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EY Introdugdo ao Estudo do Direito * Paulo Nader cariter ¢ a opeio pelo bem despertam o respeito e dito credibilidade a palavra. O saber juridico, sem 608 predicados éticos, niio se impde, no convence, pois gera a desconfianga, A implementagao do jurista de amanha se faz mediante muita dedicagdo. A leitura em geral, especialmente na area de ciéncias humanas, se revela da maior importincia, O desejavel € que © espirito se mantenha inquieto, movido pela curiosidade cientifica, pela vontade de conhecer a organizagao social e politica, na qual se insere 0 Direito. Para os académicos, to importante quanto a ligdo dos livros € a observagiio dos fatos, da légica da vida, pois eles também ensinam. O habito de raciocinar é da maior relevancia, pois nada aproveita quem apenas se limita a ler ou a ouvir. Cada afirmativa, antes de assimilada, deve ser avaliada, submetida andlise critica. curso juridico é um processo pedagdgico, que visa a criar o habito de estudo. A educagio juridica requer perseveranga; é obra do tempo. Ela amolda o espirito, orientando-o na interpretagio do ordenamento e na arte de raciocinar. A busca do saber é atividade que apenas se inicia nos centros universitarios; o seu processo é intermindvel. Por mais sibio que seja o jurista, nao poderd abandonar ‘os compéndios. A renovacao dos conhecimentos ha de ser uma pratica didria, ao longo da existéncia. Na vida universitaria, que é toda de preparagiio, o estudo de linguas deve ser cultivado ¢ a partir da bela flor do Lecto, que ¢ instrumento insubstituivel em nosso trabalho. Ao seu lado, outras se revelam da maior importancia para as pesquisas cientificas, como a espanhola, a francesa, a italiana a alema, entre outras. O conhecimento da lingua inglesa permitira a participago do futuro jurista em conclaves intermacionais Ao ingressar nas Faculdades, os estudantes devem ter em mente um projeto, visando a sua formagao profissional. Haverao de ser ousados em sua pretenso: por que ndo um jurista ou um causidico de projegio? Um mestre ou um jurisconsulto de nomeada? O fundamental, depois, seré a coeréncia durante 0 periodo de aprendizado: a utilizagao de meios ou instrumentos que transformem © projeto em realidade. ‘A nota que distingue o verdadeiro jurista, a meu ver, é a sua autonomia para interpretar as novas leis; é a capacidade para revelar 0 direito dos casos concretos, sem a dependéncia direta da doutrina ou da jurisprudéncia. Estas sto importantes instrumentos na defini¢ao das normas e do sistema juridico em geral, mas devem ser apenas coadjuvantes nos processos cognitivos. Dentro desta visio, 0 académico ha de preocupar-se mais com os principios e técnicas de decodificagaio do que propriamente em assimilar os contetidos normativos. Estes, muitas vezes, possuem vida effémera, pois as leis e os cédigos estio em continua mutagao, acompanhando a evolugao da sociedade, (© ordenamento juridico que o legislador oferece aos profissionais do Direito carece de sistematizagdo ou de coeréncia interna ¢ apresenta importantes omissdes, ditadas algumas pelo avango no Ambito das ciéncias da natureza, como a Biologia e a Fisica. Cabe ao intérprete a tarefa de cultivar a harmonia do sistema e propor o preenchimento de lacunas. ‘A teoria, como se depreende, é importante, nao a ponto de prescindir da experiéneia, adquirida nna andlise de casos propostos, Nao se formam juristas apenas pela leitura de livros, no recothimento das bibliotecas. Ressalvadas, pelo menos em nosso meio, as figuras exponenciais de Pontes de Miranda ¢ de Miguel Reale, desconhego a figura do jurista precoce, daquele que domina o saber juridico em plena juventude, antes mesmo de sua colagdo de grau e de se afeigoar aos embate forenses. © jurista de amanha se encontra, hoje, nas Faculdades de Direito, Este vir a ser depende, preponderantemente, do esforgo de cada académico, de sua determinagdo em realizar © seu projeto pessoal, Seus pais ¢ mestres, com