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MALINOWSKI na ane ne eo fo) Para Malinowski o processo cultural, em todas as suas manifestacdes concretas, envolve sempre seres humanos em relacdes soviais dafinidas e que manipulam Artefatose se comunicam utravés da linguagem e outras formas de simbolismo. Equipamerto material organizacio soctal¢simbolisme estariam intimamente Pinculados. (Imagem e maecara da regito do Colfo de Papua, Nova Cuine) genital emigre Siero sistema de parentesco, tema tradicicnal da antropologia, mas estudar a dina txpecifica da ordenacio. das. condutas dentro desse quadro institucional, isto és como “funeionava™, na verdace, uma so” ciedade macrilinear ‘A ordenagio dos dados, nesses traba- thos, mio se fate tanto em eermow da insti (wigdo da familia, mas em termos de um Aspecto universal do comportamento mano, presente em todas as culturas: 0 itnpuisg oexual ‘Nandlise da vida sexual é feta em ter- inode ua dup referencia: o pul Sos biolégicos sua regulamentacio so Gial, A. importinela desse. tema. para Malinowskr esta justamente. em “que consiste no tipo de atividade. icin ul integra mais explicto, impulses perativon sociais, apreventando-se po bre a propria natareza da cultura, Esso integracao, entretanto,. = pode apreendida ao nivel individual rnc bissica 20 impulso sexual implica ‘numa abordagem que localiza no indivi XIX OS PENSADORES duo (¢ nio na sociedade) todos os pro- cessos significativos ¢ todas av explica- Goes formuladas. Aparceem assim nesee tema, com grande nities. o biologismo 0 paieologiamo que estao latentes em Gquase todas obra de Malinowski E necessario reconhecer ques apesar das deficiéncias dease ‘tipo de. aborda- gem, ela permite a Malloowski, como talvex em ieshuon outro trabalho, fazer tmergir, com extraordiniria nities, 0 Tizando quase que exclasivamente as at tades ¢ & motivacko do comportamento a"isto é0 arranjo particular trobrian- desde sspectos tniversais do compor- tamento humano ~, toma-se sparente, através da pecullaridade do costume, a ‘alidade humana da conduta Malinowski demonstra que © compor tamento do trobriandés no & nem irta- Gina en nr mas crete om reensivel dentro’ dan premissas, da Cultura wobriandess. Para demonstrar Sas.’ mas nio & necessirio analisi-las tabation "vienna laren tipo de abordagem, De um lado, ela nos aproxima da vida real. mas. de outro, abandona uma problematica de enorme Felevincia, muito mais presente nas dus utras monogeafius, ut consiste na née Tae das forge socinle que explicam emergéncia e a forea das atitudes pro- prise das situacdes investigadas: a natu, Fezn daa relagdce entre os gropos © Uradas através do parentesco. Na verdade, a ausbnetade uma andlise sistematica do. parentecco.,freqiente- tente impede o etclarecimento de aspee- {os findamentais da organteagdo soil, Constitwindo ma defieiéncia. que tem Sido apontada por todos os criticos de Rialingwski 0 biologismo tantas vezes crticado em Malinowski relaciona'se diretamente com sua ‘concepedo de. cultura, que. € Sempre relerida a capacidade de satista- rer teens humanas. A itamen- talidade ‘da cultura € que assegura. do ponto de vista de Malinowski, sua racio- Malidade inerente A relagho entre as insttuigdes ¢ a sa- XX tisfagio das necessidades humanas apa- eee constantemente em suas tentativas delaboraste wren constitu um pro- ema que le jamais conseguu resolver de modo satifatorio. Nes Slaboracdes osteriores, especialmente tal como apa Fece em A Setentifie Theory of Culture, Malinowski postula toda sims gama de Uipos de necéseidade, Tnicialmete, hia considerar as necessidades biologicas do rganismo, denominadas basics (nutr- fio, procriagio, protecao. ete). Como 0 Hromem, entretanto. s6 pode’ satisfarer cssas necessidades hasicas através, da cultura. surgem necessidades derivadas, relacionadas A manutengdo, reprodueio ¢ transmissio do. proprio equipamente cultural. Estas, Malinowski" subdivide cm mpeativon instrumental a organiagio econdaniea, legate educa. tional da sociedade) © imperativos inte srativos (como a magia, a religido, a ‘éncia e as artes). A difculdade funda mental que encontra é de relacionar. de tim Indo, as necessidades dervadas as tease, de outro, as is- ides he neceseidades, Caberia exatamente a0 conceito de fancio superar esta titima dificuldade define o conceite em termos da corres pondéncia entre a nstituigao ¢ as neces- Sdades que ela saisfaz. Obviamentey al definigho distanciacee enormemente, da splicagio efedea do concelto A andlise tlnograticn Na verdade, a posigio de Malinowski nessa questio é bmstante ambigua, pois tlaborou diferentes conceitos de funtio, definindo-a também, em oposi igo ou carta de sti tall Como é-definide pelo investigad Verificaceefaeslmente que essn defini & diferente da anterior ¢ muito mais pro- xima do método de interpretagao usado no tratamento dos dados empiricos, onde Ea analise da funcio que permite a pac- sagem da conseiénein dos agentes para as conexdes gerais. constituldas pelo ob servador e que definem a natureza da inmituieao (Como oeore. por exemplo, na analise do Kula). ° Questées tebrieas ¢ metodologicas permeiam toda a obra de. Malinowski pos 1930. aparecem mais alguns en- MALINOWSKI Malinoveski oi um dos expoentes do hancianalimo om antropotagia