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C8 FO6SHSSHOHOHHHHHDGEEHHHHHGVHEHHOHAD CSP Retor Veeretior be — cn eee ComiadoEtorat Robewo Leal Loboe Sia ko uy Lowen 40> Hayden White METAHISTORIA A IMAGINACAO HISTORICA DO SECULO x1x bree . 7 cna “radu de JonéLawénio de Melo Indiagso de Anni Dims, Profesor de Dept de Leas isis Venus d USP. “Tilo do evga em nes: Methistory: The Hurial naginetion i Nineteenth Century Europe (© 1973 bythe Johns Hopkin Uivesty Press alae Casiopaom Piling heen ‘imonitor, Pt) Metin: bimini ins do Sc KY Mayen We aan ee Lan eel, Sh Pa: ata da Unrest de ‘So Pr, 1 (Coo Pv) Popa. (nos pcan: Bop: Hig 97.204 TEE PIRLIOTHCA CIN pp anes sp ~ Fito ds Universidade de So Palo ‘Aw Prof Leino Out, Travess 9° 374 andar - Eda Ang» Retorie~ Cade Universita (5808 = Sto Paulo = SP- Dra Fax: (011)211-088 Tel: (11) 15-8857613-322 263,268 eo UF NDC wow DES aL] Printed in Baal 1992 Sé6sepode estar aguilo com queprineiro se sono A Pica do Fe $O0GOHFOS OHH HHHHHHOHHHHHHEHHOH OHS SUMARIO Preficio cece Introdugéo: A Poética da Historia» Parte 1 ATRADICAO RECEBIDA: O ILUMINISMO EO PROBLEMA DA CONSCIENCIA HISTORICA, 1.A Imaginacao Historica entre a Metéfora e a Iroi 2. Hegel: A Poética da Histéria e o Caminho para além da Ironia Porte It QUATRO TIPOS DE “REALISMO” NA ESCRITA HISTORICA DO SECULO XIX, 1. Michelet: O Realismo Hist6rico como Est6ria Romanesca 2.Ranke: O Realismo Historico como Comédia . . . 3. Tocqueville: O Realismo Histérico como Tragédia 4. Burckhardt: O Realismo Hict6rieo como Sativa... a7 a5 2a Parte II © REPUDIO DO “REALISMO” NA FILOSOFIA DA HISTORIA DO FINAL DO SECULO XIX 1. A Consciéneia Historica ¢ 0 Renascimento da Filosofia da Historia 2. Marx: A Defesa FilosGfica da Histéria no Modo Metonimico 3, Nietzsche: A Defesa Postica da Historia no Modo Metaforico 4. Croce: A Defesa Filos6fica da Hist6ria no Modo Irdnico Conelusio. - - Bibliografia Indice Remissivo 2 201 339 383 433 403 449 PRERACIO Esta analise da estrutura profunda da imaginagao historica é precedida ‘por umaintroducao metodologica. Alitento expor,explicitamente de mancira Estematica, os principios interpretativosem que se bascia o trabalho. Enquanto Tiaos classicos do pensamento historico europeu do século XIX tormou-se para mim evidente que considerd-los como formas representativas da reflexio hist6- rica pressupunha uma teoria formal do trabalho histérico. Procurei apresentar tal teoria na introdugio. "Nessa teoria tratoo trabalho histrico como o que ele manifestamente é: uma estratura verbal na forma de um discurso narrativo em prosa. As hist6rias (€ filosofias da histéria também) combinam certa quantidade de “dados”, conceitos te6ricos para “explicar” esses dados e uma estrutura narrativa que 0 ‘presenta como um fcone de conjuntos de eventos presumivelmente ocorridos fem tempos passados. Além disso, digo eu, cles comportam um contetido estrutural profundo que é em geral postico e, especificamente, lingUistico em ‘sua natureza, ¢ que faz as vezes do paradigma pré-criticamente aceito daquilo {que deve ser uma explicaglo eminentemente “histrica”. Esse paradigma fun- ona como 6 elemento “meta-histrico” em todos 0s trabalhos histéricos que ‘so mais abrangentes em sua amplitude do que a monografia ou o informe de arquivo. “Aterminologia que empreguci para caracterizar os diversos nfveis em que se desdobra um relato historico e para construir uma tipologia de estilos historiogeaficos talvezse mostre desorientadora. Mas lente primeiro identificar as dimensbes manifestas ~ epistemolégicas, estéticas € morais ~ do trabalho histérico e s6 depois penctrar até onive! mais profundo em que essas operagies 860080 S OOOH HHS HHHBHHHHOHHOHHHHOD n ‘MeEN wore teéricas fundam suas sangSes pré-rticas implicitas. Ao contrério de outros analistas da escrtahistrica,ndo suponho que a