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LOGEION wee Filosofiada informagao DOT: https:/doi.org/10.21728/logeion.2024v10n2e-6850 Data de submissA0: 12/12/2023 Data de aprovagao: 22/03/2024 Data de publicaglo: 25/03/2024 UMA REFLEXAO FILOSOFICA-INTERDISCIPLINAR SOBRE ETICA DA INFORMAGAO Gabriel Fefin Machado! Universidade Estadual Paulista gabriel fefin@unesp.br Juliana Moroni? Universidade Estadual Paulista jmoroni@unesp.br Resumo © objetivo deste trabalho € investigar a natureza ontol6gica e epistemolégica do conceito de informacto, focalizando inicialmente a Filosofia ¢ Etica da Informagio (EI), propostas por Flori (1999: 2002; 2004; 2011 2016), cujo fundamento tebrico servird de suporte para reflexdes acerca da inteligéncia artificial generativa (IAGen), mais especificamente, o ChatGPT. O conceito de informagto seri abordado a partir de ts vertentes na perspectiva filos6fico-interdisciplinar: (1) realismo informacional, (2) ecologia informacional e (3) seméantica informacional, segundo Gonzalez, Nascimento c Hasclager (2004). A partir dessa abordagem, direcionamos ‘nosso estuido para propostas de Floridi (2004), indicando 03 seus possiveis problemas, Procuraremos entender a Filosofia da Informagao, a partir da perspectiva da Etica da tnfoimacdo (ED), analisando como a EI pode contribuir para reflexdes acerca do uso de IA generativa. Problematizamos a El a fim de consinuir uma ponte com a Etica Intercultural da Informagio (ED) proposta por Capurro (2010), Palavras-chave: informagao. filosofia da informacao; ética da informagao: [A Generativa; chatGPT. A PHILOSOPHICAL-INTERDISCIPLINARY REFLECTION ON ETHICS OF INFORMATION Abstract The objective of this work is to investigate the ontological and cpistemological nature of the concept of information in the context of Philosophy of Information (PD, focusing on the Philosophy of Information (PY) and Ethies of Information (ED. proposed by Floridi (1999; 2002; 2004; 2011; 2016), whose theoretical foundation will support reflections on generative artificial intelligence (Al), more specifically, ChatGPT. The concept of information will be approached from three strands of information studies in the philosophical-intcrdisciplinary perspective: (1) informational realism, (2) informational ecology and (3) informational semantics, according to Gonzalez, Nascimento & Faselager (2004), Based on this approach, we direct our study to Floridi's PI (2004), indicating its possible problems. We will try to understand the Philosophy of Information, from the perspective of Information Ethics (ED), analyzing how EI can contribute to reflections on the use of generative Al, represented, in this work, by ChatGPT. Keywords: information. philosophy of information. ethic of information. generative AL. chatGPT. * Graduando em Filosofia. Universidade Estadual Paulista “Silio de Mesquita Filho” - UNESP, Marilia, SP. Apoio: PIBIC — CNPq, 7 p6s-doutoranda em Filosofia. Universidade Estadual Paulista “Dilio de Mesquita Filho” - UNESP, Marilia, SP. Apoio: PROPe-UNESP, OVO) Bsa obra ests licenciada sob uma licenga PERSE Creative Commons Attribution 4.0 Intemational (CC BY-NC-SA 4.0), LOGEION: Filosofia da informagao, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan.{jun, 2024. LOGEION ARTICO sofia da Informacéo 1 INTRODUCAO A implementagio de uma nova era teenolégica, por meio do giro informacional e do advento das Teenologias Informacionais de Comunicagio (TIC), instiga uma relagao ambigua do ser humano com seu meio, Por um lado, oportunidades atraentes sfo eriadas, por outro, as TIC criam uma dinamiea que, por sua vez, gera consequéneias na e para a ago humana, através de ferramentas de vigildncia, controle ¢ manipulagio. Nesse contexto, 0 objetivo deste trabalho é investigar os seguintes problemas: 1. Qual é a natureza ontolégica e epistemoldgica da informagao no contexto da FI? 2. Quais sao os problemas para uma Filosofia da Informacdo, segundo Floridi (1999; 2002; 2004; 2011; 2016)? 3. Quais as contribuigdes da Etica da Informagao (EI) para os estudos sobre a TA. generativa, como o ChatGPT? A partir desse objetivo, trataremos dos seguintes tépicos no Desenvolvimento: 2.1: A Filosofia da Informagao no seu contexto geral, a partir de diversos filésofos, mateméticos, e de outras éreas interdisciplinares, com o enfoque em trés tendéncias nas abordagens ontolégicas © epistemolégicas da informagao: (1) realismo informacional, (2) ecologia informacional e (3) semantica informacional. 2.2: A Filosofia da Informagio na perspectiva de Luciano Floridi (2004), visando esbocar uma Etica da Informacio (EI), ressaltando os seus problemas. 2.3: Reflexdes sobre as contribuigdes da EI para os estudos sobre a IA generativa. No primeiro topico (2.1), analisaremos as abordagens ontologicas e epistemolégicas da Informacao, segundo Gonzalez er al. (2004), incluindo a abordagem Matematica por meio da Teoria Matemética da Comunicacdo (TMC), de Shanon & Weaver (1949). No segundo tépico (2.2), expomos as hiipoteses de Floridi (2004, 2013) para a constituigao de uma Etica da Informacao através de sua Filosofia da Informacao. Floridi nos auxilia a entender os diversos problemas da FI contidos nela mesma, sem se emaranhar nas dificuldades do cénone da histéria da filosofia, pois ele no se limita apenas atribuir problemas exteriores a FI, mas busca tomar o campo de pesquisa da FI autonomo, No terceiro topico (2.3), a El é utilizada para refletirmos sobre os impactos negativos e positivos da IA generativa, como 0 ChatGPT. Finalizamos este texto, questionando até que ponto estudos sobre Ftica Intercultural da Informagao (ETT) pode nos auxiliar no entendimento e controle dos impactos das TIC, como a TA Generativa, no ambiente informacional. LOGEION: Filosofia da informacao, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024, LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao 2 DESENVOLVIMENTO 2.1 0 QUE E A FILOSOFIA DA INFORMAGAO? A Filosofia da Informagio & uma area do conhecimento que aborda estudos ontologicos, epistemologicos, seménticos, pragmiticos e éticos acerea da informagio, no seu vies matemitico, semiotico, moral, cibernético, ecoldgico entre outros, No artigo intitulado Inyformacdo e Conhecimento: notas para uma tavonomia da informacao, de Gonzalez et al. (2004, p.1), ha o objetivo de elaborar um mapa conceitual das prineipais abordagens filoséfico-cientifieas do conceito de informagio, junto ao didlogo interdisciplinar. Para tragar o objetivo proposto, podemos comegar analisando 0 conceito de informago no viés da classiea Teoria Matematica da Comunicagio; logo depois, inserimos a informagao nas teorias de cunho ontoldgico e epistemologico. Na vertente matemética da informagao, segundo Gonzalez et al. (2004, p. 3): [..] so preponderantes os problemas formais ¢ téenicos da engenharia sobre a aplcago de ters no mbito tcnolgico envolvides ma transnssto erecepeto de ‘mensageas [..] giram em tomo da communicacao, da mensurabilidade e da quantidade de informagao gerads em uma fonte, da capacidade do canal que a transmite, bem como da sua confiabilidade e efetividade na tansmissio de dados [...] no controle eficiente da comunicagao entre fonte e receptor, independentemente do significado e dda natureza do contetido informacional transmitido (Gonzalez et al, 2004, p. 3). Segundo Gonzalez er al. (2004, p. 3), a Teoria Matematica da Comunicagao, proposta inicialmente por Hartley (1928) e Szilard (1929,1972); esses autores investigam a segunda lei da termodinimica, [e] sugerindo uma analogia entre informagdo, formas de organizagio e entropia, Nessa empreitada, a TMC focaliza essencialmente a medida da informagio, relacionada a nogdo de ordem e ao mimero de decisdes envolvidas no processo de redugio de incerteza na escollia de mensagens. Ao focar nos aspectos objetivos em relagdo a quantidade de informagao, a TMC acaba por nao engendrar aspectos de ordem semantica, A perspectiva ontolégica e epistemologica foi desenvolvida por Wiener (1968), entre outros, através da cibernética, euja proposta é desenvolver linguagens e técnicas para tratar do problema do controle e da comunicaclo, sugerindo analogias entre humanos e maquinas (Gonzalez ef ai., 2004, p. 4). Segundo Gonzalez et al., hi trés vertentes nas abordagens ontolégica e epistemolégica da informagio: (1) realismo informacional, (2) ecologia informacional e (3) semantica informacional. Na primeira (1) so utilizadas caraeteristicas da TMC, contudo, com uma diferenga importante no que coresponde 4 ordem e 4 organizago na constitui¢ao da informagio, Para LOGEION: Filosofia da informacao, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024, LOGEION ARTIGO Filosofia da Informagao 0s tedricos da TMC, quanto maior a quantidade de desordem de um sistema, maior ser’ a quantidade de informagio gerada. Em oposigdo, os realistas informacionais entendem a onganizagao e a ordem como matéria prima da informagao que se amplia pelo universo em crescente complexidade, Para os teéricos realistas, quanto maior a desordem, menor a quantidade de informagio, pois a informagao tem que estar em conformidade com um todo ordenado, Como um exemplo, se pensarmos em uma floresta que foi parcialmente destruida por um incéndio: o que teremos de informagao? Para os teéricos realistas, pouco se poderia ser entendido e extraido de uma floresta queimada, pois nada teria de ser organizado naquele lugar; no entanto, para os tedricos da TMC, essa cireunsténcia carregaria mais informagao do que se a floresta estivesse totalmente em ordem (ou nas suas condigdes normais), pois a desordem, segundo eles, gera uma quantidade de informagio maior para ser investigada do que seria gerada pelas condigdes normais de uma floresta. Gonzalez et al. (2004, p. 6) ressaltam que para alguns realistas informacionais, como Stonier (1990), a informagao faz parte do universo como um elemento per si no mundo, assim como matéria e energia, haveria particulas denominadas infons que constituiram informagio na realidade. Na vertente da ecologia informacional (2), a informagao é uma relacdo inerente do ser com o mundo, Segundo Gonzalez ef ai. (2004), para Gibson (1979) e Bateson (1999), a informagao esta intrinsecamente ligada 4 acao e 4 situac3o dos organismos no meio ambiente. Essa postura em relagio a informagio permite entender o padrao que liga, uma expressio de Bateson. Nessa perspectiva, “a informago guia o ser em sua existéncia no mundo, no sendo considerada como algo fisico, mas essencialmente relacional e significative” (Gonzalez et al., 2004, p. 7). O carter qualitativo da informagdo se da na interagdo entre agente e ambiente, essa relagilo 6 denominada por Gibson (1979) affordanees, derivado do termo em inglés to afford (fornecer, possibilitar). As affordances fornecem ao agente possibilidades de agao em determinado contexto. Um passaro tem affordances dinamicas e intrinsecas, diferentes do ser humano, por ser de uma espécie diferente e viver em um contexto diferente, mesmo os dois convivendo juntos em um ambiente parecido. Affordances so padrdes que podemos captar ao interagir no ambiente situado, guiando nossa agio em meios especificos constitutivos de nichos. Como o objetivo aqui é apresentar brevemente cada tendéneia da informagio, nao entraremos em detalhes acerea das concepgdes acima, seguiremos indicando o essencial para a presente proposta de problemas relacionado ética informacional. Assim, no tépico seguinte trataremos de questdes relacionadas a semantica informacional. LOGEION: Filoso! da informagto, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024. LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao Gonzalez et al. (2004) destacam, na abordagem da seméntica informacional, tentativas de