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7. FATO RELIGIOSO E RELIGIAO 7.1. Conceito de religito 7.2. Blementos de uma religiio 7.3. Criticas a0 fato religioso Estagios da evolucao religiosa 75. Reflexdes sobre atitudes religiosas 7. FATO RELIGIOSO E RELIGIAO O comportamento humano, inclufdo o religioso, é estudado pela Psicologia e Sociologia, pela Filosofia e Historia. Ao tentarmos estudar | © fato religioso, tomamos por base as informagGes dessas ciéncias. i Em todos os tempos, lugares € povos encontram-se manifestagdes religiosas em to grande diversidade de formas, que suscitam nos es- tudiosos do tema mais interrogacdes do que certezas. Mesmo nas so- ciedades pés-industriais, elas esto presentes com roupagem nova. Nao é de estranhar que nas varias épocas sempre tenha havido quem falasse desse fato. Nao bd povo tao primitivo, tdo barbaro, que ndo admita a féncia de deuses ou seres superiores, ainda que se engane so- bre sua natureza®. Ha uma lei essencial: todo o espirito finito cré em Deus ou em seu idolo. A descrenca em Deus, ou melhor, a alucinagao persistente, que leva a por um bem similar em lugar de Deus (como 0 Estado, a arte, a mulber, o dinheiro, a ciéncia etc.) ou tratd-lo como se fosse um Deus, tem sempre uma causa essencial na vida do homem. Se se descobre esta causa, despoja-se 0 bo- mem do véu, que oculta a alma a idéia de Deus. Se se destr6i 0 idolo que ele colocou entre Deus e ele, 0 ato religioso, que havia | sido desviado, volta por si, a seu objetivo adequado, formando- se a idéia de Deus*. 23, Cf. Cicero, De natura deorum, 1, 4 24, Max SCHELER — fildsofo contempoxineo, 83 Entre todos os meus pacientes de mais de trinta e cinco anos, ndo ha nenbum cujo problema ndo seja o da religacao re- ligiosa. A raiz da enfermidade de todos estd em terem perdido o que a religido deu aos seus crentes, em todos os tempos; ninguém esta realmente curado enquanto ndo tiver atingido, de novo, o seu enfoque religioso®. Quando tudo parecia anunciar os funerais de Deus eo fim da religido, o mundo foi invadido por uma infinidade de novos deuses e deménios, e um novo fervor religioso, que totalmente desconheciamos; tanto pela intensidade como pela variedade de suas formas, encheu os espagos profanos do mundo que se pro- clamava secularizado”. A variedade das formas religiosas, nas mais diferentes culturas, nos induz a crer que 0 fato religioso esta ligado ao ser homem, a sua natu- teza, 4 sua existéncia. Parece que na religiio o homem encontra senti- do para a sua vida, mesmo que nao consiga compreender a origem do fato religioso”’. O fato religioso tem origem no interior do homem, em dois dos impulsos do inconsciente: cogitacio do sentido da existéncia e autotranscendéncia”. O homem € ser religioso pela sua propria natureza: ou cré em Deus, ou arranja idolos nos quais colocar sua confianca e dar senti- do @ sua existéncia. O idolo pode ser algo material como dinheiro, conforto, fama, poder etc. Nao é fato simples de compreender. O es- tudo psicolégico do fato religioso revelou que ele aparece também telacionado com o individuo em si, com 0 grupo humano do qual 0 individuo participa, com a cultura e com 0 sistema sociopolitico vi- gente. 25, jung, discipulo de Freud, 26, Rubem ALVES. O enigma da religido. Petropolis, Vozes, 1975. p. 10. 27. Cf. Urbano ZILLES. Religido ¢ cristianismo. Porto Alegre, PUCRS, p. 14 28, Cf Jo20 MOHANA. Ajustamento conjugal. Os impulsos do inconsciente sto: autoconservacio, auto afirmacio sexual, sociabilidade, cogitacao do sentido da existéncia e autotranscendéncia 7.1. Conceito de religiaio E dificil dar definigao precisa de teligiao, porque jamais abrange- tia o sentido que as pessoas dao ao fato de Participar de uma religiio. De modo genérico pode-se dizer que religiao é 0 conjunto de crencas, de leis e ritos que visam a um ser superior, do qual o homem se julga dependente, com 0 qual pretende entrar em relagio pessoal e do qual espera obter favores. Essas crencas demonstram a atitude