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BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da arte. Séo Paulo: Perspectiva, 1991. 3. A Importancia da Imagem no Ensino da Arte: Diferentes Metodologias [ARTE NA EDUCACAO NAO E MERO- EXERC{CIO ESCOLAR Sempre me encomendam textos ou palestras com 0 tfulo “A Importincia da Arte na Escola”. Para os que trabalham com arte € tho dbvia a importancia da arte na vida €, portanto, em qual- {quer forma de insttucionalizagio da vida, como a escola, que Seo Giada a dizer apenas: Se a arte nfo fosse importante nfo existi- ia desde o tempo das cavernas, resistindo a todas as tentativas de ‘menosprez0. ‘Entretanto, para escapar a acusaglo de simplismo que esta reapesta poderia provocar, vamos pensar na necessidade da arte cm duas etapas fundamentais do ser humano em sociedade: © momento de sua alfabetizacéo ¢ a adolescéncia. ‘Estes dois momentos evocam no senso comum instantancae mente necessidades de natureza diferente: a alfabetizagio como Recessidade de conguista de uma técnica a adolescéncia como necessidade de conguista de equilibrio emocional. ‘Porém, se pensarmos que uma tem como objetivo apenas 0 dominio cognitive ou intelectual (a alfabetizagao) © a outra (a fadolescéncia) € uma crise de dominio afetivo estaremos come- tendo o velho erro de dicotomizar razio e emosio. ‘Nao ee alfabetiza fazendo apenas as criancas juntarem as le- tras. 28 AIMAGEM NO ENSINO DA ARTE Hi uma alfabetizacdo cultural sem a qual a letra pouco signi- fica. ‘A leitura social, cultural e estética do mi sentido ao mundo da leitura verbal. Por outro lado, a arte facilita 0 desenvolvimento psicomotor sem abafar 0 processo criador. Em 1988, Maria Lucia Toralles Pereira defendeu uma tese na Universidade de Séo Paulo (ECA) pesquisando numa creche de criangas pobres demonstrou que 0 ‘grupo que trabalhou com arte desenvolveu melhor sua motricida- de que o grupo submetido aos exercicios psicomotores usuais, © provou isto usando testes empregados pelos especialistas em psi- comotricidade, isto 6, usando as armas do inimigo. ‘As artes plisticas também desenvolvem a discriminagdo vi- sual, que € essencial ao processo de alfabetizacao. Para uma crianga de seis anos as palavras lata ¢ bola sao muito semelhantes porque tém a mesma configuracdo gestéltica LOS , isto é, uma letra alta, uma baixa, seguida de outra alta ¢ mais uma baixa. S6 uma visualidade ativada pode, nesta idade, diferenciar as duas pa- lavras pelo seu aspecto visual e esta capacidade de diferenciagao visual 6 basica para a apreensio do c6digo verbal que também é visu ambiente vai dar ‘Aprende-se a palavra visualizando. Outra importante fungao da arte € a complementagao da comunicaco entre professor-altu- no. Os professores, por mais iletrados que sejam, tm um univer- so vocabular muito maior que a crianga ¢, se sao letrados, tém uma linguagem muito diferente da linguagem “nés vai”, “nds se mo” das criangas pobres. Como € possivel a comunicagao verbal? # como se 0 professor falasse grego para um aluno imbecili- zado pela incompreensao. ‘A representacio plistica visual muito ajuda a comunicagio verbal, que € restrita a umas setenta palavras para uma criauya de seis anos. Para a demonstragéo da necessidade da arte na adolescéncia prefiro recorrer a textos com 0s quais me identifico. Em primeiro lugar, Octavio Paz para definir a natureza da crise cxistencial da adolescéncia, seguindo-se Regina Machado ‘que nos fez imaginar a imaginago que organiza a consciéncia in- terrogante do adolescente. Octavio Paz diz no Labirinto da So- lidao: ‘A todos, em algum momento, s© nos revelou nossa existencia como alge particular, instranferivel e precioso. Quase sempre esta revelagio se situa na ado- Iescéncia. © descobrimento de nés mesmos se manifesta como um saber ~ nds 26m entte o mundo ¢ nos se sbre uma impalp4vel, transparente muralha « de nossa consciéncia. £ certo que basta nascermos para nos sentirmos ss; mas as A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINO DA ARTE... 29 criangas ¢ 08 adultos podem transcender sua solidfo ¢ exquecer-se de si mesmos através do jogo ou trabalho. Por outro lado, © adolescente, vacilante entre a infincia ¢ a juventuée, fica suspenso um instante ante a infinta riqueza do mun 0, O adolescente se astombra de ser. E ao pasmo sucede a reflexdo: inclinado sobre o rio de sua Consciéncia pergunta se este rosto, que aflora lentamente do fundo deformado pela 4gua, €0 seu. A singularidade de ser ~ mera sensagio na crianga ~ sc transforma em problema ¢ pergunta, em conscitncia interrogantet ‘Regina Machado comenta este texto de Octavio Paz: Que possibiidade o nosio sistema educacionaloferece ao adolescente de exert uma consioncia interrogante? cho. desneceiio rerponder a ta Suesto, todorsaberoro quanto uma erange, ese mai ov menos tte anos, jt Sis “Tormada” pelos padzbes da lpica do cero e do errado, 0 quanto ruse pose Stiidadee de perguncar sobre 0 que pode ser estioengusdradat em regras re~ taabelcids, Dai para a frente ela busca sompre scertar,guandose pelo que parece estar de acordo™ com 0: mundo alto, pels exgencas exteriors do “Xencer na vida", © momento da adolescénca me parece enical como oportun- dude para que a escola preencha Ge signiiengto esta revlagto da existciaco- tno algo particular, intransfervel de que fala Octavio Pan B precio que 0 400. iecente tenn a pousbiidade de se apoderar do ser dno que cle 6 das suas ap- tidGen, ronhor, angosare indagagoos, pens que into cle pode conseguir 4 pus der EXPRESSAR ou consrun, deforma sigificativ, areftexdo sobre seu “a. Sombrane de se" B precio tor espago ¢ condigden que me permite ac et tho quinze ano, confrontar-me com quem eu sou enquanto indviualidede, no tnomento em que ext deseubro como minha, Além dt vor, que me diz 0 tempo {odo come ev devo ser, como dav vestinme, omportarme, © que devo dcr, © Que dive ecolher, precio que me se permitigo exeuiar uma outs vor que Dergunta dentro de mim 0 gee eu PODERIA ou GOSTARIA de ser. E preciso nfm que cu possa IMAGINAR. Quero dizer, imaginar no no sentido pejorat- ‘wo que esta palavra tem cada vex mais na nosa sciedade, ou sn 0 de produit Tnabe, fantasia, “ostaia de ser ma princes” te. Ma alo da fungio primox Gia da imaginagio, que és de possbiltar o indiéuo perguntarse sobre 0 que ode cr lve Gas marras do certo cdo crado, pare que aguilo que ¢ zeal seit nifcavo pare quem pergunta. © rel dima de ser ripdo,prestabelecio pare Sempre e paisa ager algo ue cu possa ofhar de vriogfngulos para encontrar & treo forma de compreendéte 1 que o process de socilaag faz com a imaginagio? A crianga pequens entra paeacolac encont © olharcomplacente do ndllo:"quelindo.e vou dese- tho, alhes6 que imaginagdo que ‘riativgade’, como é interessante seu jelto de Ierente de pesguntar” nt na melhor das hipéesce, quando encontra usm auto “enuivel” a0 "mundo infant Entdo af imaginagio esté bem, afin, dizem, ‘ang ainda “ndo sabe pensar dieito", «fantasia erruture 0 ser da cxange,€ ‘sa forma de reltcionamento com o endo, Ela presen brincar ~ quando Scr sam, € caro ~ também desenbar, ouvir eatriasGinda ni esténa hors de BS- TUDAR No i grav, tudo muds’ a teriodade dos nimero, pala, repibee do imundo, 40 corpo mano invade or espagoe ocupade me entdo pela Imapie ste 1. Octavio Paz, EI Labirinto de la Soledad, México, Fondo de Cultura Beonémica, 1977 30 AIMAGEM NO ENSINO DA ARTE, “Tais informagBes poderiam e podem conviver com a Imaginagio, de muitas formas: Mas, em geral, 0 que acontece € que a razSo ¢ a imaginagio sto coloca- dos cm compartimentos separados ¢ estangues, até mesmo pelas tentativas mo- ~GESET