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CONE te i ete Pedro CALDERON DE LA de Calderin © de todo o steulo BARGA nasceu em Madrid, no XVI espanhol, a segunda & uma ano 1606). af faleceu, 225 de dus suas melhores tragédias, cida CALDERON DE LA BARCA Maio de"U68l. De scenaincly om Tome do clio dy hanes 0 fidalga, cstudow Teologa no Magic Prodigioto (drama Colo Imperial do Mada, teolSgio-hitco) Cae com Sauantanio posestrmente Daas Fortr Die de Guar Universidauss de Atealé de (Gomi de ened, Principe Henares e Slamanca, Consta que Conant (drama zeligisa, om sor T3 anos de dade eseven'© que € toatado 0 matin ao $4 princi drama f! Gv det Infante D.Femando de Pre, Cielo). De 1623 41629, 0 Medico de Sto Hono tts incorporedo no exit espanol, do Hon, so gas dat pecs e CCalgerdn combate em Milo c na mais famoss de" Caldetin, ty A VIDA ES Fands. De repesso 2 Esanhs, Obra nunca js entrada do ONHO passa a dedicar-se inteiramente 3s espirito europeu na Tdade letras. Dos trés grandes nomes do Moderna. na “sécula de ouro™ espanhol ON AT AAI AD = Lope de Vega, Quevedo ¢ Calderén —, foi talvee 0 filtimo aquele cuja existéncia se desenroiou mais plicidamente, favorecido pela corte © admirado pelo publico. A sa produgio Uterdtia ~ dispersa por génoros to diversos como at coméaias de Intriga, as pegas MlosSfcas, ot dramas vliglosos, a tragéis 05 autos sacramentais ~ foi abundantissima,atvibindosthe os investigadores moderos mais ae 200 obras. Decidido a retirarse da vida mandana, aos 51 anos toma lordens, dsposto a deixar también 4 actividade teria, Frente Insistoncia de Flipe IV, Caldera retoma a pena, que x4 abandona 3 hhora da morte. As duas pogas reunidas neste volume ~ 4 Vide EB Sonko © 0 Aleaide de Zelamea ~ datam ee 1635. Compostoc impresso por Enquanto 2 primeita & um dos ‘Gris, Impressres ls perfeitos dramas Mos8ficos Lisboa, 1971 EDITORIAL VERBO © Tradugto de Maria Mansela Couto Viena © Anténio Manuel Couto Viana A VIDA & SONHO. (MARNIE IRAN Ne ess csr ence ne PERSONAGENS QUE NELA FALAM ROSAURA, dama SEGISMUNDO, principe CLOTALDO, velho ESTRELA, infanta SOLDADOS CLARIM, bobo BASILIO, rei ASTOLFO, principe GUARDAS| usicos CRIADOS (TradugGo de Mra Manucta Couto Viana) PRIMEIRA JORNADA CENAI (No alto de wm monte, parece Rosaura, vestda de vagnbundo, g emt dizenclo os prineiros versos, vai descendo. Atris delt » Carin} ROSAURA = Hipogrifo violento que correste. parethas com o vento, donde raio, sem chama, ‘péssaro sem matiz, peixe sem escarna, € bruto sem instinto atural, 20 confuso labirinto de essas desnudas penhas te desbocas, te arrastas, te despenhas? Fioa-te neste monte onde tenham 0s brutos seu Faetonte; ‘que eu, sem mais caminho que 0 que me dao as leis do meu destino, coga e desesperada descerei a encosta emaranhada de este eminente monte ue enruga ao sol uma sanhuda fronte Mal Polénia recebe a0 estrangeiro que a transpor se atreve suas portas terrenas © apenas chega quando chega a penas Bem minha sorte o diz; ‘mas onde achou piedade um infelie? vem ARNO PONTE st aren 2 CLARIM ROSAURA CLARIM ROSAURA CLARIM ROSAURA Diz dois e nfo me deixes no esquecimento, a mim, quando te queixes pois que, se foram dois ue fugizam de ptria ha muitos seis, em busea de aventuras, nos dois que, entre desditas e loucuras, ci viemos parar; dois caidos do monte a rebolar, 6 razdo que me aftonta ‘meteressme no pensar e nd0 na conta Eu no quis dare porte de meus males, Carim, pra no tirarte chorando tev cuidado, © direito de teres consolado. Que tal prazer havin em queixarse, um fi6sofo dizi, ue, a troca de queixar-se, haviam as desitas de buscarse 0 fildsofo era rematado sandew; oh! quem Ihe dera mais de mil bofetadas! Queixava-se depois de mui bem dadas Mas. que fazer, senhora, 4 pé, Wo s6s, perdidos nesta hora em um deserto monte, quando se afasta 0 sol a outro horizonte? Quam ha visto sucessos to estranhos! Mas, se a vista nao softe ‘dos enganos (que faz a fantasia, nna pouca luz que inda sustém 0 dia areceme que vejo um edificio, ‘Ou mente meu desejo fu terminam as magoas, Riistico nasce entre desnudas fréguas um palicio tao breve que 0 sol apenas a olhar se atreve: com tao rude artificio 4 arquitectura esta desse edificio, que parece, a estas plantas de tantes pedras e de rochas tantes ue 0 sol touca de ume, lum penhasco rolado desde 0 cume. CLARIM = Vamo-nos acereando; gue isto é muito tardar, senhora, quando € bem melhor que a gente ‘que nele habita, generosemente, nos admit. ROSAURA, . Acntrada = direi boca funesta~ escancarada esta, © € em seu centto Que a noite nasce porque a engendra dentro. (Soam neidos de cacteias.) CLARIM Mas que som infemal! ROSAURA Sinto-me fia estatua sepuleral CLARIM — Se ha ranger de cadeado matem-me, se no é alma em pecado: que o medo bem mo diz. (Segismndo, dentro.) SEGISMUNDO — Pobre de mim, ai misezo,inftiz! ROSAURA —— Que triste vor eseuto! Com novas penas e tormentos luto! CLARIM Eu com dobrados pigs. ROSAURA = Chatim, CLARIM Sephore ROSAURA E fugir aos castigo desta encantads torre. Q ASS AL, REINS CLARIM = devo ROSAURA, que é de cadéver vivo sepul , pra maior espanto, ~homem ou fer? — num recanto © que diz; CENA I (Ahrens as portas e descobre-se Segismundo com um grilhio e io de peles. 144 luz na torre.) SEGISMUNDO — Pobre de mim, ai m: © pecado 30 nascer Be outro foi meu ofender para cast © eu que tenho mais alma tenho menos liberdade? Nase a feta e com 2 pele ‘ham manchas belas 10 € de estrelas 10 douto pincel -, quando, atrevida e cruel 4 humana necessidede ina 2 ter crueldade, de seu labi erdade? © peixe © no respira, abarto de ovas e lamas, apenas beixel de escamas ue sobre as ondas se mira, quando em todo 0 lado gira, medindo a imensidade © apenas serpe de prata entre as mesmas flores se dobra; quando, miisico, na obra, ZAC ESS ANAS “INC ROSAURA, SEGISMUNDO CLARIM, ROSAURA ‘SEGISMUNDO_ CLARIM ROSAURA SEGISMUN das flores celebra a piedade Ese) lo 8 esta paixao, Ema feito, uisera arrancar do peito pedagos do coracio. Que lei, justiga ow razto ~ pe aos homens um entrave — 144 privilégio su excepso to pi «qual fora Deus peixe. Temor ¢ piedade em suas razbes tém causado, Quem tais queixas ha escutado? Es Clotald iz que sim Nao mais que um triste, ai de mim!, que nas abobadas frias te ouviu. 2s melancolias Pois a morte te darei no saibas que sei {que sabes fraquezas minhas Somente por teres ouvida, com meus musculosas bragos te farei eu em pedagos Surdo. no tenho podida escutar-te ao: Tua voz pode enterecerme, 4 presenga suspenderme, f teu respeito turbarme, Quem és? O saber-me assim, sem saber do mundo, d6i, «que bergo e sepulero foi esta torre para mim sci — por certo, lugar 56 tenho 0 deserto or fu sendo um vivo esque! se nfo vi nem ~ por mais por monstra tas tO graves ica estudado, os ardores da minha mégoa, meus olhos sodentos de agua © espanto do meu ouvido. Em cada vez que te vejo te admiro, ¢ sempre mais © te admirar almejo, Olhos secos de desejo (08 meus olhios devem ser pois, quando a morte € beber bebem mais: e desta sorte, vendo que o ver me @ morte, ROSAURA CLOTALDO (Todo CLARIM CHU SLO JSS ALE im Clotaldo, com sapados,) cloraLpo | — CLARIM - 16 CLOTALDO ROSAURA SEGISMUNDO es, CLARIM CLOTALDO = s cadeados S30. dio e ampares. 4s tas flrias arrogantes cLoTALDo como feio que a8 deter ¢ rédea para que pa SOLDADOs porque blasonas? A porta dese estreito cateere; CLOTALDO {Fecham a porta.) faa ro nele or que na ve SEGISMUNDO Dentro.) Ah, céus, de donde, ieee ROSAURA Eis fora CLARIM ROSAURA, CLOTALDO ROSAURA, CLOTALDO ROSAURA, CLOTALDO ROSAURA im, de todos és nko sabe menor valor. ha é tal .. pode darse jomaia Ws, CLOTALDO E se heide morrer, deixarste quero, em fé deste piedade, prenda que possa estimar-se fem mao de dono que um dia Que cale seu nome devo, Porqua? Compreendes agora, ou sabes, que ha segredo nesta espada? Quem a dew, disse-me: “Parte ppara a Pol6nia. Ai, pede, ‘com engenho, estudo e arte, ofereca © ampar ‘mas esse pode estar Nao 10 céu me vatha! Que escuto? ou iusdes ou verdades, Esta espada foi de 2 traria; era encontrar-me amoroso como um filho heio de piedade de fazer, al de mim, m confusfo semelhante Se quem a traz por favor que chega a meus pés? Que notavel Que triste fado! we Sorte ta Este € meu fitho, muito bem diz coos sinais do coragdo, que por védlo se abrasa em meu peita e bate 28 asas, e. nfo podendo Quebrar as grades, 58 faz como 0 que esta encerrado © ouvindo vores se arroja por sobre a a ele. ass ide fazer? Deus me valha! “-de farer® Pois, levi-lo para 40 Tei no posso, conforme 24 lei da homenagem, De um lado esta amor-prépria e do outro a lealdade Entre um e outra, duvido? Lealdade ao rei e do que a vida ¢ do que 2 honra? Seja a vida e a honra falte. ‘Apesar, que, se cue vir a vingarse uum agravo, todo © homem 0, nO & nem tem o meu nobre sangue. Porém, se mui grande perigo passou liberto, onde nada nem ninguém passara, a honra deve ser matéria frdgil, que com um feito se quebra, e que no ar se desmancha. Mais pode fazer? Que mais, ‘bre, de sua parte, que 3 custa de tantos rasgos vyeio a honra procurar? De meu fillho sangue tem, pois que tem valor ta0 grande: em davidas repartide hei em meio © importante. Irei ao rei a dizerthe que é meu filho ¢ que o mate. Por minha honra seré piedoso em desobrigar-me? ‘Mas se eu 0 mereco vivo, © ajudasei 2 vingar-se do agravo: mas se el-rei nde comigo, estrangeiros, (Saem.