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3. Prismas Espaciais: Barthes, Foucault, Lefebvre Nas correntes tedricas humanisticas, a discussao sobre a catego- ria espaco atinge o apogeu, em termos de constituir um polo di- fusor, na Franga do final dos anos de 1960 e principio dos anos de 1970, no contexto que se convencionou denominar estrutu- ralista, Devido a sua repercussao, ainda hoje ativa, trés textos sao elementares para compreender nao apenas os fatores que, em termos gerais, determinam no campo tedrico das huma- nidades a problematica espacial, mas também as divergéncias, as potencialidades e os impasses espectficos daquele contexto. Em sintonia com o pensamento estruturalista, mas cada qual a seu modo, os textos “Semiologie et urbanisme” (Semiolo- gia e Urbanismo), de Roland Barthes, e “Des espaces autres” (Espacos Outros), de Michel Foucault, publicados respectiva- Mente em 1970 e 1984, sao ambos resultantes de conferéncias proferidas em 1967. Na posicao contraria esta La Production de lespace (A Producao do Espago), livro de Henri Lefebvre edi- tado em 1974, em cujo texto introdutério, intitulado “Dessein de fouvrage” (Plano da Obra) e aqui analisado, se formula a critica aos pressupostos estruturalistas. Tais textos constituem tentativas de complexificagéo da abordagem do espago, seja Porque reconhecem a variabilidade do conceito, indicando a raRARIO:TSPAG so F260 sons “ nistéria do MESO, Sa Porgy, algae com a . stodos par Ques, ces eoteeam qe 3 ca nogig Car nt ePsemologi tdo est fe det correspon espaio HISTORIAS DO ESPAGO fo de situar o debate sobre, spagio de situar 0 i Hi nots ee ono, asinlando MOMENtOS sip pago segundo ovis yoda categoria, sendo que, ng «as feativos do desenro fase recai na nogdo especifica de, esp de Roland. Langan distinto 0 modo como as breyg| a cea sio elaboradas. Henri Lefebvre coloca,| ea cet termos dscplinares, ao indicar que a catego Po eu e inicalmente histria do pensamente fie a ciesaté Ka. Avincuaglose desfaz medi sai cada una “inca do espacd dominada pele m were Oeag sd retma 18 fleofos come “cols o| ‘Tupar mental” O objetivo principal de Lefebvre é denunci| “lugar ment i do pensamento estruturalisa sofisma que encontra na base do p rest av as oars descents Os Pressuposto de que instinla meal envolve a sci ser qualquer mediacio, P| alent autor erase para conceber grandes itera sii ~ 8 qs akacam percep, concep e vivid do espao - associados aos mods de produsao social. Sdo men mente condenada por cai lise ee oliferante, que substituia andlise pet. . tyson te rss supostamente complexas, Carine denometolt propoe ums “espéciededescricio sistemas tipos do que denomina *heterotopias Naveisa, ue se veriica €a sugestio de principos pris gore Smasheterotopis; im trabalho mas de nattenah dei que propriamente descritiva, Michel Foucault e Henri Lefebvre se aproximam ea rem a nogio, atribuida 20 senso comum, de que espace imo de vaio, ou de mero continent. Foucaul, conde sipeiona a contribuicio de Gaston Bicheard edo: fname Mglogos ~ 08 quals destacaram que todo espaco¢ carregad de “guslidades que sio como que intrinsecas”~ pas em segue declarara insuficiéncia de tal contribuicio,jé que a dina rex ito somente 20 “espaco de dentro’, e€ na heterogencidade do espaco de fora” que o pensamentofoucautiano deseja con, ‘centrar seu interesse, De fato, Foucault parece querer se desviar das consequén- cias bastante corriqueiras em leituras influenciadas pela obra de Bachelard: um psicologismo de natureza estetizante, um idea. lismo de base arquetipica. Encontram-se ressonancias bache- lardianas mesmo em Barthes, quando sustenta a necessidade de “explorar as imagens profundas dos elementos urbanos"®, ainda que reconheca que os significados de tais elementos sao, historicamente, “extremamente imprecisos, recusiveis e indémitos”, Mas € Lefebvre quem sintetiza as criticas as concepgdes mais difundidas de espaco ao estabelecer dis ipos elementares de “ilusdes”: a ilusio de opacidade, ou realista, que supde haver uma substincia espacial que pode ser pacificamente reconhe- cida em sua materialidade; ailusio de transparéncia, que con- cebe 0 espaco como projecio mental, resultado do movimento das ideias®, Sem duivida Lefebvre inclui na segunda ilusio 0 ta, frequents tsa da propensig ue ee aos ori © risti aceital sind 8 Op.citp.as7s. 7 Ibidem, p.573. 