interior de re- conhecimento da dependéncia e a aceitagao das leis, dos mandamen- tos e ritos relativos a este ser superior. A palavra religido é de origem latina cujos significados etimo- logicos se completam entre si: a) Re-legere (reler): considerar atentamente o que pertence ao culto divino, ler de nOVO, reunir ou recolher; b) Re-ligare (religar): ligar de novo o homem a Deus. O homem vai a Deus e Deus vem ao homem; © Re-eligere (reeleger): tornar a escolher Deus, perdido pelo pe- cado, Keligioera comunidade de adeptos de determinada espiritualidade. Em grego, ekklesia significava convocacao, assembléia de pessoas, e no oriente designava o cla®, Para o povo simples, Igreja € quase sinénimo de Religiio, porém nio sio a mesma coisa. Para refletir e responder: 1. Que é religiao? 2, Qual a origem da palavra religido? 3. Onde se origina o fato religioso do homem? 7.2. Elementos de uma religiao Embora diferentes, as varias religiées tem alguns elementos em co- mum: doutrina, ritos, moral, seguidores ou adeptos e relacdo com o ser superior. 29, Cf. ZILLES, op. cit. p. 17-9, a) Doutrina ou dogma: é 0 conjunto das verdades sobre 0 mun- do, sobre o homem e Deus, sobre o sentido da vida, sobre a origem do homem e seu destino apds a morte, sobre a origem da matéria e seu destino. As religides primitivas buscam sua doutrina na tradicio dos an- tepassados. Nas religides sapienciais a fonte da verdade € 0 sabio ilu- minado que as fundou, ¢ as religides proféticas aceitam como verdade a palavra de Deus revelada pelos profetas. b) Ritos e cerimOnias: sao manifestagdes puiblicas, pessoais ou co- letivas, dos que tém a mesma crenga € se unem por meio de: nifestacdes. Os titos sao expressdo simbdlica da crenca. ©) Ftica ou moral: € constituida por comportamentos caracteris- licos, que decorrem do dogma ensinado pela religido. E expressa me- diante os mandamentos ou preceitos sobre os relacionamentos huma- nos, sobre as atitudes diante de Deus e sobre 0 modo de viver. d) Comunidade: quem esta convencido da veracidade de sua crenga sente-se atraido a partilhd-la com seus semelhantes e manifestar sua religiosidade junto com eles. Isto leva a formar comunidades de culto e de vida ©) Relac&o pessoal: todas as crencas estabelecem alguma forma de relacionamento da pessoa com Deus, que nés chamamos de oracao*, ma- 7.3. Criticas ao fato religioso Pensadores da era moderna, que por algum motivo professaram © ateismo, fizeram criticas contundentes ao fato religioso e a vivéncia teligiosa. Fis algumas delas: A religido é a superestrutura do poder econdmico. Existe o capital e este precisa defender-se. Para isto existe 0 exército, a policia, o Estado ... ea religido. Ela é contra o povo. A religido diz que é preciso obedecer ao patréto e ao Estado, mesmo que nos ex- lorem. E preciso obediéncia e paciéncia, depois, no céu, Deus vat recompensar. Por isso a religido € 0 6pio do povo. O progresso do socialismo acabara com a religiao* 30. CI. Irineu WILGES. Cultura religiosa. Petropolis, Vozes, p. 11-2. BIL Karl MARX. Idealizador do Comunisimo, no livro © capital. 86 O individuo tem uma profunda dependéncia em relagado 4 sociedade. Cénscio dessa dependéncia, o hon aderir @ sociedade fazendo deta uma divindade. Jeta para o além, numa divindade, 0 seu s déncia da sociedade®. mem comeca a O bomem pro- ‘entimento de depen- A religiao provém do medo, da ignoréincia ou também do entusiasmo pela natureza. Ha trés estagios na evolucao religiosa: W O mitico ou teolégico em que os homens procuram ex- blicar tudo com os deuses, também as leis da natureza. ) O filoséfico ou metafisico em que os. fendmenos sao ex- Dlicados por conceitos meta| ‘isicos, ©) Opositivo em que os ’ fendmenos sao estudados cientifica- mente e explicados por meios naturais. Assim, 0 primeiro esldgio da humanidade foi o religioso, 0 segundo o filos6fico eo terceiro é 0 da ciéncia positiva’, A religido provém da fantasia viva e irrefletida dos primi- tivos ou do apetite ilusério da | felicidade completa, ou da dema- siada tensdio de afetos, ou de uma ‘perturbagao nervosa, de um estado psicoldgico doentio da ‘psique humana*. A religiao provém de uma neurose uni Curando-se dessa neurose de culpa, da necessidade religiosa®. iversal de culpa. 