seu apoio, orientagiio e palavra de estimulo, desempenham importante papel nesta conversiio de poténcia em ato, Paulo Nader AOS JURISTAS DE AMANHA Mensagem aos iniciantes no estudo do Direito) Conhego as diividas e inquietagdes dos académicos ao ingressarem nos cursos juridicos. Durante muitos anos, no magistério de disciplinas propedéuticas, desenvolvi processos interativos com os jovens, tendo por objeto nao apenas os conceitos gerais ou especificos de nossa Ciéncia, mas, ainda, os aspectos psicolégicos que envolvem 0 comego da aprendizagem. Na fase de iniciagao, muitas sfo as dificuldades. A linguagem técnica dos livros constitui, invariavelmente, um desafio a ser superado e, as vezes, 0 obstaculo do académico situa-se também na verbalizagao de suas ideias, ao carecer de recursos para a exposigdo clara de seu pensamento. Acresce, para muitos, a frustrag&o ao no encontrar, de imediato, os assuntos que despertam 0 seu fascinio, como o habeas corpus ou 0 mandado de seguranca. Em lugar da andlise de institutos juridicos populares, a tematica que se Ihes apresenta é de conteiido sociolégico ou filoséfico, que o seu espirito ndo assimila com avidez. As especificidades se limitam, por ora, as nogdes fundamentais do Direito. Compreende-se um projeto t8o grandioso quanto o de formagio do jurista de amanha, no se executa aleatoriamente, nem atendendo imediatidade dos interesses, Os contetdos so relevantes, mas 0 método adequado de aprendizagem é indispensével, tanto ma selegao dos temas, quanto na sequencialidade de seus estudos. Durante o curso, a teoria e a pritica sao igualmente importantes ¢ devem ser cultivadas sem preponderfincia de enfoque. O saber apenas tedrico € estéril, pois nfo produz resultados; a pritica, sem o conhecimento principiologico, é nau sem rumo, nao induz ds solugdes esperadas. Para ser um operador juridico eficiente, 0 profissional ha de dominar os principios informadores do sistema. O raciocinio em torno dos casos concretos se organiza a partir deles, que sao os pilares da Ciéncia do Direito. A resposta para as grandes indagagdes e a solucdo dos casos complexos nao se encontram em artigos isolados de leis, mas na articulagao de paradigmas e a partir dos inscritos na Constituigao da Repiiblica. ‘A experiéncia de vida é um fator favoravel a0 estudo do Direito, que é uma disciplina das relagdes humanas, Quem esté afeito 4 engrenagem social ou aos problemas da convivéncia possui uma vantagem, pois 0 conhecimento da pessoa natural e da sociedade constitui um prerrequisito 4 compreensdo dos diversos ramos juridicos. {sdisciplinas epistemolgicas, que no tratam do teor normativo das leis, mas de suas categorias fundantes, devem ser a prioridade nos primeiros periodos. © académico pode até, paralelamente, acompanhr 6 andamento de processos, engajanco-se em escritirio de advocacia, o que no deve é preterir os estudos de embasamento ou adid-los. A assimilago de priticas concretas, sem aquela Preparago, pode gerar vicios insandveis. Tio importante quanto a formagao técnica do futuro profissional & o desenvolvimento paralelo de sua consciéncia ética; é 0 seu compromisso com a justiga. A seriedade na conduta, a firmeza de NOTA DO AUTOR A 252 EDICAO Nas varias edigdes que sucederam o langamento desta Introduedo ao Estudo do Direito, em 1980, cuidamos de manté-la sempre moderna, ajustada ndo apenas a doutrina, mas jgualmente aos fatos da €poca, & legislagao vigente e & evolugo de nossas ideias e concepgdes. Durante este largo periodo, ampliou-se a nossa experiéneia, tanto pela maior vivéneia académica quanto pelo ingresso ye magstratura civel fato expressivo que ampliou a nossa compreensdo do Direito e das relagdes de vida © encontro com as classes docente e discente, na vastidao de nosso Pafs, colocou-nos em contato com diversas formas de pensar e de questionar o Direito ¢ instituigdes puiblicas. Na visio Siversificada, constatamos um denominador comum nas preocupagdes: 0 anseio por uma ordem juridica