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Williane Tibúrcio Facundes

mostra de artigos
(organizadora)

E-book
TOMO 3

Vol. III

CIÊNCIAS JURÍDICAS
na Amazônia Sul-Ocidental

EAC
Editor
Copyright © by autores, 2024.
All rigths reserved.

Todos os direitos desta edição pertencem aos autores. Nenhuma parte desse
livro poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a autorização
prévia da organizadora pelo e-mail < williane.facundes@uninorteac.com.br >.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº 9.610/98 e pu-
nido pelo art. 184 do Código Penal. As informações contidas em cada capítulo
são de inteira responsabilidade dos autores, bem como o alinhamento dos tex-
tos às normas da ABNT e da ortografia gramatical da língua portuguesa.

CAPISTA E DIAGRAMADOR
Eduardo de Araújo Carneiro
eac.editor@gmail.com

CONSELHO EDITORIAL DA OBRA


Dr. Eduardo de Araújo Carneiro
Dr. Elyson Ferreira de Souza
Me. Adriano dos Santos Lurconvite
Esp. Simmel Sheldon de Almeida Lopes
Esp. Arthur Braga de Souza
Esp. Ícaro Maia Chaim

E-BOOK

F156c FAGUNDES, Williane Tiburcio (Org.).


Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental: mostra de
artigos / Williane Tiburcio Fagundes (organizadora). – 1.
ed. – Rio Branco: EAC Editor, Edição dos autores, 2024.
206 p.; il. 14,8x21 cm. Tomo III; Vol. 3. (E-Book)
ISBN: 978-65-01-02367-0
1. Ciências Jurídicas; 2. Direito; 3. Amazônia; I. Título.
CDD 340.07
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 05
1. O INQUÉRITO DAS FAKE NEWS 07
Amanda Luena Marinho de Castro
Arthur Braga de Souza
2. A (IN) EFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS 44
DA LEI MARIA DA PENHA
Vivian Maria do Amaral Souza
Williane Tibúrcio Facundes
3. ANÁLISE DA PRISÃO PERPÉTUA NO DIREITO 94
BRASILEIRO
Thalia Milena Silva Cardoso da Mota
Arthur Braga de Souza
4. CRIMES COMETIDOS NAS PLATAFORMAS DE 142
VENDA E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
Matheus Marciel Andersen dos Santos
Williane Tibúrcio Facundes
5. A APOSENTADORIA DO SEGURADO ESPE- 173
CIAL RURAL – REQUISITOS E MEIOS DE PROVAS
Andréa de Souza Furtado
Alcides Marini Filho
“A justiça é a verdade em ação.”
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

APRESENTAÇÃO
.

A
presente obra reúne 05 (cinco) artigos de con-
cludentes do curso do direito do Centro Univer-
sitário Uninorte, sob a organização da profes-
sora especialista Williane Tibúrcio Facundes, tendo também a
colaboração dos professores especialistas Alcides Marini Filho
e Arthur Braga de Souza os quais foram escritos em coautoria
com os autores e abordam relevantes temas jurídicos, a saber.
Os artigos científicos aqui apresentados desempenham
um papel fundamental na expansão do conhecimento jurídico.
Eles fornecem uma plataforma para a análise ampla de ques-
tões legais, a discussão de jurisprudência recente e a contri-
buição para o desenvolvimento de teorias jurídicas. Além
disso, esses artigos auxiliam na disseminação de informações
valiosas para a comunidade jurídica, advogados, estudantes e
profissionais do direito. Eles também desempenham um papel
importante na formação de políticas e na tomada de decisões
judiciais informadas.
Os textos científicos apresentados nesta obra exploram
tópicos variados, desde questões de direitos humanos e cons-
titucionais até a análise de casos legais específicos. A pes-

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

quisa cuidadosa e a análise crítica são o cerne para a produ-


ção de artigos jurídicos aqui tratados que, por sua vez, contri-
buem para o avanço e a compreensão aprofundada das com-
plexidades legais em nossa sociedade.
Trata-se de uma obra coletiva e plural, que debate te-
mas interessantes à sociedade e, sem esgotar os assuntos,
promove reflexões a respeito de situações vivenciadas diaria-
mente em nosso corpo social. Daí se extrai a sua relevância.

Prof. Esp. Williane Tibúrcio Facundes


Docente do curso de direito do Centro Universitário Uninorte. Gradu-
ada em Direito pela U:Verse. Graduada em Letras vernáculas pela
UFAC. Especialista em Psicopedagogia pela Universidade Varzean-
grandense. Direito Digital pela Faculdade Metropolitana.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1
O INQUÉRITO DAS FAKE NEWS

THE FAKE NEWS INQUIRY

Amanda Luena Marinho de Castro1

Arthur Braga de Souza2

CASTRO. Amanda Luena Marinho de; SOUZA, Arthur Braga


de. O inquérito das Fake News. Trabalho de Conclusão de
Curso de graduação em Direito - Centro Universitário UNI-
NORTE, Rio Branco. 2024.

1
Discente do 9º período do curso de bacharel em Direito pelo Centro Uni-
versitário Uninorte.
2
Graduado em Direito pelo Centro Universitário Uninorte. Pós-Graduado
em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes. Servidor
Público Federal do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Coordenador-
adjunto e Professor do Curso de Direito do Centro Universitário Uninorte.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

Introdução. O caso em estudo tem o intuito de analisar a ins-


tauração de inquérito de ofício pelo Presidente do Supremo
Tribunal Federal, como no caso do inquérito das fake news.
Especialmente, para discutir a compatibilidade do artigo 43 do
regimento interno do Supremo Tribunal Federal com a Consti-
tuição Federal. Objetivo. Nesse sentido, com foco em atrair a
atenção, o trabalho mostrará ao longo de seu desenvolvi-
mento, falhas no modelo processual penal brasileiro, com o
intuito de deixar exposta à completa incompatibilidade com a
ordem constitucional, já que estamos diante de decisões con-
troversas tomadas por ministros da Suprema Corte, os quais
deveriam ter o conhecimento dos ritos de um inquérito policial,
sendo assim um tema relevante a ser estudado. Método. Por
meio de um estudo de caso e realização pesquisa bibliográ-
fica, sendo utilizado julgados, leis e doutrinas a respeito do as-
sunto, bem como informações colhidas da internet em sites de
alta confiabilidade, buscando referências e instrumentos le-
gais relacionados ao tema. Resultados. O estudo do inquérito
n. 4.781 do Supremo Tribunal Federal levou ao questiona-
mento de problemáticas referentes ao assunto, possibilitando
um leque de informações a serem comentadas. Por fim, a aná-
lise comparativa feita de um inquérito policial que segue o re-
gimento constitucional e o instaurado pelo Supremo Tribunal
Federal traz lacunas deixadas pela Suprema Corte, que nos
faz questionar, seu julgamento e sua credibilidade. Conclu-
são. Dessa forma, o estudo em questão demonstra o procedi-
mento de um inquérito policial conduzido pelo Supremo Tribu-
nal Federal e ainda elenca um conjunto de princípios e normas
que disciplinam o sistema penal brasileiro.

Palavras-chave: inquérito policial; processo penal; Supremo


Tribunal Federal; constitucionalidade; sistema acusatório.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

Introduction. The purpose of this case study is to analyze the


opening of an investigation ex officio by the President of the
Supreme Court, as in the case of the fake news investigation.
In particular, to discuss the compatibility of article 43 of the Su-
preme Court's rules of procedure with the Federal Constitution.
Objective. In this sense, with a focus on attracting attention,
the work will show throughout its development, flaws in the
Brazilian criminal procedural model, in order to expose the
complete incompatibility with the constitutional order, since we
are facing controversial decisions made by Supreme Court
Justices, who should have knowledge of the rites of a police
investigation, thus being a relevant topic to be studied. Me-
thod. Through a case study and bibliographical research,
using judgments, laws and doctrines on the subject, as well as
information gathered from the internet on highly reliable sites,
looking for references and legal instruments related to the sub-
ject. Results. The study of Supreme Court inquiry No. 4.781
led to the questioning of issues relating to the subject, provi-
ding a range of information to be commented on. Finally, the
comparative analysis of a police investigation that follows the
constitutional rules and the one launched by the Supreme
Court reveals gaps left by the Supreme Court, which makes us
question its judgment and credibility. Conclusion. In this way,
the study in question demonstrates the procedure of a police
investigation conducted by the Federal Supreme Court, and
also lists a set of principles and rules that govern the Brazilian
criminal justice system.

Keywords: police investigation; criminal proceedings; Federal


Court of Justice; constitutionality; adversarial system.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

Tendo em vista o cenário atual de instabilidade do sis-


tema judiciário, o Supremo Tribunal Federal, como órgão de
Suprema Corte, guardião da Carta Magna de 1988 em última
instância, vem tomando decisões polêmicas que violam o sis-
tema acusatório e o regramento infraconstitucional delineado
ao processo penal, quando da investigação e persecução de
crimes. Dessa forma, o presente projeto aborda casos que se
mostraram polêmicos quando se trata de inquérito policial ins-
taurado de ofício pelo Supremo Tribunal Federal, para investi-
gar crimes contra os ministros da corte.
Nesse âmbito, o interesse pelo tema surge a partir de
visões confusas e permeadas de divergências. De tal modo,
ainda que seja possível a instauração de um inquérito de ofício
pelo Supremo Tribunal Federal, fica o questionamento sobre
a constitucionalidade destes procedimentos.
Portanto, o trabalho mostrará ao longo de seu desen-
volvimento, falhas no modelo processual penal brasileiro, com
o intuito de expor incompatibilidades com a ordem constituci-
onal.
O estudo do inquérito n. 4.781 do STF é o objeto deste
projeto, onde foram levantadas problemáticas referentes ao
assunto, possibilitando um leque de informações a serem co-
mentadas. Por fim, será feita uma análise comparativa de um

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

inquérito policial que segue o regimento constitucional e o ins-


taurado pelo Supremo Tribunal Federal.

1.1 O PROCESSO PENAL

O Direito Processual Penal é o conjunto de princípios e


normas que disciplinam a composição das lides penais, por
meio da aplicação do Direito Penal objetivo (Capez, 2023).
Dentro dessa perspectiva, sabe-se que o Direito Processual
Penal e o Direito Penal são duas disciplinas inter-relacionadas
no sistema legal que lida com crimes e infrações penais, tra-
balhando em conjunto para garantir a aplicação justa e eficaz
da lei penal.
Assim, segundo Capez (2023), o Direito Penal é o seg-
mento do ordenamento jurídico que detém a função de seleci-
onar os comportamentos humanos mais graves e perniciosos
à coletividade, capazes de colocar em risco valores fundamen-
tais para a convivência social, e descrevê-los como infrações
penais, cominando-lhes, em consequência, as respectivas
sanções, além de estabelecer todas as regras complementa-
res e gerais necessárias à sua correta e justa aplicação.
Conceito este validado pelo artigo 1º do Código Penal,
que na interpretação de Nucci (2022), é um texto legal que diz
que é obrigatória a prévia existência de lei penal incriminadora
para que alguém possa ser por um fato condenado, exigindo,

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

também, prévia cominação de sanção para que alguém possa


sofrê-la, mostrando exatamente como funciona a legislação
formal e, consequentemente, como age o Estado quando co-
metida determinada infração penal.
Diante do exposto, conforme Aury Lopes Júnior (2019),
o processo não é um instrumento que tem apenas a finalidade
de punir, mas que funciona como um meio limitador do poder
e garantidor do indivíduo a ele submetido. Ademais, o pro-
cesso penal é um caminho a ser traçado, tendo em vista que
para chegarmos a uma pena prevista em lei é necessário per-
correr todas as provas e circunstâncias do crime.
Nesse contexto, sob visão de Norberto Avena (2023), o
Direito Processual Penal funciona como instrumento desti-
nado à realização do poder punitivo do Estado, o chamado jus
puniendi cujo desenvolvimento será regido por um conjunto de
normas, preceitos e princípios jurídicos, com o objetivo espe-
cífico de influenciar diversas regras de procedimento penal,
moldando seu conteúdo e direcionando a sua aplicação. Por
sua vez, Edilson Mougenot Bonfim define princípio como:

Assim, “princípio” é considerar algo do começo,


ou compreender (tomar) o que vem primeiro.
Esse sentido – apenas um dos vários possíveis
– já fora analisado por Aristóteles, na medida em
que busca o ponto de partida de um conheci-
mento, sua análise e interpretação de algo.
(2019).

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

No mesmo sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello ilus-


tra que:

Princípio - já averbamos alhures - é, por defini-


ção, mandamento nuclear de um sistema, verda-
deiro alicerce dele, disposição fundamental que
se irradia sobre diferentes normas compondo-
lhes o espírito e servindo de critério para sua
exata compreensão e inteligência, exatamente
por definir a lógica e a racionalização do sistema
normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá
sentido harmônico. É o conhecimento dos princí-
pios que preside a intelecção das diferentes par-
tes componentes do todo unitário que há por
nome sistema jurídico positivo [...]. (2000).

Em virtude disso, os princípios exercem um efetivo po-


der centralizado na condução do processo penal, visto que
funcionam como âncoras processuais em todo o ordenamento
jurídico, orientando a elaboração e aplicação dos preceitos
processuais, garantindo um processo que segue minuciosa-
mente os ritos jurídicos previstos na lei formal com prévia co-
minação legal.
Ademais, esses princípios não apenas servem como
orientação, mas também como garantia a imparcialidade, a le-
galidade, a lesividade das fases dispostas no processo penal,
ajudando, assim, a efetivar os direitos de pessoas envolvidas
e interessados de modo a manter a legalidade processual.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1.1.1 O DEVIDO PROCESSO LEGAL

O artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal de 1988,


dispõe:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distin-


ção de qualquer natureza, garantindo-se aos bra-
sileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos ter-
mos seguintes: (...) LIV - ninguém será privado
da liberdade ou de seus bens sem o devido pro-
cesso legal (Brasil,1988).

Instaurado o processo, é de praxe, que sejam respeita-


das as regras estabelecidas no ordenamento jurídico. Nesse
viés, não é admitido um processo que não se ajuste aos mo-
delos legais tipificados, ou seja, aos previstos em lei (Marcão,
p. 30).
Nesse sentido, o princípio do devido processo legal ga-
rante a todos o direito a um processo com todas as etapas
previstas em lei, assegurando que o indivíduo só será privado
da sua liberdade ou terá os seus direitos restringidos mediante
um processo que obedeça às normas processuais, visando
impedir as arbitrariedades do Estado, assim como, o abuso de
poder, violação do juiz natural e imparcial, bem como, do con-
traditório e ampla defesa.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Diante disso, convém ressaltar o devido processo legal


sob a ótica formal e material (Netto, 2000). O formal refere-se
ao processo em si, exigindo respeito a um conjunto de garan-
tias processuais, que seriam as regras do processo, configu-
rando-se como um processo formal.
Já o devido processo legal material diz respeito à ma-
téria, ou seja, ao conteúdo das decisões e sentenças, logo, é
observado que tal conteúdo é adequado, no sentido de ser
proporcional e razoável. Afinal, de nada adianta ter um pro-
cesso que segue todas as regras processuais se, na decisão
ou sentença, o juiz não considerar a proporcionalidade e a ra-
zoabilidade no conteúdo do que está sendo decidido.
Nesse ínterim, há de se convir que o devido processo
legal estabelece relações com cada fase do processo e com
outros tantos princípios incidentes. Relação está sustentada
por Renato Marcão:

[...] haverá quebra ao devido processo, por


exemplo, se o juiz não observar, já de início, a
necessidade de intimação do acusado para res-
posta escrita, nos casos e na forma em que apli-
cável o disposto no art. 396 do CPP. Note-se,
ainda, que essa violação também guarda relação
com os princípios da ampla defesa e do contra-
ditório [...] (2021, p.30).

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Tal assertiva é válida, pois, como dito, nada adianta o


juiz proferir uma sentença sem antes dar ao acusado o direito
de defesa, violando o contraditório e ampla defesa. Ainda so-
bre o tema, Léo da Silva Alves nos mostra a diferença entre
estes dois princípios regentes:

O contraditório é o momento em que o acusado


enfrenta as razões postas contra ele. A ampla
defesa por sua vez é a oportunidade que deve
ter o acusado de mostrar suas razões. No con-
traditório, o acusado procura derrubar a verdade
da acusação e na ampla defesa ele sustenta a
sua verdade. (...) a ampla defesa é exercida me-
diante a segurança de três outros direitos a ela
inerentes, que são: direito de informação, direito
de manifestação e direito de ter suas razões con-
sideradas. (2001, p. 57).

Neste sentido, a Constituição Federal postula em seu


artigo 5°, inciso LV que:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distin-


ção de qualquer natureza, garantindo-se aos bra-
sileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos ter-
mos seguintes:
LV - aos litigantes, em processo judicial ou admi-
nistrativo, e aos acusados em geral são assegu-
rados o contraditório e ampla defesa, com os
meios e recursos a ela inerentes. (Brasil,1988).

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

De tal modo, ressalta-se, a similaridade com o princípio


do devido processo legal, pois, segundo esta norma, ninguém
será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido pro-
cesso legal, incluindo indubitavelmente o direito de defender-
se, trazendo provas de suas alegações. Nesse viés, ter o de-
vido processo legal, é possuir um meio judicial realizado nos
termos da lei, a fim de que sejam seguidas as regras proces-
suais.
Simultaneamente a este princípio, faz-se necessária a
figura de juiz natural e imparcial. O juiz da causa deve ser de-
finido de acordo com normas preestabelecidas, logo, foram cri-
adas regras que determinam quem será o juiz competente
para julgar cada caso.
A respeito disso, a doutrina brasileira ensina que: “Se
todos são iguais perante a lei, seria preciso um particular e
relevante razão para afastar o criminoso do seu juiz natural,
entendido este como o competente para julgar todos os casos
semelhantes ao que foi praticado” (Nucci, p.255).
Não há dúvidas que o juiz natural é, de tal modo, o juiz
legal, portanto, aquele constituído mediante regras estabeleci-
das pela lei, garantindo ao acusado o direito de ser julgado por
um juiz independente e imparcial, sendo inquestionável que,
todo indivíduo tem o direito de ser ouvido por um juiz determi-
nado anteriormente por lei.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Ademais, o juiz não deve ser estabelecido após o fato


delituoso a ser julgado, mas sim ser previamente definido con-
soante as normas legais, devendo, neste meio judicial, ser um
terceiro imparcial e não alguém interessado em beneficiar ou
prejudicar uma das partes. Assim, leciona Aury Lopes:

O nascimento da garantia do juiz natural dá-se


no momento da prática do delito, e não no início
do processo. Não se podem manipular os crité-
rios de competência e tampouco definir posteri-
ormente ao fato qual será o juiz da causa. Ele-
mentar que essa definição posterior afetaria,
também, a garantia da imparcialidade do julga-
dor. (2019,p.292)

Em síntese, o princípio do juiz natural traz uma garantia


de limitação dos poderes do Estado, assim, não se pode insti-
tuir tribunal de exceção para julgar um caso específico. Sendo
os tribunais de exceção criados após a prática de um ato deli-
tuoso, visando julgá-lo a partir de regras diferentes das aplica-
das aos demais fatos idênticos, portanto, proibidos pelo orde-
namento jurídico.
Diante do exposto, temos a ideia de que os princípios
do direito processual penal, além de limitar o poder de punir
do Estado, orientam o legislador durante a elaboração das nor-
mas e a forma de aplicação do direito penal.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

2.1 A FASE INICIAL DA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL: O IN-


QUÉRITO POLICIAL

Para dar início a persecução penal existe o chamado


inquérito policial. Trata-se de um procedimento administrativo
que visa apurar a ocorrência de um crime, reunir evidências
que levem ao autor do fato, bem como, saber se o crime real-
mente ocorreu e como aconteceu.
Sendo, portanto, um conjunto de diligências, de natu-
reza inquisitorial, realizadas pela autoridade policial para a
apuração e obtenção de elementos que apontem a autoria e
comprovam a materialidade das infrações penais investiga-
das, permitindo ao Ministério Público nos crimes de ação penal
pública, e ao ofendido em crimes de ação penal privada, o ofe-
recimento da denúncia e da queixa-crime (Avena, 2023).
Por sua vez, na perspectiva de Paulo Rangel, o inqué-
rito policial não passa de mero expediente administrativo, cujo
objetivo é a apuração da prática de uma infração penal com a
delimitação da autoria e as circunstâncias em que o crime
ocorreu, sem o propósito de aplicar pena a quem seja objeto
dessa investigação.
Nesse contexto, o conceito de inquérito policial, con-
forme entendimento de Fernando Capez, diz respeito ao:

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Conjunto de diligências realizadas pela polícia ju-


diciária para a apuração de uma infração penal e
de sua autoria, a fim de que o titular da ação pe-
nal tenha condições de ingressar em juízo dis-
pondo de elementos informativos (CPP, art. 4º).
Trata-se de procedimento persecutório de cará-
ter administrativo instaurado pela autoridade po-
licial. Tem como destinatários imediatos o Minis-
tério Público, titular exclusivo da ação penal pú-
blica (CF, art. 129, I), e o ofendido, titular da ação
penal privada (CPP, art. 30); como destinatário
mediato tem o juiz, que se utilizará dos elemen-
tos de informação nele constantes, para o rece-
bimento da peça inicial e para a formação do seu
convencimento quanto à necessidade de decre-
tação de medidas cautelares. (2023).

Assim, o inquérito policial exerce no âmbito da investi-


gação criminal um papel crucial para fins de persecução penal,
garantindo que todas as informações coletadas e apuradas se-
jam embasamento para as ações penais.

2.1.1 INQUÉRITO POLICIAL E AS CARACTERÍSTICAS QUE


O DEFINE

O inquérito policial, disposto na parte geral do Código de


Processo Penal, regula a fase pré-processual de investigação,
tendo suas particularidades e características. Dessa forma, é
de se convir que se trata de um procedimento formalmente
escrito, marcado pelo sigilo, com caráter oficial e oficioso, pro-

20
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

vido de discricionariedade na condução do processo investi-


gativo, podendo ser dispensável em alguns casos e indisponí-
vel na sua instauração, possuindo natureza inquisitiva e presi-
dido por uma autoridade policial competente, como destaca
Fernando Capez.
Segundo o artigo 9° do Código de Processo Penal, o
inquérito policial, como procedimento primária para a fase in-
vestigativa, deve cumprir exigências, tendo todos os seus atos
formalizados de forma escrita e rubricados pela autoridade, in-
cluindo-se, nesta regra, depoimentos, testemunhos, reconhe-
cimentos, acareações e todo gênero de diligências que sejam
realizadas (Avena, 2023).
O inquérito policial é sigiloso. Assim, é garantida a con-
fiabilidade das informações e etapas do inquérito policial, con-
forme preconiza o Art. 20, parágrafo único, do Código de Pro-
cesso Penal:

Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o


sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido
pelo interesse da sociedade.
Parágrafo único. Nos atestados de anteceden-
tes que lhe forem solicitados, a autoridade poli-
cial não poderá mencionar quaisquer anotações
referentes a instauração de inquérito contra os
requerentes.

21
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Logo, conforme o dispositivo mencionado, se o sujeito


está sendo investigado mediante um inquérito policial, a auto-
ridade policial não pode mencionar na folha de antecedentes
do investigado que há um inquérito contra ele em curso. O in-
quérito é totalmente sigiloso, sendo uma forma de proteger a
intimidade do investigado, resguardando-se, assim, seu es-
tado de inocência.
Sigilo este, que a doutrina classifica como um sigilo
externo, que nada mais é do que um sigilo que vai atingir so-
mente os curiosos, pessoas estranhas aquele fato, não ha-
vendo, portanto, sigilo interno no inquérito. As pessoas envol-
vidas como o delegado, o juiz, o promotor, o advogado terão
acesso ao inquérito, podendo esse último sofrer limitações.
(Távora, 2019)
Nesse sentido, o acesso ao advogado pode ser limitado.
Enquanto o delegado, o juiz e o promotor têm acesso a todas
as peças do inquérito a qualquer momento, o advogado sofre
restrições. Restrições estas que se permeiam quando é decla-
rado o segredo de justiça, em que o advogado só pode ter
acesso à peça mediante procuração, conforme Art. 7°, § 10 do
Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil:
“Nos autos sujeitos a sigilo, deve o advogado apresentar pro-
curação para o exercício dos direitos de que trata o inciso XIV”
(1994).

22
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Sob esse panorama, a Súmula Vinculante n.º 14 do Su-


premo Tribunal Federal diz:

É direito do defensor, no interesse do represen-


tado, ter acesso amplo aos elementos de prova
que, já documentados em procedimento investi-
gatório realizado por órgão com competência de
polícia judiciária, digam respeito ao exercício do
direito de defesa. (STF, 2009)

Face a isso, o advogado não tem acesso às diligências


em andamento ou as diligências ainda não documentadas por
escrito no inquérito. Mas uma vez que reduzidas a escrito e
encartadas no inquérito policial, o advogado terá acesso.
E ainda, frisando que em qualquer crime comum o ad-
vogado tem acesso a peças independentemente de procura-
ção, mas, falando em crime em que corre segredo de justiça,
somente mediante procuração.
Nesse viés, o advogado não está sujeito somente a
restrições, logo, para fortalecer o direito à ampla defesa, é ga-
rantido ao advogado o acesso aos autos do inquérito policial,
conforme estabelece a Súmula Vinculante n.º 14 do Supremo
Tribunal Federal.
Súmula esta que atua como protetora do acesso às in-
formações da investigação e por conseguinte, contribuindo
para uma defesa justa e eficaz.

23
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Ressalta-se ainda que o inquérito policial é um procedi-


mento oficial, realizado por agentes públicos, sendo vedada a
delegação a particulares, sendo exclusivo do Estado. Con-
forme estabelecido no Art. 2° da Lei nº 12.830, de 20 de junho
de 2013, que dispõe acerca da investigação criminal condu-
zida pelo delegado de polícia.

Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apura-


ção de infrações penais exercidas pelo delegado
de polícia são de natureza jurídica, essenciais e
exclusivas de Estado.
§ 1º Ao delegado de polícia, na qualidade de au-
toridade policial, cabe a condução da investiga-
ção criminal por meio de inquérito policial ou ou-
tro procedimento previsto em lei, que tem como
objetivo a apuração das circunstâncias, da mate-
rialidade e da autoria das infrações penais.
§ 2º Durante a investigação criminal, cabe ao de-
legado de polícia a requisição de perícia, infor-
mações, documentos e dados que interessem à
apuração dos fatos.
§ 3º (VETADO).
§ 4º O inquérito policial ou outro procedimento
previsto em lei em curso somente poderá ser
avocado ou redistribuído por superior hierár-
quico, mediante despacho fundamentado, por
motivo de interesse público ou nas hipóteses de
inobservância dos procedimentos previstos em
regulamento da corporação que prejudique a efi-
cácia da investigação.
§ 5º A remoção do delegado de polícia dar-se-á
somente por ato fundamentado.
§ 6º O indiciamento, privativo do delegado de po-
lícia, dar-se-á por ato fundamentado, mediante
análise técnico-jurídica do fato, que deverá indi-
car a autoria, materialidade e suas circunstân-
cias.

24
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Portanto, a oficialidade, nada mais é do que a caracte-


rística que diz respeito ao inquérito policial ser comandado por
um órgão oficial, pelo Estado, e mais precisamente pela poli-
cial civil ou policial federal.
No que diz respeito à oficiosidade do inquérito policial,
o delegado de polícia ao tomar conhecimento de um possível
crime tem o dever de agir de ofício, independentemente de
provocação ou não, conforme art. 5º, inciso I, do Código de
Processo Penal:
A característica discricionária do inquérito policial é um
elemento essencial no processo de investigação criminal.
Essa discricionariedade confere ao delegado o poder de de-
terminar ou postular todas as diligências que julgar necessá-
rias ao esclarecimento dos fatos (Avena, 2023).
O inquérito não possui um procedimento formal igual a
um processo judicial que tem todas as suas etapas definidas.
As formas de praticar as diligências, os métodos de investiga-
ção ficam a critério do delegado de polícia, conforme descrito
no Art. 14 do Código de Processo Penal: “Art. 14. O ofendido,
ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer
qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da au-
toridade.”
Então, o delegado que vai decidir quais serão as formas
de diligências para a investigação de um crime.