explicar a ontologia da informacio e o seu significado, Na epistemologia e na semantica informacional, Dretske (1981) foi um dos pioneiros nessa empreitada, caracterizando, segundo Gonzalez er ai. (2004, p. 8) a informagio semintica no contexto das relagdes de significado do contetido carregado por um sinal numa dada linguagem. Eles ressaltam que, segundo Carnap, poderiamos entender, por meio de uma teoria pragmitica da informagio, que 4 mensagem expressa através de proposigdes nfo apenas teria um valor de verdade, como também, um significado que estaria atrelado 4 linguagem. Para entendermos melhor a seméntica informacional, Dretske (1981) nos mostra os problemas concementes a Teoria do Conhecimento, a partir de uma_perspectiva SA informagio que justificaria a crenga, por meio de um conhecimento empirico. Dretske se informacional. Ele caracteriza 0 conhecimento como “crenga fundada em informagdo inspira inicialmente na TMC, mas a remodela com aspectos semanticos, com a preocupagao de explicar © significado da informagio engendrado nas crengas, fundamentando 0 conhecimento no seu vinculo a percepgdo. Dretske argumenta que para corer o proceso de geraglo de informagio significativa, que dara origem ao conhecimento, ha a necessidade do agente possuir a capacidade de detectar a existéncia de erros. Em sua concepgio, a detecedo do erro seria essencial para caracterizar 0 comportamento inteligente, que envolve aprendizagem, em contraste com © comportamento meramente reflexo. Nesse sentido, Dretske ressalta a relevineia da postura intencional por parte do agente; nela o agente manipula a dimensio da informago que é carregada de significado. Baseado no que foi exposto podemos entender que [.] 0 cio € naturalmente possivel, © organismo possuidor de conhecimento teria que, além de aprender a eliminar as crengas que nio se fundam em informagio, dispor de critérios de relevancia que lhe auxiliem na selesao das crencas verdadeiras. relevantes (Gonzalez et ai., 2004, p. 12) Em suma, a Filosofia da Informagdo, foi aqui brevemente abordada, em suas vertentes realista, seméntica e ecolégica. Trés tendéncias foram expostas, tendo em comum 0 modo que a informagao se relaciona com a ordem/desordem, No realismo informacional hé uma relagio direta entre informacao e ordem; jd os te6ricos da semintica informacional adotam a capacidade de eliminar a desordem, 0 ruido e o erro como papel principal na caracterizagao da informagao, Além disso, na ecologia informacional, segundo Gonzalez er al. (2004, p. 10), a informagao é caracterizada em termos de ordemy/desordem, com énfase na dindmica relacional organismo-ambiente em sua construgio direta de informagio significativa LOGEION: Filoso! da informagto, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024. LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao No proximo tépico, resumimos a Filosofia da Informago proposta por Floridi (2004), expondo os seus principais problemas, bem como o seu conceito central, infosfera. Apresentamos os cinco termos-chave que direcionam os estudos da FT floridiana: Informagao; Semintica; Inteligéneia; Natureza e Valor. 2.2 FLORIDI E OS PROBLEMAS PARA UMA FILOSOFIA DA INFORMAGAO Floridi empreende a tarefa de dar dignidade filoséfica a informago ao elucidar os problemas da Filosofia “da” Informagao (FI), ¢ nao “sobre” a Filosofia da Informagao. Para dizer mais claramente, ele trataré os problemas da Fl, nela mesma, sem anexar problemas filos6ficos extemmos para examinar os intemnos da prépria informagao. Assim, Floridi toma a FI um campo de pesquisa autéuomo, dialogando e confrontando as principais ideias tanto do pensamento contemporaineo quanto das tradigdes filoséficas. Nessa empreitada, segundo Gonzalez de Gomez (2013, p. 4), Floridi evitaré “a mera translagdo a uma linguagem filoséfica de problemas que sejam de outra ordem”. 0 filésofo em questio, por ter um olhar formado na drea de ciéncias da computagao, faz uso da filosofia analitica; contudo nao incorpora premissas da l6gica positivista, pois seus trabalhos se relacionam com os problemas que caracterizam a teoria clissica da informagao seméntica, Por isso, ele acaba limitando seu olhar para a filosofia continental, e se distancia da filosofia académica ou sistemética (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 4). Além disso, o que podemos entender de Floridi na sua elaboragio de uma FI é que sen campo de pesquisa esté em construgao com uma expressio reflexiva do “giro informacional”” © “giro informacional”, no mundo contemporaneo, designa as transformagdes que acontecem com o desenvolvimento das cigncias ¢ tecnologias da computagio, da comunicagio e da informacao (Floridi, 2004, 2011). A FI é um campo concemente, segundo Floridi, com (a) a investigagio critica da natureza conceitual ¢ os principios da informacio, incluindo suas dindmicas, wilizaglo e cigncis, e (b) a elaboragio e eplicagio de metodologias teoréticas, informacionais e computacionais, a problemas filos6ficos (Ploridi, 2004, p. $55; 2011, p. 14). Na constituigio de uma FT, é importante salientar que Floridi nao pretende elaborar uma feoria unificada da informagio, pois oferece uma investigagio de principios da informagdo, (a), de varias dinamicas e utilizagdes distintas que podem ser incluidas em uma familia integrada de teorias. A aplicagdo de metodologias diferentes, (b), propde uma LOGEION: Filosofia da informacao, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024, LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao constituigio dos problemas filoséficos a partir de diversas metodologias em diferentes areas, integrando uma interdisciplinaridade. ‘A FI pode ser exposta em 5 termos-chave: Informagdo; Semantica; Inteligéneia; Natureza e Valor; alguns de cunho ontologico, outros epistemologicos e também éticos. Os cinco termos sdo expressos no texto Open Problems