8 Op.citsp. 44s. 9 Tbidem, p.446. 40 CF cits P.36:39- rons pOstACOUTHARO-TENGD"QUESTOCSCONarryag que considers come defnidr do pensamento estruturalista a questi do es pao qe eins Qe fA 08 A0Ts x telecom nos rs textos wma proposicio geral, em seguida des. dobrada em formulagdes particulares. A proposicto de Barthes eek cidade € um discurso, e esse discurso é verdadeiramente tama inguagem’” A partir dai, autor detecta problemas, des, ‘reve os procedimentos habituais empregados na semiclogia {ubana, ao mesmo tempo que procura atualizé-los por meio de tum balango dos debates, entdo recentes, da semiologia geral, ‘A proposigdo de Lefebvre é:“O espago (social) ¢ um produto (Gocial)” Desta decorrem quatro implicagées que dizem res. peitos questbes do espagofisico, dos elementos constituintes do espago social, do saber sobre o espaco ¢ da historia. Para Foucault, i dois tipos de posicionamento que englobam todos (0s outros: as utopias e as heterotopias. Define entio heteroto- pias como “lugares reais” que “sio espécies de contraposiciona- entos, espécies de utopias efetivamente realizadas nas quais ‘0 posicionamentos reais [..] slo a0 mesmo tempo represen. tados, contestados e invertidos’ ou seja, como “lugares que es- to fora de todos os lugares”. Em seguida Foucault apresenta seis principios a partir dos quais se pode realizar a “descricio sistemética” das heterotopia. (Os autores elegem, em suma, seus prismas: para Henti Lefebvre, o espago é concebido como produgio social; para Roland Barthes, como sistema de linguagem; para Michel Fou- cault, segundo a diferenca em relacdo aos espacos instituidos. CIENCIAS DO ESPAGO A existéncia de uma proposigdo geral, que se desenvolve em Principios ou implicagdes, demonstra, nos tes autores, cert Pretensio de abrangéncia que se manifesta no delineamento de tum sistema tebricoassociado a apontamentos metodoldgicos Com efeito, ha um horizonte de cientificidade presumido n0+ 1 Opdtsp aan 1 Opdtapas 9 Opa. piss, mIsMAS SIAC FARTINS FOUCAULT nena textos, ainda que expresso de formas di formas diferentes: em Lefebvre, com certa relutincia em oe em Lefer, cia. em Barthes, so, rrateiramente Cientificidade & palavra- i chave no coy auc epic cer agin ee eel em turalista interagem a recusa da tradicdo pose neo oe cepsio redutora e ingenua de conh, sobre a pés-modernidade. Em Henti Lefebvre é pat tente ai teoria unitaria, nos molds. ar pos da fisica. Busca-se tr mental e social, a fe ea hipotese vate ‘espaci us, Tepresentagdes do espago e lagdo, ou seji vivid Ouse entre espago percebido Nos vai a anid VAT® sistemas de producio da his lo entre "P9505 de re concebido ‘6ria da hu tize-se que, a conn » 20 sustentar que o espaco é sempre produ- $85 com g gto um carter processual envolvido ste, 'Pago, Lefebvre infere que esse cardter se projeta QuesTO#s CONCETTUAIS 10 ES spago. Seo conhecimento, bre a propria teoria que aborda 0 esPas0. see tT teri sore 0 spo deve Iva ea cata que cla mesma é também engendrada pelo esaco, Lefs- core fine teoria como cédigo de cbdigos. Apesar de conde, ‘ruturalismo a primazia da linguag dor das teorias, admite que elas “se sabe aproxi. so TEORIAS DOUESPAGO LITER nar no est ressalta 0 aspecto codifica constituem um tipo de conhecimento que imo tempo certo e incerto” Tal conhecimenta ‘mativo, ao mest ; colver numa apologia do é autocritico, “sem contudo se diss nao saber™. ‘Em Roland Barthes e Michel Foucault, o debate sobre cien. tificidade é bem menos explicito, o que nao significa que sejg menos importante. Revela, no minimo, que nunca € totalmente pacifico o vinculo do teérico com a teoria que formula ou em. prega. Em Barthes se observa a relagao de ambiguidade com ‘a disciplina, a cigncia ou o campo de saber (a imprecisio ter. minoldgica nao é desprezivel) que a semiologia constitui, Por um lado, a semiologia ¢ adotada, defendem-se suas potencialj- dades, hd