ialnesino Encontr tl de Associagdo dntropotagica Americana, realizado no ano de 1939) ation, verbetes« artigos nos quais pr cura explicitar © sintetizar sua postzao teoriea Datam desea época, por exem plo, o verbete Culture da Encyclopaedia Of Social, "Seiences (1931), 0 Nerbeve inthropology, do Book of the Year de 1938 da Encyclopaedia Britannica e as diferentes versoet do artigo “Culture as determinant of Behavior” (1937, 1937, 1938). £ também a partir dessa época que sua posicio comega a ser criticada pelos antropologos mais jovens, sobre os {uais aumenta a influéneia do funciona- wo catrutural de Radeliffe- Brown, A dltima grande obra ntretanto, nao ae pode dizer que di- tigio de' Malinow det Seua proprios alunos comegam a atingir a ma. furidade cientfiea; muitos deles. tendo terminado. 0: trabalho de earypo Sob sua orientacio, comecam a publicar Shras originals. Malinowski prefaciou tuitas. dessas monogralias: cm-l tocreveu a introducao do livro de Reo Fortune, Sorcerers of Dobu e de Audrey Richards. Pheiger and Work in a Savage Tribes em 1934: prefaciow o trabalho de Ian Tiogbin, Lave and Order in Pole: Sia; em 1936, 0 de Raymond Fit, We The Tikopia; no ano seguinte, 0 de Ash [ey Montagu, Coming of Age in Samoa: mr 1938, aparece, com prefacio de Mali fowski. 9 lnvrode Jomo Kenyata, Fac Mount Kenya, "primeira, monogra antropolbgien eserita por um membro da Sociedade tribal : ‘Com tantos discipulos fazendo traba- thos de campo. aumenta também seu in- teresse pelos problemas da transforma: ‘ao cultaral induida pela dindmica da Sfmuagao colonial, interesse que cresce depois de sun visita & Africa, Em 1936, parece seu primeiro artigo sobre esse problema, “Native Education and Cul- ture Contact”. Data de 1938 um ensaio fitulndo “Introductory Essay on the itotig Sng Me incl tte ene memeaartentetalaes eo tae fete Sle Xx os eget Sora td mt and tee Te aa tl ate tes I ta ao ae Ct tate mr ae Soh pti cde ps than ele mens i i nd eo Stak SAEs Sond a reel ’ Seeeea ie foe ennenene hata 22h, Si ene 8 terra, levantando. de modo extrema- mente rico ¢ original. a questi basica da relacio entre 0 proceso produtivo © sua regulamentacio juridica, politica e mitolbgica. Com Coral Gardens, encer- ra-se-o ciclo das suas grandes producdes etnografieas, Xxit SADORES Publicagdes péstumas Em 1938, Malinowski volta nova- mente & América para uina permanéncia tnais prolongada. Com sade outra vez abalatla, estabelecesse por alg tempo tm Tucson, Arizona, onde 0 elima ce mostra bendfico para suas complicagies puboonares (0 inicio da guerra na Europa levaco a prolongar a_permanéncia nos. Estados Unidos: send’ contratado como profes sor visitante pela Universidade de Yale tm outubro de 1939. Permanece nessa Universidade até 1942, através de uma subsencio do. Bernice’ Ps Bishop Mu. Scum. ile Honolulu. tendo encontrado tompo e energin para iniciar novo traba- Iho de campo entre os Zapotec, no Me- xieo. No inieio de 1942 fotnomeade pro fessor permanente da Universidade de Yale, mas filecew 16 de mato dese mesmo ano, em New Haven, antes de as- ‘esses ultimos anos reconstituiu sua ida familiar, tendo easado com a ar tista Valetta Swann, A crise dflagrada pela ascensio do nazismo eo inicio da Segunda Guerra ‘Mundial. entretanto perturbaran-no profundamente. Viana Emergéncia do" totalitarismo wna ameaca a propria civilizacao, com a dese truigio de codon ot valores nos quais realmente acreditava, Tmbora tivesse se naturalizado cida- dio britanico ha muitor anos e no sc incase plement com a Pol Tevouo m solidariaar-ve com 0 pove por lonés, tendo ajudado a fundar, woe Bta- dos Unidos, @ Polish Institute of Arts fand Selenete, do qual fol presidente, através do qual ve empenhou em auniliar os refugiados polonese Nesseperiotlo Final de sum vida, Mali- nowski no produsiv senhumn obra de ‘nde relevincia. Os trabalhow dessa Epoca, em geral pequenos, estho quase todos voltados pata as questdes que ov ttham preocupando desde o nile da d ‘ada de'30. rapectalmente aquelas rela tivas a translormagio. das ‘yociedades tribnise A fandamentngio ebriea do fi Cionalismo. Sobre esta iltima questi ublicou, em 1939, The Group and the Individual in functional analyst MALINOWSKI A aE etc AYR a a SENSE ea MALINOWSKI A cultura, para Malinoteski, no é um todo indiferenciado, mas uma totalidade integrada gue apresenta nicleos de rdenagao e correlaedo = as instituicoes. 4 nattcan Tune untae multidimensional gue comprende: a conti au cédigo, un grupo humano organizado e um equipamento material manipulado pelo grapo narealisagio de suns atividades (Capa de obras de Malivoeski) Apis sun mort auxiliada por amigos c discipulos de Malinowskh. empreendew ‘1 publicacso dos manuseritos que ele havia deixado, Em 1944 aparece a Scientific Theory of Guleure ~ and other essays, com prefacio da. Huntington Cairns que preparou ® manuserito para publicagao, Esse trabalho consiste numa tentative de conciliar © integrar = abordagern scad'ng apatioe da iiueden com 3 concepeao instrumental da cultura; nel Malinowski elabora a teoria das necess dades basicas © dos imperatives culty ras, Apesar de incomplete ¢ contradi tio, o lwo teve grantte aceltagao, endo tradhurido para inimeras linguse Em. 1943 € publicado The Dynamics of Culture Change, editado por Phyllis