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Conrrabi¢Ao 8 TECNOLOGIA, TRABALHO E DESCARTABILIDADE HUMANA ‘A principal contradigio quea concep¢io marxista tradicional de socialismo/cormu- nismo deveria resolver é aquela entre 0 aumento inacreditivel nas forcas produtivas (amplamente entendidas como capacidades ¢ potencialidades tecnol6gicas) ¢ a in- capacidade do capital de uclizar essa produtividade para o bem-estar comum, em razio de seu compromerimento com as relagoes de classe vigentes ¢ seus mecanis- ‘mos associados de reproducio, dominacio ¢ controle de classes. Abandonado a si ‘mesmo — prossegue 0 argumento —, o capital esté fadado a produair uma estrurura de classe oligirquica e plutocrética cada vez mais vulnerdvel, sob a qual a massa da populacio mundial deve se virar para ganar a vida ou morrer de fore, Frustrado com essa desigualdade crescente em meio 3 abundancia, surgird das massas um mo- ‘yimento revolucionirio anticapitalista, conscientemente organizado (conduzido, nos termos leninistas, por um partido de vanguard), capaz de derrubar 0 dominio de classe e reorganizar a economia global, proporcionando a toda a populagio do planeta os beneficios prometidos pela maravilhosa produtividade do capical -Embora haja bem mais do que um pingo de verdade nessa anise (parecemos bascante adiantados hoje na produgéo de uma plucocracia global, por exemplo), acompanhado de mais do que uma lufada de fervor revolucionstio com esperancas ‘no mecanismo de transisio, sempre tive a sensacdo de que essa formula é simplista demais, ou até fundamentalmente falha. Esta claro que os aumentos dristicas de produtividade do capital so apenas um dos polos de um movimento contradieé- rio que esti sempre ameagado de explodir em uma crise. O que nio esti claro, no centanto, & qual seria sua antitese correra. Vamos tratar aqui dessa questo. ‘A tecnologia pode ser definida como 0 uso de processos coisas naturais na fabricaco de produtos para propésitos humanos. Em sua base, a tecnologia define uma relacéo espectfica, dindmica e contraditéria, com a natureza. Retornaremos 9417 contradigbes¢0 fim do captalismo 4 essa importantissima contradicio em outro capitulo (Contradigi0 16). © que rigs interessa aqui é reconhecer sua existéncia, fluidez e dinamismo. © propésito imediato e distintivo do capital (em oposieSo, digamos, 3s Forcas Armadas, 20 apa- relho estatal ea vétias outras insticuigoes da sociedade civil) €0 uco, que se traduz socialmente na acumulagio perpétua do capital e na reprodugio do poder da classe apitalista. Esse é 0 objecivo do consumo do capital. Para alcangé-lo, os capitalistas adaptam e reformulam 0 hardware da tecnologia (méquinas ¢ computadores), 0 software (programas usados pelas méquinas) ¢ suas formas de organizagio (estru- tures de comando e controle sobre 0 uso do trabalho, em particular). O propésito imediato do capital aumemtar a produtividade, a eficiéncia e as taxas de lucro, bbem como criar novas linhas de produtos, se possivel ainda mais lucrativas ‘Ao considerar a trajetGria das mudancas tecnolégicas, é fundamental nos lem- brarmos de que o software eas formas organizacionais sio tio importantes quanto © hardware. As formas organizacionais, como as estruturas de controle da empresa ‘moderna, o sistema de crédito, os sistemas de entrega just-in-time, além do software incorporado na robética, na administragéo de dados, na inteligacia artificial e nas transagdes bancirias eletrOnicas, so cio cruciais para a lueratividade quan- 10 0 hardware representado pelas méquinas. Se tomarmos um exemplo atual, a computagio em nuvem é a forma organizacional, 0 Word 0 software e 0 Mac em que escrevo & 