You are on page 1of 29
D.E.L.T.A., vol. 6, n.° 2, 1990. (139-167) AS PASSIVAS DO PORTUGUES E DO INGLES: UMA ANALISE FUNCIONAL Yara DUARTE (Universidade de Brasilia) ABSTRACT: The purpose of this paper ts to discuss some current funetional analyses of the passtves,to point out thetr inadequactes and limitations,and to present an alternative account whieh finds support in Portuguese and English empirical data, in recent generative Framework and in erosslinguistie evidences. 1. Introdugao Nao_s6 devido aos inimeros problemas detectados nas analises formais para se obter uma caracterizaczo0 universal essencialmente sintatica das estruturas pas sivas, mas sobretudo pelo atrativo de descobrir a razao de ser de tais construgoes nas linguas naturais, os v4- rios estudos que investigaram as fungoes das passivas buscaram determinar os fatores funcionais que regiam sua escolha e estabelecer uma tipologia translingtlisti- ca das passivas. 0 objetivo deste artigo @ examinar algumas das pro- Postas funcionais das passivas mais conhecidas na lite- ratura, apontar suas inadequagoes e apresentar uma ana~ lise alternativa que encontra apoio nos dados empiricos do portugués e do inglés, em analises formais recentes e em evidéncias translingliisticas. 2, An@lises Funcionais das Passivas 2.1, Halliday (1970-1976) Provavelmente, uma das analises mais completas dos problemas de estrutura tematica e sua relag2o com as passivas foi a de Halliday, com base nos estudos lin- gilisticos da Escola de Praga (Mathesius, 1928; Firbas, 1964; Danes, 1974). 140 : D.E.L.T.A. Halliday viu na natureza da linguagem ligagoes es treitas com as fungoes que ela desempenha: a forma que o sistema gramatical de uma lingua toma esta intimamen te relacionada aos _Propositos a que serve.Sob’ esse en- foque, a unidade basica do uso lingliistico nao @ a pa- lavra ou a sentenca, mas o discurso ou. texto, criado pelo falante ou escritor, ao fazer uso de um conjunto de opgdes disponiveis no componente textual e relevan-— tes ao contexto. £ nesse sentido que cada sentenca se organiza como uma mensagem, cuja estrutura €,essencial mente, uma estrutura tematica, na medida em que a pre dicacao se faz em torno de um tema. ~ Segundo essa concepcao, as sentencas podem ser di vididas em duas partes distintas, o Tema e o Rema. 0 Tema, o elemento geralmente colocado em posigao inicial, @ 0 ponto de partida para_a mensagem,e 0 Rema, o ele- mento que vem em seguida, @a mensagem propriamente di~ ta. Como a posicao inicial tematica @ quase sempre a posicao do Sujeito que, por sua vez, desempenha fre ~ qllentemente o papel de Agente, em geral, no inglés co~ mo também no portugués, Tema, Sujeito e Agente sao dénticos: (1) (i) John bought a book Gi) Joao comprou um Livro Sujeito/ Predicado/ Agente / Rema Tema Segundo Halliday, a principal razao para a esco ~ lha da passiva esta justamente nessa confluéncia ou coincidéncia de tragos caracteristicos do elemento em posicao inicial. Ele viu nas passivas uma fungo | disso. ciadora, pois, nesse tipo de sentenga, o Agente e sepa rado do Sujeito e do Tema, quer para ser colocado em posigao rematica ou de foco, no final da sentencga,quer para ser totalmente suprimido. No primero caso, a pas siva seria um meio de dar proeminéncia a esse elemento, como o foco da informagao que, na forma ativa, tenderia a veicular | a informagao dada, e portanto nao passivel de proeminéncia. DUARTE 141 Diferentemente de Firbas (1964), Halliday conside rou que, mesmo na ordem marcada, o Tema @ oelemento da perspectiva funcional da sentenga que ocupa a_ primeira posicao, ja que nada tem a ver com informagao dada ou mengao prévia. Para Halliday, as nogoes de dado 2 novo distinguem itens referentes ao discurso, a situagao ou & experiéncia anterior, considerados ou nao pelo falan te como disponiveis ou presentes na mente de seu inter locutor. Dois pontos foramenfatizados: (2 ) informagao dada nao diz respeito apenas ao conhecimento que € comum ao falante e seu ouvinte, mas também aquela que @ recupera, vel no contexto lingtfstico ou extra-lin guistico. . (ii) informagao nova, por outro lado, nao se refere apenas 4 informagao que nao foi mencionada, mas, sobretudo;diz respeito a informagao que o falante apresenta como nZo recuperavel, a partir do discurso pre cedente. Em suma, ao definir o Tema como base da comu nicagao, ou o elemento de menor dinamismo comunica tivo, e o Rema, como elemento impulsionador da coma nicagao, ou de maior dinamismo comunicativo, Halliday explicou a escolha da passiva como um mecanismo ca paz de inverter esses elementos, isto é, apassivapo de ser descrita como um processo de Tematizagao de um nao-Agente, ou de Rematizacao do Agente. Como veremos posteriormente, essa analise dopa pel funcional das passivas nao encontra apoio nos da dos empiricos do portugués e do inglés, nem tampouco nos dados de outras linguas analisadas,pois nenhuma das funcoes Propostas pode ser considerada basica ou universal para caracterizar Oo processo em todas as linguas naturais. 2.2 Givon ( 1979 ) Embora para os linguistas da escola de Praga @ para Halliday,o Tema possa veicular também infor magao nova quando essa informacao for menos comuni. 