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Lrolo. Boge Pie 2OKSV/Z Fredie Didier Jr. Hermes Zaneti Jr. CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL ae EDITORA AePODIVM torauspodivm.com, Sumario Nota dos autores 4 11* edicao Nota dos autores a 10* edicio Prefacio a 1" edicd0. Apresentacao a 1* edicdo 3 —D Capitulo 1 > Introducao ao estudo do processo coletivo eco 1. Concelto de processo coletivo, aco coletiva e tutela Jurisdiclonal cOletIVa wmwewwnnnenee 31 2. O processo coletivo como espécie de “processo de interesse puiblico" (public law litiga- tion): Interesse puiblico primério e interesse puiblico secundério no controle Jurisdiclo- nal de politicas publicas = 36 2A. Generatidad eS nena BG 22. Modelo experimentalista de reparacSo e medidas estruturantes (structural injunctions e specific performance) mn aon ss 23, Interesse publico primério e interesse puiblico secundario anne 39 24. Aimplementacéo e controle de politicas puiblicas por parte do Poder Judiclario (judicial activism, judicial restraint e ativismo judicial seletivo): ativismo da lei e da Constituiggo em matéria de pollticas pUbliCaS 10 BraSll wwwenenennnenennnne 41 25. Para além da politizacao da justica” em uma democracia de direltos: uma conclusso parcial — 45 3. O microssistema processual coletivo, 0 papel do Codigo de Defesa do Consumidor € © di8logo das fontes com 0 CPC-2015 (era da FeCOdIfCEGEO) amen 50 3.1. Generalidades 50 3.2. O.CDC como um “Cédigo de Proceso Coletivo Brasileiro” 3 33. Omicrossistema do processo coletivo 55 4, Legislagio e procedimentos relacionados a tutela coletiva: procedimento comum das ‘causas coletivas (art. 21 da LACP e art. 90 do CDC) C) ~2H Capitulo 2 > Situagdes juridicas coletivas: direitos coletivos lato sensu (difusos, coletivos e individuais homogéneos) e casos repetitivos 6 1. Introdugéo — S 8 ‘CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL Vol 4 = Fredie Didier. e Hermes Zaneti st 2. Conceito formal (estrutural) de direitos difusos, coletivos e individuais homogéneos ——— 66 1. Direitos ou “interesses"? Cs 22 Direltos difusos 23. Direitos coletivos stricto sensu 4 24, Direitos individuals homogéneos, 75 24.1. Generalidades TS 242. Direitos individuais homogéneos como direitos coletivos: vis6o critica da doutrina dos “direitos individuais coletivamente tratados” 80 243, O julgamento do RE n. 631.111/GO: nticleo de homogeneidade e mar- gem de heterogeneidade 82 3, Titularidade dos direitos coletivos lato sensu: direitos subjetivos COletivoS, ———-w———- 83 4. Critérios para a identificaglo do direlto objeto da a¢80 COletiVa. amen BF 5. Dos direitos coletivos aos conflitos coletivos: a adequagéo do processo coletivo as peculiaridades to caso levado a julgamento. A proposta de Edilson Vitorelli 7 5.1, IntrodUgb0. ae 87 5.2. Litigios cpletivos de difusso global 89 53. Utigios coletivos de difusto local 90 5.4. Litigios coletivos de difusSo irradiada 1 55. CumulacSo de litigios de difusao irradiada com litigios globais e locais 4 56. Concluséo 6 6. Instrumentos pare a tutela das situacbes juridicas coletivas no direito brasileiro: 2 a¢50 Coletiva e 0 julgamento de casos/questies tepetitivos: aan 97 7. Situagdes juridicas coletivas passivas 102 — Capitulo 3 » Normas fundamentais da tutela jurisdicional coletiva 103 1. Considera¢o introdutéria 103 2. Principio do devido processo legal coletivo 104 2.1, Generalidades 108 22. Regra da adequadsa legitimacso 106 23, Adequada certiicagso da acSo coletiva 106 24, InformagSo e publicidade adequadas ean 109 24.1, Principio da adequada notificac3o dos membros do grupo. 