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TERCEIRA PARTE METODOLOGIA DAS TRES LEITURAS UMA PROPOSTA DE INTERPRETAGAO BIBLICA METODOLOGIA DAS TRES LEITURAS OS CINCO PILARES interpretagio biblica, extraindo de outras metodologias o que jera benéfico para mim, e a denominei Metodologia das trés lei- furas. Nas duas primeiras partes deste livro, apresentei os principios as ferramentas que utlizei para criar essa metodologia. Assim, 0 leitor poders té-la mao para seguir esse ou qualquer outro método de interpretacio biblica. A: LONGO DOS ANOS, CRIEI UMA METODOLOGIA PESSOAL DE Nesta parte final do livro, dedico-me a explicar como essa me- todologia pode ser usada na pratica. Tenho feito uso dela em todos ‘05 meus anos como professor de hermenéutica em semindrios e fa culdades, compartilhando-a com alunos que buscam um método objetivo de interpretar a Palavra de Deus. ‘A metodologia das trés leituras se baseia em cinco pilares, que explico a seguir. Nos capitulos posteriores, abordare o passo a passo para cada leitura. PRIMEIRO PILAR: LEITURA INDUTIVA Entre os diferentes métodos que existem para interpretar a Biblia, @ metodologia das trés leituras se apoia na leitura indutiva. No método indutivo, azemos perguntas a texto biblico e buscamos nele mesmo as respostas que nos conduzem a interpretagio, Ouvimos a voz do autor biblico,eisso nos induz interpretacio do que diz o texto. Para evitar possiveis erros de interpretacio, o método indutivo segue trés passos: observacio, interpretacio e aplicagio. ETODOLOGIA DAS TRES LEITURAS: OS CINGO PILARES | 176 PRIMEIRO PASSO: OBSERVAGAO Nesca etapa do processo, a preocupacio esté em descobrir que « texto informa, sem arriscar abordagens mais profundas, Nao se trata de interpretar o significado do texto, mas simplesmente de compreender o que ele diz. # hora de buscar no texto respostas as seguintes perguntas: + Quem? (Quem esta agindo ou falando aqui?) + O qué? (O que esti acontecendo? Sobre o que as personagens conversam?) « Quando? (Quando se passa essa histéria dentro do contexto do livzo? O texto & respeito de coisas que aconteceram, acon- tecem ou acontecerio?) « Onde? (Onde se passa essa cena, ou a que lugar se refere?) + Como? (Como ocorrem os fatos? O que veio primeiro e 0 que aconteceu depois?) « Por qué? (Por que esse evento acontece? Ele é resultado de ‘uma agio anterior, ou anuncia algo a seguir?) Nessa fase da leitura, atentamos para palavras ou expressGes re- ppetidas no texto, bem como para termos que sugerem mudancas, contrastes, causa e efeito, Nessa etapa, nao tentamos analisar 0 que essas descobertas significam; apenas registramos sua ocorréncia € entendemos acerca do que 60 texto. SEGUNDO PASSO: INTERPRETAGAO Nessa etapa, buscamos o sentido do texto, ampliando o olhar para ‘contexto e tomando por base os princ{pios biblicos gerais. As per- guntas a serem feitas nessa etapa sio: + Qual £0 contexto cultural dessa passagem? + Qual é 0 contexto histérico dessa passagem? «+ © que mais posso saber sobre olivro, o autor ¢ 0 contexto? oo _—"e. eee 176 | wosaico slaLico + Quais outras passagens das Escrituras me ajudario na tarefa de interpretar esse texto? TERCEIRO PASSO: APLICACAO A observasio e a interpretagao extraem da Palavra informacoes e constatagSes maravilhosas, mas seu propésito principal é transfor- ‘mar nosso aprendizado em prética para nossa vida. Nao examina- ‘mos as Escrituras para saber mais, mas para sermos transformados por meio de sua aplicac3o em nossa vida. Basicamente, a aplicagio responde is seguintes peryut + O que esse texto despertava em/requeria de seus primeiros ouvintes? + O que ele desperta em mim, ou requer de mim hoje? Nao podemosesquecer que o objetivo de estudurmos as Escritu- ras é crescermos no conhecimento de Cristo e sermos transforma- dos & imagem dele (cf. 2Corintios 3:18). ‘SEGUNDO PILAR: LEITURA EXAUSTIVA Alleitura exaustiva diz respeito a ler cada livro (¢, consequentemen- te, a Biblia toda, ao final) diversas vezes. O importante, principal- ‘mente para quem nao esté habituado a interpreta: as Escrituras, é Jer com uma frequéncia cada vez maior, ler por completo o texto aser estudado. O cetistio deve esforsar-se para ler a Biblia toda, pois é nela que encontramos as “palavras de vida eterna” (cf Joao 6.68). Portanto, é inadmissivel que alguém que se proponha interpretar as Escrituras nio tenha feito pelo menos uma leitura completa. A cestratégia que aconselho é priorizar um livro por vez e tentar leo todo antes de focar nas partes. Costumo dizer que & preferivel sentar-se e ler duas horas da Palavra uma vez por semana a ler vinte ‘minutos todos os dias. Uma leitura mais demorada o fard entender a LMETODOLOGIA DAS TRES LEITURAS: 0S CINCO PILARES | 17 ‘mensagem principal do livro com mais clareza do que ler fragmen- tos do texto para junté-los dias depois. TERCEIRO PILAR: COMPREENSAO DO ENREDO Quando recebemos um e-mail, nio tentamos deduzit 0 que 0 re- rmetente esta falando apenas pelas primeiras linhas. Lemos o texto por completo, até mesmo o assunto, a fir de entender 0 propésito do e-mail. Compreender 0 enredo é o exercicio mais importante em sua ta- refa de interpretasio. Se voct quiser estudar 0 Bvangelho de Marcos, por exemplo, leia-o por completo de uma vez sé, antes de interpretar aspartes dolivro. Isso se aplica todos oslivros da Biblia. Desse modo, vyocé entender melhor o enredo ea linha de pensamento do autor. Destaco aqui a facilidade em ouvir a Biblia narrada pelo celular ou pelo computador, em diversos aplicativos. Criar 0 habit de ou- ‘vir um livro todo de uma ver € voltar& origem, ou seja, 8 forma como «© primeiro piblico recebia a Palavra de Deus. Como boa parte da Palavra foi transmitida oralmente, ouvir a Biblia sem cortes resulta em entender cada vex mais 0 enredo geral revelado nas Escrituras. (QUARTO PILAR: EXPLICAGAO DE TERMOS E IDEIAS Esse pilar esti relacionado ao tépico dos hiperlinks, explicado em capitulos anteriores. £ por meio deles que entendemos expresses temas bfblicos, como, por exemplo, a expressio “égua viva’, que cstudamos no capitulo 17. Em minha metodologia, compreendo que, toda vez que deparamos com palavras ou expresses que no centendemos, devemos buscar o significado delas na propria Biblia. ‘QUINTO PILAR: COMPREENSAO DO TEXTO ‘NLUZ DO DRAMA GERAL DAS ESCRITURAS [Antes de aplicar a Biblia ao nosso contexto, temos de aplicar 0 texto no contexto geral do drama das Escrituras, conforme observado no capitulo 5. Para iso, fazemos perguntas como: 178 | wosaico sistico + O que o texto representa na linha do tempo entre Génesis ¢ Apocalipse? + Onde, no drama das Escrituras, devo encaizara revelaco que acabei de encontrar? O canon biblico é um todo coerente, formando um “teodrama’, Para compreender melhor o significado particular de cada episédio ou de cada livro, devemos entender bem o enredobiblico como um. todo AS TRES LEITURAS (Os principios mantidos nesses pilares se revelam na metodologia das trés leituras, sobre a qual nos deteremos até 0 fim deste livro. Cada leiturateré um foco diferente e abarcard determinada quanti- dade de texto. Buscamos, em primeiro lugar, obte: uma visio geral para depois nos aprofundarna interpretaclo, Para uma boa interpre~ tasio da Biblia, nfo basta fazer a pergunta certa. £ fandamental que 4 pergunta seja feita na ordem correta, Sio estas as trés leituras: + Primeira leitura: leitura do livro inteiro com foco nos assuntos. + Segunda leitura: leitura de um assunto com foco na estrutura, + Terceira leitura: eitura da pericope com foco 20s hiperlinks £ uma leitura de zoom-in, Do contexto maior do livro, vamos para uma porsio menor de texto, que € 0 assunto — ele pode cobrir ‘um capitulo ou mais, ou talvez parte de um capitulo, Do assunto, au- ‘mentamos o 200m para a pericope, que 6a menor unidade de texto com sentido completo, Pensando, por exemplo, em um estudo do Evangelho de Mat. “Andreas J-Késtenberger; Richard D. Patterson, Comite d interpretagao brblca: a rade hermentutica (Sto Paul: Vida Nove, 2018), p. 149. [METODOLOGIA DAS TRES LEITURAS: 0S CINCO PILARES | 179 + a primeira leitura contempla o livro todo, com foco nos as- suntos que compéem o enredo e na linha de pensamento do autor; «+ a segunda leitura se detém em um dos assuntos (por exemplo,a parte inicial da vida de Jesus), buscando-se a linha de pensa- ‘mento do autor sobre 0 assunto especifco, para uma melhor compreensio; « a terceiraleitura se concentra numa pericope (por exemplo, a visita dos magos), atentando para os hiperlinks entre o trecho focalizado e o restante do livro e das Escrituras, e finaliza 0 es- tudo com um zoom-out para entender a pericope a luz do livro todo. ‘A metodologia das trés leituras visa facilitar 0 processo de in- terpretagio biblica, uma vex.que cria um ciclo virtuoso. O fato de ler cada ver mais as Escrituras desenvolve em nés uma consciéncia ‘melhor sobre 0 enredo do teodrama. O sentido da revelacio mais ampla mostra o que o livro e a passagem que escolhemos estudar ;cam, Cada texto contribui para a montagem do mosaico, dan- do-lhe forma, e o mosaico contribui para a compreensio dos textos, para que tenham mais sentido. PRIMEIRA LEITURA 0 CONTEXTO HISTORICO JOMO AFIRMEI NO CAPITULO ANTERIOR, A PRIMEIRA LEITURA, a do livro inteiro, Minha recomendacao é que 0 leitor escotha hum texto para ler e meditar durante um bom periodo. Devemos fazer a primeira leitura tendo em mente perguntas que nos ajudem a compreender o contexto hist6rico do livro: + Quem é 0 autor do livro? «+ Em que circunstancias politicas, sociais eceligiosas vivia 0 au- tor? + O que o texto diz sobre o autor, sua personalidad e seus inte- + Para quem o autor estava escrevendo? + Como