} (Entram, por um ladio, Astolfo com at ‘mas desditas; nas duvidas semelhantes de viver ou de morret do Serdo todas tdo grandes? CENA V © por outro, Estrela com danas. fisen.) ASTOLFO ESTRELA Sob os lampejos ardentes esses olhos. tal cometas, ‘misturam salvas diferentes 65 tambores as trom 88 bala, 8 passaros como & Aurora, 428 trombetas como a Palas, © a8 flores como a Flora ois sois, enganando dia ue jf a noite desterra, uma Aurora de alegria, Flora em paz, Palas em guerra, rainha que eu serviria, Se a voz se hide medir com quaisquer aceoes humanas al vos vem a0 proferir Vas palzcianas, com as quais vou desmentir todo o marcial trofeu no, que vos falte mpanhamento de soldados we lan Ais omen Giacomini SS, rc ASTOLFO a causa e ver se assim €? Morreu Eustérgio terceiro, da Polénia; ficou seu herdeiro, de quem sou ida e eu nascido. Que a minha raxio ordene calar 0 que € desmedido ESTRELA ASTOLFO mereco ser preferida, ‘A intengao que a ambos guia neste Tugar, nest Com esta intengao, sai de Moscévia e sua terra; com esta chegued aqui A to cortés bizarria digo com maior fervor gue a imperial monarquia, pare vos ter por senhor or minha a dese ‘mesmo a no ser st © amor, pois sois ingrato, se do que dizeis suspei € $5 por esse retrato ‘que trazeis em vosso peito. Satisfazer-vos intento, mas maior calma nfo ‘dé tanto sonoro instrumento aque avisa que chega © rei com Seu parlamento, 28 820s rapids movi or rumos e por caminhos. Prouvera ao céu, em primeiro, gue meu génio houvesse sido das suas das suas teria sido esta © primeiso desperdicio dos seus furores, e com eles © meu mal tivesse sido! Porque, ao que € infeliz, é permitido, pois 2 quem dana o saber em si perpetra homicidio. Diga-o eu, mas, bem melhor pelos sucessos, confirma, ra cuja admireeo no ealar, de novo, insist. De Clonite em cujo parto, os céus se esgotaram em prod igios Antes que a formosa luz Ihe desse sepulero vivo de um ventre — porque 0 nascer © 0 morrer sao parecidos — mie, infinitas vezes, tazi0 e 0 delirio do sonho, viu Ihe rompie as entranhas, atrevido, lum monstro em forma de homem, ©; no seu sangue tingido, Ihe dava # morte, nascendo vibora humana do signo, Chegou de seu parto ao dia, © 0 pressigio foi cumprido. = porque tarde ou nunea sf0 dados por falsos os impi nascew sob um signa, que 0 sol, em seu sangue entrava sanhudamente com @ lua em desafio; , sendo a terre privada ae em grande perigo. sndo eclipse que ha padecido © Sol, desde que o seu sangue chorou @ morte de Cristo, assim foi, porque alarmada a Terraentre lumes vivos, caleulou que padecia 0 ultimo paroxismo; escureceram as eéus, emeram os edificios, choveram pedras das nuvens, correram em sangue 03 rios. reste mortal, foi neste 'a de bem mau signo, que Segismunda nasceu dando tais crugis indicios, morte a sua mie lando-2 com © disse: Homer sou, pois jd comeco 4 pagar os maus principios.”" Eu, correndo aos meus estudos neles vi um grande aviso que Segismundo seria © homem mais atrevido, © principe mais cruel €.0 monarca mais impio, © que o reino venderia, POF ser parcial, repartido, Como escola de traigao © academia de vici ele em seu furor levado, 29 (C0 ean que vergonha o digo!~ aleatifa que pisava, LANTOS) que por eu dizer que outro Etirano fera que 8 ver $e 0 sibio teria Sobre as estrelas dom nio, Fiz constar que ele viera Porque 0 fado mais esquiv 4 inclinagto mais vio 30 31 | fem tudo quanto eu vivo, as ser na repiblica um € donde todos, rendidos, obediéneia Ihe jurem; ASTOLFO = Sea mim responder me toca pois com tudo isto consigo como aquele que tem sido ‘t8s coises, com que respondo aqui o mals interesede. as outras trés que confirmo. em nome de todos age A primeira & que sendo que Segismundo aparega, pnidente, cordato, benign, Dols Ihe basta ser pa Fc desmentindo em tudo o fado h que tanto mal dele disse, {Todos} ~ Dainos o principe nosso, sozaels 0 natural sue jf pore 0 pedimos, principe vosso, que hé sido cortesto entre altos montes BaSILIO = Vassalos, por tal fineza, das feras 0 vizinho paalegenioesl extn AA segunda é: caso surja Acompanhl a seus quartos soberbo, ousado, atrevido 05 mets augusios oh, a ecmuel § rédea Goleman agree { sndo do campo 0s vicios, iedoso, entio, (Todos) ~ Viva‘o grande rei Basdio! fo cumprido; que serd 0 destroné-lo (Saem todos.) ue tal cumpre 2.um rei invieto 0 voltar para o seu cétcere, CENA vi nfo 6 crueza, 6 castigo, Ee a terceira que, sendo (Antes que saia 0 rei, entra Cotaldo, Rosaura e Clarim, que detém © principe como eu digo, ore) Por Voss amor, meus vassalos, Ines datei dois rei, mais dignos CLOTALDO =~ Poderei falar? da nobre coroa e ceptro: pois sero meus dois sobrinhos, BASILIO - Clotaldo!, juntando em um o direito sj bem aparevite 8 dois, porque, recebidos na fé matrimonial, CLOTALDO Ainds que venha a teus pés, tal ber terdio merece é por earaho mere Isto como rei vos mando, que esta vez muda, senor, isto como pai su 4 aeeeaee : isto como Sibio ro © privléyo ° isto como ancido vos digo; © © costume pelo estilo, : BASILIO = Que tens tu? a soon 33 RN I we ane CLOTALDO | — BASILIO - CLOTALDO BASILIO. (Clotaldo, Rosana CLOTALDO ROSAURA, a4 na de 0 acontecido. a pudesse ter regozijo, sucesso que se tem E esses presos, pra que, enim, fifo presumam que castigo descuidos vassos, perdoo. CENA VI mil vezes, CLARIM ROSAURA CLOTALDO ROSAURA, CLoTALDO ROSAURA Em teu nome, vez segunda 0 cinjo Jjuto vinganga, ia que fosse 0 poderoso, 35 CLOTALDO ROSAURA, CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA 36 Fé muito? 10 que nem te digo. Nao-porque & tua prudéneia maiores coisas nfo confio, 6 86 por que nif se volte contra mim favor que edmiro nessa piedade Antes fosse ganhar-me, por descobri-lo, pois fora entravar o passo de ajudar teu inimigo. (A parte.) Oh!, se soubesse quem é! Para nio pensares que estimo, ‘0-pouco, essa confianga, fica sabendo que ha apenas Astolfo, duque de Moscovia (A parte) Mal resisto A dor, porque ¢ bem ms do que 0 imaginado o vi Apuremos mais 0 ¢: se moscovita his nascido, 0 que ¢ natural, senhor ofendido. grave ofenderme. Nao pode. nem que pudesse, arevido, mio em teu rosto. (A parte) Ai, cbus! Maior 0 agravo sentido, CLOTALDO ROSAURA, pois que nfo podes izer mais do que imagino. Se 0 dissera; mas no com que respeito te fito, com que alzifo te venero © com que estima te asisto, que nfo me atrevo a dizerte que € este exterior vestido enigma, pois que nao ¢ de quem parece. Te advirto: Se nfo sou o que pareco € Astolfo a casarse hé vindo com Estrela, julgaras do agravo. Tudo esté dito (Saem Rosaura ¢ Clarim.) CLOTALDO. Bsouta, espera, detém-te! Que confuso labirinto @ este, donde nao pode achat 2 razzo 0 fio? Meu brio foi insultado, € poderoso 0 Aescubra 0 céu 0 caminho; ‘mas nio sei se poder, quando, em tio confuso abismo, todd 0 cfu é um pressigio © todo © mundo uum prodigio. 37 oe une au SEGUNDA JORNADA CENAI (Basitio e Clotatdo. ) cloratpo n como mandaste, mpria, BASTLIO. - Comenta, Clotaldo. © que se passou. CLOTALDO Foi, Senhor, desta manera, Ce pois, tocada est lanta nem pedra que ndo tenha qualidade determinada, e se chege @ examinar mil venenos acerta rte. No entanto a humana mal que déem pois hi venenos que matam @ venenos que adormentam. Deixemos de duvidar ser possivel que suceda, J que fica bem provedo com razbes ¢ evidéncias ..