de junticas:'o desenho da caravela junta-se A matéria sobre 0 desenvol crrnet do Brasil, ou coloca-se em dramatizacdo o texto da aula de portugues. Mas trstee de uma relagio mectinica © néo orginica como poderia ser. Isto 6 Ue por um desconecimento da complementaridade que existe entre a razio © & Imapinagdo em todo processo genulno de aprendizagem. ‘Plar do que inao, tal desconhecimento gera uma desinformagso muito grave tna viedo que se tem da ImaginagSo, relegada aos artistes, aos loucos ¢ ds criancas Molten autores chegam a discutir © perigo de incentivar a atividade imaginative fo sentido de que cla poderia impedir a atuaglo do individuo no mundo: &fanta- Tha stra” a pessoa da realidade, deixa-a “sem recursos” para enfrentar o€ pro- Diemas concretor que a vida aprecenta. Nao hd divida qe existem macanismos Poaroticos, doenter, que isolam determinados individuos em uma fantasia ext rerpada, na qual eles se refugiam por te sentirem incapazes de lidar com a reali- ade, "Mas a alienagSo néo se produz apenas pela fantasia. E a fantasia nto se re- dur A utlenngio, Esta apenas € um mau weo de wma faculdade humana que existe jJostamente para promover « afirmagao do homem enquanto ser criador, para Mostrar diferentes Angulos possiveis, de uma realidade que a légica apresenta de ‘ma 36 forms. “Antigamente, nos povos tradicionais, © momento da adolesctncia era mar- cado pot ites de iniiagho, que tinham a funcSo precisa de introduzir o individu ge SIONIFICAGAO de ser adulto. A visio de mundo daqucla sociedade estava Cnpresta em slmbolos compartthados por todos e tal conhecimento era transmi- Gdovuo adolescente através de rituals que o faziam passam por duras provas, fnarcevamvno, escreviam, As Vezes 10 Seu corpo, na sua mente, © modo como quele grupo humano entendia seu estar no mundo. Na nossa sociedade, 0 adolescente recebe REGRAS ¢ nfo SIGNIFI- CAGOES. Ele deve aceité las para poder #e transformar num cidadfo bem-suce~ Glee, Banund Burke Feldman fundamenta sua teoria e método da arte-educagio tha nccessidade que hoje temos de ritualizar nossas crises de confronto com a vi a, durante virias etapas do nosso crescimento, Segundo Feldman, s6 existe crise Ge adolescéneia em nosso mundo, porque tal erise nfo € RITUALIZADA por Seatumn sito de patsagem. A arfe entso cumprisia um importante papel nesse sentido, possibilitaado a0 individu, através de sus expressso, controntarse com ‘Aeredito que a arte tem, de fato, uma fungio especifica nesta fase da vida 4o indiiduo, em que cle deixou de set erianga, em que se v8 como consciéncia TeenGgante'e sinda nfo & adulto, Comecei falando da Imaginacto porque ela € indissoeidvel da atividade artistica, uma nZo existe sem a outra. A principio con MMerel a imaginagio como potencialidade humana fundamental para qualquer Shade ou atiidade? nfo existe pensamento genulno sem imaginacio. Todos os re- fatos dos grandes cientistas, como por exemplo Poincaré ou Einstein, falando de tee trabalho, mostram 0 quanto a imaginacio ¢ a intuigSo estio na base de qui Quer investigagdo cientfiea. Para chegar a uma verdade nova, que contribua para a eeranro da ciéncia, o investigador precisa arviscar, perguntar, transgredir 0 que Ja esté dado como certo, como logicamente possive ‘So pazeamos pelo plano dos cientistas, pequena parcelads humanidade, pa- ra todos oe outros seres humanos, 0 fenSmeno é 0 mesmo. Um adulto equitibra- ‘Go. que seja capaz de resolver satisfatoriamente of problemas que a vida lhe A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINO DA ARTE... 3 presenta, necessita nio apenas do pensamento I6gico, mas também da intuigSo da imaginagho? Regina Machado nos dé, no texto acima, as razbes posticas ¢ cognitivas da arte na educagdo do adolescente, ¢ quero lembrar também que nao menos importantes so as razbes catérticas © emocionais que incluem a satide mental ¢ o desenvolvimento do processo criador. ‘Como estas justificativas da arte na educagao tém sido exaus- tivamente defendidas pelos arte-cducadores, prefiro me referir As razbes pragmaticas da arte na escola para os adolescentes € pré- adolescentes. ‘A adolescéncia € 0 momento de se testar pré-profissional- mente, € quando 0 jovem comeca a se interrogar que carreira se- guir ou, mais imediatisticamente, que vestibular fazer. Mais de 25% das profissdes neste pals esto ligadas direta ou indiretamente as artes, e, scu melhor desempenho depende do conhecimento de arte que o individuo tem. O contato com a arte € essencial para vérias profissdes ligadas a propaganda, as edito- ras, pa publicagéo de livros e revistas, A inddstria dos discos ¢ fitas cassetes. Ndo conheco nenhum bom designer de publicidade. que desconheca a produgéo contemporanea das artes plasticas, como do conheco nenhum bom programador visual de editora que nio ‘conhega a produgao gréfica da Bauhaus, nem bons profissionais que trabalham cm gravadoras que nfo conhegam misica para melhor julgar a qualidade do som que esto gravando. ¥ na televisio? Todos os trabalhadores de TV, desde os pro- dutores até 0 camera man, seriam melhores se conhecessem arte, porque estariam melhor preparados para julgar a qualidade ¢ a Propriedade das imagens. J4 ha uma pesquisa nos Estados Uni- Gos mostrando que 0s camera men que tiveram cursos de apre- Giagdo artistica sio mais eficientes, escolhem melhor os enqua- Gramentos, dominam melhor a imagem que jogam em nossas ca- sas. Pensemos também na indGstria téxtil, que desde a textura A padronagem, se enriqueceria com profissionais que conhecessem Erte, O desenho de nossas cadeiras, em geral to ruim, seria bem melhorado se aqueles que 0 fazem conhecessem arte. ‘Quando falo de conhecer arte falo de um conhecimento que nas artes visuais se organiza inter-relacionando 0 fazer artistico, a 2, Regina Machado, “AHC ED ASAC: uma Reflexio sobre a Funcio da “Aste no Magistério”, 1988, texto manuscrito 32 AIMAGEM NO ENSINO DA ARTE apreciagao da arte ¢ a historia da arte, Nenhuma das trés dreas sozinha corresponde a epistemologia da arte. (O conhecimento em artes se dé na intersecdo da experimen- tagfo, da decodificagao ¢ da informagao. "Arte-educago € uma certa epistemologia da arte como pres- suposto € como meio so os modos de inier-relacionamento entre arte ¢ 0 piblico, ou melhor, a intermediagao entre o objeto de arte © 0 apreciador. Nem a arte-cducagdo ‘como investigagéo dos modos pelos quais se aprende arte, nem a arte-educagao como facilitadora en- tre a arte ¢ pSblico podem prescindir da inter-relagao entre hist6- ria da arte, Ieitura da obra de arte ¢ fazer artistico. 