o documento foi recebido por seus destinatérios? + Quais mudangas o texto pretendia causar nos leitores? Nao se restrinja a essas perguntas. A curicsidade é um ponto fandamental nessa primeira leitura, Leia o texte questionando tudo fo que Ihe vier & mente: quem é 0 autor, quando o texto foi escrito, quem é 0 personagem, e assim por diante. Para responder a essas perguntas, vocé talvez tena de fazer uso de obras de referéncia, como comentarios, mannais e diciondrios bi- blicos. A maioria das Biblias atuais, especialmente as de estudo, traz, no inicio de cada livro, um resumo contendo algumas informagoes: autor, destinatérios, propésito, data e lugar de composigdo, carac- terfsticas especiais, estrutura e assim por diante, Esses resumos 530 Siteis para fornecer uma nogo do contexto. PRINEIRA LEITURA: O CONTEXTO MISTORICO | 181 ‘A primeira tarefa do intérprete biblico é entender 0 texto no con- texto em que foi escrito. Para isso, voct pode imaginar que o docu- ‘mento foi escrito diretamente para vocé, um integrante de Israel que saia do Egito e ovvia de Moisés a Lei de Deus, ou um cristio de uma igreja do primeiro século que recebia uma carta do apéstolo Paulo. Depois que entender o enredo, ficard mais evidente por que © autor é mais incisivo em alguns assuntos. Vocé comecari.a construir 6 perfil do auitor nao pela tradigio, mas a partir de informagdes ex- traldas do proprio texto. ‘Talvez-voce tenha de recorrer&lista de perguntas para se lembrar de fazé-las no momento da leitura. Com o tempo e a experiéncia adquirida, isso acontecerd de formal natural. Chamo isso de reflevo hermentutico. Voce jf deve ter ouvido algo acerca de meméria mus- cular. Os nervos se comunicam com os miisculos e, assim, permitem ue estes se movimentem na mesma sequéncia quando repetimos "um gesto. E como se a ordem em que os misculos foram ativados ficasse gravada. Por isso, quem se ausenta da academia por um bre- ‘ve periodo nio tem a mesma dificuldade de alguém que treina pela primeira vez. Acontece a mesma coisa com relagao & tarefa herme- néntica, Depois de aprendermos essas perguntas, 0 reflexo herme- néutico permitird que as fagamos na ordem correta sempre que nos propusermos a estudar um texto ‘Talver vocé, ao proceder & primeira leitura do texto, se sinta ten- ‘ado a fazer pausas para anotar suas observagdes. Recomendo que io faa isso. Continue lendo — ou ouvindo, caso tenha optado pela Biblia em Sudio — e atentando a mudanga de assuntos e de ar- ‘gumentagdes, mas nio interrompa a letura ou a audig4o. Em breve, chegaré o momento de registrar suas descobertas. O.CONTEXTO HISTORICO NA PRATICA ‘A seguir estio dois exemplos do tipo de descoberta possivel quando fazemos a primeira leitura tendo em mente as perguntas referentes ao contexto hist6rico. PRIMEIRA LEITURA: O CONTEXTO HISTORIGO | 183 2 | Mosaico BiBLico capital. Naum e Sofonias predisseram sua ruina (cf, Naum 3:7; Sofonias 2:13), enquanto Jesus a tomou como exemplo de conversio (Lucas 11:32). EXEMPLO 1: GALATAS Quando lemos Galatas, percebemos que um dos assuntos é a pole- ‘mica em torno da circuncisio e do cumprimento das ceriménias ju- daicas por parte de convertidos gentios. O texto érépido e urgente, nao havendo espago nem mesmo para uma introducio. Em Atos 15, lemos a respeito de um Concilio de Jerusalém do qual Paulo participa, e no qual foi tomada uma cecisio a respeito desse assunto. Como Paulo nio menciona 0 evento nesta carta, € como o apéstolo é incisivo sobre a questio de voltar& velha vida, & escravidao da lei, ele difcilmente teria deixado de citar 0 concfli. Assim, a hip6tese mais provavel ¢ que Paulo tenhaescrito a carta no final de sua primeira viagem missionéria, por volta do ano 49 d.C. Em relacio aos destinatirios, percebe-se em toda a carta uma forte indignacio com os falsos mestres que importunavam as igrejas a Galécia, pervertendo o evangelho. Esses falsos mestres eram ju- daizantes, ea agio deles determinou a urgéncia dacarta e 0 tom por vvezes agressivo que o apéstolo emprega. EXEMPLO 2: JONAS [A parte introdutéria do livro de Jonas diz. que o profeta é filho de Amitai, Quem é Amitai? Pesquisando na propria Biblia, descobri- ‘mos que tanto Jonas como 0 pai faziam parte de uma linhagem de profetas durante 0 reinado de Jerobodo Il (cf. 2Reis 14:25). Esse rei foi mau aos olhos do Senhor, e seu nacionalismo o levou a agit com extrema violéncia contra os povos vizinhos e contra os que di- vvergiam de suas ideias. Jonas provavelmente alimentava os mesmos sentimentos nacionalistas de Jerobodo Il, pois nao pareciafazer-Ihe nenhum tipo de oposicio. Mais tarde, esse rei aparece diretamen- te envolvido na destruigio de Ninive. Deus, ent3o, mostra a ironi apesar de no confrontar o rei que destruin aquela cidade, designa Jonas para pregar a ela. Em relagio a0 contexto histdrico, a pesquisa nos mostrard que Ninive era a principal cidade da Assiria e também sua tiltima PRIMEIRA LEITURA O CONTEXTO LITERARIO do enredo de um livro,¢ ele também faz. perte das indagagdes da primeira leitura. Nesta etapa do estudo, sua tarefa consiste basicamente em destacar os assuntos, que sio as partes que formam 6 livro. Isso significa descobrir 0 enredo construido pelo autor © 2 cordem em elenca os assuntos. Para ajudé-lo no processo, faca perguntas como: C:-= LITERARIO £ TUDO O QUE ENVOLVE A CONSTRUGAO. + Qual a légica do texto? De que o autor estéfalando? + Por que o autor diz isso aqui, e nfo em outro ponto? + Por que o autor colocou os assuntos nessa ordem? + Como 0 autor conclui cada assunto? Para qual assunto segue nna sequéncia? texto biblico & muito complexe, fruto de séculos de constru- ‘io. Tudo foi extremamente bem arquitetado, Nio existe palavra ou argumentagao aleatéria, Precisamos, entdo, entender qual & a mente do autor e o enredo que ele constréi para interpretar as pequenas partes. Quanto mais vezes lermos o livro por inteiro, mais facilmente pperceberemos os assuntos que compdem seu enredo, e o fio argu- ‘mentativo que o autor utiliza para uni-los. OCONTEXTO LITERARIO NA PRATICA Vejamos trés breves exemplos do que pode ser encontrado no livro em relacio contextoliterdro. PRIMEIRA LEITURA: O CONTEXTO LITERARIO | 185 EXEMPLO 1: GENESIS Quando lemos Génesis, percebemos algumas possiveis divisdes no enredo: + actiagio boa de Deus (Genesis 1:1—2:3); + a Queda do ser humano (Genesis 2:4—11:9); «+ ahistéria dos patriarcas (Genesis 11:10—36:43); + ahistéria de José (Genesis 37:1—S0:26). Poderiamos subdividir essa estrutura em pontos menores, € ‘mais adiante isso ser feito, Nessa primeira leitura, porém, basta re- conhecer os assuntos gerais que o autor aborda no livro. EXEMPLO 2: GALATAS ‘Ao ler Galatas, fica evidente que a carta nio tem uma introducao dentro do padrio que Paulo costumava seguir em todas as suas car- tas, Como percebemos com a leitura histdrica, isso talvez se deva & ‘urgéncia do assunto: por influéncia dos falsos mestres, os crentes da Galicia estavam “abandonando [...] aquele que os chamou pela ¢graga de Cristo, para seguirem outro evangelho" (1:7). Isso mostra 20 leitor 0 contexto no qual a carta foi escrita e como o contetido seré abordado. ‘Outro aspecto lterdrio digno de nota é que Paulo conta sua his- t6ria mais uma ver nessa carta, Podemos supor que os cristios gila- tas duvidavam de suas credenciais como apéstolo, pois ele diz: “que co evangelho por mim anunciado nao de origem humana. Nao 0 recebi de pessoa alguma nem me foi ele ensinado; ao contrério, eu © recebi de Jesus Cristo por revelagio" (1:11,12). B possivel que, {quanto mais Paulo se distanciava de Jerusalém, mais os judaizantes colocavam em xeque seu apostolado. Assim, Paulo também lembra gue ele mesmo fora aceito pelos apéstolos em Jerusalém (1:18,19), ce mostra que o evangelho que recebeu de Cristo esté acima dos in- fuentes da igreja em Jerusalém. 186 | wosaico BiBtico EXEMPLO 3: LUCAS: Nesse exemplo, quero mostrar outro aspecto do oltar sobre 0 todo para demonstrar que, se no prestarmos atencio 20 contexto lite- trio, no perceberemos como as historias estio interligadas umas as outras. No Evangelho de Lucas, ha um didlogo de Jesus com os discipulos acerca das riquezas. Fle tem inicio depois de um homem rico se retirar, entristecido, da presenca de Jesus, por nfo querer dar ‘que tinha aos pobres para seguir Jesus. O Senhor, entdo, exclamou: [Disse Jesus:] “Como € dificil aos ris entrar no Reino de Deus! De fato,é mais ficil passar um camelo pelo fundode uma agulha do que um rio entrar no Reino de Deus” (Os que ouviram iso perguntaram: “Entio, quen pode ser salvo?” Jesus responden: “O que é impossivel para as homens & pos- sivel para Deus (Lucas 18:24-27) Os discipulos nao entenderam a declaracio de Jesus. Segundo a cultura judaica, a riqueza era um sinal do favor de Deus, portanto eles ndo entendiam como um rico nao entraria no reino de Deus. A resposta de Jesus afirma que o impossivel para o homem é possivel para Deus. No capitulo seguinte, Lucas registra a histéria de um cobrador deimpostos chamado Zaqueu, ends vemos o impossivel acontecen- do na pritica: Zaqueu levantou-se e disse 20 Senhor: “Olha,Senhor! Estou dando a metade dos meus bens aos pobres; ese de algutm extorqui algu- ‘ma coisa, devolverei quatro vezes mais’ Jesus the disse: "Hoje houve salvacio nesta :asa! Porque este hhomem também é filho de Abraao” (Lucas 19:8,9). A leitura completa do Evangelho de Lucas nos faz perceber que a historia de Zaqueu € uma resposta clara 20 questionamento dos PRIMEIRA LEITURA: O CONTEXTO LITERARIO | 187 discfpulos, suscitado pelo comentirio de Jesus sobre os ricos. Um +homem de quem ninguém esperava nada — um ladrio, 0s olhos do povo —, a0 ouvir o evangelho, decide doar parte