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Revista de Economia Polltica, Vol. 5, n? 4, outubro-decembro/ 1985 Agroindistria, politicas pablicas e estruturas sociais rurais: andlises recentes sobre a agricultura brasileira* D. E. GOODMAN, B. SORJ e J. WILKINSON** A profunda transformag&o ocorrida nas estruturas sociais rurais no Brasil nas ultimas duas décadas induziu igual- mente mudancas significativas no debate sobre a questo agra- tia, Podemos distinguir basicamente trés formulag6es a res- peito das estruturas agrarias e de sua integrac4o com o capita- lismo industrial. SAo estas 0 modelo articulador, o processo de proletarizagao interno classico da ‘‘via prussiana”’ e formula- des que postulam a subordinagdo da produgdo familiar ao “complexo” agroindustrial. Nenhuma destas perspectivas desapareceu inteiramente, apesar da rapida mudanga no campo de debates sobre a ‘“‘tendéncia dominante”’ na divisdo social do trabalho na agricultura brasileira. UMA REVISAO DOS DEBATES SOBRE A QUESTAO AGRARIA BRASILEIRA A nossa reviso concentra-se nas formulagdes recentes que consideram as politicas de modernizacdo subsidiadas pelo * Este trabalho apresenta em forma limitada e aplicada ao caso brasileiro o marco analitico desenvolvi- do pelos autores em From Farming to Biotechnologies, Oxford, Blackwell, no prelo. Traduzido por Irene Portela. ** D. E, Goodman — da University College, Londres; B. Sorj — da Pontificia Universidade Catdlica do Rio de Janeiro, PUC-RJ; ¢ J. Wilkinson — da Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ. 31 Estado e o crescimento da agroindustria como determinantes basicos de mudanca nas estruturas sociais agrarias nos anos 70. Essas politicas, segundo esta interpreta- go, promoveram a capitalizagao dos processos de trabalho rurais e a mercantil zac&o crescente da agricultura de pequena escala, acelerando a taxa de proletariza- g4o rural. Essas recentes tendéncias so encaradas como prova de uma rearticulagao fundamental nas relagdes rural-urbano, caracterizando-se pela integracdo direta da agricultura a reprodugo dos capitais industriais. Esta, por assim dizer, “‘industriali- zacao”’ da agricultura € apresentada como definidora de um novo modelo de acumulag4o, o que implica um afastamento radical do modelo articulador proposto anteriormente por Oliveira (1972) e por Sa (1973). Uma vez que as contribuicdes originais destes dois ultimos autores se constituem no ponto de partida para as formulagdes atuais, parece-nos importante refletir, ainda que rapidamente, a respeito.! Oliveira tentou demonstrar, em oposicéo aos prognésticos dualistas, que a persisténcia de estruturas agrarias ‘‘atrasadas’? nao havia impedido uma rdpida industrializagio no pés-guerra, quer pela impossibilidade de ai se mobilizar o excedente agricola com “mercado doméstico” para a indis- tria capitalista. ie a agdo extensiva de novas fronteiras agricolas por uma agricultura “‘primitiva’’ teve uma importancia fundamental na consolidagao de um padrao urbano, industrial, de acumulagdo e de crescimento. A oferta de excedentes para consumo interno e para exportacdo foi obtida através da incorporag&o de fronteiras, baseada na reproducdo de relacdes “arcaicas”, na capitalistas, de exploracao do trabalho, embutidas no ‘‘complexo latifandio-mini- fandio’’. Este processo histérico de expansdo da fronteira ou ‘‘crescimento através da elaborac4o de periferias” é visto por Oliveira como uma acumulaco primitiva continua.” As condig6es para a apropriac&o do excedente através de meios extra- econémicos eram criadas e reproduzidas através da transitoriedade do acesso da m4o-de-obra rural a terra. Estas condi¢Ses sdo encontradas tanto na “fronteira externa’”’ dos estabelecimentos agricolas recentes como via rotacdo de terras nfo cultivadas, na ‘‘fronteira interna’”’ dos latifandios em regides ha muito ocupadas, tais como o Nordeste. A incorporag4o de fronteiras por formas ndo-capitalistas de produg&o permi- tiu a agricultura brasileira responder adequadamente as exigéncias de um rapido crescimento industrial, liberando bens e fluxos de recursos financeiros sem gerar nenhum movimento significativo nas condigdes internas de troca desfavordvel a industria.’ No modelo de Oliveira de articulagdo intersetorial, a agricultura ‘‘primi- tiva’’ fornece uma contribuic&o direta 4 acumulacdo de capital urbano ao reduzir 0 custo de reprodugdo da mao-de-obra empregada em setores capitalistas urbanos e na agricultura comercial. Os bens produzidos pelas formas ndo-capitalistas de produ- ! Para uma discusso aprofundada a respeito, ver Goodman (1977). 2 Este conceito, que ocupa um lugar significativo nos textos de Rosa Luxemburgo, foi recentemente recolocado ¢ ampliado por Foweraker (1981) na sua andlise da colonizagfo da fronteira no Paran4, na zona Sul de Mato Grosso € na zona Sul do Pard. 3 Oliveira goza de um grande consenso quanto a este ponto de vista. Para maiores detalhes, ver ‘Goodman e Redclift (1981: 135-139). 32 40 subsidiam a acumulago de capital urbano através do achatamento dos salarios rurais e do preco real dos alimentos — o principal bem primario de consumo urbano.‘ Estes mecanismos baseavam-se na existéncia de um excedente populacional ena expansdo das fronteiras agricolas, o que criava condigOes para uma acumulagao primitiva permanente. No seu ataque ao que concebe como modelos dualistas primarios na contro- vérsia ‘“feudalismo x capitalismo” no Brasil, Oliveira enfatiza entao que a repro- dugdo de formas nao-capitalistas de produsdo rural era funcional, e nao contréria, A acumula¢do de capital industrial. Além disso, o surgimento de fortes tendéncias & concentracdo e a criag&o de um mercado de classe média urbana, que caracterizaram © programa de substituico de importagdes de desenvolvimento industrial no Brasil, reduziram o significado estratégico do setor rural como um “mercado interno” para ‘os bens manufaturados. A articulagdo entre 0 modo de produgao capitalista e as formas ndo-capitalistas de produgo rural forneceu condigdes favoraveis 4 forma- Ao de capital urbano, consolidando o “‘pacto estrutural’’ entre a burguesia urbana as classes rurais proprietarias de terra. Apesar do deslocamento estrutural no locus de acumulacdo do setor prim4rio exportador para a industria, este modelo de arti- culag&o ‘‘permitiu ao sistema deixar intactas as bases de producdo agraria, passando por cima dos problemas de distribuiclo da propriedade da terra, que pareciam cruciais no final dos anos 50” (Oliveira, 1972: 18). ‘Apés 0 golpe de 1964, 0 Estado autoritario manteve o pacto entre o capital urbano e a propriedade rural da terra. Os movimentos dos trabalhadores rurais foram reprimidos e as pretensdes de reforma e de distribuic&o foram abandonadas, apesar da sua recorréncia na retdrica politica. Embora a manutengdo das condigdes necessdrias & reprodug&o ampliada de capital industrial urbano haja colaborado claramente para uma continuidade essencial nas politicas brasileiras de desenvolvi- mento agricola do pés-guerra,’ 0 foco desta estratégia, no final dos anos 60, deslocou-se gradual mas incisivamente da ocupagdo de fronteiras para a ca] do do processo de produgdo rural, via politicas de investimento subsidiadas pelo Estado, principalmente através de programas de crédito rural. O incentivo a invoca- mento da produtividade dentro do quadro anterior de forte concentré zacéo conservadora’’, uma vez que 0 seu objeti i mar 0 Jatiftndio, simbolo da agricultura ‘“‘primitiva’’, 1 grande e moderna empresa a ento rural, sustentada pela a por muitos autores como consti- (0 capitalista nas estruturas sociais o interesse tedrico se detém nas capitalistas no campo sob a égide das politicas doras do Estado. 4 Oliveira afirmou que ‘‘a maioria das culturas de vegetais para alimentago (tais como cereais) que supriam os grandes mercados urbanos provinham de zonas de colonizagéo rec (Oliveira, 1972: 16-17). 5 Este ponto de vista ¢ defendido por Goodman e Redclift (1981: 128-150). 