242. Regra da informaséo aos érgaos competentes ned 25. Principio da competéncia adequada m 3. Principio da primazia do conhecimento do mérito do processo coletivo u3 4. Prineiplo da indisponibilidade da demanda coletiva. O problema da desisténcia da agéo coletiva n6 5, Postulado hermentutico do microssistema: aplicagSo integrada das les para a tutela coletiva (dialogo de fontes) M8 ¥ 0s ‘ NG Capitulo 4 > Compet neta SUMARIO 6 Reparacso integral do dano = 120 7. pripos dando tazatidade eatpiidade (méxima arpitude) do ao ¢ 6° Posy ete ——————— wi 7.1. Generalidades 121 processual para a tutela de 72. O mandado de seguranga coletivo como instrumento 1 direitos difusos Principio da predominancia de aspectos inqustorias no processo coletvo) ———~— 125 % Principio da primazin da decsbo de mt do process coetvo em reagso 8 deciso is de mérito do proceso individual, 131 11. Principio da competéncia adequada ——_—_——————} z senor territorial 1 _DistingSo entre competéncia funcional e competéncia territorial absolute ———— 22 ‘A competéncia para a agho chil piblica como hipstese de competéncia territorial absoluta 2. Acompettnce pare a ago civil publica ea regra de delegacéo de competéncia federal 20 julz estadual (art. 109, § 3°, CF/B8),— a 133 135 24 Competéncia quando 0 dano ou © Hicito for nacional ee 196 25, Competéncia quando o dano ou 0 licito for regional, — $$$ 140 2 26. Competéncia quando 0 dano ou o llicito for @StaD Ua ne 145 Competéncia para a ago de improbidade administrative ——————————~ 145 = 51, Ainconstitucionalidade da Lei n® 10.628/2002 (prerrogativa de fungéo) ———— 145 3.2. Competéncia para julgamento dos agentes politicos (crime de responsabllidade e bis in idem) $< $$$ $< $F 33. LimitagSo da decisfo do juiz de primeiro grau nas acbes de Improbidade: es dade $< —$—$—<— <_< 49 ‘A. Outras hipéteses de compettncia da Justica Federal para processar e Julgar aco CON cn 150 5. Competéncia do STF para as acbes coletivas que envolvar confltos entre estados ou entre esses e a Uni8o (art. 102, |", CF/88) 150 6. Casos extraordingrios de competéncia originéria do STF para ulgar a acko popular 152 7. Competéncia para julgamento de aco chil publica sobre poluigéo visual por propa ganda politica: Justia eleltoral ou justica comum? ———————_——______. 153 & Competéncia internacional? Litigios transnacionals, transfronteiricos e cooperacso intermacional em acbes coletivas 154 Capitulo 5 ® Conexdo e litispendéncia entre acées coletivas _____._ 159 1. Conexio 159 1.1. Consideracdes gerais sobre a conex5o 159 VET a) a 1 2 3. 4 5. 6 1.2. A conexdoe » prevengSo na tutelajurisditonal coletiV 1.3. CooperachoJursiciona nacional e conexdo probatri (at 69, CPC). ———- 164 1A. ConexBo apés 0 julgamento de uma das acbes colethas: art. 55, $18, CPC n 235 d 164 espn 2. Consideragbes gerals sobre a Itispend&nle ae 2p Contato 6 > Legitimagéo ad causam nas agées coletivas Caracteristicas da legitimacéo coletva 10 (CURSO DE DIRETTO PROCESSUAL CMIL-Vol 4 = FreceDider t. @ Hermes Zonet 162 simula do ST) e a distingSo feta no CC 144 922/MG, ee 165 165 22. Litspendénca entre demandas coletvas, ————_——————————— 22.1, Generalidades Itspendéncia entre demandes