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PEQUENA HISTORIA Escrito por historiadores e por médicos, este livro comega por relatar © dificil nascimento da medicina, através das priticas de magia na antiquissima Babilonia, das ligbes dle Hipécrates na Grécia € da medicina arabe na Idade Média, até a elaboragio de uma medicina cientifica a partir da época de Pasteur. ‘Mas estuda também as doengas mais mortiferas los tempos modernos no seu contexto histérico € enquanto fontes de angistia e sofrimento. mM Ln rica TheNICA © Lttuoreton dx Sl, 1985 ‘Tho oda: Ler aaron un Hare ‘agus! Lads Bom “Reale teats teil Alberto Free Capa op pienso: Rabun Sans Ito de cap: pormeor dea uno de Bosh Fotocouposit: Dero, Lae Tepe cebariat: Aan Maroas& Fos, La pesto ea a 4971, ISHN 97210 0922 ‘Todos ot datos deen edgto rserados por ‘TERRAMAR = Bore, Dabldor Liveoy, Ls, [Ras Rodiiguss Sampaio, 79 R/C - ag, ‘Tenens 31568 ee Pax 90.2098 Hop itea PORTUGAL. APRESENTACAO Colaboradores deste volume ‘RAR, Jee: eageno agrnome ¢doutorsdo tm Cains ‘Nati ‘aR, Yoreph oma conto americao. enc, YverMasie: profesor de Hiss Moder na Unives- ‘dude do Ree. sina, Prange: eset de Hisria na Universidade de ‘Borst orTiRo, Jar: ditoe de extudon nt Ttcla Prin de Alo "Beds, de Pa. ARNON, Pie: hstorador¢ romance. Invetigdor do CNRS. * (Cetro Nasional de Inveigagto Ceti), de Pai. Duvonr, Robart membro da comisdo de redosfo dn revita ‘Tso. or do veo Les dns on we tae DESERT, Gabi: profesor de Hise Contemportaee ma Usie ‘vad do Can. ‘OADVARD, Ciaule: stents do Hira Medien an Universe ‘dae de Pas. ‘OUERRAND, Roger-Heas slborador da evita Lake, QAULT-MUART, MatiJouL: doutorad em Lata, & dirctors ‘do Tstitso 6 Hira da Meticoa edu Farms (Ulver I ach eis nanan: ia lh the aa | - > > > > ; > 7 7 » » b » y y , y > ? > > > > > » Ss sidade Rent Deere) serra geal de Academia Ite. fnconal de Histria da Mion sAcQUART, Danielle: erquit-palelog,& invertigndora do ‘ENRS (Pa LEmGRE, Auete: profetora da Facldade de Diesio e Che "mont Ferra ‘eanuny, Fang: profesor da Universidade du AltBretans (emneriD, 1s GOR, Jou: Mirtoiador francs, &ecor de estas ma ‘ova don Alle Bates de Ctois Soci do Pars. E autor Ge agons livros fOpdamesas, cm eopecal sobre a dade Mein. ONARD, Jeeque: profssr de Hisvia Contemporines na ‘Univenade de Remnes. MeUNTER, Huguet: profscen de Hine cclboradora da ‘esta L Hero ‘uteateaL, Prange: proftor-aitant de Universidade de See maa Hine do Mao Oe moins st loca meer vest Cae poate de Uvalde de Ps-VI ~ Sit ‘Ds tor de diver tio sabe « Glia atin. MOULIN, Ame Mace: doutorada em Medici, iovetgndors ‘se Usverldade de Harvard. ove, Delp: oral faces, SAUNTER, Ane antente de Universidade de Pais, SOURNIA, Jet-Chares: manibro da Academia dt Medicina (Ganga e predate da Secloade Tnteraconal de Hiri i Median iNDICE APRESENTAGHO, rod 5 in iti ee vrnnnennnnene 1 -ONASCIENTO DA MEDICINA MODERNA cane 9 ‘A magi 4 mein a 98 BIE caer ML ‘eSpis de prt. ‘Rida ooore do mdse ri ‘Armediine motel past prom : arto verdes ranted a ia ne 8 (Obras ita. E 3 2-AS GRANDES DOBNCAS covenants 17 (oe pate do ta Decanute: A pt Omedo da er 5 ecamets: Alea n ‘lower doe cus. ‘Acesls pngeaoe, rs pa i i i Dement Ogi 0 nnn tia do 0 we BSeeeg a Seekers Uma histéria dramatica Jacques Le Gott ‘Da mais remota Antiguidade, donde surgem os ainda espantosos documentos da Babilénia, até a0 ‘loco operatério mais futurista, as attudes face dy cng em nad s altraram, Por un lado, a andonts pesquisa do saber cient © de ume pritin misice ‘que nfo pita de aleanpar grandes vitérae, da trepeaa- 0 prb-histirioa ds vacinas, sors, anbistios ete, os tempos modernos. Por outro «crenga inveteaa 2a eficcia da magia (rapes ou ervas) nos magicos (ruxas, milgreiros, curandevos de toda a espe) ‘eamo hoje srt fi estabelece a tronteca? Espago privlepiado dos fantasmas indviduis me- distzados pele familia, 0 meio, o Estado ~getor cada @ ‘ez mais poderoso da satde-, 0 Sorpo softedor ane formar-seia em objectoprvileiado dos historiadoree © que acontece desde ha vinte acs, ‘A docnga pertence & hitéria, em primeiro lugar, Porque fo & mais do que uma idea, um oso abe, . AS DOENCAS TEM HISTORIA ‘acto numa ccomplexa realidade empitica» (M.D. Grmek), © porque as doengas so mortais. Onde estio as febres terse quarts dos nossos antepassados? A. doenga pertence nfo 96 & historie superficial dos pro- ‘gressos cientificos e teenoldgicos como também & trie profuada dos saberee © das pritcas Higadee && cstrururas sociis, ds instituigtos, as representagSes, ds ‘mentalidades. Desde a Idade Média, 0 jogo da doen «eda sate jogu-se cada vez menos em casa do doente © cada vez mais no palécio da doenga, o hospital Existe umes histéria do softimento, Esta hietéria das doengas conhece « febre conjuntural das epidemias. B 1uma historia dramatica que revela através dos tempos ‘uma doenga emblematic unindo o horror dos sintomas. 40 pavor de um sentimento de culpabilidade individual colectva: lepra, peste, sf, tisica, eanero ¢, nom ‘Pequeno teritrio fortemente simbélic, a SIDA. Entre o mito totalitirio do Dr. Knock ¢ 0 sonho ‘utépico da desmaedicinalizago a todo o trans, & nossa sociedade tem, de qualqtier modo e sempre, um dificil ccaminho a percorrer face ds doengas. Mas, falando em termos de suide -, ou de mutrigfo ou de alfabetizacio, resumindo, todos os dominios do homem ¢ da socie- ‘dade na qual procuramos a justo titulo os indicadores ddo progresso ~; temos vergonha quando comparamos 0 nossos problemas © as nossas angtstias com as tesriveis realidades de uma grande parte do Terceiro Mundo, 1 O NASCIMENTO DA MEDICINA MODERNA. A magia e a medicina reinam na Babilénia ean Botte Cade civiizagto, cada tpoca, tem a sua dose de racional ede iracional, Se existe dominio em que esta € visivel, €0 da luta contra 0 mal. Porque o mal nfo & apenas contrariante, mas