33 Podemos distinguir dois momentos nas andlises sobre o papel do Estado na transformag4o das estruturas sociais rurais ‘‘primitivas’’. Inicialmente, a onda de proletarizag&o que acompanhou intervencdes do Estado, tais como o programa de erradicagao de cafezais ¢ a legislacao previdenciéria e trabalhista rural, é vista como sendo uma resposta dos proprietarios de /atifindios a politicas discriminatérias, embora isoladas. Culturas que exigem emprego intensivo de m4o-de-obra, tais como o café, s&o substituidas por outras de ciclos mais curtos ou por pastagens, € os traba- Ihadores residentes (colonos, agregados, moradores) s4o expulsos em favor de mao- de-obra assalariada temporaria (volantes), contratados ocasionalmente, de modo a ludibriar a legislagdo trabalhista rural. Posteriormente, no entanto, o Estado passa a ser encarado como agente de uma estratégia deliberada e coerente no sentido de transformar a base produtiva da agricultura via sua integrag&o ao complexo agroindustrial. A ‘“modernizaco conservadora”’ é vista como uma alternativa para a reforma agraria, € o interesse tedrico volta-se para a transformacao do processo de trabalho nas grandes proprie- dades onde se processaria a ‘‘purificagéo”’ das relagdes salariais até ai ‘‘disfarca- das’’ em formas nao-monetarias de remuneracdo. Os sistemas ‘‘mistos”’ de controle da mao-de-obra caracteristicos de grandes fazendas, particularmente nas plantacdes de café e de cana-de-aciicar, recebem o golpe de misericérdia da legislacao traba- lhista rural e dos subsidios aos insumos industriais. O colapso final destes sistemas moribundos e o proletariado rural emergente foram aclamados como a expressdo acabada de relagOes sociais capitalistas na agricultura. Nesta fase do debate no Brasil, as classicas andlises marxistas de diferenciagéo social, de Lenin e Kautsky sobretudo, desfrutaram um notério reflorescimento. resenta um tratamento original da tese da ‘“‘via prussiana” no seu trabalho sobre a mudanca das estruturas sociais na regiao da Alta Soroca- bana, Estado de Sao Paulo. Ela afirma que o avanco do capitalismo, que se caracte- tizou pela concentrag&o da propriedade da terra, pela especulacdo imobilidria de terras e pelo aumento do emprego intensivo de capital nos processos de trabalho rural, difundiu a relagdo salarial na agricultura. A exclusdo dos trabalhadores rurais do acesso ao processo produtivo contribuiu para o achatamento dos saldrios nos mercados rural e urbano, levando a constituig&o do novo contingente de fora de trabalho de reserva, tal como o definiu Marx, “tanto em termos de suas causas estruturais como no modo peculiar de participacéo nos diferentes processos de producao ‘al regional’? (D’Incao e Mello, 1975: 31). A eliminacao dos meeiros, arrendatérios ou trabalha- dores residentes, e sua proletarizacfio, na transformag4o em mAo-de-obra assala- riada casual, ndo-residente, popularmente chamados de bdias-frias, € vista como a “‘afirmag&o hist6rica’” do modo capitalista de produgdo na agricultura. Brant (1977) amplia essa formulago, que aplica no seu estudo de caso do Sudoeste de Sdo Paulo, afirmando que as mudangas no uso da terra, os plantios mistos e a modernizac&o dos processos de trabalho rurais criaram um excedente relativo de populacao, eliminando, portanto, as vantagens de se manter uma forca de trabalho residente, fixa, e abrindo assim caminho para o surgimento de um mercado de trabalho capitalista. A importAncia relativa crescente de mao-de-obra assalariada temporaria marca ‘‘a transformagdo da agricultura em industria bem 34 como a transformagao de um contingente de reserva para a inddstria (1977: 81). Para Brant, o bdia-fria expressa a aproximagdo de uma unificagdo entre os merca- dos de trabalho rural e urbano, ao nivelar as condigdes de acumulago, o que liberara as forcas capitalistas de produg4o para uma “‘industrializacdo” da agri- cult do trabalho nas grandes propriedades, baseados na escassez de mao-de-obra, cedem ispontvel para ser empregada ocasionalmente. como 0 novo paradigma da agricultura brasileira. O trabalho de D’Incao e de Brant deu origem a um sem-ntimero de estudos de caso do fenédmeno dos bdias- frias ¢ de suas manifestagdes regionais, o qual ¢ tomado como prova da consolida. Go das relacdes capitalistas de produgao.° Devemos mencionar aqui a contribuig&o de Graziano da Silva (1981), uma vez que ele combina elementos dos diferentes estigios do debate. Assim, para ele as estruturas rurais, particularmente o Jatifindio, permanecem ainda como ponto central das andlises sobre as politicas modernizadoras do Estado. Estas so enca- radas como uma alternativa para a reforma agréria num contexto de rapido aumento da demanda urbana e internacional por produtos agricolas. Graziano enfatiza, no entanto, a natureza peculiar do novo proletariado rural. Ao invés de vé-lo como a expresso mais acabada de relagOes capitalistas, ele sugere que denota ocarAter limitado da penetraco capitalista, sobretudo no que se refere as atividades de colheita. Graziano da Silva também salienta a crescente identificagao de inte- resses entre os capitais agroindustriais e 0 Estado em expandir os processos de modernizac4o. Nesse ponto ele pode ser encarado como um precursor das perspec- tivas atuais. No presente estagio, 0 terceiro do debate, as estruturas rurais deixam de estar no centro da discussdo tedrica. O objeto de andlise passa agora a estar nitidamente centrado na importancia estratégica assumida pelos capitais agroindustriais na determinacdo das relacdes sociais rurais. A expansdo destes capitais ¢ encarada como parte integral do processo de industrializaglo pos-64 e da concomitante internacionalizacéo da economia brasileira. Podemos distinguir trés perspectivas basicas sobre as estruturas sociais rurais dentro deste quadro geral, ‘A primeira formulagéo, que pouco se detém nas relacbes sociais agrarias, tende a identificar capitalismo com modernizacdo técnica no trabalho. No trabalho de Geraldo Muller (1982), por exemplo, o sitio familiar modernizado torna-se uma 6 Vide a colegio de artigos de conferéncia anual que vém sendo publicados pelo Departamento de Economia Rural de Botucatu, So Paulo, desde 1975. Podem-se encontrar artigos escolhidos destas reunides em CNPq/UNESP (1982). A literatura a respeito do béia-fria foi revista por Goodman € Redelift (1977) e por Saint (1980). 35 Pequena empresa capitalista. Muller defende a idéia de que a tendéncia dominante na agricultura brasilei m proceso generalizado de modernizago Uma segunda linha, encontravel no trabalho de Wanderley (1979) mostra-se marcada pelos aportes franceses recentes.’ Ao afirmar a domindncia estratégica da agroindistria na dinamica das estruturas sociais rurais, Wanderley afasta a tese classica da diferenciacdo social em favor de uma conceitualizacao do sitio familiar modernizada como forma especifica de relac&o trabalhador-capitalista,® Essa nocao de subordinagéo também é sustentada por Graziano da Silva (1982), que aceita a caracterizagao de Wanderley do ‘novo camponés” como um “trabalhador para 0 ital” sm perceber que o campones participa do processo de repro- Contrariamente a essas posigdes, podemos identificar u ira, original- mente ligada a Kautzky, recentemente restabelecida por Dickinson e Mann (1976), a respeito da singularidade do processo de produgdo na agricultura. Nesta perspec- tiva, a nitida diferenca existente entre o tempo de trabalho e o tempo de produg&o limita a velocidade de circulagao e rotagao do capital, achatando a taxa de lucro em muitos setores da atividade rural, o que efetivamente impede o ingresso macico de grandes empresas capitalistas. Esta abordagem conduziu varios de seus proponentes a caracterizar o sitio familiar modernizado como parceiro privilegiado dos capitais agroindustriais (Aidar e Perosa Jinior, 1981). Uma variante desta posicdo, que tam- bém parte da hipétese dnt dele sustenta que as condigSes para o desenvolvi- mento de uma agricultura capitalista foram enfraquecidas pelo caréter oligopélico dos capitais agroindustriais’ (Nakano, 1981). Esta breve exposicao mostra como o debate no Brasil evoluiu do modelo arti. culador para perspectivas que enfatizam a generalizacao das relagdes capitalistas de produgo ¢ o papel instrumental assumido pelo Estado ¢ pelos capitais agro- industriais. A agroindistria constitui agora o ponto de partida para uma andlise da dindmica das relagdes sociais rurais no Brasil. CRITICA DE TESES ATUAIS SOBRE PROLETARIZAGAO Embora concordemos na centralidade da agroindiistria na identificaso das principais tendéncias atuando sobre a agricultura no Brasil, a literatura atual 7 Marcadamente Faure (1978) e Vergopoulos (1974, 1978). § Oleitor mais atento deve ter encontrado aqui uma repeti¢do de discusses européias nessa perspectiva. Vide, por exemplo, o trabalho de Banaji (1977) € o de Bernstein (1977). ® Esta abordagem tende a ignorar a questo fundamental da natureza do processo de trabalho na agricultura, em beneficio do emprego de algumas categorias econOmicas limitadas. Foge, portanto, da questo de por que nfo ocorreu uma oligopolizagao na agricultura. 36 contém algumas sérias limitacdes. Afirmariamos que entre estas est4o: 1) uma con- ceitualizac&o errénea do ‘“‘complexo agroindustrial’’; 2) uma caracterizagAo incor- reta dos processos de trabalho rural nas propriedades modernizadas como consti- tuindo processos especificos de trabalho capitalista; 3) a identificacao de estruturas agrrias, tanto do “‘trabalhador para o capital’? como a empresa familiar moder- nizada, como aliada privilegiada da agroindustria. Isto supde a existéncia de uma relacao funcional e essencialista entre o desenvolvimento da agroindtstria e a conso- lidagdo de estruturas sociais rurais apropriadas."” Estas limitagdes n&o so, no entanto, apenas da literatura brasileira. Na verdade, como se pode supor a partir do resumo anterior, a integraglo subordinada da agricultura brasileira ao circuito dos capitais agroindustriais foi acompanhada Por uma crescente aproximacdo entre os debates no Brasil ¢ aqueles atualmente em curso na Europa e nos Estados Unidos. Esta integracdo intelectual nao é meramente fruto de uma imitagdo, sendo antes reflete a crescente semelhanga nas pressdes € forcas as quais vem sendo submetida a agricultura brasileira. A nossa critica ultra- passa, portanto, a literatura brasileira e pode ser encarada como uma contribuicao ao debate mais geral atualmente em curso em nivel internacional. Neste artigo, limitaremos nossas considerag6es aquelas