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OLERICULTURA GERAL

PRINCÍPIOS E TÉCNICAS

1 DEFINIÇÃO, ORIGEM E EVOLUÇÃO DA OLERICULTURA


Olericultura é o termo agronômico empregado para designar o cultivo das
plantas conhecidas vulgarmente como hortaliças. O dicionário brasileiro da língua
portuguesa define hortaliças como "Designação vulgar de plantas leguminosas ou de
plantas herbáceas, comestíveis sob a forma de saladas, ensopados, guisados,
condimentos, etc., e que geralmente se cultivam nas hortas: verdura, erva". Por sua vez.
Filgueira (2000) define o mesmo termo como "Grupo de plantas de consistência tenra,
não lenhosa, de ciclo biológico curto, com exigência de tratos culturais intensivos,
cultivadas em áreas menores do que as grandes culturas e utilizadas na alimentação
humana sem exigir prévio preparo industrial". As duas definições são amplas, porém
falham na tentativa de englobar a totalidade das espécies que podem ser classificadas
dentro dessa área da agricultura. O tomateiro, o pimentão e a berinjela, por exemplo, são
plantas semilenhosas, que extrapolam a consistência herbácea. O morangueiro é uma
planta herbácea, porém, tem um ciclo longo, superior a seis meses. O tomateiro
cultivado para produzir frutos destinados a industrialização deixaria de ser uma
hortaliça, de acordo com a segunda definição citada acima. No conjunto das hortaliças,
encontram-se os mais variados produtos vegetais comestíveis, como folhas (alface,
agrião, etc.), caules (aspargo), tubérculos (batata, batata-doce, inhame, etc.), flores
(couve-flor, brócolos), raízes (cenoura, beterraba), sementes (feijão vagem, fava,
ervilha) e frutos (tomate, melão, pepino), que tanto podem ser consumidos in natura
como industrializados. Não existe, portanto, uma classificação estrita das espécies
quanto ao seu caráter hortaliça e, às vezes, uma mesma espécie pode ser classificada em
uma ou mais categorias. Citam-se como exemplos o morangueiro, que tanto pode ser
considerado uma hortaliça como uma frutífera de clima temperado, e o caso da batata,
que é uma hortaliça cujo manejo se aproxima mais daquele praticado nas grandes
culturas de cereais do que propriamente das hortaliças. Por essas razões, em muitos
países, evita-se fazer uma classificação exaustiva e utiliza-se apenas o termo
horticultura para designar conjuntamente o cultivo dessas espécies.
A olericultura é o ramo da agricultura que trata do cultivo das espécies
cujas folhas, flores, caules, raízes ou frutos são consumidos in natura e sem
industrialização. Uma classificação estrita é difícil de ser realizada e o termo
horticultura é geralmente empregado para designar o cultivo dessas espécies.

1.1 Das sociedades primitivas ao mundo contemporâneo


Uma das hipóteses apontadas para explicar a capacidade de adaptação do
homem aos mais distintos ambientes no decurso da evolução da espécie sobre o globo
terrestre faz referência à habilidade em utilizar uma ampla gama de produtos para sua
alimentação. Entretanto, o surgimento da agricultura como atividade econômica esta
ligado basicamente à produção de grãos, principalmente os cereais como o trigo na
Europa, o arroz na Ásia e o milho nas civilizações americanas pré-colombianas.
Naqueles tempos remotos, os grãos podiam ser utilizados tanto para a alimentação
humana como animal e podiam, ainda, ser conservados facilmente pelos meios
tecnológicos rudimentares então existentes. O mesmo já não ocorria com os alimentos
protéicos, cuja disponibilidade dependia da criação previa dos animais, nem sempre
fácil dentro do contexto ambiental existente. A densidade demográfica era baixa, o que
permitia que as frutas e as hortaliças fossem obtidas facilmente na natureza,
dispensando seu cultivo. Além do mais, esses produtos tinham como serio
inconveniente a alta perecibilidade, dificultando ou mesmo impedindo a conservação
por períodos prolongados de tempo. Essa situação perdurou até os tempos modernos. A
falta de tecnologia de conservação dos alimentos pelas baixas temperaturas, combinada
com as condições de vida precárias das populações, obrigava o consumo de farinhas e
alimentos gordurosos, estes últimos como fonte de energia para suportar os rigores do
inverno nas regiões frias. Durante todo esse período, o consumo de frutas e hortaliças
existiu apenas como uma fonte complementar de alimentos, de caráter eventual e
irregular ao longo do tempo.

A falta de tecnologia para a conservação das hortaliças foi o principal fator


que retardou a evolução desse setor, quando comparado aos cereais.

A descoberta das vitaminas e seu papel essencial no metabolismo humano


representou o primeiro passo para o surgimento da horticultura como atividade
econômica. Ficou evidente aos olhos das populações que o consumo apenas de farinhas
e proteínas não era suficiente para uma boa alimentação, tornando-se necessário incluir,
na dieta cotidiana produtos vegetais não cozidos. Entretanto, somente após a segunda
metade do século XX, foi que a horticultura mundial iniciou sua arrancada para tornar-
se um dos setores mais evoluídos da agricultura e também aquele que usa tecnologia
mais sofisticada. Essa mudança foi provocada por, pelo menos, quatro fatores
principais:
– o avanço tecnológico dos meios de conservação dos alimentos pelo
resfriamento e/ou congelamento, o que tornou possível transportar e comercializar
frutas e hortaliças no espaço e no tempo;
– a rápida melhoria das condições de vida das populações, sobretudo na Europa
e na America do Norte, que se urbanizaram e passaram a adquirir, no comércio, os
produtos necessários a sua alimentação, permitindo o surgimento de uma horticultura de
caráter profissional;
– a popularização do uso da energia fóssil para o aquecimento doméstico nos
países desenvolvidos, reduzindo a necessidade de ingerir alimentos de alto valor
energético, como as gorduras, para suportar as baixas temperaturas durante o inverno;
– as descobertas recentes da medicina, apontando a prevalência das hortaliças e
frutas na dieta alimentar como uma condição favorável ao aumento da expectativa de
vida das pessoas.
Esses fatores conjugados induziram uma profunda modificação nos hábitos de
vida e nos padrões culturais da saúde física, cujo referencial passou dos contornos
corporais arredondados dos séculos passados para as formas anoréxicas do final do
século XX. Implicaram também uma transformação radical nos hábitos alimentares das
populações, conferindo a horticultura um novo e importante papel no contexto da
agricultura mundial, como fornecedora de alimentos balanceados e de baixo valor
energético.
A conservação pelo frio e as descobertas da medicina tornaram as hortaliças
um dos principais componentes da dieta das populações no final do século XX.

1.2 O caso do Brasil


A origem e a evolução da Olericultura, no Brasil, está estritamente ligada ao
desenvolvimento econômico e social do país, desde o descobrimento até os dias atuais.
A matriz cultural brasileira foi herdada dos portugueses. No século XVI, a riqueza de
Portugal provinha essencialmente da atividade mercantil, e o desenvolvimento da
navegação não foi propriamente uma escolha, mas uma imposição face à escassez de
recursos naturais no seu pequeno território. Essa mentalidade persistiu após o
descobrimento e colonização do Brasil. A colônia foi destinada a ser, durante séculos,
uma simples fornecedora de matérias-primas de baixo valor agregado ao mercado
europeu. Ao contrario do que ocorreu em outros países colonizados no mesmo período,
principalmente na América do Norte, não houve, no Brasil. a vontade política em
desenvolver uma agricultura voltada aos interesses das populações locais. A alimentação
das camadas sociais nos extratos inferiores da sociedade colonial ficou baseada
essencialmente no consumo de farinhas e produtos locais, abundantes e de baixo custo,
como o feijão e o charque. A cultura mercantilista se refletiu também nos padrões
sociais, que viam, no trabalho manual, uma atividade destinada essencialmente aos
escravos (Ribeiro, 1995). Essa mentalidade estava longe de se compatibilizar com o
esmero e a dedicação exigidos no cultivo das hortaliças. Esses fatores de ordem
econômica e cultural herdados da colonização portuguesa retardaram o surgimento da
Olericultura no Brasil. Durante as primeiras décadas da colonização, predominou o
consumo de hortaliças locais, como o inhame, porque as hortaliças originarias da
Europa ainda não eram cultivadas no País (Melo, 2000).
As primeiras experiências com o cultivo intensivo de hortaliças, no Brasil,
iniciaram com as correntes migratórias de origem não-ibérica. Essas populações eram
oriundas de regiões continentais da Europa, onde a alimentação provinha de uma
atividade agrícola local. Na matriz cultural dessas populações, o consumo de plantas
domésticas se constituía em fator indispensável para a sobrevivência, pois parte da
produção de grãos e/ou outras atividades com valor comercial se destinava as trocas
limitadas que ocorriam dentro de um contexto econômico de subsistência. A estrutura
social dessas populações estava fundamentada na valorização do trabalho e de seus
resultados. Durante esse período, surgem e se expandem as hortas domésticas,
caracterizadas pela diversificação de espécies e baixo volume de entradas no
agrossistema, com objetivos comerciais ainda muito limitados.

A evolução da Olericultura, no Brasil, foi retardada por uma matriz


econômica e social voltada para a exportação. A agricultura de subsistência,
oriunda da imigração recente, deu origem a essa atividade em escala doméstica.
Na primeira metade do século XX. tem início, embora de forma tímida, a
industrialização do Pais, principalmente no estado de São Paulo. A industrialização
desencadeou o processo de êxodo rural e a concentração urbana da população, criando
as condições necessárias para o surgimento de um mercado consumidor de frutas e
hortaliças. Os descendentes de japoneses no estado de São Paulo, oriundos das últimas
correntes imigratórias que chegaram tardiamente para a substituição da mão-de-obra
escrava na lavoura cafeeira, foram um dos primeiros grupos a perceber esse novo
mercado. Tinha origem assim, no Brasil, a Olericultura como atividade econômica, no
estado de São Paulo. Naquela época, as cidades eram de pequeno porte, o valor da terra
relativamente baixo e a produção de hortaliças podia ser feita na periferia das mesmas
cidades para onde a produção era destinada. Surgiam, assim, as hortas comerciais
diversificadas, caracterizadas por um numero ainda elevado de espécies e volume médio
ou alto de entradas no agrossistema. A comercialização dos produtos podia ser feita pelo
próprio produtor, que se apropriava da maior parte dos benefícios econômicos da
atividade. O fenômeno ocorreu primeiramente no estado de São Paulo e expandiu-se
para outros estados, como Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Distrito
Federal e outros.
A industrialização caótica, ocorrida no Brasil na segunda metade do século XX.
provocou forte desorganização social e o conseqüente crescimento desordenado das
grandes cidades. A produção de hortaliças deslocou-se para longe dos centros urbanos,
empurrada pela elevação do valor da terra e pelas difíceis relações sociais que passaram
a se estabelecer na periferia desses centros urbanos. O acesso ao mercado tornou-se
mais difícil, exigindo a presença de intermediários. Surgiam, assim, as hortas comercias
especializadas, caracterizadas pelo cultivo de apenas uma ou poucas espécies e alto
volume de entradas no agrossistema. Uma das conseqüências mais marcantes dessa
etapa foi à perda na apropriação dos benefícios econômicos da atividade pelo produtor
de hortaliças, que se viu obrigado a dividir esses benefícios com vários outros
segmentos intermediários, dentro de um sistema de comercialização desorganizado e
complexo.

A Olericultura, como segmento da economia, surgiu em decorrência da


concentração urbana da população e sofreu as conseqüências da natureza caótica
desse processo social.

1.3 Situação atual e perspectivas para o setor


Embora tenha surgido e evoluído de forma caótica, a industrialização do Pais
mostra tendência a crescer de forma irreversível. Esse processo não ocorre propriamente
por uma opção nacional, mas impulsionado, sobretudo, pela pressão da economia
mundial de caráter globalizante. Paralela à industrialização, ocorre a concentração
populacional, ampliando o mercado consumidor. Esse fato, aliado a mudança dos
hábitos alimentares rumo a um consumo cada vez maior de produtos vegetais, permite
prever um crescimento potencial elevado da demanda por hortaliças nas próximas
décadas. Por outro lado, o abrandamento das fronteiras comerciais entre os países. em
decorrência da globalização da economia, contribui para diminuir a defasagem
tecnológica entre os parceiros comerciais. O produtor de hortaliças se defronta
atualmente com um mercado consumidor cada vez mais exigente e, para atendê-lo,
precisa lançar mão de tecnologias sofisticadas provenientes de países mais avançados.
Como exemplos dessas tecnologias, citam-se o cultivo em ambiente protegido, as
técnicas da fertirrigação, do cultivo em hidroponia, do cultivo em substratos, etc.
Entretanto, nos países em que foram geradas, essas tecnologias foram assimiladas pelos
produtores de forma lento e gradual, no decorrer de períodos relativamente longos de
tempo, superiores a dez anos.
O horticultor brasileiro vê-se, portanto, confrontado com o desafio de assimilar
as mesmas tecnologias em prazos muito menores se quiser se tornar competitivo e
permanecer na atividade. Um dos mais sérios obstáculos para atingir essa meta reside no
baixo grau de escolaridade do produtor nacional, quando comparado com seus colegas
dos países desenvolvidos. Essa característica não é exclusiva do horticultor, ao
contrario, observa-se também na média da população nacional e tem como principal
fator a baixa valorização da educação no decorrer da história passada e presente do Pais.
A elevação do nível educacional do horticultor brasileiro é condição sine qua non para o
avanço tecnológico do setor nos anos vindouros.

Na economia globalizada, a olericultura precisa ser eficiente para atender a


um mercado consumidor cada vez mais exigente e competitivo.

2 OBJETIVOS DA OLERICULTURA NO CONTEXTO ATUAL


2.1 Mercado consumidor
A noção de hábito alimentar indica a repetibilidade de um procedimento no
decorrer do tempo, nesse caso, a ingestão dos alimentos. Para que as frutas e as
hortaliças passem a ser consumidas quotidianamente pela população, passando a fazer
parte do habito alimentar, e fundamental que estejam sempre disponíveis no mercado,
de acordo com as preferências do consumidor.
O objetivo maior da olericultura atual consiste, portanto, em ser capaz de
oferecer ao consumidor hortaliças de boa qualidade durante os doze meses do ano. A
interrupção do fornecimento, em qualquer período do ano, implica em uma ruptura no
hábito alimentar e repercute de forma negativa sobre o consumo, pois as pessoas tendem
a substituir as hortaliças por outros produtos. A importação de regiões distantes, nos
períodos de entressafra local, é uma solução paliativa e de eficiência duvidosa, por duas
razoes principais. A primeira se refere ao preço final mais elevado, que desestimula o
consumo por causar transtornos ao orçamento doméstico do consumidor. A segunda se
refere à qualidade inferior dos produtos oriundos de regiões distantes, que sofrem perda
de qualidade tanto pelas más condições de embalagem e transporte, como pelo longo
período de tempo que transcorre desde a colheita, na lavoura, até o consumo final. Para
exemplificar, tomemos o exemplo do tomate tipo Santa Cruz (Paulista), consumido, no
Rio Grande do Sul, nos meses de inverno. Essa fruta provém de lavouras localizadas no
interior de São Paulo, sendo colhida em fase anterior ao início da maturação, quando
sua consistência é ainda suficientemente elevada para suportar o transporte e a
comercialização. Percorre centenas de quilômetros na carroceria de caminhões sem
refrigeração, ate chegar as prateleiras do varejista quatro ou cinco dias mais tarde. Uma
vez nesse local, os frutos são despejados a granel sobre prateleiras em condições
higiênicas geralmente precárias, sem qualquer embalagem de proteção. Serão, ainda,
revolvidos inúmeras vexes durante o dia pelos consumidores. Uma proporção do
produto estimada em torno de 34% do volume inicial sofrera deterioração precoce e
ficara inapta ao consumo (Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo,
1995). O valor da fração perdida será acrescido ao custo no cálculo do preço praticado
ao consumidor. As péssimas condições de comercialização são um dos fatores
responsáveis pelo baixo consumo de frutas e hortaliças no Brasil, quando comparado
com outros países. Quando a produção é proveniente da mesma região onde é
comercializada, o produto pode ser colhido em fase mais próxima da maturação e passa
por um numero menor de etapas intermediárias até chegar ao consumidor. Por isso, é
geralmente de qualidade mais elevada.
O objetivo máximo da olericultura consiste em produzir com qualidade e
regularidade durante todo o ano.

2.2 Comercialização e abastecimento


O capitulo 1 mostrou que a evolução da produção de hortaliças, nos diferentes
estados do Brasil, ocorreu dentro de contextos econômicos e sociais diferenciados.
Alguns estados como São Paulo e Minas Gerais antecederam os demais no
desenvolvimento da horticultura, criando excedentes de produção. A criação das
Centrais de Abastecimento (CEASAs), nas grandes cidades, permitiu a concentração
desses excedentes e abriu a possibilidade de comercialização em regiões distantes.
Nessas regiões, a escassez de oferta estava associada tanto a falta de tecnologia de
produção como as limitações decorrentes da disponibilidade radiativa, térmica e/ou
hídrica. A diversidade social e climática existente no Brasil ampliou, portanto, o
mercado consumidor de frutas e hortaliças, que podia ser abastecido sem grandes
restrições graças a livre circulação dos produtos entre as diferentes regiões. Atualmente,
as CEASAs se multiplicaram na maioria dos estados da Federação, tanto nas capitais
como nas cidades de médio porte. A produção de hortaliças manteve-se regionalizada,
enquanto o mercado consumidor se estendeu por quase todo o território brasileiro.
A estrutura de comercialização centralizada nas CEASAs trouxe benefícios ao
consumidor, permitindo uma maior regularidade de oferta de hortaliças nos diferentes
períodos do ano. Entretanto, o funcionamento desse sistema engendrou vários aspectos
negativos no decorrer do tempo. Um deles diz respeito à elevação dos preços combinada
à perda de qualidade dos produtos transportados, como foi discutido na seção anterior.
Um segundo aspecto se refere ao aumento da complexidade da cadeia de
comercialização entre o produtor e o consumidor (Figura 1).
Frente às dificuldades em atingir isoladamente grandes volumes de produção a
serem comercializados nas CEASAs, pequenos e médios produtores são obrigados a
vender sua produção a um primeiro agente de comercialização local. Esse agente,
representado, na maioria das vezes, por alguém de origem rural dentro da mesma região,
concentra e transporta o volume de produção de um determinado grupo de produtores.
Na CEASA, esse volume é revendido a um segundo agente, de formação
essencialmente comercial. Um terceiro agente entra em cena para repassar o produto da
CEASA para o mercado varejista local, que representa o último elo entre os dois
extremos da cadeia. Existem, portanto, pelo menos quatro agentes de intermediação.
Considerando-se uma sobretaxa em torno de 30% em cada etapa, o produto final pode
chegar ao consumidor acrescido de até 120%. Essa diferença fica apropriada pelos
agentes de comercialização e representa uma perda econômica para o meio rural.
Um terceiro aspecto negativo do sistema esta associação ao mecanismo de
formação de preços. Os agentes, localizados nas CEASAs, detêm o controle
privilegiado das informações referentes à evolução dos preços entre as diferentes
centrais localizadas nas distintas regiões do País. Trata-se, portanto, de um mercado de
tendência oligopolística, com poder de manipular e estabelecer preços. Os agentes
localizados em uma mesma CEASA competem entre si e esse tipo de mercado tende a
reduzir gradativamente o numero de agentes em concorrência. Com o passar do tempo,
somente os comerciantes mais hábeis permanecem na atividade acentuando o caráter
concentrador desse mercado. Os preços deixam de ser estabelecidos pelas relações
simples entre a oferta e a demanda e podem sofrer aumentos abusivos, com prejuízos
diretos tanto ao produtor como ao consumidor final.

A estrutura atual de comercialização das hortaliças através das CEASAs é


de natureza oligopolística, em que o produtor fica com uma parcela reduzida do
valor agregado.

2.3 Possibilidades tecnológicas


Nas seções anteriores, mostrou-se que a horticultura qual tem por desafio o
fornecimento regular de produtos sadios e de elevada qualidade. Entretanto, para que
esses produtos sejam acessíveis a maioria da população, é fundamental que cheguem ao
mercado em níveis de preços compatíveis com o poder aquisitivo dessa população. A
tecnologia de produção a ser adotada deve, por isso, ser capaz de atender ao trinômio
regularidade, qualidade e preço.
2.3.1 Regularidade de produção
O rendimento final das culturas agrícolas, entre elas as hortaliças, depende
fundamentalmente da radiação solar incidente. A radiação condiciona a sobrevivência e
o crescimento das espécies vegetais e determina a quantidade de biomassa fixada. As
diferentes hortaliças têm exigências radiativas diferenciadas e, por esse motivo, são
classificadas em espécies de inverno ou de verão. As primeiras são aquelas capazes de
crescer com níveis moderados de radiação solar. As espécies de verão, que representam
a maioria das hortaliças cultivadas, exigem níveis elevados de energia solar para
sobreviver, crescer e produzir satisfatoriamente. Para essas plantar, utiliza-se como
referência o nível de radiação solar igual a 8.4 MJ m-2dia-1 (FAO. 1990: Cockshull et al.,
1992). Abaixo desse valor, chamado limite trófico, os assimilados produzidos pela
fotossíntese são insuficientes para suprir a energia necessária para a manutenção das
estruturas vegetais de uma planta adulta. Nessa situação, a planta degrada, em uma
primeira etapa, as suas estruturas vegetativas e transfere esses assimilados para os
frutos, que passam a ter prioridade na repartição da massa seca (Andriolo et al., 1998a,
b). Se a deficiência radiativa persistir, a planta termina por destruir sua estrutura
vegetativa responsável pela fotossíntese e morre. Quando o nível de radiação solar esta
acima do limite trófico, o crescimento e a produção são possíveis. Entretanto, existe um
limite superior de radiação, acima do qual o efeito sobre o crescimento passa a ser
negativo. O valor desse limite ainda não foi claramente estabelecido por resultados de
pesquisa. Porém, em uma estimativa preliminar, pode-se apontar valores acima de 20
MJ m-2 dia-1 como aqueles onde o crescimento das plantas pode ser fortemente
prejudicado. Os efeitos sobre o crescimento não se devem unicamente a radiação, mas
ao efeito combinado da radiação e temperatura do ar. Existe uma relação entre a
evolução desses dois elementos ao longo do ano. Quanto mais elevada for a média de
radiação solar incidente, maiores serão os valores das temperaturas medias do ar (Figura
2).