0 bomen libertar-se-a O fato religioso, como todas esté isento de problemas ou desvios. verdade, sobretudo quando revel 0 fato religioso. O homem € um satide fisica, psiquica ou espiritu: todas as expressdes teligiosas si para o bem-estar da pessoa hu: S outras realidades humanas, nao » Nas criticas acima ha parcela de lam formas inadequadas de expressar todo, e pode estar com problemas de ‘al. Com isto queremos dizer que nem (0 sadias e que nem todas contribuem mana, como querem todas as religi 32, Durkhein, 33. Augusio COME, fil6sofo do século XIX, fundador do Positivismo 34. Janet LOMBROSO, 35. Sigmund Fi 'D, médico austriaco, fundador da Escola Psicanalitica Atendo-nos ao modo sadio de viver a teligiéo, podemos dizer, como resposta a essas criticas, que a teligiio mantém viva, no homem, a esperan¢a de vida melhor, no além. O marxismo nao da esperancas Para esta vida nem para a outra, pois 0 Paraiso que pretende construir aqui nunca se realiza. O que fez foi matar milhdes de pessoas para implantar-se como sistema de governo e criar grandes exércitos para garantir-se no poder. O desmoronar dos Tegimes comunistas do Leste Europeu é sinal evidente de seu fracasso. O homem é anterior a formagao de qualquer sociedade e ja pos- suia manifestaces religiosas. Se a teligido fosse contra a natureza so- cial do homem, ela nao poderia subsistir na sociedade. Nem pode a religiao ser fruto do medo, Pois Os animais também tém medo e nao tém impulso religioso. Muitos homens superaram todo © medo, mas 0 impulso religioso permaneceu. Pessoas que nao podem ser acusadas de ignorantes, como Albert Einstein, Werner Von Braum e muitos outros cientistas, acreditaram na existéncia de Deus. O fenémeno religioso € universal: manifestacdes deturpadas do fato religioso, com certeza, sao sinal de desequilibrio psicoldgico, mas nao podemos admitir que a fantasia Se€ja Sua causa, nem aceitar que, depois de tantos avancos técnicos, a humanidade viva a mesma ilusio de felicidade. Nem podemos aceitar que a humanidade inteira seja gran- de hospital de doentes Nervosos, como considerava Freud™. Ha ainda pessoas que nao tem de que sentir culpa, pois cresce- ram livres de todos os tabus sociais e, no-entanto, procuram algo para preencher 0 vazio interior e dar sentido 3 propria existéncia. O fato de haver formas desequilibradas de viver o fato religioso nao 0 invalida como fendmeno humano e nos estimula a estudéo para compreendé-lo melhor, Para refletir e responder: Quais os elementos de uma religiio? Quais as principais criticas as religioes? 6. Que se pode responder as criticas feitas pelos pensado- res dos séculos XIX e XX? 4. 5. Ges deturpadas do fato religioso, com certeza, sio sinais de desequilibrio psicolégico. 4. Estagios da evolucio religiosa Nas criticas ao fato religioso, a coloca¢ao feita por Augusto Comte tem validade enquanto se refere aos estigios; ele errou quando previu que 0 fato religioso nao teria mais lugar no mundo moderno. O que ocorre, na verdade, é que as manifestagdes religiosas € as proprias re- ligides dependem da mentalidade e da cultura das pessoas, Mudando a mentalidade, como mudou realmente na Idade Moderna, mudam tam- bém as formas de expressio. Perante tal situacao podemos perguntar-nos: Que tipo de religido o bomem moderno e pds-moderno vai adotar? ‘Tomando por base os estégios citados por Comte, tentamos colocar as caracteristicas correspondentes a alguns elementos: Elementos da vida | Caracteristicas em cada um dos estgios da evolucao humana religiosa ¢ das religides Estigio mitico Estigio metafisico | Estagio positivo Mentalidade Consciéncia ingénua, | Logica e critica Utilitarista migica ‘Tipo de conhecimento | Observacao Observagao racional | Observagzo racional ¢ simples com causas € efeitos | cientifica = tecnologia Conceito de Deus Varios deuses: um | Deus nico, espirito | Origem e destino do para cada atividade | perfeito, criador do | Universo evolutivo, bumana, Universo, Deus das coisas, Deus do povo. Deus pessoal. Adeptos (comunidade) | Grupo humano lade de cren- | Comunidade de vida, natural, tes, culo, fratemidade. | pantilha no grupo. Relagio com a Agradar as divindades | Obediéncia Relacao pessoal com| divindade ou manipuli-tas Lei de Moisés. Fazer a] Deus. vontade de Deus Experiéncia de Deus Moral Intuitiva Mandamentos (amor) | Respeito a vida Relago com a natureza| Dependéncia mina sufi | Tansformar com imegrac nee respelto Relacio com o poder | Unidade cultural da | Religiio da maioria | Liberdade religiosa ‘ribo (poder tinico) | Destinagio de poderes | Independéncia de Gogo do poder) poderes Pluralismo religioso Religides no mundo | idolos gregos e Judaismo, Budismo, | Novo Grstanismo @) romanos, culos Cristsnismo, alricanos, Hindufsmo, | Islamism Xiatoismo rr Para cada est4gio a humanidade criou religioes comespondentes. O Cristianismo nasceu, se implantou e desenvolveu no mundo da cul- tura greco-romana, porque respondeu 4 mentalidade légica dos gregos, base cultural do mundo ocidental. Mas em nosso tempo ha algo que devemos considerar: na socie- dade, apesar de todo 0 desenvolvimento alcancado, h4 pessoas com mentalidade mitica, hd outras no estdgio I6gico e outras que j4 vivem na idade pés-moderna. Encontramos pessoas com relativo grau de ins- trugdo; na dimensio religiosa, porém, apresentam mentalidade magica. Tem mentalidade magica ou mitica a pessoa que atribui poderes a objetos ou pessoas, que estes nao possuem, Nao raro do as suas cren- ¢as pretensa base cientifica. Basta lembrar a divulgacao do efeito das pi- ramides e da medicagio com plantas. E preciso salientar que nao ha es- tudo cientifico rigoroso a respeito, porém muitos aceitam sem questionar. Quem tem mentalidade légica busca a verdade por meio do estudo e do bom-senso. Tais pessoas nao precisam de fatos extraordinarios para crer, pois a luz da inteligéncia lhes é suficiente para delinear o caminho que cumpre seguir. No mundo pés-moderno ha mistura de mentalidade utilitarista, conseqiiéncia da tecnologia, e retorno a certo sentimentalismo, eviden- lado pela énfase dada aos psicologismos religiosos trazidos do Orien- te, Parece que a religiao vai assumir formas muito pessoais, enquanto responder as necessidades dos individuos. Nesse caso deveriamos pen- sar em sdlida instrucao e, a0 mesmo tempo, levar 4 experiéncia de Deus. TAI. ALE. O desenvolvimento religioso esta interligado com o desenvolyi- mento afetivo e cognitivo da pessoa; a iniciacio religiosa est4 intimamen- te ligada as experiéncias religiosas vividas na familia. A religiosidade é atividade em que a pessoa conhece, constroi € interpreta suas experiéncias com o transcendente, e vislumbra, por meio dela, o sentido da prépria existéncia. Como ninguém vive sem sentido, a fé esté sempre ligada 4 experiéncia humana de existir, A fé religiosa tem dimensao relacional: consigo mesma, com 0s ou- tros e com Deus. A relacao da pessoa com qualquer desses pdlos im- plica em relagao com os demais. Se ela nao se relaciona bem com um deles, tampouco se relacionaré bem com os outros. Qualquer cren¢a engloba conhecimento e afeto, isto €, atividade da raz4o e da emogio. Assim como a pessoa usa da raz4o para com- 90 preender as questdes fundamentais da fé religiosa, ela também manifesta amor, respeito € acmiragao pelo objeto dessa f6, aspectos mais voltados para a afetividade. Aatividade interpretativa e relacional é ajudada por outras capa- cidades do individuo: a légica do pensamento, a coeréncia das atitudes, 4 compreensao dos outros, a relago com a autoridade, a nogao dos limites nas relacdes com os Outros, a capacidade de julgamento valorativo e a expresso de realidades ausentes por meio de simbolos. Essas aptiddes crescem com o desenvolvimento da Pessoa e com as ex- significativas