'S6 um fazer consciente ¢ informado torna possfvel a aprendi- zagem em arte. ‘Sabemos que a arte na escola nfo tem como objetivo formar artistas, como a matemética nao tem como objetivo formar ma- tematicos, embora artistas, mateméticos ¢ escritores devam ser igualmente benvindos numa sociedade desenvolvida. (© que a arte na escola principalmente pretende é formar 0 conhecedor, fruidor, decodificador da obra de arte. Uma socie- dade s6 € artisticamente desenvolvida quando ao lado de uma producio artistica de alta qualidade h4 também uma alta capaci dade de entendiménto desta produgao pelo pablico. Desenvolvimento cultural que é a alta aspiragdo de uma so- cicdade 86 existe com desenvolvimento artistico neste duplo sen- tido. & paradoxal que ao mesmo tempo em que a sociedade mo- derna coloca na hierarquia cultural a arte como uma das mais al- tas realizages do ser humano, construindo “verdadeiros palécios que chamamos muscus para expor o¢ frutos da produso artistica € construindo salas de concerto para atingir as mais altas expe- riéncias estéticas a que podemos chegar através da musica”, des- preza a arte na escola. ‘Reconhecemos que a arte representa a apoteose cultural de uma sociedade, mas reservamos um espago bem pequeno para ela na escola. Por qué? Lembra Elliot Bisner que os resultados da negligéncia da ar- 3, Elliot W. Bisner, “Why Art in Education and Why Art Education”, in Beyon Creating: the Place for An in America’s Schools, USA, J. Paul Getty Trust, 1985, p. 5. A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINO DA ARTE... 33 te na escola so claros. “Sé uma pequena porcentagem de nossa populacio visita nossos muscus ou assiste a concertos”. $6 uma pequena minoria € capaz de apreciar ¢ usufruir da experiéncia estética apresentada nestes espagos, mas através de impostos, um némero muito maior de pessoas paga pelas reali- zagées artisticas. Contudo, aos cédigos da arte erudita tem acesso apenas uma pequena elite. ‘A escola scria a instituigao ptiblica que pode tornar 0 acesso A arte possivel para’ a vasta maioria dos estudantes em nossa nagio. Isto ndo s6 € desejavel mas essencialmente civilizatorio, porque o prazer da arte € a principal fonte de continuidade hist6- Tica, orgulho ¢ senso de unidade para uma cidade, nagéo ou império, disse Stuart Hampshire alguma vez em algum de seus escritos. ‘Sem conhecimento de arte € hist6ria nao € possivel a‘cons- ciéncia de identidade nacional. A escola seria o lugar em que se poderia exercer o prinefpio democratico de acesso & informagio ¢ formagio estética de todas as classes sociais, propiciando-se na multiculturalidade brasileira uma aproximacao de cédigos cultu- rais de diferentes grupos. © que temos, entretanto, é 0 apartheid cultural. Para 0 povo, © candomblé, o carnaval, o bumba-meu-boi ¢ a sonegagao de c6- digos eruditos de arte que presidem o gosto da classe dominante que, por ser dominante, tem possibilidade de ser mais abrangente ¢ também domina os cédigos da cultura popular. Basta ver o ni- mero de teses que se escrevem na universidade sobre cultura ¢ arte popular, ¢ ainda a clite econémica ¢ cultural desfilando nas escolas de samba no carnaval. ‘AS magsas tém direito a sua propria cultura ¢ também a cul- tura da elite, da mesma maneira que a clite j4 se apropriou da cultura da massa, embora quasc sempre “huspedada nv Hilton Hotel”. © canal de realizagio estética € incrente A natureza humana endo conhece diferengas sociais. Pesquisadores j4 mostraram que ‘© ser humano busca a solugao de problemas através de dois com- portamentos basicos: o pragmético ¢ o estético, isto é buscam so- lugdes que sejam mais préticas, mais ficcis, mais exeqtifveis, porém, ao mesmo tempo, mais agradaveis, que lhe déem maior prazer. Por isso, a0 viajarmos pelo interior do Brasil, nos deparamos As vezes com casas muito pobres, de taipa cobertas de palha de 4, Idem, ibidem. 36 A IMAGEM NO ENSINO DA ARTE, coqueiro, mas ao redor alguém plantou um jardim organizando as cores das flores de maneira a lhe dar um prazer que vai trazer um pouco de qualidade de vida a miséria. ‘Dentro de uma destas casas podemos até encontrar um jarro de flores de plastico, que foi posto ali também para dar prazer ou qualidade de vida. A flor de plastico pode no ser prazer estético Para mim e para meu padrio de valor cultural, mas 0 € para os Gonos daquela casa que também podem ter uma reprodugéo da ‘Santa Ceia de Leonardo da Vinci na parede. (© intercruzamento de padrées estéticos ¢ 0 discernimento de valores devia ser 0 principio dialético a presidir os contetidos dos curriculos na escola, através da magia do fazer, da leitura deste fazer ¢ dos fazeres de artistas populares ¢ eruditos, ¢ da contex- tualizagdo destes artistas no seu tempo ¢ no seu espace. A METODOLOGIA TRIANGULAR: HISTORIA DA ARTE, LEITURA DA OBRA DE ARTE E FAZER ARTISTICO. No Brasil tem dominado no ensino das artes plésticas o tra- balho de atelier, isto é, 0 fazer arte. Este fazer € insubstituivel para a aprendizagem da arte ¢ para © desenvolvimento do pensamento/linguagem presentacional, uma forma diferente do pensamento/linguagem discursivo, que caracteriza as dreas nas quais domina 0 discurso verbal, € também diferente do pensamento cientifico presidido pela légica. (© pensamento presentacional das artes plésticas capta e pro- cessa a informagao através da imagem. ‘A producdo de arte faz a crianca pensar inteligentemente acerea da criagao de imageus visuais, mas somente a produgio ado é suficiente para a leitura e 0 julgamento de qualidade das imagens produzidas por artistas ou do mundo cotidiano que nos cerca. Este mundo cotidiano esté cada vez mais sendo dominado pela imagem, H4 uma pesquisa na Franga mostrando que 82% da fossa aprendizagem informal se faz através da imagem a 55% desta aprendizagem ¢ feita inconscientemente. ‘Temos que alfabetizar para a leitura da imagem. Através da leitura das obras de artes plasticas estaremos preparando a crian- a para a decodificagéo da gramética visual, da imagem fixa e, através da leitura do cinema e da televiséo, a prepararemos para aprender a gramética da imagem em movimento. Esta decodificagéo precisa ser associada ao julgamento da A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINO DA ARTS. 35 qualidade do que esta sendo visto aqui e agora ¢ em relagéo ao passado. ‘Preparando-se para o entendimento das artes visuais se pre- para a crianga para o entendimento da imagem quer scja arte ou "Um curriculo que interligasse o fazer artistico, a bist6ria da / arte ¢ a andlise da obra de arte estaria se organizando de mancira que a crianga, suas necessidades, seus interesses © seu desenvol- vimento estariam sendo respeitados ©, 20 mesmo tempo, estaria sendo respeitada a matéria a ser aprendida, seus valores, sua cs- trutura e sua contribuicdo especifica para a cultura. ‘Teremos assim equilibrio entre as duas teorias curriculares dominantes: a que centra na crianca os contetidos © a que consi- dera as disciplinas autOnomas com uma integridade intelectual a ser preservada. ‘Este equilibrio curricular comegou a ser defendido na Ingla- terra pelo “Basic Design Movement” ainda nos anos cingjienta. Em um congresso, no Bretton Hall em 1956, sobre a Ex- pressio do Adolescente na Arte ¢ no Artesanato, duas correntes comegaram a se degladiar. De um lado, o grupo que passou a ser chamado de romantico, liderado por Barclay Russel ¢ os discfpu- los de Marion Richardson, defendiam a intuigéo como origem de toda expressiio € rejeitavam a idéia de processos logics € cons- cientes tomando parte do processo de criacao em arte. Este grupo falava em termos misticos do trabalho de seus alunos, dizendo como Veronica Zabel que a beleza destes traba- Thos “permancce misteriosa c além de qualquer explicagao”*. ‘De outro lado, 0 grupo liderado por Harry Thutron, do qual participavam Tom Hudson, Maurice de Suasmarez, Victor Pas- more € posteriormente Richard Hamilton, comegou neste con- grecso a defender o desenvolvimento do profissionalismo na esco- la e a idéia de que os adolescentes necessitam informagées ¢ ba- ses racionais sobre as quais se dé o desenvolvimento, Maurice de Suasmarez chegou a dizer que a atitude denegridora da inteligén- cia estava tendo conseqiiéncias danosas para a arte-educacdo acrescentando: Free expression had played a vital role in fostering creativiey in the primary school, but all agred that at the adolescent and adult stages, a more objective and rational approach was necessai 55, Richard Yeomans, “Basic Design and the Pedagogy of Richard Hamil ton”, Jounal of Art and Design Education, volume 7, n° 2, p- 155 Londres, 1988, 6. Ider, p. 156. 