142 D.E.LAT.A. cativa, devido as suas caracteristicas posicionais e pelo fato de veicular freqentemente a informagao dada, os conceitos de Tema e Rema, muitas vezes, fundiram-se com as nogoes de dado e nove sob a etiqueta Tépico e Comentario. Lyons (1977) explicou essa confluéncia com plexa de tragos pela coincidéncia de pontos de partida, quando o ponto_de partida cognitivo, o comunicativo e © gramatical sao os mesmos. Como em muitas linguas a categoria Topico parecia coincidente com a do Sujeito,alguns estudos procuraram determinar tipologicamente o conceito de Topico. Lie Thompson (1976) apontaram, entre as caracteristicas dis tintivas do Topico, o seu traco de definitude, sua se legao independente do verbo, sua independéncia sintati ca @ seu papel funcional relacionado 4 estrutura do dis curso: o Topico estabelece o quadro de referencia tem poral, espacial ou individual, dentro do qual se faz a predicagao. Os autores concluiram que ha uma relagao muito intima entre o Sujeito e o Topico esugeriram que o Sujeito é um Topico gramaticalizado, posicao também adotada por Givon (1979). © conceito de Topico foi utilizado por Givon (1979) na sua definigao funcional do processo da apas. sivagao, Ele refutou a definigao relacional, segundo a qual um Objeto @ promovido a Sujeito ( Perlmutter e Postal, 1977), pelo fato de que, em algumas linguas, o elemento promovido nem sempre se torna Sujeito, e pelo fato de que outros complementos podem ser diretamente apassivaveis. Contestou também aproposta de Keenan (1975), de que a apassivagao envolve o rebaixamento do Agente da posigao de Sujeito, porque essa definicao obs. curece a fungao principal das passivas, a Topicaliza gao. Givén caracterizou universalmente a apassivagao como um processo pelo quai um nao-Agente é promovido a Topico. E, na medida em que uma lingua possui proprie dades codificadoras que identificam o topico principal com 0 Sujeito, e os distinguem de Topico, entao essa promogao tambem envolve a subjetivacao. Em geral, afun ¢ao primordial das passivas @ codificar sentengas no DUARTE 143 contexto em que o ndo-Agente € mais tdpico. Assim, pelo fato do Agente ser menos topico, ele & removido ou re baixado da posicgao inicial, que, em muitas Lnguas 2 coincide com a posigao do Sujeito, para posigoes sinta ticas menos topicas, podendo inclusive ser inteiramen te suprimido, se o seu grau de topicalidade for muito baixo. Givon apresentou as seguintes evidéncias favora veis 4 fungao de topicalizagao das passivas (Givon, 1979: 191 - 194): Ci) em algumas linguas, o elemento promovido aTépico nao adquire as caracterigtiéas de Sujeito: (2) Turco: Kandin - la kunus - ul - du "mulher-com" “falar” passiva - passado “Foi falado com a mulher" (ii ) em algumas linguas é impossivel a separacao en tre as regras de apassivacao e de topicalizagao: (3) Indonésio: Buku itu saja - batja "Livro" "ot Meal nyyn "0 livro, eu li" "0 livro foi lido por mim (iii) em linguas nas quais_o Agente rebaixado ou su primido, a apassivacao so é possivel enquanto @ xistir algum argumento que possa ser promovido: (4) Ute: (a) Passiva ~ Objeto Direto: cypyyei = tRaabi | - ta - ka “pedra" "atirar" passiva Passado (b) Passiva - Objeto Obliquo ti ka?’napu - ?ubvan ?abi - ta - Ra “mesa"—"sobre" "por" -passiva~passa— do (c) Passiva ~ Adverbial puka wika = - ta - ka “muito” "trabalhar'- passiva - passado (4) * Passiva - sem Tépico 144 D.-E.L.T.A, Ryka - ta - ka “erabalhar passiva passado £ importante notar que na tipologia proposta por Givon estao inclufdas senten¢gas que nao apresentam mor fologia verbal caracteristicamente passiva, como se po de observar no exemplo indonésio(3). Além disso, seu conceito de.topico é muito amplo. Pode designar o elemen to que ocupa a posicao inicial, seja ele _ Sujeito ou to pico sentencial, ou outro elemento que nao ocupe tal po sigao, como ilustram os exemplos abaixo de passivas im pessoais do espanhol, nas quais os Objetos Dativo © Acusativo, respectivamente, sao analisados como topico principal: (5) Se did a Juan un libro (6) Se did un libro a Juan Na verdade, os dados empiricos do inglés e do por tugués, bem como os de outras linguas examinadas, apre sentam evidéncias que contrariam a proposta de Topica lizag2o como fungao basica das passivas, o que equiva le dizer que ela nao € universal. 2.3 Foley e Valin (1984) _Foley e Valin optaram por duas macro - categorias semanticas, Ator e nao Ator (Actor e Undergoer), para simplificar a caracterizacao das passivas, definidas, respectivamente, como participante iniciador e contro. lador, e participante afetado. Eles observaram que, na verdade, a passiva nao pode ser definida como uma cons trugao na qual | um Paciente se torna Sujeito e o Agente é rebaixado, ja que os argumentos dos verbos apassiva veis podem apresentar outras fungdes tematicas, como ilustram os exemplos abaixo: (7) (i ) Marta foi premiada pela professora (Beneficiario-Agente) Gi) 0 alvo foi atingido pela flecha (Meta-Instrumento) DUARTE 145 (iii) Aquele telegrama foi recebido por Maria ( Tema-Recipiente ) (iv ) A mata foi destrufda pelo fogo (Locativo-Origem) Segundo Foley e Valin, as passivas podem ser divi didas em dois tipos principais, de acordo com sua fun ¢40:(i) as passivas de obliteracao ou defocalizagau, cuja fungao @ suprimir o argumento Ator, ou tornad-lo um constituinte periférico; (ii) as passivas de antecipa ga0 ou de focalizagZo, cuja fungao @ permitir que um argumento nZo Ator ocorra como argumento central daora ¢40, chamado Pivo. Embora essas fungoes sejam logica mente independentes, elas se encontram comumente asso ciadas nas linguas, o que resulta a seguinte tipolo gia: (tipo 1): as passivas de obliteragao do argumento Ator, nas quais o argumento Ator @ suprimido, sem qualquer outra modificagao: (8) Ulcha (Man chu-Tangus) Ti duse - we hon - da ta - wuri “aquele'"tigre"~acus. "como''-interrogacao"fa zexr" — passiva 7 "O que deve ser feito com aquele tigre?” (tipo 2): as passivas de obliteracao do argumento Ator, com a conseqiiente antecipagZo de um argumen to nao Ator: (9) Chichewa (Bantu): Mvana wanga wapandi - ka Nard ov aha" 1 in : . crianga’ minha’ "bater" - passiva medi al ~ "Minha crianga foi espancada"™ (tipo 3): as passivas de antecipagao do argumento nao Ator com a consequente obliteragao do argumen to Ator: 146 