absurdo, e porque nem a sgeometria de Euclides» 0 conseguiu explicar nem a Tica conseguin east, Deste exemplo de paradoxo, deixou-nos a antiga ‘Mesopotimia um espantoso exemaplo sobre os gineros dda sua medicina: da sua jute orgenizada contra o mal fisico, a doenga. Praticamente descoahecido dos nfo assziblogos, ficou-nos um dossier considerdvel, desde 0 ‘mais remoto torexiro milénio até a0 desaperecimesto desta calture, pouco antes dt nossa era: vicios milha- es de documentos téenioos, mais ou menos copiosor, ‘ais ou menos poupados pela firia do tempo, e uma ‘mpressionante acumulago de dados aluivos, extrai- dos de todos os sectores da literatura. Mas delee quase 2 ‘AS DOENGAS THR ISTORIA nada se compreenden até se perceber que essa gente tinha, de facto, elaborado, com a mesma intengio terepeutice, duss técnicas, bastante diferentes, quer za inspirapio quer na aplicagio: uma medicina de médicos ¢ uma medicina de eanagos», Em todas as culturas se aprendeu muito cedo combater 0 mal fisico com os meios disponiveis: & a medicina empirica. Hla 6 conhecida na Mesopotimia desde a primeira metade do tereeio milénio, pouco depois do inicio da excita, e primsiramente pelo seu ceapecialista, 0 séuthenioo: 6 médico, em acadiano ast, palavra cj sentido radical gnorames, A toss, a febre eas doves de cabepa ¢, Formados ors por um mestre, também ele pratcan- ‘te, ore numa escola eflebre, como a «faculdade da cidade de Tsin», 05 médicos encontram-se um pouco por toda 2 parte nos nossos textos. Se acreditarmos ‘num conto bastante irénico, os mais importantes apre» tavamvse de forma especial: cabepa rapada, pompo- s08 e afectados, «possuidores dos seus préprios instrumentos cirirgicom, © o8 tolos diziam: «Ble & ‘muito bom» Por vezes especalizavam-se: conhece-se ‘um «anédico de olhom, sf0 até mencionadas algumas aaulheres praticando a medicina». Os asd serviam-se antes de mais nada de remédios (bultc «o que dé a video), extaidos de todos os elementos da naturezs, ‘es prineipalmente das plantas, donde a sus designe” ADMAGIA A MEDICA REINAM NA BABILONTA ” fo gentrica de «simples» (sham). Bram utilizados Fresos ou sec08, inteiros ou em p8, mais frequente- ‘mente misturades, para multiplicaglo dos efeitos. Bra também 0 caso de diversos produtos mineras (sis © pedras) ¢ animais (sangue, carne, pele, oss05, oxcro- Sobre estas drogas, eleborsram-se ftermi- i cathlogos, por vezes completados com dados ‘eis para a sua identificapo © com referéncias especi- ficasrespeitates @ sua utlizago. Os médicos adminis- ‘ravam-nos depois de eles mesmos 08 terem preparado = porque nfo existiam boticérios ~ de varies formas diferentes: depois de imersfo ou decoorio em diversos Tiquidos, em pogSes, logdes, unguentos, cataplasmas, faixas, plules, suposit6rios,clisteres e temples. Espe- cializaram-ce também em movimentos ¢ exercicios, {fitos & mio ou com o auxilio de virios instrumen tos, especialmente concebidos pera agirem directamen- te tobre as partes doentcs: fumigapées, ligaduras, smassagens, palpapbes e intervengtes varias. No «cd- digo» de Hamurabi, vé-e um mbdico reduzir as frac ‘ras e utilizar a eanceta» para praticar incisdes até & ego dos olhos. ‘Seguindo as caractersticas de um pais conquistado desde longa data pela tradigho esrits, estes métodos, recctase tratamentos exam apontados em verdadeiros tratadom mais ou menos desenvolvidos, mais ou ‘menos especializados: contra a wlossen, a eebren, as adores de cabsca», tas doenpas dos ollios» ou «dos dentees, as doengas internas... Neles se enumeravam © desoreviam os diferentes males estudados,alinbando-se or “ AS DOENGAS Tia HISTORIA para cada um formulas, por vezes numerosas, entre a8 ais 0 médico teria de escolher, Para tornar mais acessvel esta prética médica, apre- sentaimos ume carta escrita em 670 antes da nossa era ao rei assirio Asaraddon (680-669), por um médico, por ele frequentes vezes consultado, chamado Ured- Nan: «Boe saide! Excelente safide para o Rei, mew Senhorl E que os deuses da snide, Ninurta e Gul, Vos concedam 0 bem-ester do coraglo ¢ do corpo! Vossa ‘Majestade pergunta-me insistentemente 0 motivo pelo ‘qual ainda nfo fiz o diagndstioo da doenga que Vos faz ‘offer e por que motivo ainda no preparei os amédios ‘para a cura. (Diga-se entre paréntoses que Asaraddon parece ter sido um grande doente: depois de observar o sou volumoso dossier patolégico, um assriblogo acaba e afirmar, talvez revelando uma carta ingenuidade ‘métca, que ele devia sofker ~ e que disso teria morri- do ~ de lépus eritematoso dissominado...] verdade que, falando anteriormente com o Rei, eu tinha con- fessado a minha incepacidade em identificar a natureza do mal que o afige. Mas, neste momento, para que tomeis conhecimento por escrito, envio-Vos esta carta sclada. B, sendo da vontade de Vossa Majestade, poderst-d recorrer (para confirmagio] & Arispoe, O Rel deveré, portanto, utilizar a segunte logo: depois a sua utilizagdo, afebre que Vos aflige desaparceers. 