subestrutura “meta-hist6rica”™ 4o trabalho histrico conssta nos conceitos te6ricas expictamente utilizados pelo historiador para dar a suas narativas 0 aspecto de uma “explicagio”. Acredito que taisconceitos compreendem o nivel manifesto do trabalho, visto {que aparecem na “superficie” do texto e podem comumente ser idenificados om relativa failidade. Distingo, porém, tts tipos de estratégias que podem ser usadas pelos historiadores para aleangar diferentes tipos de "impresso cexplicaiva”. Chamo, a esss estratésias, explicagio por argumentagio formal, ‘explicagio por elaboragio de enredo* ¢ explicagio For implicagdo ideolozica, Dentro de cada uma dessa diferentes estratégias identifico quateo possiveis ‘modos de articulagéo pelos quais pode o historador lcangar uma impressio explicatva de tipo especifico. Para os argumentoshé os modos do formismo, do organicismo, do mecanicismo e do contextualismo; para as claboragdes de enredo é os arquétipos da estériaromanesca"*, da comédia, da tragéala © da sitira;e para a implicagio ideol6qica ha as tticas do anarquismo, do conser- vantismo, do radiealsmo e do liberaismo. Uma eombinagéo espectica de modos constitui o que chamo de “estilo” historiogrfico de determinado historiador ow fildsofo da histria. Procurci expliar esse estilo em meus estudos sobre Michelet, Ranke, Tocqueville e Burckardt entre os historiado- res, ¢ sobre Hegel, Marx, Nietzsche © Croce entre os fildsofos da hist6r Europa do século XIX, ‘A fim de correlacionar esses diferentes estlos como elementos de uma Sinica tradigio do pensamentohist6rco, fui forgado apostular um nfvel profun- do de consciéneia no qual um pensador da histéria escolhe as esteatégias conceitusis com que irs explicar ou epresentar seus dads. Nesse nivel, aere~ dito, ohistoriador realiza um ato essencialmente pattico, em que prefigara 0 ‘campo hist6rico 0 eonsttui como um dominio no qual é possivelaplicar as teoras especificas que uilizaré para explicar “o que estava realmente aconte- ‘cendo” nel. Ess ato de prefguracéo pode, por sua vex, assumir certo nimera de formas cujos tipos slo caracteriziveis pelos modas lingisticas em que estio vazados. Sequindo uma tradigio de interpretagéo que remonta a Aristételes e que, ‘mais recentemente, foi desenvohido por Vieo, pelos ingistas modernos e pelos teéricos dalteratura, dou aessstipes de preiguragiosnomes dos quatro ropes da linguagem postica: metéfora, metonimia, sinédoque ¢ ironia. Como € bastante provével que essa terminologia seja estranha a muitos dos meus + Explor ois. nei au uae seme pr “caborgi de ened". Noes prs formar empl enplatedempcing—ezowse. como pana de puis epee “pr ‘eda empregats pelo pro Lut Cos Lins para cons So ena empl 40 ore eos {etiayden Wace iro Conrado napa eat, SsoPaca Bene 184, p10 ‘rela sepa Ride ane, Frese Une 1989p. 166) N. do) +» Romance ro sinl “Eas romans” io cis a ad op Piles Engi ds Sih Hamer dol de Noro Fine nat de hie (Sh Pala Cali IFT, mogul sor de resto eH aaron ponds Seed Wr ae MErA.msTORLA 2 ‘pico na introdugdo por que a empreguei eo que entendo por suas ‘Um dos meus intuitos fundamentais, além daquele de identificar ¢ interpretar as principais formas de consciéncia hist6rica na Europa oitocen- tista, € estabelecer os elementos inconfundivelmente poéticos presentes na historiografia e na filosofia da hist6ria em qualquer época que tenham sido postos em prética, Diz-se com frequéncia que a historia é uma mescla de Giéncia ¢ arte. Mas, conquanto recentes filésofos analiticos tenham conse- guido aclarar até que ponto € possivel considerar a histéria como uma modalidade de ciéncia, pouquissima atencio tem sido dada a seus compo- nentes artisticos. Através da exposigio do solo linglistico em que se consti tuiu uma determinada idéia da hist6ria tento estabelecer a natureza inelutavelmente poética do