A disponibilidade de radiação solar é a primeira condição indispensável para o


cultivo das hortaliças durante todo o ano. Por isso, a oferta desses produtos fica
condicionada por esse elemento do ambiente. No planejamento estratégico da produção,
a primeira etapa consiste em efetuar um levantamento da radiação disponível nos doze
meses do ano. Esse estudo serve para indicar os meses em que o cultivo é possível em
um determinado local. Permite, ainda, mostrar as diferenças de potencial de produção
entre diferentes locais e pode ser empregado também como base para o planejamento da
produção em uma grande região, um estado ou mesmo um país, aproveitando diferenças
existentes entre microclimas regionais. O primeiro caso é ilustrado pela Figura 2, que
mostra a disponibilidade radiativa e térmica ao longo do ano na região de Santa Maria.
Observa-se que nessa região existe uma deficiência de radiação solar nos meses de
inverno, que impossibilita o cultivo de hortaliças de verão, como o tomateiro, o pepino e
o meloeiro. Por outro lado, nessa mesma época, a produção dessas culturas pode ser
feita em outras regiões do Estado que não enfrentam a mesma deficiência de radiação,
como é mostrado pela Tabela 1.

O levantamento da disponibilidade de energia solar ao longo do ano é o


primeiro estudo a ser feito para planejar a seqüência de cultivos, tendo em vista
obter a maior regularidade de produção.

2.3.2 Qualidade dos produtos


A qualidade das hortaliças que chegam ao mercado consumidor pode ser
dividida em qualidade fisiológica e sanitária. A primeira diz respeito aos processos
fisiológicos, na planta inteira, que deram origem ao produto final comercializado. Um
produto de elevada qualidade fisiológica é geralmente obtido por culturas isentas de
qualquer estresse durante o seu período de crescimento e desenvolvimento. Essa
situação pode ser definida pelo "conforto vegetal", em analogia ao mundo animal.
Quando um estresse é imposto às plantas, o crescimento é afetado, prejudicando o
aspecto visual do produto. Se o estresse for mais acentuado, são as características
relacionadas com a qualidade que podem ser alteradas, modificando variáveis
organolépticas como o sabor, o aroma, o teor de açúcares e outros. Para exemplificar,
uma planta de alface submetida a um estresse hídrico apresenta folhas pequenas e de
sabor amargo, devido à síntese de látex. Um fruto de tomateiro produzido em condições
de temperatura excessivamente elevada diminui a síntese de licopeno, passando a
apresentar coloração amarelada, e seu sabor fica alterado pela diminuição no teor de
ácidos e açúcares. Nas duas situações, o produto apresenta baixo ou nenhum valor
comercial. E por essa razão que as tecnologias de produção empregadas em horticultura
tendem a se aproximar da máxima eficiência técnica da produção. Essa característica
torna essa área da agricultura diferente das demais, nas quais os objetivos de produção
são norteados principalmente pela busca da máxima eficiência econômica da produção.
Na horticultura, não basta obter volumes de um determinado produto. Esse produto só
terá valor comercial se apresentar uma elevada qualidade fisiológica.
Existe uma situação, porém, na qual o estresse pode aumentar a qualidade
fisiológica das hortaliças. É o caso de algumas espécies que produzem frutos,
especialmente o tomateiro, em que o cultivo em condições salinas reduz o crescimento
vegetativo da planta e o teor de água dos frutos, aumentando, porém, o teor de sólidos
solúveis. Essa técnica vem sendo empregada nos cultivos fora do solo em alguns países
europeus, onde a concentração e a composição da solução nutritiva é ajustada no
decorrer do ciclo de produtivo da cultura, de forma a obter a melhoria da qualidade dos
frutos, sem atingir níveis tóxicos às plantas (Bolarin et al., 2001; Cuartero & Fernandez-
Munoz, 1999; Sonneveld & Welles, 2001).

A qualidade fisiológica é essencial na produção de hortaliças e, para ser


alcançada, os fatores que controlam o crescimento e o desenvolvimento precisam
ser otimizados.

Um segundo fator que repercute fortemente na qualidade fisiológica das


hortaliças que chegam ao consumidor diz respeito às embalagens utilizadas durante o
transporte. A embalagem padrão, ainda empregada no Brasil, é a caixa de madeira,
denominada caixa tipo K. Suas dimensões são de 0,495 m de comprimento, 0,23 m de
largura e 0,355 m de altura. Torna-se difícil descrever virtudes associadas a essa
embalagem, pois seus inconvenientes são múltiplos. A madeira é um material poroso,
que absorve umidade facilmente, permitindo a multiplicação de inúmeros agentes
patogênicos, tanto aos vegetais como aos seres humanos. A desinfestação é uma
operação difícil e também de custo elevado, sendo raramente efetuada. Muitas
hortaliças folhosas são acondicionadas ainda na lavoura para o interior dessas caixas,
muitas vezes em estado de semidecomposição, portando, nas paredes internas, resíduos
de sua utilização anterior e, nas paredes externas, resíduos de solo e/ou outras impurezas
aderidas. Essas hortaliças folhosas serão posteriormente retiradas das caixas e
repassadas ao consumidor, sem qualquer limpeza complementar. Muitas vezes, a caixa é
simplesmente aberta e o produto espalhado a granel sobre as prateleiras, provocando
danos que reduzem seu período de conservação.
Um segundo fator negativo inerente à caixa K é a facilidade de fraudes
comerciais. O volume relativamente grande permite adicionar produtos de qualidade
inferior nas camadas inferiores, e a fraude somente será percebida quando o produto for
exposto ao consumidor. O enchimento feito a granel, na maioria das vezes sem
classificação previa do produto, tenderá a uma redução de volume durante o transporte.
Por esse motivo, é muito comum as caixas serem enchidas com uma camada extra de
produto, que será fortemente pressionada para permitir o seu fechamento. A
conseqüência mais evidente é o amassamento e/ou a deterioração de uma fração
importante dos produtos contidos no seu interior. Uma das causas citadas há anos para
explicar a existência e a continuidade dessa situação aponta o baixo custo da madeira,
quando comparado ao de outros materiais mais higiênicos, como as embalagens
plásticas. Entretanto, essa situação mostra sinais de mudança nos últimos anos, com o
encarecimento tanto da madeira como da mão-de-obra necessária para a fabricação
dessas caixas, aumentando seu custo de aquisição. Se for considerada sua vida útil
relativamente curta, a embalagem de madeira perde competitividade em comparação
aos materiais plásticos. As péssimas condições de embalagem, transporte e
comercialização são um dos fatores que reduzem a qualidade fisiológica das hortaliças
consumidas no Brasil. Como alternativa, são recomendadas as caixas plásticas, com
dimensões variáveis, e a caixa "EMBRAPA". Esta última foi concebida com dimensões
menores, com 0,50 m de comprimento, 0,30 m de largura e apenas 0,23 m de altura,
permitindo reduzir as perdas por danos mecânicos de frutos de tomateiro em
aproximadamente 15% (Luengo et al., 2000).
Uma forma alternativa de comercialização das hortaliças surgiu através dos
produtos minimamente processados, praticada há décadas em países do Hemisfério
Norte. No Brasil. esse segmento tem crescido nos últimos anos, especialmente no centro
do País, prevendo-se forte evolução nas próximas décadas. Uma das principais
vantagens desse processamento é a redução do tempo necessário para o preparo das
hortaliças pelo consumidor domestico.
O processamento mínimo das hortaliças consiste, entre outras operações, na
limpeza prévia, descascamento, fatiamento, picamento, com ou sem adição de produtos
químicos para aumentar sua conservação. A vida útil desses produtos é menor do que
aqueles não processados e essa é uma das razões pelas quais são empregadas
embalagens pequenas, como sacos plásticos ou bandejas de poliestireno. A limpeza é
essencial durante todo o processo e, para preservá-la, os produtos devem ser envoltos
com filme de polietileno específico para embalagens. Diferentes tipos de filme podem
ser empregados, com diferentes permeabilidades aos gases, permitindo modificar de
forma passiva a atmosfera no interior da embalagem, a fim de prolongar a conservação
dos produtos. Outras vantagens são a agregação de valor ao produto e a possibilidade de
comercialização diretamente com as grandes redes de supermercados e/ou atacadistas,
escapando, assim, dos efeitos negativos do circuito de comercialização através das
CEASAs (Durigan & Cassaro, 2000).
A qualidade sanitária das hortaliças depende da presença de agentes ou
substâncias nocivas à saúde do consumidor. Os principais agentes são os
microorganismos vivos responsáveis por doenças contagiosas como o cólera e a hepatite
e, ainda, as zoonoses. A maioria desses agentes provém tanto do solo como de águas
contaminadas, utilizadas na irrigação ou na limpeza das hortaliças. A situação e
altamente preocupante do ponto de vista da população, pois a grande maioria das
hortaliças são consumidas cruas. Uma boa parte da horticultura é praticada próxima a
centros urbanos, onde os esgotos nem sempre passam por um tratamento adequado,
contaminando as águas. Essas águas atingem os arroios e rios, podendo difundir agentes
responsáveis por doenças graves, como o cólera e a leptospirose. No próprio meio rural
onde as hortaliças são produzidas, os princípios de higiene doméstica nem sempre são
observados a risca, podendo afetar sua qualidade sanitária. Na esfera doméstica do
produtor rural, o problema pode ser resolvido pela educação. Porém, no tocante à
contaminação das águas, o problema extrapola os limites da horticultura e somente
poderá ser solucionado pelo engajamento político de toda a sociedade.
O segundo aspecto da qualidade sanitária das hortaliças se refere à ausência de
resíduos químicos, especialmente daqueles empregados para o controle de pragas e
moléstias das culturas. Embora estatísticas oficiais sobre o assunto sejam ainda escassas
no Brasil, pesa sobre as hortaliças uma grande desconfiança por pane do consumidor.
Essa desconfiança provém do uso maciço de produtos químicos tóxicos em quase todas
as etapas de produção da maioria das hortaliças. No caso do tomateiro, por exemplo, em
algumas regiões, são efetuadas entre 30 e 40 aplicações de inseticidas e/ ou fungicidas
em um único ciclo de cultura de aproximadamente 120 dias. Isso significa em torno de
duns aplicações por semana, o que exigiria produtos químicos com período de carência
inferior a dois dias para que esse período pudesse ser respeitado antes da colheita.
Problemas semelhantes também existem com outras culturas, como o morangueiro e a
cenoura. A solução dessa questão depende de fatores sociais e tecnológicos. O primeiro
se refere ao baixo nível educacional do horticultor, que assimilou, durante décadas, uma
cultura voltada ao uso maciço de agrotóxicos na lavoura. A conscientização desse
elemento humano já poderia reduzir os riscos de contaminação das hortaliças. A
segunda se refere ao desenvolvimento de novas tecnologias de produção baseadas no
manejo integrado da planta e do ambiente, segundo uma visão holística da produção
vegetal.

A qualidade sanitária das hortaliças consumidas no Brasil é baixa, porque o


controle tanto da qualidade da água como da presença de resíduos químicos ainda
é pouco efetuado.

O uso exagerado de produtos químicos, na horticultura brasileira, foi induzido


por, pelos menos, três fatores. De um lado, a estratégia comercial das companhias
produtores dessas substâncias químicas, em busca de novos mercados. Por outro, as
dificuldades encontradas pelos produtores para o controle de pragas e doenças por
meios alternativos. As condições climáticas da maioria das regiões brasileiras onde a
horticultura é praticada são muito mais complexas do que aquelas das regiões onde
esses genótipos foram desenvolvidos, em sua grande maioria no Hemisfério Norte.
Conseqüentemente, quando esses genótipos exóticos são expostos à biodiversidade
existente no País, tornam-se muito suscetíveis às pragas e às doenças. Grande parte dos
horticultores brasileiros provém de correntes imigratórias. Inexistia, portanto, na
bagagem cultural coletiva desses produtores, o conhecimento do ambiente físico e
biológico local e das potencialidades de manejo integrado das culturas e do ambiente
nessa nova situação. Esses fatores criaram as condições que a indústria agroquímica
necessitava para disseminar o uso intensivo de agrotóxicos na produção de hortaliças.O
terceiro fator foi o desconhecimento dos efeitos nocivos desses produtos químicos sobre
o organismo pela comunidade cientifica nacional. Varias décadas se passaram até que
essa comunidade tomasse posicionamento sobre a questão e esse retardamento permitiu
que o horticultor assimilasse uma cultura alopática de controle das pragas e doenças das
culturas.

O uso macro de produtos químicos na horticultura ocorreu porque não


havia, no País, uma bagagem cultural e científica capaz de limitar a pressão
comercial da indústria agroquímica sobre esse novo mercado consumidor.

Algumas alternativas tecnológicas podem ser apontadas para a diminuição do


uso de produtos químicos na olericultura a curto prazo:
• Cultivo em ambiente protegido: um dos principais fatores relacionados com a
incidência de moléstias é a elevada umidade, tanto do ar como do solo. Os cultivos
protegidos permitem evitar que a precipitação pluviométrica atinja as plantas e o solo. A
umidade do ar pode ser manejada através da ventilação. O aquecimento do ar também é
uma alternativa que pode ser empregada para esse fim em culturas de elevado valor
comercial. A umidade do solo no interior dos ambientes protegidos pode ser controlada
através do manejo racional da irrigação. As moléstias do sistema radicular de difícil
controle, como, por exemplo, as bactérias do gênero Pseudonomas, podem ser evitadas
através do cultivo fora do solo, eliminando a necessidade de efetuar a desinfestação
periódica do solo. Tomando-se como exemplo a cultura do tomateiro, observa-se que
enquanto no cultivo em ambiente natural são efetuadas até 30 aplicações de produtos
químicos em um único ciclo (Zambolim et al., 2000), a mesma cultura conduzida em
ambiente protegido pode ter as aplicações reduzidas para, no máximo, cinco ou seis,
representando uma diminuição de 80% na utilização desses produtos nocivos a saúde.
No tocante às pragas, sua incidência pode ser prevenida por barreiras mecânicas (telas)
e, quando o controle químico torna-se indispensável, a utilização de produtos
fumigantes é uma alternativa que reduz o impacto negativo sobre a cultura, o
trabalhador e o consumidor.

O cultivo em ambiente protegido é uma das principais técnicas empregada


na maior parte do mundo para proteger as culturas das adversidades climáticas,
pragas e doenças, reduzindo a aplicação de produtos químicos.
• Maneja integrado das culturas: as espécies vegetais, atualmente existentes
sobre o globo terrestre, são o resultado de um longo processo de evolução natural que
vem ocorrendo desde o surgimento da vida sobre o planeta. Esse processo evolutivo
continua a ocorrer e implica em que as diferentes espécies compitam entre si pelos
recursos naturais necessários à continuidade da vida vegetal. O surgimento da
agricultura representou uma quebra nesse processo, pois as espécies de interesse
econômico foram privilegiadas artificialmente pelo manejo do homem, em detrimento
das demais. O advento da agricultura de mercado, baseada no uso intensivo de insumos,
criou a expectativa de que era possível, para as plantas cultivadas, escapar
indefinidamente do processo evolutivo comum a todas as espécies vegetais. O uso
indiscriminado de produtos químicos, ainda praticado nos países subdesenvolvidos,
representa o apogeu desse agrossistema. Entretanto, quanto mais um sistema se
desequilibra maiores são as forças necessárias para restabelecer o equilíbrio.
Conseqüentemente, o uso exagerado de produtos químicos na horticultura potencializou
os desequilíbrios do agrossistema, engendrando a necessidade crescente de sua
utilização. No segmento da produção de hortaliças, essa situação provocou queda na
produtividade e aumento dos custos de produção. No segmento consumidor, a
desconfiança gerada a partir de denúncias nos meios de comunicação de massa induziu
a diminuição do consumo. Esse quadro foi responsável pela busca de novos sistemas de
produção, baseados em relações mais harmônicas entre as culturas e o conjunto do
agrossistema.

O manejo integrado das culturas e do ambiente surgiu pela necessidade de


reduzir custos e de atender a pressão do mercado consumidor por produtos de
maior qualidade sanitária.

Nos países altamente desenvolvidos, onde a escolaridade da população é


elevada, a produção de hortaliças evoluiu para sistemas altamente controlados, com o
uso reduzido de produtos químicos. Esses sistemas são instalados em ambiente
protegido, com controle artificial do ambiente. Dessa forma, as condições ambientais
favoráveis as doenças são evitadas pelo manejo de variáveis como a temperatura e a
higrometria do ar. Os cultivos são realizados sobre substratos isolados do solo, onde as
plantas são fertirrigadas de forma balanceada, tornando-se mais resistentes aos
patógenos. O controle das pragas é efetuado por métodos biológicos, mediante a
distribuição, no interior da cultura, de agentes predadores das pragas, evitando o uso de
produtos químicos. Esses sistemas de produção tornaram-se viáveis, nesses países,
graças à existência de instituições sólidas tanto de pesquisa como de ensino, capazes de
gerar e transmitir eficientemente as novas tecnologias. A mudança de escala tecnológica
ocorreu de forma lenta e gradual, permitindo a popularização dos novos conhecimentos.
Nos países subdesenvolvidos, a escassez crônica de recursos vem acompanhada
por uma atividade intelectual rarefeita e esses dois fatores associados se traduzem em
uma baixa produção científica e tecnológica. O desenvolvimento de agrossistemas
capazes de produzir hortaliças saudáveis, como aqueles que foram desenvolvidos em
outros países, é muito lento nessas condições. Entretanto, as tecnologias geradas
naqueles países são rapidamente repassadas aos demais, mediante forte pressão
comercial. Caracteriza-se, portanto, uma situação em que produtores de baixa
escolaridade se vêem confrontados com tecnologias altamente sofisticadas, para as
quais não estão preparados. Enquanto nos países em que essas tecnologias foram
geradas os produtores dispuseram de tempo suficiente para assimilá-las corretamente,
nos países subdesenvolvidos, essas mesmas tecnologias são adotadas bruscamente, sem
uma previa avaliação e/ou adaptação. Os resultados são, muitas vezes, catastróficos,
originando problemas de ordem econômica, social e sanitária. Um exemplo dessa
situação pode ser constatado em casos recentes da prática da fertirrigação em espécies
hortícolas, nas quais as doses exageradas conduziram à salinização dos solos,
comprometendo tanto a renda dos produtores como a sustentabilidade da produção.

A baixa atividade intelectual associada à baixa escolaridade do produtor


rural são um forte entrave para a evolução qualitativa da olericultura nacional.

2.3.3 A olericultura orgânica


O impacto negativo da introdução brusca de tecnologias importadas gerou a
busca de novas tecnologias de produção, de menor custo e mais integradas ao ambiente.
Uma das alternativas foi o resgate de praticas agrícolas ancestrais praticadas antes do
advento dos produtos agroquímicos. Essas tecnologias são, atualmente empregadas
pelos grupos ligados à produção de hortaliças ditas orgânicas e/ou ecológicas, que
existem em quase todos os estados da Federação.
O princípio fundamental da produção orgânica esta baseado em um enfoque
global e dinâmico das plantas como elementos de um ecossistema maior que interage
através de relações de causa e efeito. Dentro desse enfoque, uma monocultura passa a
ser considerada como um desequilíbrio desse ecossistema, porque um grande número de
indivíduos geneticamente semelhantes predomina em uma determinada área, em
detrimento de outros genótipos e/ou espécies. O surgimento de pragas, doenças e
distúrbios fisiológicos é considerado com uma conseqüência da quebra do equilíbrio
que existia originalmente na natureza entre todas as espécies vegetais. Quando espécies
diferentes coexistem em uma mesma população, a progressão das pragas e moléstias é
mais lenta. De forma semelhante, a utilização dos nutrientes existentes no solo é mais
eficiente, pois espécies diferentes têm necessidades nutricionais diferenciadas,
permitindo que as plantas disponham de um melhor balanceamento dos nutrientes. O
desbalanceamento dos nutrientes no solo interfere no metabolismo da planta, tornando-a
mais suscetível às moléstias e ao ataque das pragas. O termo trofobiose é empregado
para designar o estado de equilíbrio fisiológico de uma planta ou cultura que cresce e se
desenvolve em harmonia com o ambiente formado pela atmosfera, o solo e os outros
seres vivos, animais ou vegetais. Alguns dos princípios básicos da produção orgânica
são os seguintes (Aubert, 1998):
- supressão do use de pesticidas e/ou produtos químicos de cadeia complexa:
- uso exclusivo da adubação orgânica como fonte de nutrientes;
- consórcio de culturas:
- rotação de culturas;
- controle biológico de pragas através de inimigos naturais.
A viabilização da horticultura orgânica, no contexto do século XXI, precisa
superar vários desafios. O primeiro diz respeito ao retorno a uma escala familiar de
produção, baseada na mão-de-obra barata. Nos países periféricos ao sistema econômico
mundial, antes de ser uma exigência, essa condição surge como uma valiosa alternativa
de inserção econômica para uma parcela expressiva da população de baixa escolaridade,
que vem sendo alijada, de forma crescente, da economia formal cada vez mais
competitiva. Nessa categoria, incluem-se os pequenos produtores rurais e também
aqueles assentados pelos programas de reforma agrária. Entretanto, é preciso considerar
que a população humana atual do planeta, da ordem de seis bilhões de pessoas,
constitui, por si só, um desequilíbrio ecológico, o qual induz outros desequilíbrios,
como a produção de alimentos em larga escala. O retorno a sistemas de produção com
nível tecnológico mais baixo significa, geralmente, obter rendimentos inferiores àqueles
obtidos atualmente. Essa situação implica profundos reflexos, tanto no segmento
produtor como consumidor. Rendimentos mais baixos, obtidos com os produtos
orgânicos, podem se traduzir em preços mais elevados aos consumidores, dificultando o
consumo de hortaliças pelas camadas mais pobres da população, que se situa
historicamente abaixo das quantidades recomendadas. Quanto aos produtores, os ganhos
terão que ser divididos entre um número maior de trabalhadores, pois a agricultura de
baixa tecnologia é mais exigente em mão-de-obra. Os produtos orgânicos são na
maioria das vezes, de aparência inferior e isso exige uma mudança nos hábitos
alimentares da população urbana, de forma a valorizar mais a qualidade do que o
aspecto visual. É possível que essa mudança venha a ocorrer a curto prazo, uma vez que
descobertas recentes da medicina apontam as hortaliças cultivadas por métodos naturais
como uma importante fonte de substâncias capazes de prevenir moléstias que afetam as
pessoas (Gerber, 2000).