44 havia preparado duas ou trés vezes este remédio, & bese de éleo: o Rei reconbect-lo-, sem divide. Se assim o desejardes, poderd s6 ser aplicedo no dia seguinte, Deverd fazer desaparecer o mal. Por outro \ \ i 1 | : | [AMAGIA A MEDICINA RENAN NA BABILENIA 8 Jado, quando a dite losfo fou siltbdnu (raz sea de repo} for entregue a0 Rei, a aplicaglo poder ser feita porta fechada [. O Rei doverdentio trauspira, ‘motivo pelo qual, muma embalagem a parte, envio juntemente 08 seguintes porte-amuletos: o Rei guar- concebidos a sua imagem colocada no superlative: infnitamente mais fortes, mais argutos © dotados de uma vida sem fim, © que, querendo proporcionar-se, na indoléncia © na despreccupagdo, abundincts extrema de todos os bens ‘itis © agradiveis, baviam fabricado homens para os servirem enquanto trabalbadores, produtores © servos, cuja vide controlavam inteiramente, Teria sido insen~ sato responsabilizar estes deuset-cpatrdes» pelos males com que afligiam os seus servidores, limitando 0 sett ‘elo ¢ as suas capacidades de rendimento, Pare explicar 0 «mal de sofimento», forjare-se uma coutra série de personalidades inferiores, & certo, 20s cxiadores ¢ soberanos do universo, mas superiores és suas vitimas, ¢ que poderiam livremente provocar as Jimemorins, imperativos de hibits, preserig8s impl- cts de dreito ou exits das autoriades, se toma- ‘yam ito fecto uma ofens no impéco dos deuses, uma falta contra eles, um epecadon e, como na tesa 08 soberanos corigea fudo 0 que pBe em rico a sta autordads, aconteia aos deusesrepimirem, com os devs castigos, fais desmandas. Estes castigo exam SSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSESCEEELS e e e o e 2 > » ‘As DONS TEM HISTORIA 0s males ¢ as infelicidades da eniatici, que os dem6- nios» jé nfo inflgiam mais, como na visio «mégica» das cites, sua fantasia, mas agora sob ordens dos ‘deuses, dos quais se haviam tornado executores n0 dominio de sangéo. Deste modo, «al de softimen- ‘top, em geral, © doenga, em particular, integrados no sistem religioso do Universo, eles haviam neles encontrado a sua explicagio, 2 sua razio iitima de ‘Btambém o sev antidote. Porque a tsaisn contra os Gorgas malignesy fora mantid, materialments mute vel, da primeira magi: sempre feta das mesmas pals- vras e dos mesmos gestos ~ situs orais e situais rmamusis~ no passado devendo agi de imodiato sobre 3 «deméaios» hosts, mas agora incorporados no alto sagrado, do qual consti a part, digamoe, sesacramental Através de oeriménias,atingindo, por vez, as dimensbesdeliturgias soles, das quais noe ficaram quantdades surpreendentes de rtuis,pedia-ae aos soberanes do muado que encomendassem 205 scdoménios ¢ is forgas mulésicas que nfo se eprox- massem dos suplicantes, ou que partiem com oF tales com os quais 0s haviam aflgid. A isto cha- smacse propriamente 0 eexorcismon. Assim, havin outros meios para Tutar contra’ at doengas: una outra medicina, nfo mais especiis, ‘mas por assin dizer «univers, porque o seu objets era aexpulso do anal de softimentoy, como tal. No ‘ra mais fundada sobre o empiismo, mas sobre um. verdadeito sistema de pensamento, mitolégico 6, em i | | / |AMAOIA © A MEDICINA RBINAS( A BABILONIA a sums, «teolégicon, de dependéncia dos deuses e de srocurgo ao sou poder. O especialst jé nfo era o as, {uas outra personagem, um «clérigoy: o exorcist. Em acadiano chamava-se dshipu, algo como 0 «esconjt- rador» (dos males), ou o «purifcador (das méculas responsdveis pelo aparecimento dos ditos males). A cdimiows subiu do Inferno Se se quer oficiar 0 exorcsta, ¢ compreender, de imediato, a que ponto o seu comportamento diante 4 doenga diferia do al~médico ~ aqui ficam, extra as de astentos ad hoc, as instrugdes que The eram ddadas com vista ao procedimento ritual para a expul- slo de uma adoenga» cujo nome (dimfu) ja nada nos diz © gue, eliés, na nosologia brumosa e imprecisa ‘daquele tempo, pode mais representar toda uma fami 1a de afeogdes do que um mal espeifco. 1, Apresentaglo da doonge e chaimada de atenpio para as suas origens: «A dimtu subin do Inferno [Je (08 ademénios» que a traziam, caindo sobre o paciente abendonado pelo seu deu-protector, que ele ofendera, ‘com ela 0 envolveram como se fosse um casacol» 2. Descrigo do estado miserdvel em que se encontra ‘ doente, a fim de apiedar os deuses: «O seu compo est ‘to infeciado, ele tem os bragos eas permas paraisados 2 AS DOENGAS TEN STORIA La}, © seu peito esgota-se com a tosse, a sua boca snche-se de baba e c-lo munido, deprimido e prostra. dob, 3. A origem sobrenatural do remédio, sublinhade simultaneamente para garantir a eficicia e para suge. rir que, na sua aplicaslo, o'ofiiante apenas agind er ‘ome dos grandes mestresdivinos do exorcismo - a ¢ Marduk: «Marduk, quando o viu neste estado, fo tor ‘com o pai, Ha, para The descrever o estado do doente, ¢ disselbe: ‘Ignoro o que fez eate honiem para ser afi sido deste modo, e nfo sei como curé-la!" E Ba tes, Pondeu ao filho: “Tu sabes tudo! Que poderia ‘ev fnsinar-te, a ti que sabes tanto como eu» 4. © tratamento, sob forma de instrupées de Ba Marduk, de quem o exorista faz aqui o papel: «Aqui tens o que deverd ser feito para o curar: tomards sete pies de farinha grosscira [7 ¢até-los-s com um fio de ‘bronze. Depois estrogaris este homem com cles ¢ obrigé-los-ds a escarrar sobre as migalhas que cal. rem, pronunciando uma fSrmula [«fStmula do Eri. x» (sconjuro, ou oraglo especial, tia como muito ficaz), tudo} depois de o teres conduzido até @ estepe, ‘Tugar isolado junto a uma aokoiaselvagem. Confiaréa enti o mal que o atacou [sob as espécies da massa Ge ‘plo com o qual serd eaftegado e das migalhas caidas Gurante a Sogo) a Ninedinna [a deusa padrocia da steps] para que Nin-kilim, © deus padrociro dos foc, dores selvagens [que povosm a mesma estepe] faya AMAGIA BA MEDICINA REINA NA BABILONTA Pa passer para eles a doenge [dando-lhes a comer os restos comestveis em questo)» 5, Rito oral, em forma de invocagio terminel: «Que 1 divina curandeira Gule, eapaz de dat a vida aos mech, bbundos, o restabelega, a0 tocélo com as méos! Eta, ‘Marduk piedoso, para que fique totalmente live de erigo, promuncia a fSmaula que o Hbertaré do seu mally ‘Nio se trata, portanto, do uma iniciativa deixada a cargo do operador, como era o caso com 6 médico de Aseraddon, mes de umn ritual previamente fixado ¢ ‘avarlvel, no qual o exorista apenas.tem que exoct tar 0 cerimonial auto-eficaz. De resto, o dshine apaga $0 completamente diante dos deuses que representar ‘como se vé, no destino final (5), os verdadeiros curen deitos so cles! © mal & aqui considerado como uma, ‘alidade material, trazido de fora («0 Enfernon) pelos ‘tdeménios» e