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Resumo

Abdome Agudo
Vascular
Resumo de Abdome Agudo Vascular 2

1. Introdução

Síndrome clínica caracterizada por dor abdominal, não traumática, de início


súbito ou intermitente, de intensidade variável, representado pela isquemia
mesentérica ou intestinal resultante de um fornecimento inadequado de oxigênio para
o intestino, que necessita de intervenção médica imediata por ser potencialmente fatal.

Patologia mais comum em idosos, associado a aterosclerose. A isquemia


mesentérica crônica é mais comum em mulheres. A rapidez do diagnóstico está
intrinsecamente ligada ao sucesso do tratamento e prognóstico. A taxa de mortalidade
é elevada, com cerca de 30% nos casos de trombose e 75-80% nos casos de obstrução
arterial atribuído ao diagnóstico tardio.

2. Fisiopatologia
A isquemia mesentérica pode ser aguda ou crônica, mesentérica (acomete o
intestino delgado) ou colônica (acomete o intestino grosso).

As três principais síndromes de isquemia intestinal são:

1. Isquemia colônica (70-75%)

2. Isquemia mesentérica aguda (20-25%)

3. Isquemia mesentérica crônica (5%)

Na isquemia mesentérica aguda, temos também as três principais (imagem 1):

1. Oclusão da Artéria Mesentérica Superior (AMS) por êmbolo (50%) ou trombo


(15-25%)

2. Trombose da Veia Mesentérica Superior (VMS) (5%)

3. Isquemia mesentérica não-oclusiva (20-30%)

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Imagem 1. Malta-Ramirez GA et al. Isquemia mesentérica aguda: urgencia que exige um abordaje diagnóstico integral, 2015.

As regiões mais propensas à isquemia são as áreas pobres em circulação


colateral, como a flexura esplênica e junção retossigmoide.

A lesão intestinal se dá por dois mecanismos:

1. Hipoperfusão com hipóxia: o comprometimento da oferta de oxigênio se dá com


uma redução do fluxo intestinal maior que 50%.

2. Reperfusão: devido a ação de espécie reativas do oxigênio.

De uma forma geral, o intestino consegue compensar até 75% de hipoperfusão por até
12h sem dano substancial, pelo aumento da extração de oxigênio e circulação colateral.

• Se houver manutenção da hipoperfusão, temos: vasoconstricção e redução do


fluxo colateral

• Em alguns casos, mesmo após restauração do fluxo a vasoconstricção é mantida.

A sequência de eventos está resumida no fluxograma abaixo:

↑ extração O2
Sem dano
Hipoperfusão + circulação
substancial
colateral

Vaso constricção Necrose e


Hipoperfusão
+ ↓ fluxo pelas infarto Perfuração
prolongada
colaterais transmural

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• Principais fatores de risco:

o Cirurgia cardiovascular, doença cardíaca (em especial IAM), hemodiálise,


trombofilias, DAOP

o Medicações vasoconstrictoras: constipantes como opiódes,


imunomoduladores, cocaína.

o Má formações arteriovenosas

ISQUEMIA COLÔNICA
• O cólon recebe menor suprimento sanguíneo em relação ao resto do TGI, por isso é
o segmento mais acometido.
• Existem 3 mecanismos principais:
o Isquemia colônica não oclusiva (95% dos casos)
o Oclusão arterial por êmbolos ou trombos – a maioria com isquemia do
intestino delgado concomitantemente.
o Trombose da veia mesentérica
▪ Raramente envolve o cólon

Isquemia da Infarto
Necrose da
mucosa Isquemia transmural Gangrena em
Hipoperfusão camada
superficial prolongada em 8-16 15%
vilosa
em 1 hora horas

• Evolução:
o É mais prevalente em mulheres e deve ser suspeitada em pacientes com dor
em abdome inferior e diarreia ou hematoquezia.

ISQUEMIA MESENTÉRICA AGUDA


Oclusão da AMS
• Por êmbolos: mais comum e costuma ter melhor prognóstico, já que a obstrução
é mais distal do que na trombose, com infartos menos extensos, geralmente
poupando o delgado. Os êmbolos são provenientes de trombos do átrio

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esquerdo, ventrículo esquerdo, valvas cardíacas ou aorta proximal, tendo como


fator de risco IAM, fibrilação atrial ou estenose mitral.