0 hardware. Esses tts elementos — hardware, software e forma orga- nizacional ~ esto combinados na tecnologia computacional. De acordo com essa definigio, o dinheiro, as transagées bancérias, 0 sistema de crédito e 0 mercado sio tecnologias. Tal defini¢do pode parecer excessivamente ampla, mas acredito que seja esencial manté-la assim. A tecnologia do capital foi submerida de inicio a transformagées internas por causa da conconréncia entre produtores individuais essa, pelo menos, era a teoria). As empresas capitalistas, em competi¢fo umas com as outras, procuravam aumen- tar sua eficicia individual e produtividade para obter luctos maiores em relacéo 8s concorrentes. As que conseguiram prosperaram, enquanto as outras ficaram pa- 1a urds, Mas vantagens competitivas (lucros maiores) de formas organizacionais idos de estoque) nao duravam. Empresas concorrentes podiam adorar novos métodos (a menos, € claro, que a tecnologia fosse patenteada ou protegida pelo poder do monopélio). © resulrado foram inovacées progressivas nas tecnologias de diferenes secores. Digo isso em tom cético, porque a histsria do capital tem uma queda néo pela concorréncia, mas pelo monopilio, e isso néo é muito favorivel & inovacio. Ao contrério, vemos que hi entre os capitalistas uma forte preferéncia geral e coletiva uma cultura, por assim dizer ~ por eficdcia e produtividade crescences de todos os empreendimentos, com ou sem a forca morriz. da concorréncia. Se 0 objetivo melhores (como maquinas ou controles mais 1 fosse produ exigit godio nova | impor cendo de me quand ° legica nessa e forn estio do ca Mas v Conttadigio 8, Teenologia trabalho e descartabiidade humana 95 fosse melhorar a produtividade geral, inovagdes em determinado ponto da cadeia produtiva (por exemplo, a producio de tecidos de algodo em teares mecinicos) exigitiam inovagées em todos os pontos dela (por exemplo, descarogadores de al- odio). Mas a reorganizagéo de todo um setor da atividade cconémica sobre uma nova base tecnolégica levava tempo ~ ¢ ainda leva. Por iltimo, mas no menos importante, 0s capitalists individuais e as grandes empresas acabaram reconhe- cendo a importincia da inovagéo des produtos como uma forma de ganar lucros de monopélio, ainda que por um tempo determinado, ¢ uma renda monopélica, ‘quando protegidos por uma lei de parentes. ( capital nao foi e mio ¢ o tinico agente envolvido na busca de vantagens tecno- légicas. Diferentes ramos do apatelho estaal sempre se envolveram profundamente nessa busca. O mais notével, obviamence, & 0 exército na busca de melhores armas formas de organizagdo. A guerra e as ameagas de guerra (corrida armamentista) ‘estio fortemente ligadas as ondas de inovagio tecnolgica. No inicio da histdria do capitalismo, essa fonte de inovacio reve provavelmence um papel importante. ‘Mas varias outras dreas da administracio estaral, relacionadas 4 arrecadagio ¢ a0 pagamento de impostos, definicéo de direitos sobre bens iméveis ¢ formas legais de contrato, além do desenvolvimento de tecnologias de governanca, gestéo finan- ceira, mapeamento, vigilancia, policiamento ¢ outros procedimentos de controle da populacéo, também se envolveram de forma significativa no desenvolvimento de novas formas de tecnologia, talvez até mais do que empresas ¢ corporagdcs ca pitalistas. £ enorme 2 colaboragio em pesquisa ¢ desenvolvimento entre Estado e setores privados, no que diz respeito a cecnologias militares, médicas, sanitérias € cenergéticas. E sio iniimeros os beneficios das inovacées da esfera publica para as priticas do capital, e vice-versa, ‘As mudancas tecnolégicas do capitalismo, para as quais contribui c das quais se alimenta com