e dario formas diversas a fé em cada estagio do seu desenvolvimento, 7.4.2. Desenvolvimento da Pessoa € estagios da fé O desenvolvimento de cada Pessoa passa por estdgios que Piaget assim classificou: Desenvolvimento Sens6rio motor Fase de anomia FungGes simbélicas Imagem mental e simbolos Pré-operatério Usa 08 simbolos, mas nao generaliza; € capaz de praticar regras, mas sem compreender. Reversibilidade Capaz de compreender Tegras; semi-autonomia. Racional Capaz de ter logica, mas relacionada com 0 mundo conereto. Abstracao Capaz de raciocinio puramente intelectual. Fowler aplicou os conhecimentos de Piaget ao desenvolvimento religioso e identificou estigios de desenvolvimento da fé de acordo com a idade da pessoa. Nem todas as pessoas passam por todos os estagios. A maioria permanece no estdgio sintético-convencional. O desenvolvimento da fé depende do trabalho feito em cada fase do processo de amadurecimento, para que ela passe de um estagio para outro. Idade Tipo de fé Lactncia (0 a 2 anos) Fé indiferenciada Primeira infancia (2 a 6) Fé intuitivo-projetiva Infancia (7 a 12) Fé mitico-literal Adolescéncia (13 a 20) Fé sintético-convencional Inicio da idade adulta (21-30) | Fé individuativo-reflexiva Idade adulta (31 a 60) Fé conjuntiva Acima de 60 anos Fé universalizante primeira infancia a aquisic&ao do conhecimento se faz pela in- tuigdo; a fé comega a ser adquirida pela imitagao dos adultos. Para a crianca Deus é imagindrio e magico, com forma humana, projecao da imagem dos adultos mais significativos. Na infancia, com o advento da razao, a crianga testa as imagens da f€ trazidas do periodo anterior. Desenvolve o sentimento de pertenga aum grupo de fé, caso lhe seja proporcionada a ocasido. Os conceitos 40 assimilados literalmente, mas Deus continua a ser entendido de maneira antropomérfica. 92 W Na adolescéncia a aquisicao do raciocinio formal leva a buscar 0 significado real do que aprendeu anteriormente, mas a fé se estabele- ce mais pela convencao do grupo do que por decisio pessoal, pois ele tem necessidade de corresponder 4 expectativas dos outros. Os rela- Clonamentos com os varios segmentos sociais lhe permitem formas di- ferentes de encontrar sentido ¢ Ihe causam conflitos interiores. A fé do individuo, nesse estgio, coincide com a fé da maioria. No inicio da idade adulta, a sintese convencional anterior entra em colapso perante a incongruéncia e as expectativas pessoais e dos dife- rentes grupos. Ha necessidade de optar refletidamente por uma tendén- cia de fé e por uma comunidade de fé. Pela meia idade a pessoa incorpora os paradoxos das fases ante- tiores; a vida se torna disposigao em conviver com as ambigitidades e estar aberto para lidar com os opostos da vida de forma nao radical ou exchudente, coordenando as ambivaléncias em dinamismo dialético. Ha grande disposig&o para 0 didlogo com o outro ¢ para a busca de senti- do. A fé da infancia é retomada sem infantilizagdes. A pessoa € capaz de depender dos outros sem perder a propria indentidade e se sente cidada do mundo, capaz de ultrapassar as fronteiras culturais, étnicas e raciais. No ultimo estagio, atingido por poucas pessoas, a pessoa nao é mais 0 ponto central; coloca-se como a tiltima da sociedade e é capaz de deixar-se consumir para colaborar na transformacao da realidade pre- sente, tendo em vista a realidade nova no transcendente. Vive em co- munhao com 0 transcendente de forma que ‘0 Reino de Deus é reali- dade experimentada. Sua vida é testemunho de viver em justica e mi- sericérdia, ‘Vemos que a infancia é idade propicia para formacio da religio- sidade e que a adolescéncia é mais adequada para a educacio da fé em vista da autonomia religiosa’”. A educagio da religiosidade abre o ser humano para a transcendéncia e deve existir em todas as idades, enquanto a educacio da fé deve ser feita a partir da idade da razao. Fowler afirma que a maioria das pessoas estacionam na fase sin- tético-convencional, isto €, permanecem toda a vida com