A viabilização da olericultura orgânica e/ou ecológica depende de profundas


modificações na estrutura agrária atualmente existente no País.

O uso exclusivo da adubação orgânica na olericultura também apresenta algumas


dificuldades operacionais. Se proveniente de estercos, cuidados precisam ser tomados,
pois a criação de animais com alta tecnologia, como, por exemplo, em confinamentos,
faz uso de medicamentos e/ou produtos químicos que podem contaminar as hortaliças
produzidas. Nesse caso, somente os estercos de animais criados extensivamente
poderiam ser utilizados, criando dificuldades para a coleta do material em grande escala.
Outra alternativa seria a utilização de palhas e/ou resíduos vegetais para o método da
compostagem orgânica. Nesse caso, os materiais orgânicos seriam provenientes de áreas
anexas, as quais necessitariam da adição de nutrientes externos para a produção de
biomassa. O uso de fertilizantes químicos seria simplesmente transferido da olericultura
para outros setores da agricultura, contrariando os princípios da agricultura sustentável.
Quanto ao uso de resíduos urbanos na compostagem, seu emprego depende do controle
da presença de metais pesados nocivos à saúde (Pb, Cd. Cr. Hg e outros), os quais
podem ser absorvidos pelas plantar (Melo et al., 2000).
Um segundo desafio diz respeito à obtenção de uma produção regular de
hortaliças saudáveis, capaz de consolidar a horticultura orgânica como um hábito de
consumo para a população urbana. No caso de adversidades climáticas e/ou do
surgimento de pragas e moléstias que fogem do controle pelos métodos ancestrais, o
apelo aos insumos químicos representaria uma quebra de confiança perante o
consumidor. Um dilema então se estabeleceria, a ser resolvido sob o risco da perda da
produção ou do mercado.
Um terceiro fator provém da necessidade de desenvolver novas tecnologias de
produção dentro desses princípios. A contraposição de uma horticultura orgânica a uma
outra química se originou porque as instituições de pesquisa e ensino não conseguiram
adaptar corretamente as tecnologias importadas e é pouco provável que essas mesmas
instituições venham a ser capazes de criar, com a rapidez necessária, as formas
alternativas de produção requeridas pela horticultura orgânica. É provável que essas
correntes aparentemente antagônicas venham a evoluir nos próximos anos rumo a uma
tecnologia integrada de produção, semelhante àquela praticada atualmente nos países do
Hemisfério Norte, especialmente da Europa. A fisiologia das espécies de hortaliças é
regida por processos que dependem das condições de cultivo. As possibilidades de
modificação desses processos para adaptá-los às condições de cultivo são muito
limitadas. Na olericultura, são as condições de cultivo que devem ser adaptadas à
fisiologia das culturas. Uma combinação de técnicas como a proteção do ambiente,
manejo correto da água e dos nutrientes, uso de controle biológico, etc., seria capaz de
em um primeiro momento, reduzir o impacto negativo das tecnologias importadas e
produzir hortaliças de qualidade sanitária aceitável. Entretanto, é importante salientar
que para a concretização das possibilidades apontadas é indispensável uma profunda
mudança na mentalidade de produtores e consumidores.

Para tornar-se uma alternativa viável para suprir a demanda global de


hortaliças, a olericultura orgânica e/ou ecológica necessita desenvolver tecnologias
de produção mais complexas do que aquelas já desenvolvidas até o momento atual.

3 PROPAGAÇÃO DAS HORTALIÇAS


A moderna fisiologia da produção das hortaliças concebe uma cultura de forma
semelhante a uma unidade industrial de produção em série. Cada uma das plantas que
faz parte da cultura representa uma linha de produção individual, que passa por todas as
etapas, desde o recebimento da matéria-prima (CO 2), a gestão do sistema (radiação,
temperatura, etc.) até o produto final com valor comercial agregado. A eficiência da
produção depende da eficiência individual do conjunto das n plantas que compõem a
cultura. Por esse motivo, o rendimento máximo somente será obtido quando todas as
plantas da cultura estiverem operando em sua capacidade máxima de produção. Plantas
eficientes somente poderão ser obtidas de sementes e mudas de alta qualidade e, por
esse motivo, a etapa de propagação é condicionante da performance da cultura.
A grande maioria das hortaliças é propagada por sementes. Nesse grupo,
incluem-se variedades de polinização livre, cultivares e híbridos simples ou duplos,
permitindo a produção comercial de sementes de elevada qualidade genética. A
propagação assexuada é empregada para um pequeno número de culturas, formadas por
híbridos interespecíficos de ploidia elevada (morangueiro) ou caracterizadas por
limitações fisiológicas que dificultam ou impedem a produção de sementes (alho).
3.1 Fatores condicionantes da germinação
A germinação das hortaliças é condicionada pela temperatura e umidade, embora
algumas espécies, como a alface, sofram a influência da radiação. A temperatura ótima
para a germinação varia de uma espécie para outra (Tabela 2). Quanto à umidade, as
exigências variam de acordo com as espécies. As cucurbitáceas germinam bem com
baixa umidade, próxima ao ponto de murcha permanente (PMP), enquanto a alface,
chicória e beterraba exigem um teor de umidade 50% acima do PMP (Minami, 1995).
Atualmente, a semeadura das hortaliças é feita predominantemente em substratos. No
caso de substratos com espaço poroso total não inferior a 0,75 mL mL -1, a germinação é
adequada quando o teor de água estiver dentro da fração facilmente utilizável (Gras,
1987; Andriolo, 1999; Marfà & Guri, 1999). As sementes das hortaliças são, na maioria,
de pequeno porte, razão pela qual tem poucas reservas, exigindo que as condições para
germinação sejam otimizadas a fim de assegurar a emergência e produção de mudas de
alto vigor. A etapa de produção de mudas é uma fase distinta dentro do ciclo de
produção e deve ser feita em condições especiais e por produtores especializados.
3.2 Semeadura indireta
A qualidade fisiológica das hortaliças somente pode ser obtida quando a planta
estiver livre da ocorrência de períodos de estresse durante o seu ciclo de crescimento e
desenvolvimento. O transplante das mudas é um fator de estresse. Por esse motivo, do
ponto de vista fisiológico, a semeadura direta seria preferível à indireta. Entretanto,
diversos fatores, descritos a seguir, dificultam sua utilização na prática:
• O tamanho reduzido da maioria das sementes de hortaliças: o tamanho de uma
semente tem relação com a quantidade de reservas energéticas que ela possui. Essas
reservas se destinam a suprir a energia necessária para a germinação e emergência, até
que as folhas estejam aptas a obtê-la pela fotossíntese. Sementes de pequeno porte
devem ser semeadas a pequena profundidade (menos de 0,015 m), a fim de facilitar a
emergência. Conseqüentemente, a camada superficial do solo deve estar isenta de
torrões e/ou partículas muito grosseiras. A pequena camada de solo que recobre as
sementes perde água com muita facilidade, exigindo irrigações freqüentes para evitar
sua desidratação, tanto na fase de germinação como no período de crescimento das
plântulas. Esse manejo intensivo é difícil de ser feito no campo, em grandes áreas, ou
em locais afastados da residência do horticultor;
• O alto custo das sementes com elevado padrão genético: o valor agregado das
sementes de algumas hortaliças é dos mais elevados no conjunto das espécies de
interesse agrícola. Sementes de híbridos transgênicos têm geralmente cotação
internacional, podendo atingir, atualmente, preços superiores a US$ 0,10 a unidade, ou
seja. US$ 100.00 a cartela contendo mil unidades. Sementes com esse valor não podem
ser desperdiçadas e essa é uma das razões pelas quais as condições para a germinação,
emergência e crescimento precisam ser otimizadas. Para tal, devem ser empregadas
instalações e equipamentos especiais, com controle da radiação solar, temperatura do ar
e do meio radicular, umidade e nutrição mineral;
• A densidade de plantas a ser mantida na lavoura: muitas hortaliças de porte
médio ou alto têm sementes de pequeno tamanho. Um exemplo é o tomateiro cujas
sementes são pequenas e a população de plantas a utilizar na lavoura se situa
normalmente entre 2,5 e 3 plantas m-2. Torna se difícil, nesse caso, realizar a semeadura
direta sem um grande desperdício de sementes, havendo ainda a necessidade de efetuar,
posteriormente, um desbaste rigoroso das plântulas em excesso. Maquinas para realizar
a semeadura mecânica existem apenas para um número reduzido de espécies, como a
cenoura, por exemplo. Uma alternativa para permitir a semeadura mecânica de sementes
de pequeno tamanho seria a peletização, porém, esse processo aumenta o valor agregado
e ainda é pouco empregado na produção de sementes de hortaliças.

A semeadura indireta é o método de propagação empregado para a maior


parte das espécies de hortaliças propagadas por sementes.

3.3 Semeadura direta


A semeadura direta de hortaliças é empregada nos seguintes casos:
• Hortaliças tuberosas: quando as raízes de uma plântula são injuriadas ou
rompidas, o sistema radicular que se desenvolvera posteriormente poderá modificar sua
anatomia. Um sistema radicular tipo axial poderá se transformar em fasciculado. Esse
fato tem profundas implicações em hortaliças cuja parte comestível são as raízes. Uma
planta de beterraba, submetida ao transplante, poderá apresentar uma intensa
proliferação de raízes secundárias, embora seu sistema radicular normal seja do tipo
axial. No caso da cenoura, ramificações, bifurcações, rugosidades e mesmo
tortuosidades podem ocorrer em plantas transplantadas. Por esse motivo, espécies com
raízes comestíveis utilizam a semeadura direta (cenoura, beterraba, rabanete, nabo,
almeirão de raiz):
• Hortaliças com rápida suberificação das raízes: quando uma planta jovem é
submetida ao transplante com raiz nua, a maior parte dos pelos radiculares se rompem e
ficam presos ao solo de origem. A absorção de água pela planta, no período subseqüente
ao transplante, precisa, por isso, ser feita pelas raízes remanescentes, com idade
fisiológica mais avançada. Entretanto, à medida que as raízes crescem, sua parede
celular passa por um processo de suberificação, isolando o meio interno do exterior da
raiz. Esse fenômeno é um mecanismo adaptativo natural destinado a evitar que a água
absorvida pelos pêlos absorventes seja perdida ao longo da superfície da raiz, por
difusão para o meio externo (Figura 3). Entretanto, a rapidez com a qual a suberificação
ocorre varia de uma espécie para outra e depende também da velocidade de emissão e
crescimento de novas raízes. Espécies de crescimento radicular lento podem, portanto,
sucumbir por desidratação nos dias posteriores ao transplante, porque seu sistema
radicular não consegue absorver água nos volumes necessários para atender à demanda
hídrica da plântula. Espécies desse tipo são multiplicadas por semeadura direta, ou por
métodos de produção de mudas que preservem a integridade física do sistema radicular.
Dentro desse grupo se enquadram as cucurbitáceas como o pepino, o meloeiro, a
moranga e as abóboras, assim como o feijão vagem e a ervilha.

A decisão sobre o emprego da semeadura direta ou indireta depende de


critérios fisiológicos e também econômicos.

3.4 Métodos de produção de mudas


3.4.1 Propagação sexuada
O objetivo maior da produção de mudas de hortaliças consiste em: i) obter
plântulas de alto vigor; ii) sadias e iii) produzidas no mais curto espaço de tempo
possível. Para atingi-lo, o manejo deve ser realizado de forma a evitar estresses durante
o período de crescimento. Por essa razão, a produção de mudas propagadas por
sementes deve ser realizada em ambientes protegidos, em condições assépticas e com
controle da temperatura e umidade do ar.
• Acondicionamento: para efetuar a semeadura, empregam-se normalmente
bandejas de poliestireno. As dimensões podem variar de um fabricante para outro, sendo
as mais comuns de 0,40 m de largura e 0,70 m de comprimento. A superfície dessas
bandejas é subdividida em alvéolos, cujo número pode variar desde aproximadamente
72 até 288 por bandeja. Em quase todos os países do mundo, são empregadas bandejas
desse tipo para a produção de mudas de hortaliças. As principais razões são o fato de
serem leves, de baixo custo e permitirem a limpeza e desinfestação com facilidade. O
formato dos alvéolos é piramidal, com a extremidade inferior perfurada, a fim de
assegurar a livre drenagem da água fornecida em excesso pela irrigação. As principais
vantagens oferecidas por essas bandejas são o baixo peso, a facilidade de limpeza e
desinfestação e a praticidade de transporte e manuseio das mudas por ocasião do
transplante.
• Assepsia: o local destinado a produção de mudas deve ser o mais asséptico
possível, a fim de reduzir os riscos de contaminação por pragas e/ou moléstias. A
desinfestação das bandejas, antes de cada semeadura, pode ser feita por imersão em
solução de hipoclorito de sódio (1% p.a.) ou de formol (3% p.a.) (CTIFL, 1995c). O
sulfato de cobre pode ser empregado com a vantagem adicional de reduzir a aderência
das raízes à superfície interna dos alvéolos, facilitando, posteriormente, a operação de
retirada das mudas. No interior do ambiente protegido, a superfície do solo deve ser
revestida preferencialmente por brita, a fim de permitir a rápida drenagem da água e
facilitar o controle da umidade do ar. Deve também ser mantida isenta de toda e
qualquer vegetação hospedeira de pragas e/ou patógenos. As superfícies de ventilação
devem ser protegidas por telas antiinsetos, a fim de manter afastadas as pragas
responsáveis pela transmissão de viroses. Recomendam-se pedilúvios nas entradas e o
acesso deve ficar restrito ao pessoal encarregado de realizar o manejo.
É conveniente que o substrato a ser empregado seja previamente desinfestado.
Muitas empresas especializadas na fabricação de substratos agrícolas fazem essa
operação previamente à comercialização. Quando isso não é realizado, o produtor de
mudas pode faze-1o. Os métodos mais simples que podem ser empregados para tal são
o uso do vapor e a solarização. O uso de calor seco deve ser feito com cuidado, porque
pode provocar combustão da fração orgânica, alterando as características físicas do
material. O uso do vapor é difícil e oneroso, porque exige a produção do vapor e sua
distribuição no interior do substrato, o qual deve ser disposto em finas camadas.
Equipamentos simples para a desinfestação do solo através do vapor foram
desenvolvidos, nos quais o vapor é produzido no interior de uma caldeira metálica,
empregando lenha ou gás como fonte energética para o aquecimento (Esteves. 2000;
Silva et al., 2001) (Figura 4). O vapor é conduzido até o interior de um túnel baixo de
polietileno de baixa densidade (Pebd), onde se encontra o material a desinfestar. Outra
alternativa consiste em empregar a solarização clássica, nos meses de verão (Streck et
al., 1996: Medeiros, 2000). Esse método é de baixo custo, porém depende da ocorrência
de dias com elevada insolação. Nos períodos ou anos de baixa insolação, sua eficiência
é baixa.

• Manejo c/a temperatura. Quando as temperaturas do ar se situam em valores


inferiores aqueles considerados ótimos para cada espécie, o aquecimento artificial deve
ser empregado. Os métodos mais simples que podem ser empregados são o aquecimento
elétrico ou por combustão gasosa. O primeiro pode ser constituído por resistências
elétricas, instaladas sobre uma mesa de germinação, controladas por um termostato
(Figura 5). Uma camada de areia úmida deve ser mantida entre as resistências e o fundo
das bandejas, a fim de transmitir o calor ate o substrato. Pode também ser constituído
por lâmpadas incandescentes instaladas sob as bandejas (Beckett, 1981). A combustão
gasosa pode ser feita mediante o uso de gás de cozinha (butano), localizando os
queimadores sob as bandejas. Equipamentos especiais dotados de termostato podem ser
empregados, capazes de funcionar de forma automática. Para aumentar a eficiência do
aquecimento e reduzir simultaneamente os custos, as bandejas podem ser superpostas
umas sobre as outras e, a seguir, envoltas por um filme de polietileno até o início da
emergências das mudas.
Nesse caso, Basta aquecer o ar contido sob o filme que envolve as bandejas.
Outra alternativa consiste em instalar um túnel baixo sobre os estrados que contêm as
bandejas, a fim de concentrar o ar quente próximo delas, reduzindo seu movimento
ascendente por convecção. Após a emergência, o filme plástico deve ser imediatamente
retirado, a fim de evitar o estiolamento das mudas. O teor mais adequado de umidade do
ar, a fim de reduzir os riscos de moléstias, situa-se próximo de 80% (CTIFL, 1995a). É
possível manejar a umidade do ar associando-se aquecimento e ventilação
simultaneamente. Quanto à umidade do substrato, o teor de água deve ser mantido
sempre próximo da capacidade máxima de retenção de água. Porém, o teor de umidade
tanto do ar como do substrato deve ser reduzido alguns dias antes do transplante, a fim
de tornar as mudas mais resistentes ao manuseio e a desidratação e para obter uma
proporção elevada de pegamento. O teor de umidade do ar a ser mantido nessa última
fase da produção de mudas situa-se em torno de 40%, e a irrigação é efetuada somente
aos primeiros sinais de murchamento das plântulas (Bakker, 1991).
Nos períodos quentes do ano, a nebulização e a ventilação podem ser
empregadas para efetuar o controle simultâneo da temperatura e da umidade do ar. A
microaspersão é uma técnica que pode ser utilizada para espécies e/ou períodos em que
o risco de moléstias e baixo.

Um método adequado de produção de mudas deve ser capaz de produzir


plântulas vigorosas e sadias no mais curto período de tempo possível.

Os principais métodos de irrigação de mudas de hortaliças são a microaspersão,


a flutuação das bandejas (float, floating) e a inundação subsuperficial (Figuras 6 e 7).
Cada um desses três métodos apresenta vantagens e inconveniências, que devem ser
avaliadas no momento da tomada de decisão:
• Microaspersão: nesse método, as bandejas são dispostas linearmente sobre
estrados, e o fornecimento de água é efetuado por um sistema de irrigação por
microaspersão instalado sobre as bandejas (Figura 6). O volume de água excedente à
capacidade de retenção do substrato é drenado pelos orifícios existentes na superfície
inferior das bandejas. A freqüência das irrigações é determinada em função da ETP. O
acionamento da irrigação pode ser feito de forma automática, empregando-se
dispositivos semelhantes aqueles utilizados no manejo das culturas em substrato
(Cortés, 1999). O maior inconveniente desse método é o molhamento da parte aérea das
mudas, que aumenta o risco de ocorrência de moléstias. Nos períodos do ano em que a
demanda hídrica e elevada, esse método apresenta ainda o inconveniente de intensificar
a lixiviação dos nutrientes contidos no substrato. Por isso, a fertirrigação periódica das
mudas é quase obrigatória quando esse método é empregado. Entre duas irrigações
sucessivas, a disponibilidade de água às mudas flutua entre os limites representados
pelo volume máximo de água disponível na capacidade máxima de retenção pelo
substrato e valores de tensão negativos situados no limite inferior da água utilizável
(Gras, 1987: Andriolo. 2000).
• Flutuação: quando esse método e empregado, a semeadura também é efetuada
em substrato agrícola acondicionado em bandejas de poliestireno. Após a semeadura, as
bandejas são instaladas na superfície de reservatórios rasos de água, com profundidade
geralmente inferior a 0,20 m.
O reservatório é, em seguida, enchido com um determinado volume de água, de
forma que as bandejas permaneçam flutuando sobre a superfície liquida até que as
mudas atinjam o estádio de transplante (Figura 6). O nível da água dentro do
reservatório é mantido constante através de um sistema de bóia conectado a uma caixa
d'água. O espaço entre as bandejas e as paredes do reservatório deve ser
cuidadosamente vedado para evitar a entrada de luz no seu interior. As principais
vantagens desse método são a economia de água e mão-de-obra. Os maiores
inconvenientes são o baixo teor de oxigênio no meio radicular, favorável a ocorrência
de moléstias e, ainda, o crescimento exagerado das raízes no interior do reservatório. O
crescimento das algas será facilitado se houver entrada de luz no reservatório e não
ocorrer, neste, a renovação da água. Algumas espécies toleram a adição de fungicidas
cúpricos na água, a fim de reduzir simultaneamente o crescimento das raízes e a
proliferação de algas. Porém, outras sofrem fitotoxicidade, quando expostas a esses
produtos, inibindo o crescimento. O fato de as mudas crescerem sem déficit hídrico
torna-as menos resistentes ao estresse hídrico por ocasião do plantio. Isso pode acarretar
perdas elevadas de mudas, principalmente quando o plantio é feito no campo. Uma
forma de minimizar esse problema é o emprego de outros métodos de irrigação nos dias
que antecedem o plantio das mudas.
• Inundação subsuperficial: esse sistema é semelhante ao anterior, empregando
também bandejas de poliestireno com substrato agrícola. Porém, as bandejas são
apoiadas sobre suportes a uma certa altura do fundo do reservatório, de forma a evitar o
contato da superfície inferior das bandejas com a água, entre as irrigações sucessivas.
Para efetuar a irrigação das mudas, o reservatório é enchido de água. A água flui através
dos orifícios existentes na superfície inferior dos alvéolos. Alguns minutos apos o
enchimento do reservatório e a saturação do substrato ter sido atingida, a água é drenada
pela pane inferior do mesmo. A drenagem pode ser controlada por eletroválvulas ou
mediante um ajuste entre os fluxos de entrada e de saída da água, de forma a aumentar o
intervalo de tempo necessário para o esvaziamento completo do reservatório. A
freqüência das irrigações é determinada de forma semelhante ao método anterior e o
acionamento da bomba pode ser facilmente automatizado com o auxílio de um
programador horário. A água drenada é recolhida e reutilizada. Esse método combina as
vantagens do método anterior, preservando a aeração das raízes. Em experimentos
efetuados na Universidade Federal de Santa Maria, a inundação subsuperficial
demonstrou ser o método mais favorável ao crescimento de mudas de tomateiro e
meloeiro durante os meses de verão, quando a demanda hídrica é elevada (Figural 6, 7 e
8).
A escolha do método de produção de mudas depende da espécie, da época
do ano e dos objetivos de qualidade pretendidos.