25
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Portanto, uma vez instaurado o inquérito, possui a au-


toridade policial liberdade para decidir acerca das providên-
cias pertinentes ao êxito da investigação (Avena, 2023).
Por outro lado, a dispensabilidade diz que o inquérito
policial não é essencial para a propositura da ação penal, em
acordo com o Art. 12 do Código de Processo Penal, “O inqué-
rito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que
servir de base a uma ou outra”, abrindo margem para a instau-
ração ou não de processo investigativo (1941).
Assim, em determinadas situações, o Ministério Público
pode optar por não iniciar um inquérito e, em vez disso, dar
início diretamente ao processo penal com base em denúncias
ou queixas. Portanto, a dispensa do inquérito policial geral-
mente depende da presença de provas sólidas e suficientes
que permitam ao Ministério Público formular uma denúncia
fundamentada.
No que tange à característica de indisponibilidade do
inquérito policial, Norberto Avena ressalta que uma vez instau-
rado o inquérito policial, não poderá ser livremente arquivado
ou encerrado pela autoridade policial.
E esta indisponibilidade é abordada no Art. 17 do Có-
digo de Processo Penal, que diz: “Art. 17. A autoridade policial
não poderá mandar arquivar autos de inquérito”. Assim, aberto

26
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

o inquérito não é facultado a autoridade policial o arquiva-


mento ou não do caso, pois ele não tem autoridade para isso.
E somente quem teria essa autoridade seria o juiz e, ainda
assim, a pedido do Ministério Público.
Em suma, o inquérito sempre deverá ser concluído e
encaminhado a juízo, pois ele é um procedimento indisponível.
Quanto ao caráter inquisitorial mencionado anteriormente, re-
fere-se à natureza do inquérito policial, que se diferencia de
um processo acusatório, pois, segundo Fernando Capez:

Caracteriza-se como inquisitivo o procedimento


em que as atividades persecutórias se concen-
tram nas mãos de uma única autoridade, a qual,
por isso, prescinde, para a sua atuação, da pro-
vocação de quem quer que seja, podendo e de-
vendo agir de ofício, empreendendo, com discri-
cionariedade, as atividades necessárias ao es-
clarecimento do crime e da sua autoria. (2022, p.
52).

Por fim, o inquérito policial, conforme doutrina anterior,


tem por característica ser presidido por uma autoridade pú-
blica, no caso, o delegado de polícia, conforme dispõe a Cons-
tituição Federal de 1988 no Art. 144, § 4°:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado,


direito e responsabilidade de todos, é exercida
para a preservação da ordem pública e da inco-
lumidade das pessoas e do patrimônio, através
dos seguintes órgãos:
§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de

27
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

polícia de carreira, incumbem, ressalvada a com-


petência da União, as funções de polícia judiciá-
ria e a apuração de infrações penais, exceto as
militares.

Em suma, as características supracitadas são funda-


mentais para o funcionamento do sistema processual penal
acusatório, tendo em vista que o inquérito policial desempenha
um papel vital na investigação de crimes, fornecendo informa-
ções e garantindo que essa investigação criminal seja reali-
zada dentro dos limites estabelecidos em lei.

2.2 O PAPEL DO DELEGADO E DE OUTRAS AUTORIDA-


DES EM CONDUZIR AS INVESTIGAÇÕES DO INQUÉRITO
POLICIAL

Compete ao delegado de polícia a condução do inqué-


rito policial ou outro procedimento investigativo de origem ou
em curso nas delegacias de polícia, atribuição esta que não
pode ser transferida a outras instituições ou ao particular
(Avena, 2023). Sendo este, um investigador imparcial. Con-
forme a Lei n.º 12.830/2013, já abordada neste capítulo, diz
em seu artigo 2º, § 1º, que:

§ 1º Ao delegado de polícia, na qualidade de au-


toridade policial, cabe a condução da investiga-
ção criminal por meio de inquérito policial ou ou-
tro procedimento previsto em lei, que tem como

28
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

objetivo a apuração das circunstâncias, da mate-


rialidade e da autoria das infrações penais.

O artigo em questão, inicialmente, esclarece o papel do


delegado de polícia como autoridade policial, tendo poderes e
deveres específicos para conduzir investigações criminais,
bem como supervisionar todas as etapas da investigação.
Cabendo ao delegado, a requisição de perícia, informa-
ções, documentos e dados que interessem à apuração dos fa-
tos. O texto legal confere ao delegado a ordem necessária
para coleta de informações e provas, para enfim ocorrer a apu-
ração dos fatos.
Assim, deve a lei ser interpretada no sentido de que a
presidência do inquérito policial é incumbência do delegado, e
não que a atividade investigatória, em qualquer caso, seja ex-
clusividade absoluta da polícia (Norberto Avena, 2023). No en-
tanto, como em toda lei, existe uma exceção. A segunda turma
do Supremo Tribunal Federal decidiu que não é apenas a au-
toridade policial que pode conduzir investigações criminais.

O Ministério Público (MP) tem, sim, competência


para realizar, por sua iniciativa e sob sua direção,
investigação criminal para formar sua convicção
sobre determinado crime, desde que respeitadas
as garantias constitucionais asseguradas a qual-
quer investigado. A Polícia não tem o monopólio
da investigação criminal, e o inquérito policial
pode ser dispensado pelo MP no oferecimento
de sua denúncia à Justiça.

29
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Entretanto, o inquérito policial sempre será co-


mandado por um delegado de polícia. O MP po-
derá, na investigação policial, requerer investiga-
ções, oitiva de testemunhas e outras providên-
cias em busca da apuração da verdade e da
identificação do autor de determinado crime.
Com esse entendimento, a Segunda Turma do
Supremo Tribunal Federal (STF) indeferiu, por
votação unânime, o Habeas Corpus (HC) 89837,
em que o agente da Polícia Civil do Distrito Fe-
deral Emanoel Loureiro Ferreira, condenado pelo
crime de tortura de um preso para obter confis-
são, pleiteava a anulação do processo desde seu
início, alegando que ele fora baseado exclusiva-
mente em investigação criminal conduzida pelo
MP (STF, 2009).

O Ministério Público tem competência para realizar, por


sua iniciativa e sob sua direção, investigações criminais,
desde que respeitadas as garantias constitucionais do investi-
gado.

2.3.1 O MINISTÉRIO PÚBLICO

A Constituição Federal, elenca em seu texto legal, Art.


127: “O Ministério Público é instituição permanente, essencial
à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da
ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses soci-
ais e individuais indisponíveis. (1988)”.
A Magna Carta de 1988 trouxe uma inovação à figura
do Ministério Público. Nesse sentido, o Ministério Público foi
oficialmente reconhecido como uma instituição permanente e

30
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

desvinculada definitivamente de representação judicial da


União (Lenza, 2023). Por outro lado, na esfera penal, o Minis-
tério Público é a instituição de caráter público que representa
o Estado-Administração, expondo ao Estado-Juiz a pretensão
punitiva (Capez, 2016).
Com advento da Constituição 1988, surge o Minis-
tério Público como titular da ação penal pública. Conforme pre-
visão expressa no Art.129, inciso I: Art. 129. São funções ins-
titucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente,
a ação penal pública, na forma da lei’’. Sendo estabelecida
uma clara separação das funções de acusador, julgador e de-
fensor.
Nesse sentido, é conferido ao Ministério Público, com
exclusividade, a prerrogativa de propor a ação penal pública.
A Lei Maior atribui ao Ministério Público, ainda, a função de
exercer o controle externo da atividade policial (art. 129, VII),
requisitar diligências investigatórias e determinar a instaura-
ção de inquérito policial (art. 129, VIII) (Capez, 2016).

VII - exercer o controle externo da atividade poli-


cial, na forma da lei complementar mencionada
no artigo anterior;
VIII - requisitar diligências investigatórias e a ins-
tauração de inquérito policial, indicados os fun-
damentos jurídicos de suas manifestações pro-
cessuais; (Brasil, 1988)

31
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Ademais, o Ministério Público desempenha um papel


crucial no devido processo legal, especialmente no contexto
da ação penal, tendo em vista a sua atuação imparcial, respei-
tando os direitos e garantias das partes envolvidas.

3.1 INQUÉRITO Nº 4.781 DO SUPREMO TRIBUNAL


FEDERAL

O Inquérito n. 4.781 é um caso a ser estudado. Instau-


rado de forma autônoma pelo presidente do Supremo Tribunal
Federal na época, o excelentíssimo Ministro Dias Toffoli, sem
pedido do Ministério Público ou autoridade policial. Não ha-
vendo, portanto, similaridade com os ritos presentes no pro-
cesso penal, tendo em vista que, em regra, os inquéritos são
dirigidos pela polícia ou Ministério Público e as denúncias fi-
cam a cargo do Ministério Público. Mas neste caso, ele foi
aberto e conduzido de ofício pelo Supremo Tribunal Federal.
A Portaria GP N. 69/2019, assinada pelo Presidente
Dias Toffoli, autorizou a instauração deste inquérito, visando
apurar, conforme documento:

(...) existência de notícias fraudulentas (fake


news), denunciações caluniosas, ameaças e in-
frações revestidas animus calumniandi, diffa-
mandi e injuriandi, que atingem a honorabilidade

32
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

e a segurança do Supremo Tribunal Federal, de


seus membros e familiares (...) (2019)

Justificando então, que a abertura deste inquérito teve


como base informações e notícias que podem representar
uma ameaça à segurança da Corte Suprema. Esta portaria
trouxe ainda o embasamento legal do Inquérito n. 4.781, haja
que vista que utilizou em seu teor o art. 43 do Regimento In-
terno do Supremo Tribunal Federal, que dispõe:

Art. 43. Ocorrendo infração à lei penal na sede


ou dependência do Tribunal, o Presidente instau-
rará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa
sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribui-
ção a outro Ministro.
§ 1º Nos demais casos, o Presidente poderá pro-
ceder na forma deste artigo ou requisitar a ins-
tauração de inquérito à autoridade competente.
§ 2° O Ministro incumbido do inquérito designará
escrivão dentre os servidores do Tribunal.

Conteúdo normativo que autoriza o presidente do Tri-


bunal a iniciar investigações de ofício, em casos relevantes.
Levantando, portanto, a indagação de que esta previsão nor-
mativa, contida no artigo 43 do Regimento Interno da Suprema
Corte, é suficiente para o Ministro Dias Toffoli, na qualidade de
presidente do Supremo, ordenar a instauração do inquérito n.
4.781.

33
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Nesse contexto, fica evidente a necessidade de uma in-


terpretação minuciosa do dispositivo em questão, uma vez que
o ministro Dias Toffoli fez uma interpretação controversa,
tendo em vista que é estabelecido que as infrações devem
ocorrer em sede ou dependência do tribunal, porém, as infra-
ções ocorreram fora dos limites territoriais do STF.
Na sequência, o Ministro Dias Toffoli, por meio da Por-
taria GP N. 69/2019, designou o Ministro Alexandre Moraes
como relator do inquérito n. 4.781, que recebeu a tarefa de
conduzir o inquérito n. 4.781 do Supremo Tribunal Federal.
É importante destacar que o relator tem um papel de
destaque, tendo em vista que é detentor do poder de conduzir
as investigações, contando com o auxílio da autoridade poli-
cial, sendo o encarregado de assegurar que as investigações
corram de forma justa e imparcial, conforme a legislação for-
mal. Ao final da investigação, o relator pode apresentar relató-
rios e sugestões. Porém, a decisão final que determina a cul-
pabilidade ou não do agente recai sobre o tribunal, ou órgão
competente, após serem analisadas todas as evidências de-
correntes do processo investigativo.
Diante disso, a legislação brasileira estabelece que a
investigação de crimes é de responsabilidade do Ministério
Público ou de uma autoridade policial, enquanto o julgamento
de processos criminais é de competência do Poder Judiciário.

34
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Dessa forma, o Ministro Dias Toffoli usou do Regimento In-


terno do Supremo Tribunal Federal, para instaurar, de ofício,
o inquérito 4.781.
Por conseguinte, é importante ressaltar que o sistema
acusatório foi acolhido de maneira explícita pela Constituição
Federal, conforme o artigo 129, inciso I, que concede ao Mi-
nistério Público a titularidade da ação penal pública. Além
disso, a Constituição deixa claro que as funções de acusar,
investigar, defender e julgar devem ser exercidas por pessoas
diversas, indo ao encontro da imparcialidade do magistrado,
deixando-o distante da fase investigatória.
Visto isso, diante de diversas controvérsias e polêmicas
que correm em torno do inquérito n. 4.781, a ex-Procuradora-
Geral da República, Raquel Dodge, solicitou, em 15 de março
de 2019, esclarecimentos acerca da portaria assinada pelo Mi-
nistro Dias Toffoli, pois para procuradora, há uma violação
clara dos ritos pertinentes ao Ministério Público em matéria de
inquérito policial. Logo, parafraseando o que foi dito por Ra-
quel Dodge, ao menos que uma Lei Complementar determine
casos específicos, o Ministério Público tem a prerrogativa de
conduzir investigações.
Diante disso, a Procuradoria-Geral da República solici-
tou ao Supremo Tribunal Federal detalhes sobre os fatos que
foram objeto do inquérito e a razão pela qual o tribunal era

35
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

competente para iniciar uma investigação, autorizando o Mi-


nistério Público a análise para decidir se arquivaria o inquérito
ou iniciaria uma ação penal pública.
Nesse contexto, diante dos questionamentos impostos
à Suprema Corte, bem como o debate acerca da rejeição de
promoção do arquivamento pelo ministro Alexandre de Mo-
raes, diversos processos foram apresentados visando a inter-
rupção do inquérito, alegando sua inconstitucionalidade,
sendo um deles, a Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental (ADPF) n. 572/DF movida pelo partido Rede
Sustentabilidade. Tendo, julgamento realizado em 18 de junho
de 2020, sob ementa:

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRE-


CEITO FUNDAMENTAL. ADPF. PORTARIA GP
Nº 69 DE 2019. PRELIMINARES SUPERADAS.
JULGAMENTO DE MEDIDA CAUTELAR CON-
VERTIDO NO MÉRITO. PROCESSO SUFICI-
ENTEMENTE INSTRUÍDO. INCITAMENTO AO
FECHAMENTO DO STF. AMEAÇA DE MORTE
E PRISÃO DE SEUS MEMBROS. DESOBEDI-
ÊNCIA. PEDIDO IMPROCEDENTE NAS ESPE-
CÍFICAS E PRÓPRIAS CIRCUNSTÂNCIAS DE
FATO EXCLUSIVAMENTE ENVOLVIDAS COM
A PORTARIA IMPUGNADA. LIMITES. PEÇA IN-
FORMATIVA. ACOMPANHAMENTO PELO MI-
NISTÉRIO PÚBLICO. SÚMULA VINCULANTE
Nº 14. OBJETO LIMITADO A MANIFESTAÇÕES
QUE DENOTEM RISCO EFETIVO À INDEPEN-
DÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO. PROTEÇÃO
DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DE IM-
PRENSA.

36
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Ao final do julgamento, o Supremo Tribunal Federal pro-


feriu acordão, decidindo que o inquérito 4.781 está de acordo
com a norma constitucional e optando por sua continuidade:

(...) Na sequência, o Tribunal, por maioria, co-


nheceu da arguição de descumprimento de pre-
ceito fundamental, converteu o julgamento da
medida cautelar em julgamento definitivo de mé-
rito e, nos limites desse processo, diante de inci-
tamento ao fechamento do STF, de ameaça de
morte ou de prisão de seus membros, de apre-
goada desobediência a decisões judiciais, julgou
totalmente improcedente o pedido nos termos
expressos em que foi formulado ao final da peti-
ção inicial, para declarar a constitucionalidade da
Portaria GP 69/2019 enquanto constitucional o
artigo 43 do RISTF, nas específicas e próprias
circunstâncias de fato com esse ato exclusiva-
mente envolvidas, nos termos do voto do Relator
e dos votos proferidos, vencido o Ministro Marco
Aurélio.

O inquérito no 4.781 continuou ao longo dos anos.


Nesse período, produziu informações importantes sobre a pro-
pagação de notícias falsas e discursos de ódio na internet. No
entanto, como mencionado, o inquérito foi inicialmente desti-
nado a investigar ameaças à honra dos Ministros da Suprema
Corte, mas as investigações se concentraram cada vez mais
na identificação dos infratores para combater a propagação de
informações falsas que circulam nas redes sociais.

37
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Contudo, apesar de anuência de figuras relevantes


para a persecução penal, como o Ministério Público e a auto-
ridade policial, o inquérito foi alvo de críticas diversas, devido
à sua natureza sigilosa, bem como aos métodos de controle
de redes sociais utilizados, que incluem a suspensão de perfis
de políticos e influenciadores, além de prisões, como a do ex-
Deputado Federal Daniel Silveira.
Ganhando destaque e retornando aos holofotes jurídi-
cos novamente devido aos atos de vandalismos praticados
contra o Supremo Tribunal Federal em 8 de janeiro de 2023.
Nos levando a uma análise mais aprofundada do regimento
interno do tribunal no qual o inquérito n.º 4781 foi embasado,
revelando de fato a abrangência de sua abertura.
Logo, conforme referido dispositivo, se ocorrida infra-
ção penal nas dependências do Tribunal, o presidente poderá
instaurar inquérito. Portanto, torna-se evidente a hora certa de
ter usado o ordenamento para abrir um inquérito, pois a inva-
são ao prédio do Supremo Tribunal Federal seria um caso le-
gítimo de instauração de inquérito, tendo em vista que ocorreu
nas dependências do tribunal e não no caso de crimes come-
tidos em ambiente digital — que não são as dependências do
tribunal, tornando o inquérito, um tema a ser discutido e anali-
sado por muito tempo.

38
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo tem por objetivo analisar o inquérito


instaurado de forma autônoma pelo presidente do Supremo
Tribunal Federal, bem como a instauração por iniciativa do
próprio judiciário, sem pedido dirigido pelo Ministério Público
ou autoridade policial, que, em regra, são os ritos comuns
neste procedimento. No entanto, ganha destaque o objeto da
abertura do inquérito, visando combater a disseminação de
notícias falsas nas redes sociais.
Foi visto que o inquérito n. 4.781 foi alvo de críticas e
controvérsias acerca do fim que se destina, tendo em vista sua
natureza sigilosa, bem como a prisão de pessoas conhecidas
e bloqueio de diversos meios de comunicação.
Analisou-se o embasamento legal deste inquérito, e
ainda a análise minuciosa do texto legal que o compõe. Con-
cluindo que, o inquérito n. 4.781 tomou rumos inesperados,
mas sempre dentro de normas constitucionais, apesar das inú-
meras polêmicas que o acoberta, tendo em vista que começou
de uma maneira incomum para o ordenamento jurídico.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

2
A (IN) EFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS
DA LEI MARIA DA PENHA

THE (IN) EFFECTIVENESS OF PROTECTIVE MEASURES


UNDER THE MARIA DA PENHA LAW

Vivian Maria do Amaral Souza3


Williane Tibúrcio Facundes4

SOUZA, Vivian Maria do Amaral. FACUNDES, Williane Tibúr-


cio. A (In) Eficácia Das Medidas Protetivas Da Lei Maria Da
Penha. Trabalho de Conclusão de Curso de graduação em
Direito – Centro Universitário UNINORTE, Rio Branco. 2024.

3
Discente do 9º período do curso de bacharelado em Direito pelo Centro
Universitário Uninorte.
4
Docente do Centro Universitário Uninorte. Graduada em Direito pela
U:VERSE. Especialista em Psicopedagogia pela Universidade Varzea-
grandense e Direito Digital pela Faculdade Metropolitana. Graduada em
Letras Vernáculas pela Universidade Federal do Acre- UFAC.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

Introdução. O estudo trata da (in) eficácia das medidas prote-


tivas da Lei Maria da Penha, tendo ênfase na Lei 11.340/2006,
logo através de uma análise histórica, que torna evidente que
as mulheres foram constantemente discriminadas e relegadas
a um papel secundário na sociedade. Objetivo. Analisar a ine-
ficiência das medidas protetivas na aplicação da Lei Maria da
Penha, identificando suas causas e propondo alternativas
para garantir uma proteção mais eficaz às vítimas de violência
doméstica. Método. Através do embasamento teórico e pes-
quisas em campos de dados, produziu-se uma análise acerca
da efetivação da Lei Maria da Penha, como forma de viabilizar
a aplicação da lei e os esforços de sensibilização para alcan-
çar uma sociedade verdadeiramente livre de violência contra
a mulher. Conclusão. Ao compreender melhor os obstáculos
enfrentados e os impactos das medidas protetivas, é impor-
tante identificar possíveis melhorias na legislação e nas políti-
cas públicas, visando uma proteção mais efetiva das vítimas
de violência doméstica. Espera-se, então, contribuir para o de-
bate sobre o tema auxiliando na construção de uma sociedade
mais justa e igualitária, onde a violência contra as mulheres
não tenha lugar.

Palavras-chave: Lei Maria da Penha; violência doméstica; ví-


tima; mulher.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRAC

Introduction. This study addresses the effectiveness (or lack thereof)


of protective measures under the Maria da Penha Law, with a focus
on Law 11.340/2006. Through a historical analysis, it becomes evi-
dent that women have been consistently discriminated against and
relegated to a secondary role in society. Objective. To analyze the
inefficiency of protective measures in the application of the Maria da
Penha Law, identifying its causes, and proposing alternatives to en-
sure more effective protection for victims of domestic violence.Me-
thod. Through theoretical foundations and field data research, an
analysis was conducted on the implementation of the Maria da Pe-
nha Law, aiming to facilitate the application of the law and efforts to
raise awareness to achieve a society truly free from violence against
women.Conclusion. By better understanding the challenges faced
and the impacts of protective measures, it is important to identify
possible improvements in legislation and public policies, aiming for
more effective protection of victims of domestic violence. The hope
is to contribute to the debate on the subject, assisting in the cons-
truction of a fairer and more equal society where violence against
women has no place.

Keywords: Maria da Penha Law; domestic violence; victim; woman

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

Este artigo busca evidenciar a ineficácia das medidas


adotadas para prevenir, enfrentar e punir as agressões come-
tidas no âmbito da violência doméstica, familiar e afetiva con-
tra a mulher. Embora a Lei Maria da Penha tenha sido criada
com a intenção de reduzir os casos de violência, é evidente
que o sistema não tem conseguido acompanhar sua aplica-
ção, como demonstram os dados que colocam o Brasil entre
os países com os maiores índices de violência doméstica re-
gistrada.
Desde a promulgação da Lei 11.340/2006, o governo
brasileiro enfrenta dificuldades significativas para garantir a
máxima efetividade das medidas de proteção de urgência. A
falta de capacitação dos policiais e do sistema judiciário, aliada
à escassez de agentes, funcionários públicos, juízes e procu-
radores, tem resultado em um cenário insatisfatório diante da
grande demanda por ações para lidar com a violência domés-
tica. A infraestrutura e as redes multidisciplinares com profis-
sionais qualificados são insuficientes, deixando as vítimas de-
samparadas e à mercê dos agressores.
Apesar de reconhecida pelas Nações Unidas
como uma das legislações mais completas no âmbito jurídico,
a Lei Maria da Penha não é suficiente por si só. É essencial

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

aplicar e fiscalizar o cumprimento das regras para que a norma


tenha credibilidade. Isso requer uma estrutura nacional que
garanta a aplicabilidade e a efetividade das medidas em todo
o país, protegendo assim a vítima.
O impacto dessas violências é vasto, afetando não ape-
nas as vítimas diretas, mas também os familiares, especial-
mente crianças e adolescentes, que testemunham e viven-
ciam essa realidade de violência. Isso pode gerar dificuldades
e distúrbios tanto na esfera pública quanto na privada.
Para esta pesquisa, foi adotado um método exploratório
e qualitativo, a fim de identificar a ineficácia das medidas pro-
tetivas da Lei Maria da Penha na prática. A técnica inclui aná-
lises bibliográficas, documentais e jurisprudenciais. Além
disso, será utilizado o método comparativo para confrontar a
legislação com o direito que está sendo aplicado na realidade.

2.1 HISTÓRICO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO BRASIL

Através de uma análise histórica, é evidente que as mu-


lheres foram constantemente discriminadas e relegadas a um
papel secundário na sociedade, postas à obscuridade e ao
anonimato, sendo privadas de direitos essenciais devido à pre-
dominância de uma estrutura familiar patriarcal, hierarquizada
e desigual. Apesar de sempre desempenharem um papel ativo

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

nas batalhas e conquistas da humanidade e de exercer inú-


meras contribuições que vão além da reprodução e da educa-
ção dos filhos, elas sempre foram subestimadas, tanto no am-
biente doméstico quanto no mundo do trabalho.
Tal alegação pode ser levada em conta devido ao di-
reito Romano e Grego, que desde o início colocou a mulher
em posição inferior à do homem. Naquela época, as regras
eram ditadas pela religião, e foi a partir dela que surgiu a con-
cepção da família, que previa um tratamento desigual entre os
gêneros. Isso se tornou mais evidente, por exemplo, no culto
aos mortos, em que os homens eram reverenciados como di-
vindades.
Desde os tempos antigos até a Idade Média, na Europa,
as mulheres tinham um status inferior aos homens. Na Grécia
Antiga e em Roma, por exemplo, elas eram consideradas pro-
priedade de seus pais ou maridos, sujeitas a normas rígidas e
com acesso limitado à educação e à participação política.
Cabe ressaltar que na referida época a mulher era vista como
parte integrante de seu esposo ou pai, mas nunca como um
ser que possuía autonomia de seus atos, sendo extremamente
insignificante e obscurecida.
Na sociedade oriental, por exemplo, na China Antiga as
mulheres também eram vistas em um status inferior e eram

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

consideradas propriedade de seus pais ou maridos. Elas ti-


nham poucos direitos legais e eram submetidas a práticas
como o "pé de lótus", que deformava seus pés para simbolizar
beleza e submissão. O patriarcado era predominante, e havia
uma forte aversão ao aborto e ao adultério. Com poucas ex-
ceções, as mulheres viviam em condições extremamente sub-
missas.
Na Índia, embora as mulheres fossem divinizadas de-
vido à sua função reprodutiva, elas eram excluídas de cerimô-
nias e responsabilidades civis.
No continente africano, as experiências das mulheres
variam de acordo com as diferentes culturas e sociedades pre-
sentes no continente. Em algumas sociedades matrilineares,
as mulheres desfrutavam de um status mais elevado, partici-
pando ativamente nas tomadas de decisão. Contudo, durante
o período colonial, as mulheres africanas enfrentaram opres-
são e discriminação racial e de gênero. Com a independência
dos países africanos, houve avanços significativos na luta pe-
los direitos das mulheres, com maior acesso à educação e
oportunidades políticas.
Nas Américas, durante as civilizações pré-colombia-
nas, como os Maias e os Incas, as mulheres desempenhavam
papéis importantes na sociedade e desfrutavam de certa au-
tonomia. No entanto, com a chegada da colonização europeia,

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

as mulheres indígenas enfrentaram opressão e violência, jun-


tamente com a supressão de suas culturas e tradições.
A história relata que em algumas culturas, o poder dos
maridos era tão dominante que eles podiam até mesmo esco-
lher o próximo cônjuge para sua esposa no caso de morte, ou
até mesmo matá-la e enterrá-la, alegando que ela deveria con-
tinuar servindo-o no além. Essas práticas refletem a extrema
submissão e controle exercidos sobre as mulheres em algu-
mas sociedades históricas.
Com o advento do Cristianismo, houve uma melhora na
situação das mulheres, uma vez que essa religião proclamava
a igualdade entre homens e mulheres e estabelecia o casa-
mento monogâmico, contudo tal situação teve uma mudança
com a adesão do império romano ao cristianismo, tendo em
vista as correntes interpretativas que começaram a promover
uma visão mais restrita dos papéis de gênero. As escrituras
bíblicas foram interpretadas de maneira a enfatizar a submis-
são das mulheres aos homens e a sua importância no contexto
doméstico, como esposas e mães.
A Revolução Francesa, ocorrida entre 1789 e 1799,
teve um impacto significativo nos direitos das mulheres e na
luta pela igualdade de gênero, um dos eventos mais emble-
máticos relacionados às mulheres durante a Revolução Fran-
cesa foi a Marcha das Mulheres para Versalhes, em outubro

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

de 1789, onde demonstrou o poder e a determinação das mu-


lheres em se manifestarem e reivindicarem seus direitos.
Mais tarde, durante o período colonial no Brasil, persis-
tiu a diferenciação por se tratar de uma sociedade patriarcal e
hierarquizada, onde homens brancos detinham o poder e as
mulheres, especialmente as não brancas e escravizadas,
eram consideradas legalmente inferiores. As mulheres deti-
nham um papel definido no âmbito doméstico, sendo-lhes os
principais: o lar e a igreja, persistindo ainda a submissão ao
pai, ao marido e à religião. Válido destacar que as mulheres
escravizadas enfrentaram uma dupla opressão, sofrendo tanto
a exploração de gênero quanto a opressão racial, embora as
mulheres de elite colonial ainda possuíssem privilégios, estas
estavam sujeitas às restrições da época.
O poder patriarcal da Idade Média vigorou no Brasil,
essa legislação conservadora permitia, por exemplo, o uso de
castigos corporais contra as mulheres sem que houvesse san-
ções para coibi-los. O marido tinha o poder patriarcal, e a mu-
lher precisava de sua autorização para realizar os atos civis
mais simples.
Pode-se afirmar que, inicialmente, o controle masculino
era exercido por meio da força física, e ao mesmo tempo, mé-
todos mais sofisticados de dominação foram introduzidos,

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

como leis, costumes, religião, filosofia, ciência e política. Es-


ses elementos foram utilizados como instrumentos de submis-
são e controle das mulheres.
No entanto, ao longo do tempo, as mulheres lutaram
por seus direitos e por proteção contra a violência. No século
XIX, as mulheres começaram a se organizar em movimentos
pelos direitos das mulheres e a demandar mudanças na lei e
na política para proteger as mulheres da violência.
Através da União Nacional das Sociedades de Mulhe-
res, registrada em 1897, e da União Social e Política das Mu-
lheres, fundada em 1903, as mulheres começaram a assumir
novos papéis na sociedade. No entanto, foi durante a Primeira
Guerra Mundial, que ocorreu de 1914 a 1918, que a presença
feminina ganhou maior visibilidade. As mulheres foram convo-
cadas para ocupar quase todas as funções anteriormente
exercidas por homens, que estavam combatendo nos campos
de batalha. Essa participação das mulheres na guerra impul-
sionou mudanças legislativas em vários países, reconhecendo
seus direitos. Após o fim da guerra, muitos países promove-
ram reformas legislativas que concederam às mulheres o di-
reito ao voto, como ocorreu em países como o Reino Unido
(1918), Alemanha (1918), Áustria (1919) e Estados Unidos
(1920).
Após a Segunda Guerra Mundial, as conquistas das

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

mulheres receberam reconhecimento universal, a guerra pro-


porcionou uma nova oportunidade para as mulheres demons-
trarem sua capacidade e habilidades em várias áreas, inclu-
indo o trabalho industrial, os serviços de saúde, a comunica-
ção e os esforços de resistência. Essa participação ativa levou
a uma mudança de percepção sobre o papel e o potencial das
mulheres, quebrando estereótipos tradicionais de gênero.
Além disso, o avanço dos Direitos Humanos e sua in-
ternacionalização, por meio da fundação das Nações Unidas
e a adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos
pela Assembleia Geral da ONU, contribuíram para a consa-
gração dos direitos das mulheres. Em 1946, foi fundada a Co-
missão da Condição Jurídica e Social da Mulher, um órgão da
ONU dedicado especificamente à promoção dos direitos das
mulheres.
Na década de 1970, a violência contra as mulheres foi
reconhecida como uma questão de direitos humanos, e a Con-
venção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discrimi-
nação contra as Mulheres (CEDAW) foi adotada pela Assem-
bleia Geral das Nações Unidas em 1979. A CEDAW é um tra-
tado internacional que exige que os Estados signatários to-
mem medidas para prevenir e erradicar a violência contra as

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

mulheres e garantir que as mulheres tenham igualdade de di-


reitos. O Estado brasileiro ratificou a Convenção da Mulher em
1984.
O Brasil, por ser um Estado Membro da Convenção de
Viena, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto
de San José da Costa Rica), da Convenção de Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher, da Con-
venção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Vio-
lência Contra a Mulher, pode sofrer penalizações internacio-
nais caso descumpra o fixado pelos referidos tratados e con-
venções internacionais (Silva et al, 2017).
Em 26 de dezembro de 1977, finalmente foi sancionada
a lei que instituiu o divórcio no país, resultado de uma emenda
proposta pelo Senado, a Lei 6.515/1977 Lei do Divórcio, que
auxiliou na criação de uma mudança na cultura brasileira em
relação à violência doméstica. Em 1988, com a promulgação
da Constituição atual, foram reforçadas as garantias de igual-
dade de gênero e foram estabelecidos direitos trabalhistas es-
pecíficos para as mulheres.
Em 1994, foi criada a Lei dos Crimes de Violência Do-
méstica e Familiar contra a Mulher, que estabelece penas
mais severas para agressores e tornou a violência doméstica
um crime inafiançável. A Constituição de 1988 também reco-

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

nhece a violência doméstica como um problema sério e deter-


mina que o Estado adote medidas para combatê-la. Nesse
sentido, foi promulgada a Lei Maria da Penha em 2006, que
estabelece medidas de proteção e punição para casos de vio-
lência doméstica e familiar contra as mulheres, sendo uma das
legislações mais avançadas do mundo no que se refere à pro-
teção da mulher.
Embora a Constituição de 1988 tenha trazido avanços sig-
nificativos para os direitos das mulheres no Brasil, ainda exis-
tem desafios a serem superados. A efetiva implementação das
políticas e leis relacionadas aos direitos das mulheres, junta-
mente com a conscientização e combate às desigualdades de
gênero, são questões cruciais para alcançar uma sociedade
verdadeiramente igualitária. A luta pela igualdade de gênero
continua, impulsionada pela visão de justiça e igualdade pre-
sente na Constituição Cidadã.