in the Philosophy of Information (2004), escrito por Floridi, mapeados por Maria Nélida Gonzalez de Gomez em seu texto Luciano ico (2013). Em uma exposigao breve de cada termo, a Jnformacéo, no problema que diz respeito Floridi e os problemas filosdficos da informagao: da representaciio & modeli ao que ¢ informagao (P1), pode ser vista de trés formas no cunho ontoligico: [..] como realidade (por exemplo, um padrio de sinais fisicos), denominando-se nesse caso informagao ambiental ou ecolégica; b)informagao sobre a realidad, tal como seria 0 caso da informacdo seméntica (que pode assim ser qualificada em. relagio verdade on falta de verdade);c) informacao para a realidade, a qual teria a forma de "instrugdes’ (c da qual a informagdo genética € um exemple) (Floridi, 2004, p. 11, tradugdo de Gonzalez de Gomez) a exposigio dessas trés visdes, ressaltamos que hé ainda a possibilidade das trés modalidades de informagio, pois sto formas pelas quais a informag3o é direcionada na realidade pelos meios tecnologicos e de comunicagao. Contudo, 0 que importa para Floridi sfo as duas primeiras (a,b), pois a tltima, com uma perspeetiva da informagao como instrugao (indicando uma auséncia de significagao), ndo se manteria firme em uma abordagem seméntica, na qual Floridi se debruga. A informagio é carregada de seméntiea e & necessirio seu cariter alérico (verdadeiro) para, posteriormente, ocorrer 0 conhecimento. segundo termo, Seménrica, mostra como o cardter de verdade de uma informagio se envolve na relagdo entre informagio, significado e verdade. Para se chegar na verdade € no conhecimento, ¢ necessirio, para Floridi, passar pelos niveis de abstragio. Os niveis de abstragao (level of abstraction, “LoA”) correspondem problematizagio de como um dado adquire significado, e sendo significativo, como adquire seu valor de verdade, correspondente ao problema de como os dados adquirem significado e como eles adquirem valor de verdade. (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 9). 0 LoA remete a relagio dos processos humanos de semantizacao com objetos informacionais, pois “os niveis de abstragio [Lo] sio interfaces mediadoras da relagdo epistémica entre o observado e 0 observador” (Floridi, 2011, p. 76). E 0 uso desse procedimento é necessirio para alcangar © carter alético (derivado do grego 3 Information as reality (e.g. as pattems of physical signals, which are neither tme nor false), also known as ccological information: information about reality (semantic information, alethically qualifiable); and information for reality (instruction, like genetic information). (Floridi, 2004, p. 11, tradugdo de Gonzalez de Gomez). LOGEION: Filoso! da informagto, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024. LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao “aletheia”, que significa verdade, desvelamento) da informagio. Floridi nio busea um pressuposto epistémico para indicar o caminho da verdade, e sim, utiliza 0 dado como fonte de conhecimento para o proprio conhecimento. Portanto, a informagao precede o conhecimento e no o contririo. Segundo Floridi (2004, p. $71), "o conhecimento encapsula a verdade porque encapsula informagao seméntica”. Para explicitar melhor a relagdo entre verdade, conhecimento, informagio e dados precisaremos tratar dos outros termos, mostrados a seguir. No terceizo termo, a Jnteligencia, os problemas e as perguntas seguirdo dois caminhos, segundo Gonzalez de Gomez (2013, p. 12) em relagao a Floridi: “a) relacionar a inteligéncia humana e 0 processamento computacional; b) elucidar as relagdes entre informagio, inteligéncia e conhecimento”. As perguntas sio segmentadas pelos seguintes problemas: (..] pode a inteligéncia natural ser satisfatoriamente analisada em termos de processamento da informagao? (P9); pode a inteligéncia natural ser satisfatoriamente e totalmente implementada de maneira nio-biologica? (P10); pode a abordagem informacional solucionar © problema da relagéo corpo-alma? (P11) (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 12) Na relagio entre Inteligéneia Artificial (IA) e a Inteligéncia Humana (IH) (ou Inteligéncia Natural), Floridi destaca que ha uma distingdo no processamento e identificagio: aA identifica e processa dados; ja a IH identifica e processa informagao.* Podemos entender que hd uma diferenca entre a informacao e o dado, que pode ser explicada na constituigao da relagao do ser com 0 ambiente. Os dados e a informagao esto presentes em toda a esfera informacional, Infosfera, que incorpora uma concepgao modal de espago agregando a “multiplicidade e a heterogeneidade das entidades informacionais” (Gonzalez de Gomez, 2020, p. 6). A Infosfera engloba nio s6 processos computacionais e teenologias de informagio, como também todas as coisas, tanto 0 atual quanto o virtual, digital e © analégico. Por sermos seres presentes e agentes nessa esfera informacional, temos uma maior facilidade de engendrar informagdo pela abstracZo, identificando e processando-a. Contudo, os dados, algo mais primordial que a informagdo, sio “brutos”, sem significado seméntico intrinseco. (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 9). Por isso, podemos dizer que as IAs conseguem identificar e “One of the major dissimilarities between current generation artificial intelligence systems (Als) and buman ‘natural intelligences (NIs) is that Als can identify and process only data (uninterpreted patterns of differences and invariances), whereas NIs can identify and process mainly information (in the weak sense of well-formed patterns of meaningful data). (Floridi, 2004, p.22). LOGEION: Filosofia da informacao, Rio de Taneiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, ¢-6659, jan./jun, 2024. LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao processar esses dados “brutos” de maneira mais eficiente do que a TH. A IA tem