coletivas propostas Por leghtimados dversos 16 1222. Efeto da itispandtncla entre derandascoletvas com partes distntas —~ 167 169 223. Identidade da situagdo jridica substancial deduzids, —————————— 224, Liispendénca entre as demandas coletivas que tramitam sob proced- rmentos dlversos. ———- 225, Hilitspendénela entre uma acto coletiv que versa sobre dretos fur ec cut que vers sobre dees individuals homogéneos? —————— 172 m4 174 wm felagb entre a acho coletiva e 2 2¢80 india) 3:1. AagSo coletive nfo induz tspendéncia par a arto individual ————————— 3.2. 0 pedido de suspensio do processo individual AciniaInequvoce da extend Sr eecess coletvo eo bus do demandado denfomaro autor individual —~ 174 413, Aesistncia do mandado de segurangsIndidual em razio do penclncia do arr ado de segurancacoletivo. A. 22 § 1, da tein. 1201672008. Possivelinconsttur Sei dade Apele 90 mirositeM mI SA. Hbcontindnca entre aciocoetiva e apo indvidual?), ———————————— 179 35. 0 dreto 8 autoexclsio (ight to opt out) no micossstembrasiero de tuela coletiva 4.6. Possbldade de suspensio do procesto ndvidual ndependentements de reset, ss da parte. Oulgamento do REspn1.110545/RS (recurso especial epetve) eo PC 447. ComuicasBo da esta de procests repetitive ov outro fato qué poss certjo wo sjulzamento de aro coletiva (rt. 7* da Lein. 7347/1985 eat 139,% do Pq) 180 182 186 189 189 Naturerajria da legtimagb COE Leitmagéo exraorinsacoletiva decent de negéclo process: mposibiide 6 problema do nteresse do substitute, nn 18 controle usdconal d legtimagfo CO} a 20 61, Genera a5 mn 200 ‘SUMARIO un 6.2. Notas sobre o controle da “representaglo adequada’ no direito estrangeiro ———— 204 63. LegitimacSo adequada nos Iitigios de difuséo global, local ou irradiada: a tenso_ entre egitimagéo e participacso. A contribuicSo de Edilson Vitorel 207 (644. Sintese COMIUSIA, ae 2 7. Consequéncia da falta de legitimag0 ColetVe ativan 212 1B Legitimidade ative das defensotias PUDICAS Intervencao de terceiros 21 1. Assistencia 21 1.1. Premissa geral para o exame do interesse juridico que justifica a intervencS0 como assistente ot 112. Causas que versam sobre direitos dfusos e coletivos stricto sensu 233 12.1. Intervengio do individuo 23 1.22. IntervengBo de um colegitimado 234 1.23. Intervengéo do individuo legitimado & proposttura de aco popular —.. 234 1.3. Assisténcia nas causas que versem sobre direitos Individuais homogéneos (art. 94 do Cédigo de Defesa do Consumidor) 26 1.4, Assisténcla na agéo popular 238 2. Intervencéo de amicus curiae em agbes coletivas 240 3. Intervenco mével da pessoa juridica interessada na aco popular e na ago de im probidade administrativa (despolarizac3o da demanda) 2a 3.1. Generalidades 2 3.2. Intervencéo mével da pessoa juridica de direito privado e a Lei n. 12.846/2013 — 244 4, A denunclagSo da lide em aco civil publica 4.1. Generalidades 245 245 42. Adenunciacéo da lide e o chamamento ao proceso nas causas coletivas de consu- mo 247 5. IntervencSo de legitimado extraordinério para a defesa de direltos coletivos (lato. sensu) como assistente simples em processo individual 50 2 CURSO DE DARE PROCESSUAL CMIL-Vol A ~ Freie Derk. € Hermes Zant + IRDA © Recuaes SN? \ capitulo 8 > Inquérito civil 28s 1. Nogbes gerals. A reconfiguracéo do inquérito civil no sistema multiportas de acesso & justi — 28 2. Inquétrito civil e inquérite polictal, nm 256 3, Efeltos do