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A colheita

Igor Sales

O homem parou a carroça às margens do rio, um ipê salpicava as águas de rosa


[Você escreve de modo muito linear. Os verbos mais “literários” ficam bregas
assim — comento isso no terceiro parágrafo —, a estrutura verbal é muito
monótona. “O homem... Um ipê...”. Melhor seria: Parou a carroça às margens
do rio, onde um ipê salpicava as água de rosa. Cadência, Igor, solte o punho e
conecte as orações...]. Tirou a pá e a enxada, dobrou as mangas e cavou à sombra
da árvore. Os campos estavam desertos e o vento forte, a cova era rasa; deitou o
corpo envolto num pano e cobriu o buraco. J Madeiro [terrível, o nome. Usar
abreviação é coisa de americano, e Madeiro é uma rede de restaurantes] sentia
vontade de chorar, mas não chorou. Fincou uma cruz, não lembrava a data de
nascimento tão pouco sabia que dia era aquele, escreveu torto: Dilia. [O
problema dos tempos verbais é justamente essa monotonia causada pela sua
disposição. A maioria das frases começa de modo igual, linear: “O homem
parou... Tirou... Dobrou... Cavou... Deitou... Fincou...]
[Este deve ser o primeiro parágrafo] Dilia. Tinha tempo que não falava o nome
da mulher, viviam juntos há uns trinta anos. No caminho de casa tentou lembrar
do sorriso dela, da cor dos olhos, do cheiro. Nada, só Dilia. O filho puxou aos
olhos dela, mas tinha tempo que mandara ele embora [fazia muito tempo que o
havia mandado embora]. Não lembrava bem [nem] da mulher nem do filho. M
alguma coisa [desnecessário]. Ainda era pequeno quando seguiu viagem.
Vendeu a terra que J Madeiro tinha lhe dado para plantar, vou para capital meu
pai; recordava das palavras, mas não do rosto.

Chegou em casa desatrelou o cavalo e foi trabalhar. Rasgou a terra de canto a


canto, trabalho, o sol nascia e morria naquelas terras. [Êeeeeee, melodrama...
Precisa de tanto exagero pra dizer que o sujeito arou a terra? Uma só metáfora
basta] Limpou o mato, juntando em montes que o vento carregava; diminuiu o
pasto do cavalo para plantar mais feijão e milho. [As imagens continuam
quebradas, sem uma conexão muito fluida entre as frases, você usa demais as
mesmas estruturas verbais. Tente variar. Ex: Ao chegar em casa, desatrelou o
cavalo e foi à lavoura. Limpou o mato, rasgando a terra com a enxada; o vento
carregava as ervas daninhas empilhadas. No pasto dos cavalos, reservou um
pedaço para plantar mais feijão e milho.]

Tempos depois, J Madeiro carregava o caminhão, eixo cerrado [serrado, com A,


é de serra. Mesmo assim, prefira baixo] com o peso, fez a entrega dos
compradores, terminou o dia contando dinheiro. Lucrou bem, tinha
economizado mais do que nos anos passados. Pensou, pensou, e não soube dizer
onde gastou nos anos anteriores. O quarto só tinha a cama, grande demais pra
ele, e um armário que, descobriu, que fora dinheiro mal gasto, ocupava menos
da metade; as paredes da casa nuas, quarto, corredor e sala, que havia [já tinha, não]
sido desfeita, restando apenas uma mesa e um banco; na cozinha o fogão a lenha.
Decidiu vender o que sobrava em espaço, com o dinheiro compraria móveis mais
justos e economizaria.

No canto da sala havia uma caixa já coberta de poeira. J Madeiro esquecera, já


estava lá quando chegou, no dia em que ela partiu. Dilia. Não sabia quanto tempo
ficara só, num silêncio tão prolongado que não reconheceu a própria voz [Bingo.
Ficou bonito, bastou não exagerar] quando chamou por ela. [Gostei dos últimos
dois parágrafos, com todas as ressalvas]

Pegou a caixa no colo, um envelope caiu no chão. Abriu a carta. [Já é implícito
que leu, além do mais, o “e leu” tira a dramaticidade do ato. Preferir a elipse.]
Era noite e J Madeiro ainda chorava abraçado à farda do filho. As medalhas
brilhando na casaca. O vento trouxe o cheiro do mato e ele lembrou, Dilia tinha
o cheiro do campo e sorria, tinha os olhos castanhos iguais aos do filho Moisés.
[FUI ELOGIAR PRA QUÊ? Que breguice, homem. Muito exagero. O final ficou
muito solto, não gosto da hipótese se suicídio, que teria sido óbvio, e foi a
primeira opção. Mas é preciso amarrar bem o desfecho. Para o que você fez, a
solução mais simples seria parar de dizer que o homem chora. Era noite,
Madeiro entrou no quarto do filho —seria preciso mencionar um —, abriu o
velho guarda-roupa. Retirou a farda do filho e tomou-a nos braços, as medalhas
soavam na casaca. Ele se lembrava, sim, Dilia, ele cheirava a alfazema, aquela
que você colocava nas roupas após engomá-las. E lembrou-se da esposa,
passando ferro, e do menino. Olhos castanhos, os olhos da mãe. Não é o ideal, é
apenas um exemplo. Seria preciso achar um final, nem que seja, feito
Tchekhov, matando o velho de alguma doença. É melhor que o suicídio.]

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