M. Kaberry e uma de suas obras discutivels’— que, incorpora,trabal ‘jue publicars shteriormente © as d Ses! que promovera durante os sem ros que condurin em Yale em 1941, Tal andlive da transformagao’ cultural as fume’ forma extremamente rigida de Telagdes entre instiuigoes de tres reall dades ou culwurasdistintas: a do coloa- fador. a tribal e-a-nova coltura que No'conjunter esvae dune obras psu: man, apesar de su smmpla divulgagae © Sceinon ram ui ender deo Thea apressadas e de contradigbes. Mui tas dno crtioas drigidas a Malinowski ei fragilidade de nua teorta da clara haneiamseeatainente esse ‘val hos, que prestam facilmente & critica «com isso, dbscurecem 9 alcance das ontribuigdo & antropologia moderna ¢ SSCiencias humanas em geal Siuito diseutivel for também a wii 1967, da tradugao de eeu didrto inns XXuL OS PENSADORY Sega eee ane caree apace eres eseg hae eel teas ee eae res (alias, nao sem motivo) e as freqiientes Ci geet ene eas dade para com os nativos que acometem. inevitvelnente todo pengusador de campo na situacio de “observagio parti inant" recon por atoms didade da obra de Malinowakt extho con- tidas, com” toda. sua. riqueza, nas ‘monografias etogrificas CRONOLOGIA 1858 — Franz Boas nasce fem Minden, Alemanha, Totem ¢ Tabu, de Freud; ¢ xual Life of Savages in de A familia entre os abort North-Western Melanesia. 1881 — ‘Radcliffe-Brown —gines australianos, de Mali- 1930 — Radeliffe Brown rnasce em Birmingham, In- mows publica The Social Organi- slater. 1922 — Malinowski pu- zation of Australian Tribes. 1883/84 — Boas realiza ob- blica__Argonautas. “do 1932. — | Malinowski_pu servagies entre os esquimés. Ps ico Ocidental; publica blica The Serual Life of Sa: 1884 — Nasce Bronislaw gio de The Andaman Islan- vages. Malinowski em Cracévia, ders, de Radcliffe Brown. 1938 — Publica Coral Polénia. 1925 — Malinowski pu. Gardens and Their Magic. 1906/08 Radcliffe. lia Magic, Science and 1942 — Morre Malinowski. Brown faz pesquisas entre os andamaneses. 1910 — Malinowski & ad- ‘mitido na London Schoo! of Economics. 1911 — Boas publica Chan ges in Bodily Form of Des cendents of Immigrantes. 1913 — Publicagao de As formas elementares da vida ciety. veligiosa, de Durkheim: Religion, 1926 — Publica o verbete Antropologia, na Enciclopé dia Briténica, ¢ as obras 1945 Crime and Custom in Sa vage Society e Myth in Primitive Psychology. 1947 1927 — Publica Sex and Repression in Savage So- 1929 — Publica The Se Morre Franz Boas. 1944 — Publicardo de A Scientific Theory of Culture Publicagao de The Dynamics of Culture Change. Publicagio de Freedom and Civilizat 1948 — Publicagio de Ma- Bic, Science and. Religion and Other Essays BIBLIOGRAFIA Duauas, E.R: A Reconstituicdo da Realidade. Um estudo sobre a obra etnogrifica de Bronislaw Malinowski. Tese de Livre Docéncia apresentada 20 Departamento de Ciéncias Sociais da F. F.L. eC. H. da U.S.P. Edigio Mimeografad ‘an evaluation of the work of Bronislaw Malinowski, Rou. Fuern. Ri: Man and Culture . Paulo, 1973. tledge & Kegan Paul, London, 1957, “Obituary: Prof. B. Malinowski” in Nature, vol. 149, 1. 661, London, 1942. Gtucksas, M.: Malinowski’ Sociological Theories in The Rhodes-Livingstone Papers 1. 16, Oxford, 1948. Hornet, E. A: The Trobriand Islanders: Primitive Law as seen by Bronislaw Malinowski, cap. 8 de The Law of Primitive Man, Cambridge, Mass. 1954 K1ucknonn, C.: Bronislaw Malinowski, 188: 56, 1943. 242 in Journal of American Folt-lore, vol Lanounet, Hu: £'Echange et le Commerce dans les Archipels du Pacifique et en Afrique Tropicale, lomo Ill de L "Histoire du Commerce, Ed. J. Lacour-Gavet, Pars, 1953. Merpock, G. 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Ele estava bem munido — tanto em conhecimentos te6ricos quantc em experiéncia prética — para a tarefa a que se propés. De seus conhecimentos te6ricos ele ja nos deu provas em seu tratado sobre a organizagao da familia entre os abo-igines da Australia, obra erudita e bem cuidada; ' sua experiéncia prética evidercia-se ndo menos satisfatoriamente em seu relato sobre os nativos de Mailu, baseado em seus seis meses de convivéncia com eles na Nova Guine. ? A leste da Nova Guiné, nas ihas Trobriand, as quais ele a seguir devotou sua tengo, 0 Dr. Malinowski viveu, durante muitos meses a fio, como um native entre os nativos, observando-os diariamente no trabalho e nas diversdes, conver- sando com eles na propria lingua nativa e obtendo todas as suas informagées das fontes mais seguras: — observagdes pessoais e declaragies feitas a cle direta- ‘mente pelos nativos em sua propria lingua, sem a intervengio de intérpretes. Péde ele, dessa maneira, compilar uma multiplicidade de dados de alto valor cientifico, referentes vida social, religiosa e econdmica dos nativos das ilhas Trobriand. Ele tenciona e espera poder, futuramente, publicar integralmente todos esses dados; nesse interim, ele nos oferece com 0 presente volume um estudo preli- tminar sobre uma faceta interessante ¢ muito peculiar da sociedade de Trobriant: 0 extraordindrio sistema de trocas (econdmico ou comercial apenas em parte) til zado pelos ilhéus entre si e com os habitantes das ilhas circunvizinhas. Nao precisamos refletit muito para nos convencermos de que as forcas econd- micas sao de suma importancia