D.E.L.T.A. (10) Inglés: The woman was hit “A mulher foi espancada" (tipo 4): as passivas de antecipagao do argumento nao Ator, nas quais o argumento Ator permanece como argumento central: (11) Lango (Mi lo-Saara) . Daké 3 - jwar-d 16ca "mulher" 3p.sg. Ator-"bater's 3p.sg. -naoA tor "homem" 7 Léca dake 5 - jwat - 6 “homem" "mulher" 3p. sg. Ator — "bater"-3p. sg. nao Ator "OQ homem, a mulher espancou"/"O homem foi. espancado pela mulher". A analise de Foley e Valin, porém, apresenta pro blemas. Em primeiro lugar, fica dificil distinguir © argumento nao Ator em sentengas comoo do exemplo abai_ xO, em que ha dois argumentos afetados, mas apenas um pode ser promovido: (12) ( i) Mary gave John a child (ii) John was given a child (iii) *A child was given John Além disso, ele ilustrou sua tipologia com exem plos de sentengas passivas bastante discutive is, como & 0 caso de (11) . Por outro lado, as constru g0es médio-passivas do alemao e do espanhol foram clas sificadas no tipo 1, ou seja, sentengas nas quais ° Ator @ totalmente suprimido. Ora, nas construgdes medi ais das linguas romanicas, o Ator nao € suprimido, mas sim recodificado por meio do clitico pronominal. Final mente, as duas fungoes propostas nao sao igualmente va sicas, pois os dados empiricos do inglés e do portugués, bem como os de outras linguas, nao apéiam a fungao de DUARTE 147 Antecipagao como fungao universal. 3. Uma Proposta Alternativa 3.1 A fungao basica das passivas no portugués e no inglés. Na verdade, todas as propostas examinadas sao ina dequadas para caracterizar funcionalmente as passivas do portugués edo inglés , uma vez que ha evidencias que contrariam as fungoes propostas como basicas, ou seja, validas para ambas as linguas. Assim, sao encontradas passivas no portugués e no inglés para as_quais a fungao de Tematizacao/Topicaliza gao/ Antecipacgao seria vacua, isto €,imotivada, j4 que nenhum argumento foi tematizado, topicalizado ou ante cipado, como se comprova pela posigao inicial vazia, no portugués, ou ocupada por um pronome expletivo ou pleonastico sem conteiido lexical, no inglés: (13) (i ) Foi descoberta a cura do cancer (ii ) There was discovered the cure for cancer. Se _considerarmos entao as passivas pronominais do portugues, o problema fica ainda mais sério, porque to das elas apresentam a posigao de Sujeito superficial mente vazia, evidenciando claramente que a fungao pos. tulada @ incapaz de caracterizs-las: ~ (14) Ci) Vendem-se carros (ii ) Consertam-se reldgios. — _Por outro lado, a fungao de Rematizacao fica tam bem prejudicada na medida em que, mesmo no portugues @ no ingles, linguas em que a supressao do Agente nao & obrigatoria, encontramos indmeros exemplos de passivas analiticas nas quais o Agente nao foi rematizado, mas omitido: (15) ( i) Paulo foi ferido no acidente. 148 D-E-L.T.A. (ii) Paul was hurt in the accident. Além 1 disso,nas construcdes médio-passivas, o Agen te nunca € colocado em posicgao de foco sentencial, a posigao final, mas sim recodificado por meiodo elitico que se une ao verbo. Como nao ha possibilidade de se caracterizar todas as passivas do portugues e do inglés por meio das fun goes mencionadas , nesta proposta alternativa vamos pos tular que a fungao basica das passivas nas duas Linguas examinadas esta diretamente ligada ao. . processo de destituigao, defocalizagao ou obliteracao do Agente, que passaremos a designar como a fungao de Detematiza gao do Agente. ~ Em primeiro lugar, devemos esclarecer que, nesta analise, AGENTE e PACIENTE designam macro ~categorias semanticas que englobam, respectivamente, os varios pa péis tematicos apresentados pelos dois argumentos obri gatorios das passivas, conforme exemplificado em (7). z utilizagao de tais macro-categorias objetiva uma anali_ se funcional mais adequada descritivamente, e também mais simplificada do processo examinado. A nossa prefe réncia pelas designacces AGENTE /PACIENTE deve-se naoso ao fato de que tais categorias vem sendo tradicional mente utilizadas por gramaticos e lingilistas nas des. crigdes das s passivasymas sobretude porque, embora varios papeis tematicos possam ser atribuidos ao Sujeito deri vado das passivas , ele jamais podera exibir ode Agente, que nunca é atribuido ao argumento interno sub-catego rizado pelo verbo transitivo. Quanto ao termo detematizar, conquanto ambiguo , foi propositalmente escolhido, nao sé pelo fato de en globar fendmenos distintos relacionados ao processo de apassivacao, como a omissao do Sujeito/AGENTE, ou asua recodificagao por meio de um sintagma preposicional ou do clitico pronominal, mas também porque nos permite definir a propriedade formal universal das estruturas passivas, como veremos posteriormente. Finalmente, vamos considerar que toda sentenga po DUARTE 149 de ser dividida em duas unidades lingiifsticas, Tema (opcional) e Rema (obrigatéria), definidas respectiva mente, como as unidades de menor e maior graus de dina mismo comunicativo da sentenca, a unidade textual min: ma. 0 processo de apassivagao é motivado quer para omit, tir um Sujeito/AGENTE que deixou de ser tematico, quer Para colocar o AGENTE nZo tematico em posicao rematica, a posigao de foco sentencial (Jackendoff, 1972;Guerén_ 1980). 