voracidade, derivam, em suma, da atividade de varios agentes ¢ insticuigdes. Essas inovagSes criam um amplo dominio de possibilidades mutéveis para sustentar ou aumentar a lucratividade do capital. ‘O cardter dos processos de mudanca tecnoldgica mudou ao longo do tempo. A tecnologia se romnou um campo especial de negécios. Isso sucedeu claramente no século XIX, com o advento da indiistria de m&quinas-ferramentas. Tecnologias ge- nérieas, como as méquinas a vapor e seus derivados, desenvolveram-se de maneiras «que poderiam se aplicar a mileiplas indistrias. O que importava craa lucratividade dos fabricantes de méquinas a vapor, e nao tanto a das diferentes indiistrias que ‘empregavam a energia a vapor (por exemplo, transporte, fabricas de algodo ¢ mineradoras), embora a luctatividade dos primeiros nao fosse obtida sem a lucrati- ‘vidide das segundas. A busca de méquinas a vapor novas ¢ melhores, bem como de aplicagées para sua forga e energia, rapidamente ganhou impulso. 96 117 contadigbes eo fim do captalismo A busca de teenologias genéricas que pudessem ser aplicadas a quase tudo pas- sou a ser importante ~ como aconteceu nos tiltimos anos com computadores, sis- temas just-in-time e teorias da organizacao. Surgiu um vasto campo empresarial de Invengio e inovagio que atendia a todos, fornecendo novas tecnologias de consu- ‘mo, produgio, circulagio, governanea, poder militar, vigilincia e administragio. A inovagio tecnolégica se rornou um grande negécio, nao necessatiamente “grande” no sentido de uma corporacio consolidada (embora haja exemplos abundantes desse tipo nos setores energético, farmacéutico e de agronegécio), mas “grande” no sentido de miiltiplas empresas, muitas delas de risco e startups que exploram a inovacao pela inovacio. A cultura capitalista se tornou obcecada pelo poder da ino- ‘vagio. A inovagio tecnolégica se tornou um objeto de fetiche do desejo capitalista. A partir de meados do século XIX, essa pulsio fetichista por novas formas de tecnologia 2 qualquer prego promoveu a fusio entre ciéncia e tecnologia. Depois isso, ambas evoluiram num abrago dialético. Se, por um lado, o desenvolvimento cientifico sempre dependeu de novas tecnologias, como 0 telescépio e 0 micros- cépio, por outro, a incorporagio do conhecimento cientifico a novas tecnologias tomou-se 0 cerne da atividade empresarial da inovagio tecnolégica, Esse grande setor empresarial se revelou cada vez mais competente para im- por inovagées tecnolégicas, &s vezes muito onerosas, a consumidores relutantes, ausiliado com frequéncia por regulacées estatais que tendiam a favorecer grandes ‘empresas, em detrimento de pequenos negécios, uma ver que os custos da confor- midade regulatéria costumam diminuir com a escala da operagio. As regulacoes da Unido Europeia, por exemplo, obrigaram pequenos comerciantes ¢ restauran- tes a utilizar miquinas eletrénicas em suas transagoes para fazer 0 registro fiscal € contabil, deixando-os em desvantagem em relacio as cadeias de lojas. A difusio de novas tecnologias ocorte por uma combinagio de consentimento e coergio. O desenvolvimento de tecnologias militares, por outro lado, tornou-se nada menos que uma fraude, pela qual um vasto complexo militar-industrial se alimenta dos cofres piblicos enquanto promove a inovacio pela inovacio, © caminho da evolugio tecnolégica nao foi aleatério ou acidental. Como afir- ma Brian Arthur em The Nature of Technology, as novas tecnologias se tornaram essencials “para 2 construgio de outras novas tecnologias”: Desse modo, com o lento passar do tempo, muitas tecnologias se formaram a partic de sumas poucas reenologi ponentes tecnologias mais simples. A colegio geral