em todos os estégios do desenvolvimento humano, do mais humilde ao mais elevado. A espécie humana, afinal, ¢ parte integeante do mundo animal ¢, como os outros animais, precisa de um alicerce material ‘a0 qual pode sobrepor uma vida melhor — intelectual, moral ¢ social; sem esse alicerce, esta superestrutura é impossivel. A fundamentagao material, que comsiste nna necessidade de alimento ¢ em certo grau de calor ¢ protecio contra os cle~ ‘mentos, forma 2 base econdmica ou industrial e constitui condigao necessiria da vida humana. Acredito que, se agora os antropélogos indevidamente negligen- ciaram esse aspecto, foi porque eles foram atraidos por aspectos mais elevados da * Malinowski, Bronislaw, The Family among the Australian Aborigines: A Soctologlcal Siruly Londres, University of London Press, 1913. 2 Malinowski, Bronisiaw, “The Natives of Mailu: Preliminary Results of the Robert Mond Research Work in British New Guinea". Transactions of the Royal Soctely of South Australia, vol. XXXIX, 1915, 6 MALINOWSKI natureza humana — e nao porque deliberadamente ignoraram ou subestimaram 4 importancia e necessidade de um aspecto mais basico. Como desculpa por essa negligéncia, podemos também lembrar que a antropologia é ainda uma ciéncia jovem ¢ que @ multiplicidade dos problemas a serem enfrentados pelos estudiosos fndo pode ser abordada simultaneamente, mas deve ser analisada por partes, isoladamente, Seja como for, 0 Dr. Malinowski acertou ao enfatizar a grande importancia da economia primitiva, isolando para um estudo detalhado 0 exiraor. dinério sistema de trocas utilizado pelos nativos das ilhias Trobriand Além disso, ele sensatamente recusou limitat-se a uma simples descrigio do Processo de trocas: dispés-se, em vez disso, a penetrar nos motivos que o funda. entam, bem como nos sentimentos que ‘provoca nos nativos, Parece-me que alguns estuciosos defendem 0 ponto de vista de que a sociologia deve aterst escrigdo das acdes, deixando para a psicologia o problema dos motivos senti. mentos. Sem divida, a anilise das motivages ¢ reagies difere do estudo das agoes © peitence, estritamente falando, ao ambito da psicologia. Na pritica, orém, o comportamento social nada significa para o observador, 2 n20 ‘er gue cle conhega ou possa inferir pensamentos © emogdes do agente. Assim, a simples deserigio de atos, sem qualquer refer 0 estado mental do agente, nao vai de encontro aos propésitos da sociologia, cujo objetivo no é apenas registrar mas, sim, entender 0 comportamento do ser humano na sociedade. Portanto, a sociologia no pode levar a cabo sua tarefa sem amparar-se, a cada passo. na psicologia, © método do Dr. Malinowski caracteriza-se pela preocupacdo em levar em conta a complexidade da natureza humana, Ele observa o ser humano em sua totalidade, ciente de que o homem é uma criatura dotada de paixdes tanto quanto de razio, ¢ nao poupa esforcos para descobrir a base tanto racional quanto emo- clonal do comportamento humano. O cientista, assim como o literato, tende a ver a humaridade somente em abstrato, selecionando para suas consideragoes apenas um aspecto dos muitos que caracterizam 0 ser humano em sua comple- xidade. Das grandes obras literdrias, a de Moliére pode ser usada como ‘um exemplo tipico dessa visio parcial. Todas as personagens de Moliére s40_proje- tadas num sé plano; uma delas € 0 avarento, outra o hipécrita, outra o preten= sioso — ¢ assim por diante; mas nenhuma delas é humana. Sao todas bonecos, vestidos de modo a parecerem seres humanos. A semelhanca, porém, é apenas superficial. Por dentro, sao ocas e vazias, pois a fidelidade & natureza foi sacri ficada ao efeito literdrio. Bem diferente é'a apresentagao da natureza humana na obra de outros. grandes autores como Cervantes © Shakespeare: suas personagens so sdlidas, criadas ao molde humano em quase toda a sua multiplicidade de aspectos. Sem diivida, nas ciéncias nao é s6 legitimo mas necessirlo um certo grau de abstracdo, pois elas nada mais 40 do que o conhecimento clevado a Poténcia mais alta, todo conhecimento implica num proceso de abstragio © generalizagdo: até mesmo para reconhecermos uma pessoa a quem vemos dia‘ia. mente, € imprescindivel usarmos certas abstracées e generalizagoes que sobre cla viemos fazendo, cumulativamente, no passado. Assim, a antropologia & forgada a abstrair certos aspectos da natureza humana, considerando-os & parte da redli- dade conereta; mais precisamente, ramifica-se cla em varias outcas ciéncias, cada uma analisando 0 complexo organismo humano sob um tinico aspecto —- fisiso, intelectual, moral, ou social. As conclusdes gerais de cada uma dessas ciéncias compéem um quadro mais ou menos incompleto do ser humano como um todo Fuel ompleto porque as facetas que o compoem correspondem a apenas algumas das muitas que o caracterizam. ‘A: grande preocupagio do Dr. Malinowski em seu presente estudo é a andlise de fatos que, a primeira vista, poderiamos interpretar como uma atividade pura- ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 7 mente econimica dos habitantes das ilhas Trobriand; todavia, com a grande abertura de perspectiva e acuidade que o caracterizam, ele se di a0 cuidaco de ‘nos demonsirar que essa curiosa circulagdo de riquezas entre os habitantes das ithas