pertinentes a discuss4o dos principais modelos que caracterizam o desenvolvimento das estruturas sociais rurais no Brasil. Existe a hipétese de uma dupla alianca subjacente a todas as formulacdes atuais no debate brasileiro: uma alianca entre capitais agroindustriais, tal como expressa na noc&o de “‘complexo’’ agroindustrial, e entre esse “‘complexo” ¢ a estrutura agraria, alianga esta que determinaria um processo de ‘‘industrializacao”” da agricultura. Opondo-nos a no¢4o de “‘complexo’’ agroindustrial, que contém implicita a suposicao da existéncia de capitais homogéneos e n4o-contraditérios, diriamos que, tanto na sua origem como no seu posterior desenvolvimento, os capitais agroindustriais s4o essencialmente aut6nomos e o grau de sua integragao mitua é limitado. A idéia de ‘‘complexo”’ provém de uma tentativa equivocada de generalizar a consolidacdo de um modelo que é conjuntural e particular baseado no trator/monocultura/sementes hibridas/fertilizantes/herbicidas. Ocorre, porém, que diferentes ramos agroindi fazem incidir exigéncias renciais sobre o setor agricola, ¢ fracdes especificas de capital mostram probabilidades de cresci- mento bastante distintas. Considerem-se, a titulo de exemplo, a atual crise da industria de tratores, as vias alternativas de crescimento abertas aos setores de insumos vs. setores de processamento, ou aquelas abertas para os capitais agro- quimicos através das possibilidades de fixag4o do nitrogénio com base em processos bioldgicos. 10 Uma exposigdo completa da nossa posisdo esté em From Farming to Biotechnology: The Industrial Appropriation of Agriculture, Forthcoming, Blackwells, 1986. 37 ¢ fontes alternativas de proteina. A emergéncia ¢ a unificag&o conjuntural de dife- rentes capitais agroindustriais € um processo irregular e esté sempre se redefinindo, dependendo do ritmo dos avangos cientificos e das inovacdes tecnolégicas. E um grande erro tentar expressar esse processo em termos de formacdo de um “‘comple- xo”’ consolidado e estatico. Fazé-lo é analisar equivocadamente tanto a dinamica dos capitais industriais como a da sua integracdo com as estruturas sociais rurais. Uma segunda limitacdo do conceito de ‘‘complexo”’ agroindustrial reside no fato de ele supor a existéncia de um processo unificado de produedo. Este pressu- posto fica claro na conceitualizagao de camponés, ou do produtor familiar mo- derno, como um “trabalhador para o capital’, melhor dizendo, para o capital agroindustrial. Contra este ponto de vista, dirlamos que a emergéncia destes capitais demonstra exatamente a impossibilidade de se estabelecer um processo unificado de trabalho capitalista na esfera da producdo rural. Na falta destas condigées, fragdes de capital agroindustrial assumem a apropriacdo sucessiva, mas apenas parcial, de aspectos do processo de producdo rural. Ao produtor rural direto cabe, entfo, precisamente unir em si aqueles elementos que nao foram ainda incorporados a produg&o industrial. Ou seja, ele deve coordenar ou “‘gerir’’ séries de apropriagdes industriais parciais, representadas pelos insumos agricolas: equipamentos, fertilizantes, etc. Uma prova dramatica de falta de uma responsabilizacAo integral pelo processo de trabalho rural é-nos dada pela progressiva destruicdo de seu principal meio de produgdo, a terra. Esse modelo anarquico de apropriacées aponta para a auséncia de um processo unificado de trabalho capitalista. E 0 corolario da logica predatoria de fragdes do capital agroindustrial, que encara o setor rural como um mero mercado para seus produtos. O conceito de ‘‘complexo’’ agroindustrial também traduz a nocdo de uma divisdo estatica entre ‘‘agricultura”’ e ‘‘industria’’. A agroindustria constitui-se na apropriag&o daqueles aspectos do processo do trabalho agricola que s&o especifica- mente industriais. Pelo contrario, a agroindustria abarca uma amalgama de capitais em constante mudanca e expressa um esforco continuo no sentido de transformar a agricultura num processo industrial. Como tal, nao existem limites estaticos nem preestabelecidos: a sua area de alcance é determinada pelo progresso e inovacdes tecnoldgicas. Neste aspecto, o ‘“‘complexo”’ agroindustrial representa uma fase de transig4o, na apropriacao industrial da agricultura. Como corolario desta dinamica do crescimento capitalista, nfo ha meios para que se estabelega uma relac&o privilegiada entre estruturas agrarias e capitais agroindustriais. Tal nogdo falseia completamente 0 movimento de tais capitais. Estes esto constantemente enfraquecendo as condigdes da produc&o rural, apropriando sucessivamente mais e mais elementos do processo de trabalho a medida que os avangos na ciéncia e na tecnologia permitem a industrializagao das atividades até ai ‘‘rurais’’ ou “‘naturais”’. Tampouco pode este desenvolvimento ser visto a partir de um prisma unilinear, uma vez que uma inovagdo radical numa area da ciéncia e da tecnologia pode romper com os padrdes existentes de apropriac&o e criar novas tendéncias para a expans4o da agroindustria. B, portanto, apenas num sentido negativo que a agroindtstria pode ser encarada como consolidando formas de produg&o rural especificas e privilegiadas. A progressiva apropriaco dos processos de produgdo rural pelos capitais industriais 38 inviabiliza o desenvolvimento em larga escala de operacdes baseadas em mAo-de- obra assalariada, como paradigma para a agricultura. A existéncia de capitais agroindustriais, em si mesmos produtos da auséncia de um processo unificado de trabalho capitalista, por sua vez opde-se a sua realizag’o sob forma de grandes empresas agricola: Neste contexto torna-se importante enfatizar que nao é a renda da terra a barreira para o ingresso na agricultura do capital. A renda & apenas a expressio social da dominagao do processo de produgdo agricola pela terra como “‘natureza’”. Em resumo, a discussdo brasileira est4 sujeita a uma visdo estatica e homo- geneizadora dos capitais agroindustriais, o que, por sua vez, acarreta numa andlise estatica das relagdes entre a agroindustria e as estruturas sociais rurais. Enquanto uma formulago reduz o sitio familiar modernizado a uma pequena empresa capita- lista, transitoria, numa versio recomendada de ortodoxia leninista, a andlise que fala em “‘trabalhador para o capital” supde, equivocadamente, a existéncia de um processo unificado de trabalho capitalista e é, assim, incapaz de perceber as formas de representagdo ¢ de conflito que sao peculiares a produgdo familiar moderna. Em vez de ser a expressdo acabada e a forma definitiva da presenga do capitalismo na agricultura, os capitais agroindustriais s4o os protagonistas de uma alianga instével e constantemente redefinida entre processos rurais, baseados na terra ou na “natureza”’, e processos de produg&o industrial capitalista, onde o primeiro vem sendo enfraquecido ¢ apropriado pelo segundo. Nao pode, assim, existir nenhuma alianga privilegiada permanente entre a agroindustria e a agricultura. A produgao rural dominada pela terra ou pela “‘natureza’’ & intrinsecamente contréria ao processo de trabalho industrial capitalista, e o avanco da agroindistria dé-se, portanto, necessariamente as custas da producdo rural, e apenas reforga algumas estruturas sociais em carater conjuntural. AGROINDUSTRIA E ESTRUTURAS RURAIS BRASILEIRAS Nesta parte apresentamos uma reinterpretacfo das principais tendéncias em jogo na agricultura brasileira, bem como tentaremos uma regionalizacio esquemé- tica das estruturas sociais rurais. Comegamos, no entanto, por fazer algumas observag6es adicionais a respeito do desenvolvimento da agroindustria no Brasil. Antes dos anos 60 os capitais agroindustriais concentravam-se principalmente no processamento e comercializagéo da produc4o, as importagdes sendo a principal 39 fonte de insumos modernos e de equipamentos agricolas. Esta estrutura industrial transformou-se radicalmente através de uma série de vigorosas intervengdes governamentais no final dos anos 60 e nos anos 70, o que incluiu programas de substituig&o de importacdes para os insumos modernos, investimentos na infra- estrutura rural, reorganizacao da extensdo de servicos e pesquisas agricolas e, acima de tudo, créditos altamente subsidiados para investimento com equipamentos de capital e para aquisic&o de insumos modernos. O crédito rural aumentou cinco vezes em termos reais no decénio de 1968-1978, e o subsidio da taxa de juros correspondia a aproximadamente 30% do valor liquido da produg&o agricola em 1978 (IBRD, 1979). Através de um complexo leque de programas oficiais- de crédito cobrindo as atividades de produg&o, comercializacao e investimento, o Estado funcionou como mediador das relacdes insumo-produto entre setores agricolas em modernizacdo e capitais agroindustriais, subsidiando mercados e acelerando a diversificaco da ____agroindistria. Esta estratégia também marca a diferenga existente entre o Brasil e ‘casos de incorporacdo de setores agricolas especificos por transnacionais agroindus- triais no sentido de estabelecerem enclaves para exportacéo. Em contraste com isso, a agricultura brasileira como um todo foi objeto da modernizacdo, embora as medidas politicas hajam sido altamente seletivas, de acordo com o tamanho das propriedades, tipos de producdo e regido. Em conseqiléncia disso, a agroindustria no Brasil desenvolveu-se como uma extens4o org4nica da estrutura industrial, ¢ a sua dominac&o por corporagdes transnacionais, como alias em outros setores-chaves da economia, baseou-se essencialmente na expans4o do mercado interno.'