3.4.2 Propagação assexuada


O principal objetivo da propagação vegetativa consiste em preservar a
constituição genética do material vegetal, evitando toda e qualquer recombinação
gênica. Trata-se, portanto, da multiplicação de tecidos vivos, os quais devem regenerar
plantas com potencial de produção semelhante aos materiais que lhes deram origem.
O principal problema associado à multiplicação vegetativa das hortaliças é a
qualidade sanitária das mudas. No decorrer do seu ciclo de vida, um vegetal sofre
interações com uma diversidade de agentes parasitários. Muitos desses agentes são
"filtrados" pelas etapas da meiose, formando sementes livres da maior parte deles. Essas
etapas não ocorrem na propagação assexuada e as partes propagadas tendem a
potencializar os agentes parasitários extra e intracelulares preexistentes nas plantas de
origem. Entre os maiores problemas dessa natureza envolvendo espécies de hortaliças,
podem ser citadas as viroses do morangueiro, da batata e do alho e também os
nematóides dos bulbilhos do alho. Por essa razão, a primeira etapa da propagação
vegetativa consiste na limpeza do material vegetal.
A técnica mais empregada para efetuar a limpeza biológica das hortaliças de
propagação vegetativa é a cultura de tecidos. Através desta técnica as plantas são
regeneradas a partir de explantes de tecidos em forte crescimento ativo da planta matriz.
Nesses tecidos, os agentes patogênicos ainda não se desenvolveram ou estão presentes
em concentração muito baixa. As plantas regeneradas por meio dessa técnica são
submetidas a varias gerações de multiplicação vegetativa, até dar origem às mudas
comerciais. Um exemplo desse processo é mostrado esquematicamente na Figura 9, que
resume as etapas de produção de mudas de morangueiro.

A propagação vegetativa realizada sem tecnologia adequada pode induzir à


potencializarão das pragas e moléstias da cultura.

3.3 Transplante, repicagem e plantio


As mudas produzidas pelos métodos descritos anteriormente devem ser
transferidas para a lavoura definitiva, onde obedecerão a um arranjo espacial e a uma
densidade de plantas considerados ótimos para cada espécie. Quando as mudas são
arrancadas do solo e/ou do substrato onde germinaram e são transferidas para a lavoura
definitiva com raízes nuas, é usado o termo transplante para designar essa operação.
Quando essas mudas são transferidas sem serem arrancadas, ficando com as raízes
envoltas no solo e/ou no substrato, é usado, preferencialmente, o termo plantio.
Existem, porém, situações em que é conveniente transferir as mudas para um local
intermediário entre aquele onde foram semeadas e a lavoura definitiva. Trata-se de um
local temporário, no qual as mudas permanecerão ate atingir um estádio mais adequado
para o transplante ou plantio definitivo. Essa operação se denomina repicagem e o local
onde as mudas permanecem durante esse período denomina-se viveiro.
A repicagem de mudas de hortaliças é empregada sobretudo em duas situações.
A primeira diz respeito a uma etapa intermediária na multiplicação de mudas matrizes
como, por exemplo, o morangueiro. As mudas matrizes dessa espécie são multiplicadas
em viveiro por várias gerações, a fim de obter maior rendimento de mudas comerciais.
A segunda situação em que a repicagem é empregada surge quando se deseja obter um
maior crescimento das mudas antes de transferi-las para a lavoura definitiva. Nas
bandejas onde é feita a semeadura, a densidade das mudas é elevada e, por esse motivo.
devem ser repicadas, transplantadas ou plantadas até a fase de seis folhas definitivas, a
fim de evitar que a competição interfira no seu crescimento. No viveiro, essas mudas
são dispostas em densidade e arranjo mais favoráveis a um crescimento equilibrado
entre os órgãos, ali permanecendo por um período adicional antes que a competição e o
estiolamento passem a ocorrer. Embora a densidade de plantas empregada no viveiro
seja maior do que aquela existente anteriormente nas bandejas é ainda bem menor do
que aquela que será adotada na lavoura definitiva. A área ocupada pelas mudas no
viveiro é inferior aquela da lavoura e, por esse motivo, é possível reduzir os custos de
manejo de variáveis ambientais como a radiação e a temperatura. Essa situação é muito
comum nos cultivos protegidos, quando as mudas são produzidas em épocas pouco
favoráveis ao crescimento das plantas na fase adulta. Com o uso desse método é
possível produzir mudas mais precocemente, as quais serão transferidas para a lavoura
de produção na fase de emissão da primeira inflorescência. Nesse estádio, as plantas
desuniformes podem ser melhor identificadas e descartadas, dando origem a uma
lavoura mais uniforme e, conseqüentemente, como maior rendimento. Com esse
procedimento, é possível reduzir o período de tempo entre a implantação da lavoura
definitiva e o início da colheita.

A repicagem no viveiro é uma técnica que permite produzir mudas


precocemente e reduzir o período entre o plantio e o inicio da colheita.

4 SISTEMAS DE PRODUÇÃO DE HORTALIÇAS


4.1 Cultivos a campo
O sistema de produção mais antigo empregado na produção de hortaliças
consiste em cultivar as plantas diretamente no campo, sem qualquer proteção. Embora o
custo de produção aparente neste sistema seja inferior ao de outros mais complexos, seu
custo real pode ser elevado, porque os rendimentos obtidos situam-se geralmente abaixo
daqueles considerados potenciais para as culturas. As principais limitações desse
sistema são as seguintes:
• Irregularidade de produção: para crescer e se desenvolver normalmente, as
hortaliças necessitam de condições ambientais adequadas. No campo e sem nenhuma
proteção, essas condições existem somente em curtos períodos do ano. Fora desses
períodos, a produção não é possível, ou, então, o rendimento é baixo e a qualidade
inferior. Como exemplo, podem ser citadas as espécies de verão, como o pepino, o
meloeiro e o tomateiro, entre outras. No cultivo a campo, a produção dessas espécies no
Sul do Brasil somente é possível entre os meses de outubro e março. Nesse período, a
oferta tende a ser maior que a demanda e os preços atingem os níveis baixos (Figura
10):
• Danos mecânicos: as hortaliças cultivadas no campo e sem proteção estão
expostas aos danos provocadas pelos ventos fortes e pela precipitação pluviométrica. Os
ventos podem causar injúrias mecânicas nas folhas, queda de frutos e mesmo o
tombamento das culturas. Os ventos secos que ocorrem em períodos de baixa umidade
relativa do ar aumentam o déficit de saturação de vapor do ar, elevando a transpiração e
o consumo de água das culturas. Nessas condições, as plantas tendem a diminuir a
expansão das folhas, aumentando o teor de fibra dos tecidos, o que reduz a qualidade
comercial das hortaliças folhosas. A precipitação pluviométrica intensa causando
injúrias nas folhas pode causar danos graves em espécies folhosas, inutilizando-as para
a comercialização.

• Degradação do solo: as hortaliças são plantas que exigem um preparo


intensivo do solo, tanto no caso de se utilizar a semeadura direta, como indireta. Na
maior parte das lavouras, esse preparo é feito com utilização de enxada rotativa. Este
implemento modifica a estrutura original da camada superficial do solo e deixa uma
segunda camada compactada a menos de 0,20 m de profundidade. Conseqüentemente, a
camada superficial fica mais suscetível aos danos erosivos provocados pelas
precipitações pluviométricas. A degradação do solo é um dos graves problemas
associados à prática da olericultura no campo e sem proteção;
• Elevada incidência de pragas e moléstias: a ocorrência de epidemias de
moléstias em culturas agrícolas está relacionada, entre outros fatores, ao período de
tempo em que persistem as condições ambientais favoráveis ao desenvolvimento dos
patógenos. No caso das moléstias fúngicas da parte aérea, o período de tempo durante o
qual a superfície dos órgãos, especialmente as folhas, permanece molhada é
determinante para a evolução da epidemia. Os cultivos no campo não contam com
nenhuma proteção contra o molhamento e, por esse motivo, as epidemias tendem a
ocorrer rapidamente em períodos com elevada precipitação pluviométrica. A eficiência
dos fungicidas também é severamente reduzida nessa modalidade de cultivo. No caso
das pragas, a instalação de barreiras mecânicas para dificultar a infestação é difícil de
ser realizada no campo. A elevada incidência de pragas e moléstias e as dificuldades
para o seu controle são um dos sérios problemas dos cultivos realizados no campo.

O sistema de cultivo a campo encontra um dos seus maiores entraves na


irregularidade da produção e na elevada incidência de pragas e moléstias.

4.2 Cultivos em ambiente protegido


Por definição, o cultivo em ambiente protegido passa a existir quando uma
barreira é cobertura vegetal e a atmosfera, modificando o fluxo de energia entre o solo,
a cultura e a atmosfera. Essa forma de cultivo teve sua origem há alguns séculos,
estimulada pelos monarcas ricos da Europa, especialmente de Portugal, Franca e
Inglaterra, que desejavam cultivar e propagar espécies exóticas trazidas pelos
navegadores de regiões distantes do mundo. Surgiram, então, as primeiras estufas de
vidro, conhecidas como jardins de inverno, onde essas espécies podiam sobreviver aos
rigores do inverno europeu, para o qual não estavam adaptadas. No século XX, essas
estruturas passaram a ser empregadas para a produção de hortaliças e flores,
inicialmente nos países situados ao Norte da Europa, como Holanda e Inglaterra (Baille.
1983). Com o surgimento da indústria petroquímica e a produção em larga escala dos
filmes de polietileno, de custo inferior ao vidro, os cultivos em ambiente protegido se
espalharam por praticamente todo o mundo e as estruturas antigas foram sendo
substituídas por outras mais leves e de custo inferior. Esse fato permitiu que a produção
de hortaliças consumidas nos países mais ricos passasse a ser feita em países com mão-
de-obra mais barata, favorecendo a globalização da olericultura. A maior parte da
produção de hortaliças, atualmente praticada no mundo, usa alguma forma de proteção
ambiental. As razoes principais para esse fato são as seguintes:
• Maier regularidade da produção: um dos grandes benefícios da proteção das
culturas é o fato de poder estender o período de produção durante períodos do ano em
que a produção no campo não é possível de ser realizada. Isso é possível graças ao
efeito térmico propiciado pelos materiais de cobertura dos ambientes protegidos. Os
materiais plásticos, que são os mais empregados atualmente, são permeáveis as
radiações de onda longa e, por esse motivo, o efeito estufa é muito pequeno com esse
material. O ganho térmico provém basicamente da "estocagem" da energia solar durante
o dia e seu "consumo" durante à noite para retardar o abaixamento da temperatura
(Figura 11). Dessa forma, é possível obter um aumento na temperatura média diária,
alem de uma maior proteção contra as geadas. As temperaturas mais elevadas permitem
um desenvolvimento mais rápido das culturas. Existe também a possibilidade de
fornecer energia para o aquecimento artificial desses ambientes, desde que a
disponibilidade de radiação solar não seja limitante ao crescimento. Quando a
disponibilidade de radiação solar é baixa, porém acima do limite trófico, o aumento da
temperatura induz o estiolamento das plantas. No caso de a radiação solar situar-se
próxima do limite trófico, a taxa respiratória será aumentada, acelerando a senescência e
morte da cultura. Se tomarmos como exemplo a cultura do tomateiro na região central
do RS, os ambientes protegidos permitem realizar dois cultivos adicionais por ano,
respectivamente, no outono-inverno e na primavera-verão, além do cultivo tradicional
realizado no campo nos meses de verão. Nos períodos em que a produção de frutos não
é possível de ser feita porque a disponibilidade de radiação solar se encontra abaixo do
limite trófico, as mudas podem ser produzidas com sucesso mediante o emprego do
aquecimento. Isso é possível porque plantas jovens, com pequena quantidade de massa
seca acumulada, têm taxas respiratórias inferiores às plantas adultas, podendo
sobreviver e até apresentar crescimento nessas condições. Realizar precocemente a
produção das mudas nos períodos de baixa disponibilidade de radiação solar é uma das
formas para antecipar o início do período de produção de frutos nas culturas em
ambiente protegido.
• Maior qualidade dos produtos colhidos: na produção em ambiente protegido,
obtém-se qualidade comercial superior aquela obtida no campo. Isso advém, de um
lado, pelo fato de as culturas, nesse ambiente, estarem protegidas dos danos provocados
pelos ventos e pela precipitação pluviométrica excessiva e, por outro lado, por disporem
de condições ambientais mais favoráveis ao seu crescimento e desenvolvimento. Entre
essas condições, destaca-se o maior ganho térmico, que se traduz em crescimento e
desenvolvimento mais rápidos.

A demanda evaporativa da atmosfera no interior desses ambientes é menor do


que no exterior (Buriol et al., 2000), o que permite às plantas uma maior expansão por
unidade de massa dos tecidos da parte aérea, especialmente as folhas. No caso das
hortaliças folhosas, isso se traduz em plantas de maior tamanho. Quanto aos nutrientes
minerais, sua disponibilidade às plantas é maior nos ambientes protegidos, porque as
perdas por lixiviação são pequenas ou nulas. As possibilidades de manejo das variáveis
do ambiente, da água e dos nutrientes minerais são maiores nesses ambientes, o que
significa uma condição mais próxima do "conforto" vegetal.
• Menor uso de produtos químicos: a proteção contra as chuvas é um dos fatores
que contribui para uma menor incidência de moléstias nas culturas em ambiente
protegido. O período de molhamento é inferior, quando comparado as culturas no
campo, e pode ser reduzido ainda mais quando são utilizados materiais de cobertura
antigotejamento, que evitam a queda, sobre as plantas, das gotículas formadas pela
condensação do vapor que ocorre principalmente durante a noite. No caso das moléstias
que atacam as raízes, as técnicas do cultivo fora do solo, especialmente a hidroponia e o
uso de substratos, permitem "escapar" desses agentes. Outra alternativa de manejo
possibilitada pelos ambientes protegidos é a manipulação das variáveis do ambiente
para fugir das condições favoráveis às moléstias. Um exemplo é o controle de Botrvtis,
efetuado, em alguns países, pelo aquecimento do ar no interior das estufas nos períodos
favoráveis ao ataque desse patógeno. No caso das pragas, os ambientes protegidos
facilitam a instalação de barreiras antiinsetos e também a distribuição de predadores no
interior das culturas para efetuar o controle biológico. Essas possibilidades permitem
reduzir o uso de produtos químicos e a obter produtos mais saudáveis.
• Profissionalização do produtor: quando os cultivos são realizados no campo e
sem proteção, o produtor de hortaliças participa do circuito de comercialização somente
em períodos curtos do ano, que coincidem com os picos de oferta. Nos demais períodos
do ano, ele permanece ausente do mercado e o abastecimento depende do segmento
atacadista, com produtos oriundos de outras regiões produtoras. Produzindo vários
ciclos por ano com uma mesma cultura, o produtor tem condições de permanecer no
mercado durante a maior parte do tempo. Esse fato engendra profundas repercussões de
ordem econômica e social. Uma delas se refere à profissionalização do produtor, que
passa a se especializar em algumas culturas. Torna-se possível buscar aperfeiçoamentos
técnicos, realizar investimentos sob horizontes mais amplos e planejar sua produção
para atender a demandas de mercado previamente definidas. É possível, assim, reduzir o
numero de intermediários no circuito de comercialização, aumentando a parcela do
valor agregado que fica em poder do produtor. Do ponto de vista social, o resultado é o
fortalecimento das comunidades rurais, tanto vertical como horizontalmente. No
primeiro caso, trata-se da dinamização dos segmentos diretamente envolvidos com a
produção, fornecendo insumos e serviços e gerando empregos, pois a necessidade de
mão-de-obra na produção de hortaliças é elevada. O fortalecimento horizontal das
comunidades se refere aos efeitos indiretos sobre os outros setores da economia local
não envolvidos diretamente com a produção. Esses setores se beneficiam com o
aumento do nível de renda da população, dinamizando todos os setores do comercio.
Tem sido demonstrado, ao longo da historia, que as grandes civilizações estiveram
baseadas em economias locais dinâmicas e prósperas. No Brasil, a melhor qualidade de
vida existente nos estados da região Sul está ligada ao processo de colonização
minifundiária que as caracterizou (Ribeiro, 1995) e esse processo encontra, atualmente,
na olericultura, uma das vias para sua continuidade.

Os cultivos em ambiente protegido permitem um alto grau de controle da


maior parte das variáveis que determinam o rendimento e a qualidade das
hortaliças.

A proteção das culturas, atualmente realizada na maior parte do mundo, emprega


materiais plásticos, principalmente o polietileno de baixa densidade. Esses materiais
substituíram o vidro, que foi o primeiro material a ser empregado para essa finalidade.
Do ponto de vista da eficiência, o vidro é superior aos plásticos porque provoca efeito
estufa. A expressão "efeito estufa" foi empregada, inicialmente, para designar o
aquecimento da atmosfera terrestre por efeito da camada de gases que a constituem. A
radiação solar que atinge a superfície terrestre com um comprimento de onda curto
sobre, a seguir, difusão, aumentando o comprimento de onda da energia propagada.
Quando entre o Sol e a superfície terrestre existir uma camada pouco permeável as
radiações de onda longa, uma parte da energia que chega fica retida entre a superfície e
esta camada (Alpi & Tognoni, 1999). Nesse caso, a temperatura do meio aumenta em
decorrência do acúmulo de energia e ocorre o efeito estufa. Esse fenômeno explica o
aumento da temperatura do ar, da água e da superfície terrestre por efeito da elevada
concentração de CO2, da atmosfera.
O vidro é um material permeável às radiações de onda curta e pouco permeável
àquelas de onda longa na faixa do infravermelho. Por esse motivo, existe efeito estufa
quando o vidro é usado como material de cobertura para a proteção das culturas. O Pebd
apresenta elevada transmissividade às radiações solares em quase toda a faixa espectral
e, por essa razão, o efeito estufa é muito pequeno quando é empregado esse material.
Entretanto, quando existe condensação de vapor d'água na superfície interna da
cobertura, ocorre redução na transmissividade da radiação nas duas direções. Esse
fenômeno contribui para reduzir as perdas de energia armazenada durante o dia,
aumentando o ganho térmico no interior do ambiente protegido. A velocidade com que a
energia armazenada durante o dia é perdida durante a noite depende das trocas
energéticas entre o interior e o exterior do ambiente protegido (Border, 1992). Essas
trocas ocorrem pelos três processos de transferência de energia (Figura 12) (Bailey,
1988):
• Radiação: as perdas de energia por radiação ocorrem por emissão a partir do
interior da estufa, provenientes do solo, das culturas ou dos materiais de construção.
Essas perdas são parcialmente reduzidas pela camada de condensação de vapor na
superfície interna dos materiais de cobertura;
• Condução: ocorre pela transferência de energia através dos materiais que
fazem parte da estrutura, com uma interface interna e outra externa. É uma característica
ligada à natureza do material e as possibilidades de manejo são, reduzidas:
• Convecção: ocorre pelas trocas de ar entre o interior e o exterior do ambiente
protegido. É diretamente proporcional a taxa de infiltração de ar e ao gradiente térmico
entre o interior e o exterior. É o principal processo de perda de energia que ocorre em
estruturas mal-vedadas. A vedação dos ambientes protegidos é, portanto, fundamental
para reduzir as perdas energéticas durante a noite.
As estruturas atualmente empregadas no mundo para a proteção das culturas
variam desde instalações rústicas e baratas, como os túneis baixos, até as estufas
construídas com ferro galvanizado ou alumínio, com controle de temperatura e umidade
do ar. A denominação dessas estruturas pode variar de um país para outro. Na Espanha,
é adotada a seguinte classificação (Alpi & Tognoni, 1999):
- Mulching: cobertura em contato com o solo, sem qualquer armação de
sustentação;
- Túnel (Figuras 13 e 14): dispositivo normalmente temporário, que não permite
a entrada de uma pessoa, com suporte de sustentação que armazena um determinado
volume de ar entre o solo e a cobertura;
- Abrigo (Figura 15): instalação temporária, permitindo a entrada de uma pessoa,
com alguma estrutura de sustentação, porém com vedação parcial;
- Estufa: instalação permanente, com acesso fácil de pessoas e vedação total.
Os túneis atualmente empregados no Brasil dividem se em duas categorias:
túneis baixos e altos. Os túneis baixos são estruturas semicirculares, com largura entre
1,00 m e 1,20 m e altura central entre aproximadamente 0.50 m e 0,70 m, com
sustentação feita por meio de arcos metálicos ou outros materiais flexíveis (Figuras 13 e
14). Os túneis altos têm largura entre cinco e seis metros, altura central em torno de 2,20
m e empregam arcos de PVC de 30 mm de diâmetro para sua sustentação. Em ambos, a
ventilação é feita mediante o soerguimento lateral do filme de cobertura.
Quanto aos abrigos, são ainda empregadas estruturas rústicas de madeira, com
vedação parcial, que não se classificam como estufas segundo a denominação
espanhola. Nos últimos anos, cresce a tendência pela substituição da madeira pelo ferro
galvanizado ou alumínio, embora o custo de instalação seja superior. Entretanto, esse
custo pode ser amortizado pela maior vida útil, estimada em até 20 anos. Um dos
maiores problemas dos abrigos atualmente empregados no Brasil, denominados
localmente de estufas, é a fraca resistência aos ventos.
Em um levantamento sobre os danos físicos causados pelo vento em Santa
Maria. RS, Streck et al. (1998) demonstraram que esses danos passam a ocorrer quando
os ventos ultrapassam a velocidade de 72 km/h. Nessa mesma região, os ventos atingem
freqüentemente velocidades superiores a 100 km/h, donde se conclui que as estruturas
atualmente empregadas são ainda pouco adequadas às condições ambientais existentes.
A maior parte das estruturas empregadas atualmente para a proteção das culturas
permite um aumento pequeno nas temperaturas mínimas do ar no seu interior, entre
apenas 1,6 e 3,1°C, no caso dos abrigos de madeira empregados no RS (Buriol et al.,
1993a). Por essa razão, há necessidade de aquecimento artificial nos dias mais frios do
inverno, quando as temperaturas mínimas absolutas podem atingir valores negativos.
Além da temperatura, a proteção das culturas afeta também a umidade do ar e, por
conseqüência, a demanda hídrica das culturas. A higrometria é mais elevada no interior
de um ambiente protegido, principalmente porque a ventilação é mais reduzida. O
déficit de saturação de vapor é mais baixo quando comparado aos valores medidos no
exterior (Buriol et al., 2000).
Um dos maiores inconvenientes dos túneis baixos é a alta exigência de mão-de-
obra para efetuar a ventilação mediante o soerguimento das extremidades laterais do
filme de polietileno. Esta operação é necessária para evitar a elevação excessiva da
temperatura do ar durante o dia e também para reduzir a umidade do ar. Uma alternativa
para evitar esse problema consiste no uso de filmes perfurados. Nesse caso, a ventilação
ocorre de forma passiva através das perfurações, não sendo necessário movimentar as
extremidades laterais do filme. Perfurações com diâmetro geralmente próximo a 0,01 m
são feitas sobre toda a superfície do filme, com densidades variáveis entre 100 e 400
unidades m-2, correspondendo a uma superfície perfurada entre 0,78 e 3,14% da
superfície total do filme. Os resultados de Buriol et al. (1993b) mostraram que, nos
meses de inverno e primavera em Santa Maria, a média diária das temperaturas diurnas
do ar, em filmes com densidades de perfuração entre os limites citados, situou-se entre
3,8 e 1,6°C, respectivamente, acima daquela observada no exterior, sem qualquer
proteção. Modificando-se o número de perfurações, é possível adaptar o filme às
condições ambientais locais, a fim de atingir o ganho térmico desejado. Quanto à
umidade relativa do ar, a densidade de perfurações mostrou pouco efeito.
A cobertura da superfície do solo (mulching) é apontada como um meio para
facilitar o controle de ervas daninhas e isolar o solo da cultura. Do ponto de vista físico,
o mulching se constitui em uma barreira física à transferência de energia e vapor d'água
entre a superfície do solo e a atmosfera. Embora diferentes materiais possam ser
utilizados para essa finalidade, o filme de polietileno de baixa densidade, opaco e de cor
preta é aquele mais empregado (Figura 16). Com o uso desse material, foram
observados valores de temperatura do solo, nos primeiros 0,15 m de profundidade,
superiores em ate 2,8°C em relação ao solo desnudo. Um efeito secundário ocorre
também sobre a evaporação da água do solo, que pode ser reduzida em ate 21%,
aumentando a eficiência de uso da água pelas culturas (Streck et al., 1994). As
propriedades ópticas dos materiais empregados podem interferir também sobre o
balanço de energia. Quanto maior a componente refletida da radiação, maior será a
eficiência de utilização da luz pela cultura. Esse fator assume importância nos cultivos
protegidos realizados nos períodos do ano em que a disponibilidade de radiação solar é
baixa. Nesses períodos, resultados experimentais indicaram aumentos da fotossíntese de
hortaliças de ate 7% pelo uso de fumes de coloração clara na cobertura do solo (Gijzen,
1995).