de sua riqueza aos pobres e indenizar quatro vezes qualquer um a quem tenha prejudi- ‘cado financeiramente. Jesus o considerou “filho de Abraio” SEGUNDA LEITURA A ESTRUTURA SEGUNDA LEITURA ADENTRA A ESTRUTURA DO TEXTO. AQUI, ‘vamos nos deter em um dos assuntos que compéem o livro € lobservar mais detidamente como o autor constr6i sua narrativa ‘ou argumentaglo, observando questdes como: + Qual. situagio em que o texto esté inserido? + Quais cenas compdem a histéria, ou que t6picos compoem a carta que vocé esta lendo? + Quais sio os confltos presentes no texto? + Em que lugar do texto encontramos o climax da narrativa ou da argumentacio? + Dequemaneira autor conduzo texto paraaresolusiodoconflito? + Qual €o desfecho dessa resolugio? A seguir, vamos analisar dois textos de naturezas diferentes: uma narrativa,ilustrada pela histéria de Gidedo, e uma argumentacio, exemplificada pela Segunda Carta de Paulo a Timoteo. EXEMPLO 1: GIDEAO Em Juizes 6—8, encontramos ahistoria de Gideto, Segundo os esté- .gios da estrutura narrativa, vistos no capitulo 11,podemos esbogara hist6ria de Gidedo da seguinte maneira: Situagao: Os israelitas, mais uma ver, fazem algo reprovavel para © Senhor, e sio dominados pelos midianitas. Deus escolhe Gideao para derrotar os inimigos (6:1-14).. SEGUNDA LEITURA: A ESTRUTURA | 189 Conflto: Gideo questiona 0 chamado do Senhor eIhe pede um sinal claro (6:15-24). Intensificagao do conflito: Gideio questiona o Senhor mais duas ‘vezes (otalizando trés), pedindo em cada ocasiéo uum sinal. ‘Deus atende ao pedido, mas testa Gidedo também trés vezes. Gidedo também atende ao Senhor (6:25—7:15).. (Climaz: Gideao etrezentos homens vio’ guerrasemnenhumarma- ‘mento. lesportamapenas trombetas jarrosetochas(7:16-21). Resolugdo do confito: © Senor faz.com que os homens do acam- ‘pamento inimigo se voltem uns contra 05 outros. Assim, os midianitas sio derrotados (7:22-25). Desfecho: A vit6ria sobre os midianitas € creditada a Deus, e Gi- deio é reconhecido como juiz (8:1-3). [A histéria de Gideio nos propde uma pergunta: é licito testar Deus, pedindo provas, em vez.de Ihe obedecer sem questionar? A Biblia deixa claro que nao podemos testar Deus: “Nao ponham & prova o SENHoR, 0 seu Deus” (Lucas 4:12; cf Deuterondmio 6:16). Mas por que, no caso do cético Gidedo, Deus Ihe dé ouvidos? E preciso examinar a estrutura narrativa para entender os trés pedidos de Gideao e notar que também Deus Ihe aplica trés testes. O autor espelha os trés pedidos com os trés testes da seguinte forma: BLA? Witeloestonao | 2Gdeéoquestiorao | SGiedoquestmo | Senhore pau sin | Sanarnovarente pede | Senhar pela tecera vez Deus tence com irl do | ais umsial. Deus tende | e ede cua sinal Dus foponoatar (62535). | comashalde & oats | sterde camo sl do cho eovahoam un chin | coberto de rao em seco (26-38), sola da seca (6:40. ‘Deus ordena que Giledo | 2Oeus orden que Cideao | Bes orena que Gio | tispnse os tomens que | dispense shomens qe | vaaoacarmpamento dos | fstio comets D0s32 _| se soehassem pare eber | midantas para oni que rials, sobam 1D il | aque Oos Ti sabram — | os nimigos dia (8-5) fac} peas 0075-8, 90 | Mosatco BiaLico ‘Muitos leem essa histéria maravilhosa, mas, por nio repararem em sua estrutura, nao percebem que o autor poe os pedidos de Gi- deio em paralelo com os testes aplicados por Deus. Quando pres- tamos atengio A estrutura do texto, percebemos 0 tom irdnico do autor, Ele mostra como seria terrivel para nés se Deus pudesse ser ‘colocado & prova por todo aquele que duvidasse dele. Ou seja, 0 au- tor estd nos ensinando 0 que nao devemos fazer: praticar esse jogo perigoso de pedir provas para Deus quando jé se ouviu a vor dele. Assim, antes de colocarmos Deus a prova, devemos volar & histéria ce perceber que o Senhor vai até o limite com Gidedo para Ihe mos- trar quem estava vencendo a guerra. A fim de Ihe mostrar isso, Deus desarma o exército de Israel e ainda o reduz a trezen:os homens —e estes vencem! Esta é a licio que devemos aprender: nto devemos por Deus & prova, porque ele é vitorioso em qualquer situacao. EXEMPLO 2: PAULO E TIMOTEO um pouco mais dificil estruturar textos argumencativos, como as cartas do Novo Testamento, mas nao ¢ algo impossivel. Tendo em mente a estruturagio do texto, ficard mais ficil entender o pensa- mento do autor. Vejamos o exemplo de 2Timéteo 1:3-12: ‘Dou gragas a Deus, a quem sirvo coma consciéncia limpa, como serviram os meus antepassados, a lembrar-me constantemente de ‘voce, noite e dia, em minhas oragées. Lembro-me das suas ligrimas desejo muito vé-lo, para que a minha alegria ja completa. Re cordo-me da sua fé ndo fingida, que primeiro habitou em sua av6 LLoide ¢ em sua mle, Bunice, estou convencido de que também habita em voce. Por essa razdo, torno a lembré-lode que mantenha viva a chama do dom de Deus que est em vocé mediante a impo- sigdo das minhas mos. Pols Deus nao nos deu esptito de covardia, ‘mas de poder, de amore de equilibrio. Portanto, nao se envergonhe de testemunhar do Senhor, nem de mim, que sou prisioneiro dele, mas suporte comigo os meus SEGUNDA LEITURA: A ESTRUTURA | 181 sofrimentos pelo evangelho, segundo o poder de Deus, que nos salvou e nos chamou com uma santa vocagio, nfo em virtude das nossas obras, mas por causa da sua propria determinagdo © grasa, Essa graga nos foi dada em Cristo Jesus desde os tempos eternos, sendo agora revelada pela manifestagdo de nosso Salvador, Cristo Jesus. Hl tomoa inoperante a morte e trouxe luz a ida e a imor- talidade por meio do evangelho. Desse evangelho fui constituido pregador, apéstolo e mestre. Por essa causa também sofro, mas n30 me envergonho, porque seiem quem tenho crido.eestoubem certo de que ele é poderoso para guardar o que The confi até aquele dia. ‘Vamos identificar os elementos da narrativa: Situagdo: Timéteo enfrentava problemas na igreja e na lideranga. Conflito: O medo e a covardia atrapalhavam a chama do dom do Espirito (1:6,7). Intensifcagao do conflito: Paulo convida Timéteo a suportar 0 sofrimento do evangelho com poder, amor e equilfbrio do Espirito (1:7,8). Climax: A santa vocacio de Timéteo no foi resultado de suas ‘obras, mas da vontade de Deus e da graga em Cristo Jesus desde os tempos eternos (1:9). Resolucao do conflto: Jesus derrotou a morte e trouxe & luz a vida por meio do evangelho. H nessa realidade que ocorre o cha- mado de Timoteo (1:10,11). _Desfecho: Paulo sofre por causa do evangelho, mas nao sente ver- ‘gonha, porque sabe em que tem crido (1:12). Essa 6 a tltima carta que temos de Paulo, Quando a lemos por inteiro, percebemos que seu principal propésito ¢ pedir ao jovem ‘Timéteo que se una logo a Paulo, em Roma (4:9,21), levando al- guns itens pessoais e pedindo que o evangelista Marcos va junto com ele (4:11,13). Quem esté levando a carta é Tiquico (4:12), que ees 2 | MOSAICO BiBLICO provavelmente vai ficar pastoreando na auséncia de Timéteo. O fato de o inverno ji estar se aproximando (4:21) e de es audiéncias pre- liminares de seu julgamento ja terem acontecido (4:16) confere um ar de urgéncia e tensio em toda a carta. Entendendo que estava no fim da vida, Paulo escreve aseujovem € promissor discipulo sobre o privilégio que eles tém de receber a santa vocagio de Deus para pastorear a igreja. Ferceba que vocé pode facilmente se perder nesse trecho da carta, uma vez que ela contém diversas frases fortes, e cada uma delas permite extrairligbes poderosas. Mas, quando vecé estrutura a pericope toda, fica muito mais clara a linha de pensamento do apSstolo e a ligéo principal. Como vou destacar mais & frente, 0 climax é aporta de entrada na interpretagao do texto, e é nessa parte que Paulo fila da santa vo- cago que vem da vontade de Deus por meio da graga de Jesus. O apéstolo destaca isso sabendo que, por estar preso, muitos j4 0 ha- vviam abandonado por nao desejarem associar-se a um condenado. E talvez o proprio Timéteo pudesse ficar com medo de ir visi fo \Nao € & toa que, no conflito inicial, aparecem as palavras “medo” € “covardia’, ¢ Paulo diz. que isso tudo atrapalha no chamado do dom do Espirito. Como Paulo faz. em suas outras cartas, aqui ele & cris- tocéntrico, resolvendo essa questio do medo e da covardia com a morte € a ressurreicio de Cristo, e mostrando que nele podemos seguir nossa santa vocagio com coragem. Podemos entender melhor aestrutura¢io de textos argumentati- vos analisando o climax, 0 ponto central do livr. SEGUNDA LEITURA 0 CLIMAX CLIMAX E © PONTO ALTO DA HISTORIA, O LUGAR PARA O QUAL Jo conflito se encaminha. Em uma narrativa, é 0 momento de prender a respiragia, a0 nas perguntarmas: “O que vai aconte- cer agora?” Em um texto argumentativo, é 0 ponto no qual o autor apresenta sua ideia central, e vocé tem de concordar com ele ou dis- cordar dele. Por isso, é preciso identificar 0 climax da histéria ou da argumenta¢io para interpretar o que diz.o texto em sua totalidade. ‘Como encontrar 0 climax de um texto? Devemos procurar pelo seu coragao, ou seja,aparte principal. Se o texto que estamos endo for ‘uma narrativa, devemos buscar aquela parte da histéria que nos tira 0 folego, cujo desdobramento seré decisivo para 0 contflito. Caso seja uum texto dissertativo, devemos reparar na argumentagio mais forte do autor, aquela que coloca Deus como protagonista da solugio. Todos os assuntos nos quais o livro se divide tém seu climax, e cabe a voct descobrir onde ele se encontra no trecho em estudo. E «partir do climax do assunto que fazemos a interpretagio de todo o trecho, pois o que vem antes culmina no climax, e 0 que vem depois decorre dele. Algumas perguntas que o ajudario a fazer isso: + Qual éa questéo envolvida no climax? + Qual é crise relacionada com o climax? + Quais valores o climax requer que sejam mudados? Para praticar 0 foco no climax, vamos aumentar 0 zoom nos exemplos apresentados anteriormente. 