! Diriamos também que o fomento deliberado por parte do Estado a agroindis- tria, como estratégia para solucionar a questdo agricola no Brasil sem afetar a estrutura agraria dominada pelo /atiftindio, ndo implica que estes dois atores sejam aliados privilegiados. Na verdade, uma vez que o crescimento da agroindustria significa a apropriac&o crescente do processo de producdo rural, seria menos prova- vel a priori que as grandes empresas que utilizam mdo-de-obra assalariada forne- cessem condig6es para a sua consolidaco do que unidades familiares operadas por seus proprietarios, como defendemos na discussdo acima. Esta afirmac&o genérica, porém, nfo d& conta tanto das relacdes sociais rurais estabelecidas antes da expansdo agroindustrial em diferentes formacdes sociais como também, mais especificamente, ndo da conta do grau no qual estas relages foram preservadas no nivel das politicas estatais. O acesso a financiamentos do Estado pode bem compen- sar 0 efeito corrosivo da agroindistria na apropriacdo crescente do excedente. Nestes casos, e preeminentemente no Brasil, a expansdo agroindustrial ¢ compativel com a manutengdo de uma diversidade de estruturas sociais rurais. Em oposigdo a varias das formulagdes anteriormente resumidas, a agroindustrializagAo no Brasil nfo mostrou tendéncias no sentido de impor um padréo homogéneo a divis&o social do trabalho, Em vez disso, as politicas governamentais que visaram defender as estruturas agrarias existentes reforgaram a heterogeneidade das relaces sociais na agricultura brasileira. 11 Andlises sobre politicas recentes de modernizacdo agricola esto cor (1979), Sorj (1980), Goodman ¢ Redclift (1981) e Graziano da Silva (1981). 40 las em CPDA (1979), IBRD Sob esse aspecto, podemos distinguir quatro estruturas basicas as quais coin dem nos seus tracos gerais com a regionalizacdo da agricultura brasileira. A andlise que se segue altamente esquematica, uma vez que estas relacdes sociais se dao dentro de cada ‘‘regiao”’. Todavia, uma estrutura especifica tende a predominar em cada uma delas, conferindo um cardter ‘‘regional’’ particular a formas de represen- tag&o e de conflito. Agroindtstria e grandes propriedades: 0 Centro-Sul Com base nas andlises de D’Incao ¢ Mello (1975), Brant (1977) e Graziano da Silva (1981) podemos resumir 0 processo de modernizac&o em grandes propriedades dentro da linha que se segue. Os subsidios governamentais para insumos mec&nicos € quimicos transformaram progressivamente 0 sistema de produgéo de emprego intensivo de mao-de-obra, baseado inicialmente em trabalhadores residentes perma- nentes ¢ arrendatérios ‘‘internos”, complementado por trabalhadores assalariados ocasionais rectutados nos minilatifiindios proximos e por migrantes sazonais. Essa divisio social do trabalho foi superada por processos de produgdo cada vez mais mecanizados e mais dependentes de insumos industrializados, onde, simultanea- mente, a mao-de-obra permanente foi substituida pela temporaria, e, dentro da forca de trabalho permanente, os trabalhadores nao especializados foram substi- tufdos por trabalhadores semi-especializados na operagéo da maquinaria. Estas tendéncias agravaram-se com a alta concentragdo na propriedade da terra ¢ com as alteragdes no uso da terra, sobretudo com o proceso de pecuarizagao, o qual implica a substituicdo de lavouras anuais por pastagens permanentes, privando os sitios familiares ‘‘externos” das possibilidades de renda conseguida nos arrenda- mentos por perfodos curtos. mente, torna interior das grandes propriedades consolide um contingente permanente de forea do trabalho de reserva, simultaneamente elimina a producdo de valores de uso por parte das familias camponesas, até ai a base dos baixos custos de reprodugao do trabalho rural 10 = acordo com esta posi¢&o, o proletariado rural volante, temporario, ligado ao meio urbano, € caracteristico da intensificagdo das relagdes capitalistas no campo. Diriamos, no entanto, que o trago mais caracteristico da modernizacdo dessas grandes propriedades nao reside nessa grande e empobrecida massa de prole- tariado rural, sendo antes no numero relativamente pequeno de operadores de maquinaria semi-especializados, permanentes. O proletariado volante, embora fruto da modernizagdo, existe apenas na medida que esta é ainda incompleta. A principal necessidade de mao-de-obra rural temporaria ocorre na época da colheita, mas inovacOes recentes sugerem que nao existem barreiras tecnolégicas insuperaveis 41 para uma mecaniza¢&o das atividades da colheita. A manuteng4o da colheita manual para culturas, como café, cana-de-aciicar, algodao e laranjas, tradicional- mente aquelas que s4o produzidas em grandes propriedades, parece ser, portanto, um fendmeno conjuntural, determinado pela existéncia de um excedente de mao-de- obra rural ¢ de relag6es de trabalho altamente repressoras. Outros fatores também lancam duvidas quanto a permanéncia estrutural dessa grande massa de proletariado rural. Primeiro, a crescente especializag4o na mono- cultura, sobretudo de cana-de-acitcar, estimulada pelo Programa Brasileiro do Alcool (PROALCOOL), a qual reduz as oportunidades para obtencdo de empregos ao longo do ano em atividades rurais.'* © emprego casual em setores urbanos tam- ‘bém fornece uma alternativa para o trabalhador rural assalariado. Para além disto 0 trabalhador volante vem aumentando gradualmente a sua organizagao e ganhando o apoio das liderancas do movimento de trabalhadores rurais (CONTAG), muito embora 0 ponto alto de organizacao e luta dos trabalhadores rurais temporarios no esteja no Centro-Sul mas na zona da cana-de-agicar de Pernambuco” (Sigaud, 1980). Niveis mais elevados de organizacao dos trabalhadores e o clima mais favord- vel da abertura politica também conduziram a progressos quanto a regulamentagao das condigdes do emprego rural tempordrio, nos tltimos anos. Uma acentuagao mais marcada dessas tendéncias, aliada a uma recuperagdo sustentada do emprego urbano e dos salarios reais, poderia acelerar significativamente a mecanizagdo das atividades da colheita, as principais responsdveis pelo carater massivo do emprego de mo-de-obra assalariada volante. Uma avaliacao detalhada dessas tendéncias no sentido de uma consolidag4o ou de uma dissolug&o da massa de proletariado rural ocasional permanece sendo um ponto crucial para uma andlise da dinamica das relagdes sociais e do cardter dos conflitos rurais. Todavia é fundamental reconhecer que 0 béia-fria nao é uma variante da mao-de-obra assalariada urbana, cujas condigdes se consolidaraio com 0 desenvolvimento das rela¢des capitalistas no campo. A expresso mais comum da moderniza¢ao em grandes propriedades é a substituicdo do grande numero de traba- Ihadores ndo-especializados por uma pequena quantidade de m4o-de-obra semi- especializada. Como apontamos, a mecanizacao da colheita podera virtualmente eliminar a m&o-de-obra volante ou béia-fria como um fenémeno de massa. A produgdo em larga escala ndo estA imutavelmente associada com 0 emprego em larga escala de mAo-de-obra assalariada. O proletariado rural, na forma do volante ou béia-fria, nao pode, portanto, ser encarado como um trago necessariamente permanente das relagdes sociais rurais. Tal ponto tem implicagdes importantes para © movimento dos trabalhadores ¢ pressagia alteracdes na estrutura da producao agricola na regiao Centro-Sul. Em resumo, a ago mais efetiva de organizacao dos "2 Oportunidades de emprego rural para os trabalhadores volantes envolveriam nive's muito elevados de desemprego, se calculadas em bases anuais. Sobre este ponto, ver CNPq-UNESP (1982). 13 A mobilizagao do trabalhador volante ocasional e a sua prioridade numa estratégia global de organiza- 40 dos trabalhadores rurais vém sendo um tema recorrente no congresso anual da Confederagdo Nacional de Trabalhadores Agricolas (CONTAG), desde 1979. Este & um assunto espinhoso, dada a heterogeneidade dos associados da CONTAG, entre os quais se incluem pequenos proprietarios, arrenda- tarios, meeiros e trabalhadores em terras. 42 béias-frias, aumentando significativamente o seu poder de barganha e a sua incluso sob a legislagdo oficial trabalhista ¢ previdencidria, poder conduzir a esforcos redobrados no sentido de se mecanizarem as fases ainda restantes do ciclo agricola. Isto produziria um rapido e dramatico declinio no tamanho absoluto do proleta- riado rural. Por outro lado, a consolidag&o de processos de trabalho altamente mecanizados, que empregam capital intensivo, dependeria do grau no qual o Estado se mostre capaz de manter o tradicional tratamento privilegiado as grandes proprie- dades modernizadas. Nas atuais circunst&ncias, as previsOes so particularmente arriscadas. A profunda crise econémica brasileira pode contribuir com uma drastica redugflo nos niveis de subsfdio para o setor rural como também acentuar as priori- dades para o programa do PROALCOOL. O SITIO FAMILIAR MODERNIZADO: O SUL A modernizac&o do sitio familiar em larga escala ocorreu inicialamente no final dos anos 50 ¢ nos anos 60 no setor de comercializacdo de hortigranjeiros, que se desenvolveu no “‘cinturao verde’, em torno da regiéo metropolitana de Sao Paulo, Este fendmeno foi analisado por Lopes (1978) em artigo pioneiro, e poste- riormente por Graziano da Silva (1982). Ambos explicam esse desenvolvimento em termos de uma divisto do trabalho entre setores capitalistas ¢ sitios familiares, na qual os ultimos sobrevivem através de uma especializacdo em culturas que-exigem grandes e continuados insumos em termos de mfo-de-obra. A particularidade do processo de trabalho em culturas especificas poder, portanto, fomecer um nicho especial para a reproducdo das unidades familiares modernizados, permitindo a sua coexisténcia com fazendas capitalistas.'