uma espécie de orgulho dos horizontes que ela teria aberto para as ciéncias humanas, aprego por sua vocagao uni. cadora. Por outro lado, podem-se detectar a insatisfacao, ore. conhecimento das insuficiéncias da semiologia. Barthes afirma que “quem quisesse esbogar uma semiologia da cidade deve. ria ser ao mesmo tempo semidlogo (especialista dos signos), gedgrafo, historiador, urbanista, arquiteto € provavelmente psicanalista”®, 0 que concede a semiologia um papel impre- iso, que oscila entre englobar varias dreas e oferecer-se como apenas uma delas na composi¢ao de redes intersemidticas. ‘Também é possivel constatar, no texto de Barthes, certo desinteresse pelos procedimentos consolidados na priticas- miolégica, que sio: dissociar 0 texto em unidades, distribute em classes formais, encontrar as regras de combinacio e trans formagao. Associada tanto a critica pretensa objetividade no tratamento do espago, quanto a ferrenha defesa da preménct de se investigar sua dimensio significante, ha uma postura ticente no que tange aos métodos pelos quais tal investigec# se daria, O autor admite: “falta-nos uma tiltima técnica, 26 14 Op.citsp.79. 18 Op. cit. p. 439. jem, sew enfoque RTS. POUCA gaya eepo Proclama a necessidade de istresr essa razio Barthes se confes, dor” de signos e de cidades Foucault revela a ficidade no contexto i cientifica’"* 7 'ma nova energia, Tetra cons i ingenuidade 8, acing ne etOdos. Tal -acimade ido ger ‘ama- a ‘leitura, desses espacos diferentes, esses an conceituacio bastante genérie >MO se gosta de dize Outros gates”, ape o> 8 (que inclu, mas gem toe 0 que em se revelar ot 8 objetos que elege, eracional- mente titil no contato com o: TEORIAS DO ESPAGO: METAFORAS Nos textos analisados, hé ain Pata o debate metatedrico, cidade, problema q '§ muito ffi falar a duas questées fundamentais Primeira concerne a metaf ue Roland Barthes avalia como crucial etaeicamente da linguagem da cidade aa linguagem do cinema ou da lingua a aaa salto cientfco ser realizado ands, E otermo ee inBuagem da cidade sem metifora™ Em rlago metaforinns 9 também é constatada semelhantetendénca oe Henri Lefebvre assinala a disseminacéo do usc ‘ais diversas expressies, em geral de significad sa owias HStAGOLTERARO: PAGO" QUESTONS ONCE incerto: fala-se em “espago disso’, “espago daquilo’, “espago lite rario’, “espagos ideol6gicos’,“espago do sonho” ete.*. O termo dquire tamanha flexibilidade e amplitude que sua circunscri- Go elementar se vé comprometida. Barthes afirma a necessidade de ultrapassar tal estagio, de transformar a metéfora em anilise. O problema vigora em toda abordagem semiol6gica e pode ser formulado do seguinte ‘modo: quais sio as consequéncias de se atribuir, a determinado objeto ou evento, a estrutura de discurso, em especial a de dis. curso verbal, mesmo que a atribuigao se dé de modo abrangente, como em termos de sintaxe, ou de “sistema organizativo”? A atribuigdo nao ocorre meramente no nivel metaférico? ‘Ao desenvolver sua proposta, no entanto, Barthes volta a metéfora. Primeiramente, ao postular a “natureza infinitamente metafrica do discurso urbano”, Em outro momento, quando fiisa a existéncia de uma dimensio erdtica da cidade, lugar de ‘encontro com o outro. Erotismo ¢ socialidade sio tomados como sinénimos. O autor, enfim, declara que “é preciso, so- bretudo para a cidade, investigar a cadeia metaférica, a cadeia que substitui Eros””, Parece haver, pois, no texto de Barthes, um movimento que, inicialmente, motivado por compromisso de ordem cientifica, desaprova a metaforizagao dos conceitos, ou seja, recrimina o uso de termos sem a delimitagao de seu sentido, ou exige que tal delimitagio ocorra pelo menos aproximativamente, circuns crevendo as variacoes de sentido. A medida que o texto avang porém, a imprecisio vai sendo retomada. E como se 0 asset timento de que 0 objeto a abordar ~ no caso, 0 espago da ce dade ~ é impreciso justificasse a imprecisio da abordagem. A propagacao metaférica, assim justificada, torna inevitveis ® dificuldades de se delinear uma proposta metodolégica car Vinculado ao problema da