de tecnologias supera a si mesma partindo do pouco para o muito e do simples para o compleso. Podemes dizer que a tecnologia se cria a partir de si mesma, ‘eassumiram formas mais complexas, empregando como com- Arthur ¢ excelente de antes de ser © conceicuai problemas p outros prob] gam a outro em que um O desen cidades tém po observar fortuita de necessitio p terizada po: Historicams vas combin de uma Gri de universic desenvol pelo qual busca de va Mas ées recedora sol a respeito d mente deve aviio de cor © 0 “propos simplesmen devem ser n De man nomia assut poder da cl sgica relativa funcioname © We Brian A ? Jane Jacobs Contradisio 8, Tecnologia, tabalho e deseartabilidade humana [97 do pas- “Arthur chama esse processo de “evolugio combinatéria’, o que, para mim, é uma ores, si excelente denominagéo. As novas tecnologias, no entanto, io “criadas mentalmente sarial de antes de ser construidas fisicamente”, ¢ quando observamos os processos mentais © const « conceituais envolvidos, vemos a evolugio teenolégiea como resolugio mental de raga. A. problemas posta em pritica. Um problema surge e ¢ identificado, uma solucio se faz ‘grande” necessdria ¢ invariavelmente combina em uma nova configuracdo solugées dadas a adantes outros problemas. A nova configuracéo costuma ter efeitos secundtios que se propa- grande” gam a outros campos, porque cria o que Arthur chama de “nichos de oportunidade”, loram a cm que uma inovacio origindsia de um campo pode ser aplicada a outro'. -da ino- desenvolvimento espontineo de centros de inovacio (algumas regiSes ou italisea, 7 cidades tém indices notéveis de inovacio) ocorre porque, como ha muito rem- k rmas de po observaram Jane Jacobs e outros analistas, & mais provivel que a coincidéncia . Depois 7 fortuita de diferentes habilidades ¢ conhecimentos, do tipo que Arthur considera rimento necessitio para a inovagio, surja de uma economia aparentemente cadtica, carac~ micros- terizada por uma mulkiplicidade de pequenas empresas ¢ divisées de trabalho*. nologias Historicamente, esses ambientes tém uma probabilidade muito maior de gerar no- vvas combinagées tecnolégicas do que cidades cuja vida econdmica gira em como ara im de uma tinica empresa, Mais recentemente, no entanto, a organizagio deliberada anes, de universidades, institutos, grupos de discusséo e unidades militares de pesquisa grandes ¢ desenvolvimento em determinada dea se tornou um modelo bisico de negécio confor- pelo qual o Estado capitalista e as empresas capitalistas fomentam a inovagio em ulagdes ‘busca de vantagens competitivas. cauran- 7 ‘Mas ¢ estranho que a exposicio de Arthur, que de modo geral é bastante escla- fiscal © | recedora sobre a ldgica da evolucao tecnolégica, fuja de qualquer discussio critica difusio 1a respeito do conjunto de propésitos humanos aos quais as tecnologias suposta- 40.0 ‘mente devem servir. Ee se entusiasma, por exemplo, com o design sofisticado do ‘menos aviéo de combate F-35 Lightning II, mas nfo menciona sua relagio com a guerra nea dos ‘€0 “propésito humano” de dominacio geopolitica. Para Arthur, 0 avido apresenca simplesmente um conjunto particular de complicados desafios tecnoligicos que no afir~ deve ser resolvidos. nara De maneira semelhante, ele ndo critica a forma capitalsta especifica que a eco- : nomia assume, ¢ certamente nio questiona o'esforco intencional do capital para : maximizar os luctos, facilitar a acumulacao infindavel de capital e reproduzir 0 : artir de poder da classe capitalista. No entanto, sua teoria a respeito da evolucio tecnolé- 0 com- ; gice relativamente aurénoma tem profuundas implicagdes para a compreensio do mesma fancionamento do motor