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ne7. “Nés somos 0s caramurus e vamos arrasar
tudo”: a histéria da Revolta dos escravos
de Carrancas, Minas Gerais (1833)
Marcos Ferreira de Andrade
No dia 13 de maio de 1888 foi decretado 0 fim da escravidao no Império
do Brasil, a ultima nagio a abolir a escravatura nas Américas. Este capitulo se
propde a analisar outro 13 de maio, que ainda precisa ser mais bem conhecido
pela historiografia da escravidao, Trata-se de um levante de escravos ocorrido:
naquela data, 55 anos antes da abolicao da escravatura no Brasil, nas proprie
da familia Junqueira, na freguesia de Carrancas, termo da vila de Sao
Joao del-Rei, em Minas Gerais (ver Figuras | e 2). Parte da familia senhorial foi
brutalmente dizimada pelos cativos rebeldes e cinco deles pagaram com a pro-
pria vida pelo ato de se rebelarem ¢ ao se confrontarem com os senhores ea
Guarda Nacional. Para parte dos sobreviventes, a punigao foi exemplar. Dezes
seis escravos foram condenados & pena de morte ¢ enforcados, sem direito a
solicitar a peticao de graca 4 Regéncia para que suas vidas fossem poupadas. Os
Ginicos cinco que tentaram tiveram o pedido negado pela Regéncia. Portantoy
trata-se da historia da revolta escrava mais impactante do Sudeste escravista &
da maior condenagao coletiva & pena de morte aos insurretos de que se tent
noticia, efetivamente aplicada, da hist6ria da escravidao brasileiva
1. A Revol de Carrancas fo\o principal objeto de investigagdo de minha Dissertagio de Mes
{rado, quando tive oportunidade de divulgar este episodio completamente desconhiecido pela his
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Digitalizado com CamScannerO levante ocorreu em um contexto muito particular da histéria do Impé-
rio brasileiro, O periodo das Regéncias iniciou-se ap6s a abdicacao do trono
por parte do imperador d, Pedro 1, em 1831, ¢ se encerrou com a antecipagao
da maioridade de seu filho, d. Pedro 11, em 1840, Mais que um interregno do
primeiro € 0 segundo reinados, ele foi determinante na construgao do Estado
nacional brasileiro, Foi uma época marcada por muitas tens6es, dissensdes
entre as distintas facebes politicas, violentos protestos coletivos (sedig6es mili-
tares, levantes liberais e republicanos, protestos de rua, revoltas escravas etc.)
por grande experimentacao politica. A provincia de Minas Gerais foi palco de
uma breve disputa e dissensao entre dois grupos politicos (liberais moderados
torioggabia da escravidao brasileira. Dentre as publicacées que produzi sobre o tema, destacam-se
4s sequintes; “Rebeldia € resisténcia: as revoltas escravas na provincia de Minas Gerais (1831-
AWGY, Disvertagdo de Mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, 1996; “Rebelido escrava
mia comarca do Rio das Mortes, Minas Gerais: 0 caso Carrancas’, Afro-Asia, Salvador, n. 21/22
(WAP), pp, 45-2; “Violencia, criminalidade e controle social: rebelides escravas nas Minas,
Gerais — Skeulo 11%: 0 caso Carrancas, Actas do Congresso Luso-Brasileiro Portugal-Brasil: Mem6-
sas ¢ Imaginérios (Lisboa: Fundagéo Calouste Gulbenkian, 2000), pp. 437-452; “Revolta de Car-
r2nica8, in Ronaldo Vainfas (org.), Diciondrio do Brasil Imperial: 1822-1889 (Rio de Janeiro: Obje-
iva, 192), yp, 635-637; “Negros rebeldes nas Minas Gerais: a revolta dos escravos de Carrancas
(1933), disponivel em: , acessado em 13 mar. 2021.
3, Kenneth Maxwell, A devassa da Devassa: a Inconfidéncia Mineira — Bras
1750-1808 (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978), p. 110.
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Digitalizado com CamScannerVISUSGRO DACAMPANIA
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Arete
do termo da Vila da Campanha da Princesa, Fonte: Livro de Cria-
tha da Princesa [1799-1800], AHU, Conselho Ultramarino/ Bra-
ionais de 1833 a 1835. A populagao cativa
‘lores a 40% nas comarcas do Rio das Mortes e do Rio
la recentemente (1833), Nas de Ouro Preto ¢ Rio das Ve-
itavam pouco mais de 30% da populagao. E na do Rio
tropas da moderacdo: o abastecimento da Corte na formagdo politica do
(iio de Janeiro: Simbolo, 1979); Andrade, Elites regionais,
Pe o de 1833-1835, documentagio pertencente ao Arquivo Pablico Mi-
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