— Pois, levando essa bebida que 0 6pio e a dormideira © 0 meimendro compuseram, baixei a priszo estreita HS LANES CY com isto. que foi da sua dor. 0 de Segismundo; com ele com a posto, = falei um pouco de letras 0 lor, que o rende 20 sono, hhumanas, que o ensinow astou desde a taea a0 peito, a calada natureza um vio de suo das m em ‘a ret6rica aprenden com as aves e as feras Para levantarIhe mais de sua vida. Nisto, chegam © espirito aquela empresa a8 gentes de que tomei © valor deste expe «, eolocando-o v0 a presteza audaciosa, porque, desprezando a esfera , passava a ser umo as repides supremas do fogo, emplumadas flechas, ou desprendido cometa. Louvel esse voo altivo, dizendo: “Verds quem reina a0 fim, no mundo das aves. Justo & que rainha sej Nao teve ele mio em 40 a | ! | | ANSE aos danos # porta aberta de dizer que foi Com regan nse duas coisas: 8 condisao, 2 primeira, acordado procede I conn BASILIO. 2 segunda, inda que se veja obedeci CLOTALDO _ e falta de provar que nao acer ial que me alerta dizendo-me que acordou BASTLIO = CLOTALDO BASILIO poders ser que s id conhecido © perigo, ‘mais facilmente se venga (Sai) a | | | | | no palicio da excelente e nobre Estrela, CENA I CLOTALDO — (Clarim ¢ Ctotatdo.} CLARIM SAGAS TaN y CLARIM parte.) Gissme. 4 custa de pauladas, 5 CLOTALDO | ~ Si CLARIM, CLOTALDO © eriado | de aquela CLARIM CLOTALDO CLOTALDO CLARIM CLARIM Segismundo chega, as 48 BASSOOINMIO REE: SEGISMUNDO Be a 1°. CRIADO. 28 CRIADO CLARIM, 46 CENA IIT ‘me 0 céu, 0 que mito? Com poueo espanto © admiro, com muita divida © creo, Em palicias sumptuosos? Eu, cercado de criados Dizer que sonhe € engano, bbem sei que acordado estou Eu, Segismundo no sou Dairme. céus, 0 desenga Dizei-me, 0 que pode ser © que minha f sucedeu, quando domia, pois aqui me estou a ve Mas, seja o que me a (A parte ao 2°, Chiedo e a Cla Pois a quem the sucedera isto, como nifo estivera? Ami n.} Que me: Hancdlico esta 2.9 CRIADO 1° CRIADO. SEGISMUNDO 1°CRIADO — SEGISMUNDO CLOTALDO. SEGISMUNDO — CLOTALDO para obedecer, tem sido As incleméncias do fado, que imoe que 4 ; i SS ar SEGISMUNDO CLOTALDO SEGISMUNDO. 2.© CRIADO SEGISMUNDO, 48 2.° CRIADU cLOTALDO (Sai) 2.9 CRIADO SEGISMUNDO 2.8 CRIADO SEGISMUNDO 2. CRIADO SEGISMUNDO CLARIM 2.° CRIADO CLARIM SEGISMUNDO CLARIM SEGISMUNDO. Foge, Clotaldo, Ai de ti, {que a soberba estas mostrando Sem saber que estés sonhando! Cuidado Sei-te daqui ‘Ao seu rei obedeceu. Nao péde ele examinar 2 era bem feito ou mal feito, Que nao entendeis, suspeito, pois me fazeis replicar. © principe disse bem © ¥6s fizestes hem mal Quem vas det icenca igual? A que quis tomar. E quem porque sou o meiq maior que se hé conhecic Tu, 86, em t2o novas mundos me agradas 49 CLARIM (Astolfo, Segis ASTOLFO ‘SEGISMUNDO. ASTOLFO SEGISMUNDO 2.8 CRIADO. 50 im grande “agradador™ le todos os Segismundos. CENA IV Clarim, Criados e Mitsieos.) Feliz mil vezes 0 dia, principe, em que vos mostrais Sol da Polénis ¢ nimbais de resplendor e alegria todos esses horizont com tio divino arrebol ois que sais como 0 Sol ce 08 pincaros dos montes! Sai, pois, e, ands que tarde surja essa fronte cingida —coroa em louro tecida ~. tarde morra, Deus vos guarde fo terme conhiecido, 86 como desculpa o dou por mais ndo honrar-me, Eu sow Astolfo, ¢ duque nascido, vosso primo confirmado. Haje igualdade entre nds. igo: Deus vos guarde a vis; ‘com isto, ndo vos agrado? Porém, se fazeis alarde de quem sois, © vos queixais, se outra vez me encontrais, direi que Deus ndo vos guard Vossa Alteza considere (A Axtolfo.) Como em montes foi nascido Por igual tern procedido (A Segismmundo,) Astol .senhor, prefere .. SEGISMUNDO — 2° RIAD SEGISMUNDO. — 2.0 CRIADO. SEGISMUNDO (Estrela e os restant ESTRELA, - SEGISMUNDO — CLARIM - SEGISMUNDO — Nao gostei como apereceu ne e, 0 primes ‘que fez, foi por 0 sombreiro, E um nobre, n mais sou eu. {tudo isso, entre os doi que haja mais respeito, ¢ bem, ie entre os demvais E pois quem para aconselhar-me sois? CENA Vv Vossa Alteza, senhor, seja, Por gragas mil, aparecido 0 dossel que agradecido 0 recebe ¢-0 deseja, onde, apesar de enganos viva em presenga louvada com vossa vida contada por séculos e ngo por anos. (A Clarin.} Dizeme agora tu quem & beleza soberana? Quem ¢ esta deusa humana, 2 cujo divino pé rende 9 eu 0 arrebol? Quem ¢ esta mulher bela? E, senhor, tua prima Estrela Melhor disseras 0 Sol. (ural, parabéns (a Estrela} pelo bem que hoje conquisto, ESTRELA ASTOLFO 2.2 CRIADO ‘SEGISMUNDO 2° CRIADO. SEGISMUNDO, 2.9 CRIADO SEGISMUNDO, 52 somente por ter-vos 08 parabéns 120 chegarme a ver bem que nao merego, béns agradeco, que amanhecer Que deixais que faga o 0 erguer-vos com 0 Daisme a beljar vossa mi em cuja taca de neve mata a sede a aragem breve Contimuai mais cortsto (A porte.) Bstou perdido (A parte.) A mégoa sei que estais « pegar comigo? Digo o que é justo. 88 que, no justo, o bem é servir € obedecer. 22° CRIADO —— Ans da minha condigzo. ; tal no fareis, SEGISMUNDO — Dizeis nfo? : Por Deus, que o heie provar! (Agarreo com 0s brogos e sai e todos atnés dele, yoltando ¢ ‘entrar imediatamente.) ASTOLFO Ou tO que estou a ver? ESTRELA — Correi para acalmar. (Sai) SEGISMUNDO ASTOLFO e8es severas, Porque os homens nfo sto feras @ um palécio ngo é um monte (Sai Astolfo.) CENA VI (Basito, Segismunco, Clarin e Criados.) BASILIO Que £01 isto? SEGISMUNDO Enfadado, lancet daqui, pra vingar-me, cLaRiM (A Segismundo.) € 0 ve; fiesisavisad. BASILIO, Uma vide, ¢ to dep custa 0 teu primeito i SEGISMUNDO Afimou que ew nfo podia, poréi cumpri a promessa, 33 BASILIO ‘SEGISMUNDO 34 Pesame o suber que, quando com tanto furor te a tua ace, perpatrada ‘momento da chegada, grave homicidio seja E com que smor poderei apertar-te nos meus bragos se esses teus soberbos lagos estdo ensinados, sei, 2 dar morte? Quem chegow a ver desnudo © punh que deu ferida mort sem temet? E quem olhow © sangrento rasta, aonde 2 outro homem deram morte, sem sentir? Porque 0 mais forte 8 seu natural responde ‘Assim que em teus bragos miro desta morte o instrumento e vejo o lugar sar dos teus bragos n fe, Se nos mais gue tenho medo aos teus bragos. ‘Sem iss0 posso passar se passei até aqui, que pai que mal conheci {tanto rigor sabe usar sua condieao ingrata do seu lado me desvia, como uma fera me cria © como a um mon ea minha niio dé, pois o humano ser me tira BASILIO ‘SEGISMUNDO, BASTLIO. SEGISMUNDO BASILIO Aos eéus a Deus, que, prouvera lar-te ndo chegara, pois nem a voz te escutara Nem a insoléncia entendera Se no mo tivesses dado, do me queixara eu assim, ‘mas, uma vez dado, sim, or mo haveres retirado: ois, se dar um ser a vida, € acca be lar, grande baixeza € 0 dar para o tisar de seguida, Bem me agradeces o ver-te saido de uma enxovia, principe Pois devia, or tal coisa, agradecer te? Tirano deste abandono aque velo e caduco estas, Se morres, 0 que me dis? Mais de aquilo em que sou dono? Es meu pai e és meu ri logo, toda essa grandeze 6 a Natureza pelo direito da lei Estgja, embora, neste estado, obrigado nao te sou, ©, 3e pedir contas vou de quanto me foi tirado erdade, vida, amor? —, sragas dé se eu perdoarcte: Bo venha ainda a cobrar-te, pois és tu meu devedor. do céu:e que, em hora m4, te tomou mais presumido. 