substancialmente justa e a prevaléncia deste valor nas decisGes judiciais. A expectativa é gue as leis correspondam & ordem natural das coisas e que os juizes decidam com sabedoria e em tempo oportuno, Em parte, a nossa formagao juridiea foi influenciada por provocagdes académicas, fecundamente langadas por professores ¢ universitarios. ‘A aplicago da lei aos casos coneretos propiciou-nos a visio mais realista do fendmeno suridico, Todavia, reconhecemos que a pratica dos tribunais ¢ apenas um dado relevante na defini¢ao 4do ordenamento, nem o decisivo, pois as sentengas judiciais as vezes se contrapdem ao Jus Posifum. A simula € a jurisprudéncia influenciam a interpretago da ordem juridica, porém nio devem paralisar os provessos cognitivos, impedindo o surgimento de principios ¢ interpretagdes atualizadoras. O Direito deve ser dindmico tanto pela atividade legiferante, quanto pelos processos hermenéuticos. A communis opinio doctorum, que articula 0 raciocinio juridico distante dos embates forenses, embora consciente de sua existéncia, constitui a fonte mais expressiva de revelagao do Direito. Tanto quanto possivel, deve haver convergéncia entre as produg6es legislativa, jurisprudencial doutrinaria. A ordem juridica somente se aperfeigoa quando 0 legislador, o magistrado ¢ 0 jurisconsulto se entendem ¢ mutuamente se influenciam. Com renovada postura intelectual, procuramos acompanhar 0 mundo novo, buscando outras formulas de concitiagdo dos valores seguranga ¢ justiga, Desta tentativa, surgiu a nossa concepedo /umanista do Direito, angada na 18" edig&o. Solidificou-se o entendimento de que ha limites para 6 legislador, decorrentes da presenga compuls6ria ou presumida de prineipios protetores da vida, liberdade da pessoa natural ¢ igualdade de oportunidades, Se o valor seguranga juridica impde a observéncia das regras vigentes, a exclusto de qualquer balizamento implica a consagragto de um Posivsmo absolut, capaz de vValidar eventual atentado a dignidade humana, provocado por leis ou decretos, A presente edigto marca 0 jubileu de prata desta obra, Sao vinte ¢ cinco edigdes em vinte & Cinco anos! Este fato especial motivou-nos nao apenas a rever todos os capitulos, mas a repensar as afirmagbes, os conceitos ¢ os posicionamentos. Houve alguns acréscimos. No dmbito da Hermenéutica Juridica, trouxemos informagées sobre of principios da razoabilidade ¢ proporcionalidade, ‘merpretagao da lei conforme a constituledo ¢ Interpretagao da constituigdo conforme a lei, além ‘A cada edigdo esta obra se renova, mantendo-se atualizada com as exigéncias do mundo contemporaneo. Cuidadosamente o autor revé a linguagem, os conceitos, a informacdo legislativa ¢ jurisprudencial, no poupando esforgos na renovagao de seu compromisso com a comunidade universitaria. E claro que esta disciplina propedéutica nao possui por objeto a defini¢ao da ordem juridica, entretanto, ndo € possivel situar 0 iniciante na esfera do Direito sem as ilustragdes dos principios constitucionais formadores do Estado Democritico de Direito, nem de leis estruturais, como a Lei de Introdugao as normas do Direito Brasileiro. Nesta linha de entendimento, hd de se dar o devido destaque a algumas decis6es inovadoras do Judiciario, e questioné-Ias eventualmente, uma vez que a esse Poder compete tao somente a aplicagio do ordenamento preexistente, Mais do que em qualquer época, a Introdug4o cumpre, na atualidade, um papel da maior relevancia, subministrando as nogdes fundamentais e indispensaveis articulagao do raciocinio juridico, Priorizar a literatura em formato de esquemas, resumos, sinopses, nfo contribu para a formagao do jurista, daquele que sabe ler o Direito nas novas leis. Tais métodos de estudo sto vlidos apenas quando o estudante possui uma sélida base, que se constr6i a partir dos primeiros anos de estudo, notadamente na dedicagao as disciplinas epistemol6gicas. Embora a Introdugao ao Estudo do Direito n&o seja disciplina normativa, ndo estando 1a ordem