* No entanto, essa andlise é claramente inaceitével quando consideramos a predominancia alcangada pela producao familiar modernizada nos anos 60 ¢ 70, no setor mais dinfmico e mais altamente mecanizado da agricultura brasileira, 0 da producdo de soja, no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Parana. Em Ijui, por exemplo, a maior regifo produtora de soja do Rio Grande do Sul, 70% da area cultivada esto em propriedades de menos de 100 hectares, ¢ a m&o-de-obra assala- riada permanente e temporaria, tomadas em conjunto, constituem apenas 5% do total da forca de trabalho empregada (Coradini, 1981). Essa modernizac&o de pequenas propriedades familiares pode ser atribufda, em parte, a0 quadro institu- cional encontravel no Sul, o qual inclui uma estrutura agroindustrial relativamente bem desenvolvida de empresas fornecedoras de insumos e processadores, bem como uma rede de agéncias estatais e de cooperativas anteriormente estabelecidas para fomentar a producdo de trigo. A exploso dos precos da soja no mercado mundial no comeco dos anos 70 consolidou as cooperativas como instrumento preferido das politicas de modernizagio do Estado, servindo de mediadoras entre os capitais agroindustriais e seus heterogéneos associados. As tradicdes camponesas herdadas dos imigrantes europeus que se estabeleceram no Sul também podem contribuir para 4 Bsta formulagdo lembra a de Servolin (1972) para o caso francés. 43 explicar a capacidade das pequenas empresas familiares em responder as novas exigéncias colocadas pelos capitais agroindustriais e pela integracdo com os merca- dos mundiais. Na nossa discussdo anterior a respeito das andlises sobre a agroindistria, colo- camos algumas razGes para recusar a tese do “novo camponés — trabalhador para o capital”. Contudo, a formulagao alternativa de Muller (1982), a qual encara o sitio familiar modernizado como uma variante da empresa capitalista, também se mostra inadequada, Primeiramente, 0 processo de modernizacéo nao corresponde a um processo de acumulacdo interna. Ao invés disto, este proceso & imposto de fora, pelos capitais agroindustriais, sustentados, no caso brasileiro, pelo capital finan. ceiro institucional. Para as unidades familiares individuais, a utilizagdo de equipa- mento mecanizado, de sementes selecionadas, de fertilizantes, de pesticidas ¢ de herbicidas define um “‘patamar’’ tecnolégico que deve ser alcancado caso se vise sua incorporac&io ao processo de produgo agroindustrializado e se pretenda atingir niveis de produtividade competitivos, Além disto, 0 acesso a esse processo exige 0 Tecurso sistematico ao crédito, o que implica o risco de se aumentar cumulativa- mente 0 endividamento bem como as possibilidades de faléncia.' A “‘tecnificag&o”’ ou “‘capitalizacao”’ do processo de trabalho nas empresas familiares modernizadas significa uma acumulacdo dos meios de produgdo e nao uma acumulag4o de capital. O valor excedente é apropriado pelos diferentes capitais agroindustriais e financei- Tos que mediam o processo de ‘‘tecnificagao"’.'* Na medida que a “‘tecnificag&o” se processa, os conhecimentos e priticas tradicionais s4o desvalorizados, uma vez que o controle sobre 0 processo de producdo € crescentemente ditado pelas normas dos capitais agroindustriais. Estas normas foram reforcadas, no caso brasileiro, pelo fato de 0 acesso ao sistema oficial de crédito estar condicionado a critérios técnicos e agronémicos que ditam a respeito da preparacdo da terra, do uso de insumos modernos, e de outras praticas afins. Além disso esses critérios caminham com as modificagdes técnicas, e até com condigdes econédmicas conjunturais, provenientes do crescimento dos diferentes capitais agroindustriais. A integracao ao circuito dos capitais agroindustriais também supe uma luta continua para manter-se no patamar tecnoldgico minimo, o qual est constante- mente sendo redefinido e ampliado, do ponto de vista dos recursos fixos e da area de terra necessdrios para se permanecer competitivo. Os sitios familiares incapazes de acompanhar estas transformacdes tecnolégicas sdo progressivamente marginaliza- dos do processo continuo de ‘“tecnificagéo’ ou modernizaco, passando a constituir-se num excedente relativo de populacao agraria. Estas unidades empobre- cidas ou marginalizadas provém da continua redefinic&o de relacdes entre 0 sitio familiar modernizado.e a agroindistria. No Sul foi este estrato que forneceu os colonos para o estabelecimento das novas fronteiras agricolas no Mato Grosso e em Rondé6nia nos anos 70 ¢ final dos anos 80. A integracao com capitais agroindustriais e com instituigdes do Estado acar- 'S O locus classicus onde se estabelece a afinidade entre “tecnificaco" e endividamento é Vergopoulos (1974), 'S Para uma avaliaco recente deste processo, ver Moreira (1981). 44 reta mudancas radicais no carater da representac4o social e do conflito. H4 também uma crescente divergéncia de interesses entre os proprietarios de empresas familiares modernizadas e ‘“‘integradas”’ e os produtores familiares marginalizados. O locus izadas € 0 movimento . elemento da racionalizagao por parte do Estado . As coopera- tivas facilitaram a centralizagao do crédito e dos servicos de crédito e de infra-estru- tura, fornecendo assim um mecanismo eficaz para a reconstrug&o dos padrdes de dominag&o enfraquecidos pelas mobilizag6es rurais dos anos 50 e comeco dos anos 60. Tal incorporacdo fomentou tanto uma expresso corporativista de interesses como também estruturou as exigéncias dentro de novos parAmetros. Essas exigéncias n4o sAo mais basicamente definidas em termos de interesses rurais antagOnicos a respeito da terra como centro do conflito. Em vez disso, as questdes centrais passam a vir da sua integracéo subordinada nas estruturas de modernizagao e dizem respeito a crédito, custos dos insumos, pregos e acesso a mecanismos institucionais, O modelo t{pico de mobilizag&o de proprietarios de sitios familiares modernizados, tal como a passeata de tratores pela capital do estado ou pelo centro regional estratégico, ilustra graficamente essa mudanga na definigdo das relagdes de poder do rural para o urbano. Representa um nitido contraste com os acampamentos rurais, dos quais Ronda Alta foi um exemplo marcante, que carac- terizam as mobilizagdes dos camponeses marginalizados no Sul, cujaluta continua a deter-se na classica exigéncia de terra.” N&o estamos com isso querendo subestimar a capacidade dos proprietarios de empresas modernizadas de se organizar, nem querendo negar que sua militancia pode alcangar niveis elevados, como foi o caso dos Tecentes movimentos de protesto . E dbvio que a terra permanece uma questo critica, sobretudo porque a modernizagdo continuamente faz crescer 0 tamanho minimo de propriedade rural eficiente. Porém, com um mercado de terras mais desenvolvido e com mecanismos institucionais que facilitam a sua compra, 0 acesso a terra tenderd cada vez mais a ser encarado como uma questdo individual, e menos como um objeto de luta coletiva. O NORDESTE A continuada heterogeneidade das estruturas sociais rurais no Nordeste deve- se menos a qualquer diferenca marcante no compasso da modernizagao ou na inter- 17 0 Movimento dos Sem Terra visa lancar uma ponte sobre este abismo existente entre os proprietarios familiares modernizados e aqueles marginalizados. Os membros destes iltimos incluem filhos de proprie- thrios de sitios modernizados para quem a divisto da propriedade familiar foi incapaz de criar sftios economicamente viaveis. Sobre 0 significado de Ronda Alta no contexto das mobilizagdes rurais recentes na zona Sul do Brasil, ver Grzybowski (1982). 