35 | i (Sai) SEGISMUNDO. (Rosaura, em trajo ce mulher, Segismundo, Cari ¢ Criados.) ROSAURA 56 Por ser quem és jé saberes, e desenganado estejas, neste lugar te vejas | que a outros todos preferes, tem o que digo por certo: torna-te humilde e mais brando, pois talvez estejes sonhando ‘mesmo vendo-te desperto Que talvez sonhando mesmo vendo-me desperto Nio sonho. Sinto, e, por certo, \ sei o que fai eo que sou. | Que arrependido te sintas, j pouco remédio terds ‘Sei quem sou. Nao poder nem que suspites ou mi de quem sou, ¢ sei que sou mistura de homem ¢ fera CENA VIL (A parte.) Seguindo Estrela veaho mas 0 temor de achar Astoli que Cotaldo deseja aque no saiba quem sou ¢ nfo me veja, porque diz que o que importa ¢'9 mau brio: ¢ de Clotaldo fio no afecto, pos Ihe devo, spradecida, aqui o amparo para a hon ¢ 1 CLARIM SEGISMUNDO ROSAURA, ‘SEGISMUNDO. ROSAURA, SEGISMUNDO ROSAURA, SEGISMUNDO por ser breve paraiso leza et homem. Tal como entre eéu e terra; se & quem eu vejo. 10 que eu. Porm duvide e ereio, (A parte.) Fu vi esta beleza (A parte.) E eu esta aura de grander vi reduzida 4 uma estreita prisdo. GA parte.) Ache’ a vida. ROSAURA, SEGISMUNDO. pois creio esse teu rosto ter ja visto. ‘Quem és tu, mulher bela? (A parte) Disimular importa. Sou da Estele uma bem teste daa, Nao diges, Diz do Sol, de cuja chama essa estrela depend, pois so teus raios que essa luz esplende; ¥i, em reine de odares, que presidia, entre milhares de flores, | © espirito da rosa ¢ era a imperatriz, por mais formosa: vi entre pedras finas, | a douta academia de tais minas preferir 0 diamante | € Ser seu imperador, por mais brilhante: fe, nessas cortes belas a inquieta republica de estrelas lugar primeiro, a Vénus, como o mais belo luzeiro m esferas selectas, chamando 0 Sol a corte dos planetas, vi que ele presidia como © maior oréeulo do dia, | Como € que tu (se entre flores, estrelas, pedras, signos, planetas, as mais belas | se escolhem) tens servido 1 de menor beleza, se tens sido, formosa, inte, estrela ¢ rosa? | (Clotaldo, entre bastidores; Segismundo, Rosaura, Clarim ¢ Giaios.) CLOTALDO 58 ROSAURA, ‘SEGISMUNDO ROSAURA SEGISMUNDO ROSAURA, SBGISMUNDO ROSAURA, SEGISMUNDO CLOTALDO ROSAURA| porque timida se prende minha fala; ¢ fala bem melhor quem melhor cals. Nao te vis to ligeira. Como queres deixar desta maneira ‘do belo comego? Essa licenga a Vossa Alteza peco. Partir com tal violéneia € mandar, mas ndo é pedir elem: io a dais, breve tomi-la espero, Fads que de cortés passe a severo, 86 porque a resisténeia £0 veneno cruel para a paciéncia i Pois. quando esse veneno de fini, de rigor, que tanto temo, 2 paciéncia vencera, respeitar nfo ousara nem puder, So pra me experimentar, faz que ngo tem: que sou muito 4 vencer. Foi por mim hoje arrojado desta janela um homem que dizi gue tal se nao podia; vou ver se poderei, sem © teu brio lancar pela janela aquela, (A parte.) Como se vai mudando. Que farei, meu Deus, quando se por louco desejo, thinha honra, outra vez, em risco vejo? Nio, em vio, se previa, ara o reino infeliz, at 59 SEGISMUNDO. (Sai Clarim. ) ROSAURA, SEGISMUNDO CLOTALDO SEGISMUNDO. CLOTALDO SEGISMUNDO 60 eseindalos to fort de delitos, traigbe E um homem que far (Ge € apenas nome de homem que teré), atrevido, inumano, © morte, 86.0 dirs, até que = Vamos, deixem-nos 365, © que essa porta se feche para todos! (Serei morta.) Pensa bem Sou tirano, € pretendes curvar-me a novo engano. (Que funesta partida! itei lutar, mesmo que perca a vida.) ‘Segunda vez provocas meu furor, velho caduco e louco. 1 tens por to pauco? Como chegaste aqui? Chamado pelo tom da voz que ouvi para dizer que sejas Sentires 0 dono ja) sejas cruel, porque sonho sers. A raiva me provocas, se nessa luz de desen, Verei, dendoste a morte, iho ou se é verdade. Quando desem- 'aa espace, Cotaldo agarraa e ajoetha. ) 0 tocas, CLOTALDO SEGISMUNDO CLOTALDO ROSAURA, ‘SEGISMUNDO ROSAURA, (Sai) (Entra Astolfo ASTOLFO. SEGISMUNDO, ASTOLFO ‘SEGISMUNDO. ele poe-se de per ‘Larga esse ferro em nome de teu x Até que gente venha, que teu furor e eélera detenha, no soltate. Ai Céus! (bscam) ie te darei, entre os meus bragos, morte. © 2g0, to brioso, de sangue envelhecido? Embainhai a espada, arrependido. Nao, sem vé-la tingida por esse sangue infame. Pela vids a meus pés tombado; © de algo hi-de servir-me o ter chegado. para o fim, pois desta sorte me vingarei, dando-te 2 morte, daquela antiga afronta 61 ASTOLFO. Eu defendo 48im no 6 0 rei que ofendo CENA x (Sacam das expats, entra 0 rei Basiio ¢ Estrela.) CLOTALDO Nio 0 ofendas, se ASTOLFO BASILIO Porgud, tev ESTRELA {Astolfo é como pena a0 vento solta!y BaStLIO ~ Mas 0 que é isto, em suma? ASTOLFO Chegando ws,ndo € coisa nenhuma (Metem as espaias na bainha.) SEGISMUNDO ~ —£ muito, sim, mesmo em tua presenga Ja matar esse homem, sem detenga BASILIO E respeito no Por estas cas? CLOTALDO Vereis que, sendo as importincia nao tem SEGISMUNDO — Pois 0 que interessa que, por respeito, is eas eu obedega? vosses, poderia ‘135 por aleatia, qualquer dia: i que no foi vingado © estranho modo com que fui eriado (Set) ESTRELA BastLio Pois, antes que aconteca, 4 dormir voltas © que te parega ue todo este passado, sendo um bem mundanal, foi bem sonhado (Sai) 6 CENA XI 86 poucas vezes 0 fado, ue prediz desditas, mente, ois € tao certo nos males como enganoso em benesses! Bom astrdlogo seria © que dos casos erusis 88 dese antincio: porque eles resultam verdade sempre! Em Segismundo e em mim a 2 experiéncia Estrela, porque, em nds dois, tragou rumos diferentes. Nele, previu as desgracas, mortes, raivas e soberbas, © em tudo falou verdade porque tudo, ao fim, sucede: mas em mim, que ao ver, senhora, esses raios excelentes, de quem 0 Sol fora soibra © 0 céu um amago breve, ‘que profetizou venturas, ‘roféus, aplausos, benesses, disse lisse bem, ois 86 & justo que acerte, quando amarga com favores © exeouta com desdéns Eu ezeio que essas finezas sio verdades evidentes;, ‘mas setio por outra dama, cujo retrato, pendente, trouxestes 20 peito, quando chegastes, Astolfo, a ver-me: 63 ROSAURA ASTOLFO. (Sai) ROSAURA, ESTRELA ROSAURA ESTRELA 64 ROSAURA ESTRELA ROSAURA ESTRELA (Sat) 86 porque eu a ti, somente, -gredos fio. Sio honzas, Senhora, 2 quem te obedece. Ha pouco tempo, Astreia, que te conhego, mas tens, a minha vontade, as chaves; Or i860, # por seres quem és, me atrevo eu 2 confiar-e © que de mim, muitas vezes, rocatei Eserava sou. Vou contar-te ¢ serei breve. ‘Meu primo Astolfo — bastara que meu primo se dissesse, porque hé coisas que se dizem com 0 pensi-las, sOmente — hi-de casar-se comigo; se 6 que a fortuna apenas com esta di nisso falei, cortésment Para se mostrar galante, foi bus aqui. Muito me embaraga que a mim o dé quando chegue; ficards a sua espera ¢ dirshe-és que to entregue ati, Nao te digo mai discreta © formosa és; deves saber 0 que é amor. 65 ROSAURA CENA XI Oxalé nto 0 soubesse! Valha-me o eéu! E quem fora ‘Wo atenta e t20 prudente, ue pudesse aconselhar-me 7a oczsifo to solene! Haverd alguém no mundo 4 quem o c&u inelemente com mais desditas combata © com mais pe Que farei em em que impossivel parece hhaver razto que alivie ou alivio que me alegre? Desde « primeire de ~ qual o sucesso ou acidente que outra desdita nao seja? — ve umas © outras sucedem, como herdeiras de si mesmes, E para imitar a fenix, de umas e outras nascem € da morte vio vivendo, Que exam covardes, dizia um sébio, por parecerine que nunca andava uma $6; u digo que sto valentes, pois sempre v0 adiente © em virar costas nao pensam , quem as levar consigo, a tudo pode atrever Pois em nenhums ocasido do ha receios que tenham, Que o digs eu, pois, em tantas como a mim me aconteceram, hnunca me encontrei sem eles (Entra Astolfo com o retrato.) a0 verme ferida pelo destino Se digo quem sou, Clotaldo, quem minha vida devo, 2 este amparo e esta honta, tal ofensa ndo merece; pois disse-me que, ealando, mais honra e remédio ~ espere Mas se nao digo quem sou a Astolf a alma dizthe que mente Que farei?’ Mas, porque estudo © que farei, se 6 evidente gue, por mais que o adivinhe, que'o estude, que o pense, a0 chegar a ocasifo faré tudo 0 que quiser 4 mégoa? Porque ninguém tem, em tais males, poderes. Teaho que determinar © que fazer nko se atreve a alma; que chegue a dor, hoje, a'seu termo; que chepue 40 fim a magos e acabem 88 dividas ¢ os reveses, de uma vez; mas, antes d ‘que 05 eéus me protejam peco! CENA XIV = Aqui vos trago o retrato, Meus Deus! 67 ROSAURA = © que o surpreende, ROSAURA Eu digo que 36 espero Alteza? De que se admira? © retrato, ASTOLI = Jé que pedes ASTOLFO — De ouvir-te, Rosaura, e ver-te ‘STOLFO. gue pedes au leve ao fim »engno, ROSAURA Bb, Rostra? Est engunada gam ele vou responders Vossa Alteza, se me tem ‘ por cuts dana oe, Tou Asti, © as merece tvinha dade ea ta de to conturbade erate Pouca fineza parece | envié-lo, e, deste modo, por essa estima, deverse ASTOLFO = _Basta, Rosaura, o engano, ‘enviar 0 original; porque # alma nunca mente; e serds tu quem 0 entregue, se como Astrela te olha, pois jo levas contigo como Rosaura te quer. quando 2 seu lado apareces. ROSAURA — —_ No compreendo Vossa Alteza, ROSAURA Quando um homem se dispse @, assim, nfo sei respon Tao-somente o que direi é que Estrela — que o pudera 4 tal arrojo, e se atreve a sair de tal empresa, ‘mesmo que por ela entregue ser de Vénus — me mandou ‘maior valor que 0 ido, ede sua parte diga Ex venho por um retrato, que esse retrato me entregue ‘mas, 82 0 Original Ihe levo, que