2.1.1 LEI 11.340/2006: UM AVANÇO À PROTEÇÃO DA MU-


LHER

A Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Pe-


nha, recebeu essa nomenclatura em virtude do ocorrido com
a farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, esta que teve

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sua vida mudada quando conheceu Marco Antônio Heredia Vi-


veros, um colombiano, durante seu período de mestrado na
Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de
São Paulo em 1974. Naquela época, Marco Antônio estava
estudando Economia como pós-graduando na mesma institui-
ção. O relacionamento entre eles começou naquele ano, e
Marco Antônio mostrava-se uma pessoa gentil, educada e so-
lidária com todos ao seu redor. Em 1976, eles se casaram.
Após o nascimento da primeira filha e a conclusão do mes-
trado de Maria da Penha, o casal decidiu se mudar para For-
taleza, onde nasceram suas outras duas filhas. Foi a partir
desse momento que a história deles tomou um rumo diferente.
Infelizmente, a situação entre Maria da Penha e Marco
Antonio começou a deteriorar-se após ele obter a cidadania
brasileira e alcançar estabilidade profissional e financeira. As
agressões físicas e psicológicas tornaram-se uma realidade
na vida de Maria da Penha e de suas filhas, causando um am-
biente de medo e violência dentro de casa. A situação era ex-
tremamente prejudicial para a saúde e o bem-estar de todos
os membros da família, deixando marcas profundas.
No ano de 1983, Maria da Penha foi vítima de uma ter-
rível dupla tentativa de feminicídio perpetrada por Marco Antô-
nio Heredia Viveros. Nesse trágico episódio, ele disparou um

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

tiro em suas costas enquanto ela estava dormindo. Como re-


sultado dessa brutal agressão, Maria da Penha ficou paraplé-
gica devido a lesões irreversíveis nas terceira e quarta vérte-
bras torácicas, além de ter sofrido laceração na dura-máter e
destruição de um terço da medula esquerda. Além dessas
complicações físicas, ela também enfrentou traumas psicoló-
gicos profundos em decorrência desse ataque. Infelizmente, a
violência contra Maria da Penha não parou por aí. Quatro me-
ses após as agressões iniciais, quando ela retornou para casa
após passar por duas cirurgias, internações e tratamentos,
Marco Antônio a manteve em cárcere privado durante 15 dias.
Além disso, ele tentou eletrocutá-la durante o banho, demons-
trando uma escalada ainda mais perigosa e cruel de sua vio-
lência.
Conscientes da gravidade da situação enfrentada por
Maria da Penha, sua família e amigos desempenharam um
papel crucial ao fornecerem apoio jurídico e emocional. Eles
conseguiram organizar uma estratégia para permitir que Maria
da Penha saísse de casa sem que isso fosse interpretado
como abandono de lar, evitando assim o risco de perder a
guarda de suas filhas.
O primeiro julgamento de Marco Antônio ocorreu so-
mente em 1991, oito anos após o crime. Apesar de ter sido
condenado a 15 anos de prisão, devido a recursos solicitados

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

pela defesa, ele saiu do fórum em liberdade. Essa situação


trouxe ainda mais sofrimento e frustração para Maria da Pe-
nha, que estava determinada a buscar justiça. O segundo jul-
gamento ocorreu somente em 1996, no qual Marco Antônio foi
condenado a 10 anos e 6 meses de prisão. No entanto, mais
uma vez, sob a alegação de irregularidades processuais por
parte dos advogados de defesa, a sentença não foi cumprida.
Essa nova frustração reforçou a determinação de Maria da Pe-
nha em buscar justiça plena e garantir que seu agressor fosse
responsabilizado pelos seus atos.
O ano de 1998 foi um marco importante para o caso de
Maria da Penha, pois ele ganhou repercussão internacional.
Maria da Penha, juntamente com o Centro para a Justiça e o
Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino-americano e do
Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM), de-
nunciaram o caso à Comissão Interamericana de Direitos Hu-
manos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA).
Essa denúncia tinha como base a grave violação dos direitos
humanos e dos deveres protegidos por tratados internacionais
que o Estado brasileiro havia assinado, tais como a Conven-
ção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José
da Costa Rica), a Declaração Americana dos Direitos e Deve-
res do Homem, a Convenção Interamericana para Prevenir,
Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Belém do Pará) e a Convenção sobre a Eliminação de Todas


as Formas de Discriminação contra a Mulher. Apesar da gra-
vidade do caso e do litígio internacional, o Estado brasileiro
manteve-se omisso e não se pronunciou em nenhum mo-
mento durante o processo. Essa omissão por parte do Estado
evidenciou a necessidade de pressão e mobilização para que
se fizesse justiça e fossem tomadas medidas efetivas para
combater a violência contra a mulher no país.
Em 2001, após receber quatro ofícios da CIDH/OEA no
período de 1998 a 2001 e permanecer em silêncio diante das
denúncias e do litígio internacional, o Estado brasileiro foi res-
ponsabilizado pela Comissão Interamericana de Direitos Hu-
manos por negligência, omissão e tolerância em relação à vi-
olência doméstica praticada contra as mulheres brasileiras.
Evidenciando a falta de ação efetiva do Estado na proteção
das mulheres vítimas de violência doméstica e a necessidade
urgente de implementação de medidas para combater esse
grave problema.
Em 7 de agosto de 2006, o então presidente Luiz Inácio
Lula da Silva sancionou a Lei nº 11.340, mais conhecida como
Lei Maria da Penha. Essa lei foi resultado de debates e dis-
cussões intensas entre o Legislativo, o Executivo e a socie-
dade, e teve como objetivo principal promover a proteção e o
combate à violência doméstica e familiar contra as mulheres.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Entende-se que a Lei Maria da Penha tem como obje-


tivo primordial erradicar a violência doméstica e familiar contra
a mulher, estabelecendo medidas de assistência e proteção.
Essa lei busca intimidar os agressores, tornando-os cientes
das consequências de seus atos e promovendo a prevenção
desse crime. A mulher, assim como qualquer pessoa, possui
direitos fundamentais inerentes à sua condição humana. A lei
reconhece e assegura a ela oportunidades e facilidades para
viver sem violência, preservar sua saúde física e mental, além
de buscar seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.
Essa premissa se inicia no artigo 1° da Lei 11.340/06

Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e


prevenir a violência doméstica e familiar contra
a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da
Constituição Federal, da Convenção sobre a Eli-
minação de Todas as Formas de Violência con-
tra a Mulher, da Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a
Mulher e de outros tratados internacionais ratifi-
cados pela República Federativa do Brasil; dis-
põe sobre a criação dos Juizados de Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabe-
lece medidas de assistência e proteção às mu-
lheres em situação de violência doméstica e fa-
miliar. (Brasil, 2006).

Desde então, houve avanços significativos na proteção


dos direitos das mulheres e na prevenção da violência contra

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

elas. Cabe ressaltar que essa lei foi reconhecida pela Organi-
zação das Nações Unidas (ONU) como uma das três melhores
legislações do mundo no enfrentamento à violência contra as
mulheres, uma vez que foram criados mecanismos para coibir
a violência doméstica e familiar, reconhecendo a importância
da família. Várias convenções, leis e políticas internacionais e
nacionais foram criadas para garantir a proteção e o empode-
ramento das mulheres, bem como a punição dos agressores
(Carneiro, 2010).
No entanto, por meio de inúmeras lutas, tem havido pro-
gressos significativos na busca por conquistas importantes,
permitindo que as mulheres se libertem da obscuridade e do
anonimato.

2.2 AVALIAR A EFICÁCIA DESSAS MEDIDAS NA PROTE-


ÇÃO À VÍTIMA.

A lei 11.340/2006 representa um marco importante no


reconhecimento da situação de vulnerabilidade das mulheres,
destacando a violência doméstica e familiar como uma forma
de violação dos direitos humanos. No entanto, observa-se que
a própria legislação pode apresentar equívocos em relação ao
procedimento judicial, o que pode representar um desafio na

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

aplicação de medidas punitivas contra um agressor que tenha


sido definitivamente condenado pelo crime.
Uma das formas previstas na lei é a aplicação de medi-
das protetivas de urgência, que podem ser concedidas pelo
juiz com o objetivo de garantir a segurança da vítima. Con-
forme descrito no Artigo.22 da referida Lei

Art. 22. Constatada a prática de violência do-


méstica e familiar contra a mulher, nos termos
desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao
agressor, em conjunto ou separadamente, as se-
guintes medidas protetivas de urgência, entre ou-
tras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de
armas, com comunicação ao órgão competente,
nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro
de 2003;
II - Afastamento do lar, domicílio ou local de con-
vivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as
quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e
das testemunhas, fixando o limite mínimo de dis-
tância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e tes-
temunhas por qualquer meio de comunicação;
c) frequentação de determinados lugares a fim
de preservar a integridade física e psicológica da
ofendida;
IV - Restrição ou suspensão de visitas aos de-
pendentes menores, ouvida a equipe de atendi-
mento multidisciplinar ou serviço similar;
V - Prestação de alimentos provisionais ou provi-
sórios.
VI – Comparecimento do agressor a programas
de recuperação e reeducação; e (Incluído pela
Lei nº 13.984, de 2020)

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

VII – acompanhamento psicossocial do agressor,


por meio de atendimento individual e/ou em
grupo de apoio. (Brasil, 2006).

No entanto, a eficácia das medidas protetivas da Lei


Maria da Penha tem sido objeto de debate e estudo por parte
de diversos pesquisadores e instituições. Algumas fontes indi-
cam que a aplicação das medidas protetivas pode ter um efeito
positivo na prevenção da violência doméstica e na proteção da
vítima. Um estudo realizado pelo Conselho Nacional de Jus-
tiça (CNJ) em 2019 analisou o cumprimento das medidas pro-
tetivas em diversos estados brasileiros e concluiu que a apli-
cação dessas medidas contribui para a redução da violência
contra a mulher. Segundo a pesquisa, as medidas protetivas
foram efetivas em 87,4% dos casos analisados.
No entanto, outras análises apontam que as medidas
protetivas nem sempre são eficazes na prevenção da violência
doméstica. Outro estudo, realizado pela Universidade de São
Paulo (USP) em parceria com a Universidade de Harvard,
identificou que a maioria das mulheres que foram vítimas de
violência doméstica e receberam medidas protetivas ainda as-
sim sofreram novas agressões. De acordo com o estudo, a
eficácia das medidas protetivas depende de diversos fatores,
como o contexto social e cultural em que a violência ocorre, a
qualidade do atendimento prestado às vítimas e a capacidade

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

das instituições de garantir a aplicação e o cumprimento das


medidas protetivas.
E apesar desses avanços legislativos, a violência do-
méstica no Brasil continua sendo um problema grave. De
acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Apli-
cada (IPEA), uma mulher é agredida a cada quatro minutos no
país. Além disso, o Brasil ocupa o 5º lugar no ranking mundial
de feminicídio, segundo o ACNUDH- Alto Comissariado das
Nações Unidas para os Direitos Humanos (ONU, 2016).
De acordo com o Ministério da Mulher, da Família e dos
Direitos Humanos, em 2020, mais de 105 mil denúncias de vi-
olência contra a mulher foram registradas, a maioria das de-
núncias tem como vítimas mulheres declaradas como de cor
parda de 35 a 39 anos. Do total de registros, 72% (75,7 mil
denúncias) são referentes a violência doméstica e familiar con-
tra a mulher (Gov.br, 2021).
Seguindo um novo levantamento, uma em cada qua-
tro mulheres acima de 16 anos afirma ter sofrido algum tipo de
violência. O índice de 24,4% é inferior ao da pesquisa anterior,
em que 27,4% relataram variadas formas de abuso. Contudo,
houve um aumento nos casos em que o crime foi cometido
dentro de casa. As agressões em ambiente foi de 42% em
2019 e 48,8% em 2020, enquanto as violências sofridas nas
ruas foram de 29% para 19%. (IBDFAM, 2021).

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Os dados apresentados no relatório Visível e Invisível:


a vitimização de mulheres no Brasil, 4ª edição - 2023", do Fó-
rum Brasileiro de Segurança Pública, são extremamente pre-
ocupantes. Eles revelam a dimensão alarmante da violência
enfrentada pelas mulheres no país. Segundo o relatório, mais
de 50.962 mulheres foram vítimas de violência diariamente em
2022, o que equivale a um estádio lotado. Dentro desse grupo,
28,9% sofreram algum tipo de violência ou agressão, totali-
zando 18,6 milhões de mulheres.
As estatísticas detalhadas revelam os diferentes tipos
de violência sofridos pelas mulheres. É alarmante que 14,9 mi-
lhões de mulheres tenham sido vítimas de ofensas verbais, 8,7
milhões de perseguição, 7,6 milhões de chutes e socos (equi-
valente a 14 mulheres agredidas por minuto), 3,5 milhões de
espancamento ou tentativa de estrangulamento, e 3,3 milhões
de ameaças com faca ou arma de fogo. Esses números de-
monstram a magnitude da violência de gênero e a necessi-
dade de ações efetivas para combatê-la. (Fórum Brasileiro de
Segurança Pública, 2023).
Cresceram também os casos em que o agressor são
companheiros, namorados e ex-parceiros. Com as mulheres
acima de 50 anos, há maior aparição de filhos e enteados nos
casos de violência.

66
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Importante salientar, que a violência doméstica é com-


posta por um ciclo progressivo e pode se manifestar de diver-
sas formas, conforme estabelecido pela Lei 11.340/06, em seu
artigo 7º, sendo

Art. 7º São formas de violência doméstica e fa-


miliar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer
conduta que ofenda sua integridade ou saúde
corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qual-
quer conduta que lhe cause dano emocional e di-
minuição da autoestima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise
degradar ou controlar suas ações, comporta-
mentos, crenças e decisões, mediante ameaça,
constrangimento, humilhação, manipulação, iso-
lamento, vigilância constante, perseguição con-
tumaz, insulto, chantagem, violação de sua inti-
midade, ridicularização, exploração e limitação
do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que
lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à auto-
determinação; (Redação dada pela Lei nº
13.772, de 2018).
III - a violência sexual, entendida como qualquer
conduta que a constranja a presenciar, a manter
ou a participar de relação sexual não desejada,
mediante intimidação, ameaça coação ou uso da
força; que a induza a comercializar ou a utilizar,
de qualquer modo, a sua sexualidade, que a im-
peça de usar qualquer método contraceptivo ou
que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto
ou à prostituição, mediante coação, chantagem,
suborno ou manipulação; ou que limite ou anule
o exercício de seus direitos sexuais e reproduti-
vos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qual-
quer conduta que configure retenção, subtração,

67
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

destruição parcial ou total de seus objetos, ins-


trumentos de trabalho, documentos pessoais,
bens, valores e direitos ou recursos econômicos,
incluindo os destinados a satisfazer suas neces-
sidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer
conduta que configure calúnia, difamação ou in-
júria. (Brasil, 2006).

Após expor as atitudes violentas praticadas contra as


mulheres, enquadradas no artigo acima, e analisar os núme-
ros, obtendo uma resposta preocupante, uma vez que no Bra-
sil, é alarmante constatar que 50% das pessoas conhecem
pessoalmente alguma mulher que sofreu ou ainda sofre algum
tipo de agressão por parte do atual ou do ex-companheiro.
Essa estatística reflete a extensão da violência doméstica no
país. No entanto, é preocupante notar que apenas 6% dos ho-
mens admitem ter cometido violência doméstica, sendo claro
a necessidade de também combater a negação e a minimiza-
ção da violência, promovendo uma cultura de responsabiliza-
ção e respeito (G1 Globo, 2022).
O Acre voltou a ser um dos estados com a maior taxa
de violência contra a mulher no país. Segundo o Anuário Bra-
sileiro de Segurança Pública, no ano de 2022, o estado acre-
ano registrou uma taxa de 2,7 casos de violência por 100 mil
mulheres. Os dados de 2021 apresentados pelo Anuário Bra-
sileiro de Segurança Pública destacam que foram registrados
um total de 11.190 chamados por violência doméstica através

68
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

do número de emergência 190. Isso significa que a cada dia


mais de 30 chamados foram feitos por vítimas ou por terceiros
buscando ajuda devido a episódios de violência doméstica. É
alarmante constatar esse alto número de casos, especial-
mente considerando que esse período ainda estava marcado
pela pandemia de Covid-19, que pode ter contribuído para o
aumento da violência doméstica em diversas regiões. O au-
mento de 62,5% nos chamados em relação a 2020, quando
foram registrados 6.886 chamados. (G1, Globo, 2022).

2.2.1 FORMAS DE MEDIDAS PROTETIVAS E OS


REQUISITOS

A Lei Maria da Penha, Lei n° 11.340/06, estabelece me-


didas protetivas de urgência com caráter preventivo, visando
garantir os direitos das mulheres e eliminar ou minimizar situ-
ações de risco relacionadas à violência doméstica no Brasil.
Essas medidas devem ser providenciadas pelo Poder Judiciá-
rio de forma ágil, buscando preservar a integridade física e
moral das vítimas.
Para conceder as medidas protetivas, é fundamental
observar dois requisitos no caso concreto. O primeiro é o
fumus boni iuris, que se refere à existência de indícios sufici-
entes de violência doméstica, ou seja, onde há fumaça, há

69
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

fogo. O segundo requisito é o periculum in mora, que significa


o perigo na demora da decisão judicial. Isso se relaciona ao
receio de que a demora possa causar danos graves ou de di-
fícil reparação ao bem protegido, incluindo casos em que há
risco de vida. Nesses casos, pode ser necessário aplicar o "pe-
riculum libertatis", restringindo a liberdade do potencial agres-
sor. (Nogueira, 2018).
As inovações introduzidas pelo ordenamento jurídico
brasileiro, como as medidas protetivas da Lei n° 11.340/06,
podem ser classificadas em quatro categorias principais. A pri-
meira categoria abrange as medidas protetivas que impõem
obrigações ao agressor, conforme previsto no artigo 22 da lei.
A segunda categoria engloba as medidas protetivas di-
recionadas à vítima, de caráter pessoal, estabelecidas no ar-
tigo 23. Já a terceira categoria diz respeito às medidas prote-
tivas direcionadas à vítima, de caráter patrimonial, conforme
descrito no artigo 24. Por fim, a quarta categoria compreende
as medidas direcionadas à vítima nas relações de trabalho,
conforme disposto no artigo 9º, sendo esse setor considerado
o mais criativo e elogiável da Lei Maria da Penha, pois oferece
diversas providências que podem garantir soluções viáveis
para os conflitos domésticos e patrimoniais.

70
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A Lei da violência doméstica estipula duas maneiras di-


ferentes para prisão preventiva do agressor, em caso de vio-
lência doméstica e familiar contra a mulher, existindo a previ-
são legal que está positivada nos artigos 20 e 42 deste título
penal, sendo que no primeiro a existe presunção comum para
garantir o desenrolar do processo e no último garante a exis-
tência das medidas protetivas de urgência.
Logo, é notório que em muitos casos de violência do-
méstica não são denunciados, o que significa que os números
reais podem ser ainda maiores do que os divulgados. A falta
de denúncia muitas vezes é resultado do medo das vítimas de
sofrerem retaliações do agressor ou de serem julgadas ou res-
ponsabilizadas pelo que aconteceu.
Consequentemente, ainda há muito trabalho a ser
feito para garantir que as mulheres estejam protegidas contra
a violência em todas as esferas da vida. A violência contra as
mulheres ainda é uma questão grave em muitas partes do
mundo, e é necessário um esforço contínuo para erradicá-la.

2.3 A POSSIBILIDADE DE ENDURECIMENTO DA LEGIS-


LAÇÃO PARA SUPRIR AS FALHAS NA LEI 11.340/2006.

A violência doméstica é, de fato, um problema de sa-


úde pública com consequências graves e alta incidência em

71
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

todo o mundo. No entanto, no contexto brasileiro, parece haver


dificuldades em combater efetivamente esse problema, dei-
xando as mulheres vulneráveis aos seus agressores. Apesar
das medidas protetivas de urgência estabelecidas pela Lei Ma-
ria da Penha, que foram criadas para acabar com a violência
doméstica e familiar contra a mulher, muitas vezes essas me-
didas se mostram insuficientes para protegê-las. Isso resulta
em números alarmantes de violência continuando a ocorrer no
Brasil.
Muitas vezes, o processo de solicitação e concessão
das medidas protetivas enfrenta obstáculos e demoras, o que
pode comprometer a efetividade dessas medidas. As vítimas
esperam resultados que nem sempre são alcançados, eviden-
ciando a ineficácia do sistema. Desde a fase extrajudicial, o
atendimento das autoridades policiais pode ser prejudicado
pela falta de recursos e pela sobrecarga do sistema, resul-
tando em atrasos e falta de priorização dos casos.
Essa lacuna inicial pode ter impactos significativos na
proteção das vítimas e na prevenção de episódios futuros de
violência. As falhas envolvem os poderes Executivo, Judiciário
e Ministério Público, resultando em impunidade. É importante
ressaltar que a falha não está na Lei em si, mas sim entre os
seguintes fatores, como a inexistência de infraestrutura ade-
quada, a ausência de uma rede multidisciplinar composta por

72
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

profissionais capacitados para lidar com essa demanda espe-


cífica e a necessidade de capacitação dos policiais, psicólogos
e juízes envolvidos nos casos de violência doméstica na es-
trutura e nas práticas institucionais.
É notório que mesmo quando as medidas protetivas
são concedidas dentro do prazo estabelecido, a falta de fisca-
lização do cumprimento dessas medidas representa um obs-
táculo à sua eficácia. A escassez de recursos e de efetivo po-
licial impede o policiamento frequente e o acompanhamento
contínuo das vítimas, o que contribui para que os agressores
possam reincidir na violência. A falta de estrutura adequada,
incluindo servidores e viaturas, dificulta a viabilização da fisca-
lização e do suporte necessário para acompanhar todos os ca-
sos de violência contra a mulher.
Essa deficiência compromete a capacidade do sistema
de garantir que as vítimas estejam protegidas e que os agres-
sores não voltem a violentá-las. Como resultado, muitas mu-
lheres continuam sofrendo violência doméstica, mesmo es-
tando amparadas pelo Estado por meio das medidas proteti-
vas. O descumprimento dessas medidas deixa as vítimas em
uma situação de vulnerabilidade, perpetuando o ciclo de vio-
lência.

73
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Salienta ainda, que mesmo com as medidas cautelares


impostas, soma-se a demora na sentença de julgamento com-
prometendo a eficácia da lei, fazendo com que o processo
perca sua validade. É necessário agilizar o sistema judicial
para combater a impunidade e garantir a efetiva proteção das
mulheres. Por meio de pesquisa nos sites dos Tribunais de
Justiça do país, foi constatado muitos casos em que a prescri-
ção do crime foi reconhecida devido ao longo tempo decorrido
para a proclamação da sentença. A tendência natural do
agressor é desobedecer às medidas protetivas impostas,
como a restrição de se aproximar da vítima. Da mesma forma,
a mulher pode ceder ao assédio e retornar ao ciclo de violên-
cia. É importante destacar que o agressor muitas vezes des-
cumpre a medida não com o objetivo de reatar o relaciona-
mento, mas sim para continuar com as agressões. Como ob-
servado a seguir.

APELAÇÃO. HOMICÍDIO QUALIFICADO TEN-


TADO. DECISÃO MANIFESTAMENTE CON-
TRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. PENA. 1. Pela
leitura da prova produzida na primeira fase do
Júri e, posteriormente, em Plenário, principal-
mente pelo depoimento da vítima, não há como
sustentar ter a decisão dos jurados sido contrária
à prova dos autos. Isso porque além das decla-
rações da ofendida, as demais testemunhas que
depuseram em juízo, com exceção da mãe do
réu, ouvida na condição de informante, sustenta-
ram que, embora houvesse medida protetiva da

74
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Lei Maria da Penha determinando o afastamento


do acusado de sua ex-companheira, ele foi até a
casa dela, em duas oportunidades, sendo que na
segunda arrombou a porta e tentou matá-la com
golpes de faca. A vítima conseguiu fugir pela ja-
nela, tendo o réu a perseguido e a agarrado pelo
pescoço. Nesse momento, o cunhado da ofen-
dida defendeu-a, dando um golpe com um ma-
chado na cabeça do réu. Não há que de falar em
decisão manifestamente contrária à prova dos
autos. 2. O Supremo Tribunal Federal, no Ha-
beas Corpus 111.840, por maioria de votos, de-
feriu a ordem para declarar incidenter tantum a
inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei
nº 8.072/90 com a redação dada pela Lei nº
11.464/2007. Destarte, preenchidos os pressu-
postos do artigo 33, § 2º, b, do Código Penal, im-
põe-se a fixação do regime inicial semiaberto.
APELO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação
Crime Nº 70052794880, Terceira Câmara Crimi-
nal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu
José Giacomolli, Julgado em 23/05/2013). (TJ-
RS - ACR: XXXXX RS, Relator: Nereu José Gia-
comolli, data de julgamento: 23/05/2013, Ter-
ceira Câmara Criminal, Data de Publicação: Diá-
rio da Justiça do dia 07/06/2013).