inqueérto Civ nm 257 4. Discussbes em torno do possivel objeto do inquérito civil. O problema do inquérito CGivilem matéria eleitoraL, e260 55. Principio do Comtradlt6 150. mm 262 6. Principio da publicidade © inquérito Cl) nnn 266 7. Inquérito civil e produgSo antecipada de Prova amen 270 71. Generalidades: = 270 72. OCPCea antecipacso de prova no urgente (art. 381 a 384, CPC-2015). A produséo de prova para futura aco coletiva independentemente da instauracso do inquérito vl 2d 7.3. Simultaneidade de procedimentos investigatérios pare apurar o mesmo fato (inqué- ito penal e civel) e prova emprestada 273 & Principio da duracso razodvel 274 9. Instauragao 274 10. Representacéo annima: possibilidade 2 11, Inquérito civil e compromisso de ajustamento de conduta 278 12. Arquivamento- 279 13. Reabertura do inquérito e reapreciacéo de provas 284 14. O inquérito civil e 0s crimes relacionados: falso testemiunho, delxar de prestar infor- . maces e denunciacéo caluniosa 285 15, Recomendag6es e ombudsman (defensor del pueblo) 288 16. Cadastro nacional das acbes coletivas, inquéritos civis e compromissos de ajustamen- to de conduta 22 Capitulo 9 » Prescric&o e decadéncia das situacées juridicas coletivas _ 295 1. Generalidades 25 2. Classificagéo dos direitos: direitos-prestacéo, direitos-poder (direltos potestativos) e direitos-dever 27 3. Atese da imprescrtibilidade das acées coletivas 299 4, Regras expressas sobre prescricao e decadéncia na tutela coletiva 300 5.. Prescricao e aco coletiva para a tutela de direitos individuals homogéneos. O julga- mento do REsp. n. 1.070.896/SC pelo Superior Tribunal de Justica 304 6. Prazo quinquenal para as execucSes decorrentes de acdes coletivas 307 7. Adiscusséo sobre a imprescritibiidade da pretensio de ressarcimento 20 erdtio 308 8. Inicio da fluéncia, impedimento, suspensSo e interrupeto, AplicacSo subsidlérta do CDC 310 SUMARIO B 9. A propositura de uma ago coletiva interrompe o prazo prescricional para a a¢50 individual? a6 10. Discusséo sobre a legitimidade e 0 inicio do i 5 cu prazo prescricional para a execucso individual fundada em sentenca coletiva naan a NS —t-Capitulo 10 & Autocomposicao nos direitos coletivos (justica multiportas e tutela adequada em litigios complexos) —— 321 1. Generalidades. Justica multiportas (multi-door justice) como justiga adequada, ———— 321 2 Da alternatividade 8 adequago, ———————_———— 323 3. Da possibilidade de transago nos processos coletivos e da impossibllidade de rentin- ia a0 direito em que se funda a a¢30 CO8tIVa, meee 3 4. O compromisso de ajustamento de conduta: extrajudicial e judicial 325 41. Generalidades: ste 35 42. 619805 publicos legitimados: Ministério Publico, Defensoria Publica, Advocacia Publica (legitimados para o compromisso extrajudicial ou judicial) e os demals cole- sitimados (legitimados para o compromisso judicial) —_——_————————— 329 43. Aconcreco de direttos e deveres a partir dos compromissos de ajustamento de (Ch n 380 44. Autilizagdo da produgéo antecipada de provas como instrumento que estimula 2 ‘BUtOCOMPOSIGEO mem 82 '5, Audiéncia preliminar de mediagSo ou conciiagSo (art. 334, CPC) mn 332 6. Negécios jurdicos processuals COetHOS am 88H 7. Aautocomposicso em agio de improbidade administrative 335 7.1. Arevogacho do art. 17, § 18, Lei n. 8429/1992. A necesséria interpretagao historica, ‘A colaboracio premiada e 0 acordo de leniéncia como