3.2 Analise Quantitativa de Textos Varios estudos quantitativos das passivas tém mos trado que a conseqUéncia principal da detematizacao | Proposta como fun¢ao universal das passivas, envolve frequentemente a omissao ou supressao do Sujeito/AGEN TE, mesmo em linguas,como o portugues e o inglés, nas quais o AGENTE nao tem que ser obrigatoriamente supri mido. Jespersen (1924), por exemplo, mencionou que as investigacces estatisticas feitas Por seus alunos mos travam que mais de 70% das sentengas passivas encontra das em varios textos de literatura inglesa nao inclur amo Agente. Svartvik (1966) contou 2696 ocorréncias do que denominou passivas agentivas, em diferentes textos cientificos e romances do inglés, das quais 80% eram sentengas que nao mencionavam o Agente. Duskova (1971) estudou um corpus de 5000 formas verbais finitas, meta de das quais encontradas em textos cientificos. Entre as 598 passivas encontradas mais de 80% ocorreram sem a expressao do Agente. Em estudos mais recentes,Stein (1979)e Givdn (1979) analisaram as passivas em textos escritos do inglés e seus resultados confirmaram as pes quisas anteriores: mais de 80% das passivas encontra das nao codificavam o Agente. 7 Por nao termos conhecimento de qualquer estudo quantitativo das passivas em textos do portugués, e com © objetivo de corroborar a hipétese de que afuncao pri mordial das passivas, no Portugués e no inglés, € a de detematizacao, principalmente por meio da omissa0 do AGENTE, optamos por uma contagem de passivas em dife 150 D.E.L.T.A. rentes tipos de textos escritos, do portugués . edo in glés, dado que essas construgoes, no ingles, se. apresen tam com maior freqiféncia na linguagem escrita do quena fala espontanea (Bever, 1970; Benett, 1977). Com base em metodologia proposta por Krzeszowski (1981), o corpus escrito examinado em cada uma das lin guas compreendeu quatro textos eientificos, quatro tex tos jornalisticos e uma peca de teatro, de acordo com as mossas expectativas de que, independentemente do ti po de texto (informativo ou literario), ou do registro (mais ou menos formal), as sentengas passivas encontra das deveriam ser majoritariamente construgces nas quais © AGENTE detematizado nao era mencionado, mas sim omi, tido. Nos textos examinados , foram computadas, emprimei xo lugar, todas as ocorréncias de formas verbais fi: Li tas (FF), ativas (Atv.), passivas mediais (Med.) e pas sivas analiticas (Pas.), no portugués , e ativas e pas. sivas, no inglés, para estabelecermos o universo emque as passivas foram encontradas. Em seguida, foram compu tadas as passivas com AGENTE (c/A) e as passivas sem AGENTE (s/A) nos textos do portugués e do inglés. 0s resultados estao reproduzidos nas tabelas abaixo, onde Cientifico = C, Jornalismo = J e Teatro = T: (16) Tabela I : Portugués TEXTOS cle]. %* ft [ % [rom % 1 aATIV, 843 | 79 494 82 [| 2252 | 99 {3589 | 9 REO 83 eof 315 T 19 0.8 [im | 2.3 | PAS. 140) 4 TOTAL FF 39] 6.5] 4 { 0,2 | 183 602 | 100 | 2275 | 100 | 3943 | 10 . 10 (17) Tabela II : Inglés TEXTOS c |] ze [ u x [| ft atv 775 | 7 | 503] 93 | 1149 PAS. ta | 2% | sk | 7 [0 “orac FF__[i0e8 [00 y 677 | 100 [1159 36,5 23,5 DUARTE 151 (18) Tabela III: Portugues TEXTOS C % “PAS. C7A 21 15 Pas. S/a | lig [65 31 TOTAL 140 | 100 39 % 76,5 & 100 154 4 100 183 12,2 (19) Tabela IV: Inglés TEXTOS, c & J | % T % [TOTAL PAS. C/A 45 | 16,5 15_ 127.8 i 10 61 18.1 PAS. S/A 228] 83,5} 39 | 72,2] 9 90 | 276 81,9 TOTAL 273 | 100 54 J 106 | 10 100_| 337 loo} % | 81 16 3_f 100_| (20) Tabela V: Portugués / Inglés LINGUAS P % I % 1 % PAS C/A 29 15.8 61 18.) 90 173 PAS S/A 154 84,2 276 81.9 | 430 2.7 TOTAL fos 100 337 | 00 520 190 % 35.2 | {64,8 | iso Os resultados evidenciam que, mesmo no portugués e no inglés, linguas nas quais a supressdo do AGENTE nao é obrigatoria, na maioria das passivas encontradas ° AGENTE nao era codificado, ou seja, 82,72 das sentengas Passivas eram construgoes sem AGENTE codificado. Os re sultados revelaram também que a proporcao de passivas sem AGENTE @ ainda maior no portugués,nos textos cientt ficos e jormalisticos, do que no inglés ( 852 - 79,5 % contra 83,5% - 72,22, respectivamente) (1) « Os resultados obtidos também corroboram duas outras caracteristicas gerais das passivas, ja atestadas empes quisas (Givén, 1979; Svartyik » 1966; Turner, 1962). 4 primeira delas € que as passivas sao muito menos fre quentes nos textos de ambas ag linguas doque as ativas. A segunda @ que elas sao mais frequentes nos textos ci entificos do que em qualquer outro género escrito. Nao obstante a variagao de ocorréncia de acordo com o tipo de texto examinado, @ importante salientar que,em todos 152 D.E.L.T.A. os textos, independentemente de seus registros, as cons trugdes passivas encontradas foram majoritariamente sentengas sem AGENTE expresso. Por outro lado, a segunda fungao | mais importante das passivas, nos textos examinados, @ ade tematizacao do PACIENTE, dado que poucas foram as sentengas passi vas encontradas que ou apresentavam a posigao inicial vazia ou com pronome expletivo. Os resultados estao re produzidos nas tabelas abaixo, onde Passivas com Sujei to Lexical = Pas $.L., e Passivas com Sujeito Pleonas tico = Pas. $.P. (2) ~ (21) Tabela we Portugués TEXTOS. C Pas S.L. | 127 PAS S.P. 13 TOTAL PAS] 140 % a & (22) Tabela VII : Inglés FEXTOS Pas Sil. PAS S.P. (23) Tabela VIII : Portugués /Inglés LINGUAS P 2 i % TOTAL %, PAS S.L 164 98,6 335 39.4 499 96 pas s.p, | 19 | 10,3 | 2 | Total pas | 183 { 109 | 337 | loo | seo | 109 % 35,21 64.8 199 | Deve ser notado ainda que os dados obtidos reve lam que, muito embora haja duas construcoes passivas analiticas, supostamente equivaientes ,uma no portugues e outra no inglés, elas nao sao usadas com amesmafre DUARTE 153 qiéncia, nos diferentes textos escritos das respecti vas linguas, pois as passivas analiticas ocorreram em numero muito maior nos textos do inglés, na verdade , mais do que o dobro de vezez do que nos textos do por tugués. Assim, enquanto nos textos do portugués , para cada passiva sao encontradas quase vinte ativas,no in glés, para cada passiva sao computadas apenas sete ati vas; (24) Tabela IX: Portugués /Inglés Linguas PORTUGUES Proporgao Ativ./pas 13,6 7 1 Proporgao Ativas/mediais 20,9 /_1 A proporgao total encontrada, que evidencia umuso de passivas