45 ven¢do do Estado do que a desigualdade de sua incidéncia espacial. Esta irregulari- dade é conseqiiéncia direta do clima semi-drido da regiao e da pobreza de seus recursos naturais como base para uma agricultura produtiva que dependa dos ciclos da chuva. O desenvolvimento mais lento de uma producdo de bens e das forcas produtivas inibiu, por sua vez, a expansdo de mercados para os insumos modernos ¢ para as redes institucionais correlatas que sustentassem um setor industrial diversi- ficado. Tais aspectos, mais do que qualquer atraso intrinseco por parte dos grandes proprietarios de terras, explicam a predomindncia da pecuarizacdo como linha geral da modernizaco do /atiftindio nas areas do agreste semi-drido e do sertao. Podemos também encontrar outras formas modernizadas de producao, muito embora estas se constituam em enclaves, de um ponto de vista regional. Esta caracterizagao pode ser igualmente estendida de modo a nela se incluir a zona de plantac&o agroindustriali- zada de cana-de-acucar, bem como as grandes propriedades modemizadas em Areas Tecentemente ocupadas, como a das plantacdes de café recentemente instaladas no Oeste da Bahia. NAo obstante, existem paralelos estreitos com o restante do Brasil e nenhum téo claro como o do setor de plantag4o da cana-de-acicar na imida Zona da Mata, onde a purificacao das ‘‘relagdes salariais disfargadas’”” vem-se verificando desde meados dos anos 40 (Correia de Andrade, 1964). A expulsdo dos moradores, trabalhadores com direitos de acesso a terra dentro da plantacAo, e o recrutamento de m4o-de-obra assalariada sem terra, intensificaram-se no final dos anos 60 e nos anos 70. A aceleracdo deste processo manifesto de proletarizaco foi atribuido a introdugao da legislaco rural trabalhista, ao acesso mais facilitado dos proprieta- tios das plantacdes a operacdes subsidiadas de capital ¢, mais recentemente, a expansdo do cultivo da cana-de-acticar sob o programa do PROALCOOL (CPDA- NE, 1978; Palmeira, 1979). Como em outras regides, a grande disponibilidade de créditos institucionais subsidiados, reforcada pelo acesso privilegiado dos grandes proprietarios a linhas de créditos para investimento, aumentou grandemente o valor da terra e encorajou a especulacdo imobiliéria. Na zona de transi¢&o climatica do agreste, a pecuarizacdo emergiu como um dos meios basicos de se obter um controle centralizado sobre os processos de producao, em propriedades mistas de cultivo e pecuaria. Esta forma de “modernizagdo conservadora”’ desferiu um golpe decisivo na reproducdo articulada do ‘‘complexo latifiindio-miniftindio”’. Com a substituic¢&o por pastagens artificiais permanentes de sistemas agricolas mistos — sobretudo o de algodao-gado — o campesinato ‘‘interno’’ vé-se privado do acesso aos meios de producdo. Esses Pequenos arrendatarios, cuja reproducao combina tradicionalmente a comerciali- zag&o de suas parcelas do plantio e a produg&o de valores de uso, ndo sdo mais precisos como fonte subsidiada de trabalho na grande propriedade. A economia dos produtores familiares ‘‘externos”” é também enfraquecida pelo declinio correspondente no emprego salarial sazonal e na disponibilidade de terras cultivaveis de pequenas dimensdes para arrendamento anual. Esta diminuigao nas oportunidades de emprego proveniente das alteracdes no uso da terra nas grandes propriedades refortalece o processo secular de pressdo demografica e de fragmentacdo em dreas de minifundios, acelerando a migrac&o para fora e a conse- qilente reconcentracao dos meios de produgao. A pecuarizagdo, ao reduzir muito as 46 necessidades de emprego do latifindio, anteriormente supridas pelos minifundios internos ¢ externos, pds fim a base de reprodugdo simbidtica destas formas de producdo. ‘‘A proletarizacao, neste caso especifico, assume a forma de um éxodo rural, uma vez que é impossivel para 0 pequeno proprietério sobreviver com 0 produto de sua terra.”” (CPDA-NE, 1978: 109) A erosao das condi¢des de existéncia destes minifiindios vem acelerando a pauperizacio dos pequenos produtores familiares. Essa tendéncia é-nos compro- vada empiricamente pelos dados do Censo Agricola de 1975, os quais mostram que o valor da producado em 70% dos estabelecimentos rurais do Nordeste caiu abaixo do nivel de um saldrio minimo (Silva, 1982). De fato, esses estabelecimentos, que eram em niimero de um milhdo e seiscentos ¢ trinta e seis mil e trezentos em 1975, so essencialmente unidades de consumo, contribuindo apenas marginalmente, se em alguma percentagem, para o excedente liquido comercializado de bens agri- colas.'* Além disso, dados os efeitos adversos da modernizac4o sobre as oportu- nidades de emprego, os minifiindios tem apenas um papel residual, e que se encontra em declinio, como mao-de-obra rural de reserva. Essa massa de campe- sinato empobrecido permanece como contingente de reserva potencial de mao- de-obra, mas qualquer significacdo ‘‘regional”’ particular que seja conferida ao Nordeste é refutada pelas tendéncias que se encontram em curso em toda a agri- cultura brasileira.” Os niveis extremamente baixos do produto bruto e do produto por hectare encontrveis na grande maioria das propriedades rurais do Nordeste enfatizam o carater de enclave da modernizacdo. Essa noc&o é patticularmente adequada a produgo de culturas de alto valor, tais como frutas cftricas ¢ uvas de mesa, nos programas de irrigacdo e capital-intensivos conduzidos pela Comissao do Vale do Rio Sao Francisco (CODEVASF) e pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS). As empresas agroindustriais isoladas, atrafdas por subsidios de crédito regional e por incentivos fiscais, também criaram enclaves de empresas modernizadas que empregam o trabalho familiar, como é 0 caso dos projetos de Processamento de frutas e de tomates da Maguary e da CICA. Estes casos isolados de estabelecimentos familiares “‘tecnificados” envolvem formas de produgdo por contrato, nos quais os produtores diretos tipicamente detém a propriedade da terra mas exercem apenas um controle parcial sobre as bases técnicas da producdo e comercializagéo. As circunstancias especificas de subordinacéo aos capitais institucionais e agroindustriais emprestam caracteristicas particulares 4 mobi- lizagéo camponesa. Estas lutas detém-se sobretudo nos termos da incorpora- 40 dos planos de irrigacdo publica, no controle dos processos de trabalho ime- diatos, nos custos dos insumos e na exclusividade de compra das instituicdes de comercializacao.”” '8 Na verdade, o valor médio da produg&o em estabelecimentos incluidos nesta categoria era inferior a metade de um salério minimo. ' A “fungdo" da mfo-de-obra do Nordeste ¢ enfatizada nas formulagdes de Oliveira (1972), a respeito do modelo articulador, ¢ nas de Lopes (1973). Existem paralelos com determinadas categorias de pequenos produtores familiares encontraveis no Sul ‘¢ com suas lutas com os capitais transnacionais envolvidos no processamento do porco e na produco de vinhos e tabacos. 47 Este modelo de enclave aplica-se também 4 estratégia de ‘‘desenvolvimento rural integrado” introduzida em meados dos anos 70. Programas como o POLONORDESTE e como o Projeto Sertanejo visam intensificar as relagdes de bens primarios em reas escolhidas de agricultura de pequena escala, bem como promover tend@ncias ainda incipientes no sentido de uma especializac&o da produ- g4o. A estratégia supde essencialmente a incorporagéo dos pequenos produtores familiares 4 rede de créditos institucionais subsidiados, desta maneira integrando decididamente os insumos industriais e modernos ao processo de trabalho e subordi- nando assim os produtores as normas técnicas de producfo estabelecidas pelas agéncias do Estado e pelos capitais agroindustriais (Wilkinson, 1985). A press&o exercida através da concorréncia sobre as unidades de menor eficiéncia pelos ‘produtores modernizados que obtém rendimentos mais elevados e o aumento dos valores da terra sao acentuados pelos programas correlatos do Estado, tais como 0 methoramento de estradas, outras instalagdes ao nivel da infra-estrutura, e ainda linhas de crédito especiais para investimento na capacidade de processamento da agroindistria.”" Embora o processo se mostre mais adiantado no Sul, a diferenciagfo da produg&o camponesa no Nordeste vem, cada vez mais, criando um estreito estrato de produtores familiares ‘“‘tecnificados”’ intimamente integrados ao circuito dos capitais agroindustriais. A contrapartida estrutural, mais marcante em termos absolutos, é um imenso contingente de produtores empobrecidos que empregam a m4éo-de-obra familiar em minifundios, cuja proletarizac&o se manifesta sob a forma. de um continuo éxodo rural ou de uma migrac&o sazonal permanente. Apesar das especificidades da modernizac&o no Nordeste, existem grandes paralelos com o restante do Brasil quanto a mobilizag&o da mAo-de-obra assalariada ¢€ quanto as lutas camponesas. De fato, a organizacdo e a militancia dos trabalha- dores da cana-de-agiicar em Pernambuco e, mais recentemente, na Paraiba, colo- cam-se na vanguarda do movimento de trabalhadores rurais. Assim é que a Federacdo Estadual dos Trabalhadores Agricolas de Pernambuco (FETAPE) levou acabo no estado, desde 1979, varias campanhas vitoriosas por maiores salarios, por uma melhoria nas condiges de trabalho e por uma observancia mais rigorosa das disposic6es da legislacdo trabalhista. Além disso, apés a greve parcial de 1979 e da greve geral de 1980, os empregadores concederam aos trabalhadores da cana o direito legal de terem acesso a lotes de subsisténcia (sftios) de até dois hectares na plantacdo (Sigaud, 1983). Algumas lutas notérias, embora isoladas, provieram da expulsdo das familias de arrendadores h4 muito estabelecidas, tanto de meeiros como de arrendatarios e posseiros. Essas mobilizagdes giram em torno da questio da terra e da defesa daquilo que ¢ percebido como pertinente, enquanto campo- meses, ao seu estatuto como proprietdérios ou /avradores, dando-se em termos operacionais a luta no sentido de garantir a posse e outros direitos legais conferidos pela Lei da Terra e pela legislagéo trabalhista. O caso famoso do rancho Algamar, 21 As pressOes da concorréncia A qual esto expostos os produtores familiares no se limitam aos efeitos no nivel da oferta, a0 produto mais elevado nem aos maiores custos estruturais associados com os sitios “tecnificados’”, mas podem também ser intensificadas através das politicas de prego minimo ¢ de outros instrumentos correlatos. 