Podendo citar, os seguintes casos abaixo.

HABEAS CORPUS. LEI MARIA DA PENHA. VI-


OLÊNCIA DOMÉSTICA. DEFERIMENTO DE
MEDIDAS PROTETIVAS EM FAVOR DA VÍ-
TIMA. RECONDUÇÃO DA VÍTIMA AO LAR.
AFASTAMENTO DO PACIENTE DO LAR. PRO-
IBIÇÃO DE SE APROXIMAR DA VÍTIMA. EXIS-
TÊNCIA DOS REQUISITOS. DECISÃO FUNDA-
MENTADA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
INEXISTÊNCIA. - A Decisão que concedeu me-
dida protetiva desfavorável ao paciente se en-
contra fundamentada, devendo ser afastado o ar-
gumento de constrangimento ilegal com o qual

75
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ele pretende a sua revogação, ante a ausência


de fundamentação. - Habeas Corpus denegado.
- Comprovado que o paciente vem praticando,
reiteradamente, violência doméstica contra sua
esposa, descumprindo as medidas protetivas,
não há que se falar em desproporcionalidade na
decretação das medidas protetivas em seu des-
favor, pelo contrário, há estrita obediência ao que
dispõe a atual legislação penal. -Pela denegação
da ordem. (Relator (a): Desª. Denise Bonfim;
Comarca: Rio Branco; Número do Processo:
1001146-26.2021.8.01.0000; Órgão julgador:
Câmara Criminal; Data do julgamento:
17/08/2021; Data de registro: 17/08/2021).

HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. LEI


MARIA DA PENHA. AMEAÇA. DESCUMPRI-
MENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS ANTERI-
ORMENTE IMPOSTAS. REITERAÇÃO. GA-
RANTIA DA ORDEM PÚBLICA. FUNDAMENTA-
ÇÃO IDÔNEA. DENEGAÇÃO DA ORDEM.
APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES.
NÃO SUFICIENTES. Conforme previsto no Art.
313, do Código de Processo Penal, nas hipóte-
ses de violência doméstica e familiar contra a
mulher, caberá a prisão preventiva para assegu-
rar a eficácia das medidas protetivas de urgên-
cia, quando essas se revelarem ineficazes para
a proteção da vítima. Presentes os requisitos
para a decretação da custódia preventiva, inca-
bível a aplicação de medidas cautelares alterna-
tivas à prisão. As condições pessoais no que se
refere à trabalho certo e definido, com endereço
determinado não exime a necessidade da prisão
preventiva quando presentes os requisitos ense-
jadores. Habeas Corpus conhecido e denegado.
(Relator (a): Desª. Denise Bonfim; Comarca: Rio
Branco; Número do Processo:1000140-
81.2021.8.01.0000; Órgão julgador: Câmara Cri-
minal;Data do julgamento: 15/03/2021; Data de
registro: 15/03/2021).

76
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

No que se refere às vítimas de violência de gênero, é


de suma importância o comprometimento dos profissionais
das DEAM’s em cada atendimento, uma vez que as Delega-
cias Especializadas de Atendimento à Mulher - DEAMs repre-
sentaram uma experiência pioneira e genuinamente brasileira
desde sua criação. Elas desempenham um papel fundamental
ao dar visibilidade ao problema da violência contra a mulher,
especialmente aquela que ocorre no ambiente doméstico e
nas relações conjugais e familiares. As DEAMs contribuíram
para o reconhecimento, por parte da sociedade, da natureza
criminosa da violência baseada em diferenças de gênero, à
qual as mulheres estavam submetidas.
Essas unidades especializadas são importantes na pro-
moção da proteção e da busca por justiça para as vítimas de
violência doméstica, além de desempenharem um papel es-
sencial na conscientização e no combate a esse grave pro-
blema social, contudo muitas vezes não ocorre como descrito.
As delegacias especializadas, são uma porta de entrada para
o atendimento das vítimas, dessa forma deve ser um local
onde as mulheres deveriam ser “consideradas como sujeito de
direitos e merecedoras de atenção”. Os policiais que propiciam
o atendimento a essas mulheres precisam ouvir atentamente,
profissionalmente e ser bastante observador, para possibilitar
o “rompimento do silêncio, do isolamento destas mulheres e,

77
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

em especial, dos atos de violência, aos quais estão submeti-


das”.
No entanto, é importante mencionar que, em algumas
ocasiões, esse atendimento pode se tornar hostil e intensificar
a violência sofrida, devido à falta de preparo de alguns profis-
sionais que atuam nas Delegacias Especializadas de Atendi-
mento à Mulher. Esses profissionais muitas vezes não pos-
suem as qualificações específicas necessárias para desempe-
nhar suas funções adequadamente dentro de uma DEAM,
onde mulheres em situação de violência procuram ajuda.
Podendo citar os fatos relatados pelas vítimas,

“Você tem certeza de que vai mesmo denunciar


o pai do seu filho? Isso pode prejudicar ele”. É
essa frase que A.S., de 32 anos, relata ter ouvido
do policial que a atendeu, em dezembro de 2015,
quando tentava, com o braço roxo, denunciar um
segundo episódio de violência física envolvendo
o ex-companheiro. Para piorar, o episódio acon-
teceu numa Delegacia de Atendimento à Mulher
(DEAM) do Centro do Rio. No Dia Internacional
da Mulher (8), assim como A.S., outras mulheres
que denunciaram agressões fazem uma se-
gunda denúncia ao G1: são recorrentes os casos
de tratamento hostil ou pouco acolhedor na hora
de registrar agressões em delegacias do Rio, in-
clusive nas especializadas. A.S., que prefere não
ser identificada, afirma que se sentiu desestimu-
lada em levar a denúncia adiante. “Primeiro que
quem me atendeu foi um homem, o que já não
tem sentido, e ele foi muito babaca. Já tinha sido
muito difícil decidir fazer a denúncia e eu senti
que ele estava me desestimulando, me pergun-
tou três vezes se eu tinha certeza, chorei muito”,

78
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

a lembra, moradora de Jacarepaguá, na Zona


Oeste (G1, 2016).

Acrescentando também as atribuições das DEAM´s, po-


demos ressaltar que “atividade investigativa é parte funda-
mental do inquérito policial e deve, portanto, ser empreendida
e coordenada pela autoridade policial responsável pelo inqué-
rito”. É crucial ressaltar que o acolhimento às vítimas de vio-
lência doméstica deve ser caracterizado pela privacidade e
sensibilidade.
É notório a real e essencial necessidade de investir em
recursos adequados, capacitação e sensibilização dos profis-
sionais responsáveis por lidar com os casos de violência do-
méstica, para garantir um atendimento adequado e empático,
contribuindo para a eficácia das medidas de proteção e para o
apoio às vítimas de violência doméstica. Além disso, é indis-
pensável aprimorar os mecanismos de monitoramento para
garantir o cumprimento efetivo das medidas protetivas e a se-
gurança das vítimas. Para evitar a falta de efetivação das me-
didas protetivas, comprometendo assim sua eficácia. O com-
promisso do Estado é fundamental para que a Lei Maria da
Penha seja efetivamente aplicada e que as vítimas recebam a
proteção e o suporte necessários.
Ao longo dos anos, surgiram diferentes formas de cum-
primento de penas. Com o avanço tecnológico, surgiu uma

79
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

modalidade de monitoramento do detento por meio do monito-


ramento eletrônico: um dispositivo eletrônico colocado no tor-
nozelo do acusado que permite a fiscalização das suas ativi-
dades à distância.
Nesse contexto, a Constituição Federal de 1988 prevê,
em seu artigo 226, parágrafo 8º, a criação de mecanismos
para combater a violência doméstica e familiar contra a mu-
lher. Ela estabelece que o Estado tem a responsabilidade de
garantir assistência a todos os membros que compõem o am-
biente familiar, devendo criar dispositivos para reprimir a vio-
lência no âmbito doméstico. Além disso, é fundamental investir
em programas de prevenção, educação e conscientização que
promovam a igualdade de gênero, desconstroem estereótipos
prejudiciais e ensinem sobre relacionamentos saudáveis e
respeitosos. A redução efetiva da violência doméstica requer
um compromisso sério do governo brasileiro, da sociedade
como um todo e da implantação de políticas e práticas que
garantam a proteção das mulheres e a responsabilização dos
agressores. Somente assim poderemos alcançar um país
onde todas as mulheres possam viver livres de violência.
No Brasil, seria altamente benéfica a eficácia de um sis-
tema de avaliação de risco para casos de violência doméstica
contra a mulher. Podemos citar o com destaque nesse con-

80
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

texto, é o Botão do Pânico, desenvolvido pela desembarga-


dora Hermínia Maria em parceria com o Instituto Nacional de
Tecnologia Preventiva e o Tribunal de Justiça do Espírito
Santo. Esse dispositivo permite que mulheres em situação de
risco acionem a polícia e possa ser utilizado como meio de
prova em processos criminais.
Conforme descrito no encarte fornecido pelo Instituto
Nacional de Tecnologia Preventiva - INTP, a entrega dos dis-
positivos de segurança segue um procedimento específico.
Primeiro, a vítima que teve o botão do pânico deferido é ca-
dastrada no sistema Skybox16, onde são registradas diversas
informações pessoais que permitem um melhor atendimento
em casos de acionamento. Isso inclui fotos e endereços tanto
da vítima quanto do agressor, bem como a verificação de ima-
gens através do Google Street View e telefones de contato da
vítima e de parentes próximos.
Após receber o botão do pânico, a vítima é orientada
pela equipe do INTP sobre como utilizar o aparelho, incluindo
manuseio, carregamento e transporte, e é informada sobre as
consequências após o acionamento. Um termo de adesão e
responsabilidade é gerado pelo sistema Skybox, e a vítima
deve assiná-lo, comprometendo-se a fazer um uso adequado
do dispositivo.

81
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

No caso de violação da medida protetiva ou em iminên-


cia de agressão à vítima, a mulher pode acionar o botão do
pânico pressionando-o por 3 segundos. Isso enviará um sinal
para os smartphones das Patrulhas Maria da Penha e para a
Central, que serão responsáveis por atender a ocorrência e
garantir a integridade da vítima.
Ao acionar o botão, a central de controle é alertada, en-
viando imediatamente uma equipe ao local e iniciando a gra-
vação de áudio do ambiente, permitindo que os controladores
acompanhem em tempo real o que está ocorrendo no local.
Paralelamente, os policiais designados para o caso recebem
um alerta em seus dispositivos móveis para que a viatura mais
próxima se dirija prontamente ao local dos fatos.
A adoção do procedimento do botão do pânico pelo Go-
verno dos Estados e pelo Judiciário de todo o Brasil é consi-
derado uma medida importante para garantir o respeito e a
segurança das mulheres, além de combater a impunidade e
reduzir os altos índices de criminalidade contra elas. É neces-
sário implementar mecanismos eficientes para prevenir a
ocorrência de delitos contra as mulheres, permitindo que os
agentes de segurança cheguem antecipadamente a locais
onde possíveis agressões possam ocorrer. Essa abordagem
proativa pode desempenhar um papel significativo na proteção
das vítimas e na responsabilização dos agressores.

82
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Podendo citar ainda a utilização do monitoramento ele-


trônico como uma maneira de fiscalizar e amparar a vítima. A
autora Alice Bianchini (2014) aduz sobre a monitoração eletrô-
nica enquanto medida de significativa eficácia e sugere o se-
guinte questionamento: como fiscalizar o cumprimento das
Medidas Protetivas? Como uma possível resposta temos a
monitoração enquanto “forma eficaz de atentar aos sinais de
perigo que podem levar a novos episódios de violência, bem
como, meio de responsabilizar o agressor, e não a vítima, pelo
afastamento” (BianchiniI, 2014, p.191).
Como dito por Bianchini (2014) a aplicação destas tec-
nologias, seria mais um fator coercitivo para garantir a obedi-
ência das medidas pelo agressor, evitando sua prisão preven-
tiva ou acusação por crime de desobediência. Nesse sentido
e com esse intuito, alguns países passaram a adotar o moni-
toramento eletrônico buscando maior efetivação das medidas
de afastamento em casos de violência doméstica. A autora su-
pracitada traz os Estado Unidos e Portugal como exemplo, o
primeiro, aplica a monitoração eletrônica em casos de violên-
cia doméstica em 17 Estados, enquanto o segundo, prevê
essa utilização desde 2009, com a condição de que agressor
e vítimas deem seus respectivos consentimentos, com o es-
copo de evitar encontros malquistos e inseguros entre eles.

83
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A monitoração eletrônica está prevista no Processo Pe-


nal enquanto medida cautelar, podendo ser usada para três
fins: a detenção, para manter o indivíduo em lugar predetermi-
nado; a restrição, para que o indivíduo não frequente determi-
nados lugares ou se aproxime de determinadas pessoas e; a
vigilância, com a finalidade de manter a monitoração contínua
do indivíduo, mas sem restrições quanto a locais ou pessoas
(Mariath, 2007). Por essas finalidades, a justiça passou a apli-
car a monitoração eletrônica no âmbito das Medidas Proteti-
vas de Urgência, posto que, diante da necessidade de prote-
ção da vítima de violência doméstica e familiar de forma mais
efetiva, tal medida possibilita um maior controle sob o agres-
sor.
Logo, “o equipamento individual de monitoração – tor-
nozeleira – utilizado pelo autor de violência permite acompa-
nhar sua geolocalização em tempo real através de sistemas
de 39 informações” (Pimenta, 2018). Para que isso seja pos-
sível, são criadas áreas de exclusão, ou seja, locais que o mo-
nitorado não pode adentrar, como por exemplo, a faculdade
ou trabalho da ofendida e de seus familiares, para preservar-
lhes a integridade física e psicológica destes. Essas áreas são
determinadas por decisão judicial. O acusado fica sob acom-
panhamento 24h por dia, o sistema de monitoração avisa a

84
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Central sobre eventual aproximação das áreas proibidas, que


serão informadas ao juiz como violação (Pimenta, 2018).
Embora essa seja uma iniciativa louvável, existem al-
guns desafios e possíveis ineficiências associadas a esse re-
curso, sendo elas as limitações tecnológicas, por depender do
sistema utilizado, pode haver limitações em termos de alcance
do sinal, conexão com a internet ou funcionamento adequado
do dispositivo.
Essas limitações podem comprometer a eficácia do
alerta em emergências. Podendo citar também a dependência
de terceiros, em alguns casos, o acionamento do botão da vida
pode depender de outras pessoas, como operadores de cen-
trais de atendimento, para responder ao alerta.
A demora na resposta ou a falta de profissionais dispo-
níveis no momento podem prejudicar a efetividade da medida.
Acrescentando a falta de conscientização e adesão, pois mui-
tas mulheres em situação de violência podem não estar cien-
tes da existência do "botão da vida" ou não saberem como
utilizá-lo adequadamente. Além disso, algumas vítimas podem
ter receio de acionar o alerta devido a possíveis retaliações
por parte do agressor.
As limitações da abordagem, o "botão da vida" pode ser
uma medida reativa, voltada para situações de emergência
imediata. No entanto, não aborda necessariamente as causas

85
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

subjacentes da violência doméstica ou oferece suporte contí-


nuo às vítimas. Por fim, a dependência de infraestrutura e re-
cursos adequados, pois para que o "botão da vida" funcione
de forma eficaz, é necessário contar com uma infraestrutura
adequada, como uma central de atendimento disponível 24
horas e profissionais treinados para lidar com situações de vi-
olência doméstica. A falta desses recursos pode comprometer
a resposta e o suporte adequado às vítimas.
Com isso, é possível considerar a possibilidade de revi-
sões e atualizações para fortalecer a proteção das vítimas e
combater a impunidade. Alguns aspectos que poderiam ser
considerados para um possível endurecimento da legislação
são: Ampliação das medidas protetivas, podendo ser avalia-
das a inclusão de novas medidas protetivas de urgência, como
a criação de áreas de exclusão para o agressor, proibição de
comunicação por qualquer meio, ou restrição de posse de ar-
mas de fogo.
O aumento das penas, devendo ser avaliado a possibi-
lidade de aumentar as penas para os crimes de violência do-
méstica, especialmente nos casos de lesões graves, tentativa
de feminicídio e a consumação do feminicídio. Agilização dos
processos judiciais, buscando formas de agilizar os processos
judiciais relacionados à violência doméstica, a fim de garantir
uma resposta rápida e efetiva às vítimas, evitando a prescrição

86
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

dos crimes.
Melhoria na fiscalização do cumprimento das medidas,
reforçando a fiscalização do cumprimento das medidas prote-
tivas de urgência, por meio de um acompanhamento mais efe-
tivo por parte das autoridades responsáveis.
Fortalecimento da rede de apoio, investindo em progra-
mas de capacitação para profissionais que atuam na rede de
apoio às vítimas, como policiais, promotores, juízes, assisten-
tes sociais e psicólogos, para garantir um atendimento mais
qualificado e sensível às necessidades das vítimas.
É importante ressaltar que qualquer modificação na le-
gislação deve ser discutida amplamente, levando em conside-
ração diferentes perspectivas, como os direitos das vítimas, os
princípios do devido processo legal e o respeito aos direitos
humanos. Além disso, é fundamental que as medidas sejam
acompanhadas de investimentos em políticas públicas e na
estrutura necessária para sua efetiva implementação.
Dessa forma, a ineficácia na implantação das medidas
protetivas destaca a importância de uma abordagem abran-
gente e coordenada, envolvendo diversos setores da socie-
dade, como as instituições de justiça, as forças policiais e os
órgãos de assistência social. Somente com uma resposta in-
tegrada e eficiente será possível garantir a plena proteção e o
apoio necessário às vítimas de violência doméstica.

87
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

É fundamental que a sociedade e as autoridades este-


jam atentas e trabalhem em conjunto para combater a violên-
cia doméstica, oferecendo suporte às vítimas e punindo os
agressores. Além disso, é importante que as vítimas saibam
que não estão sozinhas e que existem recursos e organiza-
ções que podem ajudá-las a se proteger e denunciar a violên-
cia.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com presente estudo, foi realizado uma análise inicial


da história da violência contra a mulher no decorrer dos anos,
demonstrando os principais aspectos relativos à Lei 11.340 de
2006, abordando o contexto conturbado da eficácia das medi-
das protetivas na proteção à vítima, citando as formas de en-
durecimento da aplicação da Lei, bem como o endurecimento
da legislação para suprir as falhas.
No entanto, ao longo dos seus quase 17 anos de exis-
tência, essa lei tão relevante no combate à violência doméstica
não tem alcançado uma eficácia satisfatória na realidade da
sociedade brasileira, pois embora a letra da Lei seja excelente,
falta fiscalização e efetividade no cumprimento das determina-
ções da norma, tendo em vista que em muitos casos mesmo
sendo concedida a medida protetiva, as vítimas continuam à

88
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

mercê de seus agressores, não raras às vezes algumas mu-


lheres são assassinadas pelo seu algoz, gerando na socie-
dade um clima de ineficácia e impunidade, ao ponto que para
algumas vítimas, a lei com suas medidas não passam de uma
folha de papel, pois mesmo existindo a medida protetiva de-
terminando o afastamento do agressor com a vítima, muitas
vezes por falta da devida fiscalização, as vítimas acabam so-
frendo violência possivelmente mais grave e até a morte.
Outro ponto que poderia ser trabalhado de modo efetivo
é a questão do desenvolvimento de trabalhos educativos, pa-
lestras e minicursos de conscientização, tanto nas instituições
de ensino, como em canais de comunicação, auxiliando a po-
pulação a reconhecer e identificar os indícios de violência, e
prevenir as possíveis agressões, com intuito de diminuir os cri-
mes de violência doméstica.
Essa medida protetiva não tem garantido a integridade da ví-
tima de violência, com o advento desta legislação, que impôs
penas mais rígidas para o agressor, não houve diminuição nos
índices de violência contra a mulher.
Considera-se também que o baixo investimento em se-
gurança pública interfere na eficácia da aplicação das medidas
protetivas. A destinação inadequada ou insuficiente de recur-
sos financeiros na área de proteção e direitos da mulher, a

89
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

falta de apoio do Estado e do judiciário na fiscalização do cum-


primento das medidas pelos agressores, e a demora na res-
posta do Ministério Público e do poder judiciário às denúncias,
inquéritos ou solicitações, são fatores que indicam a ineficiên-
cia da aplicação.
É crucial reconhecer e concordar que há uma falha a
ser corrigida para construir um futuro no qual todas as mulhe-
res possam viver com segurança, dignidade, integridade e
desfrutando plenamente de seus direitos fundamentais. Em-
bora o caminho a percorrer seja longo, é uma jornada que de-
vemos trilhar com determinação, em prol da justiça, da igual-
dade e da humanidade.

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Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Gia-
comolli, Julgado em 23/05/2013. (TJ-RS - ACR: XXXXX RS,
Relator: Nereu José Giacomolli, Data de Julgamento:
23/05/2013, Terceira Câmara Criminal, Data de Publicação:
Diário da Justiça do dia 07/06/2013)

TJ-AC HABEAS CORPUS. Nº 1001146-26.2021.8.01.0000,


Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do AC, Relator (a): Desª.
Denise Bonfim; Comarca: Rio Branco; Número do Processo:
1001146-26.2021.8.01.0000; Órgão julgador: Câmara Crimi-
nal; Data do julgamento: 17/08/2021; Data de registro:
17/08/2021.

TJ-AC HABEAS CORPUS. Nº 1000140-81.2021.8.01.0000,


Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do AC, Relator (a): Desª.
Denise Bonfim; Comarca: Rio Branco; Número do Processo:
1000140-81.2021.8.01.0000; Órgão julgador: Câmara Crimi-
nal; Data do julgamento: 15/03/2021; Data de registro:
15/03/2021.

93
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

3
ANÁLISE DA PRISÃO PERPÉTUA
NO DIREITO BRASILEIRO

ANALYSIS OF LIFE PRISONMENT


IN BRAZILIAN LAW

Thalia Milena Silva Cardoso da Mota5


Arthur Braga de Souza6

MOTA, Thalia Milena Silva Cardoso da; SOUZA, Arthur Braga.


A análise da prisão perpétua no direito brasileiro. Trabalho
de Conclusão de Curso de graduação em Direito- Centro Uni-
versitário UNINORTE, Rio Branco. 2024.

5
Discente do 9º período do curso de bacharel em Direito pelo Centro Uni-
versitário Uninorte.
6
Graduado em direito pelo Centro Universitário Uninorte. Pós-graduado
em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes. Servidor
Público Federal do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Coordenador
Adjunto e Professor do Curso de Direito do Centro Universitário Uninorte.

94
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

Introdução. O presente estudo trata da análise da prisão per-


pétua no direito brasileiro e a sua aplicação no âmbito penal,
assim como sua criação e exclusão da Constituição Federal
vigente no Brasil. Objetivo. Diante desse contexto, procedeu-
se o estudo considerando os precedentes que possibilitam a
aplicação da prisão perpétua no Brasil, em forma de medida
de segurança em casos excepcionais. Método. Através do
embasamento teórico produziu-se uma análise do Código Pe-
nal e a legislação vigente, bem como artigos que estabelecem
fatos sobre a execução da prisão perpétua, através da medida
de segurança. Resultados. De acordo com as análises reali-
zadas, foi estabelecido que a aplicação de medida de segu-
rança em casos excepcionais (inimputáveis) tem um prazo in-
determinado, ou seja, há uma analogia entre medida de segu-
rança e prisão perpétua. Conclusão. Dessa forma, a analogia
estabelecida entre prisão perpétua e medida de segurança, é
aplicada, na prática, de maneira legítima no ordenamento bra-
sileiro, levando em consideração a sua forma de aplicação
para pessoas inimputáveis.

Palavras-chave: direitos e garantias fundamentais; inimputa-


bilidade; prisão perpétua; medida de segurança.

ABSTRACT

Introduction. This study deals with the analysis of life impri-


sonment in Brazilian law and its application in the criminal
sphere, as well as its creation and exclusion from the Federal
Constitution in force in Brazil. Objective. In this context, the
study considered the precedents that make it possible to apply
life imprisonment in Brazil, in the form of a security measure in
exceptional cases. Method. An analysis of the Penal Code

95
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

and the legislation in force, as well as articles that establish


facts about the execution of life imprisonment through a secu-
rity measure, was carried out using a theoretical basis. Re-
sults. According to the analysis carried out, it was established
that the application of a security measure in exceptional cases
(incapacitated persons) has an indefinite term, i.e., there is an
analogy between a security measure and life imprisonment.
Conclusion. In this way, the analogy established between life
imprisonment and a security measure is applied in practice in
a legitimate way in the Brazilian legal system, taking into ac-
count the way it is applied to people who are incapable of being
sentenced.

Keywords: fundamental rights and guarantees; imputability;


life imprisonment; security measure.

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem o intuito de analisar a aplicação


da prisão perpétua no Brasil. Sendo uma prática vedada cons-
titucionalmente, não pode ser aplicada, porém, com estudos
realizados nota-se que há uma possibilidade de aplicação.
Diante de uma perspectiva geral, há casos de pessoas
que passam o resto da vida na prisão, não podendo sair em
liberdade. Esse fato ocorre porque o sujeito não pode, de
forma alguma, viver em sociedade, ou seja, ele oferece perigo
para si e aos demais. De acordo com esse entendimento, uma
pessoa que não pode viver em sociedade é considerada inim-
putável, ou seja, é incapaz de ser penalizada, tendo em vista

96
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

a sua situação mental e seu nível de periculosidade.


Com isso faz-se necessário uma análise da prisão per-
pétua e da medida de segurança, onde a aplicação da medida
de segurança é estabelecida de forma indeterminada, para os
inimputáveis. Além da aplicabilidade da prisão, o referido ar-
tigo descreve o conceito histórico das punições aplicadas den-
tro do âmbito penal desde a colonização do Brasil, por meio
de Dom Pedro I, descrevendo como surgiu a pena perpétua, e
a vedação dela, tendo em vista que era uma punição legal,
sendo prevista pela Constituição Federal vigente, e como ela
foi aplicada a um brasileiro.
No que diz respeito ao desenvolvimento legislativo, a
sanção penal de caráter perpétuo foi deixada de lado, não po-
dendo mais ser utilizada, contudo, sua inutilização não foi total,
ao menos, na prática. Considerando-se que no ano de 1964,
a prisão perpétua foi restabelecida, mediante um ato instituci-
onal estabelecido pelos militares visando amedrontar oposito-
res do governo. Considerando válida a aplicação da prisão
perpétua através do ato institucional estabelecido pelos milita-
res, sua execução foi oficializada no ano de 1971, sendo apli-
cada como pena ao brasileiro Theodomiro Romero dos San-
tos.
Logo após a ditadura militar a validação estabelecida

97
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

através do ato institucional para a execução da prisão perpé-


tua no Brasil foi abolida, fazendo com que tal conduta se tor-
nasse inconstitucional. Com isso, a prisão perpétua foi ve-
dada, tornando-se uma cláusula pétrea, onde não pode ser al-
terada por emenda à Constituição, segundo o art. 60, § 4º, in-
ciso IV, da Constituição Federal.

3.1 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

É certo afirmar que a Constituição Federal do Brasil, é


reconhecida como um documento fundamental que estabe-
lece a estrutura política, direitos e deveres dos cidadãos, entre
outros aspectos importantes, que fazem parte da organização
do país.
Partindo desse ponto, consideramos a Constituição um
guia para o bom funcionamento da sociedade, de acordo com
artigo 5º da Constituição Federal, os direitos fundamentais são
aqueles que garantem ao indivíduo e ao coletivo garantias e
liberdades básicas de suma importância para a manutenção
da dignidade da pessoa humana. A manutenção da dignidade
da pessoa humana, é reconhecida como um princípio central
usado em sistemas jurídicos, e em tratados internacionais re-
ferentes aos direitos humanos, tendo como base proteger os

98
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

direitos fundamentais e garantir que os governos e instituições


tratem todas as pessoas de forma digna e justa.
Por se tratar de um princípio fundamental dos direitos
humanos, a dignidade da pessoa humana refere-se à ideia de
que cada indivíduo, independentemente de sua origem, gê-
nero, religião, condição econômica ou qualquer outro aspecto,
tem o direito inalienável de ser tratado com respeito, igualdade
e dignidade.
Também de acordo com Sylvo Motta (2021) os direitos
fundamentais representam um conjunto de direitos vistos
como essenciais para os constituintes de uma sociedade em
um determinado período histórico, em um contexto social. Es-
ses direitos são baseados na noção de que todas as pessoas
devem ter acesso a certos direitos fundamentais que garantam
seu bem-estar.
A título de ilustração, o que é considerado um direito
fundamental pode variar de uma época para outra e de uma
sociedade para outra, pois está internamente ligada ao desen-
volvimento e à evolução da própria sociedade. Por exemplo, o
direito à liberdade de expressão pode ser considerado funda-
mental em uma sociedade democrática.
Esses direitos são estabelecidos e protegidos pela
Constituição Federal. A constituição determina disposições
específicas que garantem esses direitos e define os limites

99
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

para o governo, isso significa que o governo e as autoridades


têm a obrigação de respeitar e proteger esses direitos, assim
como os cidadãos têm o poder de exigir que todos eles sejam
cumpridos.
É importante lembrar que o rol de direitos estabelecido
pela Carta Magna de 1988, é bem extenso e amplo, assim po-
demos classificar esses direitos em cinco grupos básicos.
Adotamos a classificação de José Afonso da Silva (1995,
p.181), que distingue cinco grupos básicos:

1) direitos individuais; liberdades civis; liberdade-


autonomia (art. 5o);
2) direitos coletivos; liberdade de expressão co-
letiva (art. 5o);
3) direitos sociais (arts. 6o e 193 s.);
4) direitos à nacionalidade (art. 12);
5) direitos políticos; direitos democráticos; direi-
tos de participação política; liberdades--participa-
ção (arts. 14 a 17). (Sylvo Motta apud Silva,
2021).