Na proteção das culturas empregando materiais à base de polietileno de


baixa densidade, a energia solar é armazenada durante o dia para ser dissipada à
noite, retardando o abaixamento da temperatura do ar.
4.3 Cultivos protegidos conduzidos no solo
A forma mais simples de cultivar as hortaliças consiste em implantar as culturas
diretamente no solo. O solo é o meio natural onde as raízes encontram suporte, crescem
e se desenvolvem. Um solo se caracteriza por suas propriedades físicas, químicas e
também biológicas e, por esse motivo, o manejo correto do solo é fundamental para que
as plantas possam produzir adequadamente. A olericultura é uma atividade intensiva na
qual os ciclos das culturas são geralmente curtos e se sucedem durante a maior parte do
ano. As hortaliças exigem um preparo esmerado do solo para se desenvolverem
adequadamente. Por essa razão, o preparo convencional por meio da lavração, passagem
da enxada rotativa e encanteiramento é o método mais empregado. O uso continuado
desse método, no decorrer dos anos, tende a destruir a estrutura original do solo,
favorecendo sua desagregação e, por conseqüência, a erosão superficial.
Além da degradação física, os solos podem sofrer também modificações
químicas. A principal delas e a salinização decorrente do uso de doses excessivas de
fertilizantes e/ou do acúmulo de elementos químicos não absorvidos pelas plantas. Esse
problema existe em muitas regiões do globo terrestre dedicadas à produção de
hortaliças, tanto no cultivo a campo como em ambiente protegido. Do ponto de vista
biológico, o solo pode servir como hospedeiro de pragas e patógenos que atacam as
plantas. Umas das principais pragas são os nematóides e, nesse caso, o cultivo em
ambiente protegido tende a agravar o problema. Nesses ambientes, as pragas encontram
condições térmicas mais adequadas para se desenvolverem nos meses frios do ano.
Alem dos nematóides, os fungos e as bactérias causadoras de murchas e podridões
ocorrem com freqüência. Entre esses últimos agentes, os principais são aqueles dos
gêneros Phvtophthora, Sclerotinia e Pseudomonas. Os fungos causadores de moléstias
da parte aérea também encontram, no solo, um meio para a disseminação de suas
estruturas de propagação, agravando a severidade de ataque com o passar dos anos.
São poucas as alternativas existentes para resolver os problemas relacionados
com os desequilíbrios nutricionais do solo. A eliminação dos sais em excesso pode ser
realizada por lixiviação, o que exige elevados volumes de água. Nos cultivos feitos no
campo, o efeito combinado das chuvas com a rotação de culturas, empregando espécies
que produzem elevadas quantidades de massa verde, como as gramíneas, constitui-se
em uma alternativa para reduzir o teor excessivo de nutrientes minerais presentes em
concentração elevada no solo. Embora a lixiviação possa ser eficiente para controlar a
salinização, a drenagem dos sais para o lençol freático é uma pratica que deve ser
evitada ao máximo, devido ao seu caráter poluente. As dificuldades são maiores em
ambiente protegido, no qual a água precisa ser fornecida via irrigação. Quando não é
obtido êxito no controle da concentração de sais, o solo perde sua aptidão agrícola.
Nesse caso, para recuperar os investimentos feitos, a estrutura de proteção pode ser
desmontada e reconstruída em outra área ainda não utilizada para o cultivo de
hortaliças. Trata-se, porém, de uma solução parcial, temporária e que implica custos
adicionais. Há indícios de avanço da salinização sobre extensas áreas agrícolas em todo
mundo (Yeo. 1999). A conscientização dos riscos e o desenvolvimento de tecnologias
adequadas para o manejo da adubação são indispensáveis para a preservação da aptidão
agrícola dos solos.
Uma das possibilidades para solucionar os problemas relativos aos agentes
biológicos que atacam o sistema radicular das plantas e a desinfestação do solo. O uso
de produtos químicos é uma prática que vem sendo cada vez menos aconselhada, devido
aos riscos tanto para a saúde humana como para o ambiente. O emprego do calor, por
meio do vapor d'água, é uma opção que se mostra eficiente e não tem efeitos adversos
sobre o ambiente, implicando, porém, custos elevados. O vapor precisa ser gerado em
caldeiras mediante combustão e, em seguida, conduzido e distribuído sobre o solo, o
que torna difícil sua aplicação em áreas extensas.

Na horticultura intensiva, o uso continuado do solo induz ao aparecimento


de pragas, moléstias e à acumulação de resíduos químicos não absorvidos pelas
culturas.

4.4 Cultivos protegidos fora do solo


O cultivo fora do solo é recomendado quando os problemas tanto de ordem
nutricional como sanitária tornam-se de difícil controle pelos métodos descritos
anteriormente. Nesse caso, o solo é substituído por outros meios de cultivo. As duas
grandes modalidades de cultivos fora do solo são a hidroponia estrita e o cultivo em
substratos. Uma distinção deve ser feita entre o cultivo fora do solo e o cultivo sem solo.
O primeiro se refere ao cultivo fora do perfil do solo, utilizando substratos diversos, que
podem ser até mesmo o próprio solo. O segundo termo é mais apropriado para descrever
o cultivo de plantas diretamente na solução nutritiva, sem a utilização de substratos ou,
então, mediante o emprego de substratos inertes, como areia, brita e outros.
Em algumas regiões áridas do globo terrestre, onde a precipitação pluviométrica
é muito baixa ou nula, os cultivos fora do solo poderiam ser conduzidos no campo, sem
estruturas de proteção ambiental. Porém, na prática, a quase totalidade do cultivo de
hortaliças com uso dessa técnica é feito em ambiente protegido. Nessas regiões, o
cultivo protegido permite maior eficiência de utilização da água e maior controle de
pragas.

Os cultivos fora do solo são recomendados quando existem restrições ao


cultivo no solo ou quando se busca otimizar as condições hídricas e minerais para o
crescimento das culturas.

4.4.1 Hidroponia estrita


Uma das modalidades do cultivo fora do solo é a hidroponia estrita, que consiste
em cultivar as plantas com as raízes imersas em uma solução nutritiva completa,
devidamente oxigenada. Trata-se de uma técnica indicada para espécies folhosas de
pequeno porte, que não necessitam de estruturas de sustentação complexas. A solução
nutritiva pode ser acondicionada no interior de piscinas (deep water culture) ou, então,
circular em calhas no interior das quais crescem as raízes, passando, em seguida, para
um ou mais reservatórios antes de circular novamente nas calhas (Nutrient Film
Technique, NFT) (FAO, 1990; Santos, 1998; Andriolo, 1999; Faquin & Furlani, 1999;
Moraes & Furlani, 1999).
As principais vantagens do cultivo em hidroponia estrita, em relação ao cultivo
no solo, são as seguintes:
• Limpeza dos produtos: no cultivo hidropônico, as plantas ficam isentas de
partículas de solo e/ou outras impurezas que existem quando os cultivos são efetuados
no solo. As plantas podem ser colhidas e embaladas diretamente para o destino final,
sem serem lavadas. A hidroponia permite também um melhor controle da qualidade da
água empregada, prevenindo a presença de agentes químicos e biológicos nocivos à
saúde do consumidor;
• Maior regularidade de produção: o cultivo hidropônico possibilita um elevado
grau de controle dos fatores do ambiente, tanto do ar como do meio radicular. Por isso, é
possível cultivar as hortaliças durante períodos do ano em que o cultivo não seria
possível com outros sistemas. Permite, ainda, a adoção de cronogramas de produção no
decorrer do ano, prevendo as datas de semeadura, transplante e colheita a partir de
modelos de crescimento baseados, principalmente, na soma térmica acumulada ao longo
do ciclo.
Algumas desvantagens e dificuldades são inerentes a este sistema. As principais
podem ser assim enumeradas:
• Custo da produção: o sistema exige estruturas fixas para a instalação de
tanques e suportes de cultura, implicando investimentos elevados a serem amortizados
ao longo de vários anos. Os nutrientes devem ser fornecidos através de uma solução
nutritiva completa, preparada com fertilizantes de custo mais elevado do que aqueles
comumente empregados na adubação das culturas. São necessários equipamentos
especiais para o controle diário do pH e da condutividade elétrica (CE) da solução
nutritiva, além de bombas de recalque e reservatórios para estocagem e preparo da
solução nutritiva;
• Mão-de-obra especializada: o preparo e manuseio de soluções nutritivas exige
conhecimentos básicos de química inorgânica. Conseqüentemente, as pessoas
envolvidas no processo de produção devem ter, pelo menos, um nível médio de
escolaridade. Os riscos envolvidos na produção hidropônica são elevados, decorrentes
tanto de possíveis panes no sistema de circulação da solução nutritiva como de
variações na composição dessa solução. Esses riscos precisam ser prevenidos e, no caso
de um acidente, as intervenções devem ser feitas em intervalos curtos de tempo, sob
pena de perda total da lavoura:
• Conservação pós-colheita: as hortaliças, especialmente as folhosas, produzidas
em sistemas de cultivo hidropônicos armazenam volumes mais elevados de água no
interior da planta. Isso decorre do fato de a água estar sempre disponível em torno das
raízes e o déficit hídrico ser pouco freqüente nessas condições. Por esse motivo, os
produtos tendem a murchar rapidamente após a colheita, reduzindo seu período de
conservação pós-colheita. Entretanto, esse inconveniente pode ser resolvido através do
manejo adequado, mediante o controle da absorção de água nos dias anteriores à
colheita. Esse controle pode ser feito através do manejo da CE da solução nutritiva.
O esquema básico do NFT consiste em um reservatório de estocagem de solução
nutritiva, calhas de cultura e a solução nutritiva (Figuras 17 e 18). O reservatório de
estocagem de solução nutritiva destina-se a manter um determinado estoque de solução,
que ficará em circulação em trono das raízes das plantas.
O volume desta solução é determinado em função da cultura e do número de
plantas e deve ser suficientemente elevado para dotá-la de uma certa inércia química e
física. Esta inércia refere-se principalmente ao pH, à CE e à temperatura. Quando o
volume empregado é muito pequeno, essas variáveis sofrem flutuações rápidas durante
o dia, interferindo negativamente sobre a absorção de água e nutrientes e,
conseqüentemente, sobre o crescimento e produtividade da cultura. As plantas absorvem
água e nutrientes em proporções diferentes. Por esse motivo, quando a transpiração e
elevada, a CE da solução aumenta rapidamente, exigindo reposições da água absorvida
para diluir a solução até atingir novamente os valores corretos de CE. Essas
intervenções aumentam o custo operacional do sistema e, por isso, devem ser
minimizadas.
As calhas de cultura devem ser constituídas por materiais anticorrosivos e
antioxidantes. O comprimento deve ser limitado, a fim de minimizar as variações na
composição da solução nutritiva ao longo delas, à medida que as plantas absorvem
água, nutrientes e oxigênio da solução que flui. Devem também estar sempre protegidas
da radiação solar incidente, para evitar o crescimento de algas e reduzir tanto a
evaporação como a elevação exagerada da temperatura da solução, que deve se situar
entre os limites de 18° e 25°C (Resch, 1997).
A solução nutritiva é o elemento essencial na hidroponia estrita, pois dela
depende inteiramente o crescimento da cultura. Deve conter todos os nutrientes minerais
exigidos pelas plantas e também o oxigênio indispensável para a respiração das raízes.
A composição mineral é calculada de forma a respeitar as proporções predeterminadas
entre os nutrientes, a fim de evitar antagonismos que dificultem sua absorção. O
equilíbrio eletroquímico também é essencial em uma solução nutritiva destinada ao
cultivo hidropônico, para não perturbar a polarização da membrana celular das raízes,
na qual ocorre a absorção ativa de alguns dos nutrientes. O pH deve situar-se na faixa
entre 5,0 e 6,5, porque é uma das variáveis determinantes da absorção mineral. A
concentração salina, medida pela CE, pode variar desde valores em torno de 1.0 dS m -1
até valores superiores a 6 dS m-1, dependendo da espécie e dos objetivos da cultura.
Valores elevados de CE aumentam a qualidade dos frutos produzidos. Entretanto.
dificultam também a absorção de água, porque aumentam o potencial osmótico da
solução nutritiva e, por esse motivo, devem ser monitorados cuidadosamente,
especialmente nos períodos em que a demanda de água pela cultura for elevada (CTIFL.
1995b).

A hidroponia estrita é um dos métodos de cultivo fora do solo de custo mais


elevado e deve ser praticada por profissionais habilitados.

4.4.2 Cultivo em substratos


O cultivo em substratos é uma modalidade dos cultivos fora do solo em que as
raízes das plantas crescem no interior de um recipiente contendo substrato, porém, fora
do perfil do solo. Note-se que diferentes materiais podem ser empregados como
substrato, inclusive o próprio solo.
Essa técnica é indicada tanto para evitar problemas ligados ao crescimento e
desenvolvimento das raízes, como para obter um melhor controle da nutrição mineral
das culturas. No primeiro caso, destacam-se as moléstias radiculares e os nematóides.
No segundo caso, pode-se citar a prevenção de problemas decorrentes da salinidade do
solo e/ou desequilíbrios entre os nutrientes, bem como a melhoria da qualidade dos
produtos através do manejo da CE da solução em torno das raízes. Quando manejado
corretamente, o cultivo em substratos permite ajustar a nutrição mineral de acordo com
as necessidades da planta, evitando deficiências e excessos. A maior parte do cultivo de
hortaliças fora do solo, praticado atualmente nos países de olericultura avançada,
emprega algum substrato como meio de cultura (Lopez, 1998).
As principais vantagens do cultivo em substrato, comparativamente aos demais
sistemas de cultivo, são as seguintes:
• Custo mais baixo: diferentes materiais podem ser empregados como substrato,
permitindo buscar aqueles localmente disponíveis a baixo custo. Os recipientes podem
ser dispostos sobre o próprio solo cujo preparo se limita a confecção de pequenos
camalhões revestidos com filme de polietileno opaco (mulching). A vida útil de um
substrato pode ser longa, de até quatro anos ou mais. Nesse caso, não há necessidade de
substituir o substrato entre as culturas sucessivas. Para implantar uma nova cultura.
Basta cortar a parte aérea das plantar, substituir o filme plástico de cobertura do solo
(mulching) e plantar as mudas da nova cultura. Não há necessidade de eliminar o
sistema radicular da cultura anterior, o qual entrara em decomposição rapidamente;
• Simplicidade operacional: o substrato onde as raízes crescem armazena um
determinado volume de água e nutrientes, que varia conforme o material e o volume
utilizados. Existe, portanto, uma maior inércia nesse sistema quando comparado à
hidroponia estrita. Falhas de bombas e/ou do sistema de fertirrigação podem ser sanadas
antes que as plantas sofram estresse hídrico. É possível corrigir, por meio da drenagem,
eventuais erros na formulação da solução nutritiva, tão logo estes forem detectados.
Plantas de porte alto, como o tomateiro e as cucurbitáceas, podem ser facilmente
cultivadas, empregando-se o mesmo método de condução empregado no cultivo feito no
solo.
Como desvantagem, cita-se o fato de que o use de substratos representa um
custo adicional quando comparado ao cultivo no solo. Entretanto, esse custo é
geralmente compensado por um rendimento e qualidade mais elevados da produção. A
especialização da mão-de-obra também é necessária nesse sistema de cultivo.
No cultivo em substratos, o sistema radicular das plantas fica confinado em um
pequeno volume, o qual deve ser capaz de fornecer continuamente a água, os nutrientes
e o oxigênio necessários para o crescimento. Devido ao volume reduzido, a
disponibilidade hídrica, mineral e de oxigênio pode passar rapidamente de uma situação
de "conforto" para outra de estresse. Essa situação é mais grave nos períodos quentes do
ano, quando a temperatura aumenta tanto a transpiração como a respiração da planta.
No caso do oxigênio, sua disponibilidade na solução nutritiva diminui sob altas
temperaturas, por razões de ordem fisiológica e física. A primeira refere-se ao aumento
da taxa respiratória da planta, e a segunda, à diminuição da fração dissolvida na solução
nutritiva. Por isso, os substratos devem ter uma proporção adequada entre as fases
sólida, líquida e gasosa. O substrato ideal deve ter um espaço poroso total superior a
0.75 mL mL-1 e um tamanho médio de poros entre 30 e 300 mm. Para atingir essas
características, o diâmetro geométrico médio das partículas deve situar-se entre 5 e 0,25
mm e sua distribuição ser homogênea no interior do substrato, a fim de evitar o
adensamento (Marfà & Guri, 1999).
O potencial da água retida no interior de um substrato agrícola situa-se na faixa
entre -1 e -10 kPa. A fração retida entre -1 e -5 kPa denomina-se água facilmente
disponível (AFD), entre -5 e -10 kPa, de água de reserva (AR) e aquela acima de -10
kPa, de água dificilmente disponível (ADD). Para o crescimento ótimo da planta, o
substrato ideal deveria conter entre 20 e 30% de ar e AFD, respectivamente, e uma
fração de AR entre 4 e 10% (De Boodt & Verdonck. 1972; Cortés, 1999).
No cultivo em substratos, a água e os nutrientes devem ser fornecidos às plantas
através da fertirrigação. A concentração dos nutrientes que entram na composição das
soluções nutritivas empregadas em horticultura é estabelecida de forma a respeitar o
equilíbrio eletroquímico entre os nutrientes, a fim de evitar antagonismos e também
para não interferir nos mecanismos de absorção ativa de alguns nutrientes. Essa
concentração geralmente se afasta daquela segundo a qual os nutrientes são absorvidos
pela planta para a síntese da massa seca. Conseqüentemente, existe uma fração residual
de nutrientes que deve ser eliminada a fim de evitar sua acumulação no interior do
substrato. A absorção de água pela planta é um processo eminentemente físico,
controlado pela radiação solar e pelo déficit de saturação do ar, enquanto a absorção de
nutrientes é um processo eminentemente fisiológico associado com o crescimento da
planta (Tanner & Beevers, 1990). Por esse motivo, nos períodos de forte transpiração
das culturas, a absorção de água é mais intensa que a absorção dos nutrientes,
provocando o aumento da CE da solução no interior do substrato, e o déficit hídrico de
culturas em substrato pode ocorrer rapidamente, mesmo que volumes elevados de água
ainda estejam disponíveis em torno das raízes. A disponibilidade hídrica, nesses
cultivos, depende fundamentalmente do potencial osmótico (Figura 19).
Para evitar o estresse hídrico decorrente da elevação do potencial osmótico, a
dose de irrigação é fixada como uma fração reduzida da água disponível (AFD + AR),
geralmente entre 5 e 10% (Cortés, 1998). Sobre essa dose, deve ser adicionada a fração
de drenagem, destinada a lixiviar os nutrientes e/ou elementos químicos residuais. Essa
fração é determinada em função da tolerância à salinidade de cada espécie e se situa
geralmente entre 20 e 30%.
A drenagem de uma fração da solução nutritiva fornecida é uma característica
negativa dos cultivos em substrato. Quando são empregados substratos inertes com
baixa CTC, a disponibilidade de nutrientes à planta depende basicamente daqueles que
estão dissolvidos na solução nutritiva. Nesse caso, um volume de solução completa é
fornecido sempre que se fizer necessário repor os volumes de água consumidos pela
transpiração. Mediante este procedimento, as perdas de água e nutrientes pela solução
drenada podem chegar a frações superiores a 60 e 50%, respectivamente, daqueles
fornecidos (Cones, 1999). Quando são empregados substratos orgânicos com elevada
CTC, uma pane dos nutrientes fica retida pelas partículas do substrato, que interage com
aqueles dissolvidos na solução em torno das raízes. Nesse caso, a fertirrigação pode ser
feita separadamente da irrigação, porque uma parte dos nutrientes fica armazenada no
interior do substrato. Essa prática permite reduzir em até 60% as quantidades de
fertilizantes fornecidas pela fertirrigação (Andriolo et al., 1997).
O esquema básico do cultivo em substratos consiste em um recipiente para
acondicionamento do substrato, o substrato, um dispositivo para fornecimento de água e
nutrientes (fertirrigação) é um dispositivo para escoamento da água e dos nutrientes
drenados (Figura 20). O acondicionamento do substrato pode ser feito de diversas
formas (Figural 21 e 22). Podem ser empregados containers plásticos, capazes de
suportar varias plantas. Uma forma bastante difundida no mundo são os sacos plásticos
(bags), adquiridos cheios e prontos para o uso. Calhas podem também ser empregadas,
com dimensões geralmente entre 0,25 a 0,30 m de largura e 0,25 m de profundidade.
Nesse caso, o substrato é distribuído em todo o comprimento da calha, e a solução
nutritiva percorre toda a calha até drenar, pela extremidade, em nível mais baixo. Uma
alternativa simples e barata é o emprego de sacolas plásticas individuais com volume de
ate 10L, utilizadas comercialmente como embalagens. Independentemente da forma de
acondicionamento empregada, o recipiente deverá sempre estar perfurado na parte
inferior, de forma a garantir a drenagem rápida dos volumes de água e/ou solução
nutritiva que excederem à capacidade máxima de retenção do substrato. Para efetuar a
fertirrigação, podem ser empregados sistemas de irrigação por gotejamento disponíveis
no comércio (Figura 22b) ou tubos capilares individualizados para cada planta (Figura
16c).