econdmico do capital. Ela Janga luz sobre as contradigdes rquea w Jane Jacobs, Te Benemyof Cites Neva Yor, Vintage, 196) fan Arthur, The Nature of Technolgy, cit p. 2 sep 98/17 conadigbes eo fim do capitalismo geradas pelas mudangas tecnolégicas para a perpetuagio ¢ a teproducio do capital. Hi algumas transigdes importantes em andamento. ‘A passagem de um modelo mecinico para um modelo orginico da economia tem implicagées para a teoria econdmica. “A ordem, 0 isolamento € o equilibrio como modos de organizar explicagées estio dando lugar & aberture, @ indetermi- nacio ¢ ao surgimento de novidades incessantes.”” Aqui, Archur faz eco 4 arguta obsetvacio de Alfred North Whitehead de que a prépria natureza (¢ a natureza humana nao é exces) consiste em uma busca perpétua pela novidade'. Conse- quentemente, continua Arthur: as tcenologias esto adquirindo propriedades que associamos aos organismes vivos. A ‘medida que sentem ¢ reagem'zo seu entorno, & medida que se auto-organizam, austo- configuram, autorregencram ¢ tornam-se “cognitivas’, assemelham-se cada vez mais 4 ‘organisms vives. Quanto mais sofistcadas e “de ponta’, mais bilégicas das se tor- znam. Estamos comerando a notar que a tecnologia ¢ tanto um metabolismo quanto Essa passagem de uma metéfora mecinica para uma metifora orginica (ou qui- mica) & significativa. A “nova economia” vista por Arthur parece mais natural do que a racionalidade mecinica sobreposta ao mundo desde a época do Esclarecimento. Trata-se de nada menos do que uma regressio (talvez “recuperagio” seja um termo melhor) a formas mais antigas de compreensio da relagao entre tecnologia e nature- 7, Mas essa rogressio nio & conservadora ou nostilgia, ¢ evita 0 sentimentalismo & ‘omisticismo do pensamento cultural da chamada “Nova Era’. Os “novos principios” (que devem entrar na economia, sugere Arthur, sfo formas orginicas e processuais de pensar e teorizr.Ironicamente (¢ Arthur sem diivida fcaria chocado se ouvisse isto), ‘esa forma de economia politica foi proposta por Marx, pioneiramente, nos Grun- Arise Sé dessa maneiea, sugere Arthur, seremos capazes de apreender as “qualidades da tecnologia moderna, sua conectividade, sua capacidade de adaptagio, sua tendén- a evolucéo, sua qualidade orginica. Sua vitalidade desordenada’®. ‘As implicagées dessa anélise da tecnologia para o modo como entendemos 0 cariter evolutivo do capital como motor econdmico sio profundas: A chegada de novas tecnologias ndo perturba apenas 0 status quo pela descoberta de rnovas combinasSes que sio versées melhores de bens ¢ métodos que urilizamos. Ela Te Brian Arthur, The Nature of Technolog, cit p. 211. 4 Alfted North Whitshead, Proc and Realty (Nava York, Free Pres, 1969) p33. 5 W.Brian Arthuz, The Nature of Technology, cit. 213; Kael Mare, Grundrise, ct ambéi contin ‘inuan Nova fases dag vel, de" ticament exemplo figuragie indolos, ‘mos sem da destru Qual Curiosar muito pital, ha consider 1.0: fica, cade alf boa pare técnicas de que f Aluxo per sumidas de uml 2.N suas fas po",og Encurta © WBE * Joseph [ed. be 1984 capital conomia_ auilbrio determi- 2 argura natureza _ Conse- vives. A my autor i Se tor- > quanto (ou qué Ido que imento, n termo nature- lismoe ncipios” suais de se isto), 5 Grun- lidades cendén- ‘Contradigio 8. Tecnologia, tabalho e desartabilidade humana /'99 cambém poe em marcha uma série de adaptagies teenoldgicas e de novos problemas, ¢ assim eria novos nichos de oportunidade que exigem novas combinagbes, que por sua ver introduzem novas tecnologias e novos problemas ..] A economia, portanto, etd da tecno- sua tespos- ate remota » campo de is para que x0. evisivel. Eos ens previsl- pécies biold- ssivel