Trobriand e os das demais ilhas, embora acompanhada por um comércio de tipo comum, nao constitui, de maneira alguma, uma forma de transagdo estrita- mente comercial; ele nos mostra que essa modalidade de troca néo se fundamenta num mero cdlculo utilitério de Iueros ¢ perdas; ¢ que ela vem de encontro a necessidades emocionais ¢ estéticas de ordem mais elevada que o simples atendi- mento aos requisitos da natureza animal. Tudo isso leva 0 Dr. Malinowski a criticar acerbamente a concepcio que se faz do Homem Econémico Primitivo como um tipo de fantasma que, segundo parece, ainda infesta os livros de texto das cigncias econdmicas, chegando mesmo a estender sua influéncia nefasia as mentes de alguns antropélogos. Vestindo ox farrapos abandonados pelos senhores Jeremy Bentham e Gradgrind, esse fantasma horrendo aparentemente € movido exclusivamente pela sede de lucro, o qual ele busca implacavelmente, seguindo principios spencerianos, ao longo das linhas de menor resisténcia. Se realmente os bons pescuisadores acreditam que tal ficgao angustiante possa encontrar para- Ielos na sociedade silvicola e nio a véem apenas como mera abstragio iil, 0 relato do Dr. Malinowski sobre 0 Kula deve contribuir para destruir definitiva- mente este fantasma — pois o Dr. Malinowski demonstra que a transagio de objetos uiteis, parte integrante do Kula, ocupa, na mente dos nativos, uma posi¢a0 inteiramente subordinada a troca de ‘certos ‘objetos que é feita sem quaisquer finalidades uilitrias. Combinando transages comerciais, organizagio social, mitos € rituais magicos — 0 Kula, essa.extraordindria instituicao nativa que chega a abranger enorme extensdo geogréfica, parece nio ter paralelos nos anais de antropologia. Mas, seu descobridor, 0 Dr. Malinowski, pode muito bem ter razio 40 presumir que entre os povos selvagens e barbaros existem outras instituigdes — se nao idénticas, pelo menos semelhantes ao Kula — que eventualmente serao descobertas através de novas pesquisa. Segundo o Dr. Malinowski, & importancia que a magia assume nesta instituigio constitui uma das facetas mais interessantes ¢ instrutivas do Kula. A julgar pela mmeira com que ele a descteve, a realizagao dos rituais de magia ¢ 0 uso de férmulas mégicas so indispensdveis ao bom éxito do Kula em todas as suas fases — desde a derrubada das drvores, cujos troncos so escavados e transfor- mados em canoas, até 0 momento em’ que, terminada a expedic’o com éxito, as canoas © sua preciosa carga iniciam a viagem de volta a0 ponto inicial. A propésito, aprendemos também que os rituais de magia e os feiticos so igual- mente indispenséveis & horticultura e ao bom éxito na pesca — duas das ativi- dades que constituem principal meio de sustento dos nativos; 0 “feiticeiro agricola”, a quem cabe a responsabilidade de promover, através de suas fSrmalas, © crescimento das plantas, € conseqiientemente um dos elementos mais impor- tantes da aldeia, figurando hierarquicamente logo abaixo do chefe e do feitieiro propriamente dito. Em suma, os nativos créem que a magia é absolutamente imprescindivel, a todo e qualquer ramo de suas atividades — que € tao impres- cindivel a0 bom éxito de um trabalho como as operagées técnicas envolvidas, tais como a impermeabilizacio, pintura ¢ lancamento de uma canoa, o plantio de uma horta, a colccagao de uma armadilha para peixes. “A f€ no poder da magia”, conta-nos o Dr. Malinowski, “é uma das principais forcas psicolégicas que per” mitem a orgenizagio e sistematizagao do esforgo econémico nas ilhas Tobriand.” © valioso relato do Dr. Malinowski sobre a magia como fator de grande importncia para 0 bem-estar econémico e, de fato, para a propria sobrevivéacia da comunidade nativa, é suficiente para anvlar a hipétese errinea de que a magia, contrariamente’ 4 religido, € por sua propria natureza essencialmente 8 MALINOWSKI maléfica e anti-social; e que & sempre usada pelo individuo para promover seus proprios interesses egoistas e prejudicar seus inimigos, sem levar em conta seus efeitos sobre o bem-estar comum, A magia pode ser usada com essa ‘inalidade ¢, de fato, provavelmente 0 € em todas as regides do mundo; nas ilhas Trobriand também se acredita que seja praticada com fins nefandos pelos feiticeiros, que provocam nos natives temores profundos e preocupagdo constante. Mas, em si, ‘a magia nfo é nem benéfica nem maléfica; € simplesmente um poder imagi- nério de controle sobre as forcas da natureza, que pode ser exercido pelo feiti- ceiro para o bem ou para o mal, para beneficiar 0 individuo ou a comunidade, fou para prejudies-los. “Sob esse’ ponto de vista, a magia est exatamente no mesmo plano das ciéncias, das quais vem a ser'a “irma bastarda”, também as ciéncias ndo so nem boas nem més em si, embora possam gerar tanto o bem quanto o mal, conforme a mancira como forem utilizadss, Seria absurdo, por exem plo, estigmatizar a farmacéutica como ciéncia anti-social por que 0 conhe- cimento das propriedades das drogas pode ser empregado tanto para curar quanto para destruir 0 homem. E igualmente absurdo negligenciar a aplicacio bené- fica da magia, atendo-se apenas a sua utilizagio maligna na caracterizagio das propriedades que a definem. As forcas da natureza, sobre as quais a ciéncia exerce controle real € a magia controle