colocado no corpo do doeate,o qual se ‘encoatrava exposto, sem defess, a semelhante perigo ‘elo seu deus, « quem ofendere e que 0 abendonave ‘asim aos executores da sua vingance (1) Para afastar a doenga intruse,o trataimento (4-¢ 5), ‘ua reeita 6 stribuida a0 mestre supremo do exorcis. ‘mo, Ba, inventor de todas as téenicas, deve ser aplca. do, na pessoa do exorcist, pelo filho de Ba, o grande ‘Marduk (3), bascia-se na deb» do contacto ¢ da ‘tansferénca: pequenos ples (cobre os quais se lanja- ‘o infalivelmente os roodores da estepe), em niimero SSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSESESCESE » AS DOBNGAS TR HISTORIA ssagradon de sete ¢ reunidos numa massa, slo estro- _zndos sobre o corpo do paciente para «tomarem» 0 seu smal através deste contacto intimo, Em conformidade com una outra ce, jgualmente fundamental no exor- cismo, e segundo a qual a repetigio das palavras e dos ‘actos aumenta a sua eficiia, 0 doente, escarrandon sobre as migalhes caidas durante a operagio e reoo- thidas com cuidado, transmitebes de igual modo a doenga de que softe. A operagfo decorre fora do fespago socializado, em plena estepe, part que © mal seja seguramenie afustado, nifo apenas do paciente, ‘mas dos outros homens, © desenrola-se perto de um arbusto que nfo cresoe no desertoe ao qual se ateibula = ignoramos porqué — uma virtude epurificadoray. Ai se abandona o pllo ~ a partir de agora portador do ‘maleficio- que os animaisselvagens, ao vizem devors slo, arzastados pelas divindades locas, farto deste mo- do passar sua prépriasubstincla, levendo com eles & doenga «roubede» ao pacients. Este o caminho a seguir pelos deuses que, invocados no final (5), devem cura) 0 doeate, ‘Ficam-nos assim ume prodigioss gliantidade de eexorcismos» contra todos of males e desgragas que ‘podiam econtecer aos homens, na sua situago, no seu ‘ora, esptito ou corpo. Apenas tém a ver com & teraptutica exorcise estas duas categoras, mes somen- te 0 seu objecto imediato os distingue dos outros. ‘Todos estes procedimentos so construidos sobre 0 ‘mesmo esquema essencial ~nele apenas varim, adap- tados toties quotes ao sou fim especial e as suas ci |AMAGIAE A MEDICINA REINAM NA BABILONIA s cunsténcias, 08 ritos manuais © 0 conteido das ‘eoragbes conjuntas, o recurso a «leisy diferentes, fusim como as droges utiizadss. Estas (ltimas fo, como em medicina, retiradas das diversas ordens da. ‘patreza, mas rauito menos diversficadas, atendendo fo reduzido mimero dos seus poderes «uiliziveis» (purficaglo, expulslo ¢ evacuagfo...). Contrariamen- te a0s «remédios» medicinss,s6 tinbam com os males dqoe devia afastar ura relapo cmistica» ¢ imagini- ria tal como 2 acfola selvagem acima citadal Porque ‘nfo era tidas como especifcas, destinadas a Intar, pela sua propria vrtude, contra as doengas, mas ape- ‘nas como supories e reforgos de oragGes drigiias aos sdeuses para os deciir a air 'Na medicina exorosta, apenas os deuses agiam: 0 ‘xorcista limitave-se a implorar, aplicando um ritual tradicional e considerado capaz de influenciar os deu- ses de modo mais seguro. Articalado em fiogBes, mitos eforgas»incontroliveis era uma terapéutica propria sente isracionsl. Na medicina empfrice, 0 operedor cera o médico-ail em pesto, que examinave 0 doente ‘decidia hie etme sobre o tratamento a apicar, que 0 proprio preparava escolhendo escolhendo os prepara dos e 08 «simples» pela sua vrtude natural, equal contribuia para refrear ou parar a aoso ow 0 progres ‘0 do mal, Cautas ¢ efeitos encontravam-se portanto ‘proporcionados e eram da mesma ordem: ere uma terapéuticn racional. ‘As origens dos dois métodos perdem-se nas trevas da prG-histéria. Mas, irredutiveis um ¢ outro pela sua 2 ASDOENCAS TEM HISTORIA onsttusio ¢ peo seu expirito, seria insensato querer a todo 0 custo que o primeira tivesse snido do segundo, ‘ow vice-versa, © que ele representasse um progresse (ou uma tegresslo, De facto, eles sobreviveram, para Jelamente, durante toda a longa historia do pais: do iniio ao fim, vé-e exorcstas © médicos esforgarem-se Jado @ lado, © muitas vezes & cabecsira dos mesmos pacientes. ‘Tomemos 0 sofredor Asaraddon por exemplo: vimo- lo confiae-se ao seu médico Urad-Nand, mas ao mes mo tempo recorria aos exorcistas. De uum deles, aceder 20 pedido, Do lado dos pacientes, nem a coexis- tdacia, nem os insuoessos das dus tecapéutices, eram ‘ecandalosos: elas complementavam-se ¢ encontravam- se sempre excelentes razBes para explicar as suas der- rotas. Este © motivo pelo qual medicina empirica e ‘exorciamo puderam, sem revolugfo nem progresso apreciével, permanecer tanto tempo quanto durou a civilzago do pais. tas duas terapéuticas até quase se contamsinarsm com 0 tempo, a tal ponto que podemos encontrar tanto aspectos irracionais proprios do exorcismo na -modicina como aspectos racionais préprios do mésico xa pritica dos dshipu. Por exemplo, quando Urad-Nand, médico, para reforgar as virtudes sudorficas da sua loglo, ou talvez ppara atonuar os seus efeitos mais violents, envia a0 sou rel cliente Aseraddon eporta-amuletos para trazet ‘20 pescogon, ele comporta-se um pouco como um dos rnossos clinicos que, tko devoto como o doente, 0 aconselharia a usar uma medalha milagrosa. Estes ‘porta-amuletos, que se chamavam meld, tinham a ver ‘exciusivamente com o8 exorcistas, que os faziem com ‘poles ritualmente tratadas, colocando dentro, reforga- dos por coragées» e devotos preparados,talismis tidos ‘como capazes de afastar as eforgas maléficasy ‘Costas doengas eram coerentsmente definidas, nfo por termos especficos (dimit, d'u..) ou por descri- ‘960s, como «chaga com supuragion, mas com recurso ‘a0 nome de divindades, de deménios ou de outros [AMAGIAEA MEDICINA REINAB NA BABILONIA, » agentes sobrenaturais malficos que as haviam desen- tadeado. Diaia-te: «intervengio», ou «possuido pelo ‘deus Shamash», «pelo deus Sin, epela deuse Ishtar», (qor un deménio-rdbinw, ou «por um fentasma». O3 cerorcisas, na origem de tis fcpées expliativas sobre estado do pactente, deviam tomé-as a letra, © ema Gavida tinhar-nas em consideraso para escolher 0 tratamento sobcenatural a aplicar. Os médicos toma- ramelhes aqui e ali estas denominagdes ~ como & notério em intervengo de fantasma», supracitads - ‘mas 6 possivel que no seu esptito elas tenham sido fapenas designaptes de estados doentios ou de sindro- ‘es mais ou menos bem definidas,eloquentes aos seus folkos, mesmo que no nos digam nada a nds. Por fexemplo, a cintervengéo de fantasma» parece ter deti- ido de uma maneira geral um estado patoldgico interessante, aquilo @ que chemaxiamos «nervos» ou ‘psiquismon, mais que o préprio organismo. ‘Um aspecto digno de referéncia & o contigio. Numa carta escrita por volta de 1780 antes da nosss era, 0 rei de Mari, Zimri-Lim, em viagem, aconselha deste modo f espost que ficara em casa; «oube que Nannamé, fembora atingida por uma docnga purulenta da pele [tradupo literal: «chaga purulents»] se passeia pelo ‘palécio © convive com virias mulheres, Probe scja (quem for dese sentarna sua cadeira ou dese deitar na sua cama. Ela nflo deve conviver com todas essas mulheres: porque a doenga € contagiosa {tradusio literal: «pege-se»]> E muma segunda carta ~ apenas ‘nog resta uma parte — 0 re, falando aparentemente 2 AS DOENGAS TEM HISTORIA da mesma desafortunada, acrescente que, «arriscando- -se mmuitas mulheres, por sua cause, acontraira docnga ‘parulenta em questo, énecesséro isolé-a, numa sala A parte... Estes documentos, sem diivida os mais antigos tes- temunhos médicos respsitantes ao contigio, mostram- nos que, aos olhos dos médicos ~ como o sugerem texto © contexto -, uma doenga podia, «por contacto», ‘mesmo indirecto, com o portador, passar do sujeto jd atingido a um outro, Num pats frequentemente asto- lado, desde a noite dos tempos ~ sabemo-lo -, por mortferas epidemias, para trar estas conclusdes nfo cera necessirio um génio sobre-humane, Acontece, contado, que as mesmas considerapbes reaparecem ‘em contextos indubitavelmente exoristas. Por exem- plo, um grande livro de conselhos relativos a saide, chamado Combusido (Shurpu), contém uma longa passagem onde sp analisa como & que a adesgraga pode ter chegado até junto do paciente, pegando-se- sIhe, causando o descalabro no seu espiito, no seu coragéo ou na sua situario, Talver, diz texto, entre coutras conjecturas, a sun infortunada vitima a tiveste adquitido por contacto mediato cam algaém jé sob os cfetos do agente maléfico, quer seja por se ter detado ‘a sua cama, ou se ter sentado na sua cadeira, ou tor comido do seu prato, ou bebido no seu copo». portanto 0 «contigio», fenémeno inical e essencal- ‘mente empirico, explorado pelo exorcismo. Também sobre este assunto ainda, Louve uma contaminaso ito antiga entre este e a medicine. |AMAGIA BA MEDICINA REINAM NA BABILONCA a ‘Citimo reflex, nfo menos significativo, desta inter- Tigasio das duas terapéuticas: entre as obras relativas as doongas, a mais notivel — uma verdadeira obra- -prima, ge 26 atender ao que foi composto, vai para caren de 35 séoulos foi intitulads pelo editor Tratado ‘de Diagnésticos ede Prognésticos Médions, Distibuido ‘ex 40 tibuas, devia ter na integra ceroa de 5000 01 {600 finhas de texto: possuimos mais ou menos meta- de, Construido na mesma base dos manuais de «adv _hagio dedutivay, 0 seu objectivo era reunir todos 08 ‘inaisye «sintomas» dosatios observados, para trar cconclusdes relatvas & natureze do mal que cles denun- ciavam ed sua evolugdo, Voltaremos a falar das buas.. ‘en Datibua ma xV~a2IV perden-se~ estes sintomas «ram classficados com cuidado numa ordem que passa ‘yaem revista da cabeca aos pls, todas as partes do compo c tinba sucessivamente em canta, a propésito de cada uma, todas as suas caracterfsticas médicas mais signifcativas: cor, volume, aspecto, temperatura, sen- sibilidade, presenga de dados acidentai,atitudes gerais do doente em concomitincia com os sintomes, ete ‘Séeulo xvan aC. Assim, @ propésito do nariz: «Se 0 nariz do doeate correr sangue...; «Se a ponta da narizestéhimida..»; «Ge a ponta do nariz esti alternadamente quente © fria.; «Se a ponta do nariz tem uma erupgio bran- ca..»; «Se ponta do nariz tem uma erupefo vermelba ¢ branca..; «Se a ponta do nariz tem uma erupgo SSCSSSSSSSSSSSSSSCSSSSSCSSSSSS See eeeese 2 AS DOENGAS TBM HISTORIA negra... € assim por diante, A thbua IX, por exemplo, estudando o rosto, mencionava do mesmo modo 79 observagGesl Cada uma era seguida do diagnéstico: ‘avordvelo (tradupfo a letra: «Viveré»), ou «Fatal» (eMorreré»), on ainda: «Estard doente x dias antes de aelhorars, ou «..de morrer. As tébuas XVI a 200V1, com o mesmo modelo, reuniam, nfo os «sintomes» tomados isoladamente, mas os dados semiol6gicos concomitantes de diversas doengas no seu desencadea- ‘mento ¢evolugdo. Nada possuimos das tibuas XV & XXXIV; quanto ds éltimas, XXXV 2 3CL, coupavam-se da gravidec e da pstologia das mulheres grividas e dos reclm-nascidos, © que impresonsokitor nesta obra. dominunte emplrca:§evidentemente baseeda em centenas de nervagtes, de easoe, ua decrigio das quis Se tone spar os axpectes nena para apena eer ‘© que era medicamente significativo. Tal curiosidade, acrescida de uma téo grande preocupagao de discerni- Siento, do allie, de conclnoe gris de aprox Tuapto de das nosalighos,renanitpromvelnsais {im teape mus vento o pis. Uncut Bers io de adivinhagao de cerea do stoulo xvii antes da owt era apresenta-ns, asi, win diagntico 0 traumatnmo ernino com per de conttci or tiulado a partir de uma observagfo de etrabiano bitrate o lternado tem on ola adoe tartan, se ou cro softer uma pancade oe asia rz ao ‘teontra no mesmo endo que o