36 A IMAGEM NO ENSINO DA ARTE Richard Hamilton desenvolveu esta abordagem, acusada de racionalismo, associando ao fazer artistico, os ensinamentos dos prinefpios do design, as informagées cientificas sobre 0 ver € 0 pensar ca ajuda da tecnologia. ‘Sous alunos estudavam a gramética visual, sua sintaxe © seu vocabuldrio, dominando elementos formais como ponto, linha, forma, espaco positivo © negativo, divisdo de area, cor, percepgio c ilusdo, signo ¢ simulago, tranformacio € projecdo, ¢ ndo s6.na imagem produzida por artistas, mas também na imagem da pro- paganda, como na embalagem de suco de laranja, eram assunto de suas aulas. Nos anos sessenta, Richard Hamilton, com a ajuda de artistas professores como Richard Smith, Joe Tilson e Eduardo Paolozzi’, em Neweastle University, lancava as bases teérico-praticas do que hoje os americanos denominam DBAE, isto , Disciplined-Ba- sed-Art Education, a bandeira educacional do competente traba- tho desenvolvido pelo Getty Center of Education in the Arts. Pre- cursor do DBAE foi também o trabalho desenvolvido nas “Es- cuelas al Aire Libre”, no México, depois da revolugao de 1910. ‘Aquelas escolas seguiam a orientagdo de Best Maugard que pre- tendia, através do ensino da arte, levar a uma leitura dos padrdes estéticos da arte mexicana que aliada a historia destes padres € ao fazer artistico recuperariam a consciéncia cultural e politica do povo. Buscava-se, com 0 desenvolvimento do fazer artistico, a lei- tura da arte nacional e sua hist6ria, a solidificacdo da consciéncia da cidadania do povo. Enfim, as Escuclas al Aire Libre geraram 0 movimento muralista mexicano e podemos consideré-las portanto ‘© movimento de arte-cducacéo mais bem-sucedido da América Latina, © que € admiravel no trabalho do Getty Center for Educa- tional in the Arts no € a novidade da proposta, mas a tenacidade com que este centro esté preparando os professores de arte em todos os Estados Unidos, ¢ até no Canad4, para um ensino que inclua produgso de arte, hist6ria da arte, critica ¢ estética. Para Elliot Eisner que junto com Brent Wilson ¢ Ralph Smi- th forma o team dos arte-educadores mais conhecidos da Getty ‘Trust, esta metodologia do ensino da arte corresponde “as quatro mais importantes coisas que as pessoas fazem com a arte, Blas a produzem, clas a véem, elas procuram entender seu lugar na cul- 7. Kem, p. 170. A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINODA ARTE... 37 tura através do tempo, clas fazem julgamento acerca de sua qua- lidade”*. Para cle o trabalho prético de esttdio ajuda a aprender como criar imagens que tenham poder expressivo, cocréncia, insight © ingenuidade. A critica de arte desenvolve a habilidade de ver © ndo apenas olhar as qualidades que constituem o mundo visual, um mundo que inclui ¢ excede as obras de arte. ‘A histéria da arte ajuda as criangas a entender algo do lugar © tempo nos quais as obras de arte so situadas. Nenhuma forma de arte existe no vacuo: parte do significado de qualquer obra de- pende do entendimento de seu contexto. “A estética esclarece as bases te6ricas para julgar a qualidade do que € visto”®. Nos Estados Unidos estas 4reas que compéem o conheci- mento da arte estéo sendo aprendidas de forma integrada ou se- paradamente. ‘Acredito que a separacao das dreas vai levar rapidamente a um retorno ao academicismo ¢ teremos escolas onde se ensinaré somente historia da arte ¢ talvez algo que se aproxima mais ao que criticamente chamamos de “historia do slide”. A grande conquista do DBAE ¢ a simultaneidade de diversas formas de pensar num mesmo ato de conhecimento. ‘A metodologia de ensino da arte usada no Museu de Arte Contemporanea da Universidade de Sao Paulo integra a historia da arte, 0 fazer artistico, e a leitura da obra de arte. Esta leitura/ envolve andlise critica da materialidade da obra ¢ principios esté-| ticos ou semiolégicos, ou gestalticos ou iconogréficos. ‘A metodologia de andlise é de escolha do professor, o impor- tante é que obras de arte sejam analisadas para que se aprenda a ler a imagem e avalié-la; esta leitura € enriquecida pela infor- macio hist6rica ¢ ambas partem ou desembocam no fazer artist As operagées acima referidas se integram na busca de signifi- cages e 0 limite entre a hist6ria da arte ¢ a leitura da obra é mui- to ténue. Nao adotamos um critério de historia da arte objetivo ¢ cien- tifizante que seja apenas prescritivo, eliminando a subjetividade, Sabemos que em hist6ria da arte € importante conhecer as carac- teristicas das classificagées de estilo, a relagdo de uma forma de 8, Elliot W. Eisner, “Structure and Magic in Disciplined Based Art Educa- tion”, Journal of Art and Design Education, volume 7, 8° 2, p. 189, Londres, 1988. 9. Idem, ibitem. 38 AIMAGEM NO ENSINO DA ARTE expresso com as caracterfsticas sociais e com a psicologia social da época, mas analisar as caracterfsticas formais do objeto no seu habitat de origem n&o pode ser o escopo maximo da historia da arte, Cada geragdo tem direito de olhar ¢ interpretar a historia de uma maneira propria, dando um significado & historia que nao tem significagdo em si mesma. A esta idéia de Popper podemos juntar Benedetto Croce que dizia: “toda Hist6ria verdadeira ¢ }istéria Contemporanea” © Ortega y Gasset com sua frase dramatica “o passado sou eu”. "A reconstrugao do passado € apenas um dado ¢ ndo tem um fim em si mesma, especialmente no que se refere a histéria da ar- te. Na hist6ria da arte 0 objeto do passado esté aqui hoje. Po- demos ter experiéncia direta com a fonte de informacio, o objeto. ‘Portanto, é de fundamental importdncia entender 0 objeto. A cognigdo em arte emerge do cnvolvimento existencial total do ‘aluno, Nao se pode impor um corpo de informagSes emotivamen- te neutral. ‘Em palestra que assisti de Arnaud Reid, pouco tempo antes de sua morte, ele dizia que 0 caminho do conhecimento da arte se jnicia na intuigo estética imediata do objeto, uma espécie de duminagéo de interesse até a extrema acuidade, conseqiiéncia do ver, ler, fazer again and again. Por isso, a hist6ria da arte ndo pode estar separada daquilo que chamavamos antes do DBAE, “apreciagao da obra”. O termo Sapreciagdo artistica” caiu de moda mas esta prética foi to do- minante nos anos sessenta que os historiadores da arte comega- ram aver sua rea ameacada. Quentin Bell chegou a ser explicito dizendo: |A historia da arte € frequentemente confunuida com a apreciagto da arte que conriste numa espécie de exortaglo estética: deve-te dizer ao estudante SNE Sam's o que € mau e a histéria transforma-se numa expécie de apologia do bom (© que Bell estava criticando em 1976 era jé um desvio mani- quetsta da apreciagao artistica que néo poderia substituir mesmo historia da arte, uma vez que para dominar a hist6ria temos, as Vezes, que entender, ver ¢ analisar muita obra de qualidade duvi- dosa, como € 0 caso dos retratos do século XVIIT, essenciais para se conhecer a pintura inglesa daquela época. 