imaginrio, iio sto influenciadas pela disposigio moral ou pela boa ou mé intengao do individuo que se utiliza de seus conhecimentos especiais para colocé-las em movimento, A acéo das droges no ‘organismo humano € exatamente a mesma, quer sejam elas administradas por tum médico, quer por um envenenador. A natureza eas nao so nem benéficas nem hostis & moral; so simplesmente indiferentes a cla, e estio igual- ‘mente prontas para atender as ordens quer do santo, quer do pecador, desde que um deles thes dé a ordem adequada. Se na artilharia as armas estio bem carregadas e apontam para o alvo certo, seu fogo sera igualmente destrutivo: nfo no importa que seus portadores sejam patriotas @ lutar em defesa da patria, ‘ou invasores a arriscar-se numa guerra de agressio injusta. Caracterizar a ciéncia ou a arte em fungao de sua aplicabilidade, ou de acordo com a intengio moral do cientista ou artista € obviamente falacioso no que se refere & farma- ‘Gutica ou a artilharia; © 0 € igualmente (embora, para muitos, nao tao Sbvio) no que diz respeito & magia A grande influéncia da magia sobre a vida ¢ pensamento dos nativos das ithas Trobriand &, no presente volume, talvez um dos aspectos que mais impres- sionam o Ieitor. O Dr. Malinowski nos conta que "a magia, tentative humana de controlar diretamente as forcas da natureza através de conhecimentos especiais, € fator fundamental € permeante na vida dos nativos das ilhas Trokriand”; & “parte integrante de todas as suas atividades industriais ¢ comunitérias”; “todos 08 dados até agora analisados revelam a extrema importancia da maga’ no sis- tema do Kula. Mas, se se tratasse de qualquer outro aspecto da vida tribal desses nativos, constatariamos igualmente que os nativos recorrem & magia toda vez que ‘enfrentam problemas de importancia vital. Podemos dizer, sem corrermos 0 isco de exagerar, que a magia, segundo eles, governa os destinos do homem; que ela dé ao homem o poder de dominar as forgas da natureza e que ela é a arma ¢ 0 escudo com que 0 homem enfrenta todos os perigos que o rodeiam”. Assim sendo, no ver dos ilhéus de Trobriand, a magia € uma forga de su- prema importéncia, quer para o bem, quer para o mal; ela pode construir ow ani- Quilar a vida de um homem; pode sustentar e proteger 0 individuo e a comu- dade, ou pode prejudicé-los e destrui-los. Comparada a esta convicgio univer- sal e profundamente enraizada, a crenga na existéncia dos espiritos dos mortos poderia, & primeira vista, parecer de pouca influéncia na vida dagueles nativos, Contrariamente & atitude geral entre os selvagens, os nativos de Trobriand néo ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 9 temem os espiritos. Acreditam, mesmo, que os espiritos voltam as aldeias uma vez por ano, a fim de participar do grande festejo anual; mas, “de maneira geral, os espiritos ‘néo tém muita influéneia sobre os seres humanos, seja para o bem seja para o mal”; “nada existe da interagio métua, da colaboragdo intima entre (© homem e os espiritos que constitui a esséncia do culto religioso”. Esse predo- minio conspicuo da magia sobre a religio — ou, pelo menos, sobre 0 culto dos mortos — & uma caracteristica marcante da cultura dos ilhéus de Trobriand, que ‘ocupam lugar relativamente alto na escala da selvageria. E este fato nos fornece nova prova da extraordindria forca e da tenacidade da influéncia que essa uni- versal iluséo tem exercido agora e sempre, sobre a mente humana. ‘Sem diivida, iremos aprender muito sobre a relagdo entre magia e religiao entre os nativos das ilhas Trobriand no relato completo das pesquisas do Dr. Malinowski. Da observagdo paciente que devotou a uma iinica instituigdo e da riqueza de detalhes com que a ilustrou, podemos auferir a extensio e 0 valor da obra completa que esti em preparago, a qual promete ser um dos trabalhos mais completos e cientificos j4 produzidos sobre um povo selvagem, J. G, Frazer Londres, The Temple, 7 de marco de 1922. PROLOGO do autor Encontra-se a moderna etnologia em situagdo tristemente cOmica, para no dizer tragica: no exato momento em que comeca a colocar seus laborétérios em ordem, a forjar seus proprios instrumentos e a preparar-se para a tarcfa indicada, © objeto de seus estudos desaparece répida e irremediavelmente. Agora, numa Epoca em que os métodos © objetivos da etnologia cientifica parece ter se delineado; em que um pessoal adequadamente treinado para a pesquisa cientifica esté comecando a empreender viagem as regides selvagens ¢ a estudar seus habitantes, estes esto desaparecendo ante nossos olhos. ‘A pesquisa sobre racas nativas, realizada por pessoal de formago académica, tem-nos fornecido provas irrefutéveis de que a investigagao cientifica e metédica proporciona resultados melhores — e em maior mimero — que a dos melhores amadores. A maioria, embora nao a totalidade, dos relatos cientificos feitos atual- mente tem revelado novos ¢ inesperados aspectos da vida tribal: tracou, em linhas claras e precisas, um quadro de instituigdes sociais, que sio muitas vezes surpreendentemente vastas ¢ complexas; apresentou uma visio do nativo, tal como ele é, com suas crengas ¢ praticas religiosas ¢ magicas; ¢ nos permitiu penetrar em sua mente de maneira mais profunda do que nos era possivel ante- Fiormente. Deste