seu cai» (Por ailaahchessetsrnecsanerteatiassisinctnc mi si pest nda AMAGIA EA MEDICINA RBINAM NA BABILONIA 2 coutas plavras: «Tem o eapiritopeturbado, desregu- fad), Sto andlies ¢ reflexes deste género que fommeceram so nosso tratado o maior mimero de cbservages médias, Por extmplo: «Se da cebega aos pis o doente est coberto de borbulas vermethes ¢ a ua pete se ensontra livia: ele & portador de dornea endrey; «Se o sca eaindo ae ‘ora subtamente 10 ave que ele deiza de reconheser os seus famiares: prognbntic fatal» «Se tem o roto parado e o corpo birt: 60 efeto de um ataque de paras: prognéstico fatal» Sto descritos 0 aparecimento de um staque de ppaludismo (que parece ser atribuido — ou assimilado — a uma insolagio): «Se desde 0 inicio a doenga se presenta com crises remitenes, durante as qua © dente apresenta ltemadamenteacettos de febre,de- pois clatos e transpragfo, depois do que sents em {odes os membros uma sensasio de calor, tendo depois tum ataque de febre muito forte, que dé lugar @ novo aque de calafos ea novos suores: uma febre-ds fo sentido preciso do termo escape-nos] intermitente, devia a [um goipe de tl, eeetbo neoeasiros sete dias paa se recompor. Bum ataque de eplesia: Se 0 interesado ent a andar, mas ci de repens para a freate,comos lnos ilatados, em quevoltem ao estado somal ese alm dist 6 ncapez de mexer os bragos © as peras:& 0 inicio de uma eis de eplepia.» ‘Um outro dado da mesma omdem médica & a prix déncia e o realismo empirico dos prognésticos. Estas cvualidades restaltam ainda mais se se comparat © ‘resente tratado com outros de um campo visisho: © % AS DOENGAS TER HISTORIA a Adlvinhagdo Dedutiva, fsion6bmico, que fazia previ- sites a partir de diversos aspectos do rosto e do corpo dos consultados. A maior parte das prevsdes fits, bom findadas numa eégica» especial, sfo, a nosios thos, completamente extravagantes, se atendermos 406 sintomas que as motivam, ¢ o futuro encarado & -0 para o espago de dois, ts ou mais anos: «Morrecé, dentro de dois anos... Quanto ao nosso tratado, nunca se aventura no seu prognéstico além do més que se segue a observario — prazo médico plaurivel =e, do forme geral, o que prove esté directa admiss- velmente relacfonado com os sintomas. Seja, por cxemplo, a observago de um «rosto livido». 0 isio- nomista retire dai que «o inteessado morrerd devido ao efeito da igus», ou eno seguimento de perrion; on ‘atfo, sogundo outra interpretagdo, «ter vida longa». Enquanto os médicos do tratado se contentem em anunciar que o doente «morreré dentro de pouco tempo». Diante de um rosto exangue, nfo é mais racional, mis eldgicon,prever um desfalecimento fi- esto, por anemia, por hemorragia interna. ou algo andlogo, do que uma morte causads pela «igus» (formula, aliés, ambigua, sem divide propostadamen- 12), ou pela acgo misteriosa de uma promessaviolada, ainda menos ume vida prolongada. ePorgué cut» ‘Tanto no que respeita a estes dingnbetioos como a ‘estes prognéstices, existe, portanto, no Tratado uma [AMAGIA BA MEDICINA RBINAM A BABILONA s preocupigfo de verosimihanss, de verdade positiva eoosatvel, na sogeécia de un eforgo raconl Signor, métio, a0 sentido proprio do terme, de nlite factual dos dadose de reflexdo sobre 0 que ‘ok se pode descobei mama perspective noslégca. Bums obra do meicina. FE, conmido, entre fodo ete bom-at0, ets isos serous, ext competncia evel, apareem ag e lk trago petitament iraciosis © cirectamente suri- dos do exorsimo, Nio not deitemoe far pelos dng- nbtcon bastante frequenes do tipo winterengao de {al deo, we tl deméaion, ede al forga males txistem ~ como aca afmimos ~ posiidades de ‘ge, embora Miraimentetenbam & ver-com a exito- Topi, tenam sido tomados aqui como formalagSes de sinkromes norolégca, Bm contrapas, extamos ‘em peno istoma teolbgio do mal» quando lemos: (Ge 0 interessado tem doves na bac: uma interven 580 do Shula, porque dormiu com a ina eastarso- “por algum tempo, morrendo. depoitn; «Se as ‘Eemports esti dordese ot ohos toldados:& porque smalise 0 su propio deus, ou o dous da cidade. ‘Mas 6 sobretudo plas suas ds primaiastbuas «ave 0 tratado parece bem merguhado no taiveso nilolgio e izacional do exorcismo, Nests tibuas, © dp, 6 le, & convidado ate cuidado com 08, (intomace casuals que se The deparacam enquanto ele cativesse a caminko para viitr um doeate que 0 chamava: antes mesmo deter examinado 0 docnts, sie poderk deur detssiatomas tento 0 diagnéntco SVSCSSCSCSSESSSSeeuveseeeeeeeeereeereeree # ‘AS DOENGAS TES HISTORIA ‘como o prognéstco da sua doenga: «Se, no caminho, 0 ‘exorcsta v8 um porco corde-rosa: 0 doente a casa de ‘quem vai tem hidropisiay; «Se encontra um porco Preto: prognéatico fatal» A falta de manuscritos suficientes ¢ devidamente localizéveis no tempo, a hist6ria — verosimilmente secular ~ da composigdo de tio complexo tratado em ‘que interveram tantas mios, e para o qual contaram tantos séculos, escapa-nos, Sem divida, ela explicar- -nosia como se conseguin retirar do tibuas tio mani- festamente eoncebidas num espirito exoreista uma obra tio claramente médica. Sejam quais forem as circonstincins que presidiram a esta adiglo, & claro que se quis dar aos utilizadores do tratado uma viso de, duas medicinas de algum modo aliadas. Semelhante associaso, nfo tendo evidentemente rmodificado em nada as caractersticas essenciais de cada parte, em que podia ser itil? Pelo que me toce, vejo nela duas vantagens. Em primeiro lugar, jé temos uma ideia: sobre o plano terapéutico, fundamental, afinal, ela encorajave a aplicego conjunta das duas tonicas, multipicando as hipéteses de'tuoeiso, Era de resto 0 costume, como jé-vimos, que era cancionado, laborandose o tratado deste modo. ‘Mas hi, talvez, um outro ponto a considerar,e mais capital ainda: a modicina empirca, so fornecia remé- io, programas de cuidados a