analiticas, nos textos do inglés, mais do que duas vezes maior do que nos textos do portugues , obscurece, porém, um dado importante. £ que a diferen ga mo uso de passivas entre as duas linguas mostrou-se significativamente maior, no inglés, apenas nos textos cientificos e nas pecas de teatro, observando-se ainda que nelas o uso de passivas foi insignificante. Nos tex tos jornalisticos, os resultados obtidos estio bastan te proximos, enbora o inglés continue apresentando uma Proporcao maior de uso. (25) Tabela xX: Portugués /Inglés TEXTOS T_crenticos JORNALESTICOS] TEATRO LINGUAS ye? I P I | P I Proporco ativ./pas [6/1 2.8/1 | i2,6/1 11.5/1 S6a/1 11671 Pi nt ft lig/)_ - Pt TIy./M PROPORGAO PAS/MED PROPORCAO MED/PAS Como se pode constatar, enquanto nos textos cien tificos ocorrem quase trés ativas para cada passiva, 6 numero dobra no portugués, onde sao encontradas seis 154 D.E.L.T.A. ativas para cada-passiva. Nos textos jornalisticos do inglés, porém, as ocorréncias de passivas diminuem de tal modo que sua proporgao de ocorréncias quase se igua la 4 do portugués. Deve ser observado ainda que, em relagao ao uso das construgées mediais, os resultados obtidos mostram uma variagao na ocorréncia dessas | estruturas , dependente do tipo de texto examinado, que @ inversamente propor cional ao uso das passivas. Enquanto as passivas dimi nuem dos textos cientificos para os jornalisticos, e desses para as pegas de teatro, as construgées mediais aumentam, ou seja,nos textos cientificos sao encontra das quase duas passivas para cada construgao medial, e nos textos jornalisticos, acontece o oposto, quase du as const rugoes mediais para cada passiva. Uma possivel _explicagao para o fato de que as cons trugdes mediais sao encontradas com maior freqiiéncia nos textos jornalisticos do que nos textos cientificos pode ser dada com base no grau de _indeterminagao do AGENTE conferido 4s passivas analiticas: ele @ muito maior nas passivas sem AGENTE do que nas cons trugoes mediais. Assim, nos artigos de jornais e revistas, em que a agentividade @ de especial relevancia, constata -se um pequeno nimero de passivas analiticas, com o ma is baixo grau de agentividade, evidenciado pela supres. sao do AGENTE, e uma proporgao maior de estruturas com AGENTE, reunidas aqui nado so as passivas analiticas com AGENTE expresso, como também as construcgoes mediais. Por outro lado, em contraste com as sentencas ati vas, nas construgoes mediais, o pronome SH apresenta um um grau menor de topicalidade conferido ao AGENTE, mas nao tao baixo quanto o conferido as. passivas analiti cas sem AGENTE. 0 menor grau de topicalidade é corre borado nao so pelo fato de que o AGENTE tem referéncia indeterminada, ou seja, ele € apenas parcialmente iden tificado, como também pela perda da posicao inicial. Se considerarmos que as construgdes mediais cons tituem, no portugués , além das _passivas, o mecanismo detematizador mais semelhante as passivas analiticas , DUARTE 155 quer sob o aspecto de suas propriedades estruturais > ques sob 0 aspecto de suas propriedades funcionais ( Du arte, 1987), veremos que,na verdade, a ocorrencia de estruturas detematizadoras € maior nos textos escritos do portugués (354) do que nos do. inglés(337). Caso es sa particularidade seja confirmada em pesquisas futu ras, ela certamente merece uma investigacao mais apro fundada . 3.3 A Fungo de Detematizacao e as Evidéncias Translin guisticas. Como vimos, ha varias evidéncias no portugués eno inglés contrarias 3 fungao de Tematizagao/Topicaliza gao/Antecipagao, proposta como fungao basica das pas sivas. Contudo, as evidéncias mais contundentes contra tal fungao sao de natureza translinglifstica. Em primeiro lugar, existem linguas que apresentam morfologia verbal passiva com verbos intransitivos,pre dicados que exibem apenas um argumento, o argumento ex terno, Nesse caso seria impossivel postularmos como fun ¢80 basica do processo a topicalizagao ou tematizagao de qualquer argumento interno, dado que ele nao existe. Os exemplo sao do latim e do holandés (Keenan, 1975) , do alemao (Comrie, 1977) e do galés ( Perlmutter e Postal, 1984): (26) (i) Latim: Curritur “correr" - passiva - passado "Foi corrido" (ii ) Holandés: Ex wort door pro. expl. aux. passiva prep. de jongens gefloten "os meninos" "assobiar — part. " Foi assobiado pelos meninos" (iii) Alemao: Es wurde gestern Pro expl. aux. passiva " ontem'' 156 D.E.L.T.A. von, uns getanzt prep. pro. “dancar" = part. “Foi dancado ontem por nos” (iv ) Galés: Dannswyd gan y plant “dancar"-part.prep. "as criangas" " Foi dangado pelas criangas" Uma segunda evidéncia contraria a fungao de Topi. calizacao/Tematizagao/Antecipagao como fungao basica das passivas envolve as estruturas nas quais nenhum e lemento € promovido, ou seja, a posicgao de Tépico oude Tema se encontra vazia de contetdo lexical. Os exemplos abaixo sao do portugués e do inglés (Duarte, 1987), do chamorro (Shibatani, 1985), do alemao (Comrie, 1977) e do italiano (Jaeggli, 1986): (27) Ci) Portugués: " Foi encontrado um jacaré na piscina” (ii) Inglés: "There was held a banquet” " Foi realizado um banquete" (iii) Chamorro: Man - ma - lalatde i famagu'on Pl. -passiva -"admoestar'"as criangas" gi eskuela “na escola" “Poram admoestadas as criangas na esco qa" = (iv ) Alemao: Es wurde dem Schiller pro. expl.aux.passiva art."alumo" von Lehrer geholfen prep."professor” “ajudar" - part. "Foi ajudado o aluno pelo professor". (v ) Italiano: Ne furono riconosciuti molti DUARTE 157 "Foram reconhecidos muitos deles". Uma terceira evidéncia translingiistica contraria a fungao de TematizacZo/Topicalizagao nos é oferecida pelas passivas mediais. Caracterizam se pela morfolo gia verbal ativa na terceira pessoa, 4 qual se une oo clitico