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rica: dos Fundamentos as Praticas apresenta um niicleo de conceitos amplo, rigoroso e sdlido, que estabelece uma terminologla comum @ ‘adoquada a0 estudo da acgdo; um conjunto de teoriasdiferentemente ‘estruturadas, enquadrando diferentes perspectivas e partindo ou visando diferentes intencionalidades ou principios, que oferecem sistemas ex «ativos unitiriosecoerentes para uma pluralidade de modos de agir; uma dliversidade de metodologias que, seguindo distntas estratégias, conver ‘gem na procura de uma articulagio harmoniosa entre plano tebrico, de relexdo, ¢0 plano pritico, da 2cgi0 efectiva, eyentualmente percorida ros dois sentidos também uma pan6plia de temas e problemas canden twsna contemporaneidade, cujas abordagens comuns tendem, por ve2es, acondicionara propria reflex ética alm de um articulado de relagbes com saberes plurais, todos eles, afinal, producio do espicito humano, ‘o mesmo espiito que, inquieto, seafadiga no empenho por bem agi. 000 = ESE de Lisboe e basPmdssPras ‘© Orme dv ete Ee 7,216 Dept Leg a seb somce coe Pap Cumgetere nea era fica ov tedoonoa pte apa ‘ih Ig cao obs 70 (0s esr nme de 2010) DIgD#S 7a cane de Ele Aten, SA swonodicoes7O.pt ace rte Mee ri ‘ncnds weep ep ee pee rn ioe "Guigur emirate os Deen de Aa pe erodes oi Indice [Na senda da inguietude (nota introdutéria) ‘Maria do Céu Patrdo Neves ‘Um pono de vista sobre a Hlonfa je Anténio Manuel Martins. A Filosofia no mundo atual ‘Ricardo Vélex Rodrigue: 1 (CONCEITOS FUNDAMENTAIS. A Teoria da Acgio Isabel Renaud e Michel Renaud [Racionalidade prtica Carls Morajao ul 25 33 63 A Teoria da Accao Isabel Renaud e Michel Renaud Universidade Nova de Lisboa A primeira vita no deve ser muito complcado dizer o qu Ea aegio. Nao sero que fazemos 04 Fealizanonwodos os cia? rofisionalmente somos chamados a age na linha das nossas competéncia. Mas uma vez proferida sta expos, que parece Simplisa, surge imediatamente uma florsta de interrogacbes. Quando dizemos que agimos, ser que este agir € & mesma tainn que a acco de um reméetio no nos corpo? E os ele- mnentos natura, sen que também age? A gua mola, 0 01 aquece. Asim, também o cio parece air, podendo ladrar e tmorder. Do mesmo modo, seré correct fa da waedion de tum remédio? Quanto a ros humano, ele pode sersimpatico ou antpitico, aangulo ow nervos0, sreno ou tens, preaci- pado, itrtado, ete; seria expressio humana uma forma de Iecio? Neste caso, o air seria primordialmente espontineo, {quasesubtraido & nossa consciéncia explicita. Outra questio {que ocorte:serifaere agir a mesma coisa? Quando uma cran- Cinha mexe em todos os botdes dos aparelhos que arodeiam, la egm colsas; sera iso a sua acgao? Ela ndo sabe o que faz, 46 | _ETIGA: DOS FUNDAMENTOS As PRETICAS mas sabe a sua maneira aquilo que tende a fazer, porque deixa de mexer nos botdes se sente uma reprovacio com ameaca de um castigo. Além disso, falamos de acces colectivas; mas sobre quem recaira a auibuicio da responsabilidade? Enfim, seri a omissio, 0 facto de ndo fazer nadl, também wma forma de acca As perguntas sobre a accdo e o agir comegam a surgir em ‘eascata € ja nao vemos claramente como nos orientar neste emaranhado de questdes. Nio é por acaso que a analise da accio € uma questdo primordialmente filoséfica, mas que interesca também a psicologia assim como a neurofisologia a sociologia, o direito, a economia, a ética, a bioética, a religiao, para nio char sendo alguns campos de disciplinas. Contudo, 4 presente andlise situx-se unicamente ao nivel da teoria do agir, aquém de toda a problemalica ética; com efeito, antes de falar das questao do bom, do preferivel e do obrigatétio & preciso claificar 0s conceitos com os quais falamos da accio, deixando para outras anslises a introducio da dimensio ética, Neste sentido, a steoria da acco» entende que a accio € espe- cificamente humana, embora 6 termo possa ser exportado de ‘modo meramente metafSrieo para caracterizar outras formas de causalidade. Ea tarefa da presente andlise apresentar ofan damento desta tese 1, A conceptualizacao