nao me dio beneficios, € Estrela quem as quer ASTOLFO ois como, no 0 du, ASTOLFO — — Por mais esforgos que fagas, ROSAURA = pat | aque mal, Rosabra, consegues dissimulis? Diz 20s 0 aue a sua expressto acrtem com a voz, porque é forgaxo que faga por desdizerse ROSAURA Por Deus, que nfo hé-de ver 0 insiromento dissonance, g 7 entre as mios de outra mulher! que ajustare medit quer re as mos de outra sul ‘amentira do que diz | = an com a verdade que ASTOLFO £ terrivel 68 69 ASTOLFO em vao, (Procura trartheo retato,) Largs, ingrato, | f j s SAUR, : E tu cego, i colética ¢ impaciente KOSAURA ® fiz por Iho arrebatar. ASTOLFO — — 34 basta, minha Roscura Esse que ns mio sustém €0 meu; e se verd ROSAURA — — Bu tua, vildo? Pois mentes | , que comigo se parece. eee ESTRELA Entrega, Astolfo, o etrato. (Thxetho.) hi ASTOLFO Senhora — —Astreia, Astolfo, o que €? | ESTRELA a ESTRELA Vejo nao mentem ASTOLFO — Bis Estrela 08 delitados matizes. ROSAURA (A parte.) (Apenas peso, ROSAURA Nio é 0 meu? para reaver 0 retrato, a cet engenho 20 amor.) Se queres oe E, por ceno. saber 0 que eu, Senhora, | ROSAURA Agora € pedirihe o outro. as ESTRELA Leva o tou; desaparece ASTOLFO. a O que pretendes? ROSAURA, (Recuperei o retrato; . agora, venha 0 que venha.) ROSAURA — —_Mandaste que aqui esperasse (Sai Rosaura.) Astolfo e pedir devera um retrato de teu mando. | CENA XV Fiquei 6, ¢ se aparecem | ESTRELA Entregai o outro retrato de uns pensamentos a outros i seo pedimesmo que pense 38 ideias, Pacilmente nfo mais ver-vos ov falar-vos ‘ Tembranga dos retratos | Atendei bem que © néo quero, & memoria me sugere | em poder voss0, guardado, que um meu trazia comigo, porque eu t70 nésciamente na manga. Deseei védo, | © pedi Porque quem esté solitario i com loucuras se diverte; | ASTOLFO (A parte.) (Como sait caiume por entre as mos, | do tevés que me acontece? ) &, quando Astolfo aparece | Ainda que devesse, Estrela, a entregar o de outra dama, | setvirte e obedecer-te, levantouto ¢ tao rebelde nfo te darei o retrato se mostra a dar o que pedes, que me pedes ue em ver.de dar um, pretende « a ESTRELA E por seres 70 levar outro; pois o meu reeusa-se a conceder-mo, ‘mesmo com os maiores rogos; Vildo € grosseiro amante. Nio quero que mo entregues; n porque afinal, nfo desejo } CLOTALDO - Pois deve estar aque, por mo entregs suardado o clarim, que sabe que’fui eu quem to pediu | tantos e grandes segtedos, @ pra ndo tecer enredos, (Sai) | onde nfo possa soar. ASTOLFO. = Ouve, peco consideres CLARIM = me Deus, por Rosaura! que destino acontece { que a Polonia tenhas vindo, | pare perder-me e perder-te? Sonho ou durmo? Qual o fim (Sat) | de me encerrar? CENA XVI | : | CLOTALDO | — Es Clarim. (Ve-se Segismundo como a principio, com peles e cadeias, dormindo no chio; aparecem Clotaldo, Clarim e os Criados.) cranny — Pois eu digo que serei corneta e que calate, CLOTALDO Aqui o haveis de deixar, que 6 instrumento ruim. (Levam-no.) ue hoje a soberba tem im, Volta ao mesmo, CENA XVIE 19 CRIADO — E eu, assim, (Aparece o rei Basilio, embucado.) volto as cadeias a BASILIO = \do? CLARIM — Nao fagas por despertar Segismundo, podes ver CLOTALDO | — Senhor! Que ouvi? 4 sorte mudada, e ser, Pois & Vossa Majestade? sendo tua sorte’'fingida, como uma sombra, da vida; BASILIO — A tola curiosidade, ¢ da morte, chama’a arder ver quanto acontece aqui a Segismundo, me vi, 8 contragosto, att CLOTALDO = — A quem sabe discutir assim, é bom se mantenha em lugar aonde tenha ‘muro tempo para arguir. Este & 0 que haveis de servi nesse quarto encerrar. CLOTALDO =~ Olhai-o ali, reduzido ‘20 miserével estado. BASILIO — —_Ai, principe desgracado, om triste dia na Em breve despertars? CLARIM = Porqué, eu? R | I CLOTALDO BASTLIO SEGISMUNDO CLOTALDO BASILIO CLOTALDO BASILIO SEGISMUNDO, BASTLIO. SEGISMUNDO 4 Que forga e vigor perdeu, { CLOTALDO came dple aon oe Inqueto,senhor, et, | zi SEGISMUNDO CLOTALDO. Que sonhard agora? Escutemos bem. i (Bm somos) Piedade um principe tem se a tranos dé castigo morra Clotaldo, 0 inimigo; Sujeitar meu pal convém SEGISMUNDO E minha morte que traga Calcar-me a sous pés procure Em mim, tenta a morte dura © meu poder ameaga (Em sonkos} Saia & grandiosa praca que 0 teatro do mundo este valor sem segundo: para uma aftonta vingar, Yejam do pai triunfer © principe Segismundo. ‘Mas, ai de mim!, onde estou? (Desperta.) CLOTALDO SEGISMUNDO. A mim ndo me hi-de ver; if sabes 0 que fazer. 0 scuté-lo vou. (Retirase,) Sou eu, porventura? Sou © que, preso, encadeado, chego a versme neste estado? Nao € meu sepulero torre? Sim. Valhame Cristo, {que coisas tenho sonhado! (Comegarei a pensar na simulagfo, agora.) De acordar jd é hora? desde que a dguia alte ‘mais alto subindo, ansiosa, Nic. Nem agora despertei, «, Clotaldo, ter de ndo acordar Nao devo estar enganado: pois, se tudo foi sonhado © que vi palpév ido; © somhe, estando desperto, Isso escutarei de ti? Se por sonhos o tomei, no ditei o que sonhei: mas sim, Clotaldo, 0 que vi. Despertando, me senti, que doce engano eu soft sobre um leito, que pudera, ‘com seus matizes e cores Serum tapete de flores, feito pela Primavera. Até mil nobres, rendidos meus pés, nome me deram ae seu principe ¢ estenderam galas, j6ias ¢ vestidos. A-calma de meus sentidos ‘tu trocaste em alegria, 75 CLOTALDO ‘SEGISMUNDO CLOTALDO ‘SEGISMUNDO (Sat 0 rei) CLOTALDO (Sei) SEGISMUNDO 16 E ou que alvissaras teria? ‘Nada boas; por traidor com peito atrovido e forte quis, duas vezes, dar morte. Para mim tanto rigor? De todos era de todos me 86 uma mull Que foi cer de que tudo se acabou, ‘mas que 0 mal nfo terminava, (Foi-se embora, comovido, lo escutado.) na tal dguia, adormecido, fai de império o sonho urdido; ‘em sonhos, seria um bem, nto, que honrasses 8 quem te criou com tal cuidado, pis, mesmo em sonhos, é dado, como um dever, fazer bem, CENA XVIII € 0 faremos, pois estamos destino que o leva & m E esta a desdita forte que tem quem pense reinar vendo que hé-de despertar do seu sonho, desia sorte Sonha 0 rico eom riqueza aque mais euidados Ihe ofereces sonha 0 pobre que padece sua miséria ¢ pobreza; sonha © que o triunfo preza; sonha o que lutae pretende, sonha 0 que agrava ¢ ofende, € no mundo, em concluséo, todos sonham © que sio, ‘no entanto ninguém compreende. Ev sonho que estou aqui de cadcias carregado, que em outto estado mais lisonjeiro me vi. Que é a vide? Um frenesi; Que 6 a vida?’ Uma iluséo, uma sombra, uma ficef0, € pequeno o maior bem; que o sonho a vida sustém €.08 sonhos sonhos s%0. (Entra Clarim.) CLARIM TERCEIRA JORNADA CENAT E nesta encantada tore que, por mé sorte, estou peso. Que fardo pelo que ignoro se pelo que sei me enterram? ‘Ter um homem tanta fore Que pena tenho de mi todos dirfo: “assim pens bem 0 podem pensar, pois para mim tal silencio, fe no acerta com nome de Clarim, calar nfo devo. ‘Quem tenho por compania aqui, 3€ 0 que digo é cert, sfo 0s aranas ¢ 05 tatos: them que lindo bringuedos! E, dos sonhos desta noite, 2 cabega triste te chia de mil ceiménies, de trombetas¢ apejos, de procisses e de enuzes, ds franos;¢ sfo estes {que ora baixam ora fobem, € outros desmaiam, vendo tanto sangue derramado; cu, a verdade dizendo, porque no como, desmaio; fe neste céroere aprendo filosofar na fome, 4 filosofos que 2 seguem. 8 eu no quero as razdes de Niceno ou Nicomedes. Se é santo aquele que cala, novo calendério acerto, ‘So Sepredo serei eu, pois de comer me abstenho; ainda que seja merecido © castigo que padeco, pois calei, sendo criado, © que é um sacrilégio. CENA TI (Ouvernse, dentro, vores, ruido de caisas ¢ de clarins.) 19 SOLDADO — Besta torre em que esté. Urge que a porta arrebente e-entrem todos. CLARIM = A Deus, eres! Que me procoram € cero, pois dizem que estou aqui Que quereréo? (Aparecem 0s Soldados,) 1.2 SOLDADO — Entrai dentro. 2° SOLDADO — Aqui esti CLARIM = Nao esti (Todos) - Senhor 80 CLARIM 28 SOLDADO (Todos.) CLARIM (Todos.