a capacidade de gerenciar dados sem diferencid-los ¢ de maneira sistematica, Entendemos que se uma IA tivesse a necessidade de lidar com o significado, ela tanto atrasaria 0 proceso de consolidagdo do dado, quanto abritia para variantes possiveis de significagio. Sendo assim, a informagao, que contém o significado engendrado, possibilita 0 ser humano, por meio do LoA, compreender e processar seu cariter informacional. © quarto termo, a Natureza, encaminha 0 foco novamente para un eunho ontolégico da informagao em relacdo aos segnintes problemas: a informagao pode ser natural?: a natureza pode ser informatizada?, Segundo Gonzalez de Gomez (2013, p.13) |, “Floridi sustenta que nao seria cabivel pressupor um mundo totalmente cadtico e imprevisivel: nele, nfo teria cabido a informagao”. E nesse contexto, Floridi, com seu conceito de Infosfera, se mantém coerente ao afirmar a impossibilidade da informagio em um mundo caético, pois a esfera informacional necesita de uma ordem para manter sua rede de conexdes, ¢ uma totalidade de desordem faria com que essa estrutura se desequilibrasse. Vale ressaltar a perspectiva abordada por Floridi da informagio como parte do mundo, uma informago ambiental. Essa perspectiva [..J no requer para ser aquilo que é, nem uma representacio cognitiva nem um processamento computacional [...] nto teria tampouco como condigado ter um suporte fisico, ja que ela ¢ ou esta inserida na propria estrururagao do mundo fisico ou exterior (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 14). Na compreensio da informag4o como ambiental, a relagao agente e ambiente ocorre dinamicamente na Infosfera, Além disso, é por essa informagao estar na propria estruturagio do mundo que ela se toma parte da organizagio da rede da Infosfera, e por sua vez, a sustentagio para relagdes entre agente e ambiente. Assim, impossibilitando, nessa perspectiva, uma totalidade cadtica do mundo. © quinto temo, 0 Valor, € pode ser entendido também em relagao aos problemas éticos que abarcam; “questdes normativas ¢ orientadas por valor (...] as quais [evidenciam] que as tecnologias de informagao ¢ comunicagao sao capazes de afetar os sistemas e as formas de vida” (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 15). As Tecnologias Informacionais de Comunicagio direcionam 0 novo tipo de organizagao da sociedade que advém do ja comentado giro informacional. Questdes éticas se voltam para os problemas surgidos a partir da constituigao do giro informacional como também das suas consequéncias atuais, ressaltando os pontos positivos @ negativos dos novos recursos informacionais. Para tratar de problemas éticos, Floridi argumenta que é importante olhar de um ponto de vista estratégico global, nio LOGEION: Filoso! da informagto, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024. LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao enfatizando anilises microéticas, as quais favorecem uma solugdo a curto prazo e parcial, que no levam em conta a totalidade do problema (Gonzalez de Gomez, 2013. p. 15). Os problemas contemporéneos da ética podem ser vistos por um agente moral do ponto de vista “micro” das seguintes formas: “(a) informagao (informagzio como recurso) para gerar alguma outra (b) informagao (informagao como produto) e, ao gerar [outra informagio], afetar seu (c) ambiente informacional (informagio como alvo)” (Floridi, 2013, p. 20, tradugdio nossa)’, Para tornar compreensivel as microéticas, o agente pode entender a informagio como recurso quando: (i) precisa escolher ¢ tomar alguma decisio ou aco; (ii) € considerado produtor, © qual se vé responsavel pela informagio gerada e seus efeitos, necessitando ou da confianga em alguma informagio ou sentindo as consequéncias do seu uso; (iii) pode ter “como alvo a informagio, como varidvel dependente, afetando o ambiente informacional” (Gonzalez de Gomez 2020, p.10). ‘As trés possibilidades indicadas acima so complexas e nfo podem ser entendidas de forma isolada; para Floridi, as microgticas nao sGo suficientes para tratar os problemas éticos, pois “focalizam em cada caso teenologias especificas a uma linha de ago, dissociando os complexos ciclos de vida da informagio e suas mediagdes tecnolégicas”. A informagio tomada pelo seu ciclo de vida que envolve geragdo, processamento, distribuigao, armazenamento, protecio, uso e destruigdo/preservagao, (Gonzalez de Gomez, 2020, p. 111) Com a inadequagao das microéticas, Floridi abarca as macrogticas como a alternativa vidvel para analisar questdes éticas. Segundo Floridi, do ponto de vista da meta-ética, EI [ética da informagio] & wma macro-éica “naturalista”e “tealista”: as carcteristicas ontoldgicas e o “bem-estar” da infosfera proveem bases “objetivas” (orientadas ao objeto) para o julgamento do correto e do exrado e geram razées “objetivas” para a ago [..] Floridi, 1999, p. 49, tradugio de Gonzalez de Gamez, 2020p. 10-11). ‘A macroética esti relacionada a ecologia da informagao, com o agente situado dinamicamente no ambiente. Para essa relagao nao ampliar a entropia, ela necesita de um aumento do “bem-estar” da Infosfera. Esse aumento de “bem-estar” restringe a entropia, caracterizada como lei da termodinamica que mede os graus de desordem de um sistema 5 a) information (information as a resource) to generate some other (b) information (information as a product), and in so doing affect her (c) informational environment (information as target)”. (Floridi, 2013, p. 20). © From a metacthical view, IE is a ‘naturalist’ and ‘realist’ macroethics: the ontological features and well-being of the infosphere provide an ‘objective’ (ie. object-oriented) basis for judgements of right and wrong and generate “objective” reasons for action [.