trabalho hist6rico e especificar o elemento pre figurativo num relato histérico por meio do qual seus conceitos teéricos foram tacitamente sancionados. ‘Assim, postulo quatro modos principais de consciéncia hist6rica em Gonseatacia da ealeiapreiguratv (ropoligis) que fforma cada wm deles: metafora, singdoque, metontmia e ironia. Cada um desses modos de ‘consciéncia proporciona a base para um protocolo lingistco preciso com que. prefigurar o campo historico e a partir do qual podem ser empregadas estraté- bias especificas de interpretacio hist6rica para “explicé-lo”. Afirmo que os rmestres reconhecidos do pensamento hist6rico do século XIX podem ser compreendidos, que suas elagdes miituas como participantes de uma tradigio ‘comium de investigacéo podem ser confirmadas, pela explicagio dos diferentes modos tropolégicos que Ihes inspira e informa 0 trabalho. Em suma, é minha opinido que © modo tropolégico dominante € seu concomitante protocolo lingistco compdem a base irredutivelmente “meta-histérica” de todo trabalho histérico. E sustento que esse elemento meta-historico nas obras dos historia dores magistrais do séeulo XIX constitui as “Filosofia da histria” que implici tamente mantém suas obras e sem as quais cles nao podcriam ter produzido os tipos de obras que produziram, Por fim, tento mostrar que as obras dos principaisfil6sofos da historia do século XIX (Hegel, Marx, Nietzsche e Croce) s6 diferem das dos seus homélo- _gosnoque as vezesse denomina “hist6ria propriamente dita” (Michelet, Ranke, ‘Tocqueville e Burckhardt) quanto a énfase, ndo quanto a0 contetido. O que permanece implicito nos historiadores é simplesmente levado & superficie © sistematicamente defendido nas obras dos grandes [ilésofos da historia. Nao acidente o fato de que os principais fildsofos da historia foram também (ou posteriormente se descobriu que foram) quintessencialmente filésofos da lin- ‘guagem. Por isso € que foram capazes de compreender, de modo mais ou menos Autoconsciente, 0s fundamentos poéticos, ou pelo menos lingiisticos, em tiveram suas origens as teorias supostamente “ciemtifieas” da historiografia do séeulo XIX. Naturalmente esses flésofos procuraram isentar-se das acusagiies ‘de determinismo lingistico com que atacavam seus adversérios. Mas €inegivel, ‘ameu ver, que todos eles entendiam a proposicao essencial que tento demons: 4 navoen wre trar: que, em qualquer campo de estudo ainda no reduvido (ou elevado) 20 estatuto de verdadeira cincia, 0 pensamento permanece cativo do modo Tingtistico no qual procura apreender 0 contorno dos objetos que povoam seu ‘campo de percepgio. ‘As conclusées gerais que extraio do meu estudo da consciéncia hist6rica oitocentista podem ser assim sumariadas: 1) no pode haver “hist ‘mente dita” que nao seja ao mesmo tempo “Filosofia da hist6r possiveis de historiografia so os mesmos que as modos possiveis de filosofia especulativa da histéria; 3) esses modos, por sua vez, sio na realidade formali- 2agoes de int jeas que analiticamente os precedem e que sancionam as teorias particulares usadas para dar aos relatos hist6ricos a aparéncia de uma “explicagao”; 4) ndo hé apodicticamente premissas te6ricas infaliveis em que se possa de forma legitima assentar uma justifcativa para dizer que um dos _modos é superior aos outros por ser mais “realist” S) em consequéncia disso, estamos irremediavelmente presos a uma escotha entre estratégias interpreta- tivas opostas em qualquer esforco de refletir sobre a historia em geral; 6) ‘como corolério disso, os melhores fundamentos para escolher uma perspec- tiva da hist6ria em lugar de outra sio em iitima andlise antes estéticos ou morais que epistemologicos; ¢, finalmente, 7) a exigéncia de cientificizagao da historia representa apenas a declaragio de uma preferéncia por uma modalidade especifica de