Diante do exposto, os direitos fundamentais desempe-


nham um papel indispensável na garantia da dignidade da
pessoa humana e dos direitos humanos. Os direitos humanos
e os direitos fundamentais são concepções importantes, com
implicações significativas dentro do contexto jurídico e social
do Brasil. Apesar de serem termos semelhantes, eles têm dis-
tinções cruciais que refletem a forma de como os direitos serão

100
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

aplicados e reconhecidos.
Os direitos fundamentais, no Brasil, referem-se aos di-
reitos e garantias individuais/coletivas consagradas pela Carta
Magna de 1988. Essa constituição, estabelece um extenso re-
gistro de direitos específicos para os brasileiros, direitos esses
que abrangem uma ampla gama de questões, como direito à
vida, liberdade, educação, saúde, etc. Além de aplicados aos
cidadãos brasileiros, bem como aos estrangeiros que estão
sob a jurisdição brasileira, os direitos fundamentais servem
como uma base legal sólida para promover e proteger as liber-
dades e as garantias dentro do âmbito brasileiro.
Os direitos humanos, diferente dos direitos fundamen-
tais, são direitos universais que se aplicam a todas as pes-
soas, independentemente de sua nacionalidade, são basea-
das em padrões internacionais determinados por tratados e
acordos internacionais, como a Declaração Universal dos Di-
reitos Humanos. Por outras palavras, os direitos humanos con-
têm questões fundamentais como à proteção contra a tortura
e o tratamento desumano. São promovidos por organizações
internacionais, como, por exemplo, a Organização das Nações
Unidas (ONU).

101
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

3.1.1 DIREITO DOS PRESOS APLICADO NO ORDENA-


MENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Nota-se que na Constituição direitos e deveres andam


lado a lado, se complementando. Quando uma pessoa des-
cumpre um dever que não afronta diretamente a lei, não se é
passível de punição, entretanto quando um sujeito comete um
ato que vai contra lei, há a punição devida, e durante essa pu-
nição seus direitos não são excluídos. Além disso, os direitos
dos presos no Brasil, refere-se ao conjunto de direitos e ga-
rantias assegurados às pessoas que estão sob custódia do
sistema prisional, ou seja, estão cumprindo pena em prisões.
Tais direitos são fundamentais para garantir a digni-
dade da pessoa humana e o tratamento justo dos indivíduos
privados de liberdade. Diante disto, os direitos estabelecidos
para os encarcerados elencados na Constituição Federal são:
dignidade da pessoa humana (art. 1º , III e art. 5º , III e XLIII);
direito à vida (art. 5º, caput); proibição de tortura e tratamento
desumano ou degradante (art. 5º, III e XLIII); direito à integri-
dade física e moral (art. 5º, III e XLIII); direito à assistência e à
saúde (art. 5º, III e XLIII); direito à assistência jurídica (art. 5º,
LXIII); direito à educação e ao trabalho (art. 5º, XLII); direito à
individualização da pena (art. 5º, LVII).
Levando em consideração o exposto, os presos têm a

102
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

garantia que não irão passar por penas degradantes ou desu-


manas, com isso estabelece-se que a prisão perpétua não
pode ser aplicada. A prisão perpétua é caracterizada como
pena desumana e degradante, tendo em vista que a sua apli-
cação faz com que um indivíduo passe o resto da sua vida
preso.

3.1.2 DIREITO DOS PRESOS CONSOANTE A LEI DE EXE-


CUÇÃO PENAL

Além dos direitos estabelecidos pela Constituição Fe-


deral, a Lei de Execução Penal (LEP) regulamenta as execu-
ções de todas as penas aplicadas dentro do âmbito penal. As-
sim como a Constituição, a LEP é um guia para o sistema pri-
sional, sendo ela responsável por todo funcionamento de um
sistema e a aplicabilidade dos direitos dos presos. Sua base
legal estabelece que a execução penal deve ser aplicada de
forma correta e humanitária. Segundo a Lei de Execução Pe-
nal, em seu art. 1º, “estabelece que a execução penal tem por
objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão crimi-
nal e proporcionar condições para a harmônica integração so-
cial do condenado” (1984).
A Lei de Execução Penal estabelece um acervo de di-
reitos aos presos, em seu art. 41, a saber:

103
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Art. 41 - Constituem direitos do preso:


I - alimentação suficiente e vestuário;
II - atribuição de trabalho e sua remuneração;
III - Previdência Social;
IV - constituição de pecúlio;
V - proporcionalidade na distribuição do tempo
para o trabalho, o descanso e a recreação;
VI - exercício das atividades profissionais, inte-
lectuais, artísticas e desportivas anteriores,
desde que compatíveis com a execução da pena;
VII - assistência material, à saúde, jurídica, edu-
cacional, social e religiosa;
VIII - proteção contra qualquer forma de sensaci-
onalismo;
IX - entrevista pessoal e reservada com o advo-
gado;
X - visita do cônjuge, da companheira, de paren-
tes e amigos em dias determinados;
XI - chamamento nominal;
XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exi-
gências da individualização da pena;
XIII - audiência especial com o diretor do estabe-
lecimento;
XIV - representação e petição a qualquer autori-
dade, em defesa de direito;
XV - contato com o mundo exterior por meio de
correspondência escrita, da leitura e de outros
meios de informação que não comprometam a
moral e os bons costumes.
XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anual-
mente, sob pena da responsabilidade da autori-
dade judiciária competente. (Brasil, 1984).

Como sendo um guia para a aplicabilidade de penas


dentro do âmbito penal, a LEP é composta por vários preceitos
que devem ser respeitados e aplicados. Dentre vários tópicos
e especificações, os direitos e deveres dos presos, são de es-

104
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

pecial modo mais visado, tendo em vista a manutenção da dig-


nidade da pessoa humana. De acordo com Renato Marcão
(2014, pág. 112) os deveres gerais dos presos que estão elen-
cados no art. 38 em conjunto com o art. 39, que estabelecem
condutas que devem ser inseridas no repertório dos encarce-
rados, instituindo obrigações que estabelecem boa convivên-
cia carcerária. Acompanhado dos deveres, os direitos são apli-
cados simultaneamente.
Os direitos dos presos visam a dignidade da pessoa hu-
mana, então o fato do indivíduo estar cumprindo momentane-
amente uma pena criminal, não extrai do executado seus di-
reitos constitucionais.
A aplicabilidade do direito estabelece que as autorida-
des devem respeitar o indivíduo que se encontra dentro do pe-
rímetro prisional, permitindo assim integridade física e moral,
essa conduta não é aplicada apenas aos presos provisórios,
mas se estende aos condenados com trânsito em julgado e
aos indivíduos que recebem a medida de segurança.

3.1.3 PRISÃO PERPÉTUA

A primeira Constituição Federal foi elaborada no ano de


1824 por Dom Pedro I, estabelecendo-se assim o Império do
Brasil. Em seu texto original foi elencando o artigo 179, que

105
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

estabeleceu políticas e condutas institucionais, prevendo tam-


bém a criação do primeiro Código Criminal do Império, que foi
promulgado em 1830:

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e


Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por
base a liberdade, a segurança individual, e a pro-
priedade, é garantida pela Constituição do Impe-
rio, pela maneira seguinte.
XVIII. Organizar–se-ha quanto antes um Co-
digo Civil, e Criminal, fundado nas solidas bases
da Justiça, e Equidade. (Brasil, 1824).

Seguindo os padrões estabelecidos pela legislação, o


texto expresso no primeiro Código Penal, determinava a apli-
cação da prisão perpétua no Brasil, sua execução era utilizada
em casos de banimento, ou seja, se o sujeito fosse banido e
voltasse, sua pena seria a prisão perpétua. Tal pena foi esta-
belecida pelo artigo 50, da primeira Constituição elaborada:

Art. 50. A pena de banimento privará para sem-


pre os réos dos direitos de cidadão brazileiro, e
os inhibirá perpetuamente de habitar o territorio
do Imperio.
Os banidos, que voltarem ao territorio do Imperio,
serão condemnados á prisão perpetua. (Brasil,
1830).

No ano de 1891, a Constituição Federal aboliu a pena


de prisão perpétua no Brasil, e essa decisão ficou intacta em

106
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

todas as constituições decorrentes, mas com a formalização


do período do governo militar em 1964, a abolição de tal pena
seria deixada de lado. Assim, no ano de 1969, a pena de pri-
são perpétua foi reintroduzida no Brasil. A reintrodução, foi re-
alizada pela junta militar que sucedeu o presidente Costa e
Silva. O regresso da prisão perpétua ocorreu inicialmente por
intermédio do Ato Institucional n.º 14 (Folha de São Paulo,
2000). Essa reinserção foi possível, tendo em vista que a apli-
cação de penas como a de caráter perpétuo, não era conside-
rada cláusula pétrea, podendo assim ser modificada, tal con-
duta mudou com a promulgação da Constituição Federal de
1988.
Com a criação do Ato Institucional n.º 14, a aplicação
da prisão perpétua foi legalizada e aplicada, em território bra-
sileiro. A Constituição Federativa do Brasil de 1967, teve seu
artigo 150, § 11 modificado pelo Ato Institucional de 1969, a
nova redação ficou estabelecida como:

Art. 1º - O § 11 do art. 150 da Constituição do


Brasil passa a vigorar com a seguinte redação:
Art. 150 -
...........................................................................
§ 11 - Não haverá pena de morte, de prisão per-
pétua, de banimento, ou confisco, salvo nos ca-
sos de guerra externa psicológica adversa, ou re-
volucionária ou subversiva nos termos que a lei
determinar. Esta disporá também, sobre o perdi-
mento de bens por danos causados ao Erário, ou
no caso de enriquecimento ilícito no exercício de

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

cargo, função ou emprego na Administração Pú-


blica, Direta ou Indireta (Brasil, 1969).

Nesse sentido, os militares tinham um amplo caminho


para punição de indivíduos que iam contra o regime, como os
guerrilheiros que reagiam contra o governo.
Conforme a Folha de São Paulo (2000) o primeiro e
único caso de prisão perpétua aplicada no Brasil, ocorreu em
março de 1971, quando o brasileiro Theodomiro Romeiro dos
Santos, de 19 anos, ativista do Partido Comunista Brasileiro
Revolucionário - PCBR, foi sentenciado à pena de morte pelo
assassinato de um oficial da aeronáutica. Theodomiro foi con-
denado a pena de morte a princípio, contudo, em junho do
mesmo ano, o Superior Tribunal Militar converteu sua pena de
morte, para prisão perpétua, onde o mesmo não cumpriu a
pena, e fugiu da prisão, ficando exilado na França até o tér-
mino do regime/ditadura militar.
Com o fim do regime militar, a pena de prisão perpétua
foi finalmente abolida por meio da emenda constitucional n.º
11, aprovada em 13 de outubro de 1978, que passou a vigorar
no dia 1º de janeiro de 1979. A Constituição Federal vigente
no Brasil, é a de 1988, sendo promulgada no dia 05 de outu-
bro, que ficou conhecida como “Constituição Cidadã” estabe-
leceu-se esse termo tendo em vista que em seu texto alguns

108
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

os artigos tinham um olhar mais humanitário, voltado para a


sociedade, visando os direitos e deveres que eram necessá-
rios para manutenção da dignidade da pessoa humana. Tam-
bém estabelecendo os princípios e as normas que regem a
organização do Estado, os deveres e direitos dos cidadãos e
as relações entre os poderes.
Seguindo esse olhar humanitário, e tendo passado por
modificações necessária em sua estrutura constitucional, foi
elencado no artigo 5º, inciso XLVII, alínea “b” a vedação da
prisão perpétua como uma cláusula pétrea, ou seja, não pode
ser alterada por meio de emenda à constituição, segundo o
art. 60, § 4º, inciso IV, da Constituição Federal. As emendas
constitucionais são instrumentos legais que permitem a modi-
ficação da Constituição Federal, que pode ocorrer com o in-
tuito de adaptar a Constituição a novas realidades, corrigir dis-
posições defeituosas, entre outras coisas.
Mediante todo esse conceito histórico, o Código Penal
também foi modificado, sendo vigente o do ano de 1940, onde
traz em sua estrutura o tempo determinado que um indivíduo
pode ficar preso – com a criação do pacote anticrime, a idade
estabelecida mudou de 30 para 40 anos.
Levando em consideração todo o exposto, entende-se
por que a prisão perpétua no Brasil é vedada, pois a aplicação
da prisão perpétua consiste em deixar uma pessoa presa pelo

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

resto da vida, sem a mínima chance de sair para o mundo ex-


terno, partindo desta breve explicação, a pena de caráter per-
pétuo vai contra tudo que Carta Magna estabelece.

3.2 A INIMPUTABILIDADE DENTRO DO ÂMBITO PENAL


BRASILEIRO

A teoria do crime, estabelecida pelo direito penal, traz o


que é preciso para a configuração de um crime. Segundo Ja-
naira Paschoal (2015) para que um ato seja considerado
crime, é preciso ter alguns requisitos como o fato típico, a con-
duta, o resultado e o nexo de causalidade. Além destes requi-
sitos, temos a culpabilidade que se refere à capacidade do
agente de compreender a ilicitude de seu ato e de agir de
acordo com esse entendimento.
A culpabilidade tem ainda dois sentidos, sendo eles a
vedação de responsabilidade objetiva, ou seja, limitando a in-
criminação sem que o autor tenha agido por dolo ou culpa,
conforme o art. 19 do Código Penal, “Pelo resultado que
agrava especialmente a pena, só responde o agente que o
houver causado ao menos culposamente” (1940) e a propor-
cionalidade da pena, que estabelece que a pena deve ser pro-
porcional ao crime cometido.
Para os doutrinadores Humberto e Poggio (2019, pág.
276), a culpabilidade é composta por imputabilidade; potencial

110
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

da consciência da ilicitude; e inexigibilidade de conduta con-


forme o direito, sendo assim elementos essenciais para sua
concretização.
Partindo desse ponto, a imputabilidade é conhecida
como o primeiro elemento, podendo ser definida como “capa-
cidade para ser culpável”, ou seja, só será penalmente respon-
sabilizado aquele que for imputável, é importante lembrar que
o Código Penal não define o imputável, mas traz em sua es-
trutura a definição de inimputáveis e semi-imputáveis, assim
podendo definir o imputável:

Imputabilidade é a capacidade de culpabilidade,


ou seja, é a possibilidade de entender o caráter
ilícito do fato e de se determinar de acordo com
esse entendimento. Conforme ensina Mirabete
(2013a, p. 196), a imputabilidade é a aptidão
para ser culpável. (Portocarrero e Ávila, 2023).

Sob o mesmo ponto de vista de Humberto e Poggio


(2019, pág. 276) a definição de inimputabilidade, é referente
às pessoas que não possuem capacidade de entender o cará-
ter ilícito de uma determinada ação, e por falta dessa capaci-
dade o indivíduo não pode ser considerado culpado. Nestes
termos, são reconhecidos como inimputáveis os menores de
18 anos e os doentes mentais, ou com o desenvolvimento
mental incompleto, ou retardado. No caso do semi-imputável,

111
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

o legislador considera que ele não é inteiramente incapaz.


De acordo com Janaína Paschoal (2015, pág. 42), no
caput do artigo 26, o inimputável é impassível de ser punido
criminalmente, ou seja, o indivíduo que, por doença mental ou
desenvolvimento mental incompleto/retardado, ao tempo da
ação ou da omissão, é incapaz de compreender o caráter ilí-
cito de seu ato ou de determinar-se de acordo com esse en-
tendimento.
A partir desse conhecimento, quando um indivíduo, em
uma ação inusitada, desfere várias facadas, em um estranho
porquê em sua realidade aquela pessoa, na verdade, era um
monstro que estava tentando atacá-lo, evidencia-se que a ca-
pacidade de distinção de realidade e imaginação some, não
por sua vontade própria, mas sim por conta de uma determi-
nada doença mental, ou por mau desenvolvimento mental.
Este mesmo indivíduo não será responsabilizado por seus
atos de forma criminal, tendo em vista que seu estado mental
está prejudicado, estabelecendo assim a medida de segu-
rança onde o juiz estabelece a forma de tratamento que será
aplicada.
Para a caracterização da inimputabilidade, não basta
apenas a incapacidade de entendimento no momento da
ação, é necessário comprovar que a doença ou mau desen-
volvimento levou o indivíduo a realizar uma conduta que, em

112
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

sua mente, não é considerada errada.

3.2.1 DOENÇA MENTAL E O CÓDIGO PENAL

Para entendermos o que é doença mental e desenvol-


vimento mental incompleto/retardado e como funciona sua
aplicação no direito penal, é preciso entender que há uma di-
ferença entre doença mental e deficiência mental, apesar de
ter conceitos parecidos, sua aplicação no direito penal é dife-
rente.

3.2.1.1 Deficiência Mental (Deficiência Intelectual)

Dentro do Código Penal, a utilização de deficiência


mental, passou para deficiência intelectual, acompanhando as
mudanças, estabelecidas pela Declaração de Montreal no ano
de 2004, aprovada pela Organização Mundial de (OMS) em
conjunto com a Organização Pan-americana de Saúde
(OPAS), essa mudança se fez necessária para a diferenciação
de doenças mentais (Sassaki, 2011).
Consoante a Associação de Pais e Amigos dos Excep-
cionais (APAE) a deficiência intelectual é caracterizada por
funcionamento intelectual notável, que são inferiores à média,

113
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

acompanhado de limitações importantes para o funciona-


mento adaptativo em áreas como comunicação, autossuficiên-
cia, etc.
É importante lembrar que a deficiência intelectual (DI)
está diretamente ligada às condições genéticas ou outros fa-
tores nas quais resultam em alterações no desenvolvimento
cerebral, durante o período intrauterino, podendo ocorrer tam-
bém na hora do parto ou nos primeiros anos de vida. Levando
em consideração esse conceito, a (DI) não é considerada do-
ença, mas está relacionada ao desenvolvimento que ocorreu
de uma forma diferenciada, podendo se manifestar até o co-
meço da fase adulta. Um exemplo seria Transtorno do Déficit
de Atenção com Hiperatividade - TDAH.

3.2.1.2 Doença Mental (Transtorno Mental)

A doença mental refere-se a uma condição que afeta o


funcionamento mental e emocional de uma pessoa. Sua apa-
rição está ligada a uma ampla variedade de condições que
afetam o pensamento, o comportamento ou as emoções, es-
ses fatores podem ser genéticos, biológicos, ambientais e psi-
cossociais, diferente da deficiência intelectual, elas podem
surgir em qualquer fase da vida e podem variar em gravidade,

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

conforme o texto informativo, publicado no site do Instituto Fe-


deral da Paraíba, em 2018. Vale ressaltar que em situações
mais gravosas a pessoa, não tem mais a quem recorrer, pas-
sando assim por todo tipo de tratamento, mas não apresen-
tando melhora.
Além da doença mental, temos o sinônimo transtorno
mental, que é um conceito mais específico, onde engloba to-
das as condições que afetam a saúde mental de um indivíduo.
Assim, pode se considerar que a doença mental é uma ramifi-
cação, ou seja, uma categoria de transtornos mentais.
Existem vários tipos diferentes de transtornos mentais,
sendo eles esquizofrenia, transtorno dissociativo de identi-
dade e a psicopatia. Dentro do direito penal há um olhar mais
avaliativo e cauteloso sobre os referidos transtornos. O motivo
pelo qual pode se dar uma atenção especial no direito penal a
esses transtornos, é que eles se encaixam perfeitamente nas
hipóteses de uso do artigo 26 do Código Penal.
Segundo os termos utilizados, temos um conceito geral
que engloba tanto o transtorno mental como a doença mental,
sendo a inimputabilidade onde é definido que o agente não
pode ser responsabilizado por seus atos criminais tendo em
vista a sua capacidade mental prejudicada. Partindo desse
ponto podemos usar como exemplo as pessoas que sofrem de

115
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

esquizofrenia, transtorno dissociativo de identidade e psicopa-


tia.
O transtorno dissociativo de identidade (TDI), conforme
David Spiegel (2023) tem como característica a existência de
duas ou mais personalidades, que podem ser acompanhadas
com lapsos de memória, esquecimento de informações pes-
soais, e a falta de identificação com o próprio corpo, esse
transtorno é causado na maioria das vezes por um grande
trauma que o indivíduo sofreu na vida, especificamente na in-
fância. O que mais chama a atenção, é a dupla personalidade
que o indivíduo consegue revisitar, sendo totalmente diferente
uma da outra, e com essa mudança de personalidade vem a
mudança de atitude e opiniões. De acordo com Alex Vandr
(2016), além da mudança de personalidade, são frequentes os
lapsos de memória, onde se estabelece três formas de amné-
sia dissociativas, vejamos:

Portadores de TDI além da condição marcante


que é a dissociação, eles sofrem de recorrentes
perdas de memória, acompanhada de fortes do-
res de cabeça. De acordo com o (DSM-5) a am-
nésia dissociativa se configura em três formas,
ou critérios; 1° Lacunas na memória da vida pes-
soal, como a Infância, o brinquedo predileto etc,
2° Lapsos na memória confiável, como o dia pre-
sente, habilidades pessoais, e por último a 3° que
leva o sujeito a descobrir eventos cotidianos que
ele fez, e não se recorda de ter os feitos. (Nasci-
mento; Santos; Lourenço; Freire, 2016).

116
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

No filme “Fragmentado”, dirigido por M. Night Shyama-


lano, no ano de 2016 o ator James McAvoy interpreta o jovem
Kevin, que possui o transtorno dissociativo de personalidade.
Durante toda a ação são demonstradas 23 personalidades di-
ferentes e uma dessas personalidades, é conhecido como
besta, que mata as pessoas. Apesar de ser uma ficção, ela
retrata bem a funcionalidade mental de quem tem o transtorno
dissociativo de personalidade, e como a conduta do agente
pode mudar segundo a personalidade que se assume.
Trazendo esse conceito para fora da ficção, o pro-
grama “Fantástico’’, da emissora Rede Globo, apresentou
uma matéria no dia 20.08.2023, explicando como vive uma
pessoa diagnosticada com esse transtorno e como a mudança
de personalidade é real. Durante a reportagem, especialistas
explicam que transtornos desta categoria, são adquiridos via
traumas, sendo explicado como uma psicopatologia onde o
sujeito, para fugir da sua realidade traumática, cria rotas de
fuga, para se sentir melhor. Esse mesmo entendimento é es-
tabelecido por Stela Vimercati, vejamos:

O TDI pode ser explicado como uma psicopato-


logia em que o indivíduo, após passar por uma
situação traumática, desenvolve uma ou mais
personalidades distintas como uma forma de es-
cape da própria mente para lidar com o trauma
vivido. (Martins, 2021).

117
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

De acordo com Carol Tamminga (2022) a esquizofrenia


é um transtorno mental grave que afeta o pensamento, as
emoções e o comportamento de uma pessoa. Os sintomas da
esquizofrenia incluem alucinações (ouvir vozes dentro da ca-
beça), delírios (falsas convicções), pensamento desorgani-
zado e dificuldade em distinguir a realidade da imaginação.
Pessoas com esquizofrenia muitas vezes têm dificuldade em
manter uma rotina padronizada, precisando assim de trata-
mento a longo prazo, como terapia e medicamentos, para ge-
renciar seus sintomas.
O motivo exato da esquizofrenia não é conhecido, mas
acredita-se que envolva uma combinação de coeficientes ge-
néticos e ambientais. Conforme Noto (2020, pg. 45) destaca-
se uma certa dificuldade, para definição da esquizofrenia,
tendo em vista que ela é conhecida como “sem etiologia defi-
nida”, a abordagem moderna utilizada para detectar um diag-
nóstico preciso é através da hierarquização dos sintomas
como um “continuum” dimensional em apoio ao diagnóstico
categorial tradicional. A esquizofrenia tem o poder de causar
grave deterioração das faculdades cognitivas, estigma social
e prejuízo funcional ao indivíduo, fazendo com que seja de
suma importância a identificação e a intervenção precoces,
para identificar e prevenir o avanço da doença. (Noto, 2020).
Apesar da dificuldade em estabelecer um padrão para

118
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

a esquizofrenia, ela é conceituada como um transtorno mental


grave que afeta como uma pessoa pensa, sente e se com-
porta, fazendo com que a pessoa não tenha domínio próprio,
tornando-se incapaz. Esse transtorno é conhecido como uma
doença crônica que não tem cura, tendo cinco principais tipos,
mas a mais comum é a paranoide onde a pessoa apresenta
delírios e alucinações, geralmente sobre perseguição ou con-
trole. De acordo com Paulo Dalgalarrondo (2019) as “síndro-
mes psicóticas” tem como sintomas delírio, alucinação entre
outros, tais aspectos são estabelecidos no diagnóstico de pes-
soas com esquizofrenia. Consideramos:

As síndromes psicóticas caracterizamse por sin-


tomas típicos como alucinações e delírios, pen-
samento desorganizado e comportamento clara-
mente bizarro, como fala e risos imotivados (Jan-
zarik, 2003). Os sintomas paranóides são muito
comuns, como idéias delirantes e alucinações
auditivas de conteúdo persecutório. Em alguns
casos, observa-se uma desorganização pro-
funda da vida mental e do comportamento, de
qualidade diversa à que ocorre nos quadros de-
menciais, no delirium ou nos quadros de retardo
mental grave (Schimid, 1991). Os autores de ori-
entação psicodinâmica tendem a dar ênfase à
perda de contato com a realidade como dimen-
são central da psicose(...). (Dalgalarrondo,
2019).

Ao ter o diagnóstico de esquizofrenia, são passados


medicamentos para os tratamentos dos sintomas, conforme o

119
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas, estabelecido pela


Portaria SAS/MS n.º 364 de 2013. Mediante esse tratamento
é esperado melhora significativa, apesar de não ter cura. Nem
sempre a aplicação desse método é eficaz, há casos que
mesmo com o uso de medicamento, o esquizofrênico pode
agir de forma inconsequente ou impulsiva.
De acordo com “G1-Rio de Janeiro”, o diretor de cinema
brasileiro Eduardo Coutinho foi assassinado a facadas pelo
próprio filho Daniel Coutinho, além de matar o pai a facadas,
o mesmo tentou matar a mãe, por sorte a mãe de Daniel se
escondeu no banheiro, podendo assim ser salva com vida.
Preso em flagrante, Daniel Coutinho explicou que durante a
ação sofreu com um ataque de pânico e revelou que o assas-
sinato dos pais era uma forma de salvar eles, de qualquer mal
futuro.
No caso de Daniel Coutinho, o Juiz da 1ª Vara da Capi-
tal, Fábio Uchôa Montenegro, “absolveu sumariamente”, o réu,
ou seja, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) che-
gou à conclusão que o réu seria inimputável, por se diagnosti-
cado com esquizofrenia, aplicando assim a medida de segu-
rança, na forma de internação.
A psicopatia, segundo os médicos especialistas, não é
uma doença mental e sim um transtorno que afeta diretamente

120
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

o comportamento social do indivíduo, como nos outros trans-


tornos a sua causa decorre de situações traumáticas que o
sujeito sofreu. Diante de traumas vividos, a pessoa adquire a
deficiência de empatia, ou seja, é uma pessoa com tendência
a ser maldosa, demonstrando frieza e não tendo nenhum tipo
de consciência como ética ou moral.
Como sendo um transtorno de personalidade culmi-
nado com falta de empatia, sua recuperação se torna mais in-
verossímil, tendo em vista que é um transtorno incurável, pas-
sível apenas de tratamento medicamentoso e terapia. Para o
diagnóstico de psicopatia, é observado a forma que o indivíduo
vive em sociedade, o ponto mais observado é a frieza que o
indivíduo age em determinadas situações. Partindo deste
ponto, os crimes mais brutais são cometidos por psicopatas,
como é o exemplo do Chico Picadinho, assassino que matou
e esquartejou mulheres e após sua ação dormia no sofá da
sala onde cometia os crimes.
A esquizofrenia, psicopatia e o transtorno dissociativo
de personalidade são três condições psiquiátricas distintas,
sendo caracterizadas por causa e tratamento diferentes. Ape-
sar das três serem desenvolvidas por acontecimentos traumá-
ticos, cada uma tem sua peculiaridade. A esquizofrenia afeta
a percepção, o pensamento e a realidade; a psicopatia é ca-

121
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

racterizada por traços de personalidade, como a falta de em-


patia; o transtorno dissociativo de personalidade, é uma con-
dição na qual uma pessoa tem várias identidades diferentes.
Conclui-se que todas essas formas de transtorno estão abran-
gidas no Código Penal, artigo 26, fazendo com que pessoas
que se encaixem em uma dessas hipóteses sejam isentas de
pena.