48 na Paraiba, onde o Estado interveio para expropriar e redistribuir a terra, é um exemplo de mobilizacdo bem-sucedida de pequenos arrendatérios. De modo inverso, existem casos incontaveis de expulsdo de posseiros e outros arrendatarios sem que seja dada qualquer compensacao legal devida, através do recurso a praticas fraudulentas (grilagem), a intimidagao e a violéncia. O advento do PROALCOOL e a expansio da produgao de cana-de-acticar em 4reas anteriormente voltadas para a agricultura mista deram um novo impeto para a proletarizagdo de sitios familiares de arrendatérios, reforcando a militancia do campesinato e aumentando 0 numero de conflitos violentos por terra. AMAZONIA Como vimos anteriormente, o crescimento através da “‘elaboragdo de perife- rias” e a acumulagto primitiva, excluindo a mao-de-obra do acesso permanente a terra, so pontos centrais na andlise de Oliveira da reprodugdo do /atiftindio em sucessivas fronteiras agricolas. De uma outra perspectiva, a colonizago esponténea de fronteiras pelos posseiros migrantes tem sido encarada como um processo hist6- rico, no qual sucessivamente se reconstituem as condig6es de existéncia da ‘“‘econo- mia camponesa”’. Velho (1976), por exemplo, caracteriza a expansdo da fronteira como uma reproduc&o de um modo de producdo ‘“‘camponés”’ subordinado. A fronteira atrasou o avanco das relacdes capitalistas na agricultura e manteve um campesinato relativamente homogéneo, o qual, sendo-Ihe negada a propriedade dos meios de produgdo, é subordinado ao modo capitalista num processo permanente de apropriag&o do excedente. Essa forma ‘‘fechada’’ de ocupacio da fronteira, em contraste com a via burguesa americana, cria um campesinato inestével em vez dos farmers pioneiros, proprietarios de terras. Este tipo de estrutura social de fronteira é atribuido por Velho aos antecedentes autoritarios e ao carater atual do Estado e do capitalismo no Brasil. Uma das principais dificuldades dessa formulago é que o desenvolvimento histérico das relagdes sociais e das forgas produtivas, sob o capitalismo, nfo € integrado a andlise como principal determinante da mudanga nas formas de estabelecimento da fronteira e de sua periodizac&o. No caso da Amaz6nia, a andlise de Velho (1976) supée, portanto, que 0 processo de colonizagdo siga os padrées convencionais, mantendo-se a articulac&o entre uma agricultura extensiva ¢ o desen. volvimento industrial. Ou seja, a ocupac4o da fronteira continuara a ser caracteri- zada principalmente pela expansdo da agricultura “‘primitiva’” dos colonos camponeses, cujo produto representara uma fonte importante de alimentos baratos para o proletariado urbano. A constancia da dinamica interna da colonizac4o da fronteira e os seus deter- minantes econémicos € também defendida por Foweraker (1981). Muito embora possam emergir formas capitalistas de produc&o em pequena escala, como em certas partes da Amaz6nia hoje, a ocupagdo dessas reas novas tende mais a caracterizar- se pela expansdo de ‘‘ambientes econdmicos subcapitalistas”. A reprodugdo de relagdes sociais ndo-capitalistas na fronteira pioneira é explicada pela continuidade da acumulagao primitiva, e pela relevancia deste proceso na concomitante transfe- 49 réncia do excedente como suporte da acumulagdo capitalista no centro. No caso brasileiro, o ciclo de desenvolvimento da fronteira e o seu processo caracteristico de acumulagéo & reproduzido em fronteiras sucessivas, de modo que a acumu- lag&o capitalista deixa de ser um estagio histérico do desenvolvimento capita- lista para tornar-se um ‘modo hibrido de acumulagdo”’ subordinado ao capi- talismo. Foweraker (1981) coloca ainda que o ciclo da fronteira, marcado pela transi- Go de estruturas sociais ndo-capitalistas para capitalistas, é central para a reprodug&o das condi¢des de acumulacao da agricultura brasileira. Essa transicéo, mediada pela violéncia, pelo sistema legal e pelo aparato do Estado, culmina coma expulso das familias de posseiros e com o estabelecimento da propriedade privada na terra. Havendo terminado o ciclo da acumulacao primitiva, voltam a consolidar- se a estrutura monopolista de propriedade da terra e as relacdes sociais rurais preponderantes. Embora reconhecam os méritos do quadro tracado por Foweraker ao analisar a articulacdo existente entre a acumulagdo de capital agricola e industrial antes dos anos 60, Sorj e Pompermayer (1982) questionam a sua extensibilidade a um periodo mais atual e sobretudo ao caso especifico da Amaz6nia. Esses autores rejeitam a afirmag&o de Foweraker de que os excedentes mobilizados pelos pequenos produ- tores na fronteira pioneira e apropriados pelos capitais comerciais ainda’sejam de importAncia decisiva para o suprimento de alimentacAo urbana. Essa visio dA conta do impacto das recentes estratégias de modernizacdo na elevac&o dos niveis de produg&o e de produtividade em grandes propriedades rurais e em sitios familiares capitalizados, em Areas ha muito ocupadas. Com a consolidagao da agroindistria e com a concomitante modernizacdo do processo de trabalho rural, as fontes inten- sivas de crescimento do produto agregado estAo deslocando rapidamente os padrdes extensivos anteriores baseados na incorporacao de novas fronteiras agricolas. Essa rearticulag&o das relacdes intersetoriais rurais-urbanas relegou, por sua vez, a acumulag4o primitiva para um papel secundario e inferior no processo de acumula- 40 capitalista no Brasil. Por esse motivo, a caracterizacéo de Foweraker das estru- turas sociais rurais em termos do binario complexo /atifindio-minifiindio, tal como ele as situa, também esté mal colocada. Essa caracterizagao nfo dé conta das relagdes sociais heterogéneas que emergem dos processos diferenciais de subordina- ¢4o associados com a expans&o agroindustrial. Além disso, Sorj e Pompermayer (1982) sugerem que o assentamento da fron- teira é cada vez mais determinado pela dinamica da acumulag&o agroindustrial, ¢ no pelos capitais comerciais, o que implica novas caracteristicas para esse processo, Através da mediacéo do Estado, o modo privilegiado de assentamento supde o estabelecimento direto de grandes empresas capitalistas, ultrapassando-se desse modo o estagio anterior de ocupagdo da fronteira por posseiros e pequenos produ- tores de bens primarios. Para Pompermayer (1982), os incentivos fiscais introdu- 2 Incluem-se af a rodovia TransamazOnica e outras estradas de penetrac&o a longa distancia, projetos de fornecimento de energia elétrica diversos programas de desenvolvimento regional, tais como o PRODOESTE, 0 POLOCENTRO, ¢ 0 POLAMAZONIA, implementados entre 1972 ¢ 1979, 50 zidos em meados dos anos 60, reforcados por programas de desenvolvimento regional e por projetos de infra-estrutura de integraco nacional ao longo dos anos 70,2 deram um “‘novo ritmo e uma nova especificidade aos grandes empreendi- mentos na AmazOnia”’ ao atrairem fragdes do moderno capital industrial e agro- industrial. Esses capitais de grandes corpora6es, nacionais e multinacionais, tém utili- zado créditos de investimentos subsidiados para adquirirem grandes extensdes de terras piiblicas, freqientemente vendidas diretamente ou leiloadas a precos pura- mente nominais, para criago de gado, para esquemas privados de colonizacao e para especulacdo.” A presenga dos posseiros tornou-se assim uma complicagao desnecessdria, ao invés de uma vantagem para tais capitais, sobretudo em fungfo da disponibilidade de equipamento pesado para abertura de terras e formagao de pastagens. Em outras palavras, a acumulacdo primitiva baseada na violéncia e nos estratagemas fraudulentos de tomada da terra por parte do grileiro para obten¢&o de titulos legais, corresponde mais claramente, embora nao exclusivamente, aos imperativos dos capitais comerciais tradicionais. Em contraste com esse padréo tradicional, os modernos capitais das grandes corporagdes, acumuladas no Centro- Sul, com o acesso a fundos subsidiados pelo Estado para a compra de terras, inclu- sive com 0 cercamento antecipado de terras até ent&o nao colonizadas, n&o tém na acumulacfo primitiva o seu modus operandi. A ocupacao da Amaz6nia deve ser ainda analisada dentro de um processo de acumulacao capitalista, mas essa relagdo nao é mais integralmente dada pela acumu- lag&o primitiva permanente, como extens&o do ‘ambiente econédmico subcapita- lista’ e como reprodugdo da estrutura social do /atifiindio-minifiindio. De acordo com Pompermayer (1982), os padrdes anteriores de colonizac&o ‘‘horizontais’”’ e extensivos est&o sendo substituidos por um processo simulténeo de colonizac&o da fronteira ¢ de ‘‘expansdo vertical’. Com a entrada dos grandes capitais modernos mediada pelo Estado, a colonizacdo da fronteira passou a estar diretamente integrada 4 reproducdo ampliada da agroindustria, como fonte de suprimento de recursos para fabricas de carne industrializada e de processamento de alimen- tos e constituindo-se em mercado para equipamentos agricolas e para insumos modernos. As estruturas sociais que caracterizam a tradicional fronteira “‘pioneira”’ e a subordinacao a capitais comerciais estAo também sendo transformadas a medida que capitais modernos assumem o controle do processo de colonizacao. Quanto a este aspecto, as principais companhias de colonizacdo, tais como a INDECO ea SINOP na zona Norte de Mato Grosso, introduziram recentemente arranjos de produc&o por contrato com colonos como parte de uma estratégia de integrag&o vertical interna para suprir as suas fabricas de processamento (Pompermayer, 1982). % Embora a aquisicdo de terras para fins especulativos por parte das multinacionais nfo deva ser minimi- zada, isso esté longe de se constituir na forma mais significativa de penetragdo estrangeira na agricultura brasileira. Assim é que os dados do Banco Central indicam, para os anos de 1975. 