10, Quentin Bell, Critical Inquire, Spring, 1976, pp. 406-407, A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINO DA ARTE... 39 William Hare'’, dois anos antes do texto de Quentin Bell, es- creveu um artigo iluminador do sentido da apreciagSo artistis ‘Comegava 0 artigo procurando distinguir os sentidos, em lin- guagem cotidiana, da palavra “apreciacao”. ‘Lembrava elé que o mais comum, embutido na frase: “Eu apreciei o que voce fez por mim”, é 0 de gratidao, seguindo-se 0 de admiracdo, encontrado na frase: “Ele deu uma olhada aprecia- tiva para a garota”. Outro sentido com que usamos a palavra apreciagdo € o de entendimento. Em: “Eu apreciei seus argumen- tos”, alguém analisou e entendew os argumentos de outro. Nao sio diferentes significados mas diferentes implicagdes ou significagses. "As diferengas esto relacionadas com a espécie de estimacao feita, Eu posso admirar seu argumento sem ser grato a voc® por ele, Eu posso nao admirar o argumento € ser grato a voct por cle. Eu posso ndo admirar o argumento porque 0 estimei como trivial E mais dificil separar admiragdo de cntendimento. Admi ragio pressupde entendimento, entretanto podemos admirar Einstein sem entender sua teoria da relatividade porque enten- demos sua significado para o mundo, para as conquistas moder- nas. Admiraco pressupée entendimento, gratiddo pressupde es- tima, portanto admiracao ¢ entendimento. ‘De acordo com diferentes implicacdes, nos impomos diferen- tes espécies de avaliacao, mas a estima do valor capta o significa- do essencial do que se pretendia com a apreciagdo estética dos ‘anos sessenta. De acordo com este sentido, para entender a hist6- tia da arte do século XVIII na Inglaterra era importante fazer uma estimativa do valor cultural dos retratistas daquela época, era importante “apreciar” os retratos que abundaram naquele periode histérico, embora ndo gostdssemos deles, embora nao se- jam esteticamente bons. ‘A apreciagao artistica no pretendia substituir a historia da arte, como disse Bell, mas complementé-la. Entretanto, a critica de Bell se justifica porque, na pratica da sala-de aula, apreciacao artistica passou a ter 0 sentido de enjoyment, de gozo apenas. "Aquela idéia de apreciagéo, como a possibilidade de ler, an: lisar e até reconhecer a obra como um bom exemplo de um estilo fou técnica embora nio goste dela, passou a se chamar, critical snudles, antes de ser dividida em estética ¢ critica, como o fizeram 08 te6ricos da Getty Foundation através do DBAE. 11, William Hare, “Appreciation as a God of Aesthetic Education”, The Journat of Aesthetic Education, Ulinois, volume 8, n® 2, Abril 1974, pp, 6-7. 40 AIMAGEM NO ENSINO DA ARTE Dois congressos, ambos na Inglaterra, foram importantes pa- ra determinar a importancia dos estudos criticos da arte (critical studies), a0 lado do fazer artistico ¢ da hist6ria da arte nas estru- turas de ensino da arte. Trata-se do congresso sobre “Art History, Criticism and The Teacher”, na Universidade de Manchester, em outubro de 1972, € de outro sobre “Filosofia ¢ o Ensino das Artes”, organizado pela segio de Filosofia da Associacéo de Professores em Escolas ¢ Departamentos de Educagio no Madely College of Education, em jutho de 1973. Em ambos os congressos se reforgou a idéia de que “‘o estu- do da arte contemporanea, da arte do passado, do trabalho de so- cidlogos, filésofos, psiclogos ete. ¢ as atividades dos estudantes de arte hoje néo podem ser éreas de estudos mutuamente exclu- ‘Um problema real se colocou para os participantes destas conferéncias: o fato de que teoria € histéria da arte tinham se tornado, por seu papel descritivo e speculative e sua preocu- pacdo em fazer julgamentos estéticos objetivos, numa fungao a posteriori. Apresentavam aos jovens artistas um conjunto de re- gras € 0 jogo artistico mudava, mas as regras continuavam imuta- veis. Por outro lado, o fazer artistico contempordneo, que no tem “produto final”, veio provocar uma crise da teoria e da hist6ria. Fazer julgamentos objetivos de qué? Esta abordagem da contemporaneidade acerca do fazer artis- tico obrigou a historia a refazer alguns dos critérios com os quais julgava obras anteriores. © niilismo da era p6s-Duchamp exigia outra forma de inter- relacionamento teoria-pratica-hist6ria apontando para a simulta- ucidade do julgamento © ndo para a scqiiéncia classificatéria que | era possivel apenas depois do objeto artistico terminado. “Um entendimento critico de como conceitos visuais e for- mais apareceram na arte, como eles tém sido percebidos, redefi- nidos, redesenhados, distorcidos, descartados, reapropriados, re- formulados, justificados ¢ criticados em seu processo formati- vo", necessita da contribuigdo simultnea da hist6ria e de teorias da arte que iluminem a leitura da obra de arte assim como de 12. Adier Mortimes, “What Sort of Art ‘n° 2, Cambridge, March 1974 13, David Thistlewood, “Critical Studies, the Muscum of Contemporary ‘Ast and Social Relevance", manuscrito. istory?”, The New Era, volume 55, A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINO DA ARTE, an uma prética problematizadora. A prética sozinha tem se mostra- do impotente para formar o apreciador € fruidor da arte. Nos Estados Unidos, 0 ensino livre expressivo da arte existe nas escolas pablicas, portanto para todas as classes sociais, desde 0s anos trinta, nem por isso os americanos séo apreciadores mais argutos da arte. Pelo contrério, a livre expresso, sem desenvol- vimento da capacidade critica para avaliar a producao, tem for- mado nos Estados Unidos um consumidor dvido € acritico de imagens. ‘A auséncia de contato com padrées avaliatives da arte, através da sua hist6ria, impede que aquele que apenas realiza sua catarse emocional através da arte seja capaz de ser um consumi- dor critico da arte néo s6 de agora mas da arte do futuro também. © conhecimento do relativismo dos padrées avaliativos através do tempo flexibiliza o individuo para criar padres apro- priados para avaliar 0 novo, o que ele ainda nfo conhece. Os de- fensores da arte na escola para a liberacdo das emog6es devem Iembrar que as emogdes podem se revelar cm miltiplas ex- pressOes catérticas ¢ reativas, mas pouco aprendemos de nossas emogées se no somos levados a refletir acerca de nossas pr6- prias respostas. © subjetivo, a vida interior, a vida emocional deve navegar mas no ao acaso. Se a arte no é tratada como forma de conhecimento mas como “um grito da alma” nao estamos fazendo nem educagao cognitiva nem educagdo emocional. ‘Lembro Wordsworth que disse: “As artes tm que ver com as emogdes mas ndo téo profundamente para levar as lagrimas”. Por outro fado, € bom lembrar que o desenvolvimento da ca- pacidade criadora, tio caro aos defensores do que sc convencio- nou chamar de livre expresso no ensino da arte, isto €, aos cul- tuadores do deixar fazer, também sc dé no ato do entendimento, da compreensao, da decodificacao das miltiplas significagées de uma obra de arte. Flexibilidade, fluéncia, elaboracao, todos estes processos mentais envolvidos na criatividade séo mobilizados no ato de de- codificagao da obra de arte. Alids as proprias teorias da criatividade, ainda nos anos ses- senta, defendiam a necessidade do desenvolvimento da capacida- de criadora, propondo que 0 objeto criado fosse analisado em funcdo de critérios bem definidos. Samuel Messick Philip Jack- son, por exemplo, propunham que diante do objeto inquirissi * 2 |AIMAGEM NO ENSINO DA ARTE se ele representava uma resposta estética: surpresa, satisfagéo, ¢s- timulag&o € saboreo. ‘Qual 0 grau de surpresa que a obra provoca? Por qué? Esta pergunta verificaria 0 grau de originalidade, de inusualidade do objeto frente as normas conhecidas. (© choque de reconhecimento climina a possibilidade da ob- viedade do objeto e afirma o seu poder de allerar a mancira con- vencional do observador ver ¢ pensar as coisas. ‘Jé a pergunta pela espécie de satisfac que a obra dé, apon- ta para a verificacdo de onde ¢ de como ela responde ao contexto, Sendo apropriada a sensibilidade do tempo € espago em que esta sendo examinada. ‘Surpresa ¢ satisfagio so critérios aparentemente opostos que se imbricam dialeticamente. Enquanto a surpresa demonstra a inusualidade do objeto © exige que 0 observador assimile 0 objeto para fazé-lo parte de seu mundo cognoscivel, a satisfago do