194 | wosaico Bl EXEMPLO 1: GIDEAO Em Juizes 7:16-21, lemos o climax da ist6ria de Gideio: o momento no qual elee trezentos soldados enfrentam sem armas o exército mi- Dividiu os trezentos homens em tts companhise pbs nas mios de todos cles trombetasejaros vatios, com tochas dentro. Ele hes disse: “Observem-me. Faram o que eu fizer. Quando eu chegar dex. tremidade do acampamento fagam o que eu ize Quando eu etodos 0s que estiveem comigotocarmos as nossastrombeta a redor do acampamento,toquem assuas,egrtem: Pelo Sesnone por Gidedo!” Gideio os cem homens que o acompanhavam chegaram aos postos avancados do acampamento pou:o depois da meia- -noite, assim que foram trocaas as sentinels. Ent tocaram as suas trombetas ¢ quebraram 0s jarros que tisham nas mios; as {rds companhias tocaram as trombetas e despedacaram os jarros. Empunhando as tochas com a mio esquerda es tombetas coma dlireita,gritaram: “A espada, pelo Sexton epor Gidedo!” Cada ho- ‘mem mantinha a sua posiio em tom do acampamento,¢ todos os midianita fugiam correndo e gritando. Podemos destacar os seguintes pontos dessa passagem: + €impossivel, com apenas trezentos homens, derrotar um exér- cito “numeroso como nuvens de gafanhotos’ (v. 12); + Gimpossivel derrotarum exrcito inteiro sem fazer uso de armas; + 05 trezentos homens confiaram a vida a Deus e Gideao; + Deus deu vitéria aos seus, confundindo o exército inimigo e levando-o a se autodestruir. Depois de identificar o climax, nio devemos achar que jd en- tendemos tudo. Nao tenha pressa. £ preciso levantar os pontos que chamam a atengio e destacar os que sio mais importantes para 0 SEGUNDA LEITURA: 0 CLIMAX | 195 texto. Ao destrinchar esses pontos, mergulhamos no texto, a fim de ‘que a sabedoria de Deus seja aplicada a nossa vida. EXEMPLO 2: PAULO E TIMOTEO Em 2Timéteo 1:8-10, lemos: [Nido se envergonhe de testemunhar do Senor, nem de mim, que 01 prisioneiro dele, mas suporte comigo os meus sofrimentos pelo ‘evangelho, segundo o poder de Deus, que nos slvou e nos chamou com uma santa voca¢lo, nfo em virtude das nossas obras, mas por causa da sua prépria determina¢do e graca. Essa graga nos foi dada ‘em Cristo Jesus desde os tempos eternos, sendo agora revelada pela ‘manifestagio de nosso Salvador, Cristo Jesus. Ele tornou inoperante ‘amorte etrouxe iluza vida ea imortalidade por meio do evangelho. climax da argumentagao de Paulo pode ser dividido nos se- guintes pontos: + opoder de Deus faz Paulo suportar qualquer sofrimento; + Deus salvou e chamou os seus para a santa vocagio} + as pessoas nio sio salvas e chamadas por causa de suas obras, mas pela determinagio e graca de Deus + a graca de Deus foi dada em Cristo Jesus desde os tempos eter- nos, endo revelada pela manifestagao do Salvador, Cristo Jesus. Repare que, nessa estruturagio, dividi os versiculos que com- poem o texto em tépicos. Muitas vezes, a estrutura do texto jd esté pronta, subdividida em frases e parégrafos. Temos apenas de nott-la. EXEMPLO 3: 0 HOMEM RICO E ZAQUEU Em Lucas 18:23-25, lemos o climax do epis6dio em que um homem rico se apresenta a Jesus e é exortado a deixar suas riquezas e seguir Mestre: 196 | mosaico BfaLico ‘SEGUNDA LEITURA: 0 CLIMAX | 197 pecador por causa de sua profissio, voluntariamente se desfaz de imetade de seus bens depois de ouvir Jesus. Outro contraste é a de- A INTENGAO DO AUTOR SS NOS HIPERLINKS papel deles no texto. & um equivoco nos concentrarmos no hi- perlink — buscando a referéncia da citacdo, de alusio ou do eco — eesquecermos que o texto tem seu sentido proprio e objetivo. Na anilise dos hiperlinks, devemos lembrar 0s quatro tipos mais comuns de paralelismo: analogia, contraste, complemento € sequéncia (cf. capitulo 13). Tenha em mente que os autores bibl 08, 20 montarem seu mosaico com pecas de histérias e ensinos de outros autores biblicos, as vezes o fazem através de analogia, outras veres, através do contraste de hist6rias. O hiperliak também pode servir como complemento para um ensino ou como sequéncia € consequéncia de algum ensino teolégico da Palavra de Deus. 1Na terceira leitura,focada na pericope, surge um questionamento: qual éa intengao do autor aoinserirhiperlinks no texto? Essas perguntas © ajudardo a ndo interpreta ohiperlink em ver de interpreta o text: De= DE IDENTIFICAR OS HIPERLINKS, CABE ENTENDER © + Por que o autor esta citando especificamenteesse texto? + Qual é 0 contexto completo do hiperlink? + O que o autor mudou ow acrescentou ao inserir esse hiperlink? + Esse hiperlink serve de analogia, contraste, complemento ou sequéncia? + © que o hiperlink ampliow no entendimento do texto que es toulendo? ‘Vou reaproveitar os trés exemplos apresentados no capitulo an- terior para mostrar por que o autor usou os hipertinks destacados. TERCEIRA LEITURA: A INTENGAO DO AUTOR NOS HIPERLINKS | 263 Naturalmente, eles serio explicados com base em minha interpre- tacdo particular. EXEMPLO 1: REFERENCIAS A GRIAGKO NOS SALMOS ‘A intengio do salmista era trazer 4 meméria a grandeza de Deus no ato da Criagio (Genesis 1 e 2). Desse modo, ele amplia o entendi- mento do seu leitor acerca do poder e da benignidade de Deus, © salmista tem como propésito exaltar o Altissimo, lembran- do-nos de que ele é 0 Criador. Essas referéncias foram inseridas no meio do poema, para que seus leitores se recordassem daquele que ctiou o universo ea humanidade. EXEMPLO 2: REFERENCIAS AO DEUS ONICO EM CORINTIOS ‘A orasZo a que Paulo alude em sua Carta aos Corintios é a mais co- mum e repetida da Tord. Como os cristios nao costumam fazer essa ‘oragio trés vezes 20 dia, pode haver dificuldade em captar a alusio de Paulo. Porém, seria uma referéncia bem evidente para oleitor do século 1. Essa oragio constitui a profissao de f central do monotefsmo judaico, mas aqui Paulo a usa para mostrar que Jesus ¢ um com Deus € Senhor de todas as coisas. No Deus tinico, podemos ver tanto 0 Criador do mundo como o Redentor da humanidade** EXEMPLO 3: REFERENCIAS A BANQUETE EM LUCAS Em toda a Biblia hebraica, e também no Novo Testamento, vemos a palavra “banquete” ou “ceia” como representacio da Terra Prome- tida, da provisio de Deus na vida eterna e da fartura do Eden. Com esse hiperlink, Jesus mostrar que s6 participario dessa festa aqueles que o reconhecem como Senhor e aceitam seu convite. ‘©N. T. Wright, Paulo para todos: 1 Corintios (Rio de Janeiro: Thomas ‘Nelson Brasil, 2020), 204 | wosalco BiBuico PRATICANDO A METODOLOGIA DAS TRES LEITURAS CChegow a hora de praticar a metodologia das trésleituras. Como exercicio proposto, ser4 utilizado um texto de cada Evangelho, de ‘Atos, de uma carta e do Apocalipse. Assim, voce lerd boa parte do Novo Testamento e percorrers todos os géneros da nova alianga. AS TRES LEITURAS EM MATEUS 28:18-20 + Primeira leitura do livro inteiro de Mateus ccm foco nos s- sunros. «= Segunda leitira da azsnto dessa pericope com foco na ESTRU- TURA. « Terceira letura da pericope de Mateus 28:18-20 com foco nos HIPERLINKS. oicAs + Observe o foco de Mateus no ministério de Jesus antes da cru- cificagio, e veja como esse foco esté voltado 20s judeus. + Leia a pericope na versio A mensagem e destaque as diferencas ‘observadas em relagao a tradugao que voc utliza. + Localize no Antigo Testamento “ir a todas as nagées” para abengoélas. AS TRES LEITURAS EM MARCOS 8:31-38 + Primeiraleitura do livrointeio de Marcos com foconos ASsUNTOS. + Segunda leitura do assunto dessa pericope com foco na ESTRU- ‘TuRA. « Terceira leitura da pericope de Marcos 8:31-38 com foco nos HIPERLINKS. DICAS + Observe a arquitetura textual: como Marcos escreveu seu Evangelho e 0 ponto de virada nos capitulos anteriores e pos- teriores a essa pericope escolhida. TERGEIRA LEITURA: A INTENGAO OO AUTOR NOS HIPERLINKS | 205 + Atente para o papel importante de Pedro nao s6 nessa perico- pe, como também no contexto literdrio préximo. + Localize no Antigo Testamento a ideia do Messias que sofre © 6 rejeitado. AS TRES LEITURAS EM LUCAS 1:46-55 « Primeira leitura do livro inteiro de Lucas com foco nos assuN- Tos, + Segunda leitura do assunto dessa pericope com foco na ESTRU- « Terceira leitura da pericope de Lucas 1:46-55 com foco nos HIPERLINKS. bicas + Observe o paralelo entre Zacarias e Maria, e entre Jodo e Jesus. + Lucas é o evangelista que mais fala do Espirito Santo, Desta- que as ocorréncias da palavra “Espirito” no primeiro assunto do Evangelho. « Localize no Antigo Testamento 0s varios hiperlinks que ecoam na oragao de Maria. AS TRES LEITURAS EM JOAO 6:25-510 + Primeira leitura do livro inteiro de Joo com foco nos ASsUN- Tos. + Segunda leitura do assunto dessa pericope com focona ESTRU- TURA, « Terceira leitura da pericope de Joao 6:25-S1a com foco nos HI- PERLINKS. DIAS + Observe que o Evangelho de Joao registra apenas sete mila- rs, denominados de “sinais”. O milagre da multiplicagio dos er er t pies ocorreu um pouco antes dessa pericope. 