material novo, que tem cunho genuinamente cientifico, os estu- diosos de etnologia comparada jé podem retirar algumas conclusdes valiosas so- bre a origem dos costumes, crengas e instituigSes humanas, sobre a histéria das cculturas, sua difusio e contato, sobre as leis do comportamento do homem em sociedade e sobre a mentalidade humana. A esperanga de se obter uma nova visio da humanidade selvagem através do trabalho de cientistas especializados surge como uma miragem para desapa- Fecer novamente quase no mesmo instante. Embora atualmente ainda se encontre tum bom nimero de comunidades nativas disponiveis ao estudo cientifico, dentro de uma ou duas geragdes essas comunidades ou suas culturas terdo preticamente desaparecido, E premente a necessidade de trabalho arduo, € curto demais 0 tempo. Além disso, é com tristeza que se verifica, até 0 presente, uma falta de real interesse por parte do piiblico nesse tipo de estudos. Sao poucos os pesqui- sadores, ¢ 0 incentivo que recebem & escasso, Em vista disso, no sint> necessi- dade de justificar uma contribuigdo etnolégica que € resultado de pesquisa de campo especializada, Neste volume eu relato apenas uma das facetas da vida selvética, descre- vendo certos tipos de relagies comerciais que se vetificam entre os rativos da Nova Guiné. Este relato foi selecionado de material etnogrifico que cobre toda a cultura tribal de um distrito. Sem duivida, para que um trabalho etnogréfico seja vélido, & imprescindivel que cubra a totalidade de todos os aspectos — social, cultural e psicoldgico — da comunidade; pois esses aspectos so de tal forma 2 MALINOWSKI interdependentes que um no pode ser estudado e entendido a nao ser levando- se em consideragao todos os demais. O leitor itd perceber claramente que, ‘embora o tema principal desta pesquisa seja econdmico — pois trata de empre- endimentos e transages comerciais —, constantes referéncias serdo feitas & orga- nizagdo social, aos rituais mégicos, & mitologia e folclore — enfim, a todos os demais aspectos da vida tribal, além do nosso tema principal, A regio geogréfica de que tratamos neste volume limita-se & dos arquipélagos situados no extremo leste da Nova Guiné. Nela, um tinico distrito, o das ilhas Trobriand, constitui o objeto principal de nossa pesquisa, Este, entretanto foi estudado minuciosamente. Durante aproximadamente dois anos, ¢ no decorrer de trés expedigdes a Nova Guiné, vivi naquele arquipélago e, naturalmente, du- ante esse tempo, aprendi bem a sua lingua. Fiz meu trabalho completamente sorinho, vivendo nas aldeias # maior parte do tempo. Tinha constantemente ante meus olhos a vida cotidiana dos nativos e, com isso, nao me podiam passar des- percebidas quaisquer ocorréncias, mesmo acidentais: falecimentos, brigas, disputas, acontecimentos piblicos ¢ cerimoniais. Na atual situagdo em que se acha a etnografia, quando ainda ha muito por fazer no sentido de se estabelecerem as diretrizes e 0 escopo de nossas proximas pesquisas, € necessério que cada contribuico nova se justifique em diversos pontos. Deve revelar algum progresso metodolégico; deve superar os limites das pes- guises anteriores, em amplitude, em profundidade ou em ambas; e, finalmen- te, apresentar seus resultados de maneira precisa, mas nio insipida. O espe- cialista interessado em metodologia ir encontrar, na Introdugéo, nas segdes 1T- IX ¢ no capitulo XVIIT, uma exposigao dos meus pontos de vista c esforgos neste sentido, Ao leitor que se preocupa com os resultados da pesquise mais do que com o processo pelo qual foram obtidos, apresento nos capitulos IV-XXT tum relato das expedicdes do Kula e dos varios costumes e crencas que a cle se acham associados. O estudioso que se interessa nao s6 pelas descrigdes, mas também pela pesquisa etnogréfica que as fundamenta e pela definicéo precisa da instiuigdo, encontraré a primeira dessas nos capitulos Ie Il, ¢ a ultima no capitulo I. ‘Ao Sr. Robert Mond desejo expressar meus maiores agradecimentes. Gragas & sua generosa doagio, pude levar a efeito, durante muitos anos, pesquisa da qual esta monografia representa apenas uma parcela. Ao Sr. Atlee Hunt, C. M. G. secretério do Departamento de Habitagio e Territérios do governo australian, quero expressar meu reconhecimento pelo auxilio financeiro que obtive através de seu departamento, e também pela grande colaboracao que cle me ofereceu Yio prontamente. Nas thas Trobriand, fui imensamente auxiliado pelo Sr. B Hancock, negociante de pérolas, a quem sou grato néo s6 pela assisténcia servigos a mim prestados, mas também pelas grandes provas de amizade que dele recebi. Pude aperfeigoar muito dos meus argumentos neste livro através da critica feita por um amigo meu, o Sr. Paul Khuner, de Viena, especialista nos negécios préticos da industria moderna e pensador altamente qualificado em assuntos eco- némicos. O Professor L. T. Hobhouse pacientemente leu o manuscrito, dando-me conselhos valiosos sobre diversos pontos. Sir James Frazer, com seu preficio, engrandece o valor deste livro muito além de seu mérito; é ndo 36 uma grande honra e de grande proveito té-lo como autor do preficio, mas também especial satisfagdo, pois minha paixao_pela etnologia associa-se em sua origem a leitura de seu livro Golden Bough (O Ramo Dourado), na