O cultivo em substratos representa um sistema intermediário entre os


cultivos tradicionais no solo e a hidroponia estrita.
Os materiais empregados como substratos podem ser inorgânicos, como a perlita
ou a lã de rocha, ou orgânicos, como a turfa, a fibra de coco, resíduos vegetais ou a
casca de arroz. Os materiais orgânicos são preferíveis porque têm CTC mais elevada do
que os inorgânicos e podem ser decompostos biologicamente após o seu uso, reduzindo
a poluição ambiental. Qualquer material a ser empregado como substrato deve ter sua
capacidade máxima de retenção de água previamente determinada. O conhecimento
dessa característica é essencial para determinar tanto o volume de material a ser
empregado para cada planta, como a freqüência das irrigações. No caso de substratos
comerciais de constituição homogênea, a capacidade de retenção de água é determinada
em laboratório pelo fabricante e essa informação e fornecida na descrição do produto.
Entretanto, quando os materiais são heterogêneos, como no caso em que são
empregados materiais disponíveis na propriedade ou, ainda, quando são feitos
sucessivos cultivos reutilizando o mesmo material como substrato, a determinação da
capacidade máxima de retenção de água pode ser feita de forma sumário pelo produtor,
por meio das seguintes etapas (Figura 23):
• Primeira etapa: espalhar uma camada fina de substrato dentro de uma bandeja e
deixar secar ao ar, dentro de uma estufa de polietileno, por vários dias. É importante
revolver diariamente a camada de forma a garantir uma secagem uniforme de todo o
material:
• Segunda etapa: ensacar o substrato em sacolas de polietileno. As embalagens
de volume aproximado de 10 litros, utilizadas pela população urbana para comprar
hortaliças nas feiras, são uma boa opção. Coloca-se um volume idêntico de substrato
seco dentro de varias sacolas (quatro ou cinco), em seguida, as sacolas devem ser
fechadas (faz-se um nó na parte superior para evitar perdas de material) e pesadas em
uma balança. A massa de substrato seco de cada sacola é anotada. Apos a pesagem, o
volume de substrato contido no interior delas é molhado ate atingir a saturação
completa. Essa operação precisa ser feita com muito cuidado para evitar que partes do
substrato permaneçam secas:
• Terceira etapa: perfura-se a parte inferior e as superfícies laterais de cada
sacola, com uma agulha, a fim de assegurar a drenagem da água excedente. As
perfurações devem ser feitas em grande número e em todas as posições para evitar
acumulo de água:
• Quarta etapa: suspende-se as sacolas com auxilio de um cordão e deixa-se
gotejar por, pelo menos, 12 horas, à sombra. A melhor alternativa consiste em realizar o
molhamento no final da tarde e deixar escorrer durante toda a noite.
• Quinta etapa: na manhã seguinte, cada sacola e novamente pesada. A diferença
entre as massas úmida e seca representa o volume de água retido pelo substrato. Esse
valor é expresso em porcentagem da massa úmida e representa a capacidade máxima de
retenção de água. Essa variável representa o volume total de água que existe em cada
quilograma de massa úmida do substrato. Um exemplo relativo à determinação da
capacidade máxima de retenção de água do húmus proveniente da minhocultura é dado
pela Tabela 3.
Para determinar o volume de substrato a se utilizar para cada planta, deve-se
considerar a capacidade máxima de retenção de água do mesmo e a transpiração da
cultura. É conveniente que o substrato contenha o volume de água necessário para
manter viva a planta durante, pelo menos, oito horas com forte transpiração. Esse
intervalo de tempo é importante para diminuir o risco de perder a cultura por acidentes,
como pane de bombas ou falta de energia elétrica. Volumes muito grandes devem ser
evitados, pois aumentam o custo e dificultam a instalação da lavoura. Resultados de
pesquisas realizadas em Santa Maria, RS, mostram que uma planta adulta de tomateiro
pode transpirar mais de dois litros de água por dia, em períodos quentes de verão e com
baixa umidade relativa do ar. Do volume total de água retido (capacidade máxima de
retenção), aproximadamente 30% é pouco disponível, em razão da atração exercida
pelas partículas do substrato (potencial matricial). Outros 20% devem permanecer no
interior do substrato, para evitar que a concentração de sais em torno das raízes
(potencial osmótico) aumente demasiadamente, especialmente quando a absorção de
água é muito intensa (Jeannequin, 1987). Por isso, pode-se considerar, como
aproximação, a água facilmente disponível para a planta como uma fração igual a 50%
do volume retido na capacidade máxima de retenção. Entretanto, esse valor é
aproximativo, podendo variar entre os diferentes materiais. Determinações mais
precisas podem ser feitas em laboratórios especializados. A Tabela 3 ilustra o cálculo,
empregando valores determinados para o húmus proveniente da minhocultura.
O dispositivo para fornecimento da água e dos nutrientes pode ser constituído
por um sistema de irrigação acoplado a um equipamento simples para injeção dos
nutrientes no fluxo da irrigação ou de uma estação de fertirrigação complexa controlada
por microcomputador. Quando são empregados substratos orgânicos com elevada CTC,
o fornecimento dos nutrientes pode ser efetuado a intervalos de vários dias ou semanas,
enquanto a água deve ser fornecida uma ou varias vezes ao dia, de acordo com a
demanda hídrica da cultura. Recomenda-se ajustar a freqüência das irrigações de tal
forma que uma nova irrigação seja feita quando o volume de água consumido pela
transpiração atinja uma fração entre 5 e 10% da água disponível (AFD + AR) (Cortés,
1999). Nesse caso, a adição dos nutrientes à água de irrigação pode ser feita facilmente
através de um venturi ou simplesmente através de um tubo secundário de sucção
instalado entre o reservatório de água e a bomba de irrigação. Nesse caso, os nutrientes
são dissolvidos em um recipiente a parte e succionados durante a irrigação. O fluxo de
sucção é controlado através de um registro. Os nutrientes podem ser fornecidos
isoladamente ou em misturas, desde que compatíveis, de forma a satisfazer as
necessidades minerais da cultura no intervalo entre duas fertirrigações sucessivas. Esse
procedimento vem sendo adotado por muitos produtores, aliando simplicidade, baixo
custo e economia de fertilizantes (Andriolo et al., 1997, 2002).
Nos substratos com baixa CTC, em que a solução nutritiva é fornecida para
atender às necessidades hídricas da cultura, faz-se necessário dispor de uma estação de
fertirrigação, composta pelo reservatório de água e dois ou mais reservatórios
secundários, nos quais os diferentes fertilizantes que compõem a solução nutritiva se
encontram dissolvidos em concentração elevada. Bombas dosadoras com eletroválvulas
são conectadas a cada um dos reservatórios nos quais os nutrientes estão dissolvidos. O
sistema é controlado por um microcomputador, que aciona as diferentes eletroválvulas
em freqüências e intervalos de tempo previamente determinados, de forma a liberar as
doses de cada fertilizante necessárias para atingir a composição desejada da solução
nutritiva a ser fornecida à cultura (Resh, 1997; Lopez, 1998).
O destino da solução nutritiva drenada em cada irrigação ou fertirrigação
efetuada é um sério problema associado ao cultivo de plantar em substratos. Por esse
motivo, os sistemas de cultivo em substrato com solução perdida vêm sendo
substituídos por sistemas fechados, capazes de recolher e reutilizar os volumes
drenados. A Figura 24 ilustra o esquema de instalação de uma cultura em substrato em
sistema aberto e fechado.
No sistema fechado, o volume drenado é canalizado inicialmente para um tanque
de recolhimento, no qual as impurezas maiores, como resíduos de folhas e/ou partículas
de substrato, são eliminadas. Em seguida, o volume passa por um sistema de
desinfecção, baseado geralmente no use de radiações ultravioleta. Uma vez desinfetado,
o volume drenado é estocado em um tanque de deposito. Periodicamente, um
determinado volume de solução armazenada neste último tanque é transferido para o
tanque de mistura. Nesse compartimento, a solução é homogeneizada e análises são
feitas para determinar sua composição em elementos minerais. De posse dos resultados
das análises, o sistema de fertirrigação ajusta, por meios informatizados, a composição
da solução nutritiva a ser fornecida, de forma a levar em conta os nutrientes que já
existem na solução que vai ser reutilizada e adicionar apenas aqueles necessários para
restabelecer a composição original da solução nutritiva.
Nos sistemas abertos de cultivo em substratos que empregam materiais
orgânicos com fertirrigação descontínua, sua freqüência deve ser determinada levando-
se em conta a demanda de nutrientes pela cultura e a CE da solução drenada.
Para estimar a absorção de nutrientes no decorrer do crescimento da cultura,
tabelas elaboradas a partir de modelos de absorção mineral podem ser empregadas (ver
capitulo 6). Esses modelos permitem estimar as quantidades de nutrientes a fornecer
com base no crescimento da massa seca da planta.
O monitoramento da CE da solução drenada deve ser feito diariamente. Quando
são empregadas calhas para o acondicionamento do substrato, a solução drenada é
recolhida no final de cada uma delas e a CE medida antes de a solução ser eliminada.
No caso de empregarem-se sacolas individuais para acondicionar o substrato, pode-se
recolher a solução drenada de pequenos grupos de plantas, através de drenos feitos com
filme de polietileno. A instalação de um dreno desse tipo é feita da seguinte maneira
(Figura 25):
– escolhe-se, dentro da cultura, dois ou mais grupos de cinco plantas;
– coloca-se, embaixo das sacolas dessas plantas, um segundo filme de
polietileno opaco, de forma a recolher os volumes drenados;
– dobra-se o filme de maneira que forme uma canaleta capaz de conduzir, por
gravidade, esses volumes para dentro de um recipiente plástico, num nível mais baixo
que a cultura. Esse recipiente deve ter gargalo estreito, para reduzir a evaporação da
água contida no seu interior (os galões de 5 L empregados para comercializar água
mineral adaptam-se bem a esse objetivo);
– após cada irrigação, recolhe-se uma amostra da solução armazenada em cada
recipiente e mede-se a CE por meio de um eletrocondutivímetro.
A interpretação dos valores da CE medida pode ser feita observando-se os
limites aproximados, conforme a Tabela 4.

Quando os valores de CE medidos se situarem sistematicamente em valores


superiores a 3,0 dS m-1, o volume de água fornecido pela irrigação deverá ser
aumentado, para evitar a acumulação dentro do substrato dos nutrientes não absorvidos
pelas plantas, o que poderá causar salinização.
A vida útil de um substrato depende principalmente da evolução de suas
características físicas. Enquanto essas características não se alterarem demasiadamente,
um mesmo substrato poderá ser reutilizado durante anos consecutivos. Para verificar se
ocorreram alterações, recomenda-se repetir, pelo menos uma vez por ano, a estimativa
da capacidade máxima de retenção de água. Quando o valor determinado se afastar em
mais de 20% daquele obtido na primeira determinação, então é conveniente substituir o
material, a fim de evitar riscos à cultura. Se houver ocorrência de moléstias e pragas do
sistema radicular, as sacolas contendo as raízes atacadas devem ser separadas e o
substrato contido no seu interior desinfetado ou substituído. Antes de se implantar uma
nova cultura, é importante efetuar uma irrigação abundante, a fim de lixiviar os resíduos
de elementos minerais eventualmente acumulados no interior do substrato, os quais
poderão prejudicar o crescimento das plantas jovens. O cultivo em substratos é uma
tecnologia complexa que exige um manejo adequado da cultura e, por isso, deve ser
realizado sob a orientação de profissionais habilitados.

Os cultivos fora do solo precisam ser manejados de forma a contornar seu


caráter poluidor do ambiente.

5 MANEJO DA ÁGUA NO CULTIVO DAS HORTALIÇAS


5.1 Fatores determinantes do consumo de água
A água representa uma fração superior a 90% da composição dos tecidos
vegetais. Esse fato atinge importância fundamental na olericultura, na qual os produtos
são consumidos, em sua grande maioria, in natura. Dentro desse enfoque, a olericultura
poderia ser definida como a arte de comercializar água acondicionada em produtos
vegetais. A maior parte da água absorvida pelas raízes é consumida pela
evapotranspiração e se destina a dissipar a energia solar excedentária à fotossíntese,
evitando o aquecimento excessivo da planta.
A Figura 26 ilustra a relação entre a radiação solar global incidente e a
transpiração no decorrer do ciclo de uma cultura de tomateiro, em ambiente protegido,
durante a primavera, em Santa Maria, RS (Valandro, 1999).

A transpiração é o mecanismo de arrefecimento da planta e induz à


absorção de água pelas raízes, independentemente da absorção de nutrientes.

Embora a absorção de água e de nutrientes ocorra de forma simultânea nas


raízes, esses dois processos são independentes. O fluxo de água é um processo
eminentemente físico, enquanto o fluxo de nutrientes depende também de mecanismos
ativos de absorção e tem relação com o crescimento da planta.
A independência entre esses dois processos foi demonstrada na literatura,
embora o fluxo de água interfira no transporte de alguns nutrientes, como o cálcio
(Tanner & Beevers, 1990; Andriolo, 1995). O fluxo de água é o resultado da diferença
de potencial hídrico entre o meio radicular e o ar atmosférico, dividida pela resistência
ao transporte da água entre esses dois limites (Cones, 1999), cuja equação é a seguinte:

em que:
Tr = a transpiração na unidade de tempo:
ψr = o potencial hídrico na superfície da raiz;
ψa = o potencial hídrico do ar;
R = a resistência total.
Quanto maior a diferença de potencial hídrico entre o meio radicular e o ar, mais
forte será o fluxo de transpiração. Quando essa diferença é muito elevada, a resistência
total (R) não permite que o equilíbrio entre os potenciais hídricos seja atingido
rapidamente e, por conseqüência, um déficit hídrico ocorre na parte aérea da planta,
mesmo que haja volumes abundantes de água em torno das raízes. O manejo do estado
hídrico da planta exige, por isso, o controle tanto da disponibilidade de água às raízes
como da demanda atmosférica.
A absorção de água pelas raízes depende também da temperatura e do teor de
oxigênio em torno delas. A temperatura influencia o fluxo agindo sobre sua fluidez.
Com valores abaixo de 15°C, os ácidos graxos aumentam sua viscosidade, dificultando
o fluxo da água. O oxigênio é necessário para manter a funcionalidade das raízes,
especialmente de suas extremidades, que é a porção mais ativa na absorção hídrica e
mineral. Quando as temperaturas atingem valores acima de 25°C, o fluxo hídrico
diminui em razão, principalmente, da redução da disponibilidade de oxigênio para a
respiração (Cortés, 1999).
5.2 Métodos de monitoramento da irrigação
O manejo da irrigação no cultivo de hortaliças consiste basicamente em
monitorar a disponibilidade de água em torno das raízes, repondo os volumes
consumidos pela evapotranspiração, antes que um déficit hídrico se estabeleça na
planta. Vários métodos existem para efetuar o monitoramento da irrigação. Aqueles
mais utilizados na produção comercial são a tensiometria e o uso de modelos preditivos.
• Tensiometria: um tensiômetro consiste em uma cápsula porosa conectada a
uma escala graduada por meio de um tubo capilar. A cápsula é inserida no interior do
solo ou do substrato onde as raízes crescem. À medida que a disponibilidade de água
diminui, a coluna liquida existente no interior do tubo capilar se desloca, indicando o
potencial hídrico.
A principal vantagem dos tensiômetros consiste na simplicidade operacional,
pois podem ser adquiridos no comercio e instalados facilmente no interior das culturas,
sendo também de fácil leitura. Entretanto, têm o inconveniente de exigir calibrações
especificas para cada tipo de solo, pois o potencial matricial está intrinsecamente
associado à composição e à estrutura do meio radicular. No cultivo em substrato, a
disponibilidade de água depende também da concentração salina (potencial osmótico)
no interior do substrato, que pode variar rapidamente de valores baixos para limites
críticos, quando a transpiração é intensa. O tensiômetro não é adequado para medir o
potencial osmótico. Por esse motivo, seu uso é mais generalizado nos cultivos
realizados no solo, tanto em ambiente natural como protegido.
• Modelos preditivos: os modelos preditivos estimam a transpiração a partir de
modelos com, pelo menos, duas variáveis, uma de natureza física e outra fisiológica.
Esses modelos têm a seguinte expressão genérica:

Tr = µA + τB
em que:
A = variáveis físicas do ambiente como a radiação solar e/ ou o déficit de
saturação:
B = o IAF da cultura, µ e τ são coeficientes de ajuste.
Esses modelos encontram ampla aplicação nos cultivos em substrato, porque
podem estimar as necessidades de água em intervalos de poucos minutos e permitem o
manejo da (ferti) irrigação por meios informatizados (Baille, 1994; Cortés, 1999).

O uso de modelos é o método mais difundido no mundo para estimar as


necessidades de água das hortaliças cultivadas em ambiente protegido e fornecê-la
às plantas por meio de equipamentos automatizados.

5.3 Métodos de irrigação


Os principais métodos de irrigação empregados no cultivo de hortaliças são a
infiltração, a aspersão e o gotejamento. O primeiro deles é aquele de maior empirismo,
no qual o controle dos volumes irrigados é muito baixo. Ao ser distribuída em canais,
lateralmente às fileiras das plantas, a água se infiltra no solo em volumes que decrescem
à medida que o comprimento da fileira aumenta. A desuniformidade de fornecimento da
água é um dos principais defeitos desse método. Sua maior virtude reside no baixo
custo, uma vez que, na maioria dos casos, a água e distribuída mediante sifonamento e
escorrimento superficial. Seu emprego na olericultura está restrito às regiões áridas,
onde a água provém de locais distantes por meio de canais especialmente construídos
para a irrigação das lavouras. Face à escassez de água em escala planetária, prevista
para as próximas acácias, conclui-se que esse método tem suas perspectivas de
utilização cada vez mais reduzidas.
A aspersão é um método bastante utilizado na produção de hortaliças em
ambiente natural em áreas relativamente grandes. Permite uma melhor utilização da
água do que o método da infiltração, porém, seu custo é mais elevado, porque exige
bombas e tubulações de PVC agrícola para a condução e distribuição da água. Um de
seus maiores defeitos reside na desuniformidade da irrigação, pois a vazão decresce do
centro para a periferia do círculo irrigado. Um segundo inconveniente é o fato de a água
atingir diretamente a parte aérea das plantas, causando injurias em espécies folhosas e
aumentando os riscos de ocorrência de moléstias.
O método de irrigação mais recomendado em olericultura é o gotejamento. Suas
principais vantagens em relação aos outros dois descritos acima são a maior eficiência
de utilização da água e a maior uniformidade de distribuição da água. Um sistema de
irrigação por gotejamento é constituído por uma bomba, um ou vários filtros de disco e
gotejadores instalados ao longo de tubos de polietileno com diâmetro geralmente de
0,0127 m (½ polegada). A distância mais comum entre os gotejadores e de 0,30 m, o
que permite efetuar uma irrigação localizada junto a cada uma das plantas das principais
culturas de hortaliças. Os gotejadores mais utilizados são do tipo labirinto, com paredes
flexíveis e auto-reguláveis ou, então, com paredes semi-rígidas. Esses últimos permitem
maior uniformidade de vazão, sendo, porém, de custo mais elevado. Podem ser
encontrados, no comercio, gotejadores com vazão entre aproximadamente 1 L h -1 e 2 L
h-1, adaptando-se tanto para o cultivo em ambiente natural como protegido. Quando as
plantas crescem sobre camalhões cobertos com filme de polietileno opaco, o tubo
gotejador é colocado sob o filme. Essa forma de cultivo permite grande economia de
água, pois a evaporação superficial é reduzida a valores muito baixos e os volumes
irrigados se concentram em torno das raízes. A irrigação por gotejamento permite atingir
uma eficiência de utilização da água superior a 80% (Papadopoulos, 1999).