206 | osatco siB.ico + Perceba que um dos conflitos da trama ¢ 0 pedido de um sinal miraculoso a Jesus, que ele se recusa a fazer. Por que? + Localize no Antigo Testamento o episédio em que Deus fez descer pio do céu para alimentar 0 povo. AS TRES LEITURAS EM ATOS 5:1-11 + Primeira letura do livro inteiro de Atos com ‘oco nos ASSUN- 708. + Segunda leitura do assunto dessa pericope com foco na ESTRU- TURA. + Terceira leitura da pericope de Atos S:1-11 com foco nos HI- PERLINKS. oIcAS + Identifique o primeiro assunto do livro de Atos. Por que Lucas inseriu essa narrativa aqui? + Observe o paralelo que Lucas estabelece entre o Templo de Herodes e a reunido dos apéstolos e seguidores de Jesus. + Localize no Antigo Testamento duas pessoas que morreram por pecar diante do Espirito do Senhor. ‘AS TRES LEITURAS EM COLOSSENSES 1:15-20 + Primeira leitura da carta inteira de Colossenses com foco nos assuntos. + Segunda leitura do assunto dessa pericope com foco na estru- tura. + Terceira letra da pericope de Colossenses 1:15-20 com foco nos hiperlinks. DIAS + Lembre-se da fungéo dos poemas no texto biblico. + Descubra a fungao desse poema para a mensagem principal da Carta aos Colossenses. TERCEIRA LEITURA: A INTENGAO DO AUTOR NOS HIPERLINKS | 207 + Paulo dispara uma rajada de alusées e ecos do Antigo Testa- ‘mento para falar de Jesus. Identifique as principais referéncias amplie seu entendimento sobre a exaltacio de Jesus. AS TRES LEITURAS EM APOCALIPSE 12:1-17 + Primeira leitura do livro inteiro de Apocalipse com foco nos assuntos. + Segunda leitura do assunto dessa pericope com foco na estru- tur. + Terceiraleitura da pericope de Apocalipse 12:1-17 com fora, nos hiperlinks. DIcAS + O propésito final da revelacdo de Apocalipse & mostrar que, apesar dos sofrimentos da igreja no final do primeiro século, Jesus venceu o inimigo e retornaré triunfante. «+ Repare que a narrativa é repetida duas vezes nessa pericope, ‘uma complementando a outra, mas com a mesma mensagem, ‘como & 0 costume no mosaico dos autores biblicos. + Encaixe a narrativa na grande revelacao da Biblia hebraica e do Novo Testamento, com um final de esperanca para quem sofre. Que Deus fale com voce por meio dessa metodologia! Ela nio é perfeita, mas espero que o auxilie na tarefa de entender a B(blia com clareza e autoridade QUARTA PARTE | A-APLICAGAO | DA PALAVRA EO DEUS QUE | SE REVELA AILUMINAGO DO ESPIRITO SANTO PARA UMA BOA INTERPRETAGAO IALAMOS SOBRE A INSPIRACAO EM CAPITULOS ANTERIORES, agora pretendo abordar outro conceito bilico: a iluminagio. Sem a iluminagao do Espirito Santo, é impossivel interpretar a Palavra de Deus. Nao importa a metodologia adotada: se nao for- mos iluminados pelo Espirito Santo, no teremos a compreensio verdadeira do texto nem conseguiremos colocé-o em pritica. Expecificamente, a doutrina da laminago relaciona-se com aque. le ministrio do Espirito Santo que ajuda o crente a compreender a verdade das Escrituras. No que diz respeito & Biblia, a doutrina da revelagio relaciona-se com o desvendar da verdade no conted- do das Escrituras; ainspiragio diz respeito ae método pelo qual o Espirito Santo vigiou a composisio das Escrtura, a ikuminagéo refere-se a0 ministéio do Espirito mediante o qual o significado das Escrituras ¢ tomado claro ao crente.* Basicamente, a iluminacio do Espirito Santo consiste em acen- der a luz do entendimento para as coisas espirituais, para a grande revelacio de Deus. Sea Biblia € a Palavra de Deus a revelasio com- pleta de Jesus e das coisas espirituais, entio precisamos que alguém acenda a luz para que nossos olhos carnais enxerguem. Sé o Espirito “C. C Rye, “Muminagio in: Walter A. Ebel org Bncopédi hist cortege da eacrist (Sto Paulo: Vida Nova, 2008),p. 35. ATLUMINAGAD DO ESPIRITO SANTO PARA UMA BOA INTERPRETAGAD | 212, Santo pode acender essa luz. Por isso, nao basta a boa preparagio académica: se nao for pelo poder do Espirito Santo, nao entendere- ‘mos com clareza a revelagao das Escrituras, nem teremos autoridade para passar adiante nosso conhecimento. ‘ATLUMINAGAO DO ESPIRITO SOB A PERSPECTIVA BIBLICA Hi diversos textos bblicos que dizem respeito a como o Espirito San- to ilumina os servos do Senhor para que compreendam sua Palavra Destaco a seguir dois: um no Antigo e outro no Novo Testamento. O SALMO DA ILUMINAGKO Hi varios salmos que falam do poder iluminador de Deus, como este: “Tu, SENHOR, manténs acesa a minha limpada; o meu Deus transforma em luz as minhas trevas” (18:28). Vou me ater, porém, 420 salmo principal que revela com maestria essa funcio do Espirito Santo e a importancia da Palavra de Deus: 0 salmo 119, Guardei no coragio a tua palavra para nio pecar contrat (v.11) (Os teus mandamentos me tornam mais s4bio que os meus inimigos, porquanto estio sempre comigo, ‘Tenho mais discernimento {que todos os meus mestres, pois medito nos teus testemunhos (v.98 9). ‘Acexplicagéo das tuas palavras ihumina € dé discernimento aos inexperientes (v. 130). Em toda a coletinea do Saltério, percebemos a importincia de Deus iluminar aqueles que o buscam. Torna-se evidente que essa ilu- minagio é fundamental para dar discernimento, colocando o servo 22 | mosaico BiB.ico do Senhor em um patamar acima dos mestres. Quando somos ilu- ‘minados pelo Espirito Santo, vencemos 0 pecado, pois a Palavra & ‘como uma limpada que ilumina nossa caminhada. ‘AILUMINAGAO SEGUNDO PEDRO Um texto do apéstolo Pedro também mostra em que medida essa iluminagio é necesséria: Foia respeito dessa salvacio que os profetas que flaram da graga des- tinada a vocts investgaran examina, procurando saber o ten ‘po eas circunstincias para os quais apontava o Esofrito de Cristo que nelesestva, quando predisse a vocts 0s soffimentos de Cristo © as dvi que se seguriam aquelessoftimentos.A des foi revelado que estayam ministrando, nfo para si préprios, mas zara vocts, quando falaram das cosas que agora Thes sio anunciada por meio daqueles aque pregaram o evangctho pelo Espirito Santo enviado dos céus coi- sas que at os anjos ansciam observar (Pedro 1:10-12). Pedro diz que os profetas, pelo Espirito de Cristo, falaram acerca do softimento que Jesus experimentaria na cruz, mas eles no en- tendiam o pleno significado disso. Os primeiros letores do apésto- Jo, por outro lado, assim como nés, contemplaram toda a revela¢l0 por meio da iluminagio do Espirito, algo que até os anjos sonham conhecer methor. Se 0s anjos, seres celestiais, anseiam por entender cada vex mais 6 evangelho e nao chegam 20 fim, quanto mais nés, seguidores ¢ discipulos de Jesus devemos meditar nas Escritures dia e noite! Eo que seria “meditar”? E a pritica de repetir 08 vers{culos, re- fletir nos temas e nas estruturas do texto, para encaixar cada parte nesse grande mosaico chamado drama das Escrituras, que revela 0 evangelho e Jesus Cristo, Sempre que voct ler a Biblia, pega a Deus que o ilumine, a fim de enxergar a verdadeira revelagio em Jesus Cristo. ATLUMINAGAO DO ESPIRITO SANTO PARA UMA BOA INTERPRETAGAD | 213 ENCONTRANDO SEU PAPEL NO TEXTO Passamos muito tempo aprendendo como nos aprofundar no texto biblico, estudamos a forma de pensar dos autores da Biblia aprende- ‘mos sobre contexto cultural e literatio ¢ como aplicara metodologia de forma precisa. Isso é importante, porém igualmente importante é saber voltar i superficie, para o aqui e agora, de posse daquilo que aprendemos na esséncia da mensagem. Se errarmos esse caminho de volta, de nada adiantaré quao fando mergulhamos na revelacéo de Deus. Esse esforgo sera imttil se ndo trouxermos a tona o sentido do texto para os dias de hoje e aplicé-o ao nosso coragio. ‘Algo que muitos fazem automaticamente —e por sso erram — é tracar um paralelo direto entre si e 0s personagens bfblicos. Sempre {que lemos a Biblia, principalmente uma narrativa, colocamo-nos ime- diatamente no papel de um personagem, sem pensar que podemos ser © outro, e assim deixamos de entender a mensagem de Deus para nés. Por exemplo, na famosa pardbola do bom samaritano (Lucas 10:25-37) hd varios personagens: 0 homem que foi assaltado, os salteadores, o sacerdote, o evita e o bom samaritano. Voce jé parou para pensar que, dependendo daquele com quem vocé se identifica na histéria, a aplicacio da parsbola A sua vida pode mudar totalmen- te? No lugar de qual desses personagens voct se colocaria? Se-vocé se vé de imediato como o bom samaritano, essa pardbola nao é para vocé, porque esse ¢ 0 papel de Jesus em nossa vida. £16- gico que esse personagem nos inspira a amar o préximo na prética, porém esse nao € 0 propésito principal da parébola, Se voce se coloca no lugar do homem assaltado e deixado quase ‘morto, véa si mesmo como alguém desprovido de recursos, Amercé da boa vontade alheia. Esse também no é o propésito da paribola, embora seja verdade que estvamos mortos em nossos pecados € fomos resgatados por Cristo, No entanto, essa nfo ¢ a aplicasio que Jesus esperava de seu ouvinte, (O relato de Lucas comeca assim: “Certa ocasiso, um peritona Lei levantou-se para pér Jesus & prova” (v.25). A pardbola é a resposta 244 | wosalgo Bistico ‘um teste que os religiosos aplicaram a Jesus, € o Mestre est mos- trando que se deve amar o préximo na prética: nao deve ser apenas ‘uma teologia ou um credo a se declarar. Por isso, en e vocé devemos nos colocar no lugar dos religiosos, o sacerdote € 0 levita, que pro- vavelmente iriam cumprir sua escala de servico no ‘Templo, em Je- rusalém (por isso, Jesus menciona alguns lugares na pardbola, o que io é habitual). Se eles tocassem em algum morto ou em sangue, teriam de fazer rituais de purificacio durante varios dias e estariam impedidos de realizar 0 servigo a Deus no Templa. ‘Causa maior impacto caber que Jeous esté confrontando nosea religiosidade e a falta de amor ao préximo na prética, o que tenta- ‘mos justificar com a desculpa de que nao amamos por estarmos servindo a Deus ou por outros motivos religiosos. Era isto que Je- sus queria: confrontar os religiosos com essa perébola; mas esse propésito pode perder-se facilmente se nos colccarmos no papel errado. Pelo fato de ter estudado teologia ede frequentar uma igreja des- de a infancia, vivo proximo da religiio, das pregagSes e até mesmo da Biblia como alguém que conhece do assunto e sabe o que quer ‘ouvir. Isso estabelece um paralelo mais condizente entre mim e os fariseus do que com os discipulos