objeto demonstra a ade- ‘gquacdo ao mundo conhecido do observador, obrigando-o a tomar Consciéncia deste mundo. O critério de estimulaso transforma- Gora instiga a pergunta: esta obra muda alguma coisa na forma de representar 0 que cla pretende representar? Esta obra muda algo em mim? Esta obra muda algum conceito de arte? Esta obra Opera alguma mudanga na arte hoje? Qual a mudanga que cla significa para a arte de outros tempos ou para a arte em diversos outros tempos? Por Gitimo, temos 0 critério mais inusual: a idéia de que a obra de arte deve ser saboreada, que requer para isto uma con- Centragéo de significados que advém de sua complexidade. A bra para ter qualidade estética deve ter o poder de sumarizar mnéltiplos significados, Daf se conclui que uma obra de significado {inico, evidentemente percebido a primeira olhada ndo tem a qua- lidade estética de saboreo para o espectador. le a deglute de imediato. Um exemplo desta evidéncia de significado € a mao espalmada de Oscar Niemayer no Memorial da América Latina da qual escorre sangue formando uma poga $m vermelho na base do punho. A obviedade de significado a Constitui num statement © ndo numa obra de arte, enquanto a Guemica de Picasso, embora tenha um enunciado evidente, a Gestruigéo da cidade de Guernica durante a guerra civil espanho- a, possui um intrincado de relagées formais que propdem miilti- plos e particulares significados, individualizaveis de acordo com 0 observador. (© saboreo advém do poder de sumarizar da obra, da sua A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINO DA ARTE.. ° condensagéo que implica a possibilidade do observador exer Sua capacidade de criar maltiplas interpretagoes. ‘Nos anos sessenta, os arte-educadores que trabalhavam com desenvolvimento da criatividade j4 exercitavam a capacidade das Griaugas ¢ adultos analisarem seu proprio trabalho ¢ o trabalho Ge artistas bascados nestes critérios, dando muita énfase a explo- de ragdo dos muitos significados provaveis que a condensas: uma obra tornasse possiveis. "No campo da teoria da arte-educagao a idéia da educa ‘estética-ao lado da educagio artistica, isto €, 0 conhecimento € o Salor da obra de arte ao lado do fazer artistico, foi muito divulga- da nos escritos da Ralph Smith, Vincent Lanier, Kenneth Maran- tze Elliot Eisner. Mas foi s6 nos anos setenta que a alfabetizac Vieual estética chegou aos livros de orientagao didatica para os professores. Muitos refletiam a influéncia da orientagéo que era Rida em museus como a MOMA ¢ 0 Cleveland Museum. Os mu- Seus de arte moderna foram pionciros da arte-educago pés-mo- Gerna que enfatiza a leitura da obra de arte e até permite que a crianga faca releituras grAficas expressivas de obras de arte. METODO COMPARATIVO DE ANALISE DE OBRAS DE ARTE, © primeiro livro amplamente divulgado que estabelecia para o emino a relagdo entre arte como conhecimento, € arte como performace foi de Edmund Feldman, Becoming Human Through Jin: Aesthetic Experience in the School, publicado em 1970. Tratase de uma digestio mais didatica de outro livro do mesmo autor, Art as Image and Idea, nao to difundido. Para Feldman aprender a linguagem da arte impl volver técnica, critica ¢ criago e, portanto, as dimensGes sociais, “Giturais, criativas, psicolégicas, antropolégicas © hist6ricas do bomem. ‘© desenvolvimento critico para a arte € 0 niicleo fundamental da sua teoria, Para ele a capacidade critica se desenvolve através Go ato de ver, associado a principios estéticos, éticos ¢ histéricos, {0 longo de quatro processos, distingufveis mas interligados: pres tar atengao ao que vé, descricdo; observar o comportamento do ca desen. 14, Edmund Burke Feldman, Becoming Human Through Art, New Jersey, Prentice Hall, 1970. I~ 44 AIMAGEM NO ENSINO DA ARTE que se vé, andlise; dar significado a obra de arte, interpretagao; decidir acerca do valor de um objeto de arte: julgamento. Demonstra 0 quanto se pode entender 0 mundo, entendendo uma obra de arte do ponto de vista da relacdo entre os elementos visuais como linha, forma, claro-escuro, cor, unidade, repetigao, equilibrio, proporgao, ¢ do ponto de vista das caracteristicas de construgéo com predominancias diversas como agudeza, orde- nagdo, emocio, fantasia, c também tendo em vista comportamen- tos apreciativos como empatia, distanciamento ou fusdo com a obra de arte. ‘Meu entusiasmo por este livro de Feldman é tao grande que 86 me contentaria com 0 ato de traducdo integral de Becoming Human Through Art, 0 que satisfaria meu desejo de fusdo absolu- ta com a obra. Entretanto editores ainda temem traducdo de livros de arte- edueagio, porque os direitos autorais ¢ a reprodugso das imagens so caras ¢ os arte-educadores léem pouco. E a desculpat Para efeitos didaticos, ouso classificar 0 método de leitura da obra de arte de Feldman como comparativo. Ele nunca propde a Ieitura de uma “nica obra de arte, mas sempre coloca duas ou mais obras para que o estudante tire conclus6es da leitura com- parada de problemas visuais propostos de mancira similar ou di- ferentemente nas varias obras. Por exemplo, para a leitura do espago arquiteténico ¢ deco- rativo, nos faz comparar uma sala projetada por Lucas Samaras com 0s interiores da Hanna House de Frank Lloyd Wright ¢ da Villa Shodan de Le Corbusier, acrescentando ainda um interior de uma casa americana dos fins do século XIX caracteristicamen- te vitoriana. Para mostrar a diferenca entre pintura ¢ desenho, isto 6, a di- ferenga entre construgo por linhas (desenho) ¢ construc por massa (pintura), nos faz comparar 0 Monsieur Boileu at the Café de Henri Toulouse-Lautrec ¢ Broadway de Mark Tobey com Ni- ghtawks de Edward Hopper ¢ Woman I de William de Kooning. ‘A mera visualidade comparativa impée a evidéncia da diferenca dos comportamentos construtivos através de linhas ¢ de massas. Para o estudo da linha, especificamente, Feldman propée a andlise das diferengas ¢ semelhancas entre as linhas onduladas de uma cadeira de balango Thonet © da escultura de Calder The Hostess em contraposi¢éo a angulosidade do quadro de Family Walk de Paul Klee e das linhas agudas do quadro de Jacob Lawrence, Pool Parlor (Figs. 1, 2,3¢ 4). A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINO DA ARTE. 4s Ha sempre uma proposi¢io de trabalho pratico que se segue a leitura dos elementos da obra de arte. © trabalho proposto para ser feito depois da andlise da linha repousa sobre 0 quadro de Jacob Lawrence que transcrevemos*. ‘the para os tacos de bilhar na pintura de Lawrence. Trace-o8 ou copie-os sozinhos numa folha de papel. Agora tente decidir o que eles poderiam significar por eles mesmos. Vocd poderia fazer um poema sobre aquelas linhas sem as pes- soas na figura? ‘Vire seu papel para que as linhas se tomem horizontais. Por que seu signi- ficado mudou? A lei da gravidade poderia ter alguma coisa a ver com isto? Para uma idéia mais clara do método de Feldman vamos transcrever uma de suas aulas, sobre a leitura de imagens de pes- soas. Vejamos a aula na qual cle propée a leitura de obras que representam figuras humanas em duplas (Figs. 5, 6 ¢ 7). As obras colocadas @ frente dos alunos para anélise séo a Madona e Crianca de Jacob Epstein, O Banho de Mary Cassat ¢ Um Velho e seu Neto por Ghirlandaio. A conducdo da leitura das obras se faz da seguinte man: ALGUNS PROBLEMAS: Cada um destes trabalhos mostra uma crian ‘com uma pessoa mais velha, Vocé pode adivinhar qual a atitude da pessoa mais velha em relagSo a crianca? A erianga parece saber 0 que a pessoa mais velha ‘estd pensando? Quantos anos vocé acha que estas criangas tém? Como voc? po- Ge dizer? O que o artista