A irrigação por gotejamento é o método mais adequado para as hortaliças,


porque permite uma maior eficiência de utilização da água.

5.4 Manejo da umidade do ar


A umidade do ar influencia a demanda evaporativa da atmosfera e, por
conseqüência, o consumo de água das culturas. Entretanto, outros processos
metabólicos são também afetados, como o crescimento das folhas, a repartição da massa
seca entre as partes vegetativas e os frutos, a absorção de alguns nutrientes e a
incidência de moléstias.
A influência da umidade do ar sobre a expansão das folhas e aumento da área
folhar da cultura passa a ser importante quando o déficit de saturação atinge valores
elevados, da ordem de 1,5 kPa a 2,2 kPa. Para déficits médios, da ordem de 0,3 kPa a 1
kPa, e baixos, em torno de 0,1 kPa a 0,3 kPa, esse efeito é muito reduzido. Para as
hortaliças de verão, como o tomateiro, o pepino e o pimentão, a influência da umidade
do ar na produtividade, por modificações na fotossíntese, não passa de 3% (Bakker,
1991).
A repartição da massa seca entre as partes vegetativas e os frutos é afetada
indiretamente à medida que a umidade elevada favorece o crescimento das folhas. Esse
efeito é mais pronunciado quando os valores elevados de umidade vêm acompanhados
de temperaturas noturnas baixas, inferiores a 18°C, reduzindo o pegamento de frutos
(Andriolo. 1998b).
A nutrição mineral, especialmente do cálcio, é afetada por valores de umidade
do ar excessivamente baixos ou elevados. Essa influência ocorre de forma mais intensa
nos tecidos jovens, localizados nos ápices de crescimento, e nos frutos. Quando a UR do
ar é baixa, a demanda evaporativa da atmosfera é elevada e o fluxo de água da planta se
dirige para as folhas, em resposta à transpiração da cultura. Nessa situação, o fluxo de
água para os frutos é menos intenso e, conseqüentemente, as quantidades de cálcio que
chegam até eles podem ser insuficientes para seu crescimento. Por outro lado, quando a
umidade do ar é muito elevada, o fluxo de transpiração torna-se reduzido.
Nesse caso, as quantidades de cálcio transportadas até os ápices em crescimento
e os frutos também podem ser insuficientes para atender à demanda desse elemento. Em
ambas as situações, distúrbios fisiológicos podem ocorrer, sendo a podridão apical dos
frutos o principal deles. As concentrações de cálcio críticas, abaixo das quais os
sintomas se tornam visíveis, variam de uma espécie para outra: 250 mmol kg -1 de massa
seca para o tomateiro e 500 mmol kg-1 de massa seca para o pepino (Bakker, 1991).
A umidade do solo afeta a umidade do ar, através da evaporação que ocorre na
sua superfície, reduzindo a eficiência do uso da água. Quando a umidade relativa do ar
atinge níveis próximos da saturação, a polinização pode ser prejudicada por dificuldades
na abertura das anteras e na deiscência do pólen. O surgimento de moléstias e
favorecido tanto na parte aérea como nas raízes. Valores intermediários de umidade do
ar, entre 40 e 80%, são aqueles mais favoráveis ao crescimento e produtividade das
hortaliças (Bakker, 1991: CTIFL, 1995c). Quando os valores de umidade do ar são
muito baixos, inferiores a 40%, o manejo pode ser feito facilmente através da
nebulização, obtendo-se, ainda, um efeito indireto de redução das temperaturas do ar
(Andriolo, 1999). Porém, quando os valores são excessivamente elevados e próximos da
saturação, o manejo é difícil de ser realizado. Nos cultivos em ambiente protegido, a
umidade do ar pode ser manejada mediante o controle rigoroso da irrigação, evitando-se
fornecer volumes de água que excedam as necessidades hídricas da cultura. Aplicar
volumes pequenos com alta freqüência é preferível a irrigações abundantes e pouco
freqüentes.
O uso do mulching em toda a superfície do solo é uma medida complementar
que diminui a evaporação superficial. Sempre que existir uma diferença entre as
higrometrias interna e externa, a ventilação é uma técnica eficiente para reduzir a
umidade do ar no interior dos ambientes protegidos.
6 MANEJO DA NUTRIÇÃO MINERAL DAS HORTALIÇAS
6.1 Adubação das hortaliças: práticas e problemas
A adubação das culturas é uma prática agrícola cuja origem remonta há séculos.
Até o início do século XX, a adição de nutrientes ao solo era feita quase que
exclusivamente pela adubação orgânica, proveniente de estrumes diversos e/ou da
compostagem desses materiais com resíduos orgânicos das lavouras. A ação do adubo
orgânico fornecido se fazia notar duplamente, tanto na elevação da fertilidade do solo,
como na melhoria de suas características físicas, com resultados altamente positivos na
produtividade das culturas. O fato de os nutrientes serem provenientes da decomposição
de resíduos orgânicos já trazia intrinsecamente uma certa proporção entre os diferentes
elementos absorvidos pelas plantas, predeterminada pelo processo metabólico de síntese
da massa seca vegetal. Conseqüentemente, os problemas relativos ao desequilíbrio entre
as proporções desses nutrientes eram de pequena importância e levavam muito tempo
para serem percebidos pelos produtores. Essa prática ainda serve atualmente de base
para o manejo da adubação da horticultura dita orgânica. Com a fabricação em larga
escala dos fertilizantes químicos de origem industrial, na primeira metade do século
XX, a prática da adubação das culturas sofreu uma grande transformação. Surgia a
possibilidade de manejar isoladamente os diferentes nutrientes, alterando as proporções
decorrentes da decomposição da massa orgânica vegetal.
Nos países pobres, o custo dos fertilizantes é um dos componentes que incide
fortemente no custo final da produção, por isso, a prática da adubação tem sido
orientada para a busca da máxima eficiência econômica. Nesse contexto, as doses de
fertilizantes fornecidas às culturas objetivam obter o maior retorno econômico por
unidade de fertilizante aplicado (Comissão de Fertilidade do Solos dos Estados do RS e
SC, 1995). Entretanto, os produtos da horticultura exigem elevada qualidade comercial,
que somente pode ser atingida quando as plantas não cultivadas sem qualquer restrição
de ordem nutricional. Consciente dessas exigências, grande parte dos horticultores
desenvolveu, no transcorrer dos anos, o hábito de superestimar as necessidades minerais
das hortaliças. A prática ancestral da adubação orgânica passou a ser complementada
pela adubação química. Uma conseqüência desse procedimento foi a acumulação de
nutrientes nos solos. Nessa situação, a adição de novas doses de fertilizantes mostra
pouca ou nenhuma resposta sobre a produtividade ou, em alguns casos, provoca uma
redução nos rendimentos (Basso & Mueller, 1997; Veduin & Bartz. 1998).

O mau uso da adubação orgânica também pode levar ao desequilíbrio do


estado nutricional do solo.

A situação descrita veio a se agravar com a advento dos cultivos em ambiente


protegido, no qual a lixiviação dos nutrientes é muito baixa ou inexistente. Por outro
lado, a evaporação da fração da água do solo contida na camada superficial, que ocorre
com forte intensidade nos períodos de elevada radiação solar, tende à trazer a superfície
os sais dissolvidos nas camadas mais profundas, estabelecendo um fluxo hídrico
ascendente no perfil do solo no interior de um ambiente protegido. Esse fluxo age em
sentido inverso à lixiviação, favorecendo tanto o acumulo dos nutrientes fornecidos pela
adubação e que ainda não foram absorvidos pelas plantas, como aqueles em solução nas
camadas abaixo da superfície do solo. O resultado desse processo, no decorrer dos anos,
é o aumento da concentração de nutrientes no solo, como foi constatado por Veduin &
Bartz (1998) em cultivos protegidos na região de Santa Maria. Além de representar um
desperdício de recursos, essa situação caracteriza riscos potenciais de distúrbios tanto às
culturas como ao ambiente.

Nos cultivos em ambiente protegido, os nutrientes não absorvidos pela


cultura tendem a se acumular na camada superficial do solo.

As plantas absorvem os nutrientes minerais para a síntese tanto dos seus


componentes funcionais como estruturais, a partir dos esqueletos de carbono
provenientes da fotossíntese. O fluxo de CO2 antecede, portanto, ao fluxo de nutrientes,
e, para que a absorção mineral ocorra, há a necessidade de energia (ATP), gerada a
partir da degradação dos assimilados fixados anteriormente. O fornecimento de
nutrientes pela adubação não pode induzir, por si só, a uma maior taxa de fotossíntese e
a um maior crescimento. O manejo da nutrição consiste apenas em evitar que o
crescimento seja afetado negativamente pela deficiência de algum nutriente que pode
reduzir a velocidade da cadeia de reações que culminam com a síntese da massa seca
final. É por essa razão que tanto as deficiências como os excessos de nutrientes são
duplamente nefastos à produtividade das culturas. As deficiências o são porque
comprometem a eficiência de todo o processo de produção (lei do mínimo), e os
excessos porque interferem sobre os mecanismos de absorção, além de predispor as
plantas ao ataque de pragas e patógenos.
Os problemas decorrentes da prática atual da adubação das hortaliças exigem
que novos métodos sejam desenvolvidos para estimar corretamente as doses de
fertilizantes a empregar, capazes de melhor ajustar a oferta e a demanda de nutrientes,
prevenindo tanto a carência às plantas como a acumulação no solo. É importante
ressaltar que os nutrientes são absorvidos em sua forma mineral, independentemente de
serem aplicados através de fertilizantes químicos ou orgânicos. Os problemas
decorrentes do manejo incorreto da nutrição mineral das hortaliças podem ser
retardados pelo uso exclusivo da adubação orgânica, porém, dificilmente são evitados
com a intensificação da produção no decorrer dos anos. Por outro lado, a adubação
química feita corretamente permite um controle preciso e quase instantâneo da nutrição,
especialmente no caso dos cultivos fora do solo.
6.2 Métodos atuais de diagnostico e suas limitações
A prática da adubação de uma hortaliça implantada no solo envolve, pelo menos.
três componentes: o fertilizantes o solo e a planta. Quando uma determinada dose de
fertilizante é incorporada ao solo, uma parte dos nutrientes fornecidos e adsorvida pelas
partículas, como as argilas e os colóides, e outra parte fica prontamente disponível às
plantas na solução do solo. A proporção entre essas duas frações é variavel de um solo
para outro, pois depende de sua constituição química e física e sofre a influência do teor
de umidade. Torna-se, por isso, difícil estimar a quantidade de nutrientes do solo
efetivamente disponível à planta a cada momento do ciclo de produção.

A estimativa das necessidades de adubação das hortaliças cultivadas no solo


é difícil de ser realizada, porque envolve interações complexas entre o solo e a
planta.

A metodologia que tem sido empregada rotineiramente para determinar as


recomendações de adubação das culturas sofre os efeitos das interações descritas acima.
Através dessa metodologia, diferentes doses de fertilizantes são aplicadas em solos de
baixa fertilidade e a resposta das culturas é avaliada de forma relativa em relação à
produtividade considerada potencial para cada uma dessas culturas. No caso do fósforo,
para os Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, uma distinção foi estabelecida
entre as principais classes de solos, enquanto, para o potássio, uma relação única foi
ajustada. Relação semelhante foi também determinada para as necessidades de calagem,
com a dupla finalidade de corrigir a acidez e fornecer cálcio e magnésio às culturas.
O procedimento descrito acima ilustra a preocupação com o fornecimento de
doses mínimas de fertilizantes a solos de baixa fertilidade natural, com vistas a buscar a
máxima eficiência econômica. Essa situação se afasta radicalmente daquela que ocorre
com as hortaliças. O problema é agravado de, um lado, pela escassez de informações de
pesquisa, mostrando a resposta das hortaliças a diferentes doses de nutrientes, e, por
outro lado, em razão da forte variabilidade nos teores de nutrientes encontrados nos
solos de diferentes áreas de cultivo (Veduin & Bartz. 1998). Essa variabilidade pode ser
atribuída ao histórico de cada lavoura, envolvendo a seqüência de culturas praticada, às
doses de adubação mineral e orgânica que têm sido aplicadas e também às diferenças
químicas e físicas estruturais que distinguem as diferentes classes de solo.
6.3 Alternativas sugeridas
O manejo da adubação das hortaliças, que tem sido empregado em diferentes
partes do mundo, é o reflexo de situações peculiares de cada um deles, envolvendo tanto
critérios de produção, como econômicos e/ou ambientais. No contexto da agricultura
mundial, a horticultura é um dos setores que incorpora tecnologia em ritmo mais
acelerado. No Brasil, esse setor vem mostrando uma forte evolução nos últimos anos,
agregando, rapidamente, conhecimentos e processos provenientes de países mais
evoluídos. É provável, portanto, que procedimentos adotados naqueles países venham a
ser úteis nas condições locais. Entre esses procedimentos, destacam-se: (i) o ajuste de
teores máximos e mínimos de cada nutriente no solo; (ii) a análise do teor de nutrientes
nos tecidos vegetais e (iii) o ajuste da oferta e da demanda de nutrientes pela cultura.
6.3.1 Teores mínimos e máximos de cada nutriente no solo
Em boa parte das regiões agrícolas do mundo, os solos se caracterizam por uma
baixa fertilidade natural. Essa baixa fertilidade é decorrente tanto dos materiais de
origem desses solos como da exploração agrícola a que vêm sendo submetidos no
decorrer dos anos. Durante décadas, o manejo da adubação nesses países foi baseado
numa premissa que atribuía ao solo a simples função de servir de suporte às raízes.
Todos os nutrientes necessários ao crescimento das plantas deviam, portanto, ser
fornecidos pela adubação. Segundo essa visão, pouca distinção é feita entre uma cultura
implantada no solo e outra em substrato. A principal diferença reside na questão
sanitária e na maior facilidade de manejo do substrato, que permite uma rápida
drenagem da água e dos nutrientes em curto espaço de tempo. Dentro desse enfoque, a
interpretação do teor de nutrientes no solo em muito se assemelha àquela efetuada nas
soluções nutritivas, porque as quantidades de nutrientes adsorvidas nas partículas do
solo não são levadas em consideração no cálculo das necessidades de fertilizantes a
fornecer. As recomendações de adubação são, então, elaboradas a partir de
concentrações mínimas e máximas a observar na solução do solo onde crescem as raízes
das plantas.
A Tabela 5 mostra o exemplo de uma dessas recomendações, que é também
observada para as culturas em substrato inerte.

6.3.2 Teores de nutrientes nos tecidos vegetais


Um dos métodos sugerido para monitorar o estado nutricional das culturas de
hortaliças e indicar a necessidade de nutrientes e a análise dos teores de nutrientes nos
tecidos da planta. Ward (1964), em um trabalho pioneiro, determinou, semanalmente,
durante um ciclo inteiro de cultura, os teores de nitrogênio, fósforo, potássio, cálcio e
magnésio presentes na quinta folha de plantas de tomateiro, contada do ápice para a
base da planta. Essa determinação objetivava definir critérios para interpretação dos
resultados da análise da concentração desses nutrientes nas folhas. Entretanto, uma das
principais limitações desse método reside na forte variabilidade observada no teor de
nutrientes entre as diferentes folhas de uma planta no decorrer de sua ontogenia (Figura
27).
Para minimizar as variações nos teores de nutrientes relacionadas com a idade da
planta, existem normas a serem observadas no momento da coleta das folhas, conforme
se pode verificar na Tabela 6.

Caron & Parent (1989) tentaram padronizar algumas normas a serem observadas
para interpretar os teores de elementos minerais nas folhas do tomateiro, amostrando um
universo de 733 culturas, durante um período de quatro anos. Essas culturas
representavam uma amostra de 30% das lavouras mais produtivas na região do Quebec,
no Canadá, com rendimentos de frutos variando entre 4 e 6,5 kg de frutos por planta.
Essas normas foram denominadas pela sigla DRIS (Diagnosis and Recommendation
Integrated System), sendo estabelecidas a partir do ajustamento de curvas de
concentração dos macronutrientes determinadas nas folhas no decorrer do ciclo das
culturas.
O modelo proposto foi do tipo potencial, incorporando simultaneamente a
concentração dos nutrientes e interações decorrentes da proporção segundo a qual esses
nutrientes são fornecidos às plantas.
Para utilizar esse modelo na prática, é necessário determinar, em laboratório, a
concentração dos nutrientes nas folhas em um dado momento do ciclo. Em seguida,
esses valores são introduzidos como variáveis de entrada do modelo, para fazer a
estimativa do estado nutricional da cultura naquele momento do ciclo. Finalmente, o
modelo é capaz de indicar se existe algum nutriente que esta sendo limitante ao
crescimento das plantas (Lopez, 1998).
Diversas restrições podem ser apontadas ao método descrito acima. A primeira é
o tamanho da amostra necessária para que seja representativa do estado nutricional da
cultura de toda uma região de produção. São poucas as regiões do globo que dispõem de
meios adequados para a coleta de um elevado número de dados, como aquele
empregado no modelo de Caron & Parent (1989). Essa tarefa poderia ser realizada pelo
acumulo de informações no decorrer de períodos longos de tempo. Entretanto, a coleta
das informações constitui apenas a etapa mais simples do método. O ajustamento das
equações e suas respectivas interações é uma etapa complexa. O fato de as normas
estabelecerem-se a partir de rendimentos máximos da cultura pouco auxilia na
estimativa das doses máximas de fertilizantes a serem aplicadas, a fim de prevenir o
acumulo de nutrientes no solo.
Uma forma alternativa de interpretar os teores de nutrientes medidos pela análise
folhar foi sugerida por Rattin (2000), para o N em plantas de tomateiro. Essa forma
consiste em estabelecer uma relação entre os teores medidos na quinta folha, contada do
ápice para a base da planta, no decorrer do crescimento, e os teores críticos de diluição
da planta inteira. Esse autor estabeleceu uma relação entre a evolução do N entre esses
dois compartimentos da planta, que pode ser empregada para inferir o estado nutricional
da cultura (Figura 28) (ver capítulo 6.3.3).

A análise do teor de nutrientes nos tecidos é um indicador eminentemente


fisiológico que não mostra necessariamente relação com o teor de nutrientes no solo. O
fato de um determinado nutriente estar disponível em torno das raízes não significa que
a planta tenha condições de absorvê-lo, como comprovam observações feitas em Santa
Maria (Tabela 7). Uma forte deficiência de potássio foi observada em folhas de
tomateiro, no mês de julho, mesmo sob uma elevada disponibilidade desse nutriente no
solo. A deficiência foi atribuída a uma absorção muito reduzida desse elemento por
efeito das baixas temperaturas do solo naquele período, em torno de 14°C. Essas
temperaturas são limitantes à absorção de elementos minerais pelas hortaliças de verão
(Tindall et al., 1990; Cornillon, 1987).