ter, probabildades de ‘cre, além das descrgSes dos traumas ¢ das doengas © até, depois do diagnéstico, eélenlos relatives aos sens _Progressos, apenas dava importincia ds causas imedia- inseam sanicnaenibnlnasecasscbecseg AMAOIA BA MEDICINA REINARCA BABILONT ” ‘as: «Ble sofreu um choquen; «Apanhou este mal por- dquedormiu com uma mulher»; «Ficou muito tempo a0 Soin... Mas a medicina de tipo exorcista ia muito mais Tonge: sistematizada e directamente centrada na medi cin teooentrica, a tinica universalment vil © escla- recedora neste pais © neste tempo, ela associava, portanto, a doeoga, como qualquer «nal de sofrimen- to», alo 6 & sun causa préxima, mas ao que provo- cava o aparecimento desta ltima: a vontade castigadora dos deuses. Desto modo, apenas ela tinha clementos para dar a iitima expicago do mal: apenas cla ora capaz de tranquilizer completamente o esprit. Bu sei que, se estou neste estado, é devido a um choque, & uma companhia duvidost, « um golpe de sol: mas porgué eu? Bis a verdadeira questfo que ‘atormentava — e que atormente ainda ~ os doentes 6.08 infelizes! f verdade que a resposta nfio podia —e ‘continua a nfo poder ~ ter a prior a ver selio com 0 imaginario e o irracional. Mas & preciso crer que 0 hhomem tem verdadeiramente necestidade de tis res- postas, definitivas a seus olhos, mesmo se nfo pode controlé-las ou demonstré-las. ‘Nos nosios dias, por um lado, devido & persstéacia do sentimento religoso e & crenge. num mundo sobre natural, seja ele qual for, ¢ por outro, mum sentido ‘ferent, ao sucesso de métodos curatvos deliberada- ‘mente iracionais, seno tresloucados ¢ inaptos, pode- ‘mos talvez dizer que, no fuado, as coisas no mudaram tanto desde a antiga Bebilénia... [As lig&es de Hipécrates ‘aude Most 0 que me parece melhor num médio é ser habia sprover, Penetrando e expondo antsipadament, nto ot docntes, 0 presente, 0 pasado eo futuro das suas downser,expicando o que els omer, gaaharé «08 onfianga [). Tratark tambien tento-meor as doea- fa quanto melhor souber, fee. stuagfo presents, rover o estado fatro, Dar aside a todos os doentes Eimpossvel embora so fore mor do que prever raccha rocesiva dos sintomas, mas, dado qu® of homens more, uns sucumbind antes de ere cha- ado 0 mético, lerados pela vilEncia do mal, of ‘outros imedistamente depois de 0 terem charaado, tobrevivendo um dn ox povco ais expirendo antes ue 0 mbtico fenba podido conkecer a natirezn de Ainge semetbantes, saber até gue pont ultrapes- sem a forga da constinigio, e a0 mesmo tempo dis- ceric a0 exists algo de diviao nas docogss, porque & ‘esse também um prognéstico a fazer. BEESSESSSSREEESEESS ° ‘As DOENCAS TEM HISTORIA ‘este modo, 0 méico ser justamente admirado e cexerceci habilmente a sua arte; com efito, em relagio Aqueles cuja cura ¢ possivel, ele sed ainda mais capa de os preservar do perigo procavendo-os cada vez ‘melhor contra cada acidentee, prevendo e predizendo quai sfo 0s que devem morrer eos que devem eseapar, flcaré livre de censuran Este terto, extaldo de um dos tratados do corpus hipocrtico, resume bastante bem os trago8 que earac- terizam a escola médica grega ligada a0 nome de “Hipdorates (6 460 a, C377 a, C): uma eacola que, sfastando-se das prticas mAgicas dos adivinhos, como das recetas empiricas dos curandeiros, queria elaborar ‘uma medicina racional, a partir de um duplo procedi- ‘mento: procurar as causes das doengas com a ajuda de snitiplas observagdes © depois aplicar os remédios apropriados. Um tal procedimento inscrevese em to- dda uma corrente de pensamento que se desenvolve na Grécia, ¢ singularmente na Grécia da Asie, a partis do sfoulo Vi a. C. Desvendar as causas dos fenémenos, ‘compreender © funcionamento do mundo e, a partir ei, prever « sua evolugdo era a preopdpagto comum estes sébios ¢ destes flésofos que, como diz Plato acerca de um dos mis flebres dente eles, Anaxiigoras de Mileto, pretendie «que o Sol é uma pedra e a Lua ‘uma terra», recusando-se a consideri-los como auto- ridades divinas. ‘No plano médico, eata vontade de aplicar a razfo & doenga e aos meios de a curar, de renunciar ds priticas sdgicas para compreender como © porqué as leis que senatistsvaupicisienaieisinsainstiaaaseieiitsesanstinsontt sancitatnteniitnin as 19068 DE MIPGCRATES “ ogee 0 equilibrio do corpo scabam por ser transgre- (das « partir de observagSes repetidas, esti na origeri (éa-medicina moderna. Na verdade, assim o veremos, ‘0s tnédicos da escola hipocritca estavam longe de ‘ompreender todos ot mecanismos das docngas que obsorvam. Mas, voliando resolulamente as costas a0 fobrenatural, tratando o mal como um desregramento, jam contribuir para fazer da medicina, seafo uma cdéncia, pelo menos uma prtica racional, ‘De Hipéerates, o representante mais eminente desta escola de medicina, nfo se sabe grande coisa, a nfo ser fque nasoen em Cs, em 460 a. C. O pai, Heracles, ‘perienca & corporagio dos asclepiades, esses sacerdo {es ligados ao culto do deus Astépio, cujos santuirios ‘mais importantes te encontrevam em Cés ¢ em Caide ‘na Grécia da Europa, em Bpidauro. Asclépio ere um deus-médico, iam consulti-lo aos seus santuérios na tsperanga de encontrar a cura. Pode supor-se que 08 sacerdotes de Asclépio tinham reunido uma quantida- de de informagées sobre as diversas doengas dos segui- dores do deus, informagSes que inspiravam ‘espeoulags ds quais se deram os médicos de Cés © de Cuide. ‘Mias parece que Hipécrates, nisto homem do sou ‘tempo, quis romper oom préticasfrequentemente pré- ‘ximas da magia, para elaborar contra «a antiga medi- tina» regras aovas nascidas do racionalismo que caracterizava entio 0 pensamento e a ciéocia gregos. ‘Nii nos admiramos por, como os «sofistas» que per- corriam 0 mundo grego Para exporem as suas teoriss, a AS DOENCAS TEM IMSTORIA ‘encontrar em Atenas ~entifo no auge da sua