-]. (Floridi, 1999, p. 49, traducdo de Gonzalez de Gomez, 2020, p. 10- 1), LOGEION: Filosofia da informacao, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024, LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao fisico, que na visto de Floridi, significa a destruigio, corrupgao ou poluisio de um objeto informacional. Para ter esse aumento, a Infosfera precisa de: [..J quawo “leis moras” que determinariam o que & eerte ¢ errado, do ponto de vista dda maximizagao e exceléncia da infosfera, evitando a entopia, ¢ promovendo 0 bbem-estarinformacional pelo aumento em extensto (quantidade de informagia), 0 aperfeicoamento (qualidade da informacio) e 0 enriquecimento (vatiedade da informacdo) da infosfera (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 18-19). © aumento significativo € constante de elementos que maximizam o bem-estar da Infosfera contribui para a ago do individuo, pois ele ter mais informagdes pelas quais se basear e agir de forma correta, conforme a moralidade vigente. Floridi caracteriza 0 valor intrinseco da informagao através de uma abordagem ontocéntrica, que carrega em si € nos individuos que interagem com ela sua significagao, Contudo, “as coisas, naturais ou artificiais, sfo nelas mesmas sem valor, assim como o homem por si mesmo nao € plausivel de valoragio, ¢ in-valudble - ja que ele é quem assume os julgamentos de valor” (Gonzalez de Gomez, 2013, p.19). Entendemos que o individuo gera, a partir de sua interagio com o ambiente, a faculdade de julgar o valor da informacao, processando o seu significado. Ele engendra em si mesmo 0 “olhar” moral para os objetos do mundo, eirculando a informagao com 0 ambiente, O individuo carrega consigo cada vez mais dados impressos na realidade como informagio, desenvolvendo uma maior estruturagao de pensamento compreensao para lidar com as questies étieas, Em sintese, até aqui ressaltamos a importancia da natureza da Etica da Informagio (ED: [..] ontologicamente ao invés de epistemologicamente modifica a interpretagao do alcance de uma EI. Nao s6 uma EI ecolégica pode obter uma visto global de todo 0 ciclo de vide da informacio, superando, assim, os limites de outras abordagens micro-éticas, mas também pode reivindicar um papel como macroética, isto é, como uma ética que diz respeito a toda a esfera da realidade (Floridi, 2013, p. 50, tradugao de Gonzalez de Gomez).” Ressaltamos também a importincia da andlise de problemas em uma perspectiva macro, nfo s6 da étiea, mas da Filosofia da Informagdo em geral que: [..] coloce o dado como condigto da informagto (er ante), ¢ @ informagio como condi¢ao constitutiva do conhecimento e de sua validade (ex post), de modo que as condigdes aléticas da informacao (que ela seja verdadeira) dependem numa primeira 7 Understanding the nature of IE ontologically, rather than epistemologically, modifies the interpretation of its scope and goals. Not only can an ecological IE gain a global view of the whole life-cycle of information, thus ‘overcoming the limits of other microethical approaches, but it can also claim a role as a macroethics, that is, as an ethics that concerns the whole realm of reality, at an informational level of abstraction. (Floridi, 2013, p. 0, tradugao de Gonzalez de Gome2). LOGEION: Filosofia da informacao, Rio de Taneiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, ¢-6659, jan./jun, 2024. LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao instincia da constituigao alética do dado, € nio de sua decodificagao e aferimento pelo conhecimento (GONZALEZ de Gomez, 2013, p. 19). Diante do exposto em 2.1 ¢ 2.2, salientamos que é importante entender as concepcdes de informagao nas perspectivas ontolégica, epistemolégica e semantica, na medida em que elas sio a base da Filosofia e Etica da Informagao. As vertentes ontolégicas ¢ semantica da informagao sustentam os fundamentos da FI, voltando-se para a compreensio da Infosfera. Os cinco termos-chave: Informagio, Semantica, Inteligéncia, Natureza e Valor sio relevantes para o entendimento da Etica da Informacio (EI) e da Filosofia da Informagio (ED. No que se segue, buscaremos entender a contribuigao da ética informacional floridiana nos estudos sobre IA Generativa 2.3 IA GENERATIVA: CHATGPT E AS IMPLICACOES DA ETICA NFORMACIONAL, ATA Generativa (IAGen) é caracterizada como um tipo de IA que é capaz de aprender padrdes sofisticados de comportamento, utilizando algoritmos, a partir de uma base com gigantesca variedade de dados. Baseada em redes neurais artificiais, utilizando métodos como os de aprendizagem de miquina (machine learning) e processamento de linguagem natural (PLN), a [AGen capta e aprende a informagao existente, indicativa de padrdes, reproduzindo informagao e padrdes, bem como gerando informagio e padrdes exclusives. Isso se deve a0 fato de que a IAGen é capaz de absorver e processar enorme quantidade de dados advindos de textos, videos e imagens, entre outros. Exemplos de IAGen sao 0 Bing Chat (Microsoft), Google Bard e 0 ChatGPT (OpenAl), os quais so treinados com tilhdes de palavras. (Lisboa, Ciriaco, 2023; Generative Al, S. D.). Nas palavras de Musiol (s.d.) IA Geuerativa (IAGeu) & um tipo de Iateligéncia Antficial que pode criar una ampla variedade de dados, tnis come imagens, videos, audios, textos ¢ modelos 3D. Ela faz isso aprendendo padrdes de dados existentes e, em seguida, usando esse conhecimento para gerar resultados novos e exclusives. lGen & capaz de produzit couteido altauteatesealista ¢ compleno que imita criatividade bunaua, toruando- se uma ferramenta valiosa para muitos setores, como jogos, enretenimento e design de produtos (Musiol, s.d., tradugao nossa © desenvolvimento de tecnologias como 0 ChatGPT e sua utilizagio levantam questionamentos éticos referentes 4 transparéneia, ao enviesamento na aprendizagem gerado § Generative Al (GeaAl) is a type of Artificial Intelligence that can create a wide variety of data, such as images. videos, audio, text, and 3D models. It does this by leaming pattems from existing