• Por trombos: é devido a doença intrínseca da camada íntima dos vasos, sendo a
aterosclerose o principal fator. Também pode estar associado a doenças do
tecido conectivo, trauma abdominal, sepse ou dissecção de aorta. Pode ser
considerada uma isquemia mesentérica crônica que agudizou.

Isquemia mesentérica não oclusiva:

• Também conhecida como Vasoconstricção mesentérica.

• Decorrente de um grave e prolongado vasoespasmo associado ao uso de drogas


(digitálicos, cocaína) ou doenças sistêmicas graves, como choque, insuficiência
cardíaca grave, sepse, hipóxia grave.

• Se baseia na associação de estados de baixo fluxo sanguíneo e uso de drogas


vasoconstrictoras.

• A ICC é a etiologia isolada mais frequente.

Trombose da VMS:

• Principal causa de isquemia de delgado em pacientes jovens com doenças


cardiovasculares.

• A obstrução aguda do fluxo venoso causa sequestro do fluido intestinal,


hipovolemia e hemoconcentração, gerando vasoconstricção arteriolar e
redução da perfusão intestinal.

Hipotensão
Edema da Transudato
Congestão arterial + ↑ Hipoperfusão
Trombose parede do para o lúmen
vascular viscosidade do segmento
segmento intestinal
sanguínea

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• Pode ser primária ou secundária se tiver associada a algum dos seguintes fatores
(Tríade de Virchow): Estados de hipercoagulabilidade: neoplasias, deficiência de
proteína C e S, policitemia vera, deficiência de antitrombina III, uso de
anticoncepcionais orais, síndrome antifosfolípide.

o Estase venosa: hipertensão portal e ICC

o Lesão venosa direta: pós-operatório de esplenectomia, após trauma


abdominal, sepse.

ISQUEMIA MESENTÉRICA CRÔNICA


• Decorrente de episódios constantes de hipoperfusão, típico de pacientes com
oclusões e estenoses de vasos mesentéricos causados por aterosclerose.

• Outras causas raras são:

o Compressão do tronco celíaco pelo ligamento mediano arqueado


(síndrome da compressão do tronco celíaco), displasia fibromuscular,
dissecção de aorta ou artéria mesentérica, vasculites e fibrose
retroperitoneal.

• Por ser uma doença crônica, o curso insidioso permite a formação de vasos
colaterais

• Os sintomas ocorrem quando duas ou mais artérias estão comprometidas,


apenas 5% decorrem de obstrução completa de uma única artéria.

• É caracterizada pela angina mesentérica ou intestinal nas primeiras horas após


alimentar-se. Temos duas explicações para isso:

1. Desequilíbrio entre a demanda metabólica e fluxo sanguíneo


esplâncnico.

2. Hipoperfusão intestinal devido ao desvio do sangue para o estômago →


teoria mais consistente devido a correlação temporal da dor.

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4. Clínica

As formas de apresentação e gravidade dependem do leito acometido (arterial


ou venoso), grau de obstrução, duração, presença de colaterais e a extensão de vísceras
acometidas. Pode variar desde um quadro súbito (infartos) a quadros de angina
abdominal crônica. Náuseas, vômitos, diarreia e constipação são sintomas variáveis.
Sangramentos podem ocorrem na isquemia mesentérica crônica e na isquemia colônica.

Principal característica: dor abdominal referida é desproporcional ao exame físico.

A tríade da isquemia mesentérica crônica consiste em:

Dor abdominal pós-prandial Aversão a comida Perda de peso

A dor abdominal é bastante variável:

• Início: súbito, indicativo de êmbolos ou trombos em território arterial, ou


insidioso nos casos de trombose da VMS.

• Intensidade: branda, indicativo de isquemia mesentérica não oclusiva, ou


intensa, indicativo de êmbolos ou trombos.

• Localização: localizada ou difusa.

o Epigástrica ou mesogástrica: território da AMS

o Quadrantes inferiores, região retal ou sacral: território da AMI.

o Isquemia colônica: geralmente no lado esquerdo.