juridica, possui conteido perfectivel, que se aprimora com 6 pasar do tempo, uma vez que integra o mundo da cultura e este possui cardter evolutivo. Desta forma, nio ha como se dar definitividade aos estudos introdut6rios ao Direito. Estes devem ser ‘e atualizados. Ao seu cultor cabe o estado de permanente vigildncia, sempre assim subordinada a mudangas ni continuamente revistos atento as tendéncias do pensamento cientifico, No momento em que esta edigdo vem a lume, reiteramos aos professores universitarios © nosso reconhecimento pelo seu especial apoio, seja recomendando a leitura da obra, seja nos osas sugestdes, Aos estudantes, uma palavra de apoio, estimulo e a nossa certeza encaminhando vali io do curso, em muito contribuira de que a sua dedicagao a Introdugao ao Estudo do Direito, no i para a sua formagao juridica Novembro de 2011 Paulo Nader os PREFACIO. Se hé uma disciplina juridica que dependa, fundamentalmente, da perspectiva de quem a cultiva, €a Introducdo ao Estudo do Direito. E que 0 mundo do Direito tem tamanha amplitude ¢ to largos horizontes que infinitas so as suas vias de acesso. Por tais motivos, cada obra sobre o referido assunto, excluidas as de mera compilagdo, que nada significam, reflete, de maneira fiel, a orientagtio pedagégica, bem como as preferéncias de seu autor nos dominios da experiéncia jurfdica. Donde, alids, a minha predilegao por livros que representam, como no caso do ora prefaciado, o resultado de dedicado convivio com o corpo discente, procurando descobrir os temas que mais interessam aos jovens, ¢ Ihes poderdo servir de guia nos estudos ulteriores. Basta uma breve vista de olhos a obra de Paulo Nader para verificar que a sua preocupacao constante consiste em evitar que os iniciantes no complexo conhecimento do Direito se percam em veredas secundarias, escapando-lhes a situaga0 do Direito no contexto das atividades sociais, tendo como ponto de partida e de chegada os valores humanos. Num mundo cada vez mais ameagado por reducionismos perversos, ou pela perda do sentido de totalidade orgdnica e diferengada, que gera 0 angustiado “homem unidimensional”, analisado por MacLuhan, ninguém mais do que o jurista deve procurar preservar os horizontes miiltiplos e abertos essenciais ao Estado de Direito. Merece encémios, pois, a orientagio seguida pelo jovem, mas jé experiente, mestre de Juiz de Fora ao dar énfase a globalidade das perspectivas culturais, historicas e sociol6gicas que condicionam a.emergéncia das normas juridicas, sua interpretag0 e aplicagao, sabendo evitar, contudo, os exageros tanto do sociologismo como das demais concepedes unilaterais do Direito, cujos titulos de autonomia cle sabe preservar, com ticida compreensao de seus limites. Panorama amplo é descortinado nas li¢des de Paulo Nader, desde o estudo da estrutura logica das regras juridicas até o dos processes técnicos aplicéveis na esfera juridica, para culminar em breve, mas substanciosa exposi¢ao sobre os fundamentos do Direito, com precisa sintese da teoria tridimensional Tendo o cuidado de manter-se nos lindes préprios da Introdugio ao Estudo do Direito, sem cair ho equivoco ou na tentagio de converté-la em Filosofia do Direito elementar, Nader, de outro lado, situa o problema da Enciclopédia Juridica de maneira estrita, sem identificé-la com a Ciéneia ou a Teoria Geral do Direito. Em linguagem clara, de necessério cardter expositivo, dada a natureza da matéria que exige adequados processos de comunicagio com jovens que ainda esto adquirindo o vocabulitio juridico, nem por isso 0 Autor olvida a necessidade de fixar, com o devido rigor, os conceitos ¢ categorias fundantes do Direito, 0 que revela o cuidado e a responsabilidade cientifiea que presidiram a elaboragao do Curso. F. claro que nem sempre poderemos concordar com as teses sustentadas no presente livro, como, por exemplo, ao reconhecer, acertadamente, a autonomia dos valores no quadro de uma

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