ou os publicanes. Depois que en- tendi men papel no texto, releio as Escrituras sob uma nova dtica e sempre me coloco no lugar dos fariseus. O texto &0 mesmo, porém indo fago mais a aplicacio que fazia na infincia: & algo novo. Estou encarnando outro personagem nessa histéria. Em cada interferéncia arrogante dos religiosos, vejo uma parte de mim. Sinto dirigida a mim cada palavra mais rispida que Jesus Ihes dirige. Essa visio faz cada passo de minhas articulages meto- dolégicas e religiosas conspirarem para colocar 0 Jesus do texto no ‘inico lugar possivel: a cruz. Tio importante quanto entender o texto é saber seu papel nele. [sso trard uma nova revelagdo da Palavra, e talvez voce se surpreenda gritando do fando de seu eu: “Crucifca-o! Crucifica-o!” ‘A TLUMINAGAO DO ESPIRITO SANTO PARA UMA BOA INTERPRETAGAD | 215 ‘Mexendo em meus escritos dos mais de quinze anos que ensino hhermenéutica e aplicacio da Palavra, encontrei um poema que com- pus quando estava comegando a reler as pardbolas sob essa nova perspectiva. Nao sou poeta, €o texto chega a ser simplista, mas, pe- los hiperlinks de alusio, vocé percebera onde me coloco em cada pardbola, MINHA VIDA E UMA PARABI Sou o filho gue foge de casa. Sou a moeda nao encontrada. Sou solo pedregoso. Sou um pouco de trigo e de joi. Quando contou a minha histéria, ‘omenor grio virou drvore frondosa, os talentos se multiplicaram, as damas de companhia acordaram. Bato no peito, pois reconheco que nao presto. Passei ao largo de quem precisava de afeto. ‘Minha triste hist6ria foi marcada por uma rinha, pois mateio filho do senhor da vinha, ‘Quero vender tudo por esta pérola Quero acendera luz. quando o noivo aparecer. ‘Quero bater & porta até a cidade toda acordar. Quero aprender a sentar no tiltimo lugar. Sou ovelha desgarrada do rebanho. Sou filho que nao quer perdoar. Sou convidado que nao aparece na festa Sou o que cobro centavos em vez.de perdoar. 26 | mosatco siatico Mas ele encarou o deserto para me buscar. Deu grande festa quando me encontrou. Preparou o solo para minha vida transformar. E me chamou de filho quando eu s6 0 queria usar. ‘Antes de tudo, o Senhor jé sabia minha historia, Narrou os detalhes em sabedoria e milagres. Transformou minha miséria com graga e amor. ‘A pardbola da minha vida glorificou o meu Senhor. COMO TENHO CERTEZA DE QUE ESTOU APLIGANDO 0 EVANGELHO? ‘Cometemos o erro de nos colocar no papel erradodo texto por cau- sa da tendéncia religiosa de ler a Biblia como um livro moralizante, como um manual de conduta para a vida, como um livro do tipo pode/nao pode. F claro que a Biblia ensina valores morais para a Jhumanidade caida no pecado, mas nio é esse seu chjetivo principal. ‘Como jé vimos em todo este livro, o objetivo principal da Palavra de Deus é revelar Jesus € 0 evangelho do Reino. Lembro-me de uma palestra que ouvi em Aguas de Lindoia, em 2004, na qual o pastor Tim Keller discorreu sobre os quatro princi- pios para a correta aplicacao do evangelho quando se interpreta a Biblia, Sugiro que voce adote esses valores quando aplicar a Palavra de Deus & sua vida disria, PRINGIPIO 1: APLICAR 0 EVANGELHO HOJE E ENTENDER QUE A PALAVRA GRITICA TANTO A RELIGIAO COMO A NAO RELIGIAO Quando entendi que religiéo no é 0 mesmo que evangelho, minha visio de fé e minha leitura biblica mudaram para sempre. Hi trés maneiras de enxergar a revelagio de Deus e aplicé-la & sua vida. A primeira, a maneira religiosa, diz: “Eu obedego, logo sou aceito por Deus’: Nesse caso, 0 movimento mais importante é obe- decer e esti focado no ser humano. A segunda é a da nao religiio, ATLUMINAGAO DO ESPIRITO SANTO PARA UMA BOA INTERPRETAGKO | 217 ‘que diz: “Nao tenho de obedecer a Deus nem a ninguém. Sou dono dda minha vida e escrevo meu destino sozinho” Essa visio também std centralizada no ser humano e foi exatamente o que levou Adio ¢ Eva a desobedecerem. A terceira é a do evangelho, que diz: “Sou aceito em Cristo, por isso obedeco a Deus” A ordem dos fatores aqui faz toda a diferenga, assim como em toda a Biblia. A centralidade esti em Cristo, nao em nés. © mosaico é construido com a imagem de Jesus, e ele fez na cruz o que nao conseguiriamos fazer na eterni- dade. A obeditncia & nossa tinica resposta possivel. ‘Ao aplicar as Eecrituras & nossa vida, é fundamental seguir esse principio, afim de distinguir entre religito e nio religito, Na religiso do povo de Deus, hd quem se considere discipulo de Cristo, mas é ‘como 0s religiosos dos tempos de Jesus. Se voc8, como eu, cresceu no cistianismo, teve o privilégio de ouvir desde a infincia os valores bi- Dlicos, mas também pode ter desenvolvido a tendéncia de descambar para uma religiosidade igual dos fariseus. Religiosos e nio religiosos precisam entender que o evangelho nao é mero moralismo: &a graca transformadora de Cristo agindo no ser humano por completo. PRINGIPIO 2: APLICAR 0 EVANGELHO E ASSEGURAR-SE DE QUE TANTO A SANTIDADE COMO O AMOR DE DEUS ESTAO SENDO }SERVADOS NO TEXTO E APLICADOS A NOSSA VIDA [Na religido, a énfase € sempre na santidade. Na visio nio religiosa, a 4nfase é sempre no amor. No entanto, a pessoa ea mensagem de Cris- tonio descartam nenhum desses temas em detrimento do outro. ‘Ao conversar com amigos nao religiosos que trabalham com jus: tisa social, percebo que a grande mensagem que eles carregam é a do amor ao préximo, e nao hé como negar que esse é um dos pilares da mensagem de Jesus Cristo. Mas também vejo neles pouca preo- cupasio com uma vida de santidade, em que Deus determina o que 6 certo ou errado no dia a dia. Jé quando converso com amigos da igreja ou quando ougo algu- ‘mas mensagens pregadas por amigos pastores, percebo a énfase na aie | wosatco siauico santidade, Da mesma forma, nio h como negar que s trata de um va- lorbfblico fundamental, mas vejo que fica em segundo plano amensa- gem do amor incondicional ao préximo ¢ 20s inimigos, ¢ amensagem da justiga ao pobre, a viéva, a0 drfio e a0 estrangeiro, pregada pelos profetas do Antigo Testamento e ressaltada por Jesus Cristo, (© Deus do evangelho é mais amoroso e mais santo que o deus da religido e do pensamento secular, e ele ndo quer que deixemos nenhum desses dois pilares de nossa fé para tris. Temos de garantir {que tanto a santidade como o amor sejam observados na aplicasio daPalavra de Deus. PRINGIPIO 3: DAS PESSOAS ‘ESFORGO MORAL Geralmente, vemos trés movimentos na aplicagao da Biblia: CAR O EVANGELHO RESOLVER 0S PROBLEMAS E10 DE CRISTO E DO EVANGELHO, NAO POR 1. entender o texto biblico; 2. extrair uma ligio moral; 3. aplicaralligio moral. Esse tipo de aplicacio é a mais ébvia, pois creszemos ouvindo histérias com moral, como a dos Trés Porquinhos, que ensina a nio ser descuidado ou preguigoso; ou a da Chapeuzinhe Vermelho, que ensina a ouvir os mais velhos endo buscar atalhos na vida. Grande parte das pregag6es também apresenta esses trés movimentos, o que sgerou uma igreja moralista Veja, por exemplo, como é pregada a histéria bblica de Davi e Golias: Davi teve f suficiente para derrotar o gigaate e arriscou a vvida para salvar o povo de Deus (primeiro movimento). A moral da hist6ria é que enfrentaremos os gigantes que blasfemam contraDeus, ce que temos de enfrenté-los com fé (segundo movimento). Assim, na sua semana, enfrente os gigantes, sejam eles quais forem, mes- ‘mo que tudo indique que isso nao é possivel (terceiro movimento). /ATLUMINAGHO OO ESPIRITO SANTO PARA UMA BOA INTERPRETAGAD | 218 Esse tipo de aplicacao, além de gerar uma fé mecanica e moralista, causa frustraczo quando, segundo a vontade de Deus, ainda nio é ‘tempo de vencer os gigantes. Essa aplicacio poe 0 ser humano e suas agbes no centro. Naaplicago cristocéntrica, Cristo e o evangelho — no 0 esfor- ‘so moral — ocupam o centro. Essa aplicacio tem um total de cinco movimentos, Além dos trés que ja vimos, seguem-se: 4, a conscientizagio de que somos fracos endo conseguire- mos vencer por eaforgo préprio; S. a conviegio de que Cristo jé fez e que, entio, eu também ‘posso fazer por meio dele. Esses movimentos restauram a centralidade de Cristo em nossa vvida, pois 0 mosaico de nossa histéria aponta também para Jesus € seu evangelho. Reconhecer que nao conseguimos vencer os gigantes de nossa vida é reconhecer nossa natureza caida no pecado. E saber ‘que nem eu nem vocé, tampouco Davi, somos os herdis da histé- ria. A revelacio de Deus tem apenas um her6i, que é Jesus Cristo de [Nazaré, Davi arriscou a vida para salvar 0 povo; o verdadeiro her6i, Jesus, entregou a prépria vida pelo povo em uma cruz. O processo de decepsao com as proprias forcas permite que o evangelho ¢ 0 {que Jesus fer na cruz sejam valorizados e que, assim, podemos obter a verdadeira vitéria: “Eu me alegro também com as fraquezas, 0s in- sultos, 0s softimentos, as perseguigées e as dificuldades pelos quais ppasso por causa de Cristo. Porque, quando perco todaa minha forga, entio tenho a forga de Cristo em mim" (2Corintios 12:10, NTLH). PRINGIPIO 4: APLICAR O EVANGELHO E APONTAI COMO FAZ 0 MOSAICO BIBLICO A finalidade da Biblia nao somos nés — nem eu nem voce. Nao & sobre Abraao, Moisés ou Davi, nem sobre a Lei mosaica, nem sobre © Templo de Salomao, nem sobre a etnia hebraica, nem sobre a vida IRA JESUS, 220 | Mosatco BiBtico dos apéstolos. A finalidade da Biblia ¢ revelar Jesus e seu evangelho, e essa verdade nao pode ser esquecida na hora de aplicar a inter- pretagio da Palavra. Nao importa qual trecho da Biblia voce esteja endo, nem seo género & narrativo, poético ou apoctliptico. Se voce centralizar sua leitura em Cristo, sempre chegaré a ele, o Messias es- perado por seu povo. OCIRCULO VIRTUOSO DO CONHECIMENTO DA PALAVRA Geralmente, nos livros comuns, quando entendemos a mensagem