data, then using this knowledge to generate new and unique outputs. GenAl is capable of producing highly realistic and complex content that mimics buman creativity, making it a valuable tool for many industries such as gaming. entertainment, and prochict design. (Musiol, 5.4). LOGEION: Filosofia da informacao, Rio de Taneiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, ¢-6659, jan./jun, 2024. LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao por diferentes tipos de preconceitos, os quais sio tansmitidos por dados gerados por humanos, 4 privacidade, confiabilidade, autonomia, 20 processo de desumanizagio da comunicagao, uso indevido da tecnologia, ocultamento de fontes de onde foram retiradas as informagdes, sem compromisso com a verdade ete, (Almenara, 2023; Higa, 2023). Segundo Higa (2023), no que se refere aos preconceitos, as respostas do ChatGPT podem ser parciais, expressando textos com contetide estereotipado e diseriminatério, contribuindo para causar violéncia verbal e fisica, bem como reforgando, naturalizando e perpetuando desigualdades em nossa sociedade, Em relagio a privacidade, apesar do ChatGPT nao armazenar, em principio. dados de interagées com os usudrios pode revelar dados pessoais. Ji o uso indevido do ChatGPT pode gerar informagio enganosa com 0 objetivo de conduzir a opinido piblica, causando danos aos sistemas democriticos, ptineipalmente em épocas de eleigdes. Além disso, © ChatGPT pode promover a desumanizagdo da comunicagio ao ser usado, por exemplo, como um sistema de recomendagao, cujos usuarios confiam de modo acritico na informagao gerada, sem esbocar julgamentos mais aprofundados No Ambito deste trabalho, seguindo a concepeo de Filosofia da Informagio e Etica Informacional proposta por Floridi (2004), questionamos, no que conceme 4 IAGen, especificamente a0 ChatGPT: 1 —A relacao entre informacao e conhecimento. 2—A diferenga entre inteligéneia humana e artificial 3~A necessidade de uma ética global alinhada as microéticas. Como indicamos em 2.2, Floridi (2004) sugere que o dado pode ser utilizado para obter conhecimento a partir do préprio dado. Nesse sentido, diferindo da relagao epistémica entre observador ¢ observado, na qual © conhecimento precede a informagio, no caso do ChatGPT, bem como de outras teenologias de informagdo ¢ comunicagao, a informagao precede 0 conhecimento, Um dos pontos importantes e problemiticos dessa precedéncia é que a informagao veiculada no ChatGPT nao tem necessariamente vinculo com a verdade. E isso pode causar danos individuais ¢ coletivos, a depender de que tipo de informagio, sem compromisso com a verdade, foi disseminada, sua abrangéncia e impactos na sociedade. Ainda, como ressaltamos em 2.2, Gonzalez de Gomez (2013) questiona se a inteligéncia natural e humana pode ser codificada e analisada por uma maquina; ela também indaga se a inteligéncia natural pode ser implementada em uma maquina. Segundo ela, Floridi distingue processamento ¢ identificagao: a IA identifica e processa dados; jé a inteligéncia humana identifica e processa informagio. No caso do ChatGPT, ele identifica e processa LOGEION: Filosofia da informacao, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024, LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao dados que sio disseminados para os usuitios, os quais processam a informagio, tornando-a significativa. Uma diferenga relevante entre o ChatGPT e o ser humano é que o primeiro nfo diferencia significativamente os dados que estio sendo processados; ja 0 ser humano diferencia, através de diversos planos de abstragio. Os planos de abstragio atuam como mediadores da relagao epistémica entre aquele que conhece ¢ o que pode ser conhecido. Nesse sentido, teenologias de informagio e comunicagio, como o ChatGPT, suscitam problemas éticos na medida em que tém grande impacto nas diferentes formas de vida que constituem a sociedade. Na concepgao floridiana ha a necessidade de desenvolver ‘uma ética global que nao se perea em anzdlises microéticas, as quais ndo levam em conta a totalidade do problema. (Gonzalez de Gomez, 2013). No caso do ChatGPT, como indicamos em 2.2, a mictoética abordaria casos especificos contendo informagao veiculada pelo Chat, sem vineulo com a verdade, contextualizando-a em situagdes e ciclos que estio fora de ciclos mais complexos da informagio. A ética global é mais abrangente, contribuindo para equilibrar e melhorar 0 bem-estar da Infosfera, da qual humanos e maquinas fazem parte. Um exemplo de abordagem da ética global, em relagio 4 informagao gerada pelo ChatGPT, pode ser pensado quando algoritmos enviesados (algorithm bias), os quais refletem valores humanos. aparecem nos textos gerados pelo ChatGPT. A ética global proposta por Floridi focaliza 0 problema dos algoritmos enviesados, de forma ampla, extrapolando os limites da ética, abrangendo a sua base, a Filosofia da Informagio. 3 CONCLUSAO Neste ensaio, apresentamos topicos da Filosofia da Informagdo e seus problemas na perspectiva de Floridi, Introduzimos brevemente a FI nas abordagens ontolégica ¢ epistemologica, segundo Gonzalez er al. (2004), para, consequentemente, adotar os cinco termos-chave (Informagio, Semintica, Inteligéncia, Natureza e Valor) como norteadores dos problemas para uma FI, segundo Floridi, Tustramos aplicagdes da FI e EI floridiana com a 1AGen, focalizando o ChatGPT. Ainda ha muito caminko pela frente para explicitar o que é a Filosofia da Informagio e em quais processos podemos adequé-la. O que foi exposto até aqui aborda, em certa medida, questées e problemas para uma Filosofia e Etica da Informagio. Podemos considerar os caminhos para uma Etica da Informagao nas relagdes informacionais que abarcam a pluralidade de acontecimentos possiveis, sendo a Infosfera a forma de ligagio entre os sujeitos informacionais ¢ sua relagZo com os seus nichos. Diante disso, podemos