ext nor tentando dizer através de sua utilizagio de ‘contraste entre a velhice e a juventude? "ALGUMAS POSSIBILIDADES: Voct acha que a mfe na excultura de Epstein esté argulhosa de seu filho? Por qué? A mulher esté gostanto de dar ba- rho no seu bebé na pintura de Cassat? Como voc# pode dizer? Na pintura de Ghirlandaio, a crianga acha que seu avd ¢ feio? O que faz voce acreditar que ndo fou que sim? Além de retratar individuos, cada artista aqui esté retratando um re~ Incionamento. ‘Tente descobrir coma um selacionamento pode cer evpenceadn sem a uiilizagio de palavras. Por exemplo, se duas pessoas caminham para den- fro de uma sala sem dizer coisa alguma, nés podemos dizer se cles 40 irmfo irmé, namorado © namorada, patrio ¢ empregado, estranhos ou amigos? O que nos ajuda a reconhecer af relagbes entre cles? Como os atores utilizam seus cor- pos para demonstrar relacionamento? Ouga Pedro ¢ 0 Lobo de Prokofiev. Como ‘© compositor utilizou o som para descrever 0 menino, © homem ¢ 0 av6? Como ‘or artistas utilizam formas para representar a infancia, juventude ou velhice? ‘0 QUE VOCE PODE FAZER?: Rena um catdlogo de formas indefinidas de tamanhos equivalentes em seis fothas de papel e faca uma forma diferente em cada uma, Da um ndmero para cada folha. Entio pega aos membros de sua clas ‘se para assinalar se cada forma é jovem ou velha. Junte as respostas € veja se existe alguma concordancia, Como voct explica isso? + Tradust ++ Tradugdo de Sofia Fan, de Sofia F VE Fig, 3. THONET, Gebruder Rocking Chair, s.8. Col. The Mu- tum of Modern Art. His, 1 CALDER, Alexander. ts- lalsifia (Penatlvinia), UA, 1898 “Nova York, EUA, 1976. The Hostess, 2.8. Col, The Museum of Modern Art LEE, Paul. Munchenbuehsee, Sufca, 1879 — Muralto (Locarno), Subs. Fig. 2. 1980, Family Walk, 1930. Fig. 4, LAWRENCE, Jecob Ar- matead, Atlantic City'(Nova Jer Sey), EUA, 1917. Pool Parlor, 1983, Col, Mewopolitan Museum oar. Gol, The Riversid Church. Fig. 7. GHIRLANDAJO, Domenico di Tommaso Bigordi. Floreag, Inia, Lig-1694, An OL! Man dud his Gradson (Um Velho e seu Nero), 8, Col, Musée au Louvre, Fig. 6. CASSAT, Mary. Pitts- burg, BUA, 1845 — Le Mesnil ‘Art Institute of Chicago. 30 AIMAGEM NO ENSINO DA ARTE —— a altima rte ms rp es me ae ean ai on ee oft ee a eee sates Teme tn se arse he 6S me sormieen sane tect Oana cureea Can sae rarest ae Snreneenconeen fee os en ae att cera aes geno te mos ptt commen ceeen giana eg Pome pon ie ier Sia a tse Sowa oon les a a vik ft em en oman tent cs ism iene i re earn et root cop ea pas at ess pee gc Seen ot Fc osu ms cera see tah mages fon tg et ena Soil are eee ee ele. aa Acredito que estas aulas ilustram muito bem a preocupagao a ee era eee Seer aman ae eee escolas norte-americanas. METODO DE MULTIPROPOSITO Trata-se da série Teaching Through Art de Robert Saunders. Consttuise de tres livros para o professor acompanhados de uma série de excelentes reprodugées de obras de arte em pintura ¢ de- senho. intareed © autor considera os slides um recurso 2 menos poderoso que a boa reprodugao em papel. A homogeneizacdo das dimensées de todas as obras operadas pelos slides que devem ser vistos de luz apagada diminuindo a intensidade da relacdo professor/aluno sao seus argumentos para preferir as reprodugées, o mais proximo possivel ao tamanho a textura das obras originais. Saunders foi aluno de Viktor Lowenfeld, que orientou scu doutoramento. __ So dele préprio as palavras que definem seu método, deno- minado Abordagem Multipropésito: [A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINO DA ARTE... st Este programa é desenhado para orientar no uso de reprogusdes como ins: struments de dasino que vise # educagio estética da crianga, a percepsio visual, & crarmsade cepacia a simbologia visual c verbel, as mudancas hist6ricar © 2 auto- Identifieagio¥. Justifica seu método dizendo: 1Nés estamos mudando da cultura verbalmente orientada para uma cultura visualmente orientada!®, ‘Televisio, mactuhanismo, acvidade visual, o reconhecimento da aprendiza- ‘gem censbrio perceptual e of cstudos sobre of processos mentais da criatividade were tendo seus efeitos ha adaptagho 40s nossos programas escolares as mudan- saeco caste XX e As necessidades futuras das criancas de hoje que viverso além Se 2001. Explica a abordagem do Multiproposito dizendo: Entender uma obra de arte vem com repetidos encontros 4 medida que & pesion amadurece ¢ capaz de observé-lo de diferentes pontos de vista. Esta ma- Peduaue perceptive usualmente comeca através de algume forma de contato com weecegugbes mar reeebe qualidade © verificagko através do contato com origi Torna claro que as reprodugées podem ser usadas para dife~ rentes propésitos em diferentes séries. Isto 6, o Vermelho Pesado de Kandinsky pode ser usado a partir da quarta e da quinta séries € daf em diante, em outras séries, nfo havendo nenhum problema em fazer uma crianca analisar a mesma imagem dois anos em se- guida, Se cla amadureccu, a leitura seré diferente de um ano para © outro. ‘Recomenda que para o método ser usado com adultos ¢ inte~ ressante que seja completado com leitura de outras imagens ¢ ob- jetos do meio ambiente construfdo. Acredito que ele deve ser Sempre completado com a leitura arquitetOnica, © do design mesmo com criangas (como 0 faz Eileen Adams). Em scu Livro Série A, Saunders apresenta vinte reprodugées cuja leitura € mais apropriada para as classes de jardim de infan- Gia A sexta série, mas repito, cada uma pode ser aprescntada no- Yamente as mesmas criangas ao longo de scu desenvolvimento. Entre as imagens estéo pinturas das cavernas de Lascaux, da tumba de Nakht no Egito ~, 1425 a.C., mosaico de Ravenna do 415, Robert Saunders, Teaching Though Art, Série A, New York, American Books Company, 1971, p. 1 16, Idem, Série B, p-1. 17. Ider, Série A, p-1. 18, Idem, Série B, p.3. 32 A IMAGEM NO ENSINO DA ARTE, século VI, alguns artistas americanos do século XIX ¢ XX como Edward Hivks (The Comell Farm), Robert Gwatmey (Soft Cra- bling), Joseph Hisch (Circus), John Frederick Peto (The Old Cremona), Samuel Gerry (New England Homestead), que conhe- cemos pouco, além dos mais divulgados como Winslow Homer (The Country School) ¢ Gilbert Stuart (The Skater). Entretanto, as leituras mais interessantes que oferece séo as de obras cu- ropéias internacionalmente conhecidas como a Mona Lisa de Leonardo da Vinci, Passaro na Gaiola de Duly, O Banho de Mary Cassat, Jovem com a Vassoura de Rembrant, Jogos Infantis de Bruegel, A Carta de Bonnard, O Cachorro Latindo para a Lua de Mir6 ¢ 0 Tableau I de Mondrian. Seria importante que informasse em que muscus ou colecdes esto os originais, uma vez que ele proprio reconhece que a leitu- ra de reprodugées € apenas um passo para o contato insubstitui- vel com 08 originais. De todos os livros ¢ manuais que tém sido publicados, € 0 mais organizado pedagogicamente, refletindo enorme influéncia da Taxonomia dos Objetivos Educacionais de Benjamin Bloom. Divide os exercicios a serem feitos com cada reproducdo em qua- tro categori 1, Exerefcio de ver (descrever claramente, identificar acurada- mente ¢ interpretar detalhes visuais). 2. Exerefcio de aprendizagem (compreender as pinturas ou dese- nhos, expressar julgamento de valor, exercitar habilidades de fantasias ¢ imaginagdo, desenvolver conccitos espaciais, desen- ‘ volver o sentido da ordem visual). 3, Extensées da aula (relacionar arte com seu meio ambiente, es- crever criativamente, fazer comparagées histéricas, usar sim- bolos visuais ¢ verbais, investigar os fendmenos de luz ¢ cor. fazer improvisagdes draméticas, explorar relages humanas, tornar-se consciente de problemas ecolégicos). 