prever 40 podemos de oportu- -ncialmente, {3 mil anos Jembrasiam a forma da car a lucra- cio combi- a as facuras tecnologia cio entre a para com 0 ucial para a al, Durante scujo prin do trabalho acficiéncia validade da os trabalha- 2m receber: RN Contradisgo 8. Tecnologia, rbalhoe descarabildade humana / 103 © objetivo principal de muitos inovadores era 0 controle do trabalho, Na Fran- «ca do Segundo Império, um industrial famoso por suas inovages na industria de ndquinas-ferramentas declarou que seus trés objetivos eram aumentar a preciso do processo de trabalho, ampliar a produtividade e tirar poder do trabalhador. por isso, sem duivida, que Marx argumentou que a inovagd0 tecnoldgica era uma emma crucial na luta de classes, ¢ que muitas inovacdes foram adotadas pelo capital ‘com 0 objetivo tinico de impedir as greves. Foi assim, certamente, que surgis: tenga fetichista do capital de que a solugéo para obter uma lucratividade sempre rescznte era a.constante inovacio teenolégica voltada para 0 disciplinamento © 0 esempoderamento dos trabalhadores. O sistema fabsil, o taylorisme (que tentou reduair o trabalhador a um “gotila treinado”), a automacio, a robotizagio e a subs: titwigao do crabalho humano pela méquina correspondem a esse desejo. Os robés thio reclamam, néo respondem, no processam ninguém, nfo ficam doentes, no desaceleram, nio se desconcentram, nao fazem greve, néo exigem aumentos de s2- litio, nfo se preocupam com as condiges de trabalho, no querem incervalos para ‘6 café nem faltam a0 trabalho (a néo ser nas historias de ficgio cientifica). ‘A fantasia capitalista do controle total sobre o trabalho e 0 trabalhador tem suas rafzes nas circunstancias materiais, principalmente na dindmica da Jura de classes fem todas as suas manifestagGes, tanto dentro quanto fora do processo de produsio. © papel do desemprego tecnologicamente induzido na regulacio dos saldrios, @ busca de produtos cada vez mais baratos para sustentar a mao de obra (fenémeno Walmart), a fim de tornar mais aceitiveis os baixos saldtios, a critica a qualquer proposta de sairo socal (como se fost um incentivo a0 dcio) ¢ outras manobras Femelhantes constituem um dominio da lura de classes em que as invengies ¢ -mediagées tecnologicas io crucias. E éisso que torna to estranha a apresentagdo de Archur, pois esses fatos hist6ricos Sbvios ¢ elementares (t40 maravilhosamente satitizados em Tempos modernos, de Charlie Chaplin) nao entram em sua explica- lo da evolugio combinatéria, que tem de faro um papel crtico nos detalhes da mudanga tecnolégica. “Temos aqui contradicao central: se trabalho social éa grande fonte de valor Iucro, substituclo por méquinas ou trabalho robético nao faz sentido, nem politica ‘nem economiicamente. Mas percebemos com muita clareza qual mecanismo leva essa contradicio a um ponto de crise. Empreendedores ou empresas individuais consideram que as inovagées que poupam trabalho séo decisivas para a lucrativi- dade perante os concorrentes. Coletivamente, iso destri a posibilidade delucro. Em um livro recente, Martin Ford apresenta um argumento justamente sobre «esse problema. Segundo cle, 4 medida que a vanguarda do dinamismo recnolégico passa dos sistemas mecinicos e biol6gicos para a inteligéncia artificial hd um enor- ime impacto na disponibilidade de emprego nao s6 na indistria € na agriculeura, 104 17 consradigbes eo fim do capitalismo mas também nos servigos e até nas profiss6es. Consequentemente, a demanda agregada por bens e servicos entra em colapso, enquanto emprego ¢ renda desapa- recem, Iso terd efeitos catastréficos na economia, a menos que o Estado descubra luma maneita intervir com estimulos