do autor, refletimos sobre ela ea aplicamos & nossa vida. Ento, par ‘timos para outro livro, para que possamos continuar aprendendo, ‘Nio € assim com a Biblia, Por ser Palavra de Deus, o texto sagrado tem um tesouro inesgotivel, que nem mesmo os anjas se cansam de ‘buscar e de com ele se surpreender (1Pedro 1:12). ‘Tendemos a nao gostar daquilo que nao entendemos. Em 1998, fai morar nos Estados Unidos por um ano, e dividi um apartamento com um americano que amava assist as partidas de futebol ame- ricano. Como eu nunca fora exposto Aquele esport= nem entendia as regras, muito menos as estratégias, sempre murmurava: “Como vvocé pode gostar tanto desse esporte sem sentido?” Meses depois, de tanto assist aos jogos, ouvir sobre as regras e, rincipalmente, observar as estratégias aplicadas a cada situagio, comecei a entender fe me apaixonar por esse esporte. Hoje, décadas depois, ainda me ‘vejo assistindo a partidas de futebol americano mais de uma vez por semana, participando de grupos de apaixonados pea NFL, assistin- doa debates e tudo o mais. exatamente isso que acontecerd com voct, agora que entendeu como os autores biblicos pensavam e escreveram a Biblia. Quanto mais voce entende a Palavra de Deus, mais se apaixona por ela, ¢ ‘mais procura conhecé-Ia entendé-1aa cada dia. Logo acompanhard ‘mestres biblistas nas redes sociais, participara de grupos apaixona- dos por leitura biblica e se surpreenders ao ler dezenas de vezes 0 mesmo texto e encontrar algo novo a cada leitura, ATLUMINAGAO DO ESPIRITO SANTO PARA UMA BOA INTERPRETAGHO | 221 Este € 0 circulo virtuoso da boa interpretagao: quanto mais vocé les, mais entenderé; e, quanto mais entender, mais desejari ler e aprender. Pois, quanto mais se conhece a Deus, mais se percebe que hd um depésito infinito de coisas a conhecer e desfrutar nesse Deus maravilhoso, DEUS PAIE A INTERPRETAGAO quanto maior for 0 conhecimento que vocé tiver do mistério da Trindade, mais perreherd que sua busca por entendimento foi gerada pelo proprio Deus Nesta iltima parte, quero lhe mostrar, de forma sucinta, como o Deus Pai, o Deus Filho e o Deus Fspirito nos guiam. na compreensio da Palavra, uma jornada que nao esti acabando, mas simplesmente comegando, até que Cristo volte. Entre os incontiveis atributos de Deus, hi pelo menos trés ca- racteristicas do Deus Pai que podemos ter em merte em nosso pro- cesso de ler, entender eaplicar a revelagao em nosst vida. Assegurar- -nos dessas verdades nos traz paz de espirito e tranguilidade. r= BIBLICA LHE REVELARA MAIS DO DEUS TRINO, OPAL CRIADOR [A primeira caracteristica de Deus Pai pode ser vista no primeiro versiculo da Biblia: “No principio Deus criou os cus e a terra” (Genesis 1:1). Ele & 0 Criador. Esse atributo também é louvado no Saltério: “Os céus declaram a gléria de Deus; ofirmamento procla- maa obra das suas mios” (Salmos 19:1). No Novo Testamento, 0 apéstolo Paulo faz referéncia a essa caracteristica divina: “Desde a ctiagio do mundo, os atributos invisiveis de Deus, seu eterno poder e sua natureza divina, tém sido vistos claramente, sendo compreendidos por meio das coisas criadas, de forma que tais homens sio indesculpéveis” (Romanos 1:20). Ainda sobre Deus apresentado como Criador no Novo Testamento, Wayne Grudem observa: DEUS PAI E A INTERPRETAGHO | 223 © fato de ter Deus criado 0s céus ea terra, e tudo o que neles hi, 6 afirmado visas outras vezes no Novo Testamento, Por exemplo, ‘Atos 4:24 fala de Deus como “Soberano Senhor, que fizeste 0 céu, terra, o mar e tudo o que neles hi": Uma das primeiras maneiras de identificar Deus & dizer que ele criou todas as coisas. Barnabé e Paulo explicam & plateia paga em Listra que sio mensageiros de um Deus vivo, que ex “o eu, a terra, o mare tudo 0 que hi neles” (At 14:15), Do mesmo modo, quando Paulo fala aos flésofos gregos pagios em Atenas, ele identifica o Deus verdadeiro como 0 “Deus fue for mind ¢ tide a que nele existe” din que exse News “3 todos dé vida, respiragdo e tudo mais” (At 17:24-25; cf Is 45:18; Ap 10:6). Em suma, todas as coisas criadas tem a digital do Pai. A ordem, abeleza e a inteligéncia ao nosso redor proclamam que existe um Criador. Mesmo aqueles que afirmam nao acreditar em um Criador sao constantemente confrontados com o testemunho da criagi0 20 seu redor. 0 PAI QUE SE REVELA Por ser o Criador, o Pai se revela de forma direta na criaglo: ‘Toda a eriagio tem por meta revelar a gléria de Deus. Mesmo @ ‘riagdo inanimada — as estrelas,o sol, aluae firmamento — da ‘testemunho da grandera de Deus. (..] (© que a criagio revela sobre Deus? Antes de tudo, mostra o grande poder e « grande sabedoria de Deus, bem acima de qual: ‘quer coisa que qualquer criatura possa imaginar. (..] Basta olhar de relance o sol ou as estrelas para se convencer do infinite poder de Deus. E mesmo uma breve inspegéo em qualquer folha de é. vore, ou no prodigio da mao humana, ou em qualquer cétula viva, ““Telogia sisteatica (Sko Paulo: Vida Nova, 2000), p. 199. 224 | MOSAICO BiBLICO convence-nos da grande sabedoria divina. Quem poderia fazer tudo isso? Quem poderia faztlo do nada? Quem poderia susten- ti-lo dia apés dia, por incontéveis anos? ‘Todo ser humano, ao olhar ao seu redor e contemplar a beleza 4a criagao, bem como a ordem natural das coisas, tra em contato coma revelacio divina. £ importante termos ciéncis de que nao so- ‘mos os tinicos a declarar que Deus existe. A criaglo faz isso desde 0 inicio do mundo. No entanto, além de ser 0 Criador, Deus também se revela de forma intencional e especial. Ele se revelou a Abraio: “Saia da sua terra, do meio dos seus parentes e da casa de seu pai, e vi para a terra que eu Ihe mostrarei” (Genesis 12:1). Encontramos a mesma postura quando ele se apresentou a Moisés: “Eu Sou o que Sou. E {sto que voct diré aos israelitas: Eu Sou me enviou a vocés” (Exodo 3:14). Ea todo o povo e Israel, ele manda dizer: “As coisas encober- tas pertencem ao SENHOR, 0 nosso Deus, mas as reveladas perten- em ands eaos nossos filhos para sempre, para que sigamos todas as palavras desta lei” (Deuteronémio 29:28). ‘Essa € outra caracteristica que mostra nossa dependéncia de ‘Deus Pai para entender a Biblia e proclamar o evangelho. Ele se revelou ao longo da histéria e se revela a nés nos dias de hoje. E revelar-se foi decisio dele: nao fomos nds que decidimos buscé-lo. Isso nos dé mais tranquilidade para proclamar sua Palavra. Também podemos descansar na ideia de que ¢ do interesse de Deus que sai ‘bamos interpretar a Biblia corretamente. ‘Meus alunos is vezes me perguntam se Deus ndo poderia faci- litar 0 processo, enviando uma lista do que precisamos saber, em ver de se comunicar por diferentes géneros literirios, como cartas, narrativas e poesia. Para eles, essa variedade dificuta o proceso de aprendizagem da revelac3o. Eu Ihes digo que Deus se revelou dessa “Gradem, p. 206 DEUS PAI EA INTERPRETAGAD | 225, forma por ser a melhor maneira de se revelar. Deus esti no controle de sua revelagio. Em ver de debatermos sobre como Deus decidiu- revelar-se, nos alegremos ao saber que ele tem a intengao de se re- velaranés. 0 PAI DE AMOI ‘Altima caracteristica de Deus Pai, que ¢ importante para vocé en- tender sua Palavra, € 0 amor. No encerramento dos cultos de tradi- ‘40 reformada, costumamos dizer: “Que o amor de Deus Pai seja ‘com todo 0 povo de Deus!" Talvez vocé conheca o emblemstico versiculo que diz “Deus € amor” (IJoio 4:8). Mas Joio nao foi o tinico nem o primeiro a de- clarar essa verdade. Ela perpassa toda a Biblia. O Pai é um Deus que ama, como revelam alguns textos: Deem gragas ao SENHOR, porque ele é bom. O seu amor dura para sempre! (Salmos 136:1) (© Senxiox Ihe apareceu no passado, dizendo: "Eu a amei com amor eterno; com amor lea a atrat”(Jeremias 31:3). 1Nés amamos porque ele nos amou primeiro (1Joio 4:19). comuma visio de que o Deus do Antigo ‘Testamento é severo € 0 Deus do Novo Testamento é Jesus em amor. Mas apenas quem rio leu a Biblia por completo e nao entendeu 0 mosaico que aponta para Jesus pode pensar assim. O Deus de amor revelado em Jesus de forma clara € mostrado em todo o Antigo Testamento, Esse Deus no ama apenas os que buscam uma interpretagao melhor, mas to- dos os seus. E ele levaré até vot pessoas que ele ama, de modo que voct Ihes explique o que Ihe foi revelado. Em suma, a singularidade de um Deus que ama incondicional- ‘mente torna a mensagem das boas-novas praticamente irresistivel 226 | wosaico sia.ico aos seres humanos. No periodo biblico, todos os deuses se relacio- navam com as pessoas em troca de adoracio, por vinganga ou por rmotivos partidarios, $6 o Deus de Israel se revela como amor infini- to, como um Deus que amou primeiro, Isso nos di mais seguranga em nossa interpretagio. Por isso, precisamos de Deus Pai. Ele ¢ fun- damental na tarefa de interpretar a Palavra de Deus ¢ na obtengio de clareza e autoridade para proclamar nossa fé ao prérimo. DEUS FILHO E A INTERPRETAGAO lde interpretar a Palavra de Deus. Como vimas, toda a Biblia ‘aponta para Jesus. Quando compreendemos Jesus, compreen- demos a Palavra Destaco a seguir trés figuras que a Biblia constréi, em todaa sua extensio, em torno da pessoa de Jesus. A Palavra forma um mosaico de imagens e hist6rias construido para revelar 0 Deus Filho como a ‘encarnagio do amor e nossa salvagio. 