época em sua segunda edigao. Por iltimo, desejo mencionar © nome niio menos importante do Professor C. G, Seligman, a quem dedico este livro. A ele devo a iniciativa de minha expe- ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 13 io; € a ele, mais do que posso expressar com palavras, sou especialmente fgrato pelo incentivo e aconselhamento cientifico que me deu téo generosamente ‘no transcorrer de minhas pesquisas na Nova Guiné. BM, El Boquin, Ieod de Los Vinos, Tenerife, abril de'1921 AGRADECIMENTOS, A pesquisa etnogrifica, por sua prépria natureza, exige que 0 pesquisador dependa da assisténcia e auxilio de outros, 0 que ocorre muita mais freqiient mente na etnografia do que em outros ramos cientificos. Desejo, portanto, expres- sar nestas péginas meu profundo agradccimento as muitas pessoas que me aju- daram. Financeiramente, como jé consta no prefécio, minha maior divida & para com o St. Robert Mond, que possibilitou meu trabalho a0 conceder-me a bolsa de viagens “Robert Mond” (Universidade de Londres), de 250 libras esterlinas fanvais, que recebi por um perfodo de cinco anos (1914, 1917-1920). Fui substancialmente auxiliado, também, pela doagao de 250 libras obtides através ddos esforgos do Sr. Atlee Hunt, C. M. G., do Departamento de Habitagio e Ter- ritérios da Austrdlia, Da Faculdade de Ciéncias Econdmicas de Londres recebi a bolsa de estudos “Constance Hutchinson”, de 100 libras anuais, pelo periodo de dois anos (1915-1916). O Professor Seligman, a quem muito devo nesta pesquisa © em tantos outros assuntos, além de ajudar-me a conseguir todas essas bolsas ¢ doagses, deu-me 100 libras de seu proprio bolso, destinadas aos gastos da expedigao; presenteou-me, também, com uma maquina fotografica, um fond- grafo, instrumentos antropométricos e vrios aparelhos adequados 2 pesquisa eino- grifica, A convite e sob os auspicios do governo australiano, estive na Australia Em 1914 com a Associagio Briténica para Desenvolvimento da Ciéndia Talver seja de interesse a futuros pesquisadores de campo notar que minha pesquisa einogrifica se desenvolveu num periodo de seis anos (1914-1920); fiz tres expedigdes diferentes a rogido onde desenvolvi meus trabalhos © — nos inter~ valos entre elas — analisei o material obtido ¢ estudei a literatura etnogratica especializada de que dispunha na época. Para isso tudo, foram-me necessarios pouco mais de 250 libras anuais. Pude custear com esse dinheiro no 6 as des- pesas de viagem e pesquisa — tais como passagens, soldo de criados nativos & agamentos a intérpretes — mas também um bom niimero de espécimes etnogré- ficos, parte dos quais foi doada ao Museu Melbourne sob o titulo de “Colegio Robert Mond”, Nada disso teria sido possivel se eu ndo tivesse, também, recebido ‘a ajuda de residentes da Nova Guin. Meu amigo, o Sr, B. Hancock, de Gu- Sawela, nas ilhas Trobriand, permitiueme que usasse sua casa e sua oja como base para meus aparcthos ¢ provisGes; emprestou-me seu barco em ocasides diversas € me proveu com um lar ao qual eu podia sempre voltar em caso de necessidade ou doenga. Auxiliou-me no trabalho fotogrifico, fornecendo-me, inclu- sive, um bom numero de suas proprias chapas fotogrificas, muitas das quais se encontram reproduzidas neste livro (ilustracdes XV, XXXVIT e L-LI1), ‘Outros negociantes de pérolas © comerciantes das ithas Trobriand foram também bastante pacientes comigo — de modo especial, © Sr. ¢ a Sra. Raphael Brudo, de Paris; os Srs. C. e G. Auerbach; e o finado St. Mick George. Todos cles me ajudaram bastante em diversos aspectos do meu trabalho e ofereceram sua bbondosa hospitalidade. 16 MALINOWSKI Durante os intervalos em Melbourne, fui grandemente auxilisdo em meus estudos pelos funcionérios da excelente Bibliotcea Pablica de Victoria; a todos eles expresso minha gratidao através do bibliotecério, Sr. E. La Touche Arms- trong, meu amigo Sr. E. Pit, o Sr. Cooke e outros ois mapas ¢ duas ilustragoes acham-se aqui reproduzidos por gentil con- cessio do Professor Seligman, retirados que foram de seu livro Os Melanésios da Nova Guiné Brivénica. Desejo, também, expressar meus agradecimentos 20 Capi- Wo T. A. Joyce, editor da revista Man, que me permitiu usar aqui fotos anterior- mente publicadas naguele periédico. © Sr. Willian’ Swan Stallybrass, Diretor Gerente Senior, da editora Geo. Routledge & Sons, Ltd., ndo poupou esforgos no sentido de certfiear-se de que todas as minhas indicagSes referentes a detalhes cientificos fossem seguidas a Fisca na publicagdo deste liv. A cle, portanlu, desejo também manifestar meu sincero agradecimento, Nota fonética Os nomes ¢ vocdbulos nativos empregados neste texto seguem a regras sim- ples de promiincia, conforme recomendagéo da Sociedade Geogréfica Real ¢ do Instituto Antropolégico Real. As vogais devem ser pronunciadas como em italiano, as consoantes como em inglés. Esta grafia é bastante adequada para repro- duzir razoavelmente bem os sons das Iinguas da Nova Guiné. O apéstrofo colocado entre duas vogais indica que estas se devem pronunciar separademente, i, ¢., nao formam ditongo. Na maioria dos casos, acentua-se a peniiltima, raramente a antepeniltima silaba. Todas as sflabas devem ser anunciadas com clareza e precisa.

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