religiosidade propria da adolescéncia; poucas passam para as fases seguintes, 37. Gl. James W, FOWLER, Estigios da f. Sio Leopoldo, Sinodal, 1992. p. 96, 202, 238, Parece claro que, ao trabalharmos no desenvolvimento da reli- giosidade e na educagio da fé, precisamos respeitar o estagio em que a pessoa se encontra e a sua maturidade. —_—_———— Valores religiosos como sustento da cultura Olhando a histéria em sua globalidade, percebe-se fato curioso: as grandes culturas desenvolveram-se junto com sistema religioso sdlido. Outras culturas, cujos sistemas religiosos nao foram suficientemente abrangentes, morreram junto com a re- ligido que cultivavam. Para compreender isto é necessario dar alguns exemplos: @ Cultura indiana, sustentada pelo sistema de valores do Hinduismo, dura desde 1600 a.C; b) A cultura chinesa é sustentada pelo Budismo; c) Os povos arabes criaram uma cultura respeitavel, que est atravessando os séculos, porque amparada pelo sistema de valores do Islamismo; d) Os judeus ficaram sem patria durante dezenove séculos, mas nao perderam sua identidade de povo, por causa do culti- vo dos valores religiosos expressos na Lei de Moisés, que eles se- guem. A cultura européia formou-se a sombra do Cristianismo e foi sustentada pelos seus valores. © Cristianismo foi capaz de absorver os barbaros e parte de sua cultura, sem perder os valo- res originais da cultura greco-romana, que trazia consigo. A religido faz parte de qualquer cultura e the da solidez e sustento, como o ferro colocado dentro de uma viga de concre- to armado. Os valores propostos e cultivados pela religiao for- mam a estrutura de sustento daquela cultura. Com a indiferenca religiosa presente no Ocidente e com a propaganda contra os valores cristéos feita pelos meios de comu- nicacdo, a civilizacdo ocidental corre sérios riscos. Hd os que argumeniam que a civilizagao ocidental é técnica e que isto a sustentara no futuro. Vale lembrar que sdo poucos os homens que dominam a técnica avancada e, portanto, 6 apoio muito fragil. Além disso, a concorréncia dos grandes centros industriais do Oriente esta mostrando 4 fragilidade da civilizagdo técnica oci- dental. Para que a sociedade tenba estrutura sélida e Sobreviva ao longo dos séculos, deve cultivar valores religiosos que the déem a estrutura necessdria, A nosso ver, no Brasil, comete-se um erro ao colocar na Constituigdo o Ensino Religioso optativo Para os jovens nas es- colas piiblicas. Isto é equivalente a dizer que estaremos for- mando sociedade sem sistema de valores @, por isso, muito vulneravel, vendo? 9. Que relacao existe entre a religito e a cultura? 10. Que papel exerce a religiio dentro da cultura? 7.5. Reflexées sobre atitudes religiosas A opgio religiosa de qualquer pessoa se manifests que ela toma na vivéncia do dia-a-dia. Seu comportamento revela 0 sentido que da a existéncia humana ¢ 0 valor que atribui as coisas re- Quem s6 vive para 0 trabalho, para ganhar, para gastar e gozar, revela que nao cré na vida apds a morte, pois se comporta como se ela nao existisse. Quem nao duvida em lucrar com a miséria alheia mostra nao crer na existéncia de Deus, Porque, se cresse, saberia que a justi- ¢a de Deus nao deixaria este fato passar impune, Quem cré na existéncia de Deus, e na continuidade da vida apds a morte (eternidade), deve ter comportamento coerente, relativizando 0s bens deste mundo: 0 tempo, o dinheiro, a cultura e a ciéncia se tor- Jesus Cristo, sendo Deus e homem ao mesmo tempo, foi quem melhor compreendeu o préprio homem e encontrou para ele a posicao de equilibrio em suas relages com Deus, com os demais homens e com o mundo material. Basta ler os Evangelhos para perceber como é 0 homem, na visdo de Jesus: a) Um ser aberto ao absoluto, sedento de Deus, Ele buscou o en- contro com Deus em longos momentos de oracao, longe da multidao e do barulho, especialmente antes de tomar decisOes im- portantes (Le 4,1-2; Le 5,15-16; Le 6,12; Le 9,28- 31; Le 22,39-42), b) Criado por amor e para 0 amor, a melhor