Como diferenciar isquemia aguda mesentérica da isquemia colônica?

Características Isquemia aguda do intestino delgado Isquemia aguda do intestino grosso

Idade Variável > 60 anos


Fator precipitante Presente Raro
Estado geral Ruim estado geral Regular estado geral
Dor Severa Moderada, reativo
Sangramento Incomum Retal ou nas fezes

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Exame físico:

• Inicialmente o abdome pode estar normal, com dor leve a moderada.

• Peristalse normal ou aumentada inicialmente - a primeira reação à hipóxia é o


peristaltismo.

• Com a progressão da isquemia, temos:

o Distensão abdominal

o Timpanismo aumentado

o Diminuição dos ruídos hidroaéreos

• Fezes sanguinolentas se necrose

Sinais de choque e peritonite generalizada são achados tardios e indicam mau


prognóstico.

4. Diagnóstico

Qualquer paciente com dor abdominal aguda e acidose metabólica tem isquemia
intestinal até que se prove o contrário!

O diagnóstico precoce depende de: reconhecer população de risco + alto índice


de suspeita clínica.

Os exames laboratoriais são inespecíficos, podendo apresentar leucocitose em


75% dos casos, hemoconcentração, acidose metabólica, elevação do lactato, fosfato
(80% dos casos) e amilase sérica (50% dos casos e não é tão elevado quanto na
pancreatite).

→ Se houver necrose: ↑ LDH, CPK, Fosfatase Alcalina (fração intestinal).

Exames de imagem

Devem ser solicitados nos casos de pacientes estáveis. O exame de primeira


escolha pelo Colégio Americano de Radiologia na emergência é a Tomografia

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computadorizada com contraste de abdome, pois identifica aterosclerose e exclui


outras causas de dor abdominal aguda. Podemos observar nos casos de obstrução
arterial:

✓ Espessamento da parede intestinal e dilatação da víscera

✓ Pneumatose intestinal ou portomesentérica – indica perfuração

✓ Infarto de órgãos sólidos

✓ Falha de enchimento arterial

✓ Oclusão e trombos.

1 2

Imagem 1 e 2: TC com bolhas de ar na


parede do intestino delgado (setas
brancas) e espessamento da parede.

Tendler DA et al. Overview of intestinal ischemia in adults. Uptodate, jul/2018.

Nos casos de trombose da VMS, podemos ver:

✓ Estenose ou oclusão de dois ou mais vasos mesentéricos


✓ Presença de vasos colaterais dilatados
✓ Espessamento e realce da parede intestinal
✓ Ingurgitamento da VMS
✓ Trombo na VMS
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Imagem 3: TC (fase venosa) com defeito


importante do contraste na VMS
(círculo), com aumento da densidade da
gordura mesentérica.

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Imagens 4: TC (fase venosa) com defeito nítido do contraste na VMS (círculo), com oclusão por um trombo. Edema
em íleo (4b) com redução do contraste em sua parede. Ausência de gás livre.

A angiografia é o exame padrão ouro na isquemia mesentérica aguda e crônica,


porém muitas vezes não é necessária devido o diagnóstico pela TC. A vantagem da
angiografia é que pode ser usada de forma terapêutica, por exemplo em uma
abordagem endovascular ou injeção direta de papaverina como vasodilatador. Deve ser
realizado nos casos suspeitados em outros exames de imagem. Além dos achados
vasculares já descritos, podemos encontrar:

✓ “Sinal do menisco”: oclusão abrupta da AMS, visto na oclusão por êmbolos.

✓ Estreitamento na origem dos vasos mesentéricos

✓ Irregularidades nos ramos intestinais

✓ Espasmos das arcadas arteriais

Outros exames disponíveis são:

USG com doppler: também pode ser feito como exame inicial nos casos de isquemia
mesentérica crônica. Possui um valor preditivo negativo acima de 90%.

o Menos utilizado que a TC como exame inicial devido as suas


desvantagens (examinador-dependente, interposição gasosa, cirurgia
abdominal prévia).

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o Síndrome da compressão do tronco celíaco: pode ser avaliada na


inspiração, que verticaliza e move o tronco celíaco para baixo,
descomprimindo-o, observando-se o aumento da velocidade do fluxo.