} CLARM 28 SOLDADO CLARIM 1.9 SOLDADO CLARIM 28 SOLDADO (Todos. (Borrachos estardo estes? ) ‘Tu nosso principe és; Dai-nos, pois, 08 vossos pés. ‘Viva quem é nosso chefe! {A parte.) Viva Deus, como isto vai! Se € costume neste reino prender um em cada dia, fazéo principe, e feito volta logo torre? Sim, que em cada dia isto vejo; forga & que faga o papel. Dai-nos os teus pés. Protesto, que me so muito precisos Todos a teu pai dissemos , obediéncia cipe, deveremos, © 10 a0 outro. E ao meu pai, que respeito se Ihe deve? Sois uns ons trangathadangas. Por lealdade o fizemos. Lealdade? Entio perdoo. ‘Vem restaurar teu império. Viva Segismundo! Viva! al CLARIM — (A porte.) Dizem Segismundo? E certo ‘Segismundo serem todos (8 principes de brinquedo, CENA III (Aparece Segismundo.) SEGISMUNDO — Quem chama por Segismundo? CLARIM = Que principe grolo cu era! 28 SOLDADO — Quem é Segismundo? SEGISMUNDO — Eu. 2° SOLDADO — _Pois como, atrevido, néscio, te mudaste em Segismundo? CLARIM — Bu, Segismundo? Isso nego. Segismaundaram-me logo que aqui chegaram a verme. Por e de quem a culpa atrevimento? 19 SOLDADO — Oh, principe Segismundo! = porque os sinais que trazemos lo teus, ainda que a f& por senhor nosso te elege —» tou pai, grande rei Basilio, temendo que os astros dessem cumprimento a0 fado ingrato de a teus pés cair inerte, esse intento 58 © Povo, 82 DENTRO. SEGISMUNDO no quer que vera o estrangeiro mandéo, e por tudo isto mantendo um nobre desprezo pela incleméncia do fado, pprocurou-te sonde preso Sai, pois; que, nesse io mimeroso dos e de plebeus te aclama; ¢ a liberdade te espera: ouve brados seus. Viva Segismundo, viva! Outra ver, — que ¢ isto, Deus! — que hé-de desfazer 0 tempo? Outra vez quereis que veja entre sombras e acenos a majestade © a pompa desvanecidas no vento? (Ouitra vex. quereis que softa desengano ou desespero a que 0 humano poder nasce humilde e vive atento? Tal nfo volta a acontecer; olhai-me, outra ver, no adverso fado, pois agora sei que & a vida um sonho eterno, Ide, sombras que fingis, ‘205 meus sentidos inertes, corpo e voz, sendo verdade ‘que nem cotpo e yozes levam, Eu nfo quero majestades que a um toque, por mais breve, 3 2.8 SOLDADO SEGISMUNDO 1° SOLDADO ‘SEGISMUNDO aura se desfard ‘como cai a flor dz améndoa, ‘que, por muito madrugar sem aviso e sem conselho, ‘2 qualquer sopro se apaga, ‘murchando logo; e, perdendo fs seus rosados botdes, perde 2 drvore ornamento, Demais vos conhego eu sei bem que sois os mesmos para todos os que dormem; ji nfo creio em fingimentos, pois, desenganado js, que do é sonho, compreendo. Se pensas que te enganamos, delta a esses montes soberbos os olhos, para que vejas todo esse mundo de gente que te obedece. Mas ev otra vez vi isto mesmo ‘fo clara e distintamente como o agora estou vendo, foi sonho. Coisas grandes, ‘meu senhor, trouxeram sempre antincios; ¢ isto seria ‘9 sonho desse momento. Dizes bem, antincio foi, @ caso que fosse certo, se a vida jé € tHo curta, sonhemos, alma, sonhemos outra vez, mas hé-de ser com aten¢ao e conselho que haveros de despe confiando em melhor ‘que lovando-o jf sabido (Todos.) (Aparece Clotaldo.) CLOTALDO ‘SEGISMUNDO- CLOTALDO CLARIM (Sai) CLOTALDO © desengano é pequeno; que é enganarmos © mal levar sabido o conselho. E com esta prevengio, de que, quando fosse certo, todo o poder & emprestado € 20 dono tem de volver-se; atreverme-i a tudo. ‘Vassalos, muito agradeco 1 lealdade; em mim tendes quem vos livre, ousado e destro, de estrangeira escravidao, Tocai &s armas, que presto vereis aquilo que valho. Contra men pai, eu pretendo tergar armas e mostrar «que s20 0s eéus mais clementes. Véloei a meus pés curvado .. (A parte.) Mas, se antes'de isto, desperto? Dizé-o talvez ndo deva, que nfo posio faélo. Viva Segismundo, viva! CENA IV Meu Deus, que alvorogo & este? otaldo ... Senhor ... (A parte,) Em mim a raiva solta, (A parte.) Bx estou certo que 0 deita do monte abaixo. i reais pés, recebo jd sei que a morte. 85 | ‘SEGISMUNDO CLOTALDO SEGISMUNDO CLOTALDO SEGISMUNDO CLOTALDO ‘SEGISMUNDO 86 Levanta, que como pai te estremego; his-de ser meu norte e guia fe em quem eu fie os acertos; sei bein como me criast esse cuidado te devo, Dé-me um abrazo. Que dizes? Que estou a sonhar, € quero fazer 0 bem; mesmo em sonhos, nada se perde em fazé- essa morte. Que vito, traidor eingrat! (A porte.) Mas, c&us, convém retomar a calma, aqe igioro se estou desperto, Chotaldo, vosso valor 1s invejo © agraego. sampo nos veremos. tocai a6 armas. Curvo-me a teus pés mil vezes. Areinar, fortuna, vamos; se durmo nio me despertes, se € certo, faz que eu nfo durma, Mas sonho ou verdade impere, fazer 0 bem & 0 que importa se for verdade, por s# nfo, por ganhar amigos para quando desperteros, (Saem.) CENA V (Aparecem 0 rei Basilio e Astolfo.) BASILIO. Quem, Astlfo, faré para, pradente, a fra de um cavalo desbocado? E quem do rio deter a corsente que o leva 20 mar, soberbo e despenhado? Guem am rochedo suser, valente, do curme ds montanha desgarrado? Pois tuo faci de parar te: que se uve soar no mals profundo repetido: funesto onde, import ta tragédias a fortuna ASTOLFO — Suspenda-se, senhor, toda a alegria; ccesse o prazer do aplau: que tua mio se Polénia, por nobre cavaleiro no me quer, nem por rei me obedecia, que eu preciso de o merecer, primeiro. aime um cavalo, © como raio breve cairei sobre aquele que se atreve. (Sai) BASILIO = Pouoos defeitos tem 0 infalivel, fe muitos riscos previsto tem: se hé-de ser, a defesa é impo: is . menos detém. Horror terrivel! 87 (Aparece Extreta) ESTRELA - (Aparece Clotaldo, ) CLOTALDO — BASTLIO ~ CLOTALDO BASTLIO = Désme um evalo, sere eu quem vai Penso fig 20 isco € 0 risco vem; defender a coroa ameagada, corn 0 quanto guardava estou perdido; fqueto veneer 0 iho ingrato 20 pai i ac ean tabi al pate desea Quando a cigneia errou, que venga a espada. ‘CENA VI (Sai) ESTRELA —_Deusa da guerra sou, que futar vt ce sempre & minha {¢ te serd dada; porque juntar 20 teu mew nome quero, Se com tua presenga nfo se trata ‘compete’ com Palas, como espero. Ge enfrentar o tumulto sucedida, ‘que de um a outro bando se dilata, pelas rues e pracas dividido, (Sai ¢ tocam as armas.) yerds teu reino em ondas de escarlata CENA VII nadar, por entre a pirpura tingido dde seu sangue, que jé com om tragédias afunda o pov (Aparece Rosaura, que detém Clotaldo) Tanta a ruina deste impéri ROSAURA — ——& 0 teu coragdo encerra 2 forea do rigor duro e sangrente tanto valor, mesmo assim que visto admira ¢ que escutado espanta, ‘com ele falas; a mim ‘Turvase 0 sol e se revolta 0 vento, escuta, conheco a guetta cada pedra pirdmide levanta Sabes j4 como cheguei cada flor constréi um monumento, pobre, huumilde e desgracada cada edificio é sepulero altivo, 2 Poldnia, e amparada cada soldado um esqueleto em teu valor, nele achei piedade; e como mandando que disfarcada vivesse CENA VII Gragas a Deus que, vivo, a teus pés chego! fala pela noite fora ‘com Estrela num jardim; Glotaldo, que acontece a Segismundo? ‘endo eu a chave roubado, poderei ocasionar Que 0 povo, monstro despenhado ¢ cego, que nele possas ent na torre penetrou e do profundo dando fim 20 meu euidaco. do céreere 0 tirou; ele, no apego LL, altivo, ousado e fo de outra vez suas honras ver no mundo, defenderme poderds, valente se mostrou e altaneiro jurou provar seu fado verdadeito. eae a vingarsme nessa morte 89 | | CLOTALDO 90 em que te vi, a tudo fazer por ti quanto em vide eu pudesse, © primeiro que foi mudares 0 teu vestido para que Astolfo em teu proprio Eu, nesse tempo, pensava desagravar-e, podendo, x honra, mesmo ~ tanto essa hi que dar tal mi ‘Tardio pensar de um louco! fo € meu rei, tZo-pouca cle me assombra & admira Darthe morte pensei, quando Segismundo intentou rmatar-me a mim e chegou com perigos arrostando, ea vida me defendia, empenhando tal vontade, aque até foi temeridade muito mais que valent Como, agora, deste sorte, tendo a alma agradecida, 4 quem me salvou a vida tenho eu que dar @ morte? Ponho entre os dois repartide o afecto ¢ 0 cuidsdo; tenho dado, em ti obrigado a dar e nele por receber. No caso que se ofereoe ROSAURA ROSAURA 0 amor no me satisiaz pois sou aquele que faz © aquele que padece. Rem deves de compreender, sendo um vario singular, que se é nobre acgao 0 dar de sido ese que vida ta ha dado tu a mim, A razto: cle forgar-te a nobreza a cometer a baixeza @ eu a generosa acgi0. Se estés por ele ofendido, estis a mim obrigado, supondo que me tens dado © que dele ¢ recebido; e assim deves de corter risco, sem detenea, -que existe difere entre o dar e 0 receber. Se 2 nobreza € mister da parte desse que di, igual nobreza haverd naguele que agradecer; © porque dei, é sabido que tenho, por nome hontoso, © nome de gener0s0; dime ele o de agradeeido; assim 0 posso obier sendo