6.3.3 Ajuste da oferta pela demanda de nutrientes


Esse método foi desenvolvido com base em observações feitas sobre as
dinâmicas de acumulação de nitrogênio e massa seca de várias espécies agrícolas
anuais. Para esse elemento, a concentração no interior da planta diminuiu com o
crescimento da cultura e esse fenômeno foi denominado de lei de diluição do nitrogênio
durante o crescimento (Sallete & Lemaire, 1981; Greenwood et al., 1990; 1991).
Para estimar as necessidades de N a fornecer para cada cultura no decorrer do
seu ciclo, Lemaire et al, (1997) propuseram um método dividido em duas etapas
experimentais. Na primeira etapa, determinaram-se as concentrações de N nos tecidos
durante o período de crescimento de plantas cultivadas com diferentes disponibilidades
desse elemento. Existe uma dose na qual a concentração desse nutriente nos tecidos
continua a aumentar, porém não é mais observada resposta em termos de acumulação de
massa seca. A concentração referente a esta dose é denominada de concentração crítica.
As concentrações críticas, determinadas periodicamente em diferentes coletas efetuadas
no decorrer do ciclo de crescimento e desenvolvimento da planta, permitem ajustar uma
curva crítica de diluição. Por sua vez, as concentrações mínimas e máximas
determinadas na planta permitem ajustar uma curva de diluição mínima e outra máxima
para aquela espécie. A Figura 29 ilustra as curvas de diluição mínima, crítica e máxima
que foram determinadas para a cultura do trigo (Justes et al., 1994, 1997).
A expressão matemática da curva crítica de diluição do N é a seguinte:
% N = a (MS)-b
em que MS representa a massa seca aérea acumulada pela cultura, em t há-1.
Essa equação pode ser transformada para estimar a absorção de nitrogênio pela
seguinte expressão:
Abs. N = 10 x a (MS)1-b
em que:
Abs. N = a absorção de N pela cultura, expressa em kg há -1; a = a %N para uma
acumulação de massa seca de 1 t há-1; (10 x a) = a quantidade de N acumulada quando a
biomassa da cultura é de 1 t há-1 (Lemaire et al.. 1997).
Os teores estiados pela curva crítica, a cada momento, no decorrer do ciclo de
crescimento da cultura, podem ser empregados para calcular o índice de nutrição de
nitrogênio (NNI). Esse índice serve de referência para interpretar os teores de N
oriundos de análises laboratoriais de tecidos (Lemaire et al., 1997; Le Bot et al., 1997).
O NNI é determinado pela seguinte relação:

em que N representa a concentração medida e N c a concentração crítica


determinada experimentalmente. Quando os valores determinados do NNI estão acima
da unidade, a cultura está recebendo excesso de fertilizantes nitrogenados. Quando esses
valores estão abaixo da unidade, a cultura está deficiente em N.
Para o N, o método permite ainda determinar as quantidades de fertilizante
nitrogenado a fornecer de acordo com o crescimento e produtividade da cultura.
Constitui-se, ainda, em um método útil para a fertirrigação, permitindo parcelar as
aplicações durante o período de cultivo, ajustando a oferta mineral de acordo com o
crescimento da massa seca das plantas.
A Figura 30 apresenta a curva crítica de diluição e a curva de absorção
determinadas para o tomateiro.
A estimativa das quantidades de N absorvidas durante o crescimento da cultura
podem ser expressas por unidades-planta, levando-se em consideração a população
empregada na lavoura (Tabela 8). Tabelas desse tipo podem ser empregadas para
determinar as quantidades de N a fornecer ao solo para repor os nutrientes extraídos
pela cultura, face a uma determinada expectativa de produção. Podem ainda ser
empregadas para calcular as doses a serem fornecidas via fertirrigação no decorrer do
ciclo, tanto em cultivos realizados no solo como em substrato.
As curvas críticas para outras espécies de hortaliças, como o pepino, estão sendo
determinadas (Espínola et at., no prelo). Para os outros nutrientes além do N, as
estimativas podem ser feitas a partir de dois métodos diferentes. O primeiro consiste em
estabelecer uma proporção entre a concentração de cada nutriente e aquela do N
previamente determinada pela curva crítica (Greenwood & Stone. 1998). Esse método
se fundamenta no fato de que existe uma determinada proporção entre os diferentes
nutrientes encontrados na massa seca. Esse procedimento é útil nos cultivos realizados
no solo, quando o objetivo consiste em apenas repor os nutrientes consumidos pela
cultura, com a preocupação de evitar os excessos e a salinização. O segundo método
também consiste em estabelecer uma relação, porém, tomando-se como referencial a
proporção obedecida entre os íons fertilizantes nas soluções nutritivas empregadas na
fertirrigação dos cultivos fora do solo. Esse último método é mais recomendado para os
cultivos fora do solo com volume reduzido de substrato, pois, nesse caso, a absorção
depende do equilíbrio entre os íons, evitando os antagonismos químicos.
O manejo da nutrição mineral das hortaliças é uma tarefa difícil, exigindo
conhecimentos técnicos e o monitoramento tanto do estado nutricional como do
crescimento da cultura.

Não existem receitas universais de adubação: cada situação deve ser


analisada com base na disponibilidade de nutrientes e nas necessidades da cultura.

6.4 Usos e limitações da fertirrigação na olericultura


A fertirrigação é uma técnica que foi desenvolvida inicialmente para fornecer
água e nutrientes às plantas simultaneamente. Posteriormente, passou também a ser
empregada para aplicar produtos químicos ou gases dissolvidos em meio líquido.
Graças a essa técnica, o cultivo de plantas em regiões áridas como os desertos de Israel
e também da Almeria, na Espanha, tornou-se possível. Nessas regiões, para crescer e se
desenvolver, as culturas dependem inteiramente da solução nutritiva fornecida
artificialmente pela fertirrigação. Posteriormente, essa prática foi estendida também
para o cultivo em substratos. Nas regiões úmidas do globo, onde existe precipitação
pluviométrica suficiente para o crescimento das culturas em todo ou em parte do seu
ciclo de desenvolvimento, a fertirrigação é uma técnica útil para efetuar o parcelamento
dos nutrientes durante o ciclo, reduzindo as perdas nos períodos de baixa demanda pela
planta. Nessa situação, as soluções nutritivas completas são pouco empregadas e as
doses a serem aplicadas são aquelas determinadas para atender as exigências da cultura,
levando-se em conta a disponibilidade de nutrientes no solo.
A fertirrigação é uma técnica de risco na olericultura. Quando empregada no
cultivo fora do solo, seu caráter poluidor se torna evidente. Por essa razão, alternativas
de manejo como a reciclagem da solução drenada vêm sendo implementadas. Essas
alternativas, aliadas a uma melhor formação técnica dos profissionais que manejam as
culturas nesse sistema de cultivo, permitem minimizar o risco. É, porém, no cultivo a
campo e ambiente não-protegido onde se concentram atualmente os maiores riscos
decorrentes do mau uso da fertirrigação. A facilidade com a qual os fertilizantes podem
ser dissolvidos na água e aplicados por equipamentos de irrigação rudimentares permite
o emprego da fertirrigação por pessoas de baixa formação técnica e poucos
conhecimentos sobre os riscos a que essa prática está associada. Soma-se ainda a esse
contexto a pratica habitual de grande parte dos produtores de hortaliças de superestimar
as doses de fertilizantes a serem fornecidas e a pressão comercial dos fabricantes de
equipamentos para fertirrigação. Nesse quadro, é altamente provável que doses
excessivas de sais e/ou produtos químicos venham a ser fornecidas no decorrer do ciclo
das culturas. O destino final das quantidades não absorvidas pelas plantas será
fatalmente os mananciais hídricos, com reflexos negativos sobre a qualidade da água. É
urgente, portanto, que a difusão da prática da fertirrigação, no Brasil, venha
acompanhada pelo desenvolvimento e difusão de tecnologias de aplicação adequada.
Entre essas tecnologias, a determinação das doses a fornecer para cada cultura é aquela
mais importante.

Em regiões úmidas, a fertirrigação se constitui em um método que pode ser


empregado para parcelar a adubação de manutenção no decorrer do ciclo de
desenvolvimento das culturas, minimizando as perdas de nutrientes por lixiviação.

Papadopoulos (1999) sugeriu um método para estimar as quantidades de


nutrientes a fornecer, através da fertirrigação, a uma cultura de hortaliças implantada no
solo. As etapas a observar com o uso desse método são descritas a seguir, considerando-
se uma extração de nutrientes pela cultura de Nx, Py e Kz, em kg ha-1:
• Massa de um hectare de solo, na profundidade de 0,40 m: essa profundidade é
considerada como sendo aquela na qual crescem a maior pane das raízes das plantas.

M = 10.000 m2 x 0,4x Bd,

em que:
M = massa do solo, em t há-1;
Bd = densidade do solo, em t m-3.
• Disponibilidade de P e K acima dos limites de segurança: esta etapa tem por
finalidade calcular a quantidade total dos dois nutrientes citados, existentes na massa de
solo determinada no item anterior. Os limites de segurança considerados são de 30 g t -1
(para o P) e de 100 g t-1 (para o K) e indicam os teores mínimos a manter no solo, a fim
de evitar o esgotamento desses dois nutrientes.

P1 = (Po – 30 g t-1) x M,

em que:
P1 = disponibilidade de P, em kg ha-1;
Po = teor de P indicado pela análise do solo, em g t-1.

K1 = (Ko – 100 a t-1) x M,

em que:
K1 = disponibilidade de K, em kg ha-1:
Ko = teor de K indicado pela análise do solo, em g t-1.

• Disponibilidade de P e K acima dos limites de segurança, em 35% do solo,


considerada a fração efetivamente ocupada pelas raízes:
P2 = P1 x 0,35
K2 = K1 x 0,35

• Quantidades de N, P e K a serem aplicadas como fertilizantes:


N1 = Nx
P3 = Py – P2
K3 = Kz– K1
em que:
N1, P3 e K3 representam as quantidades de N, P e K a serem aplicadas,
respectivamente, em kg ha-1.

• Eficiência de absorção do N, P e K no método de irrigação empregado: essa


etapa introduz um coeficiente de correção para levar em consideração a eficiência de
uso da água fornecida, na qual os nutrientes estão dissolvidos. Os valores médios,
considerados pelo mesmo autor, para o N, P e K, são, respectivamente, de 50, 15 e
67,5%, quando a irrigação é feita em sulcos; 65, 20 e 75%, quando feita por aspersão; e
80, 30 e 85%, quando feita por gotejamento. Para esse último, os cálculos são os
seguintes:

N2 = N1 x 1,25
P4 = P3 x 3,33
K4 = K3 x 1,176

em que:
N2, P4 e K4 representam as quantidades de N, P e K finais a serem aplicadas,
respectivamente, em kg ha-1, levando-se em consideração a eficiência do sistema de
irrigação a ser empregado.
As quantidades de N, P e K calculadas referem-se a todo o ciclo de
desenvolvimento da cultura. Essas quantidades deverão ser divididas em várias
aplicações, levando-se em conta o crescimento da cultura, a fim de aproximar-se ao
máximo das necessidades da cultura em cada fase do ciclo. Para tal, estimativas como
aquela mostrada na Tabela 8 podem ser empregadas. Dessa forma, pode-se reduzir as
perdas por lixiviação, principalmente nos períodos e/ou regiões com elevada
precipitação pluviométrica.
6.5 Emprego do CO2, na produção de hortaliças
O aumento da concentração do CO2, atmosférico é uma técnica que vem sendo
empregada há varias décadas para o aumento da produtividade das hortaliças cultivadas
em ambiente protegido. Quando a concentração normal, em torno de 340 µLCO 2 L-1,
aumentada para valores de ate 1.000 µLCO2 L-1, observa-se um aumento na fotossíntese
e uma redução na transpiração da cultura (Figura 31). Esses efeitos são variáveis de uma
espécie para outra, podendo atingir até 30% para o rendimento e em torno de 10% sobre
a transpiração (Alpi & Tognoni, 1999). Como conseqüência, obtêm-se maior
produtividade e maior eficiência de uso da água.
O efeito de concentrações elevadas de CO2, sobre a fotossíntese é explicado
principalmente por dois fenômenos. O primeiro refere-se à capacidade máxima do
processo de assimilação enzimática pelas reações da fotossíntese. Uma concentração de
CO2, mais alta no ar significa uma maior disponibilidade desse gás no interior dos
estômatos, deslocando, para cima, a curva de resposta da assimilação líquida à radiação
solar. Ocorre ao mesmo tempo um aumento no nível térmico ótimo para a fotossíntese,
retardando a diminuição da taxa fotossintética por efeito das altas temperaturas. O
segundo efeito refere-se à competição do CO 2, com o O2, nas reações da enzima
ribulose bifosfato carboxilase-oxigenase, o que reduz a fotorrespiração e o custo
energético por unidade de CO2, assimilado (Alpi & Tognoni, 1999).
Essa explicação é empregada também para justificar por que o efeito das altas
concentrações de CO2, é baixo em plantas C4.
Para ser efetiva, a técnica de aumentar a concentração do CO 2, do ar deve vir
acompanhada de níveis elevados, mas não excessivos, de radiação solar e temperatura
do ar. Por suas características, só pode ser empregada economicamente em ambientes
fechados, nos quais as fugas de gás para a atmosfera sejam minimizadas. Por essas
razões, seu uso encontra-se limitado a estufas com boa vedação e somente durante os
períodos em que a ventilação não for efetuada.
Uma forma alternativa que tem sido apontada para aplicar o CO2, às culturas de
hortaliças e a fertirrigação. Por meio dessa técnica, o gás é misturado à água usada na
irrigação.

Duas situações devem ser distinguidas quanto ao emprego dessa técnica: i) em


ambiente protegido e ii) em culturas no campo, em ambiente aberto. Em ambiente
protegido, o efeito sobre a fotossíntese ocorreria acompanhado de um efeito secundário
decorrente da ação do gás em torno das raízes das plantas. No campo, esse efeito seria
atribuído, principalmente, ao efeito nas raízes.
Do ponto de vista fisiológico, as explicações para o efeito do CO 2 aplicado com
a água de irrigação são escassas e pouco consistentes. As principais hipóteses que têm
sido apontadas são as seguintes (Machado et al., 1999):
• Difusão do CO2 do solo para o ar: Segundo essa hipótese, o gás aplicado, junto
com a água, sofreria difusão do solo para a atmosfera, passando pelo interior da
cobertura vegetal. Nessa passagem, seria "capturado" pelas reações da fotossíntese. O
efeito poderia, portanto, ser explicado pelos mesmos fenômenos que ocorrem pela
aplicação na parte aérea, como foi discutido nos parágrafos anteriores. Em ambiente
protegido, essa forma de aplicação poderia ser empregada, representando apenas uma
forma alternativa de uma técnica já amplamente conhecida e dominada. Acréscimos de
produtividade próximos de 30%, citados em culturas como tomateiro, alface e meloeiro,
poderiam ser explicados dessa forma (Aguilera et al., 1997, 2001; Pinto et al., 2000;
Furlan et al., 2001). Entretanto, em ambiente não-protegido, mesmo que as moléculas
do CO2 pudessem ser absorvidas durante sua passagem em torno das folhas, a
concentração do gás no ar atmosférico, no interior do dossel, dificilmente atingiria os
níveis necessários para induzir às respostas esperadas. Para manter uma concentração
mais elevada que aquela no ar atmosférico, o gás deveria ser aplicado continuamente,
pois, no momento em que o fornecimento fosse cancelado, as moléculas restantes
ficariam diluídas no ar atmosférico, com pouco ou nenhum efeito sobre sua
concentração. É pouco provável, por isso, que essa técnica possa ser aplicada com
eficiência em ambiente não-protegido.
• Absorção pelas raízes: o CO2 seria absorvido pelas raízes e translocado para as
folhas. Nesse caso, compostos seriam carboxilados para serem utilizados nas reações de
síntese da massa seca, que ocorreriam em etapas posteriores a fotossíntese. Essa
hipótese adaptar-se-ia à idéia de um pool único de assimilados na planta inteira, que
serve, atualmente, de base para a maioria dos modelos de crescimento e
desenvolvimento de hortaliças (Marcelis et al., 1998). Entretanto, a quantidade total de
carbono absorvido pelas raízes seria pequena quando comparada com aquela necessária
para induzir os efeitos apontados sobre a produtividade das culturas (Machado et al..
1999).
• Absorção de nutrientes minerais: o CO2 seria responsável por uma modificação
no pH em torno das raízes, por ação dos íons bicarbonato. O efeito dar-se-ia por um
aumento da acidez, que poderia interferir sobre os mecanismos de absorção mineral,
aumentando a absorção de nutrientes. Essa hipótese é difícil de ser sustentada por varias
razões: i) o abaixamento do pH não estimularia necessariamente a absorção de
nutrientes. Ao contrário, alguns macro e micronutrientes poderiam ter sua absorção
seriamente prejudicada. Do ponto de vista prático, esse efeito implicaria na necessidade
de manejar os volumes de gás a serem aplicados para evitar abaixamento excessivo do
pH no meio radicular; ii) existem indicações de que a absorção mineral ocorre em
resposta à disponibilidade de assimilados para o crescimento (Le Bot et al., 1998).
Nesse caso, uma maior quantidade de nutrientes no interior da planta não seria
suficiente por si só para induzir a um maior crescimento, a ponto de justificar os
resultados sobre a produtividade. Os dados sobre a acumulação de nutrientes nos tecidos
de plantas cultivadas com essa técnica são pouco consistentes ou conflitantes e não
confirmam essa hipótese (Machado et al., 1999); iii) outro argumento que levanta
duvidas sobre o efeito benéfico do CO2 aplicado via fertirrigação provém dos trabalhos
de pesquisa sobre o uso de soluções nutritivas sobresaturadas em O2. Esta técnica
consiste em borbulhar oxigênio de forma a aumentar a concentração normal desse gás
em difusão na solução nutritiva, que é de aproximadamente 9µL L -1, para valores de até
16 µL L-1 (Marfà & Guri, 1999). Efeitos de ate 30% de aumento na área folhar e na
massa seca de hortaliças são apontados com o uso dessa prática, que é explicada pelo
fato de a concentração mais elevada do O2 impedir a acumulação de CO2 e etileno no
meio radicular, os quais têm ação prejudicial sobre a absorção de água e nutrientes.
O efeito da aplicação do CO2, via fertirrigação, em hortaliças cultivadas em
ambiente protegido, confunde-se com aquele atribuído à ação sobre a fotossíntese pela
aplicação clássica junto ao dossel vegetativo da cultura. Em ambiente não protegido, no
qual uma concentração mais elevada que aquela normalmente existente no ar
atmosférico é difícil de ser mantida, a comprovação desse efeito pelos mecanismos
fisiológicos que têm sido descritos até o momento é pouco provável. E altamente
desejável que as dúvidas existentes venham a ser esclarecidas em um futuro próximo,
por meio de pesquisas mais aprofundadas sobre a questão.
7 EM BUSCA DA OLERICULTURA SUSTENTÁVEL
O século XX caracterizou-se por profundas transformações nos métodos de
produção dos diversos setores da economia nos países ocidentais. A agricultura não
escapou dente processo e ganhos consideráveis de produtividade foram obtidos durante
várias décadas seguidas. Entretanto, esses ganhos basearam-se no emprego intensivo de
insumos, a maioria dos quais provenientes de fontes naturais não renováveis, que
mostram sinais de esgotamento, levantando incertezas sobre a capacidade de o planeta
Terra continuar a suportar tais sistemas de produção, a maioria dos quais ainda em uso.
Paralelamente ao esgotamento dos recursos naturais, as tecnologias de produção
revelaram-se altamente poluidoras, tanto pela geração de subprodutos residuais
(embalagens, plásticos, resíduos da agroindústria) como pelo impacto negativo do uso
indiscriminado de produtos químicos, principalmente para o controle de ervas daninhas,
pragas e moléstias. A busca de novas tecnologias de produção, baseadas em métodos de
menor custo energético e maior grau de harmonia com o ambiente, engendrou novos
conceitos e paradigmas, agrupados sob a noção de desenvolvimento sustentável.
Nos países que detêm o controle da economia mundial, as tecnologias de
produção foram geradas para atender necessidades especificas das suas populações.
Para que mudanças tecnológicas venham a ocorrer, precisam vir precedidas por
modificações nos padrões culturais e, por essa razão, o desenvolvimento sustentável
implica alterações profundas na atual estrutura econômica e social das nações (Martins,
1999, 2000). Algumas dessas mudanças já podem ser detectadas no comportamento das
populações de alguns países, principalmente da Europa, onde a busca pela qualidade de
vida substituiu a mentalidade quantitivista que predominou durante a maior parte do
século XX.
Nos países hegemônicos, as aspirações sociais exercem forte influencia sobre os
agentes com poder de decisão, enquanto, nos países periféricos, essas decisões são o
resultado do equilíbrio de forças entre as aspirações das comunidades locais e os
interesses hegemônicos dominantes.
As tecnologias de produção que se tornam ultrapassadas nos países de origem
tendem a ser introduzidas nesses países, buscando um período de sobrevida antes de
tornarem-se completamente obsoletas. A olericultura não esta imune a esse processo e
está se tornando um ramo da agricultura altamente consumidor de tecnologias
importadas, especialmente nos cultivos em ambiente protegido. A produção intensiva de
hortaliças com emprego elevado de capital e tecnologia é conseqüência de conjunturas
econômicas nas quais é forte o fluxo de capitais e baixa a disponibilidade de mão-de-
obra. Essas condições estão muito longe daquelas que existem atualmente no Brasil.
Sistemas de produção de hortaliças com baixa inversão de capital e emprego elevado de
mão-de-obra de baixo custo são, portanto, ainda possíveis no contexto da olericultura
nacional. É possível também que sistemas de produção sob uma concepção
agroecológica venham a se expandir no País, desde que as instituições de pesquisa,
ensino e extensão sejam capazes de gerar e difundir as tecnologias de produção
necessárias, em ritmo compatível com a evolução do setor no contexto mundial.
A evolução política e econômica, mostrada pelo Brasil nas últimas décadas,
ainda não mostra sinais de evolução no rumo de uma melhor distribuição da renda
nacional. É altamente provável, por isso, que os sistemas de produção de hortaliças de
baixa tecnologia venham a coexistir nas próximas acácias com sistemas intensivos
voltados para a produção de alto valor agregado, destinada a suprir a demanda de
hortaliças pelas camadas sociais de maior renda. Esse é um desafio para o ensino da
olericultura nas universidades, que devera ser capaz de formar profissionais com
capacidade para adaptar diferentes níveis de tecnologia em resposta a demandas
específicas. A perda de importância das CEASAs frente a outros sistemas alternativos
de comercialização de hortaliças é um sinal que aponta nesta direção.
É importante ressaltar os consideráveis avanços ocorridos na área da fisiologia
de produção das hortaliças, agrupados nos diversos modelos desenvolvidos nas últimas
décadas (Gary et al., 1998). A produção de hortaliças passou a ser enfocada como uma
linha de produção, em que os diferentes fluxos que compõem o processo podem ser
manejados e maximizados. Essa concepção é inovadora, porque abandona o enfoque
casuístico de combater os efeitos, para ater-se preventivamente ao manejo dos fatores
que condicionam a produção e às causas que perturbam o processo produtivo. Segundo
esse enfoque de natureza holística, o ambiente deve ser adaptado as plantas. De forma
semelhante, as condições favoráveis ao surgimento de pragas e moléstias devem ser
prevenidas e evitadas. Os cultivos em ambiente protegido representam a possibilidade
real de pôr em prática esses conceitos. É altamente provável, portanto, que esses
cultivos venham também a experimentar forte impulso nas próximas décadas, a
exemplo do que já ocorreu, e ainda ocorre, nos principais países do mundo. Aqui, mais
uma vez, será indispensável contar com a atividade intelectual nacional, a fim de
adaptar e/ou criar esses sistemas de cultivo em consonância com as particularidades
ambientais, econômicas e sociais da população brasileira.

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