coneeptualizagao histérica, cujas bases sd0 ou morais ou estéticas, mas cuja justificagio epistemolégica ainda esta por estabelecer. Ao apresentar minhas andlises das obras dos pensadores histéricas magistrais do séeulo XIX na ordem em que aparecem, procuro sugerir que 0 ppensamento deles representa a claboragio das possibilidades de prefiguragio {ropoldgica do campo hist6rico contidas na linguagem postica em geral. O aproveitamento real dessas possibiidades €, no meu modo de ver, 0 que ‘mergulhou o pensar hist6rico europeu na condicio irdnica do espirito que aprisionou no final do século XIX e que € as vezes chamada de “crise do historicismo”. A ironia, euja forma fenoménica era esta “crise”, continuow desde ento a lorescer como o modo dominante da historiografia profissional, tal como era cultivada nos meios académices. Isso, ercio cu, ¢ 0 que explica tanto 0 torpor tedrica dos melhores representantes da moderna historiografia académica quanto as numerasas rebelides contra a consciéncia historica em geral, que marcam a literatura, a ciéncia social ¢ a filosofia do século XX, Espera-se que o presente estudo elucide as razées desse torpor por um lado & das rebelides por outro. Talvez nio passe despercebido que este mesmo livro esté varado num ‘modo irénico. Mas a ironia que o informa & consciente € portanto representa ‘uma volta da conseiéncia irdnica contra a propria ironia, Se lograr estabelecer {que 0 ceticismo e o pessimismo de grande parte do pensar historico contempo- neo tém suas origens numa disposigdo de espirito ironica, que esta disposi Gio de espirito € por sua vez apenas uma dentre muitas posturas possiveis a adotar diante do registro histérico, teré proporcionado alguns dos motivos para Mera.tstOm 5 ‘uma rejcigao da prOpriaironia. E tera sido parcialmente desbravado 0 caminho para a reconstituigdo da hist6ria como forma de atividade intelectual que é 20 mesmo tempo postica, cientifcae filosbfica em suas preocupagbes ~ como foi durante a idade de ouro da historia no século XIX. INTRODUGAO APOETICA DA HISTORIA Este livro € uma histéria da consciéncia hist6rica na Europa do século ‘XIX, mas também pretende contribuir para a atual discussio do problema do conhecimento histérico. Como tal, representa nao s6 uma exposigao do desen- Volvimento do pensar hist6rico durante um periodo espectfico de sua evolugao yas também uma teoria geral da estrutura daquele modo de pensamento que 6 chamado de “historico". ‘Que significa pensar historicamente © quais sio as caracteristicas incon- Tundiveis de um método especifieamente histOrico de investigagao? Essas ques toes foram debatidas durante todo o século XIX por historiadores, filésofos © te6ricos sociais, mas habitualmente dentro do contexto da suposigio de que era possivelIhes dar respostas i "era considerada um modo tespecifico de existéncia, a “consciéncia histérica” um modo preciso de pensa- mento, ¢ 0 “conhecimento histérico” um dominio auténomo no espectro das. cigncias humanas ¢fisicas. 'No século XX, porém, as consideragies em torno dessas questdes se ‘rocessam numa atmosfera um pouco menos autoconfiante e em presenga de ‘um receio de que talvez nfo haja possibilidade de thes dar respostas defini Pensadores da Europa continental ~ de Valéry e Heidegger a Sartre, Lévi ‘Strauss ¢ Michel Foucault ~ ias dvidas sobre o valor de uma consciéneia especificamente “hist6rica”, sublinharam o caréter ficticio das reconstrugdes hist6ricas e contestaram as pretensdes da histéria a um lugar entre as céncias'. Ao mesmo tempo, fildsofos anglo-americanos produziram 1. Veromea The Bsken Hsin” ity on Ten 5,9°2(1965) 111 oem queseetudem tes Sommtaronmactaataca ht Gualos manifests maseceney ver Clade La Ss, ws ayen ws iografia que, tomada em conjunto,jusiica intensas

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