aristotélica da acgao Atistoteles € 0 primeira filésofo cuja conceptualizacao da accdo ainda tem grande pertinéncia, No primeiro slivrow da sua Eira a Nicimaco, apresenta wma teoria da acca que se pode considerar como preética, no sentida em que precede uma analise ética do agir orientada para 08 valores e as virtudes. Reter-sesi apenas alguns elementos da sua teoria, uma vez que no se pretende aqui analisar todas as raizes da problematica A-TEORIA DA ACCAO low Oprimeito binémio que importa salientar é seco feta de gaudoou de mau grado, De bom grado significa que o prin- esta dentro do agente: tratase, diz Aristoteles, ‘no interior do sujeito © de wm om cpio da ac ‘te um acto culo prinespio es a nq conhece as conde deco nan qa Co sr nonrola (1111, a8), A aco Tok eonscietemente post, se rrumente acco feta =de man gran, reatiala acntangimento extern ou por orn Aisttcen ent 3 acces mists; por exempl, se ealizanos wn “Trerminad eto que nto queremos fer, masque fazemos sespenade prejuda eon parece ser ina acc volun, faa ate bom grader, i Ham numa, dlvemos que em gr exe aces Tuas voluntariamentee our nvluntviamente (ember {Narmaneia de falar no sj igorosanente arisonecn, por Ghee conceit de wontae tl como o entendenos 58 apare ey ete de mil anos depot o Extagit) Tima ona dsingio que nos em de Artles conte no sindmlo paso pits Naverdade a ace poser a0 mesmo tempo pres e poss Tratase de movaidades sob 35 quai © faire contemplado canal: enquanto press oagi cons Arado na peo doaente Com fet, oagi ransformainte- lmente quem pate; xa raaformagio € seeped ter desea come o refluno da ae abe o agente. Noutos termos a praisconsste numa atotanaormagio do propio ‘gente so impacto do sew ai De moto geal, a pra €0 Ge, no ar sapereicons © agente, tansformando-. Nalin agen arsttca, apres eactalican 0 agente 0 NO se Taio em que o tora presente, ma porque the confere una realidade sem actor e no pens pene ou em poténcn. E preciso repetr que a disincao entre rans e pis ext sqét de toda onsieragio mora, embora tej enquano ass que o agi secede esta quicagio, na medida em que {oma osujete bom ox may, melhor on ior Por out lado, mas 20.0 € totalmente apesar das apse 48 | ETICA: DOS FUNDAMENTOS As PRATICAS air como poids € dito transitivo, porque € considerado como, tendo passado (dat 0 sentido de stransitivo») para dentro do objecto realizado. Assim, a construgio de uma easa acaba quando a casa, uma vex construidla, existe por si mesma, sen necessidade de lembrar a relagio com 0 arquiteeto e emprei- teiro que a realizaram. Na poids, perguntase pela natureza do objecto produzido, ou pelo servic presiad, qualquer que seja ‘6 modo ~ moral ou imoral - como aquele que o pagot tinha adquirido os seus meios financeiros. A distingio entre auto- -transformacio do agente pelo praxis enquanto tal ea produ- ‘io de algo pelo agir enquanto poifsis,esté na base da disting entre «étican (como agir-prasis)e «técnica (ow agir-poisis ou agi otransitivor). Esta distinco tem ainda a sua validade glo- bal na teoria actual do agir; contudo, no se pode ignorar a sua ddimensio formal, dado que agir € 20 mesmo tempo aperacio do agente e producio de um efeito no mundo. Aveste respeito, convém lembrar que, segundo Hannah Arendt’, é necessiri distinguir os wés seguintes conceitos: ode «trabalho», conceito proximo da pois, dado que é transitivo, passanco no produto realizado; 0 conceito de «obra», que, pelo facto de deixar socialmente a sua marca, ¢ formadora da euk tura no hiorizonte da qual se inscreve (este sentido da obra nao {az parte da definigio arstotéliea); e 0 de «accion, que pede para ser narrada, discutida eavaliada (sentido que abrange ape- nnas parcialmente 0 de praxis) Um dos conceitos mais importantes da teoria da accio & 4 ofinalidades. Em Arist6teles encontrase de modo explicito também na discussio da deliberagio que precede a escolha, Com efeito, acerca das finalidades da accio existe uma deli- beragiio (boulés, com 0 verbo correspondente bouluomai) " AueNDr, Hannah, The Human Conon Chicago, Chicago 28 5p, 1958, ATRORIA DA ACCAO, 1 _tratase