agradecido, quanto liberal, pois honsa tanto © dar como o receber. De ti recebi a vida tu mesmo me disseste quando essa vida me deste: oO CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA 92 porque vida nfo 2 que tua mo me dew. E se deves ser primeiro ral que agradecido como me foi prometide — dime a vida dando, mais S pois libe agradecido em seguida Ver pelo ergumento, es liberal sere , Rosaura, te dared ‘0s meus bens, e em um eonvento vives que estd bem pensado © quanto te solicito, pois fugindo de um a te recolhes ao sagrado; se estando tio dividido, © reino desditas sente, nfo serei quem as aumente se por nobre fui Com 0 remédio sou com 0 reino, sou contigo liberal, com AStolfo agradecido; se essa escotha te deveste se por filha te tivesse Se por filha me tiveras eu Sofieria esse abuso; ‘mas como nfo sou, recuso. Entfo que fazer esperas? Matar o duque. CLOTALDO ROSAURA ‘CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA ‘CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA Uma dame, que os pais nunca conheceu, para tanto se atreveu? Sim, Quem te alenta? A fama. Pensa que Astolfo hisde ver .. A minha honra atropela ‘Teu rei e esposo de Estrela, Jura que 0 nfo hide ser E loucura. Bem o creio. Pois vence-a, Nao poderci. ois perderds .. Bem 0 sei Vida e honra, Nio receio. Que intentas? A morte. ‘Admira tanto zelo. 5 pundonor. 93 CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA CLOTALDO ROSAURA (Sai) CLOTALDO (Sai) ~ Efe E destino, - E valor. Raiva e ira, — Enfim, nfo se encontra meio de o impedir? - Nio 0 si = Quem te giude? — Bro farei. Sem remédio? - remedeio. ~ Pensa bem se hé outros modos ~ De qualquer modo eu perder. Pois, se hisde perder-te, espera, filha, e perdemo-nos todos. CENA IX (Aparecem, tocando e marchando, Soldados, Clarim e Segismundo vestido de pees) SEGISMUNDO — 94 Se a Roma eu pertencera, 08 seus triunfos da primeira idade, ‘oh, quanto se slegrara por aplaudir ocasifo to rara de possuir a fera {que sem grandes exércitos regera, a cujo altivo alento fora pouca conquista o firmamento! Mas se © voo abatemos, nem assim, alma, n6s desvanecemos, pois este aplauso incerto ade peser-me, se estiver desperto, por téo conseguido pata havé-lo perdido; e, se menos valer, ‘menos eu sentirei se © perder. (Ouve-se, dentro, um elarim.) CLARIM SEGISMUNDO ~ CLARIM - (Sat ) SEGISMUNDO — Em cavalo veloz .. ~ Se for pigago perdosime ves porque me vem 0 j @ cujo corpo 6 o mapa mais perfeito, pois o corpo é a terra, © fogo alma que seu peito encerra, fa espuma o mar, 0 ar 0 seu suspiro, ‘em cuja confusto 0 caos admiro; pois nessa alma, espuma, corpo, alento, monstro & de fogo, terra, mar ¢ vento; parece remendado, que é de redondas manchas salpicado: ‘quando a espora softer, voa em vez de correr. E 6 nele que chega uma beldade. Asua luz me cega. Pois é Rosaura, enfim. 0 céu a traz de novo junto a mim. 95 CENA X (Aparece Rosaura, vestindo saio ¢ trazencio espada e adaga.) ROSAURA — — _Generoso Segismundo, cuja majestade heréica sai 20 dia. dos teus feitos 4 noite das suas sombras, © como o maior planets, estando em brapos da Aurora, se ergue de novo luzente sobre as flores sobre as r0sa5, e sobre mares e montes quando coroado assoma, Juz esparge, raios brilha, umes banka, espumas bords, assim amanhega 0 mundo, das duas qualquer the sobra. ‘Trés vezes so as que jd me admiras; tés que ignoras {quem sou, pois as trés me viste vardo, nessa rigorosa prisfo, onde tua vida Na’ segunda, admiraste a mulher, quando 2 pomps 96 son do teu reinado era um so cera um fantasma, uma 50 Hoje 2 terceira, que sendo monstro de uma espécie ¢ de outra, entre galas de mulher, armas de vargo me adornam. Mas porque, compadecido, ‘9 meu amparo disponhas, bom € que dos meus sucessos todas as tragédias ougas. seu nome doma ‘minha voz, que 0 no conhero, mas cujo valor dew forma a0 meu; pois, Sendo criada em sou pensar, sito agora nfo ter nascido gentil, persuadindo-me, louea, ‘que foi algum deus de aqueles que em Metemorfosis choram = chuva de ouro, cisne ¢ touro — Danae Leda ¢ Baropa Pensando que me al que te disse, em razDes poueas, que minha mae néscia desculpa de £6, palavra de esposa, tanto a aleanga, que ainda hoje a esse dever se dobra;, hhavendo sido wi ~ Eneias da sua Tria —, ‘que até the deixou s espada ” 98 Aqui se embainha 2 fotha, porque eu a desnudarei antes que se scabe a hist6rie. De este, pois, mal dado n6, aque nem ata ou aprisiona © matriménio ou delto, {que afinal é 9 mesina coisa, nasei eu 150 parecida, que fui retrato, wma c6pi 54 que em formosura no, nas suas ditas e obras; endo haverd mister dizer que, poco ditose hnerdera de tas fort sou como fosse ela pr 0 mais que posso dizerte falar desse que rouba troféus do meu pundonor, despojos da minha honra. fo! .. E a0 dardhe 0 nome jf se encoleriza e enoja © meu coraglo, que esse por um inimigo 0 t Foi Astolfo o dono ingrato ‘0 que, esquecido das glrias = porque em um passado amor se perde até a meméria — veio a Polénia chamado, pela conquista famosa, 4 casar'se com Estrela, f do meu ocaso ¢ toch. Como acreditar que sendo uma estrela quem conforma dois amantes, se uma Estrela a confusio do dentro desta Babil6nia; e declarando-me muda, porque hi penss e que explicam os afectos muito melhor do que a bocs. ‘Minhas penas fui calando, até que, uma vez por todas, a s6s com 2 minha me, rompem da prisio, ¢, 4 solta, do peito sairam ji ‘tropegando umas ‘Nao tive pejo em sabendo que uma pess ‘a quem fraquezas se o foi também ciimplice de outras, pparece que nos salvamos porque 0 peito desafoga; que as vezes o mau exemplo de algo serve. Enfim, piedosa, owvi juz que foi de ‘que facilmente perdoa! E negando & ociosa thor conselho tora Astolfo ¢ 0 obrigue entenden je de homem me ponka, Despendurou uma espada que é esta que cinjo; agora E tempo que se desnude, como promé confisda em s dissome: “Vai a procura que te vejam essa espada que te adomna, 99. (0s mais nobres; que em algum talvez. que encontre piedosa pede minha vida 20 rei, que 0 rei essa vida outorga, que, informado de quem sou, me persuade que ponha meu proprio traje, ¢ que sitva a Estrela, onde engenhosa estorvei o amor de Astolfo 0 ser Estrela sua esposa. Adiante; aqui me viste, coutra vez, confuso; e outra com o traje de mulher confundiste as duas coisas; falemos, pois, em Clotaldo que, convencido que importa que se caser e que reinem Astolfo e a Estrela formosa, contra meu brio aconsel que eu & pretensto deponha. Eu, vendo que tu, valente Segismundo, a quem toca vingar-te hoje, porque 0 edu quer que 0 saias dessa pristo, ‘onde foi tua pessoa, para 0 sentimento, fera, para o sofriment: armas contra a tua contra teu pai as tomas, venho ajudar, misturando, ‘circere rompas, SEGISMUNDO — as custosas de Diana, os arneses de Palas, vestindo agora 9 saio e cingindo a espada, pois os dois mui bem se encontram. © que importa fazer estas concertadas bodas: 4 mim, para que no case quem por esposa me toma, © a ti, porque, estando juntos seus dois estados, 10 ponham, ‘com mais poder e mais forga, diivida 8 nossa vitéria. Muther, venho persuadi tous pés, chorosa; €, vara, venho servir-te, quando 0 teu povo socorras. Muther, venho a que me valhas em agravos e revollas: «, vardo, venho valer-te com minha espada e pessoa E, assim, pensa que se hoje como mulher me namoras, como vardo, te darei a morte em defesa honrosa do meu brio; pois serei, em conquistas amorosas, ‘mulher para dar-te queixas, varlo pare ganhar honras. (A parte.) Meu Deus, se em verdade sonho, Vatha-me 0 céu, quem soubera, 0 102 o saber sar de todas ‘ou ndo pensar em nenhuma Que penas t20 duvidosa! Se sonhei essa grandeza em que me vi. como agora esta molher me refere ses sinais tio notdrios? Logo, nfo pode ser sonho; 3 foi verdade, é prova de confusio ndo menor Como esta vida se toma ‘como um sonho? Parect com 08 somos. s40 as gl ras as verdaderas sio tidas como mentirosa, ¢ a8 fingidas como certas. Pois, entre umas e outras, ro Se procura saber se 0 que se vé € se goza Smet ou verdad? ‘Tao semethante & a e6pia do original que duvidam de saber se 6 ela propria? Pois, se é assim, e hide verse desvanecida entre sombras fa grandeza e 0 poder, 4 majestade © a pompa, saibamos aproveltar este instante que n0s toca, pois na cBpia se desfruta ‘0 que entre sonlhos se goza. Tenho Rosaura sujeite; por bela, meu ser a ado