1979, que o investi- mento estrangeiro anual direto, incluindo o reinvestimento, na agricultura, andou em torno de 50,2 milhdes de délares, em comparac&o com os 543,5 milhdes de délares aplicados apenas na area de proces- samento de alimentos. St A subordinacdo do processo de trabalho rural ao capital financeiro institucional e aos seus critérios técnico-agronémicos também € caracteristico de programas publicos de colonizac3o, como aquele ocorrido em Rond6nia. Uma especializagéo maior na produgo, com a passagem para um nivel de importncia secundaria dos géneros alimenticios em termos do seu interesse comercial, é ativamente enco- rajada por programas de crédito que beneficiam produtos especificos, os quais incluem 0 cacau (CEPLAC), a mandioca (PROALCOOL) e a borracha (PRO- BORRACHA). A “‘expansdo vertical’? associada com a participagdo direta dos capitais industriais, agroindustriais ¢ financeiros no processo de colonizagéo implicaré alteragdes nas formas de representagdo ¢ de luta dos trabalhadores rurais. Por exemplo, a recente mobilizacdo de produtores familiares capitalizadas de arroz na zona Norte de Mato Grosso, que incluiu um acampamento em Brasilia para pressio- nar as autoridades federais e o Congresso a aceitarem as suas exigéncias, foi travada pelas relagdes desfavoraveis entre custos de produgdo, condigdes de crédito para insumos modernos e precos minimos oficiais. Atualmente, no entanto, os conflitos turais detém-se predominantemente na luta dos posseiros pelo acesso permanente a terra, condigéo fundamental para a sua reproduc4o.* Marginalizadas nas suas regides de origem, estas familias de migrantes lutam desesperadamente para evitar um destino semelhante na Amaz6nia, caso faltem canais de representagdo e de parti- cipacdo. Embora sua causa haja sido encampada por setores progressistas da Igreja, a organizacdio dos posseiros e de outros trabalhadores rurais permanece incipiente. localizada e esporddica. Essa situag4o vé-se acentuada pela extensdo e excepcionali- dade dos poderes para intervir nos conflitos de terras que o Estado detém e que lhe foram conferidos pela Lei de Seguranca Nacional,” e pela representac4o poderosa da corporacaéo de grandes capitais obtida na Associacéo dos Empresarios da Amazé6nia.”* CONCLUSAO Neste artigo apresentamos um breve resumo da literatura recente sobre a ‘questo agricola”” no Brasil. A nossa discusso foi seletiva e concentramo-nos nas politicas de modernizagao do Estado ¢ na expansfo agroindustrial como motores principais na redefinig&o do papel da agricultura na acumulac&o capitalista. Em vez 2 Para uma discussdo atual a respeito desses conflitos, incluindo aqueles com populagdes indigenas, com posseiros e com tomadores de terras (grileiros), ver Souza Martins (1980-1981). 25 Tais poderes vém atualmente sendo utilizados nas grandes areas da Amaz6nia, em seqUéncia A criagto, pelo governo federal, em 1980, de dois Grupos Executivos, sob controle do Servigo Nacional de Informs ‘ges, para lidar com os conflitos na regiéo do Araguaia-Tocantins (GETAT) ¢ da bacia do Baixo Amazonas (GEBAM). Esses organismos serfio atualmente subordinados ao Ministerio Extraordindrio para Assuntos Fundidrios, criado em 1982, o qual tem amplo poder de deciso sobre questoes de posse da terra e 0 qual é por sua vez parte integrante do sistema de seguranga nacional. Sobre estas recentes mudangas institucionais nas atividades do Estado, ver Almeida (1982) ¢ a Comissdo Pastoral da Terra. 26 A organizacdo € a estratégia dessa AssociagAo sto discutidas em Pompermayer (1982). 52 de estabelecerem qualquer tipo de “‘tendéncia dominante”’, estas politicas recentes e a apropriacdo agroindustrial mantiveram e até acentuaram a diversidade das relagdes sociais rurais. A nossa critica as diferentes formulagdes que falam de uma “via prussiana”’ de proletarizac&o ou que enfocam a produgo familiar modernizada decorre de uma conceitualizacao alternativa do desenvolvimento agroindustrial: a progressiva apropriacdo do processo de trabalho rural pelos capitais industriais. A dinamica desses capitais num contexto de avangos cientificos ¢ tecnolégicos impede que se estabeleca uma relacdo privilegiada com qualquer estrutura social rural especifica. Conquanto, no limite o desenvolvimento agroindustrial tende a eliminar a produgdo rural, as empresas que empregam mo-de-obra familiar tem demonstrado secularmente uma flexibilidade maior do que as grandes propriedades face a apro- priacdo industrial. No entanto, e mais particularmente no caso brasileiro de “modernizagio conservadora”, a interveng&o do Estado pode criar condigdes favoraveis para uma integracdo das grandes propriedades rurais com a agroindts- tria. Conjunturalmente essa intervenc&o reforga a heterogeneidade das relagdes sociais rurais; apesar disso, sugerimos que a tendéncia intrinseca da apropriacao agroindustrial € no sentido de reconstituir a produg&o rural como industria. A recente agroindustrializacho da populagdo avicola no Brasil é particularmente eluci- dativa nesse aspecto.”” Previne-nos contra concep¢6es essencialistas, nas quais certas formas de produgao e certas relacdes de exploracao do trabalho sao vistas como parceiros privilegiados dos capitais agroindustriais. ‘A contrapartida da integrago cada vez mais complexa da agricultura brasi- Ieira com capitais financeiros institucionais e agroindustriais esté nas diferentes formas de representacdo e de luta presentes entre os produtores rurais diretos. ‘Aqueles processos de integraco vém diferenciando rapidamente as percepedes ¢ as exigéncias dos trabalhadores rurais, opondo-se portanto assim a uma unificagao da luta da classe. , portanto, improvavel que um unico ponto fundamental, tal como © acesso terra e a reforma agraria, unifique e domine a mobilizag&o futura dos trabalhadores rurais. Ao longo da ultima década mais ou menos, tém sido aqueles trabalhadores sobre os quais incide a maior exclus&o do processo de modernizacao, como os trabalhadores volantes e os posseiros da Amaz6nia, os que vém estando na vanguarda dos movimentos de trabalhadores rurais. No entanto, embora as condigdes de reproducdo desses grupos marginalizados se tornem progressivamente mais precarias, as suas formas de representacdo e de mobilizacdo assumirao prova- velmente um papel menos proeminente na organizacao dos trabalhos rurais, com 0 aumento da agroindustrializagao do processo de producAo rural e com o ‘‘fecha- mento”’ da fronteira. O ponto crucial para se iniciar uma andlise dos padres futuros das lutas rurais € dado pelos termos e pelas condic6es de integragio com a agroindustria e pelas contradicdes de seu desenvolvimento atual e futuro. Em resumo, a mobilizac&o e a representacdo assumirao cada vez mais um carater corporativista, com 0 contexto de lutas passando a ser definido a partir do ponto de vista da integragdo a logica da 27 Vide 0 estudo dos casos da transformacao deste setor em Sorj, Pompermayer Coradini (1982). 53 acumulag&o do capital financeiro e agroindustrial. A nossa avaliac&o da importan- cia estratégica da agroindistria na determinacdo das relagdes sociais rurais aponta para que as lutas rurais deverfo deter-se mais em questdes tais como precos, financiamento, custos de producdo e politicas agricolas do Estado, do que em exigéncias de carater global de amplas reformas sociais ¢ institucionais. O volante, 0 béia-fria e © posseiro, embora possam vir a ocupar um espaco na conjuntura politica atual, n&o representam as relacdes sociais futuras da agricultura brasi- leira, constituindo muito mais expressdes da dolorosa transi¢ao no sentido de um processo de trabalho rural capitalizado, subordinado a acumulagao agro- industrial. BIBLIOGRAFIA Alwar, A. C. K. e PeRosa JUNIOR, R. M., “‘Espacos e Limites da Empresa Capitalista na Agricultura’, Revista de Economia Politica, vol. 1, n° 2, 1981, pp. 17-39. ALMEIDA, A. W. B. de, “A Reforma Agraria Localizada ¢ a Politica Regional”, Reforma Agréria, vol. 12, n° 1, 1982, pp. 22-34. BRANT, V. G., “Do Colono ao Béia-Fria"’, Estudos CEBRAP, n° 19, 1977, pp. 39-91. ComissAo PASTORAL DA TERRA, Dentincia: Caso Araguaia-Tocantins, Goidnia, CPT, s.d. CoraDINI, O. L., Produtores, Cooperativismo Empresarial e Multinacionais: O Caso de Trigo e Soja, Rio de Janeiro, Zahar, 1981. 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