das velagdes entre meios e fim do ponto de vista da utberaco (ct tia a Niomaca, 1112 18, eseguinte) 1 Eatagiita perganta entio se é possivel deiberar sobre tudo-¢ responde: a deliberacio incide apenas nos meios de sanearo lim endo sobre o fim. Comeca-se, lis, por eiminar Ado aqulo que no pode ser objeto de deiberacao, ito €, a Acersade, 0 Costios, 0 a¢280, a8 cosas imutiveis eeternas, as edades da matematica («0 didmetro ¢ 6 lado do quadrado» [r12a21), antes de afiriar que, no agir, nfo se delibera sobre 6 fim mas unicamente sobre os meios, Esta afirmacio neces- Sha alumna clavificagZo, que o autor raz logo a seguir, com Ge exemplos do médico e do politico: 0 médico tem o fim de furar; 0 orador, 0 de persuadi; © potitico, o de assegurar a ordem. Neste campo, no ha escolha nem deliberacio e, deste todo, drfamos que nto ha diseussio. A discussio ou delibera- Go surge quando se trata de analisar os meios de, respectva: tmente,curar, persuade assegurar a orem. ‘Asua mancira Arstteles tem razao, dado que pressupde uma finalidadte por asim dizer objectiva, naturale obtida por defini ciorfivefectivamente parte do tabalhodomédico tentar eurare tobre iso nio ha deliberagio.Portanto,notaremos que o enun Giado do fim daaccto consiste num enunciado te6rico, baseado ‘numa definigao regia pelo verdadero ¢ pelo falso (por exem- plo, a frase wo que é um médicor?). Todavia, diferentemente de Aristbteles, seria possvel recuar ainda mais no raciocinio ¢ transformiéto num emunciado pertencendo A razio pritica porque éque se escolheua profissio de médico oude politico? ‘Voltando a Aristtcles, reconhecese que a deliberacio pré tea depende, como foi dito, de uma premisa te6rica nao sus ceptivel de delberagio eta consiste em analisar os meios em vista 2 realizagio de um determinado objectivo previamente ‘stabelecid, Neste sentido, a deliberacio incde efectivamente nos meios eno nos fins. Mas esta tesearistotica no parecer sufciente quando se entrar na hierarquizacio das finalidades 50 | ETICA: DOS FUNDAMENTOS AS PRATICAS 2, Primeira abordagem dos conceitos do agit Além dos conceitos jl introduzides por Arist6teles, novas problematicas surgitam. Em primeiro lugar © no prolong: ‘mento imediato da diferenca entre 0 voluntitio e o involunté rio, preciso refer a disting2o entre inieiatva eacontecimento, Se nio for constrangida on realizada por ignorincia, ainicia- tiva marea 6 comeco, por parte de um agente consciente, de uma intervencao voluneéria. Esta produ efeitos, quer na inte rioridade do agente, quer na exterioridade do mundo ou ~na maior parte dos casos ~ nos dois lados. Na medida em que sio apreendidos por pessoas diferentes do agente, estes ete {os externos, surgem como acontecimentos. Por exemplo, se © ministro de um pais assina um documento legal, este docu ‘mento, uma ver promulgado, produ os seus efeitos, os quai, sendo a consequéncia de uma iniciativa, surgem como aconte- cimentos para os eidadlios que os recebem. A existir, a reaccio dos cidadios constitui uma nova iniciativa que é acolhida por todos como um acontecimento. Esta diferenga ene in € acontecimento é fundamental ma teoria da acgao: entre 0 que acontece ¢ 0 que se faz tecese uma complexa rede de sig- nificagGes, ainda antes de entrar na questo da étiea, na qual a questo da responsabilidade pelos efeitos do agir se apoiard no. binémio da iniciativa ¢ do acontecimento, Qual é 0 «abjecto» do agir humano? Noutros termos, © que realiza o agir? Esta pergunta consiste em pedir a resposta & questio wo qué?» acerca do agir. Porém, perflase uma outa ‘questao, intimamente ligada & primeira: qual é 0 objective da acgaio?, pengunta que corresponeleaoseu «porqué?», Os objecti= vos constituem as metas do agir. Na verdad, otermo «objectivor 6 linguisticamente bastante impreciso, porque evoca, por um lado, 0 «objecto» do agir, o que se quer fazer © 0 que se farefec: tivamente, e, por outro, o «objectivor no sentido da meta do augir. Em termos rigorosos, falar de objectivo da acco consiste ATEORIA DA AGCAO, Io amecipne mentaimente a realizcio da aco indicando © cn enciona