3.2.1.3 Medida De Segurança

A ideia de inimputabilidade é a condição de uma pessoa


que não tem a capacidade de entender o caráter ilícito do fato
ou compreender certos entendimentos, em outras palavras, a
pessoa inimputável não tem a capacidade de compreender
que seus atos estão errados, ou de decidir se deve ou não
fazer. Dessa forma, o Código Penal, nos artigos 26 e 97, abor-
dam como um inimputável vai ser tratado caso cometa algum
crime. Seguindo assim os respectivos artigos, o inimputável
ficará isento da pena, tendo em vista que na hora do delito o
sujeito não tinha a capacidade de distinção do certo e errado.
Quando um criminoso, que faz parte de uma facção,
decide matar alguém da facção rival via uma emboscada, ele
será condenado por homicídio qualificado, sofrendo assim a
sanção penal, como forma de punição e tendo que cumprir

122
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

essa ordem no sistema prisional.


Já um esquizofrênico que, em meio a um surto psicó-
tico, desfere facadas em seus tutores, cometendo um crime de
homicídio, não responde da mesma forma, ou seja, não há a
aplicação da sanção penal com o intuito de punição, e sim a
aplicação de medida de segurança, com o intuito de proteger
o réu e os demais.
Essa medida de segurança pode ser imposta como in-
ternação ou tratamento ambulatorial. Segundo o art. 97 do Có-
digo Penal, “Se o agente for inimputável, o juiz determinará
sua internação (art. 26). Se, todavia, o fato previsto como
crime for punível com detenção, poderá o juiz submetê-lo a
tratamento ambulatorial”, ou seja, a aplicação da medida de
segurança poderá ser executada de duas formas, internação
ou tratamento ambulatorial.
Consoante ao Código Penal, o inimputável é isento de
pena, porém nenhum crime fica impune, e nesse caso não é
diferente. Como o réu não pode cumprir uma pena de reclusão
ou detenção, ele cumpre a chamada medida de segurança.
Apesar do entendimento que um inimputável não sofre com
sanções penais, como detenção ou reclusão, a aplicação da
medida de segurança pode ser caracteriza como punição, no
que se refere a “restrição de liberdade”, ou seja, quando o su-
jeito incapaz é encaminhado para a detenção, sua liberdade

123
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

fica restrita, segundo o entendimento do STJ de 2022.

Embora muitas vezes se mencione que o inimpu-


tável não é punido, a medida de segurança –
adotada com os objetivos de tratamento e de pro-
teção da sociedade – também pode significar
restrição da liberdade, tanto que a sua aplicação,
em lugar da pena reservada aos imputáveis con-
denados, resulta de uma decisão judicial que a
doutrina chama de absolvição imprópria (o réu é
absolvido, por ser inimputável, mas, reconhecido
como autor do crime, será internado em hospital
psiquiátrico) (STJ, 2022).

É importante destacar a diferença entre pena e medida


de segurança, tendo em vista que as duas têm objetivos e efei-
tos distintos, a pena tem o objetivo de punir quem praticou o
crime e prevenir a prática de novos crimes, já a medida de
segurança visa proteger a sociedade da periculosidade do
agente. De acordo com Paschoal (2015) “Pena e medida de
segurança são os dois tipos de sanção penal. Enquanto a
pena está relacionada à culpabilidade do agente, a medida de
segurança diz respeito à periculosidade”.
A pena é uma sanção que visa impor uma punição,
como a prisão, e prevenir a prática de novos crimes, pois o
autor do delito sabe que será punido se cometer um crime no-
vamente. A medida de segurança é uma sanção que visa pro-
teger a sociedade da periculosidade do agente, e proteger o
indivíduo dele mesmo.

124
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Nos casos mais graves, se usa a internação. A gravi-


dade depende do diagnóstico e tratamento que o indivíduo
passa, como foi o caso ocorrido no dia 2 de fevereiro de 2014,
no Rio de Janeiro, onde Eduardo Coutinho, foi morto por faca-
das por seu filho Daniel em um surto psicótico, Daniel sofre de
esquizofrenia e mediante a comprovação por laudo o juiz con-
siderou ele inimputável, assim o réu foi declarado incapaz de
responder pela morte do pai. Daniel cumpre a medida de se-
gurança, internado em um hospital psiquiátrico.
No Brasil, a internação deve ocorrer em hospitais de
custódia, conhecidos como hospitais psiquiátricos, que são lo-
cais próprios e especializados para pessoas que sofrem de
doença mental (transtorno).

3.2.1.4 Absolvição Imprópria

No direito penal temos algumas hipóteses de absolvi-


ção imprópria, elencadas no artigo 386 do CPP, a absolvição
imprópria refere-se a uma situação que um indivíduo é consi-
derado inimputável, não podendo ser responsabilizado crimi-
nalmente. Ou seja, o réu é inocentado do crime que cometeu,
não podendo ser punido criminalmente, contudo será reconhe-
cido como autor da ação, sendo passível de medida de segu-

125
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

rança, conforme o STJ (2022) “o réu é absolvido, por ser inim-


putável, mas, reconhecido como autor do crime, será inter-
nado em hospital psiquiátrico’’.
Nesses casos, a pessoa não é condenada, por não pos-
suir capacidade de entendimento ou controle sobre suas
ações. No entanto, o réu é submetido a uma medida de segu-
rança, que é uma intervenção terapêutica ou restritiva desti-
nada a tratar o transtorno mental e proteger a sociedade. Se-
guindo assim o exposto no artigo 386 do Código Processual
Penal, a absolvição será aplicada em hipóteses como o artigo
26 do Código Penal, que fala sobre os inimputáveis.

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a


causa na parte dispositiva, desde que reconheça
(..) VI – existirem circunstâncias que excluam o
crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22,
23, 26 e § 1º do art. 28, todos do Código Penal),
ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua
existência; (CPP, 1941).

3.2.1.5 Incidente de Insanidade

Conforme o Código Penal e a legislação, a aplicação de


pena de caráter punitivo não se aplica a situações que envol-
vam inimputáveis, contudo, nenhum crime pode passar im-
pune, assim a lei ordena a aplicação da medida de segurança
(internação ou tratamento ambulatorial). Há essa limitação

126
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

porque o legislador entende, que não se pode culpar alguém


que não tem escolha e nem controle dos seus atos.
Como se trata de uma isenção de pena, é preciso pas-
sar por todo um processo para a constatação da integridade
mental do réu. Essa verificação ocorre por dois motivos apa-
rentes: o primeiro é quando o réu não tem mais condições de
ficar em uma sociedade, precisando ser restringido de sua li-
berdade; e o segundo é para evitar que advogados usem esse
método como defesa para beneficiar seus clientes.
De acordo com Antônio Sérgio Piedade (2022, pág.
215) os processos de verificação seguem o critério biopsicoló-
gico (verificação psíquica do agente), não verificando apenas
se réu possui doença mental ou desenvolvimento incom-
pleto/retardado, mas também, constatar que na hora da ação
criminosa o réu estava impossibilitado de compreender e en-
tender o caráter ilícito.

De acordo com a jurisprudência do STF, o mero


requerimento do exame não é suficiente para
que haja o deferimento da medida, sendo, por-
tanto, requisitos para o ajuizamento do incidente:
(a) a presença de dúvida razoável a respeito da
imputabilidade penal do acusado em virtude de
doença ou deficiência mental; e (b) a comprova-
ção da doença, não sendo suficiente a mera in-
formação de que o paciente se encontra sujeito
a tratamento. (Piedade, 2022).

127
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O processo de avaliação de integridade mental ocorre


através do incidente de insanidade, que está previsto no Có-
digo de Processo Penal nos artigos 149 a 154. O procedi-
mento de verificação começará por meio de perícia, consta-
tado que o réu realmente é inimputável ele passará a cumprir
a medida de segurança, e caso ele esteja preso de forma pro-
visória, deve ser encaminhado imediatamente ao hospital de
custódia, se for o caso.
Segundo o doutrinador Antônio Sérgio Piedade (2022,
pág. 215), o incidente de insanidade pode ser requerido pelo
Ministério Público, pelo defensor, pelo curador, pelo ascen-
dente, pelo descendente, pelo irmão ou pelo cônjuge do acu-
sado. Isso inclui também a autoridade policial, quando o caso
se encontra na fase de inquérito.
Vale lembrar que além dos inimputáveis, temos os
semi-imputáveis, identificados como aqueles que tem a perda
parcial da capacidade de entendimento, é o caso dos psicopa-
tas, que compreende parcialmente que a sua ação é errada, e
mesmo assim ainda praticam o ato criminoso, indivíduos
nessa categoria tem a redução da pena, e não isenção con-
forme o Código Penal.

128
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

3.3 APLICABILIDADE DA MEDIDA DE SEGURANÇA


COMO PUNIÇÃO DE CARÁTER PERPÉTUO E SUA IN-
CONSTITUCIONALIDADE

A inconstitucionalidade é o ato estabelecido para a con-


trariedade da lei ou de atos normativos determinados pela
Constituição Federal, ou seja, para ser inconstitucional é pre-
ciso ir contra o que a Constituição Federal estabelece em seus
textos, diante disto a aplicação da prisão perpétua é um ato
inconstitucional. Apesar disso, há um precedente para a apli-
cação da prisão de caráter perpétuo expresso no Código Pe-
nal através da medida de segurança.
A execução da medida de segurança é estabelecida por
intermédio do incidente de insanidade e é aplicada quando o
juiz reconhece que o réu é inimputável com a sua execução, a
medida será aplicada tanto na modalidade de tratamento am-
bulatorial quanto na internação. Partindo desse ponto estabe-
lecemos o precedente para aplicação da prisão perpétua, con-
forme o art. 97, § 1º “o prazo estabelecido para internação é
indeterminado (...)”. Assim, quando a medida de segurança é
aplicada na modalidade de internação, o réu não tem tempo
determinado para sair, podendo passar o resto da vida inter-
nado.
Visando a lacuna encontrada entre o tempo máximo
para o estabelecimento da pena, que é de 40 anos e o tempo

129
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

de intenção indeterminado, o STF, segundo o Tribunal de Jus-


tiça do Distrito Federal e dos Territórios, tem a interpretação
que a medida de segurança não pode extrapolar o prazo má-
ximo, conforme o artigo 75 do Código Penal. Já para o STJ a
duração não deve ultrapassar o limite máximo da pena apli-
cada para aquele crime cometido, conforme a Súmula 527 “o
tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapas-
sar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito
praticado”. Apesar do posicionamento tanto do STF quanto
STJ, a legislação não estabelece um prazo máximo para o tér-
mino da medida de segurança, o que significa que, em princí-
pio, se a cessação da periculosidade não for identificada, a
medida pode se prolongar indefinidamente.
A medida de segurança é aplicada corriqueiramente em
casos de inimputabilidade, quando o indivíduo tem uma do-
ença mental (transtorno) como esquizofrenia, transtorno dis-
sociativo de identidade, etc., ou seja, são sujeitos que não co-
mandam suas ações, não porque não querem, mas porque
não podem, e em determinadas situações podem oferecer pe-
rigo para si e para a sociedade.
A internação por psicopatia é muito comum no Brasil,
onde na maioria das vezes o réu tende a ficar “preso” por conta
de sua condição mental, podendo usar como exemplo o crimi-

130
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

noso Champinha. Roberto Aparecido Alves Cardoso, conhe-


cido como Champinha de apenas 16 anos, no ano de 2003
cometeu um crime brutal no qual chocou o Brasil, Champinha
e seus comparsas encontrava-se no interior de São Paulo para
uma pescaria, e no mesmo local havia um casal de adolescen-
tes Liana Friedenbach e Felipe Caffé. Conforme as investiga-
ções, Champinha e seus comparsas (adultos) decidiram rou-
bar o casal, mas como as vítimas não tinham posse de um
valor monetário alto, foram levados para um cativeiro, o rapaz
foi o primeiro a morrer com um tiro na nuca, a jovem foi estu-
prada e assassinada por Champinha. Além do abuso, foi com-
provado mediante investigação requintes atos de crueldade
pela parte do réu para com a vítima.
Na época que o crime foi cometido, Champinha tinha
16 anos, sendo considerado incapaz de responder por seus
atos no âmbito penal. Segundo a legislação brasileira, o inca-
paz não cumpre pena, cumpre medidas socioeducativas esta-
belecidas pelo ECA, assim Champinha foi encaminhado para
uma instituição juvenil (Fundação Casa), onde cumpriu a me-
dida máxima estabelecida pelo Estatuto (3 anos).
Após o cumprimento de 3 anos, o réu seria solto, con-
tudo, não foi isso que aconteceu. Com o cumprimento da me-
dida e alcançando a maioridade, Champinha passou por uma

131
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

avaliação psicológica, através dessa avaliação a justiça decla-


rou que o mesmo não poderia viver em sociedade devido a
sua periculosidade, seu diagnóstico foi estabelecido dessa
forma tendo em vista a frieza que o sujeito tinha no ato e logo
depois. De acordo com este diagnóstico, o réu em vez de ser
solto passou a compor a Unidade Experimental de Saúde
(UES), sem previsão de soltura.
Conforme o Ministério Público de São Paulo - MPSP
(2015), o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que Ro-
berto Aparecido Alves Cardoso, conhecido como 'Champinha',
deverá permanecer internado, na Unidade Experimental de
Saúde - UES. Essa deliberação foi aplicada devido à sua atu-
ação na morte do casal Liana Friedenbach, de 16 anos, e Fe-
lipe Caffé, de 19, em Embu-Guaçu-SP, ocorrida em 2003.
A defesa de 'Champinha' apresentou um recurso extra-
ordinário ao STF no contexto de uma ação que buscava sua
interdição e internação compulsória em um hospital psiquiá-
trico, com avaliações periódicas, até que fossem identificadas
condições para seu retorno à sociedade.
O recurso foi interposto após o Tribunal de Justiça man-
ter a resolução de primeira instância que afirmou a internação
de Champinha. Essa decisão foi fundamentada no diagnóstico
de um distúrbio psicológico que o tornava perigoso, na neces-
sidade de internação para conter sua tendência à violência e

132
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

na terapia como um meio de busca de sua recuperação.


O Ministério Público se manifestou contrário à desinter-
nação, argumentando que a execução da medida em um am-
biente não controlado representava um perigo real tanto para
'Champinha' quanto para a sociedade, conforme a avaliação
de peritos do Instituto de Medicina Social e de Criminologia -
IMESC, realizada a pedido do Ministério Público. No julga-
mento do recurso extraordinário, o Ministro relator Teori Za-
vascki negou seguimento.
Diante do exposto, surge o questionamento se de fato
a prisão perpétua não vigora no Brasil, ainda que seja incons-
titucional. O caráter perpétuo tem como característica a per-
petuidade, ou seja, é algo que dura para sempre, relacionando
este conceito com a medida de segurança, estabelecemos
que o cumprimento da medida pode ser indeterminado, assim
fazendo com que o réu fique a vida toda preso.
Tal como Champinha, Chico Picadinho ou até mesmo
o filho que matou o pai por um ataque de esquizofrenia, onde
a medida de segurança pode ser estabelecida como uma me-
dida perpétua, visando assim a segurança individual e cole-
tiva.
No caso de internações por inimputabilidade, faz com
que o indivíduo perca toda sua perspectiva de vida, apesar de
parecer uma pena severa e desumana, nos casos de sujeitos

133
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

que matam pelo simples fato de não ter empatia, se torna uma
ação eficaz.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Assim, como o Código Penal define que a medida de


segurança terá um tempo indeterminado, o mesmo estabelece
que todos os classificados como inimputáveis devem realizar
uma perícia com o médico para o aval de poder ou não pode
viver em sociedade, essa avaliação ocorre de ano a ano,
quando o especialista identifica que não há tratamento o indi-
víduo passa o resto dos seus dias em confinamento.
Apesar da inconstitucionalidade ser voltada para a pri-
são perpétua em si, por se tratar de uma pena que fere os
direitos humanos, nesta exceção, entende-se que a imposição
da medida segurança por tempo indeterminado, em casos de
doentes mentais, se faz necessária, tendo em vista que sua
imposição garante a segurança pública estabelecida pela
Constituição Federal.
Conforme a Constituição, é dever do Estado proteger
todos, desta forma com a aplicação da medida de segurança,
têm se a proteção da população, evitando que um assassino
saia às ruas, causando medo e pânico. Além do cuidado com
a população em geral, o Estado providência toda a assistência

134
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

para o doente, fazendo com ele se sinta bem, mesmo estando


em isolamento sem perspectiva de saída.

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141
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

4
CRIMES COMETIDOS NAS PLATAFORMAS DE
VENDA E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

CRIMES COMMITTED ON SELLING PLATFORMS


AND BRAZILIAN LEGISLATION

Matheus Marciel Andersen dos Santos7


Williane Tibúrcio Facundes8

7
Discente do 9° Período do Curso de Bacharel em Direito do Centro Uni-
versitário Uninorte.
8
Docente do Centro Universitário Uninorte. Graduada em Direito pela
U:VERSE. Especialista em Psicopedagogia pela Universidade Varzea-
grandense e Direito Digital pela Faculdade Metropolitana. Graduada em
Letras Vernáculas pela Universidade Federal do Acre- UFAC.

142
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

SANTOS, Matheus Marciel Andersen dos; FACUNDES, Willi-


ane Tibúrcio. Crimes cometidos nas plataformas de venda
e a legislação brasileira. Trabalho de Conclusão de Curso de
graduação em Direito – Centro Universitário UNINORTE, Rio
Branco. 2024.
RESUMO

O advento das plataformas de venda on-line trouxe consigo


um aumento significativo nos crimes perpetrados nesse ambi-
ente virtual, suscitando uma série de desafios jurídicos para a
legislação brasileira. Este artigo discute a complexidade des-
sas infrações e destaca as lacunas legais que precisam ser
abordadas para enfrentar eficazmente esses crimes digitais.
Dentre os crimes comuns nas plataformas de venda, desta-
cam-se a fraude, a falsificação de produtos, a pirataria digital
e a venda de produtos ilegais. A legislação brasileira, embora
tenha avançado em alguns aspectos, ainda carece de dispo-
sitivos específicos para lidar com as peculiaridades desses de-
litos online. A aplicação das leis existentes muitas vezes es-
barra na dificuldade de identificar os responsáveis e na coo-
peração internacional para a persecução dos criminosos. A
falta de regulamentação específica cria um ambiente propício
para a impunidade e desafia as autoridades a acompanharem
a evolução rápida e constante das tecnologias. É crucial que
o legislador brasileiro atualize e desenvolva leis que abordem
de maneira efetiva os crimes cometidos nas plataformas de
venda on-line, considerando a dinâmica desse ambiente vir-
tual e promovendo a colaboração entre os setores público e
privado. Em suma, a legislação brasileira precisa evoluir para
enfrentar os desafios impostos pelos crimes nas plataformas
de venda on-line, protegendo consumidores, empresários e a

143
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

integridade do comércio digital. Essa adaptação legal é essen-


cial para assegurar um ambiente virtual seguro e confiável,
promovendo o desenvolvimento sustentável do comércio ele-
trônico no Brasil.
Palavras-chave: e-commerce; plataforma digital; estelionato
digital.
ABSTRAC
The advent of online selling platforms has brought about a sig-
nificant increase in crimes committed in this virtual environ-
ment, posing a series of legal challenges for Brazilian legisla-
tion. This article discusses the complexity of these offenses
and highlights the legal gaps that need to be addressed to ef-
fectively combat these digital crimes. Among the common cri-
mes on selling platforms, fraud, product counterfeiting, digital
piracy, and the sale of illegal products stand out. Although Bra-
zilian legislation has made progress in some aspects, it still
lacks specific provisions to deal with the peculiarities of these
online offenses. The enforcement of existing laws often faces
difficulties in identifying perpetrators and in international coo-
peration for the prosecution of criminals. The lack of specific
regulations creates an environment conducive to impunity and
challenges authorities to keep up with the rapid and constant
evolution of technologies. It is crucial for the Brazilian legislator
to update and develop laws that effectively address crimes
committed on online selling platforms, considering the dyna-
mics of this virtual environment and promoting collaboration
between the public and private sectors. In summary, Brazilian
legislation needs to evolve to confront the challenges posed by
crimes on online selling platforms, protecting consumers, en-
trepreneurs, and the integrity of digital commerce. This legal

144
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

adaptation is essential to ensure a safe and reliable virtual en-


vironment, promoting the sustainable development of e-com-
merce in Brazil.

Keywords: e-commerce; digital platform; digital fraud.

145
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

O comercio é fundamental para qualquer sociedade ca-


pitalista, com o advento da tecnologia, o mesmo evoluiu para
as plataformas digitais, trazendo mais acessibilidade, rapidez
e variedade.

Chegando no Brasil pelo final da década de 1990, o co-


mercio eletrônico, cresceu conforme os aparelhos tecnológi-
cos ficavam mais acessíveis para a população, tendo seu au-
mento mais notável com os smartphones e a pandemia da Co-
vid-19.

Segundo dados do e-commerce Brasil, site criado feito


pela parceria das empresas Americanas, Infracommerce, Ma-
galu, Pagarme e Nuvemshop, em 2021 o comercio eletrônico
representou cerca de 17,9% das vendas varejistas. Tendo
como principal benefício a praticidade para o consumidor, po-
dendo comprar qualquer coisa sem precisar sair de casa.

A consequência negativa disto, foi o surgimento de diversos


métodos de golpes seja para roubar dados de compradores,
ou vender produtos falsos. Faz-se há então, a necessidade de
verificar como esta interação social é regulamentada.

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4.1 E-COMMERCE

O E-commerce, termo abreviado do inglês, Eletronic


Commerce e também conhecido no Brasil como Comercio Ele-
trónico.
É uma das formas de comercio mais utilizadas no Bra-
sil, de acordo com pesquisa realizada pela Octadesk e Opinion
Box, cerca de 61% dos consumidores compram mais pela in-
ternet do que em lojas físicas. Isso se deve, pela praticidade
do comprador não precisar sair de casa, dos descontos ofere-
cidos serem maiores e de o preço encontrado na internet ser
menor que o de lojas locais.

4.1.1 HISTÓRIA DO E-COMMERCE NO BRASIL

Com seu início na década de 90 na época da Internet


discada, o acesso ainda era limitado devido a computadores e
telefones sere muito caros na época, mas começou a dar seus
primeiros passos com a Booknet uma livraria crida por Jack
London, que atendia exclusivamente via Internet e prometia
fazer entregas em 72 horas para as capitais do Rio de Janeiro
e São Paulo, ele aceitava que o pagamento fosse feito na en-
trega.

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Em 1998, a empresa foi comprada por pela GP Inves-


tments e 1 ano após, foi reinaugurada como o Submarino, de-
vido ao desejo de expandir a marca pela América Latina
Entre o período de 1999-2000, foram criados dois sites
importantes para o e-commerce no Brasil, o Mercado Livre e
a Amercianas.com. Também foi neste período que ocorreu o
estouro da Bolha da Internet
A bolha da Internet foi como ficou conhecido o período
de especulação exagerada nos mercados financeiros que re-
lacionados à Internet, muitas empresas eram start-ups que
embora não tivessem lucros eram avaliadas em preços altos.
Permitindo que o público em geral comprasse ações dessas
empresas, o clima eufórico e otimista fez com que os investi-
dores tivessem mais interesse pelos lucros futuros do que nos
lucros atuais.
Em meados do ano 2000, essa bolha estourou, quando
os investidores perceberam que a avaliação feita para essas
empresas era insustentável, assim, levando a venda de ações
e o decaimento dos preços. Diversas empresas pontocom,
como eram chamadas as empresas voltadas para a internet,
faliram ou viram uma desvalorização em suas ações.
Os sites comparadores de preço Bondfaro e Buscapé
também surgiram nesse período. E com a virada do milênio,
teve o surgimento da Gol empresa de passagens aéreas que

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vendia exclusivamente via Internet, o que acabou por atrair a


atenção de mais consumidores para o e-commerce. Outras
grandes empresas surgiram logo depois como a Netshoes e a
Flores Online.
Em 2002, a empresa Submarino conseguiu provar que
o e-commerce, dava lucro ao conquistar o break even, termo
em inglês para sugerir o ponto de equilíbrio que uma empresa
atinge ao igualar tanto o lucro quanto as despesas. Isso ala-
vancou o e-commerce e fez com que em 2003, o faturamento
fosse de 1 bilhão de reais e o público consumidor atingido a
marca de 2,6 milhões de pessoas.
Já em 2005, houve alguns outros marcos, a empresa
Americanas crescia e comprava as empresas Shoptime e Vi-
deo Lar. O Submarino fez a abertura de seu capital na bolsa
de valores e entrou no mercado de viagens adquirindo a in-
gressos.com e a TravelWeb.com.
Conforme a decada passava, o aumento de usuarios na
Internet e a popularização das redes sociais, as empresas co-
meçaram a investir no sistema de marketing digital do google,
devido ao baixo preço, pois com apenas R$ 500,00, as micro
e pequenas empresas podiam ser anunciadas pela Internet,
assim possibilitando a competição com as grandes empresas,
pois as midias que mais davam certo eram os links patrocina-
dos. A entrada de empresas de serviços no ambiente online

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também ajudou a impulsionar ainda mais o comercio digital.


Mas a novidade que chegaria para alavancar o cenário, seria
os smartphones.
Os smartpones possibilitaram um acesso mais pratico
à Internet, aumentando o número de usuarios e criando sua
propria categoria de e-commerce, o mobile-commerce, onde
as empresas focam em adaptar os seus canais de vendas
para o mobile ao invés dos computadores de mesa. Estimati-
vas da Fundação Getúlio Vargas, estipulam 1,2 smartphones
por habitante, o que dá um total de 249 milhões de celulares e
representam 53% das vendas do comercio eletrônico brasi-
leiro.
Outra importante novidade, foi a chegada do Pix, o sis-
tema de pagamento instantâneo que possibilitou o pagamento
sem a necessidade de dinheiro físico ou cartão, apenas com
o celular e a leitura de um QR Code, ou chave de acesso.
Por fim, o efeito pandemia foi de bastante importância
para este setor, com diversas lojas tendo de fechar o acesso
físico, as pequenas empresas tiveram que se adaptar e inovar
com as novas demandas, segundo dados da Companhia
Compre & Confie junto com a Câmara Brasileira de Economia
digital, fez com que em 2021 o comercio digital tivesse um
crescimento de 25%.

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4.2 ANÁLISE DAS PLATAFORMAS DE VENDAS

As principais plataformas de venda, funcionam pelo mé-


todo Marketplace que é um site que reúne vários vendedores
com diferentes ofertas e produtos e intermedia com os clien-
tes, facilitando assim para o comprador analisar os melhores
preços, comprar itens diversificados e receber maior descon-
tos nos fretes, que acabam por na maioria das vezes ficar por
conta do lojista.
Já para o lojista, isso é bom pois não precisa gastar com
um site de seu próprio domínio nem precisa se preocupar com
o marketing. Também permite que os clientes avaliem seus
produtos o que afeta a reputação da loja.

4.2.1 PRINCIPAIS PLATAFORMAS DE VENDAS NACIONAIS


E INTERNACIONAIS

Amazon: fundada em 1994, a Amazon é hoje o maior


Marketplace do planeta.
Prós: maior Marketplace global, oferecendo acesso a
um grande número de clientes; infraestrutura logística robusta
para gerenciar armazenamento e entrega; ferramentas de pu-
blicidade integradas para impulsionar a visibilidade dos produ-
tos.

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Contras: forte concorrência e saturação em alguns se-


tores; a empresa não garante a qualidade do produto, por se
tratar de diferentes vendedores; taxas de venda podem ser
consideráveis, dependendo da categoria.

Mercado Livre: criado em 1999, em Buenos Aires, Ar-


gentina.
Prós: líder do mercado latino-americano, com presença
significativa no Brasil; modelo de Marketplace que permite par-
ticipação de grandes empresas e pequenos vendedores indi-
viduais; oferece várias opções de pagamento e integração
com o Mercado Pago.
Contras: concorrência acirrada em diversas categorias;
as políticas variam dependendo de cada país.

AliExpress: serviço de varejo on-line fundado em 2010


pelo grupo Alibaba.
Prós: maior plataforma de compras online da China;
preços competitivos e grande variedade de produtos; frete in-
ternacional acessível.
Contras: tempo de entrega pode ser longo; site não está
todo traduzido para o português; a qualidade do produto e a
confiabilidade do vendedor variam.