coisa que o homem pode fazer é acolher a seu respeito a vontade da pessoa ama- da, Deus. Jesus fez isto: O meu alimento é ‘fazer a vontade daquele que me enviou e consumar a sua obra (Jo 4,34). ©) Sao felizes nao os que vencem segundo as leis do mundo, mas 9s que fazem de si mesmos oferta a Deus, pois aquele que quiser salvar a sua vida vai perdé-la, mas o que perder a sua vida por causa de mim, esse a salvaré (Lc 9,24; Cf. Mt 5,1-12). Esta é a verdade religiosa anunciada por Jesus, pela vida e pelas palavras, mas que muitos homens de nosso tempo nao querem aceitar, porque a légica de Deus nao coincide com a légica comercial e consumista, Rico é quem tem muito dinheiro, instruido é quem sabe muitas coisas, mas sabio é quem pensa como Deus, quem age segun- do sua vontade e vive como Deus quer: esse recebera a vida eterna. De que valem o lucro, a fama, 0 poder e a instrugao, se nada disso o homem podera levar? Deus nao avalia o homem pela sua eficiéncia e poder, pela beleza ou comunicabilidade, mas pelo amor e aceitacio de sua vontade, pela coragem de morrer Para ressuscitar com ele. Nem sequer 0 julgara pelas belas oracdes ou pelos dons espirituais que tenha alcan- ¢ado. O Evangelho é muito claro quando nos diz: Nem todo aquele que diz Senbor, Senbor, entrard no Reino dos Céus, mas sim aquele que pratica a vontade de meu Pai que esta nos céus. Muitos me dirdo naquele dia: Senbor, Senbor, nao foi em teu nome: que profetizamos, em teu nome que expulsamos demOnios e em teu nome que fizemos muitos milagres? Eniéio eu thes direi: Nunca vos conheci. Apartai-vos de mim vos que praticais a inigitidade(Mt 7,21-23). Outra traducao: Apartai-vos de mim operarios maus, isto é, os que nao fazem a vontade do seu senhor. Fazer a vontade do Pai é andar pelo caminho estreito que conduz alvacao, Fazer a propria vontade é andar pelo caminho largo que leva 96 a perdicao (Cf. Mt 7,13-14). Conhecer e aceitar a vontade do Pai, eis a porta estreita, eis o caminho da vida. Isto pode parecer dificil, sobretudo se contarmos apenas com nossas proprias forgas. Ele mesmo nos mandou pedir aquilo de que ne- cessitamos, Se vds, que sois maus, sabeis dar coisas boas a vossos filbos, quanto mais 0 Pai do céu dara o Espirito Santo aos que 0 pedirem (Lc 11,13). Devemos pedir, em primeiro lugar, aquilo de que temos ne- cessidade para podermos viver bem, de acordo com aquilo que Jesus nos ensinou. Devemos pedir que venba ands o seu Reino, Para refletir e responder: 11. De que forma podemos conhecer a veracidade da opgao religiosa de uma pessoa? 12. Qual foi a atitude religiosa fundamental de Jesu 13. Que critério Deus usara para julgar os homens, segundo as palavras de Jesus? 14. Que significa a porta estreita de que fala o Evangelho? 15. Que mais nds devemos pedir ao Pai? —_—_— Concluséo Lateja no ser bumano, mesmo que ele negue, a dimensdo religiosa. Ela se manifesta pela sede de “algo mais profundo”, pélo desejo de romper os limites e as estreitezas. Ela estd ao lado da busca de algo que confira um sentido vélido para a vida em meio dos muitos absurdos que nos rodeiam. S6 a vivéncia da dimensdo religiosa pode saciar a sede de infinito que esté no coracdo de cada homem: A abertura para aquilo que transcende é 0 impulso natu- ral para o religioso que nos permite ir ao encontro de Deus. S6 ele basta, nos diz a doutrina mistica de Santa Tereza de Avila. As religiées sao formas desenvolvidas e institucionalizadas para ajudar os homens a se ‘ligarem” em Deus e a integrarem- se no mundo e na sociedade onde vivem. Atividade complementar: 1, Listar atitudes erradas que os homens de hoje tomam em rela- 40 a Deus, em relagao aos demais homens e em relagao a na- tureza. 2. Todo o homem tem ideal e luta para alcangé-lo. Qual deveria ser 0 ideal das pessoas que créem na existéncia de Deus? Temas para redagio: — Impulso religioso ¢ religiao. — O homem diante de Deus. — Ideologias e religiao. — Conseqiiéncias praticas da fé.

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