redistributivos aos setores dla populagéo que se tornaram redundantes ¢ descartéves. ‘André Gorz apresentou exatamente 0 mesmo argument, porém de uma pers- pectiva politica diferente: ‘A ligica microecondmica prfersia que as economias de tempo de trabalho se rahuzs~ sem em econiomias de saris para as empresas que as realizar: produzindo a um custo menor, esss empresissetdo mas “compettivas”e podetio (sob cesta condiges) ver det mais, Ms, do ponto de vista macroeconémico, uma economis que distibui cada ‘vez menos saliros, porque usa cada ver menos trabalho, escorrega inexoravelmente pela Iadeira do desemprego ¢ da pauperizagio. Para evitar isso, 0 poder aquistivo das fami- lia tria de deixar de depender do volume de trabalho que a economia consome. Ainda {que dedique muito menos tempo 20 trabalho, a populasio teria de ganharo sufcience para comprar um volume maior de bens produzidos: a redusao do tempo de trabalho ‘nfo pode ocasionar uma reducio do poder de compra.” (Os detalhes que Ford cita para apoiar sua afirmagio geral sio impressionantes. Hi evidéncias empiricas claras do crescimento exponencial inexorivel da capaci- dade ¢ da velocidade dos computadores. Grosso modo, esse crescimento dobrou a cada dois anos no decorrer das dltimas ts décadas. O atumento dessa capacidade dos computadores nao depende da construgio de uma tecnologia que tenha a ha- lade de pensar como nés. Ble surge do fato de que o computador é “inima- ginavelmence ripido” toma-se cada vez mais ripido com o tempo. O ganho de ‘elocidade sempre foi, como vimos, um objetivo fundamental da inovacao tecno- légica em relagao a0 capital, e 0 mundo da informética nao é excegio. Uma das consequéncias do crescimento exponencial da capacidade dos computadores € que “categorias inteiras do emprego tradicional correm 0 tisco de ser expressivamente informatizadas num futuro préximo”. A ideia de que a criagio de empregos pelas novas tecnologias compensara essas perdas é “pura fantasia’, Ademais, a ideia de {que apenas os trabalhos rotineiros mal remunerados sero eliminados, ao contratio ddos trabalhos qualificados, com alta remuneragao (como radiologistas, médicos, professores universitétios, pilotos de vido etc.), € um equivoco. “No fucuro, a anutomacéo incidird fortemente sobre 0s trabalhadores do conhecimento, em pat- 5 André Gore, Griqu of Economic Reason (Londres, Vers, 1989), p. 200. ticular os 1 sminados a resultantes, Mas de segmentos. © descarcéy ver, canto n cexisténcia s capital, ter outro lado, demanda? | Quem vi sth a po e wabalh tomagio midores emprego essoas Essa éu diante de u nna década ¢ consideran: zacéo? Cur perspectiva aplicados, 1 quanticativ: tio, a produ dos dois la 0s casos, a ccolapso. En tre seu arg das conseq © Marin Fo Fature Es ° Ibidem. p, rte, a demanda e renda desapa- ‘stado descubra populagio que m de uma pers- valho se traduzis- sindo a um custo -condigdes) ven- se distribu cada pravelmente pela sitive das farni- consome. Ainda nhar 6 sufciente mpo de wabalho apressionantes. vel da capaci- ento dobrou a ssa capacidade me tenha a ha- ador é “inima- >. O ganho de novagiio tecno- cio. Uma das uradores é que ressivamente mpregos pelas ais, a ideia de 5, a0 contratio sas, médicos, "No futuro, a ento, em par- Contradisio 8. Teenologa, trabalho edescarabilidade humana / 105 ticular os mais bem pagos”, Ford conclui: “Permiir que esses empregos sejam eli- ‘minados aos milhées, sem nenhum plano concreto pata lidar com os problemas resultantes, éa formula perfeita para o desastee"”. Mas de que tipo de desastre estamos falando? Do ponto de vista do capital, segmentos cada vez maiores da populagéo mundial serio considerados