gozemos, pois, a ocasifo, fe que o amor 35 leis rompa do valor e confianga com que ala a mous pés se prostra Isto € sono; e, porque 0 & sonhemos ditas agora aque depois serio pesaes. Mas ... com estas razdes proprias, ROSAURA, SEGISMUNDO. solta a convencersme a mim? Se € sonho, so vangéria, quem pela vangléria humana pperde uma divina glévia? Que passado no foi sonho? E quem teve acg6es herdicas que a si nfo confesse, quando as revolve na meméria = sem davida foi sonhedo quanto vi? Pois, se isto toca meu desengino, se sei que 6 0 prazer chama formosa € que em cinzas 0 converte qualquer vento que Ihe assopra; 20 eterno voltaremos, chama vivificadora, ‘onde no dormem as ditas, nem a grandezas repousam. Ahonra perdeu Rosaura; ras a um principe Ihe dar @ honra e ndo tiréla Pois bem, eu da sua honra hei-de ser conquistador, primeiro que da coroa Fujamos desta ocasifo que € bem forte. (A wm soldado.) As armas toca, aque hoje heinde dar batalha, bem antes que negras sombras sepultem 0s raios de ouro entre verde-negras ondas Senhor! Pois assim te ausentas? Seja uma palavra, embora, no merece meu cuidado, rem sequer minha revolta? Como € possivel, senhor, que nem me olhes nem ougas? Nao me mostras o teu rosto? Rosaura, & honra, o que importa é ser piedoso contigo, 103 ROSAURA = Que pode ser? i ras seri cruel, agora. Minka vo nfo'te responde j gure 3 hon cexponds; cLaRM ho te falo, porque quero ease | qe por min falem es obras a resstre vencor i rem olho, porque & mister. 0 do bravo Segismundo, | feat penal a0) pest j nfo olhar a formosura ROSAURA —_Entfo, bem covarde sou, ‘quem tem de olhar pela honra se a seu lado no estou, ee | que € escindalo do mundo oa y ‘quando tanta crueldade | ceampeia sem f€ nem le ROSAURA —_Palavras ' Depois de tanto pes (Sai) ainda tenho que i nas respostas duvido CENA XI CENA XI | (Aparece Claim.) (Dentro.} (Uns) Viva nosso invicto rei! } | CLARIM Aqui me tens, desta sorte Outros} Viva a nossa iberdade! i ROSAURA — — —Clarim! Onde tens estado? CLARIM ~ Um 9 cute, tnt fe, vivam e deixem viver, cLARM que eu nfo pensando na minha mo! enquanto se serd, quando ser. Que eu, neste mldito dia, como se as cartas jogasse com tanto ruido fero, €-0 azar me destinasse {aga tal qual como Nero, | perder, pois es enquanto a cidade ardia, para dar um estalido Se tenho de me importar com algo, comigo seja ROSAURA — _Porqué? sn que alguém me veja, contemplar | cCLARM = Sei um bom segredo; «quem és € potque tem medo Glotaldo .. Mas, que ruido a morte nfo me acharé, este? aque fago figas & morte. i (Ouvemese tambores dentro.) (Bsconde-se, ouverse nsido de armas.) Fs ts CENA XIII (Aparecem 0 rei, Clotaldo Astolfo, fuginde.) BASILIO ea cLorALDO | — ASTOLFO — — _Os traidores, vencedores ficam. BASILIO 7 Em batalhas tais, fos que vencem sfo i 5 do cruel, do inuman: sor do ‘lho tirano. (Dispararn dentro ¢ cai Clarim ferido, no sitio onde esti.) CLARIM — Vatha-me Devs! Quem serd 0 soldado que no chdo esté caido e de sou sangue tingido? ASTOLFO | — CLARIM —~ Sou um homem desgragado que, por querer-me guardar que a morte chame secreto;, e eis a conclusio maldita: quem mais seu afecto evita, 106 (Cai para dentro.) BASILIO CLOTALDO mais encontra 0 seu afecto i pois, e sem tardanea, | e sangrenta, a0 Fogo, | entre a refrega, logo | hi bem maior sogurangs. j | Esse € 0 monte mais guardado, essa ¢-mais segura traga para deter a desgraca 4 incleméncia do fado; se assim fugis da morte, pensando na liberdade, ‘thai que, sendo vontade de Deus, morrer é a sorte, Porque morrer & a sorte se for de Deus a vontade! ‘Que bem que foi, induzindo este cadaver que ppela boca da ferida, que o seu fluido desata ‘que sfo lutas escusadas essas que um homem intenta contra maior forga e causa; cheguei a entiegé de quem pretendi Se 0 fado conhece bem todos 0s caminhos, acha © que procura, no fundo has, que se nfo faca do € crist — tengdo torvar-the a senha. © prudente vardo sobre © mal vitéria alcanga; 107 ASTOLFO. - BASILIO - (Tocam és armas.) no estando acautelado de penas e de desgragas, faz por bern acautelar-te. Clotaldo, sonhor, te fala como prudente vari0 que a madura idade alcanga; eu, como jovem valente. Escondido entre as ramas ‘desse monte esti um cavalo, yeloz aborto da aur foge nele, que entretanto ‘te guardarei as espaldas. Pois, se a Deus provver que morra, se a minha morte me aguarda, aqui, hoje, a buscarei enfrentando-e cara a cara, CENA XIV (Aparecem Segismaundo e toda a companhia.) UM SOLDADO — SEGISMUNDO ~ CLOTALDO — BASILIO a ASTOLFO - BASILIO - CLOTALDO | — 108 No mais profimdo do monte, por entre as espesses ramas, 0 rei se esconde, Segui, Nao haja no cume planta que 0 zelo nfo examine ‘ronco a tronco, rama a rama. Foge, senhor. ara qué? Que intentas? Astolfo, aparta, Que queres? - Fazer, Clotaldo, uma coisa que me falta. (A Segismundo, ajoethando-se.) Se & a mim que procuras, ispende essas buscas tantes, que a teus pés ofereso Calca 0 meu pescogo e pise a coroa; humilha, arrasta (o-men decora e respeito; exeree em mim a vin servete de mim, cat , ap6s tudo quanto alcangas, que compra o fado a promessa 0 céu a sua palavra, SEGISMUNDO — Corte ilusire da Polonia, centre admiragdes tantas, sois testemunha, atendei que 0 vosso principe fala. O que o eéu determinou, e sobre azulinea tdbua, Deus, com o dedo, escreveu com letras e com estampas, 1no papel do firmamento bordado a estrelas doiradas, ‘nunca engana, nunca mente; porque quem mente e engara & quem, para usar mal delas, as penetra e as alcanga. © meu pai, que estd presente, para se escusar & sanha de minha condigfo, fez-me ‘um bruto, uma fera humana, de modo que, mesmo que eu, pela nobreza galharda, pela arma generosa, pela condigao bizarra, fivesse nascido décil humilde, apenas bastara tal género de viver, 110 6 criar-me em tal linhagem, ppara fazer de mim fera. Bom processo de domé- Se, a qualquer homem, dissessem ‘Alguma fera inumana te dar morte”, escothera ‘mal fizera em anrojar-se ag mar quando este levanta ‘moventes montes de ne se 0 ameaca 20 a acorda; fesse que, temendo a espads, a desnuda; esse que move - pasilio = - altas vagas de borrasca, Quando estiver — escutaisme!— adormecida esta Sanh rmoderada expoda 2 fi x em bonang flo se vence (Todos. ) SEGISMUNDO. — Antes de chegar o mal ndo desconfia ov se guarda quem o prevé; porque ainda pode, humilde — a coi na ocasifio, porque, 2 esta, nada consegue mud: exemplo este sa © que contemplam: preventivas to varias meu pai e derrubado um monarea. A sentenea do céu fois ‘mesmo querendo embargé-la, no pode; e poderei eu, que Sou bem menor nas anos, ‘que, se 0 cfu te desengana porque erraste na maneiza eo vencer, humilde aguarda © abraco que mo deves, se dos meus pés te Jevantas. Meu filho, essa nobre aegi0 de novo em minhas entranhas te engendra; principe és. louro ¢ a palma yem, porque venceste; que te coroem facanhas. Viva Segismundo, viva! ‘Se para vencer aguarda valor grandes vitérias, je havde ser 2 mais rme a mim. Pois Astolfo porque sua honra é divida endo sou eu a cobré, mn ASTOLFO ‘CLOTALDO ASTOLFO CLOTALDO ASTOLFO SEGISMUNDO- ESTRELA ‘SEGISMUNDO n2 Muito embora eu the deva 1. SOLDADO tsse bviegt, repara gue cla fo sabe quem & Oe taxes, e € itémia Gesarime ev com mther Mio prossigns e aguarda; SEGISMUNDO porque Rosaura é tio nobre omo to, a minha espada & dofenderé no campo, pois é minha fia, E basta! Que dizes? BASILIO Que eo, a vee ASTOLFO sda, nobre« honrada, ee e ROSAURA SEGISMUNDO Pois sendo assim, a palavra ccumprirei Para que Estrela fo fique desvonsolada, vendo que um principe perde de tanto valor ¢ fama, pela minha propria mio com exposo hele aque em méritos ¢ fortuna, se nfo o excede, 0 igula Dime a tus mio. En ganho | IL fem merecer dita tanta. A Clotaldo, que leal serviu a meu pai, o aguardam ‘meus bragos, com as mercés que ele pedir que lhe eu faga. — Se, assim, a quem te serviu a'mim que fui causa A torre; para que nfo saias dela nunca. Até morreres, O teu engesho admico. Que condiglo tio mudadat = Que discreto © que prudent! = Que ws admira ov espanta seo meu mestre foi um @ temendo, em minhas ansias, havi de despertar assim, ches que a felicidade humana, ao fim, passa como sonho, ¢ hoje quero aproveit no tempo que me durar, pedindo, de nossas faltas, perdZo, pois, de peitos nobres, 6 natural perdodas. 113

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