pronominal reflexivo, resultante da reanalise diacronica da ativa reflexiva, considerada como equiva lente pragmatica das passivas analiticas. Os exemples abaixo sao do portugues (Duarte, 1987), do espanhol (Givén, 1979) e do italiano (Belletti, 1982): (28) ( i ) Portugués: Vendem-se casas (ii ) Espanhol: Se curé a los brujos “Curaram-se os bruxos" (iii) Italiano: Si dicono cose impensabili da parte di tutti ultimamente "Dizem-se coisas impensaveis por todos ultimamente", ~ Por outro lado, ha evidéncias de que também a fun gao de Rematizagao nao deve ser proposta como fungao basica das passivas, uma vez que existem linguas nas quais o Agente jamais se manifesta sintaticamente rea lizado, mas @ obrigatoriamente suprimido. Comrie(1977) notou que o Agente nao € permitido nos estilos tradi cionais do persa, no arabe classico e no lativiano 7 Siewierska ( 1984) listou inimeras linguas cujas passi vas sao estruturas sem Agente expresso, entre as quais citamos 0 urdo, o aramaico, o lativiano, o arabe clas sico, o figiano, o cupenho, o cora, o huichol, oshosho ni, © pepecano, o igbo, o tera, etc.0s exemplos abaixo sao do turco e do mojave (Keenan, 1975);do finlandes (Comrie, 1977), do nanai e do ulcha ( Nichols, 1979),e do chamorro ( Topping, 1979): 158 D.E.L.T.A. (29) (i) Turco: Kandin - la kunus - ul - du "Mulher con'"falar" passiva -passado "Foi falado com a mulher" (ii ) Mojave: Injep ny — tapuy — e¢ - m pro. -acus.1p.sg.-"matar"-passiva - pas sado "Eu fui morto (iii) Finlandés: Hen et jUtettin kottin pro - acus. "deixar" passiva~passado “Foi deixado em casa". (iv ) Nanai: Ej dansa -- wa tej erincie “este""livro” — acus. “este™'tempo"obL xela - ° - xar "ler" - passiva - passado "Este livro ja tinha sido lido naquela @poca". (v) Ulchas _ _ Ti duse - we hon — da “este” "tigre" - acus. "queYinterrog. ta - wuri "fazer" - passiva "Q que deve ser feito com este tigre?" (vi ) Chamorro: Man- ma - lalatde i famagu'on pl.-passiva- "admoestar""as criangas" gi eskuela "naa escola" “Foram admoestadas as criangas na esco la". Na verdade, ha intmeras linguas em que o argumen to AGENTE pode ser opcionalmente recodificado nas pas sivas, como acontece, por exemplo, nas passivas do por DUARTE 159 tugués e do inglés. Por outro lado, os estudos de Khra kovsky (1973), Warburton (1975) e Haiman (1976) atestam a existéncia de linguas nas quais sao encontradas ape nas as passivas curtas sem AGENTE expresso, mas nenhy ma_ Lingua que apresente apenas as passivas longas com AGENTE. . Se,por um lado, as fungdes de Topicalizagao/ Tema tizacao e de RematizacZo sao problematicas como fungas basica das passivas, ja que, em todos os exemplos aci ma mencionados elas teriam aplicagao vacua, por serem imotivadas, as evidéncias translingifsticas corroboram a nossa hipdtese de que a fungao primordial e universal das passivas @ a de Detematizagao do Sujeito/AGENTE. E em conseqiiéncia da detematizagao que as duas outras fun goes das passivas sao gecorrentes, e, portanto, secun darias: a de focalizagao do argumento externo detemati zado, fungao rematica, e a de antecipacao do argumento interno, fim¢gZo tematica. 3.4. A Propriedade Estrutural Universal das Passivas: Evidéncias Formais. Chomsky (1981) observou que a categoria comumente designada por passiva poderia nao constituir uma clas se natural, quer em uma inica lingua, quer em varias linguas, ja que essa nogao nao parece estar ligada a um tnico fendmeno e j2 que o significado passivo tanto pode ser encontrado onde existe a morfologia passiva como onde ela nao existe. Embora reconhecesse a supres sao do Sujeito como fungao caracteristica das varias. construgoes categorizadas como passivas, ele viu ape nas uma relagao fraca entre o Papel funcional do pro. cesso e suas propriedades formais. 7 Isto porque, seguindo Burzio (1981), Chomsky pro Pos uma caracterizagao formal das passivas por meio de duas propriedades estruturais: (i) 0 verbo transitivo nao atribui Caso a seu Objeto; (ii) a posigao de Sujei to @ detematizada. Assim, uma sentenga como (30) ab. xo seria derivada da estrutura - P em (31): (30) Joao foi morto. 160 D.E.L.T.AL (31) £ — ] foi morto Joao SN Supondo-se que o participio | passivo foi neutrali zado pela morfologia passiva e nao mais possa atribuir Caso a seu Objeto, o SN Joao precisa se deslocar para receber Caso em outra posicao, qual seja, a posigao va zia de Sujeito, nao tematica. Nessa posicao, recebe 0 Nominativo. Embora Chomsky tivesse considerado aabsorgao de Caso a propriedade | formal nuclear das passivas, varios estudos recentes tém demonstrado que ela nao 8 univer sal, Porque nao encontra apoio nos dados empiricos de varias linguas. Duas previsoes, peio menos, seriam de correntes da propriedade de absorgao de Caso: (i) somen te verbos transitivos participam de construgdes passi. vas, porque somente verbos transitivos atribuem Acusa tivo; (ii) nenhum participio passivo atribui Caso Acusa. tivo. Ora, tais previsces, embora validas para o portu gués eo inglés nao sao confirmadas em outras linguas. Como ja foi mencionado, ha diversas linguas que passivizam verbos intransitivos, como olatim, o alemao, o holandés, e o galés (cf.13). Por outro lado, sao en contradas passivas nas quais o participio passivo nz foi neutralizado, ou seja, atribui Caso Acusativo a seu objeto. Os exemplos sao do russo ucraniano (Sobin, 1985) e do hebradico coloquiai (Borer, 1986): (32) ( i) Russo Ucraniano: Bulo zbudovano "ser''-pas neutro “construir'-part .neut. cerkvu “igreja"-acus. fem. .. . "Foi-construida uma igreja"™ (ii ) Hebraico: Haya katuv ‘et ha ~- yedi’a “foi escrito"-masc. acus. "mensagem-fem, ha zot ba-iton "a" —"esta" - fem "no papel" " Foi escrita esta mensagem no papel." DUARTE 161 Por outro lado, as consequéncias divetas da pro