xedundantes ¢ descartévcis como trabalhadores produtives ¢ terdo dificuldades para sobrevi- ‘yer, tanto matcrial quanto psicologicamente. Alicnados de qualquer perspectiva de cexisténcia significativa no campo do trabalho necesséto, tal como é definido pelo capital, trio de procurar outros espacos para construir uma vida significativa. Por ‘outro lado, a produgio vai cresces, mas de onde vird 0 aumento corsespondente de demanda? Isso é 0 que mais preocupa Ford: Quem vai se adiantar ¢ comprar todo esse aumento de produsio? [..] a automasio std a ponto de abarcar tudo — quase toda a indstria, uma ampla gama de ocupagoes e trabalhadores com diploma universitirio, mas também quem nio se formou. A au- tomagio chegard aos paises desenvolvidos ¢ aos paises em desenvolvimento. Os consu- rmidores que movimentam nossos mercados sio praticamente todas as pessoas que tém temprego ou dependem de alguém que tem emprego. Se um parcels substancial desas pessoas perder seu emprego, de oneleviré a demanda do mercado?” Essa é uma pergunta tipicamente keynesiana sobre a gestio da demands, feta diance de uma ameaca de crise do capital como a que arruinou a economia global na década de 1930. O que acontece quando reformulamas as afirmagées de Ford considerando 0 pano de fundo da unidade contraditéria entie producio ¢ reali- zacio? Curiosamente, Marx identifica uma dificuldade semelhante, mas parte da perspectiva da produgio. Quanto mais dispositives de economia de trabalho sio aplicados, mais o agente que produz valor ~ o trabalho social ~ tende a declinar quanticativamente, em iltima instancia descruindo o trabalho socialmente necessé- tio, a producio de valor ¢, com la, a base da lucratividade. Q resultado 0 mesmo dos dois lados da unidade contraditéria entre produgio e realizagio. Em ambos 0s casos, a lucratividade é erodida e a acumulacio infindével do capital entra em colapso. Em apéndice, Ford reconhece que pode haver certa semelhanca geral en- tre seu argumento ¢ o de Marx, mas no vé qual seja e, & claro, tenta se distanciar das consequéncias nocivas de qualquer associagao desse tipo. Contudo, o aleance “© Martin Ford, Te igh inthe Tiomel: Automation, Accelerating Technolgy and the Economy ofthe Future (Estados Unidos, Acculant™ Publishing, 2009), p. 62. * Tbidem, p. 96-7 106 117 contzadigBes eo fim do capitalisma potencial das forcas e solugdes opostas parcee muito diferente quando se parte das, dduas perspectivas oferecidas por essa unidade contraditéria, Ford, por exemplo, parece desesperadamente preocupado em evitar que ©

Feientes para protelarindefinidamente a queda do valor de produc ¢ dos lucros Vias de desenvolvimento desse tipo tém evitado ha algum tempo a queda dos Iucrs.A incorporagio dos camponeses da China, da [ndiae de boa parts do sudeste ae feta lem de Turqui, Ego, alguns paises da América Latina e outros da Arica ‘um continente com uma reserva gigantesca de mio de obra no aproveitada) & forca “Teseabalho mundial desde a década de 1980, além da incegracio do que foi o Bloco © Andeé Gore, Critique of Beonomie Reason, cit p. 92. Soviético, signi assalariada mun ‘Também é nitic trabalho cenebs ddademanda éa Desse modo haver nenhum dlo capital a los da mio de obr ‘movimento ma capitalists avar reservas gigante ¢ Meridional). de trabalho glo! que houve nos scrvigos rotineis set apenas 0 co! médicos, easen a produgio de miza trabalho, perigo ameaca dades de emps reproducao do | As iimas¢ década de 1990 Ho sem empre prazo em uma: Fenémeno scm de obra na Chi rece ser limitad perspectivas fu populagées red Isso tem im sais bem elab valor do trabalh fornecemos par

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