4, Produzir artisticamente (desenvolver a auto imagem através do desenho, encorajar a atividade criadora grupal, experimentar com 0 espago positivo © negativo, experimentar com représen- tagées em trés dimensées, investigar formas, texturas, cores linhas, exercitar as habilidades para recorte, colagem, modela- gem, desenho, pintura etc., desenvolver a habilidade para lidar com régua, compasso € até lentes de aumento). Tudo isto poder ser explorado segundo 0 autor relacionan- do-se com unidades de estudo de hist6ria da arte mas também com estudos de lingua, literatura, matemética, geometria, ecolo- gia, histéria etc. A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINO DA ARTE... 33 Os livros Série B e Série C apresentam cada um, também, vi te reprodugées de obras que devem ser lidas seguindo orientaco semelhante a descrita no livro Série 4. A Série C destina-se a estudantes a partir da quarta série ¢ 0 livro Série B apresenta reprodugées para serem usadas desde 0 jardim da infancia até a terceira série. Para cada reprodugdo ha nos livros do professor sugestdes para trabalhos ¢ exercicios den- tro das quatro categorias de aprendizagem j4 enunciadas. ‘Uma radical diferenca de discurso decodificador se estabele- ce quando analisamos um quadro isoladamente. A diferenga mais evidente € que a anélise isolada se prende mais aos detalhes re- presentados que a significagao metaf6rica ou metonimica' da re- presentagao. Isto fica claro quando examinamos a leitura de O Banho de Mary Cassat (fig. 6) feita por Saunders ¢ a leitura desta mesma obra em comparacdo com outras obras de outros tempos fcita por Feldman. .. Na andlise da obra isolada a informacao hist6rica fica ver- balmente sobreposta a imagem enquanto na anélise comparativa © olho capta as diferengas hist6ricas, isto 6, a propria andlise vi- sual organiza a informagao hist6rica. No livro Série B, paginas 27 ¢ 29, Robert Saunders analisa 0 Banho de Mary Cassat com os seguintes prop6sitos: levar os alu- 1, Identificar detalhes na pintura. 2. Discutir a atividade doméstica representada na arte. Propéc a extensio da aula para levar os alunos a: 1. Examinar detalhes decorativos em suas casas. 2. Fazer um desenho “Minha mac me ajudando a pentear os ca- belos”. © autor propicia ao professor uma descri¢do detalhada da pintura, uma interpretagdo ¢ informagées hist6ricas acerca da ar- tista que poderao ser usadas pelo professor para ajudar as crian- cas a responderem questdes como estas que ele propoe. 1, Exereicioe de ver Anélize global: O que vocé vé na pintura? Rastreamento analitico: Que espécie de desenhos voe8 vé no tapete, da e na parede? Sfo os mesmos ou diferentes? Como as listas do vestido da mide mudam de posigio de acordo com a diregdo do seu corpo? (© que aconteceré quando cla se lenvantar? Acuidade visual: Qual a ordem de cores nas listas do vestido da mie? 2. Baereicio de aprendizage Como difere este banho do que tomamos usualmente? Voce pensa que esta pintura tem algum sentido por trés de apenas um banho? ¥ 54 AIMAGEM NO ENSINO DA ARTE (Que outras atividades domésticas poderiam dar uma boa pintura ou constituir vuma boa pintura? Entre as propostas de extensio da aula para incentivar 0 ver ¢ 0 fazer arte esto: para a terceira série ~, pedir aos alunos uma lista de objetos decorados que tenham em sua casa ¢ no dia se- guinte trazer a lista com mais alguns que tenham esquecido de mencionar. Fazer observar 0 padréo da roupa de cada um ¢ pedir para descrever os desenhos ¢ padrées das cortinas, paredes ¢ moveis de sua casa € outra proposta. Para o jardim de infancia 0 estimulo seria pedir as criangas que desenhem “Minha mae me ajudando a pentear os cabelos”. Nas sugest6es de procedimento o autor, que foi aluno de Viktor Lowenfeld, segue a linha didatica do mestre recomendan- do ativar 0 conhecimento passivo da crianga em relagéo a expe- rigncia de “‘pentear os cabelos” através de perguntas: (Quem j4 teve problemas para pentear os cabelos? Por qué? ete. Considero que a determinagd6 do tema leva a predominancia do contetido, acredito que as problematizages tematicas mais abertas, como faga um desenho mostrando em que atividade a ajuda de sua mae é mais necesséria, scria indicado porque permi- tiria ao aluno dar forma a uma experiéncia escolhida por cle pro- prio dentro de seu campo de referéncia inter-relacionando forma € contetido de mancira mais dialogica. Por outro lado, as perguntas de Saunders desde a fase de ras- treamento visual j4 conduzem 0 observador a ver uma relagéo mie c filha na representagéo da crianga ¢ da mulher adulta. £ interessante, entretanto, para o leitor ter uma idéia mais clara do Método Multipropésito, transcrever integralmente uma aula baseada na observacdo dos Trés Miisicos de Picasso da Série A, paginas 65 a 67": Trés Mitsicos (fig. 8) — Abrams Antprint 86484 Por Pablo Picasso ~ Espanha 1881°* PROPOSITO PARA SELECAO Esta pintura proporcionard ao aluno a oportunidade para: 1. Analisar colagem e aspectos pict6ricos de uma pintura + Traduglo de Softa Fen. ++ Texto publicado antes da morte de Picasso, ocorrida na Franca em 1973. A IMPORTANCIA DA IMAGEM NO ENSINODA ARTI 35 2, Analisar abstrag6es relacionadas com a figura humana. Betenda a ligio pa 1. Analizar seres humainos ¢ vestudrios por conveng6es abstratas. 2. (quinta e sexta séries) Fazer uma colagem cubista representando uma figura humana. DESCRIGAO wultsneamente no Esta uma das duas pinturas que Pi vero de 1921. "Ambas chamam-se Trér Masicor e medem aproximadamente 1,80 m. Esta intura contém figuras que freqiientemente aparecem na obra de Picasso: 0 arle~ Quim com roupas e motivos de losango (a esquerds, com violino), © pier em raje branco (ao centro com clarinets), © o monge com manto marrom © preto (A direite, com sanfona). Os misicos estdo sentados numa mesa marrom onde est lum livro de miisien com uma escala musical simbolizada. O arlequim descansa seu brago eequerdo na mesa e segura o arco de scu violino. Formas simples tendem as elaboragSes geométricas das figuras centrais através do expago em vol ta delas, As cores sfo aruis suaves, marrons ¢ pretos com contrastes de branco ‘ul pélido ¢ of loeangos vermelhos e amarelos da roupa do arlequim, Os con- fomos de algumas formas e texturas indicam que esta é uma colagem e técnica mista feita com combinagdes de papel cortado ¢ formas ¢ detalhes pintados. Fsta Pintura também chamada, Os Trés Musicos Mascarados, est4 exposta na AE. Gallatin Colletion no Museu de Arte, Filadélfia, Pensilvdnia. INTERPRETAGAO A elaborngio complexa dos Trés Miisicos, 0 uso de formas angvlares ¢ circu tases, a torna uma pintura cubista. Entretanto, nesta época, Pleasso jé estava dé xando a escola Jo Cubismo. Como Gris (Unidade 7B) e Braque, ele nunca traba- Thou com abstragio pur ou formas geométricas nfo objetivas. Eles insistiam em manter alguns vestigios de representagio da figura. © quadro Trés Masicos est Ho primo das formas peométrcas puras, nfo obetvas, quanto fi possvel SOBRE O ARTISTA, Picasso, nascido em 1881, foi 0 artista mais produtivo ¢ mais constante re- volucionério do século XX. Bie progrediv do tratamento clissico e representa- tional dos temas para as abstragSes do cubismo, © do cubismo para as téenicas de colagem mais tarde utllizadas no Dadé, Picasso também usa fortes elementos da fantasia ¢ imaginagao em suas cerdmicas e esculturas. EXERCICIO DE APRENDIZAGEM Exercicios introdutSrios de apreciagSo: of alunos iro descrever e ident car og detaihes visuais em Trés Miisicos para propésito interpretative com relagso

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