glérie, sob a égide de mas também em Tasos, na Tesslia até, tlvez, no Egipto, Na verdade, nfo se sabe quais, dentre os sessentatratados reunidos sob 0 ‘nome de Hipécrates, so realmente dele. ‘A maior parte foi redigida ontre 430 © 330 a. C., aproximadamente, os primeiros por ele préprio de cxtteza, 08 outros por discfpalos, entre as quais o seu sobrinho Polibio. Outros foram reunidos & coleopfo na poca haelenistica (sSoulos mI a T a. C). Entre estes tratados foi possvel detectar contradig6os, mas 0 con- Junto constitui um todo revelador do que era a medi inn grega. Prognosis, diagnoste» ‘Um dositratados do corpus intitulado Do Médico, © {que data provavelmente do século 1¥, dé coneelhos destinados ao médico para que se afinme junto do seu cliente: «O médico deve ter autoridade, Ele terh boa cor e boa disposicdo de acordo cont a gua nature- za, Porque a multidfo eré que aqueles qué nfo estfo ‘bem nfo sabem cuidar convenienteménte dos outros. All disto, seri: muito impo consigo pr6prio: aspecto ecente, perfumes agradéveis, com adores discretos J. Quanto a0 aspecto moral, seri’ moderado, nfo apenas reservado no que diz, mas também peri. ‘mente ordenado na sua vida, © que 6 muito bom para 4 reputagio. Os sous hibitos serio honrados e iere- intl ‘ss ugbes Du mmrOcRATES “ preensiveis ¢, deste modo, ele seri grave, humano, Justo: porque o entusiasmo precipitado provoca des” ‘prozo, embora pudesse ser muito ttl» ‘Supés-se que tas recomendagdes se expicam devido ‘aus espécie de desclasificaglo do mdico no final da éo00a ctissica © que um teérico da medicina, como ‘Hipéorates, estava acima destas precaugSes. Conta do, encontravavse este mesmo deseo de respsitabilida- de nos mais antigos tratados do corpus. Sobre os hhonotirios destes médicos privados, sabemos pouco. ‘Uni tratado da época helenisticainssto na necessidade do tex em conta, para a fixaglo do seliio, a condigo social do doente ¢ a associapo do amor 20 oficio (philotecinié) e 20 amor aos homens (philanthropic) também esta «flantropian que deve guiar 0 médico nas suas relages com um doeate condenado: «No deixar de modo algum peroeber 0 que aconteceré xem 0 que 0 ameaga, porque mais de um doente ficou ‘em muito mau estado por isso Portanto, & partida, quando 0 médico é chamado para uma consulta éthe necessirio estabelecer uma verdadeira colaboragio com o doente para poder fa zr o sen diagnéstico. No tratado Sobre o Regime nas ‘Doengas Agudas, que talvez sea do proprio Hipécra- tes, 0 autor insste na matéria sobre a qual © médico deve examinar ¢ interrogar 0 doeate: «Os doeates spresentamte de virias formes, Em consequéncia, 0 ‘médico nilo deixaré de vigiar nem entre as causes, 25 que sfo manifests eas que t£m um motivo, nem eatre 0s sintomas, os que devem apareosr segundo o mime- anisidine 0a. 0 oe aiebiinisietnnithctas acini PEELSSSEEESEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEE “ ‘AS DOENGAS TEN HISTORDA +0, par ou impar, slo sobretudo os dies impares que so decisivos mum sentido ou noutro. B preciso atentar no primeiro dia om que o doeats se sentia mal e procurar onde © porqué o mal teve origem, porque & esse 0 primeiro ponto a esclarecers. Avala-se neste texto importincia dade aos dias e 20s nimeros: para tec «cacionaly, a medicina hipocritica nem por isso ppermanece menos ligada a certas especulagdes aritmé- tieas, que talvez evelem ume influbncia pitagérica. “Acabada a prognasis, o médico devia ento passar & dlagnosts,o diagnéstico, Para tanto, eledispanha dedes- crigfes das doenges recolhidas em certos tratados do corpus, assim, o tratado Das Epidemias & particalar- sente importante: apresenta-se como um minucioso catdlogo de casos, observades por Hipdcrate, gragas ‘uma presenra constante do médico ou dos seus auxi- Tiare junto do doeate. Esta preocupagao de reunir 0 ‘maior nimero possvel de observagées atesta também ‘0 emodernismo da escola hipocrtica: cada doente, de facto, & um caso especial © como tal deve ser trata «56 @atitude do médico consste em dsscobrir as sgeruis da evolusio das doengas,é-the também necessi- 1o ter ema conta 08 seus aspects especiicos. A ditétca Mas nfo era suficiente seguir dia a dia 0 desenrolar da doenga. Bra preciso também tentar erradicar o mal. (Ora, para compreender 0 que era a terapéutica da ‘As ig0es De MIPGTES 6 escola hipocrtice, é necessrio recordar os seus fun- damentos. ‘Estes decorsiam da natureza do corpo humano. Um tratado, inttulandose precisamente Da Natureza do -Homem, resume o esseial sobre 0 assuato: «O corpo fmomano contém sangue [pilegna, em grego), isto & ‘humor visooso, bills amarela ¢ bis negra. Sfo estes cementos que 0 constitaom o sfo causa dos males ou 4a saide, A saide & em primeito Tugar, 0 estado em ‘qu estas substfincasconsttuntesestio numa propor- fo correcta de uma em reas outa, tanto em forgs como em quantidade, estando bem misturadas. A docnga aparece quando uma destas substincias & ou Aeficitéris, ou excedentira, ou se encontra seperada ‘no corpo ¢ nfo misturada com as outrasy, A doenga 6 portanto, um desequiibrio e nfo um dos méritos smenores da escola de Cs 0 tor descoberto esta. no- fo, que permanece ainda essencal na medicine de hoje. A scpio do méico consiste, portato, por um Ido, em indicar aos que gozam de saide 0 meio de _manter esse equilbrio dos «tumores» do corpo ¢, por atro, em tentarretabeleoé-lo quando ele deseparece. Sabese a importincia que tem o estudo das dictas lintentares na medina acta, ¢ evoce-s frequente- ‘mzats a este propbsito 0 texto de Hipdcrates. Nio se deve, contudo, imaginar 0 médico de Cés como © antepassado do dictsta modemo. Porque a racionali- dade do seu pensamento era linitada por uma concep- so do corpo humano baseada em grupos de oposgo como © ert € © cozido, 0 calor ¢ 0 fio, 0 9620 6 ©

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