priedade de absorcao de Caso Acusativo ao SN pés-verbal $40 ou o seu deslocamento obrigatorio para a posigao de Sujeito para receber Nominativo, ou uma atribuicao de Caso indireta, por co-indexagao a um pronome exple tivo na posigao de Sujeito: (33) (i ) John; was killed t, Nominativol Gi) There; was held a banquet, - CNominativo J Contudo, os dados empiricos nao apoiam tais postu lagoes. Assim, por exemplo, as passivas do russo e do hebr@ico, ja ilustradas em (32), mostram exatamente o oposto. Em primeiro lugar, o SN pés-verbal nao se des locou para receber Caso na posigdo de Sujeito. Em se gundo lugar, nunca poderia haver transmiss4ao de Caso No minativo, via expletivo na posicao de Sujeito, porque, o SN seria marcado por dois Casos diferentes, o Acusa tivo, dado pelo verbo, e¢ o Nominativo, dado por co-in dexagao com o expletivo. ~ Duarte (1987) apresentou exemplos de construcdes passivas e mediais, encontradas no portugués falado in formal do Brasil, nas quais o SN pos-verbal nao mani festa a concordancia, uma indicagao clara de que nao recebeu Nominativo: (34) (i) £ proibido a entrada de pessoas estra nhas. (ii ) Vende-se casas. Essas estruturas apresentam um problema para a teoria, j& que no portugués contemporaneo doBrasil ha uma tendéncia acentuada 2 n&o concordancia quando o SN permanece em posic¢ao pos-verbal, o chamado Sujeito pos posto nas gramaticas. Nos exemplos acima, ou terfamos que considerar todas as estruturas desse tipo agramati cais, pelo fato de o SN nado ter recebido Caso Nominati 162 D.E.L.T.A. vo, seja por deslocamento, seja via expletivo, ou en tao admitir que o participio passivo nem sempre & new tralizado e pode atribuir Caso, seja ele estrutural ou inerente. . Na verdade, a hipdtese de que a absorgao de Caso @ responsavel pela natureza intransitiva das passivas @ problematica mesmo no inglés, com as passivas de ver bos bitransitivos. ~ (35) ( i) John was given a book (ii) * A book was given John No exemplo acima,se considerassemos o participio passivo uma categoria neutralizada, o SN a book nao re ceberia marcagao casual, o que tornaria (35i) agrama— tical. Nesses contextos, Chomsky (1981) postulou uma atribuigao de Caso inerente ao SN pds-verbal. 0 Caso i nerente, porém, @ dado em fungao das propriedades tema ticas do SN, e, no inglés, sO o Tema de um verbo bi transitivo pode receber caso inerente, como se depreen de pela agramaticalidade de (35ii). Essa explicagao, po rém, nao @ valida para todas as linguas. Siewierska (1984), por exemplo, apresentou estru turas semelhantes, de linguas escandinavas e do kinyar wanda, que atestam a possibilidade de o participio we tribuir nao so um Caso inerente, dependente da selegao tematica, mas também um Caso estrutural, como demons tram os exemplos abaixo: (36) ( i) Ibaruwa yohererejwe Maria “carta” “enviar"-passiva "Maria na Yohani " por Joao " "A carta foi enviada (a) Maria por Joao (ii ) Maria yohererejwe ibaruwa "Maria" “enviar"-passiva "carta" na Yohani "por Joao" DUARTE. 163 "(A)Maria foi enviada a carta por Joao" (37) ( i } Jens ble gitt en bok "(A)Joao foi dado um Livro" (ii ) En bok ble gitt Jens . "Um livro foi dado a Joao" A gramaticalidade dassentengas acima sugere que os os SNs pés-verbais receberam um Caso estrutural em (363) e (371i), nZo dependente de sua marcagao tematica, mas sim de sua posigao sintatica. Siewierska mostrou que o SN tbarwa em (36ii) se cliticiza e relativiza como um Objeto Direto, apresentando evidéncias adicionais de que, de fato,é um Objeto Direto. Em contrapartida, os dados empiricos sao sempre favoraveis 4 propriedade de detematizacao, que deve ser postulada como a propriedade formal universal das pas sivas, como estruturas que sempre apresentam a posigao de Sujeito detematizada. Ela pode ser observada em to das as estruturas categorizadas como passivas, sejan— elas passivas analiticas ou passivas Pronominais , pas sivas com verbos transitivos ou intransitivos ,passivas com Sujeito derivado ou com Sujeito pleonastico. F como nesta analise,a propriedade formal basica das passivas & também sua fungdo primordial, existe, na verdade, uma correlacao bastante estreita e desejavel entre forma e fungao em tais estruturas, ou uma relagao biunivoca en tre a propriedade formal caracteristica e sua fungao universal. 4. Conclusao Nesta proposta alternativa, as construgoes passi vas do portugués e do inglés manifestam como fungao ba sica a detematizagao do Sujeito/AGENTE. Essa fungao de tematizadora inclui nao apenas a detematizacao por meio da omissao do AGENTE, mas também a deteratizagao por meio da recodificagao do AGENTE, seja realizado por um Sintagma preposicional em posigao de foco sentencial > seja realizado pelo clitico pronominal nas constru Goes mediais. Uma segunda funcao das passivas constata 164 D.E.L.T.AL da nas duas linguas analisadas foi a fungao tematizado ra, ilustrada nas passivas em que um nao AGENTE @ pro movido para_a posicgao inicial, tematica. A fungao de detematizagao, proposta como fungao ba sica das passivas do portugués e do inglés, foi corro borada por uma anadlise quantitativa em diferentes tex tos escritos em ambas as linguas. A principal conse quencia da fungao de detematizagao proposta evidenciou -se pela omissao do AGENTE, conforme atestado pela al ta porcentagem de passivas sem AGENTE codificada nas du as Linguas analisadas, muito embora nem o portugués nem ° inglés exijam uma supressao obrigatoria do AGENTE,como @ comum em varias linguas. A fungao de detematizacao foi igualmente apoiada por evidéncias translingdfsticas, ao contrario de ou tras fungoes postuladas, o que demonstra que ela @, re, almente, a fungao universal das passivas, valida para todas as linguas. Como as analises formais recentes tém mostrado que a propriedade estrutural caracteristica das passivas é a de detematizagao da posigao do Sujeito, as evidéncias formais ngo s6 apoiam 4 analise funcional postulada_, mas, sobretudo mostram que ha, na verdade, uma relagao forte entre o papel funcional do processo de apassiva gao e suas propriedades estruturais. 