metaforicidade, da-se o embat ‘quanto aos modos possiveis de configuragao do que se poe chamar genericamente de codificacdo dos espacos. No ¢# de Roland Barthes, a luta parece ser contra a propria sem” ‘ica, em defesa de uma semiologia voltada para o significante* 1 Opct.pros, 2% Op.ctsp.aas senteanunnenirestcm cus desizamentos, eno presa is . tat dedieament Presa As ilusdes de substancildade No caso de Henti Lefebv ebvre,tem-se rente &s formas espaciais, edelasconfigurade ce iMe- adore: Essa laboragi imp lies em um es radigmitico, ou sea, nas oposigdes oo rardigmsic ous nas opsges etnias eon o dita, que oriotam uma pritica social mae do ga eas ¢oesexpiias,o encadeamento operator dense ‘, sobre os sintagmas (a linguager, mos, em uma letra, a Kteraara ete)" aaa ms comum, a escrita, a Pode-se conjeturar que Lefe febvre te e i blema da metaforicidade quando admite Recess social presume praticas, presume ae re também re 3 sesubdividem em representacées do a aren eS: © que cont li capaci eas epresentagdes do espage sod ee dos sobre © espago e no espaco, aes 'o caso de Michel Foucat i ult, reali labm pascem eos indscmines Ne eeeee se sabe até que TEOR] TAS DO ESPAGO: OPOSIGOES tra questa, i Stdo i a 0 n0s tne oe derivada do debate metateérico ve- i ‘ 5 00 atria eee Tespeito as oposigdes, as quais con- io . do pensamento. A questio é sem Oc ve esago uTerkno 18460" QUESTOES CONCETUAIS o contexto intelectual analisado, j& que a is smo é composta Por Pares oposi- se Linguistica do estruturalismo ¢ compos ase ng ben, Conor autores iam com 0 problems? No texto de Barthes, a estratégia é pleitear a prevaléncia do jogo significante, coneeber 0 significado por intermédio do significante: se TEOWASDO ivida imperiosa n atualmente a semiologia jamais postula a existéncia de um significado efinitivo. Isso quer dizer que 0s significados sio sempre 0s signifi antes para os outros, e reciprocamente. Na realidade, em qualquer Complexo cultural ou mesmo psicoldgico, encontramo-nos diante de Cadelas de metiforas infinitas nas quais o significado estd sempre em recuo of se torna, ele proprio significante™, ‘Tenta-se solucionar a oposigéo significado/significante postulando-se o deslizamento infinito da significacio ~ eis o fundamento da légica desconstrucionista: aimpossibilidade de fixagao do sentido. Rompe-se o fechamento do signo mediante a abertura, o movimento incessante da significacio. Para Lefebvre a resposta se encontra no estabelecimento de modelos triddicos, associados & proclamagao da dialética como irrecusivel mecanismo conformador do pensamento: “Triad: tres termos e no dois. Uma relagéo com dois termos reduz a uma oposisio, a um contrast, a uma contraposigio; define x por um efeto significant: efeito de eco, de repercussio, de espelhs imento, A flosoiararamente suplantou as relagSes com dois termos. o sujeto eo objet, ares coptans ea res extensa de Descartes, o Euee eu dos kantianos,pés-kantianos e neo-kantianos.» ‘Todo o sistema proposto por Lefebvre se assenta na crit Gio de trés categorias que, por principio, instauram entre relagdo dialética, No texto de Foucault a dissociacao entre teoria e pritic espacial écriticada. As oposigdes séo tidas como hierarqu ‘antes e sacralizadoras, Pode-se supor que, nos seis principio ue definem a heterotopologia, o autor sugere valores que: & algum modo, configuram alternativas as relagdes opositivas 2 Opt, pass % Opin as - Sereeceretnetee AS SPACTAS BARTHES. FOLLY area ‘Tals valores so: ampli is ales io. amplitde, mas nig bilidade isrica; 3, muliplicdade aon aproximagées conftanes 4. vince cons Pes simultinea de abertura e fecheman que ¢ insttuido, fame Em sintse, Unive tsalidades 2. varia- <“ Possbilidade de tempo; 5. relacio éncia critica 20 ' constatase que a a 7 Por extensio, de conheciment nta quanto 20s dots topicosessencin, Pena UA dagem do espago:a metaforcidade ee denen P88 Abor- sites Sete Sa aa oo aseiam, conforme autor mae SS dileticarente, Pra Roland no ade que operas ic Para Roland Barthes eee cberam sivel cientificidade da empreitada semaine M2" & pos-

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