afirmar a LOGEION: Filosofia da informacao, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024, LOGEION ARTICO Filosofia da Informagao importincia da Etica Informacional para compreendermos a agio dos individuos nas suas relagdes dindmicas com as novas TIC. Salientamos que a Infosfera é um conceito que se restringe as agdes ¢ interagdes humanas, em contraste com a Ecologia Informacional que abrange a interagdo agente- ambiente, através de affordances, ndo se limitando apenas ao ambito das relagdes fumanas. Quando consideramos a esfera informacional, nfo & vidivel, se quisermos ampliar as possibilidades de acdo, reduzir as agGes éticas em uma perspectiva apenas humana, A humanidade ¢ o principal fator para gerar e extrair informacao? Se pensarmos a fundo no que ‘nossas relagdes proporcionam como informagao, a hmumanidade nao chega aos pés, nos dias atuais, do que pode ser gerado por outras formas de comunicagio e informagio, As proprias tecnologias geraram um ciclo de transigao informacional que se adequa a diversos ambientes para, justamente, gerar informagao diferente em cada interagio, ‘Uma instincia informacional nao se restringe 4 humanidade que a instancia, mas é devido, atualmente ¢ ndo necessariamente, as proprias TIC que se instanciam a si mesmas. Estamos perdendo como humanidade a capacidade, em graus, de gerar informagio propria, por interferéncia da tecnologia de comunicaglo e informagio. Através de agdes morais, que nao resultam necessariamente em mudangas drasticas no mundo, podemos tomar a informagao que geramos e transmitimos, na esfera informacional, influéneia para cada individuo, cabendo a cada um de nés termos a conscigneia para influenciarmos o bem-estar da Infosfera. As limitagdes da Infosfera suscitam altemativas 4 Etica Informacional floridiana. Entre estas altemativas, destacamos a Etica Intercultural da Informagio (EI), proposta por Rafael Capurro (2010, p. 12, tradugao nossa) que a caracteriza como “f...] a relagdo entre normas morais universalizaveis ou universalizadas e tradigdes morais locais”®. Nesse sentido, Capurro amplia a perspectiva da Etica da Informacao na medida em que engendra o universal @ 0 local na Infosfera, diferenciando e destacando particularidades culturais e aspectos universais, Por isso, a EIl se encarrega de tratar a totalidade e particularidade da esfera informacional da realidade como duas faces da mesma moeda, Por exemplo, de uma moral universalizada, podemos adotar a Declaragio Universal dos Direitos Humanos que foi constituida apés a Segunda Guerra Mundial, a qual tem raizes em eventos que expressam moralidades ¢ particularidades culturais locais, como a Declaragao dos Direitos do Homem e do Cidadiio, na Franga, em 1789; ou ainda, nas tutas de povos escravizados por liberdade e 9 [..] la relacion entre normas morales universalizables o universalizadas y tradiciones morales locales”. (Capurro, 2010, p. 12). LOGEION: Filoso! da informagto, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun. 2024. LOGEION ARTIGO Filosofia da Informagao direitos ao longo da historia. Capurro (2010, p. 13, tradugdo nossa) ressalta que “A EIT surge no momento em que o questionamento teérico da(s) moral(is) se toma cada vez mais urgente dado 0 profundo impacto pritico das TIC na sociedade””. Entre os impactos priticos da TIC, podemos citar os conflitos, antes em niveis locais, mas que se transformam em conflitos globais por meio das teenologias. Exemplo desses conflitos & a guerra entre Riissia e Ucrinia que envolve a disputa pelos meios de conmunicagdo, via intemet, através de gigantes corporatives como Meta, Google e Apple. Enquanto essas empresas tomaram posicdo politica no conflito, declarando-se anti-Risssia, 0 governo Russo bloqueou 0 Facebook ¢ Twitter. A disputa ainda envolve pedidos de lideres de setores de alta tecnologia para que a Riissia seja desligada da Internet Global. Tais pedidos foram negados pela ICANN (Corporagio da Internet para Atribuigdo de Nomes ¢ Numeros), organizagao que controla a internet no mundo. Essa disputa teenologica gera impactos nos setores que abrangem a economia, comunicacao, politica e a sociedade em geral. (Wakefield, 2022), No contexto do que propomos aqui, ha a fragmentagio da sociedade, influenciando a Infosfera de modo que agdes se tomem reagdes, no apenas locais, mas com abrangéneia global. Sendo assim, as TIC carregam duas possibilidades de Infosfera, uma que se relaciona com 0 universal por meio do particular, e a outra do particular por meio do universal, afetando-se mutuamente. Além do exemplo da guerra entre Ruissia ¢ Ucrania, indicando a fragmentagio de vinculos sociais, através da disseminagao em ampla eseala de informagao, a qual suscita a globalizacao de agdes e reagdes, citamos 0 nosso breve estudo tebrico de caso, no tépico 2.3, o ChatGPT. Como indicamos, o ChatGPT pode influenciar agdes no ambiente, gerando impacts negativos, por exemplo, aqueles veiculados aos algoritmos enviesados. Entendemos que 0 conceito de Infosfera no ambito da Etica da Informacao de Floridi, conjugada a Etica Intercultural da Informacao proposta por Capurro, permite construir uma ponte para novas perspectivas no entendimento de diversos problemas que as TIC estio trazendo para o mundo globalizado. 10 La EIL surge en el momento en que el cuestionamiento teérico de la(s) mora(es) se vuelve cada vez mais urgente dado el profundo impacto préctico de las TIC en la sociedad”. (Capurto, 2010, p. 13), LOGEION: Filosofia da informagao, Rio de Taneiro, v. 10, n. 2, p. 1-18, €-6659, jan./jun, 2024, LOGEION ARTIC Filosofia da Informagao REFERENCIAS ALMENARA, I. 5 motivos para nao usar 0 ChatGPT. Terra, 12 de agosto de 2023. Disponivel em: https://www terra.com.br/byte/5-motivos-para-nao-usar-0- chatgpt.db15054835af7 1 7a8e67609244167a3finucl ihgi.htm! 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