realzar ste bind do objeto do objec a entra proximidade as quests 0 Gue> © porque eeen 330. Tronimo do sobjectvo>e te cenit de sfinalidaden, de que era Fate concsito to importante na loot da aco, itd © terino sine, Ora, ois & wma plawa compa, nt yemte como de vprincipior. Com ecto, or dols terms, tee principio, tem prinordiaimente uma conotaio erono- nais adequado aparece 0 se tratou na perspectiva Iégica: 0 ofims & determinada duracio temporal, fomeco. Quanido a filosofia ganhou a sua conceitualidade con- {oa ay historias miticas e a sua respectiva sctonologia, princi= pio fim tornaraimse conceit filoxoficos, pelo facto de sere fubuados & sta insere3o no tempo. Deste modo, a finalidade da accio ultrapassa 0 acabamento temporal desta, ainda que possa coincidir temporalmente com cla, € pasou a designar 0 que ela visa em iltimo Iugar. ‘A finalidade inclut, portanto, o objectivo ou os objectivos| parciais da accio, Por exemplo, um aluno quese inscreve numa, iuniversidade tem a finalidade de completar os scus estudos, © {que se poder aleangar apenas em varios anos. Os seus objec tivos sio maitiplos; um deles ser, por exemplo, ter &xito nas dlisciplinas do primeiro semestre lectivo. Um objectivo subor- dinado a este consistirs na frequentacio das aulas ministradas nessas diseiplinas®, Os objectivos parciaisinscrevem-se na Tinha, I/como o «prinespio» € 0 seu "Tomas de Aquin ji reco que a8, ru tenn fe iin in ewctime rma i exon alo in tent 9 ue € Bi Incro na intenca0 a ima cis (que lean) a0 el da veaiaci, 20 so qua priraeisa que se resi Sima na inten, Por wxemph ots de comecar wrest univers ainengin primordial 60 diploma, Ime sto que we abn em tno ge, 0 paseo que ssi no cus {En primecna cia que se deve sexcetar, mau, do pont de vista da fi “Mate itima, parece a mae remota na neni global 82 | ETICA: DOs FUNDAMENTOS As PRATICAS a finalidade global da accio. Assim, pode exist u confusio entre objective e finalidade, embora a finalidade che- sue a abranger muitas vezes, tal como acaba de ser referido, um conjunto mais vasto de abjectivos, Segue-se que cada accao se deixa decompor numa multipli- cidade de acces subordinadas. Por exemplo, deslocarse para ir ao-cinema implica, por exemplo, que se pegue no carro, que se o estacione no devido lugar, ete, Mas a prépria finalidade de sir a0 cinema» pode também ser um objectivo abrangid por uma finalidacle mais larga, tal como diverti-se ou preparar luma conferéncia sobre a matéria do filme, A jusante da final dade encontramse, portanto, outras finalidades que poderiam de certo modo transformar a primeira finalidade em objectivo subordinado a uma finalidade mais remota ¢ importante. Por sua vez, cada objectivo pode ser decomposto em objectives par- ciais, os quais se enquadram no desentolar da accao global. Surge entio uma dificuldade: seré que em sltimo lugar existe uma diferenca entre 0 objecto da aecio € o seu objec tivo? Se o objecto do agir corresponde a questo wo qué?» ese 0 “objectivo evoca o seu porqué?>, entio a que se deve explica arelagio entre o «0 qué? ¢0 sporqué?». Porém,nido sera que a primeira questio a colocar deveria ser «quem?» a propésito da acedo que foi ealizatla, que se esta realizar ou que se tenciona ‘executar? Assim, ndo seria mais Gti entrar imediatamente na problemdtica do agir pela busea do ator da acco, isto é, do agente? A esse respeito abriuse um debate incontorndvel de Tineamentos. {que nao podemos omitir os princip: 3. O debate entre a teoria analitica da accao e a feno- menologia do sujeito agente A filosofia analitica do mundo anglo-saxénico privilegiowt uma teoriasemntica daacedo. Trazase nela de definirosentido, ATEORIA DA ACCAO, Loss baie primeira questio reside na relagio entre motivagio ¢ * Rican Pan, Soi come Pa, Sel, 199, «Tereeina sd; Une seminten dain sem agents, pp. 78108, ¢ «Quarto Estas: Danecio até an agentes, pp. 108136. 54 | ETIGA: DOS FUNDAMENTOS AS PRATICAS de agit do que no proprio agir; saquilo que a accie fae» iden- Lfica-se com o «porque?» da mesma, Nouttos termos. 0

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