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Submarino: Como já citado, foi uma das pioneiras do


Brasil neste ramo, o nome submarino foi escolhido por ser um
serviço disponível em toda a américa latina.
Prós: frequentemente oferece descontos e promoções
o que acaba por atrair consumidores de diferentes áreas; faci-
lidade de compras online, além de ter um site projeto para ser
fácil de usar, também faz parte do grupo Americanas, possibi-
litando o alcance a ainda mais produtos; benefícios como pro-
gramas de fidelidade, como o Submarino prime que fornece
prioridade em promoções, frete grátis e descontos exclusivos;
possui lojas tanto online quanto físicas; a empresa fornece um
atendimento de troca e devolução.
Contras: de acordo com as informações do reclame
aqui, a empresa é conhecida por prolongar os prazos de en-
trega; problemas de atendimento ao cliente, como demorar a
responder ou dificultar para solucionar o prolema; embora ofe-
reça frete grátis, não é para todas as regiões do país; por ofe-
recer produtos de diversos produtores, acabam por ter uma
qualidade variada; algumas reclamações relatam, que nas lo-
jas físicas as filas são longas e desorganizadas.

OLX: a OLX é um Marketplace consumidor x consumi-


dor, ou seja, os consumidores compram e vendem entre si,

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sem a necessidade de uma empresa intermediando, ela apre-


senta apresente algumas peculiaridades diferentes dos ou-
tros:
Prós: os usuários podem facilmente navegar pela lista
de produtos e anunciar de forma fácil e pratica; a OLX fornece
a possibilidade para os usuários criarem anúncios gratuitos; a
plataforma facilita a negociação direta entre comprador e ven-
dedor, permitindo acordos personalizados.
Contras: como as demais plataformas de comercio ele-
trónico, há riscos de fraude e demais tipos de golpes; alguns
usuários podem criar anúncios falsos que podem prejudicar os
compradores; as negociações e encontros pessoais para fina-
lizar a transação, podem ser inconveniente e podem acabar
arriscando a vida dos usuários; por a negociação ser direta
entre os usuários a OLX não oferece cobertura e garantia de
qualidade e nem devolução dos produtos.

Pode notar-se que os principais problemas estão rela-


cionados a qualidade dos produtos e a confiabilidade do ven-
dedor, mas esses não são os únicos perigos que ocorrem nas
plataformas de venda, há ainda outros diversos tipos de gol-
pes.

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4.3 CRIMES COMUNS NO E-COMMERCE E SEUS IMPAC-


TOS

Os crimes cometidos no comércio eletrônico podem ser


variados e estão em constante evolução à medida que a tec-
nologia avança. Dentre eles temos:

4.3.1 FRAUDE DE CARTÃO DE CRÉDITO

O fraudador obtem acesso aos dados do cartão como


o código de segurança a data de validade e o número do car-
tão, assim, realizam compras não autorizadas. Essas infor-
mações podem ser obtidas por diferentes métodos tais como:

Skimming: dispositivos projetados para registrar infor-


mações dos cartões,como número e CVV (Card verification
value o mesmo que valor verificador do cartão), instalam dis-
positivos em caixas eletrônicos, terminais de pagamento ou
outros dispositivos de leitura de cartão para assim capturar os
dados;
Phishing: ao enviar e-mails, mensagens de texto ou fa-
zendo ligações telefônicas se passando por órgãos governa-
mentais ou instituições financeiras. Eles tentam enganar as
pessoas para que elas forneçam suas informações pessoais e
os detalhes do cartão;

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Clonagem do cartão: após a obtenção dos dados do


cartão por um dos métodos citados acima, o fraudador utiliza
essas informações para fazer uma cópia do cartão, que são
utilizados em locais onde a presença física do cartão não é
necessária;
Compra de dados roubados: quando ocorre alguma in-
vasão a grandes bancos financeiros e os dados são roubados,
ou as pessoas utilizaram-se do phishing e do skimming, eles
acabam sendo vendidos no mercado negro da internet, muitas
vezes localizados em sites na dark web. Nos casos de crime
de fraude do cartão e descoberto o fraudador, incidem os art.
927 do Código Civil (2002), “Art. 927: Aquele que, por ato ilícito
(art. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-
lo”
A lei 12.737/2012, Lei dos Crimes Ciberneticos, equipa-
rou a falsificação de cartão ao art. 298 do Código Penal (1940),
falsificação de documento particular, assim aqueles que co-
metem este tipo de crime podem acabar sendo condenados a
uma pena de 1 a 5 anos e multa. Caso o golpista não seja
encontrado vem resguardar o titular do cartão o artigo 14 do
Código de Defesa do Consumidor e seu parágrafo unico

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, in-


dependentemente da existência de culpa, pela

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

reparação dos danos causados aos consumido-


res por defeitos relativos à prestação dos servi-
ços, bem como por informações insuficientes ou
inadequadas sobre sua fruição e riscos.
§ 1º O serviço é defeituoso quando não fornece
a segurança que o consumidor dele pode espe-
rar, levando-se em consideração as circunstân-
cias relevantes, entre as quais:
I - o modo de seu fornecimento;
II - o resultado e os riscos que razoavelmente
dele se esperam;
III - a época em que foi fornecido. (Brasil, 1990)

Ou seja, caso a fraude ocorra e não seja culpa nem do


titular nem do vendedor, cabe à operadora do cartão, reparar
os danos.

4.3.2 VENDA DE PRODUTOS NÃO LICENCIADOS

A venda de produtos falsificados pode ocorrer tanto


quando os produtos são pirateados quanto os produtos são
vendidos por uma loja sem licenciamento.
De acordo com pesquisa realizada pela diretoria de Es-
tudos e Pesquisa da Fundação Procon-SP, cerca de 63% dos
consumidores recebeu produtos falsificados ao invés do origi-
nal.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Gráfico 01

Fonte PROCON/SP

Desses 686 consumidores entrevistados, 350 foram en-


ganados por lojas do comércio eletrônico; 176 em lojas virtuais
e 60 em prestadoras de serviço. Nota-se que a maior ocorrên-
cia nas compras on-line é devido a falta de contato direito com
o produto, assim, restando apenas analisar através de ima-
gens e descrições.
Quando chega, os compradores notam a falsificação
pela qualidade do material, logotipos mal produzidos, ou em-
balagens de cor diferente ou fora do padrão da marca.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Esse tipo de golpe é prejudicial tanto pro consumidor,


quanto para o Estado, já que por se tratar de produto falsifi-
cado, o vendedor não paga os impostos referentes a taxa de
licenciamento, já para os consumidores é perigoso, pois não
passou pela inspeção e controle de qualidade.
Além do Código de Defesa do Consumidor, esse tipo de
golpe também fere a Lei 9.279/96, Lei de Propriedade Indus-
trial, que visa proteger os vendedores e criadores do próprio
produto e trata sobre o registro de marca, a patente, registro
do desenho industrial do produto e identidade visual, indicação
visual e direitos autorais.
No caso de vendas de produtos piratas ou não licenci-
ados ocorre os casos previstos no art. 189 e 190 desta lei:

Art. 189. Comete crime contra registro de marca


quem:
I - Reproduz, sem autorização do titular, no todo
ou em parte, marca registrada, ou imita-a de modo
que possa induzir confusão; ou
II - Altera marca registrada de outrem já aposta em
produto colocado no mercado.
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano,
ou multa.
Art. 190. Comete crime contra registro de marca
quem importa, exporta, vende, oferece ou expõe
à venda, oculta ou tem em estoque:
I – Produto assinalado com marca ilicitamente re-
produzida ou imitada, de outrem, no todo ou em
parte; ou

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

II - Produto de sua indústria ou comércio, contido


em vasilhame, recipiente ou embalagem que
contenha marca legítima de outrem.
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou
multa (Brasil, 1996).

E ainda ocorre o ato ilícito civil previsto no 186 do Có-


digo Civil (2002), “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito.”
É importante ressaltar que para as marcas que sofre-
ram desse golpe, elas podem entrar com ação de danos mo-
rais e lucros cessantes nos limites do que foi perdido, ou pedir
que seja pago a quantia que seria necessário para se obter a
licença. Não só a empresa dona da marca pode entrar com
ação, mas também as empresas licenciadas, conforme o art.
139 da Lei 9.279/96

Art. 139. O titular de registro ou o depositante de


pedido de registro poderá celebrar contrato de li-
cença para uso da marca, sem prejuízo de seu
direito de exercer controle efetivo sobre as espe-
cificações, natureza e qualidade dos respectivos
produtos ou serviços.”
Parágrafo único. O licenciado poderá ser inves-
tido pelo titular de todos os poderes para agir em
defesa da marca, sem prejuízo dos seus próprios
direitos (Brasil,1996).

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O consumidor é amparado pelo CDC, devendo valer-se


no que é previsto no art. 49, o direito ao arrependimento, em
um prazo de 07 dias ele deve comunicar-se com a empresa
de e-commerce e falar sobre as falhas do produto.

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato,


no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou
do ato de recebimento do produto ou serviço, sem-
pre que a contratação de fornecimento de produ-
tos e serviços ocorrer fora do estabelecimento co-
mercial, especialmente por telefone ou a domicí-
lio.
Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o di-
reito de arrependimento previsto neste artigo, os
valores eventualmente pagos, a qualquer título,
durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de
imediato, monetariamente atualizados (Brasil,
1990).

4.3.3 CRIME DE ESTELIONATO DIGITAL

O crime de estelionato digital, inserido no contexto con-


temporâneo da cibercriminalidade, representa uma forma so-
fisticada de fraude que explora as vulnerabilidades das tran-
sações eletrônicas e a confiança depositada pelos usuários na
tecnologia. O estelionato digital envolve a utilização de meios
eletrônicos para enganar indivíduos ou organizações, visando
a obtenção de vantagens ilícitas. As táticas empregadas in-
cluem a criação de páginas web falsas, e-mails fraudulentos,

161
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ou a manipulação de sistemas de pagamento online. A vítima,


muitas vezes, é ludibriada a divulgar informações sensíveis,
como senhas, dados bancários ou detalhes pessoais, resul-
tando em prejuízos financeiros significativos.
Graças a Internet, o crime de estelionato pôde se adap-
tar de diversas formas, a falsa anonimidade na Internet da aos
criminosos uma sensação de segurança para que assim se
aproveite dos demais usuários. De acordo com os dados do
Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o estelionato por meio
digital em 2021 foram 120.470 registros, já em 2022, 200.322
casos, isso é um aumento de 66,2%.

GRAFICO 02:

Fonte: Fórum de Segurança

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O estelionato on-line pode ocorrer de diversas formas,


como diz Guilherme Souza Nucci

Existem diversas maneiras de se cometer o crime


de estelionato, sendo a sua forma genérica a que
está disposta no caput do artigo, que é quando o in-
divíduo obtém determinada vantagem sobre outra
pessoa ao induzi-la a erro, ou, fazer que permaneça
nele. A vítima deve contribuir com o criminoso, po-
rém sem notar que está colocando a risco o seu pa-
trimônio. O autor do crime pode provocar a situação
de engano ou simplesmente fazer que a
vítima permaneça em erro, usando de artifícios,
meios ardilosos ou qualquer outra forma de
fraude. (2023)

Dentre elas, uma das mais dignas de nota é a fraude de


invasão de dispositivo, este tipo pode ocorrer tanto em sites
do e-commerce quanto em qualquer outro site da Internet,
onde seja possível o hacker instalar um spyware, tipo de mal-
ware, que visa instalar-se no dispositivo e captar informações
pessoais como dados financeiros, fotos e demais informações
de conta.
Este tipo de estelionato ficou bastante famoso no país,
pois graças a uma famosa ter sido vítima, a lei 12.737/2012,
Lei Carolina Dieckmann, ganhou forças e foi sancionada. Está
lei foi a primeira no Brasil a tipificar os crimes cibernéticos, em-
bora não seja muito complexa, ainda foi um importante marco.

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Art. 2º O Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezem-


bro de 1940 - Código Penal, fica acrescido dos
seguintes arts. 154-A e 154-B:

Invasão de dispositivo informático


Art. 154-A. Invadir dispositivo informático alheio,
conectado ou não à rede de computadores, me-
diante violação indevida de mecanismo de segu-
rança e com o fim de obter, adulterar ou destruir
dados ou informações sem autorização expressa
ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vul-
nerabilidades para obter vantagem ilícita:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um)
ano, e multa (Brasil, 2012).

Embora não tenha tipificado todas as variações do


crime de estelionato, em 2021, veio a Lei 14.155/2021 que
acabou por qualificar o crime de estelionato feito por meio ele-
trônico.

Art. 1º O Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro


de 1940 (Código Penal), passa a vigorar com as
seguintes alterações:
Art. 171[...] Fraude eletrônica:
§ 2º-A. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8
(oito) anos, e multa, se a fraude é cometida com a
utilização de informações fornecidas pela vítima
ou por terceiro induzido a erro por meio de redes
sociais, contatos telefônicos ou envio de correio
eletrônico fraudulento, ou por qualquer outro meio
fraudulento análogo.
§ 2º-B. A pena prevista no § 2º-A deste artigo, con-
siderada a relevância do resultado gravoso, au-
menta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

o crime é praticado mediante a utilização de servi-


dor mantido fora do território nacional.(Brasil,
2021).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O comércio eletrônico, embora jovem teve uma evolu-


ção rápida e caiu no agrado dos brasileiros, devido a sua pra-
ticidade e confortabilidade, assim superando em alguns casos
as compras em lojas fisicas. Os marketplaces, os sites de
comparação de preços e os sites que permitem vendas de
comprador para comprador, possibilitaram a evolução do co-
mercio e a melhoria da economia.
No entanto, onde há comércio, há golpistas, não demo-
rou para que pessoas se aproveitassem das falhas do comer-
cio eletronico e começassem a abusá-las, o Código de Defesa
do Consumidor é a principal forma de regulamentar as rela-
ções entre os consumidores e vendedores, mas por ser de
1990, não está preparado para lidar com todos os problemas
que vieram com o comércio virtual.
Por isso, em 2013, foi criado o Decreto Federal nº
7.962/2013, que foi concebido para melhorar o comércio ele-
trônico trazendo mais seguridade evitando fraudes. Mas é

165
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

digno de nota, que mesmo com esse decreto, os contratos en-


tre comprador e vendedor digitais ainda é regulamentado pelo
CDC que visa contratos fisicos.
Já a punibilidade para os praticantes destes atos ilicitos,
não parece ser o suficiente, mesmo com a Lei Carolina Dieck-
man, o Código Penal a Lei de Proteção Industrial e a qualifica-
ção do Estelionato, os crimes em ambiente virtual, principal-
mente no e-commerce, apenas tendem a aumentar.
O e-commerce ira continuar a evoluir, assim como os cri-
mes digitais, dessa forma qualquer regulamentação, por isso,
qualquer nova forma de regulamentação visando a proteção
do consumidor é bem vista.
A legislação brasileira enfrenta desafios na tipificação pre-
cisa do estelionato digital, dada a sua natureza complexa e
dinâmica. A falta de dispositivos legais específicos pode difi-
cultar a persecução eficaz desses crimes, levando a lacunas
na proteção legal das vítimas. A colaboração internacional
também se mostra crucial, dada a natureza transnacional des-
ses delitos.
A prevenção do estelionato digital exige uma abordagem
holística, integrando medidas técnicas, educacionais e legais.
A conscientização pública sobre práticas seguras na Internet,
o aprimoramento de sistemas de segurança cibernética e a

166
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

atualização constante da legislação são aspectos cruciais


para mitigar os riscos associados a esse tipo de crime.
Enfim, o estelionato digital representa uma faceta desafi-
adora da cibercriminalidade, demandando uma resposta jurí-
dica e tecnológica eficiente. O aprimoramento da legislação e
a cooperação internacional são essenciais para enfrentar esse
fenômeno em constante evolução, garantindo a proteção dos
cidadãos e a integridade do ambiente digital.

REFERÊNCIAS

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Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

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BRASIL, DECRETO - LEI Nº 2.848. DE 7 DEZEMBRO DE


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BRASIL, DECRETO Nº 7.962, DE 15 DE MARÇO DE 2013.


Regulamenta a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, para
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BRASIL, LEI Nº 8.078 DE 11 DE SETEMBRO DE 1990. Dis-


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172
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

5
A APOSENTADORIA DO SEGURADO ESPECIAL
RURAL – REQUISITOS E MEIOS DE PROVAS

RETIREMENT OF SPECIAL INSURED RURA –


REQUIREMENTS AND METHODS OF EVIDENCE

Andréa de Souza Furtado9


Alcides Marini Filho10

FURTADO, Andréa de Souza; MARINI FILHO, Alcides. A


aposentadoria do segurado especial rural – requisitos e
meios de provas. Trabalho de Conclusão de Curso de
graduação em Direito – Centro Universitário UNINORTE, Rio
Branco. 2024.

9
Discente do 9° Período do Curso de Bacharel em Direito do Centro Uni-
versitário Uninorte.
10
Docente do Centro Universitário Uninorte. Graduado em Direito pela Uni-
versidade Católica Dom Bosco de Campo Grande; Pós-graduado em Di-
reito Civil pelo Instituto Elpídio Donizete.

173
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

RESUMO

Introdução. Este artigo discute os requisitos e meios de


provas na aposentadoria do segurado especial, bem como
os requisitos de acesso à aposentadoria rural e, ainda, os
meios que o trabalhador rurícola possui para comprovar o
cumprimento dos requisitos para a obtenção dos benefícios
de aposentadorias. Objetivo. Analisar as Leis
previdenciárias, especialmente, a Lei 8.213/91 e Decreto
3.048/99 para verificar quais provas são exigidas na
aposentadoria por idade rural, bem como acerca da
existência de outros meios para a obtenção da
aposentadoria e demonstrar a dificuldade que muitos
trabalhadores rurais possuem na obtenção de aposentadoria
em virtude da insuficiência de documentos rurais que os
mesmos não conseguem juntar e identificar a maneira de
amenizar isso. Metódo. Através do embasamento teórico
possibilitou-se identificar os meios de provas rurais e de que
maneira isso pode melhorar. Resultados. Houve uma
evolução na legislação e nos meios de obtenção de provas
para o segurado especial, ofertando-se um maior leque de
documentos que servem como prova do labor rural, bem
como pela possibilidade de comprovação dessa atividade por
meio de bases governamentais, isto é, uma vez o segurado
estando devidamente qualificado nos órgãos de agricultura,
extrativismo, pesca, etc, tais dados migrariam para as bases
previdenciárias do INSS, podendo, a partir, daí, ocorrer a
comprovação da atividade rural por meio, unicamente, das
bases governamentais e a consequente automação do
reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria.
Conclusão. Enxerga-se a necessidade de uma maior
discussão da temática, pois mesmo diante da aparente
evolução, muitos trabalhadores rurais não conseguem obter
a documentação necessária à obtenção do seu direito.
Palavras-chave: aposentadoria; rural; meios de provas.

174
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

ABSTRACT

Introduction. This article discusses the requirements and


means of proof in the retirement of the special insured, as
well as the requirements for access to rural retirement and,
also, the means that the rural worker has to prove
compliance with the requirements for obtaining retirement
benefits. Goal. Analyze the social security laws, especially
Law 8,213/91 and Decree 3,048/99 to verify what evidence
is required in retirement due to rural age, as well as about the
existence of other means to obtain retirement and
demonstrate the difficulty that many rural workers have in
obtaining retirement due to insufficient rural documents that
they are unable to gather and identify a way to alleviate this.
Method. Through the theoretical basis, it was possible to
identify the means of rural testing and how this can improve.
Results. There has been an evolution in legislation and in the
means of obtaining evidence for the special insured, offering
a greater range of documents that serve as proof of rural
work, as well as the possibility of proving this activity through
government bases, that is, Once the insured person is duly
qualified in the agriculture, extractivism, fishing bodies, etc.,
such data would migrate to the INSS social security bases,
and from there, proof of rural activity could occur through,
solely, the governmental and the consequent automation of
the recognition of the right to retirement benefits.
Conclusion. There is a need for greater discussion on the
topic, as even in the face of apparent evolution, many rural
workers are unable to obtain the necessary documentation
to obtain their rights.

Keywords: retirement; rural; means of evidence.

175
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

INTRODUÇÃO

Este artigo discute os requisitos e meios de provas


na aposentadoria do segurado especial, bem como os
requisitos de acesso à aposentadoria rural e, ainda, os meios
que o trabalhador rurícola possui para comprovar o
cumprimento dos requisitos para a obtenção dos benefícios
de aposentadorias.
A legislação previdenciária elenca algumas espécies
de benefícios, tais como auxílio por incapacidade temporária,
salário-maternidade, auxílio-acidente aposentadoria por
incapacidade permanente, pensão por morte, auxílio-
reclusão, etc. Entretanto, neste artigo, dar-se-á maior ênfase
ao benefício de aposentadoria por idade, pois, por ser,
teoricamente, o benefício que depende de uma robustez
maior de provas documentais, considerando o maior prazo
de comprovação da atividade, a qual necessita ser em 180
meses – 15 anos, é a espécie que mais impõe dificuldade de
comprovação documental aos segurados. Vale lembrar que,
tanto para mulheres quanto para homens, o tempo de
comprovação no benefício de aposentadoria por idade será
o mesmo. Nos últimos anos, como se verá, houve uma
evolução na legislação e nos meios de obtenção de provas
para o segurado especial, ofertando-se um maior leque de

176
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

documentos que servem como prova do labor rural, bem


como pela possibilidade de comprovação dessa atividade por
meio de bases governamentais, isto é, uma vez o segurado
estando devidamente qualificado nos órgãos de agricultura,
extrativismo, pesca, etc, tais dados migrariam para as bases
previdenciárias do INSS, podendo, a partir, daí, ocorrer a
comprovação da atividade rural por meio, unicamente, das
bases governamentais e a consequente automação do
reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria.
Contudo, mesmo assim, enxerga-se a necessidade
de uma maior discussão da temática, pois mesmo diante da
aparente evolução, muitos trabalhadores rurais não
conseguem obter a documentação necessária à obtenção do
seu direito.

5.1 ASPECTOS INTRODUTÓRIOS ACERCA DO


BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR IDADE E OS
MEIOS DE PROVAS

A aposentadoria por idade está prevista na Lei


8.213/91. O Art. 18, inciso I, b, da referida Lei elenca a
aposentadoria por idade como um dos benefícios a serem
pagos ao segurado. Já o art. 25, II da mesma Lei impõe
como carência ao referido benefício, 180 contribuições

177
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

mensais. Apenas a título ilustrativo, importante, mencionar


que, carência é o número mínimo de contribuições que um
determinado segurado precisa atingir para alcançar um
benefício.
Referida aposentadoria pode ser paga a todos os
segurados que contribuem, respeitados, evidentemente,
inúmeros outros requisitos de acesso, sendo o elementar
deles, as 180 contribuições mensais. Ela pode ser paga
também ao trabalhador rural, os quais podem ser
empregados rurais, contribuinte individuais rurais e os
segurados especiais, objeto deste trabalho. Quem são os
segurados especiais? A própria Lei 8.213/91 nos apresenta.
O Art.11, VII da Lei assim define o segurado especial:

A pessoa física residente no imóvel rural ou em


aglomerado urbano ou rural próximo a ele que,
individualmente ou em regime de economia fami-
liar, ainda que com o auxílio eventual de tercei-
ros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário,
possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outor-
gados, comodatário ou arrendatário rurais;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado
que faça da pesca profissão habitual ou prin-
cipal meio de vida;
b) cônjuge ou companheiro, bem como filho
maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este
equiparado, do segurado de que tratam as alí-
neas a e b deste inciso, que, comprovadamente,
trabalhem com o grupo familiar respectivo (Bra-
sil, 1991).

178
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

A definição acima exposta é a definição geral,


existem outros normativos que especificam de forma mais
pormenorizada quais tipos de trabalhadores podem se
enquadrar como sendo os segurados especiais. A instrução
Normativa PRES/INSS Nº 128, de 28 de Março de 2022 é
um desses normativos. Ela foi expedida para disciplinar as
regras sobre a aplicabilidade do direito previdenciário como
um todo. Ela é conhecida como a “bíblia do INSS” e prevê
674 artigos elucidando as regras, rotinas e procedimentos
acerca da legislação previdenciária e sua aplicabilidade.
A IN acima citada cita em seu art. 3º o segurado
especial como sendo um segurado obrigatório do Regime
Geral de Previdência Social e a partir de seu artigo110
discrimina de forma mais detalhada do que a Lei as pessoas
que podem ser consideradas seguradas especiais, senão
veja-se:

Art. 110. Para efeitos do enquadramento como


segurado especial, considerase produtor rural o
proprietário, condômino, usufrutuário, pos-
seiro/possuidor, assentado, parceiro, meeiro, co-
modatário, arrendatário rural, quilombola, serin-
gueiro, extrativista vegetal ou foreiro, que reside
em imóvel rural, ou em aglomerado urbano ou ru-
ral próximo, e desenvolve atividade agrícola,
pastoril ou hortifrutigranjeira, individualmente ou
em regime de economia familiar, considerando
que: I - condômino é aquele que explora imóvel

179
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

rural, com delimitação de área ou não, sendo a


propriedade um bem comum, pertencente a vá-
rias pessoas; II - usufrutuário é aquele que, não
sendo proprietário de imóvel rural, tem direito à
posse, ao uso, à administração ou à percepção
dos frutos, podendo usufruir o bem em pessoa
ou mediante contrato de arrendamento, como-
dato, parceria ou meação; III - posseiro/possui-
dor é aquele que exerce, sobre o imóvel rural, al-
gum dos poderes inerentes à propriedade, utili-
zando e usufruindo da terra como se proprietário
fosse; IV - assentado é aquele que, como benefi-
ciário das ações de reforma agrária, desenvolve
atividades agrícolas, pastoris ou hortifrutigranjei-
ras nas áreas de assentamento; V - parceiro é
aquele que tem acordo de parceria com o propri-
etário da terra ou detentor da posse e desenvolve
atividade agrícola, pastoril ou hortifrutigranjeira,
partilhando lucros ou prejuízos; VI - meeiro é
aquele que tem acordo com o proprietário da terra
ou detentor da posse e, da mesma forma, exerce
atividade agrícola, pastoril ou hortifrutigranjeira,
partilhando rendimentos ou custos; VII - comoda-
tário é aquele que, por meio de acordo, explora a
terra pertencente a outra pessoa, por emprés-
timo gratuito, por tempo determinado ou não,
para desenvolver atividade agrícola, pastoril ou
hortifrutigranjeira; VIII - arrendatário é aquele que
utiliza a terra para desenvolver atividade agrícola,
pastoril ou hortifrutigranjeira, mediante paga-
mento de aluguel, em espécie ou in natura, ao
proprietário do imóvel rural; IX - quilombola é o
afrodescendente remanescente dos quilombos
que integra grupos étnicos compostos de des-
cendentes de escravos; X - seringueiro ou extra-
tivista vegetal é aquele que explora atividade de
coleta e extração de recursos naturais renová-

180
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

veis, de modo sustentável, e faz dessas ativida-


des o principal meio de vida; e XI - foreiro é
aquele que adquire direitos sobre um terreno
através de um contrato, mas não é o dono do lo-
cal. (Brasil, 2022)

Para Amado (2017) o segurado especial pode ser


conceituado como “o pequeno produtor rural ou pescador
artesanal, que trabalham individualmente ou em família para
fins de subsistência, sem a utilização de empregados
permanentes”.
Conforme se percebe, de uma maneira geral,
segurado especial é o trabalhador rural, agricultor, o qual faz
da atividade rurícola seu principal meio de vida. O pescador
artesanal também é considerado segurado especial,
equiparado a trabalhador rural, conforme Art. 111 da mesma
instrução Normativa PRES/INSS Nº 128, de 28 de Março de
2022.
A legislação previdenciária também enquadra o
indígena como segurado especial, desde que o exercício de
sua atividade rural seja devidamente certificado pela Funai.
Nesse caso, a legislação trata a certidão de exercício de
atividade rural do indígena expedida pela Funai como prova
plena, dispensando se apresentação de quaisquer outros
documentos. Portanto, no caso do indígena, a comprovação
é diferente, pois a certidão da Funai é prova plena, em

181
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

virtude da fé pública e da presunção de veracidade dos atos


expedidos por servidores e órgãos públicos.
Existem inúmeros outros artigos da legislação que
irão versar sobre o segurado especial de maneira
pormenorizada, tais como os que permitem o segurado
praticar determinadas atividades ou receber determinados
rendimentos sem que haja sua descaracterização como
segurado, bem como em quais casos e a partir de quando o
segurado especial poderá perder sua qualidade de
segurado, quem são as pessoas integrantes de seu núcleo
familiar que também poderão ser consideradas especiais,
como é feita a sua produção, de que forma pode ser feita a
comercialização de sua produção, etc. Entretanto, ao menos
neste momento, não se falará disso, tendo em vista o foco
ser a aposentadoria propriamente dita e os meios de provas
para a obtenção deste direito.
Pois bem. Voltando ao tema aposentadoria, como foi
dito, a aposentadoria por idade está prevista na Lei nº.
8.213/91 e, como visto, exige para o seu reconhecimento a
necessidade de, no mínimo, 180 contribuições mensais.
Entretanto, especificamente, para o segurado especial, esta
carência pode ser comprovada por meio do exercício de
atividade rural. É o que prevê o artigo 39 da referida lei.