Colonoscopia: pode ser solicitada nos casos de isquemia colônica para confirmação
diagnóstica. Deve ser feito com insuflação mínima para evitar distensão excessiva e
somente nos casos estáveis, sem sinais de peritonite ou evidência de isquemia
irreversível. Podemos visualizar:

o Edema, eritema, mucosa friável, nódulos hemorrágicos, úlcera linear


única no eixo longitudinal (sugestivo de isquemia).

5. Tratamento
Nos pacientes instáveis, o tratamento não deve ser postergado visando
confirmação diagnóstica com exames de imagem.

Tratamento clínico

O manejo inicial inclui monitorização cardíaca e dos parâmetros ventilatórios,


acesso venoso com reposição volêmica individualizada, correção de distúrbios
hidroeletrolíticos, analgesia e antibiótico venoso de amplo espectro.

o Antibiótico venoso: protege contra translocação bacteriana e reduz inflamação


intestinal por reduzir a flora intestinal.

o Anticoagulantes: nos casos de oclusão arterial ou venosa e em alguns casos de


isquemia mesentérica não oclusiva para evitar a formação de trombos e sua
propagação, exceto nos casos de sangramento ativo.

o A papaverina pode ser utilizada nos casos de vasoconstricção, colocado


diretamente na AMS.

Deve haver suspensão de drogas vasoconstrictoras de uso prévio.

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Tratamento cirúrgico

O tratamento definitivo é cirúrgico e pode ser necessário ressecção das alças


isquemiadas. A exploração cirúrgica está indicada nos casos de:

• Sinais de irritação peritoneal

• Sinais de infarto intestinal em imagem

• Dúvida diagnóstica

5
Imagem 5: isquemia mesentérica aguda
com alça intestinal não viável (seta),
sendo necessário a ressecção.

Pearl G et al. Acute mesenteric arterial occlusion. Uptodate,2018.

Pode ser necessário uma segunda reabordagem (“second look”) em 24-48h para
reavaliar a persistência da isquemia.

Nos casos de oclusão arterial mesentérica:

• Com êmbolos: Laparotomia com embolectomia

• Com trombos: revascularização aberta ou angioplastias com trombólise


endovascular (in situ)

• Revascularização: pode ser tentada em alguns casos – utiliza-se a veia safena.

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Na isquemia mesentérica crônica geralmente o tratamento é conservador visando a


prevenção da progressão da aterosclerose com terapia antiplaquetária e anticoagulação
nos casos de trombos. Porém a revascularização está indicada nos sintomáticos com
estenose importante com o objetivo de prevenir infarto intestinal.

• Opções: revascularização endovascular ou cirurgia aberta, sendo a abordagem


endovascular preferível, com colocação de stent ou não.

• Reestenose: ocorre em 5-15% dos casos, sendo mais comum na revascularização


endovascular, a qual é manejada com angioplastias de repetição.

Referências bibliográficas

1. SABISTON. Tratado de cirurgia: A base biológica da prática cirúrgica moderna. 19.ed.


2. Pearl G et al. Acute mesenteric arterial occlusion. Uptodate, mar/2018. Disponível
em: < http://www.uptodate.com/online>. Acesso em: 13/09/2018.
3. Tendler DA et al. Chronic mesenteric ischemia. Uptodate, dez/2017. Disponível em: <
http://www.uptodate.com/online>. Acesso em: 13/09/2018.
4. Peter G et al. Colonic ischemia. Uptodate, jun/2018. Disponível em: <
http://www.uptodate.com/online>. Acesso em: 13/09/2018.
5. Tendler DA et al. Mesenteric venous thrombosis in adults. Uptodate, out/2017.
Disponível em: < http://www.uptodate.com/online>. Acesso em: 13/09/2018.
6. Tendler DA et al. Nonocclusive mesenteric ischemia. Uptodate, out/2017. Disponível
em: < http://www.uptodate.com/online>. Acesso em: 13/09/2018.
7. Tendler DA et al. Overview of intestinal ischemia in adults. Uptodate, jul/2018.
Disponível em: < http://www.uptodate.com/online>. Acesso em: 13/09/2018.

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