7 NOTAS 1. Para demonstrar que as variaveis da Tabela sao inde pendentes, ou seja, que os tipos de textos analisa dos nao influem nas percentagens das passivas encon tradas, foi aplicado o teste estatitico do x* ( qui quadrado). 0 teste mediu a significancia das percen tagens que separavam o uso das passivas com AGENTE. e sem ACENTE nesses dois grupos de textos, conside rando-se 3.84 como a média de relevancia do x*, no nivel 0.05 (5 chances em 100 de que os resultados se jam acidentais). Como os valores obtidos foram infe- viores ao da média, isto é, 0.33 para o portugués, DUARTE 165 e 3.12 para o inglés, podemos goncluir que as dife vengas percentuais da tabela nado sao significativas. 2. Aplicado o teste do x2, foram obtidos os valores 0.63 e 0.10, para o portugués e o ingles ,respectiva mente .Como os resultados saoinferiores 4 média de re levancia (3.84), 0 teste mostrou novamente que as. variaveis sao independentes, ou seja,o tipo de tex to nao tem influéncia sobre as diferentes distribui, goes de passivas com Sujeito Lexical e passivas com Sujeito PleonSstico, nas duas linguas. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS BELLETTI, A. (1982) - Morphological passive and pro- drop: the impersonal construction in Italian - Journal of Linguistie Research 2: 1-34 BENNETT, T. (1977) Verb voice in unplanned and planned Rarratives . In: Keenan, E.0. e Bennett, T. (orgs.), Discourse across Time and Space. Southern California Occasional Papers in Linguistics 5: University of Southern California. BEVER,T. (1970) The cognitive basis for linguistic structures In: Hayes, J.R. (org) Cognition and the Developement of Language. New York: Wiley. BORER, H. (1986) I- Subjects Linguistic Inquiry 17 (3). BURZIO, L. (1981)Intransttive Verbs andItalian Auxttia vies. ese de Doutoramento. M.I.T. ~ COMRIE, B. (1977) In defense of spontaneous demotion: the impersonal passive In: Cole, Pie Sadock,J. (org.), Syntax and Semanttes, 8:47-58 AcademicPress, New York, CHOMSKY, N. (1981) Lectures on Government and Binding. Foris, Dordrecht DANES, F. (1979)° Functional sentence pespective and the organization of the text . In: Danes, F. (org.), Papers on Funetonal Sentence Perspective. Mouton: The Hague. DUARTE, Y.C.M.A. (1987) ds Construgoes Passivas do Por tugues e do Inglés:lim Estudo Comparativo, Tese de Dou toramento PUC ~ S30 Paulo ~ 166 D.E.L.T.A. DUSKOVA, L. (1971) On Some functional and stylistic aspects of the passive voice in present-day English . Philologica Pragensta 14: 117-43 FIRBAS, J. (1964) On defining the theme in functional sentence analysis .Travaux Linguistiques de Prague 1: 267-80. FOLEY, W. e VALIN,R. (1984)Fimetional Sytax and Universal Grammar Cambridge University Press: Cambridge. GIVON. T. (1979) ‘On Understanding Grammar ., New York: Academic Press. GUERON, J.(1980) - On the syntax and semantics of PP extraposition Linguistie Inquiry 11(4): 637-78 HAIMAN, J. (1976) Agentless sentences . Foundations of Language 14 HALLIDAY, M.K.(1970) Language structure and language function. In: lyons,J. (org.) New Horizons in Linguistics. New York: Penguin. (1976) “Functions and universals of language In: Kress, G. (org.)Halliday: System and Funetion in Language. Oxford: Oxford University Press. JACKENDOFF, R. (1972) Semantic Interpretation in Genera tive Grammar. Cambridge: MIT Press. 7 JAEGGLI, 0. (1986) Passive ‘Linguistic Inquiry 17(4): 587-622. JESPERSEN,0. (1924) The Philosophy of Granmar.New York: Norton. KEENAN. E. (1975) Some universals of passive in rela tional grammar’ .Papers from the 11th Regional Meeting. Chicago: Chicago Linguistic Society. KHRAKOVSKY, V.S. (1975) Passive constructions In: Kiefer, F. (ore)frends in Sovtet Theoretical Linguistics. Dordrecht: Reidel. KRZESZOWSKI, T.P. (1981) Quantitative contrastive analysis Studia Linguistica 35 (1-2). LI, C. e THOMPSON, S. (1976) Subject and topic: a new typology of language In: Li,C. (org.) Subject and fopte . New York: Academic Press. LYONS, J. (1977) Semantics. Cambridge: Cambridge Univer sity Press. DUARTE 167 MATHESIUS, V. (1964) On linguistic characterology In:Vacheck, J. (ore.)A Prague School Reader in Linguisttes. Blomington: Indiana University Press. NICHOLS, J. (1979) Syntax and pragmatics in Manchu- Tangus languages In: Clyne, P. (org)The Elements: a Pavasesston on Linguistie Units and Levels, pp 420- 28. Chicago Linguistic Society. PERLMUTTER, D. e POSTAL, P. (1977) “Toward a universal characterization of passive’ Papers From the 3rd Annual Meeting of the Berkeley Linguistie Society. Berkeley. (1984) “Impersonal passives and some relatio nal laws . In: Perlmutter, D. e Rosen, C. (org.). Studies in Relational Grammar, 2. Chicago: University of Chicago Press. SIEWIERSKA, A. (1984)The Passive: Comparative Linguistie Analysts. Londres: Croom Helm. SHIBATANI, M. (1985) Passives and related constructions" Language , 61 (4), 821-47. SOBIN, N. ( 1985 ) Case assingnment in Ukrainian morphological passive constructions Linguistie Inquiry, 16(4): 649-62 STEIN, G. (1979) Studies in the Functions of the Passive, Tubingen: Gunter Narr Verlag. SVARTVIK, J. On Voice in the English Verb The Hague: Mouton. TOPPING, D. (1979) Chamorro Reference Crammar, Honolulu: University of Hawaii Press. TURNER, G.W. (1962) The passive construction in English scientific writing - AUMZA 18:181-97 WARBURTON, I. (1975) ° The passive in English and Greek" Foundations of Language, 13:563-78

You might also like