182
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Art. 39. Para os segurados especiais, referidos


no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica
garantida a concessão: I - de aposentadoria por
idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de au-
xílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um)
salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme
disposto no art. 86 desta Lei, desde que compro-
vem o exercício de atividade rural, ainda que de
forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, igual ao
número de meses correspondentes à carência
do benefício requerido, observado o disposto nos
arts. 38-A e 38-B desta Lei; (Brasil, 1991)

Da legislação supracitada, depreende-se que,


embora, seja obrigatório o alcance de 180 contribuições
mensais para a obtenção do benefício de aposentadoria por
idade, para o segurado especial este benefício será garantido
se o mesmo comprovar o exercício de atividade rural no
número de meses idênticos a carência do benefício.
Portanto, no momento em que a lei permite ao
segurado especial que as 180 contribuições mensais sejam
substituídas pela comprovação do exercício de atividade
rural, o critério deixa de ser unicamente objetivo (pagamento
de 180 contribuições), passando-se também para o campo
da subjetividade, pois toda comprovação requer também uma
análise subjetiva. A seguir, veremos de forma mais detalhada
os meios de comprovação disponíveis ao segurado especial
acerca do seu exercício de atividade rural.

183
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

1.1 EVOLUÇÃO DOS TIPOS DE PROVAS DO LABOR RU-


RAL A PARTIR DA LEI 8.213/91

Neste tópico não se pretende abordar a evolução e


os aspectos históricos da legislação processual
previdenciária acerca da comprovação da atividade rural
pelos segurados especiais, tendo em vista que, nas décadas
passadas já existia aposentadoria por idade rural e os
requisitos de acesso a ela, inclusive o chamado Funrural, tão
conhecido entre os trabalhadores rurais, a qual na verdade
se trata de uma lei antiga que prevê a aposentadoria do
trabalhador rural.
Portanto, irá se abordar os meios de comprovação
do labor rural sob a égide da lei 8.213/91 que é a lei que trata
do sistema de benefícios do regime geral de previdência
social. Quando a Lei entrou em vigor no ano de 1991 elencou-
se apenas 7 documentos que serviu como prova da atividade
rural, quais sejam:

Art. 106. A comprovação do exercício de ativi-


dade rural far-se-á, alternativamente, através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de
Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou como-
dato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores ru-
rais, desde que homologada pelo Ministério Pú-

184
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

blico ou por outras autoridades constituídas defi-


nidas pelo CNPS;
IV - declaração do Ministério Público;
V - comprovante de cadastro do INCRA, no
caso de produtores em regime de economia fa-
miliar;
VI - identificação específica emitida pela Previ-
dência Social;
VII - bloco de notas do produtor rural;
VIII - outros meios definidos pelo CNPS (Brasil,
1991).

Conforme se vê a lista de documentos era pequena


e, muitos trabalhadores não possuíam nenhum dos
documentos listados. Antigamente o acesso aos cartórios por
parte dos trabalhadores rurais era muito limitado em
decorrência das localidades serem situadas em meios
remotos e de difícil locomoção, o que inviabiliza, por
exemplo, a confecção do contrato de arrendamento
parceria ou comodato rural prevista no inciso II do artigo
anterior. Nesse sentido também, por exemplo, o comprovante
do cadastro do inca previsto no inciso V era muito difícil, pois
se até hoje não são a maioria dos trabalhadores rurais que
possuem o cadastro do INCRA, imagine-se a época.
O Bloco de Notas do produtor rural previsto no inciso
VII sequer é um documento muito visto na nossa região,
sendo mais utilizado na região sul e sudeste. As declarações
expedidas pelos sindicatos rurais nos termos do inciso III

185
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

necessitavam de homologação por autoridades públicas, às


quais muitas vezes, por cunho eleitoral, poderiam assinar e
homologar declarações que supostas pessoas que não eram
trabalhadoras rurais, o que poderia ocasionar fraude no
sistema previdenciário. O Ministério Público, por outro lado,
não tinha à época, meios de fiscalizar todo mundo que era ou
não era trabalhador rural. Não havia como fazer visitas in loco
para que pudessem homologar as declarações expedidas
pelos sindicatos, por isso, o método de homologação das
declarações pelo MP não era muito usual.
Enfim, a medida provisória n. 1,002, de 19/05/1995
passou a prever que um dos documentos que serviriam para
a comprovação da atividade rural, seria a declaração
expedida pelo sindicato dos trabalhadores rurais, desde que
homologada pelo INSS. A partir daí, o INSS passou a ser o
responsável por analisar e homologar a declaração do
sindicato, deixando de ser um instrumento ratificado por
outras autoridades e passando a ser de responsabilidade do
INSS.
A partir desse momento, foi possível alavancar a
quantidade de documentos que serviram de base para a
comprovação da atividade rural, pois, como visto acima, a lei
8213 de 1991, originariamente, previa que o INSS poderia
estipular outros meios de prova. Com isso, já que a partir

186
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

deste momento, o INSS passou a ser responsável por


homologar a declaração do sindicato dos trabalhadores rurais,
foi possível, internamente, através de normas internas,
aumentar o rol de documentos que serviriam de comprovação
da atividade.
Diante disso, tomou-se conhecimento da primeira
norma a prever outros documentos que serviriam para
comprovação da atividade rural, tendo sido a Instrução
Normativa INSS/DC Nº 057, de 10 de Outubro de 2001. Os
documentos serviriam para homologar a declaração expedida
pelo sindicato e, por consequência, comprovar a atividade
rural, conforme previa, o Art. 120, §1º da referida norma,
senão veja-se:
§ 1º Para subsidiar o fornecimento da declaração
por parte dos Sindicatos de que trata o inciso IV
do art. 117 desta Instrução, poderão ser aceitos,
entre outros, os seguintes documentos, desde
que neles conste a profissão, sejam contemporâ-
neos aos fatos e se refiram ao período a ser ho-
mologado:
I – certidão de casamento civil ou religioso;
II – certidão de nascimento ou de batismo
dos filhos;
III – certidão de tutela ou de curatela;
IV – procuração;
V – título de eleitor ou ficha de cadastro elei-
toral;
VI – certificado de alistamento ou de quitação
com o serviço militar;

187
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

VII – comprovante de matrícula ou ficha de ins-


crição em escola, ata ou boletim escolar do tra-
balhador ou dos filhos;
VII – ficha de associado em cooperativa;
VIII – comprovante de participação como be-
neficiário, em programas governamentais para a
área rural nos estados, no Distrito Federal ou nos
municípios;
IX – comprovante de recebimento de assis-
tência ou de acompanhamento de empresa de
assistência técnica e extensão rural;
X – ficha de crediário de estabelecimentos
comerciais;
XI – escritura pública de imóvel;
XII – recibo de pagamento de contribuição
federativa ou confederativa;
XIII – registro em processos administrativos
ou judiciais, inclusive inquéritos, como testemu-
nha, autor ou réu;
XIV – ficha ou registro em livros de casas de
saúde, hospitais, postos de saúde ou do pro-
grama dos agentes comunitários de saúde;
XV – carteira de vacinação;
XVI – título de propriedade de imóvel rural;
XVII – recibo de compra de implementos ou
de insumos agrícolas;
XVIII – comprovante de empréstimo bancário
para fins de atividade rural; 57
XIX – ficha de inscrição ou registro sindical ou
associativo junto ao sindicato de trabalhadores
rurais, colônia ou associação de pescadores,
produtores ou outras entidades congêneres;
XX – contribuição social ao sindicato de tra-
balhadores rurais, à colônia ou à associação de
pescadores, produtores rurais ou a outras entida-
des congêneres;
XXI – publicação na imprensa ou em informa-
tivos de circulação pública;

188
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

XXII – registro em livros de entidades religio-


sas, quando da participação em batismo, crisma,
casamento ou em outros sacramentos;
XXIII – registro em documentos de associa-
ções de produtores rurais, comunitárias, recrea-
tivas, desportivas ou religiosas;
XXIV – declaração anual de produtor (DP) fir-
mada perante o INCRA;
XXV – título de aforamento.

Conforme se percebe, a lista supracitada é bem mais


extensiva do que a lista originariamente publicada com a lei
8213 de 1991, tendo sido um avanço no meio de
comprovação da atividade rural. Entretanto de nada servia os
referidos documentos se o requerente não apresentasse a
declaração do sindicato dos trabalhadores rurais.
Os documentos supramencionados serviam para
comprovar atividade rural, entretanto, necessitavam vir
acompanhadas da declaração do sindicato. Além desses
documentos, a instrução normativa supracitada também criou
o instituto da entrevista rural, ocasião em que o servidor do
INSS realizava uma entrevista obrigatória com o trabalhador,
objetivando saber como o requerente exercia o trabalho rural,
bem como saber, se, de fato, o mesmo era ou não trabalhador
rural através das respostas mencionadas na entrevista. Este
é um trecho da entrevista rural à época, realizada de maneira
escrita pelo servidor.

189
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Tabela 01

Fonte: Instituto Nacional do Seguro Social

Com a criação da entrevista rural e a extensão da


lista de documentos originariamente prevista na lei 8.213/91
facilitou-se a comprovação da atividade rural por parte do
segurado especial, tendo em vista que, anteriormente os
documentos eram limitados a uma pequena lista previsto na
lei, os quais eram de difícil manuseio por parte dos
trabalhadores rurais. Conforme narrou-se, em 1995, um dos
documentos, qual seja, a declaração expedida pelo sindicato
dos trabalhadores rurais passou a ser objeto de homologação
por parte do INSS através de uma lista de documentos
extensiva, bem como, por intermédio da entrevista rural.
Entretanto o cenário ainda era longe do ideal, isto porque,

190
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

nem sempre os trabalhadores rurais conseguiam responder


às perguntas a contento, muitas vezes por causa do
nervosismo, por serem pessoas legais e sem instrução. Além
disso a Entrevista rural era fruto de muita subjetividade por
parte dos servidores, considerando que cada servidor
conduzia de uma forma diferente e analisava as respostas de
acordo com a sua subjetividade.
Como forma de subsidiar a declaração do sindicato e
a Entrevista rural, a análise dos documentos também era
muito subjetiva, tendo em vista que, muitos servidores
exigiam um documento para cada ano, considerando que a lei
era vaga quanto ao modo de interpretação e extensão das
provas. Sendo assim, por mais que tivesse sido ampliada a
lista de documentos, os trabalhadores rurais ainda se
deparavam com a problemática de que deveriam possuir
muitos documentos durante todos os 15 anos exigidos para
obter a aposentadoria rural.
A dificuldade de locomoção à época e as localidades
rurais situadas em áreas remotas e de difícil acesso tornavam
o acesso a serviços públicos e expedição de documentos
muito difícil. O trabalhador rural praticamente não saía de seu
ambiente, e por exemplo, muitas vezes o nascimento dos
filhos era registrado de forma tardia. Os fatos cotidianos do
meio rural tais como venda de produtos, vacinação de gado e

191
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

compra de insumos não era registrada em papel, o que, de


igual modo, dificultava a comprovação da atividade rural,
especialmente, em face da exigência do INSS, a qual exigia
internamente uma prova para cada ano ou indício de prova
material no início, meio e fim aos fatos que se pretendia
comprovar, mas sempre muito dentro da subjetividade, o que
dificultava o reconhecimento do direito.
Importante destacar que não só a aposentadoria,
mas muitos outros benefícios acessíveis aos trabalhadores
rurais, tais como: pensão por morte, salário-maternidade,
auxílio por incapacidade temporária, etc, não eram fáceis de
serem conquistados, em virtude da falta de comprovação
daqueles como segurados especiais.
Não é diferente o pensamento dos autores na área
previdenciária. Jane Berwanger (2014) disserta que tal
cultura de informalidade no campo fica evidenciada das mais
diversas formas, que vão desde a ausência, ou, o registro civil
dos produtores, até a falta de documentos para a
comprovação das relações de produção rural, até mesmo à
falta de titulação, ou mesmo de documentos que comprovem
a posse da terra.
Nesse sentido também Carlos Alberto Pereira de
Castro e João Batista Lazzari (2020) ao que tal análise acerca
das referidas formas de comprovação do tempo rural não

192
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

pode ser dissociadas das particularidades do meio rural, no


qual, culturalmente, não há a preocupação com a
formalização de relações jurídicas através de documentos ou
outras formas. Soma-se a isso, o fato de que muitos destes
pequenos produtores rurais são pessoas bastante humildes
e de baixa escolaridade, o que acaba por dificultar de
sobremaneira a obtenção de documentos sob sua
titularidade.
Lazzari (2017) concorda com essa premissa,
conforme se vê:

Leva-se em conta a dificuldade do interes-


sado, não raras vezes pessoa humilde e de
pouca instrução, em obter documentos em
seu nome para que tenha reconhecido o
tempo de serviço prestado. As particularida-
des do meio rural devem ser consideradas,
pois culturalmente não se vê o homem do
campo preocupado com a formalização, por
via de documentos, das mais diversas for-
mas de atos, salvo quando se demonstra ne-
cessário.

Pois bem, compreendida a dificuldade que esses


trabalhadores rurais possuíam, notadamente, até o momento
aqui narrado, noutro lado tem-se que os processos
administrativos de análise de aposentadoria, à época, eram
muito mais burocráticos.

193
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Os processos de reconhecimento de direito eram


físicos e possuíam as etapas do agendamento, tempo de
espera, requerimento em posto, envio desses processos
para os analistas, geralmente em outras cidades e/ou
estados, exigências, análises de papéis que comprovassem
os 15 ano de atividade rural (geralmente solicitados 1
documento para cada ano), posteriormente, a entrevista
rural, pesquisas externas num vasto processo que, por vezes,
todas essas etapas, demandavam anos. Não se pode,
portanto, esquecer que além da dificuldade jurídica quanto
aos meios de provas, tinha a dificuldade burocrática e de
tempo de análise do benefício.
As Leis e as normas foram evoluindo e a entrevista
rural foi extinta em 2017, através da Portaria Conjunta Nº
1/DIRBEN/DIRAT/INSS, de 7 de Agosto de 2017.
Atualmente, busca-se a automação do reconhecimento de
direito e a comunicação com outras bases governamentais
como forma de vencer o gargalo da comprovação da
atividade rural, bem como aumentar a celeridade nas
respostas ao segurado e evitar fraudes no reconhecimento
do direito à aposentadoria.

194
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

5.2 DA EVOLUÇÃO NA FORMA DE COMPROVAÇÃO DA


ATIVIDADE RURAL – NOVOS DOCUMENTOS E NOVAS
REGRAS EM VIGOR

Como citado acima, a entrevista rural veio a ser


extinta pelo INSS como uma das etapas de comprovação da
atividade rural. A abolição da entrevista se deu com a
publicação da Portaria Conjunta Nº 1 /DIRBEN/DIRAT/INSS,
de 7 de Agosto de 2017. A abolição se deu, justamente,
porque conforme amplamente exposto neste trabalho, não
havia exigência legal para a realização da entrevista. Ela foi
um instrumento criado pelo INSS a partir do momento em
que a legislação outorgou para si as decisões sobre a
homologação das declarações expedidas pelos sindicatos
dos trabalhadores rurais. Inclusive, esse é o entendimento
da Procuradoria do INSS (2017):

Conforme na fundamentação, a legislação previ-


denciária (Lei nº 8.213/91 e Regulamento da Pre-
vidência Social) não estabeleceu a exigência de
ser realizada entrevista rural na análise da com-
provação da atividade rural como segurado espe-
cial para fins de concessão de benefício, o qual
foi disciplinada por meio de Portarias do antigo
Ministério da Previdência Social e atos internos
do INSS - em especial a Instrução Normativa nº
77/INSS/PRES/2015.

195
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Diante disso, foi retirada a entrevista rural da


legislação no ano de 2017, muito em virtude de que, era o
procedimento mais demorado dentro da etapa do processo
de aposentadoria e ante o início da digitalização dos
processos e da automação das análises, como ficaria a
entrevista rural nos requerimentos eletrônicos, analisados à
distância?
É tanto que, meses depois, os primeiros
requerimentos passaram a ser realizados de forma eletrônica
por meio da publicação do Memorando-Circular Conjunto nº.
5/DIRAT/DIRBEN/INSS, de 18 de maio de 2018.
Mas foi em 2019 que houve uma virada de chave no
formato de comprovação da atividade rural, pois o INSS
passou a ter acesso a outras bases governamentais de
programas de agricultura, extrativismo e pesca. A partir daí,
os cadastros feitos pelos trabalhadores rurais nos mais
variados programas e órgãos, tais como DAP, cadastro do
imóvel rural pelo INCRA, registro geral de pesca, seguro-
desemprego do pescador artesanal, sistema nacional de
cadastro rural e sistema de informações de projetos de
reforma agrária passaram a ser comunicáveis com os
sistemas do INSS.
Na verdade, com a nova legislação que entrou em
vigor com a Lei nº 13.846, de 18 de Junho de 2019 a

196
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

comprovação deveria ser automatizada. Pelo menos na


teoria houve inúmeras transformações na legislação de
comprovação da atividade rural de 2019 em diante.
Teoricamente, o trabalhador rural não deveria mais
ter a preocupação de décadas atrás, quando precisava reunir
a documentação (em papel) de uma vida para comprovar a
atividade rural. Trabalhadores rurais que iriam se aposentar
nas décadas passavam precisam guardar documentos numa
época em que o acesso deles à órgãos públicos era ainda
mais difícil do que é hoje.
Atualmente, a legislação tem se transformado para
mudar esse paradigma, objetivando tornar a comprovação da
atividade rural um procedimento automático ou, pelo menos,
automatizando, onde o servidor analista do INSS faria apenas
as consultas às demais bases governamentais para confirmar
a atividade rural do requerente de aposentadoria por idade
rural, sobretudo diante das inúmeras bases governamentais
que passaram a ter sincronização com as bases do INSS.
Foram profundas as alterações legislativas acerca da
dispensa dos outros documentos, priorizando a automação
na comprovação da atividade rural, senão veja-se as
alterações realizadas pela Lei nº 13.846, de 18 de Junho de
2019:

197
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

Art. 38-A O Ministério da Economia manterá sis-


tema de cadastro dos segurados especiais no
Cadastro Nacional de Informações Sociais
(CNIS), observado o disposto nos §§ 4º e 5º do
art. 17 desta Lei, e poderá firmar acordo de coo-
peração com o Ministério da Agricultura, Pecuá-
ria e Abastecimento e com outros órgãos da ad-
ministração pública federal, estadual, distrital e
municipal para a manutenção e a gestão do sis-
tema de cadastro.
Art. 38-B. O INSS utilizará as informações cons-
tantes do cadastro de que trata o art. 38-A para
fins de comprovação do exercício da atividade e
da condição do segurado especial e do respec-
tivo grupo familiar.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2023, a compro-
vação da condição e do exercício da atividade
rural do segurado especial ocorrerá,
exclusivamente, pelas informações constantes
do cadastro a que se refere o art. 38-A desta Lei.
(...) § 3º Até 1º de janeiro de 2025, o cadastro de
que trata o art. 38-A poderá ser realizado, atuali-
zado e corrigido, sem prejuízo do prazo de que
trata o § 1º deste artigo e da regra permanente
prevista nos §§ 4º e 5º do art. 38-A desta Lei.

Como se pode perceber, as alterações legislativas


foram profundas em relação ao modelo de comprovação de
atividade rural originariamente criado na Lei 8.213/91. A Lei é
bem clara ao dispor que a comprovação da atividade rural, a
partir de então, deve obedecer às informações constantes do
Cadastro Nacional de Informações Sociais em cooperação
com as demais bases governamentais. Desta forma, quando

198
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

as informações colhidas através de consultas às bases


governamentais forem claras e suficientes para a análise da
atividade rural e, por consequência, conclusiva ao processo
de aposentadoria, não será mais necessária a solicitação de
documentos complementares, aqueles mesmos listados
anteriormente.
Portanto, atualmente é dessa forma que funciona, os
trabalhadores rurais ao fazerem algum tipo de cadastro nos
demais órgãos seja por procura voluntária seja porque os
próprios órgãos no exercício do cumprimento de seus
programas vão até esses trabalhadores rurais e os registram,
tais informações, agora, migrarão para o sistema do INSS e
se instalarão como o principal e exclusivo meio de prova para
o exercício de atividade rural por parte dos requerentes. Ao
menos foi assim que o legislador previu a partir do ano de
2019.
Entretanto, se aprofundada a legislação, constatar-
se-á que mesmo diante da automação, há períodos de
trabalhadores rurais que, mesmo cadastrados nos sistemas
de outras bases governamentais, migram como períodos
pendentes que não podem se confirmados automaticamente,
seja porque os cadastros ainda não migram com as
informações fidedignas e completas para que o
reconhecimento fosse automático, seja por erros de sistemas

199
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

e até mesmo diante de informações que podem desqualificar


o trabalhador rural como segurado especial. Ainda existem
inúmeras intercorrências no meio do caminho que impedem
que haja uma integração 100% fidedigna capaz de fazer com
que a comprovação seja realizada de forma integralmente
automática.
Conforme se viu na legislação supracitada, o prazo
para que esse cadastro ocorra de forma integral é até o ano
de 2025, no entanto, o INSS já está tendo acesso às demais
bases governamentais e já está sendo possível fazer o
reconhecimento da atividade rural com base nos demais
sistemas governamentais, quando é o caso do trabalhador
rural que possua cadastros nas demais bases
governamentais.
Conforme disserta Albaniza Santos Souza, a
supracitada Lei 13.846/2019 expressamente estipula um
verdadeiro período de transição, que visa a adaptação dos
trabalhadores às novas regras, bem como para a própria
organização dos servidores e dos órgãos públicos no sentido
de implantar o sistema de cadastro no CNIS para os
segurados especiais (Souza, 2019).
Entretanto, boa parte dos trabalhadores rurais, os
agricultores de economia familiar, nunca possuíram acesso à
cadastro de órgãos públicos ou suas terras enfrentam algum

200
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

tipo de entrave ou burocracia que impede sua área de ser


colocada em algum programa governamental. Além disso, há
casos de trabalhadores que até conseguiram registrar suas
terras em órgãos governamentais cujas bases migram para o
sistema do INSS, entretanto, a comprovação da atividade
rural só seria possível apenas parcialmente, não abarcando
o período total da carência que é de 180 meses para a
atividade rural.
Com base nisso, os documentos físicos, aqueles
convencionais previstos na legislação interna do INSS, tais
como certidão de nascimento dos filhos nascidos na zona
rural, comprovante de vacinação, prontuário médico, etc,
ainda estão previstas na legislação, como uma forma de
comprovação apenas subsidiária e/ou complementar, mas
não mais como forma exclusiva de comprovação, senão
veja-se a previsão que traz o Ofício-Circular nº 46
/DIRBEN/INSS de 13 de setembro de 2019:

Item 3.4. Quando as informações obtidas por


meio de consultas às bases governamentais fo-
rem suficientes para a análise conclusiva do pro-
cesso, não será necessária a solicitação de do-
cumentos complementares.
(...)
Item 8. Os períodos reconhecidos pelo INSS,
tanto no CNIS, quanto nos sistemas de benefí-
cios, devem ser considerados válidos para todos

201
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

os fins. Com relação aos períodos não reco-


nhecidos, caso o segurado apresente nova do-
cumentação com base nas novas regras vigen-
tes, esta deverá ser analisada.

Conforme se vê, a própria redação dada ao art. 106,


da Lei 8.213/1991, pela precitada Lei 13.846/2019,
estabelece que a comprovação do exercício de atividade rural
será feita apenas complementarmente à declaração de que
trata o art. 38-B, da Lei 8.213/1991 (Serau Junior, 2019).
Portanto, os documentos físicos ainda exercem
função importantíssima, é tanto que tendo passado
décadas desde a edição da Lei 8.213/91, ainda
permanecem em vigor na legislação, ainda que exerçam um
papel complementar. Ademais, vale lembrar que, em
muitos casos ainda permanecerá se constituindo como a
principal fonte de prova do exercício de atividade rural, pois
se determinado trabalhador não dispuser de nenhum
cadastro em base governamental, as provas materiais
poderão ser usadas para a comprovação da atividade rural.
A diferença é que, agora, graças a evolução
legislativa, o segurado não precisar mais apresentar uma
prova para cada ano e/ou provas com início, meio e fim no
período da atividade rural. A mudança legislativa também
alterou a quantidade de documentos e o marco temporal.

202
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

O Ofício-Circular nº 46 /DIRBEN/INSS de 13 de setembro


de 2019 agora exige de forma expressa 2 documentos, não
ficando mais à mercê da subjetividade do analista do INSS.
A alteração legislativa exige, no período de carência
(180 meses) somente a apresentação de 02(dois)
documentos, podendo ser uma na primeira metade da
carência e outro na segunda metade da carência, sendo que
qualquer um dos documentos elencados na legislação terá a
mesma força probatória/mesmo peso no momento da análise
da aposentadoria.
Conforme se viu, portanto, houve uma enorme
transformação positiva no método de comprovação da
atividade rural dos segurados especiais, especialmente, com
a legislação que passou a prever a comunicação entre as
diversas bases governamentais, deixando o papel de lado e
passando a reforçar o registro eletrônico desses segurados e
a comunicação entre os mais variados órgãos
governamentais. Houve também uma maior objetividade na
apresentação das provas, deixando expressamente, previsto,
desta feita, a apresentação de 02 (dois) documentos como
sendo meio suficiente para a comprovação da atividade rural
no período de 180 meses e o consequente reconhecimento
do direito à aposentadoria por idade rural.

203
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

CONSIDERAÇÕES FINAIS

E, por mais que, recentemente, a legislação tenha pri-


orizado a utilização de várias bases governamentais para auxi-
liar na comprovação da atividade rural pelos requerentes, ainda
assim, faz-se necessário que haja a correta e adequada filiação
cadastral desses segurados à tais bases, pois de nada adianta
a alteração da forma de comprovação (priorizando agora os
sistemas corporativos e a comunicação entre os sistemas) se
os requerentes não tiverem a instrução necessária para se re-
gularizarem/inscreverem junto a tais órgãos.
Além disso, a Lei 8.213/91, bem como a legislação
interna do INSS, tais como o Ofício-Circular nº
46/DIRBEN/INSS, de 13/09/2019, permanecem prevendo os
documentos como prova material para fins de comprovação
da atividade rural desses segurados e tais provas
materiais/documentos ainda continuam sendo primordiais no
reconhecimento do direito, tendo em vista que nem sempre
os trabalhadores rurais conseguirão se cadastrar nos órgãos
governamentais ou por vezes esses cadastros ainda chegam
com intercorrências ou falhas, sobretudo, porque a legislação
previu que o ajuste na automação do reconhecimento do
direitos dos trabalhadores rurais se daria até 2025, sendo que
até lá os documentos físicos ainda exercerão função
importante na comprovação da atividade rural do segurado

204
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

especial.
Não se pode esquecer que o índice de ações judiciais
sempre foi alto, muitas vezes havendo a reversibilidade da
decisão do INSS, nos levando a concluir que, se houvesse
uma melhor instrução do processo, com documentos mais
hábeis à qualificação do segurado, certamente, o
reconhecimento do direito a esses segurados seria maior,
evitando um retrabalho pelo INSS na concessão do benefício,
uma redução de ações judiciais e um reconhecimento do
direito a quem de fato, é trabalhador rural.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de Julho de 1991. Dispõe sobre


os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras
providências. Brasília, DF, 1991. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm.
Acesso em: 2023.

BRASIL. Decreto nº. 3.048, de 06 de maio de 1999. Aprova o


Regulamento da Previdência Social, e dá outras providên-
cias. Brasília, DF, 1999. Disponível em: https://www.pla-
nalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048.htm. Acesso em: 2023.

Ofício-Circular nº. 46/DIRBEN/INSS, de 13 de setembro de


2019. Orientações para análise da comprovação da ativi-
dade de segurado especial e computo dos períodos em

205
Ciências Jurídicas na Amazônia Sul-Ocidental

benefícios. Novos procedimentos decorrentes da publica-


ção da Lei nº 13.846, de 18 de junho de 2019. Brasília, DF,
2019. Disponível em: andriellyscrobot.com.br/wp-con-
tent/uploads/2020/06/ofcircular46DIRBEN-INSS3.pdf. Acesso
em: 2023.

AMADO, Frederico. Direito previdenciário. 8. Ed. rev., atual.


Salvador: Juspodivm, 2017.

BERWAGNER, Jane Lucia Wilhelm. Segurado Especial - O


Conceito Jurídico para Além da Sobrevivência Individual.
Juruá: Curitiba, 2014.

LAZZARI, João Batista e CASTRO, Carlos Alberto Pereira de.


Manual de direito previdenciário. 20. ed. rev., atual. Rio de
Janeiro: Forense, 2017.

LAZZARI, João Batista e CASTRO, Carlos Alberto Pereira


de. Manual de Direito Previdenciário. Rio de Janeiro: Fo-
rense, 2020.

SERAU JUNIOR, Marco Aurélio. Operação Pente-Fino e Mi-


nirreforma Previdenciária. Porto Alegre : Paixão Editores,
2019.

206
E-book
TOMO 3

Vol. IIi

Este livro reúne cinco artigos, na


área de Ciências Jurídicas,
redigidos por concludentes do
Curso de Direito da UNINORTE –
Ac, sob a supervisão do Profa.
Williane Tibúrcio Facundes.
EAC
Editor .
ISBN 978-65-01-02367-0

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