0 Do Dgvs FILHO TAMBEM £ FUNDAMENTAL NA TAREFA. JESUS, 0 UNGIDO A primeira figura de Cristo que a Biblia constr6i é a de ungido de Deus. Na hist6ria biblica, os reis, os sacerdotes ¢ alguns profetas eram ungidos (cf Exodo 3:30; 1Samuel 15:1). O rei era figura re- presentativa de Deus na terra; eo sacerdote, 0 representante dos ho- ‘mens diante de Deus. Adio e Eva incorporavam essas duas figuras, pois exerciam uma espécie de sacerdécio real (expresso muito utili zada em toda a Palavra de Deus) para toda a criagio. Deus concedeu a0 ser humano essa autoridade quando nos criow & sua imagem e & sua semelhanga. No entanto, o reinado e 0 sacerdécio como dom natural foram perdidos na Queda. Contudo, a expectativa messiénica (simbolizada pela imagem do “ungido” no Antigo Testamento; e do “messias” no Novo Testamento) percorre toda a Biblia e é concreti- zada em Jesus. Na revelagdo progressiva da Biblia, nds vemos a figura do ungido ganhando contorno: 22u | wosalco sisuico ‘Assim voce os consagrari, para que me sirvam como sacerdotes [4] Unjz-o com 0 éleo da ungio, derramando. sobre a cabesa (Exod 29:17). ‘Quanto a voct [Davi], sua dinastia e seu reino permanecerio para sempre diante de mim; o seu trono serd estabelecido para sempre (2Samuel 7:16). (© Sennor disse ao meu Senhor: “Senta-te mirha direita até que eu fasa dos tous inimigos um estrado para o¢ teus pés" (Salmas 11011) [Um menino nos nasceu, um filho nos foi dado, e 0 governo est sobre os seus ombros. E ele seri chamado Maravilhoso Con- selheiro, Deus Poderoso, Pai Eterno, Princip: da Par” (Isaias 9:6) Esses versiculos e dezenas de outras passagens mostram que 0 ppovo de Israel estava aguardando o rei que Deus mandaria, o verda- deiro Ungido, o verdadeiro Sacerdote-Rei, Essa era texpectativa nos tempos de Jesus. Foi por isso que tentaram proclamé-lo rei. Mas ele ‘mostrou que era um rei diferente. Ble veio reinar nos coragSes. Ele no era apenas o rei de Israel, mas de toda a criagdo. No entanto, Je- sus nunca negou ser 0 Ungido, o Rei-Sacerdote, o Messias, 0 Cristo que todos esperavam. Jesus € 0 tinico e definitivo Rei-Sacerdote. Ele reina sobre nossa vida e sobre toda a criagio. Ele é 0 protagonista de todas as histérias — nao s6 das narrativas biblicas, mas também da histéria de cada ‘um de nés, O mosaico biblico que aponta para Jesus é também um ‘mosaico de nossa vida. Quando olhamos para trés, percebemos que Deus foi construindo os detalhes e padres em nossa trajetéria, com o fim de revelar Jesus por meio de nés, nosso rei e mediador para com o Pai. DEUS FILHO E A INTERPRETAGAD | 220 JESUS, O SACRIFICIO DEFINITIVO A segunda figura de Jesus importante para nosso entendimento da Biblia € a do cordeiro pascal. Essa figura comega a ser construida is vvésperas da saida do povo de Deus do Egito: © animal escolhido sers macho de um ano, sem defeito,e pode ser cordeiro ou cabit. [..] Este da erd um memoria que vocts eto- dos os seus descendentes celebrarao como festa a0 SENHOR. Cele- brem-no como decreto perpétuo (Exodo 12:5,14). A ideia se repete no Novo Testamento: No ia seguint Joo vin Jesus aproximando-se dss: “Vejam! E © Cordeiro de Deus, que tra pecado do mundo!” (Joio 1:28). Livrem:se dofermento velho, para que sejam massa nova esem fe- mento, como realmente io, Pois Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi sacriicado(ICoriatios 5:7). Cristo foi oferecido em sacrficio uma tnica vee, para trae os peca- dos de muitos (Hebreus 9:28) Desde o inicio das Escrituras, um animal inocente e sem mécula 6 sacrificado pelos pecados que o ser humano comete. Porém, 0 s2- crificio nao tinha aspecto definitivo, pois tinha de serrepetido perio dicamente. Por essa razdo, criou-se no Antigo Testamento a expecta- tiva de que um dia o verdadeiro Cordeiro viria remover o pecado de uma vez por todas, reabrindo o acesso ao Eden, & presenga de Deus. Jesus se revela como esse sacrificio perfeito A morte de Jesus, o nico que nao cometeu pecado, revela que todos so culpados. Sua morte nos constrange humilha, ao mes- mo tempo que nos da coragem e forca, pois entendemos seu amor sacrifical. E muito interessante esse paradoxo. Temos consciéncia 230 | mosaico sia.ico de que Deus teve de morrer por nés,¢ isso é constrangedor. Esse constrangimento é que deve levar-nos a compartilhar a Palavra de Deus. Em contrapartida, saber que Deus nos ama de forma incon- dicional a ponto de entregar o préprio Filho parz morrer na cruz enche-nos de coragem e ousadia para proclamar a mensagem sal- vadora. ‘Em suma, a cruz de Jesus deixa-nos constrangidos para que fa- lemos com humildade, mas também nos dé fora e coragem para falarmos com ousadia e poder. JESUS, 0 FILHO DO HOMEM A terceira figura do Deus Filho como revelacao e auxilio na com- preensio de sua Palavra é a do Filho do homem. #la comeca a ser construida no primeio livro da Biblia: PPorei inimizade entre vot e a mulher, entre a sua descendéncia 0 descendente dela; este feriri a sua cabesa, 2 voct Ihe fers 0 calcanhar (Genesis 3:15). ‘Também esté presente nos Profetas: ‘Em minha visio & noite, vi alguém semelhante a um filho de ho- mem, vindo com as nuvens dos céus. Ele se aproximou do anci3o «foi conduzido & sua presenga. Ele recebeu autoridade, gléria ¢ 0 r2ino; todos os povos, nagies e homens de todas as inguas o ado- raram, Seu dominio & um dominio eterno que ndo acaba, e seu reino jamais seri destrufdo (Daniel 713,14). Em todos os Evangelhos, Jesus se autodeclare o Filho do ho- ‘mem, como em Mateus 18:11: “O Filho do homem veio para salvar ‘que se havia perdido” Em todo 0 Antigo Testamento, a expressio “Filho do homem” faz referéncia a descendéncia de Adio — “Adio” e “homem"” sio a DEUS FILHO E A INTERPRETAGKD | 231 ‘mesma palavra no hebraico. Mas, desde a promessa de Deus sobre 0 descendente da mulher que pisaria na cabeca da serpente até a visio de Daniel sobre o “filho de homem’, percebe-se que esse Filho é al- ‘guém muito préximo do Pai. Assim, a partir dos escritos de Daniel, comesa a se formar a ideia de que o Filho do homem, além de ser filho de Adao, ¢ Filho de Deus. Por isso, quando Jesus fala de si mes- ‘mo, ele se identifica como “Filho do homem” Em suma, Jesus, o descendente de Adio, é 0 Filho de Deus en- camado, aquele que nos deu acesso & presenga do Pai. Isso revela ue todos os seus discipulos podem viver nessa seguranga ¢ dar ease testemunho. Se Jesus é verdadeiramente homem e verdadeiramen- te Deus, como acreditamos, ele garante a nés, humanos, acesso 20 Deus Pai. Ele veio para nos conduair outra vez presenca de Deus, no Eden, Ele ¢ 0 Filho verdadeiro de Adio, porém sem pecado; por isso Paulo se refere a Jesus como uma espécie de segundo Adio (Corintios 15:21-22). Jesus percorreu esse caminho até o Pai. Quando nos comunica- ‘mos, proclamamos as boas-novas de alguém que jé cumpriu toda a sentenga de Deus na cruz e, por isso, todos os que pela fé aceitam ‘essa mensagem tém acesso a Deus. DEUS ESPIRITO 23 SANTOE A aera INTERPRETAGA nossa compreensio da Biblia. Mais uma ver, as trés caracteristi- [cas que apresentarei neste capitulo nao so as inicas, mas creio que o ajudario a interpretar com clareza e intrepidez,e a proclamar feo Do Espirito SANTO TAMBEM & FUNDAMENTAL PARA com ousadia, a mensagem do evangelho. OESPIRITO SANTO REVELA E INSPIRA A primeira caracteristica do Espirito Santo é que ele revelae inspira Encontramos essa verdade no Novo Testamento: Quando os prenderem, néo se preacupem quanto 20 que dizer, ow ‘como dizé-lo, Naquela hora, seri dado © que dizer, pois nfo serio vvocts que estario falando, mas o Espirito do Pai de voces falaré por intermédio de vocds (Mateus 10:19,20). ‘Todavia, como esté escrito: “Olho nenhum viu, ouvido nenhum ‘ouviu, mente nenhuma imaginou o que Deus preparou para aque- les que o amam; mas Deus o revelou a nés por meio do Espirito (1Corintios 2:9,10). Nodia do Senhorachei-me no Espirito e ouvipor tris de mim uma vor forte, como de trombeta, que dizia:“Escreva num livro © que 8 vé"(Apocalipse 1:10,11). ‘DEUS ESPIRITO SANTO E A INTERPRETAGAO | 233 Espirito Santo revela verdades as pessoas e as inspira. Ele ins- pirou de forma especial e singular os autores biblicos, e continua inspirando muita gente até hoje. Usamos o verbo “iluminar” para se referir a0 esclarecimento dado pelo Espirito, mas é interessante constatar como ele “sopra” e revela o caminho eterno aos seus. E 0 Espirito Santo quem se comunica conosco. Alids, a Biblia diz que 1do sabemos orat, mas, quando o fazemos, o Espirito Santo traduz para Deus 0 que esti em nosso cora¢ao quando nao conseguimos exptessé-lo (Romanos 8:26). Dessa forma, o Espirito Santo é fun- damental para entendermos a Diblia. Contudo, vamos deixar algo bem claro: algumas pessoas usam 0 Espirito Santo como escape para nao se dedicar ao estudo e & her- menéntica, como se Deus revelasse tudo apenas por meio da ora- fo. Nao & assim que acontece. A revelacio ocorre em momentos especiais. De fato, no precisamos de hermenéutica nem de estudos pprofundos para entender a salvagio em Jesus Cristo. Isso também acontece pela revelagio do Espirito Santo. E gragas a ele que somos convencidos de nosso pecado e de que precisamos de salvacio. No entanto, como diz o salmista, devemos meditar dia e noite nas mara- vilhas registradas na Palavra de Deus (Salmos 1:2). Assim, entende- remos cada vez mais a mente de Deus e o que ele decidiu nos revelar. A certeza de que o Espirito Santo inspirou os autores das Es- cituras e que elas ndo falham em revelar a plenitude de Deus para todos nos da seguranga ao examinar o evangelho. As vezes, no en- tendemos certos assuntos 20 ler a Biblia, mas, como sabemos que foi o Espirito Santo quem inspirou os autores biblicos, podemos ter certeza de que encontraremos a resposta na propria Biblia ‘Também no Espirito temos confian¢a para testemunhar, pois foi a verdade revelada na Escrituras que transformou nossa vida. OESPIRITO SANTO SALVA E SANTIFICA ‘Também é 0 Espirito que nos salva e nos faz crescer em santidade, e © faz. por meio da revelacio. Lemos que:

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