negécios juridicos processu ais atipicos no processo de improbidade administrative 335+ 7.2. Kautocomposicéo e © pedido de ressarcimento ao erério 338 8, Controle da autocomposigSo pelo uiz. O dever de controle do mérito do acordo e da JegltirmaG&io 2. ka 339 9, Limites & autocomposigso nos processos coletivos 32 10. Outras ponderagbes contra 0 acordo judicial: iscalizacso do desequilbrio econdmico fe de informacbes entre aS parteS, 343 11, O principio da primazia do julgamento de merit, tutela integral do direto, disparida Ge economica e a necessidade de producéo de prova adequada para a conclliacbo ou mediaco: coisa julgada rebus sic stantibus ou 12 Apossibllidade de Impugnacso pelos colegtimados por melo do recurso de terceiro Interessado e outras agbes de impugnagso autonomas M5 Capitulo 11. > Aspectos gerais do processo coletivo ory 1. Opedide na acéo coletiva oy 1.1. Interpretacso do pedido 349 14. ‘CURSO DE DIRETTO PROCESSUAL CIVIL: Vol.4 ~ Fredie Didert. e Hermes Zane. 1.2. O pedido de indenizagéo por dano moral coletivo 1.3. Agbes coletivas e o controle de constitucionalidade 1.4. Ago coletiva em matéria tributéria 1.5. Aco civil publica em matéria previdenciéria, —. 1.6. AgBo civil piiblica ern rmatéria de FGTS wa 2. Abandomo erm ages CONES am 3. Desistémcia em ages COVtiAS ame 4. Areconvencéo 5. A distribuic&o dindmica do 6nUS a, prOVS amen 6. Audigncia publica nc 7. Audiéncia publica extrajudicial e Ministétio PEIICO nana 8. Tutela proviséria nos processos COlStiVS 81. Gemeralicea des: ene nnn et 82. Tutela de evidéncia cautelar no processo de improbidade administrative: 8 indispo- nibilidade dos bens prevista no art. 7° da Lei n. 8429/1992, vw 9. Litigdncia de mé-fé e despesas process UBS em 19.1. Regime juridico geral de adiantamento de custas processuals € pagamento de honorérios advocaticios de sucumbéncia nas acées coletivas 9.2. Outros possiveis condenados em razéo da litigancia de mé-fé 93. Condenacéo do ministétio publico: responsabilidade da fazenda publica —————- 9.4. Arts. 17 ¢ 18 da Lei n. 7347/1985 10. AatuacSo do Ministério Puiblico nas agdes coletivas 10.1. Litisconsércio entre Ministérios PUblicos eo problema da competéncia 10.2. A questo do enunciado n. 489 da sumula ST) —— 1103. IntervengSo como fiscal da Order JU am 104, Ministério Piblico e os direitos individuais homogéneos: fungo promocional dos relevantes interesseS SOCIQS meme 10.5: Ministerio Pblico e o seguro decorrente do DPVAT: cancelamento do enunciado n- yO da stimula GO ST. 1046. Ministério pblicoe protegB0 20 810) nm 410.7, Ministério publico como parte e 8 prerrogativa funcional da reserva de‘assentod direita do 6rgo jurisdicional” (Art. 41, XL, Lei n. 8625/1993), earn W Dace, eS AT tA en 12.3, Reemessa CESS ee 12.3.1 Generalidades —— 12.3.2. Remessa necessérla e improbidade administrativa ——— 350 353 355 358 359 361 365 365 369 372 372 377 381 381 383 386 388 394 397 399 as a5 a6 a7 SUMARIO 6 124. Agravo de instrumento na acdo de improbidade administrativa ____. 420 12.5; Agravo de instrumento na aco popular ———_________________ 421 Ap Capitulo 12 > Coisa julgada 423 1. Nogbes gerals sobre o regime juridico da coisa julaada 423 2. Regime juridico da coisa julgada coletiva a5 21, Nota introdutéria ga 22. Coise julgada coletiva nas agdes que versam sobre direitos difusos ou coletivos — 426 23. Coisa julgads coletiva nas agbes que versam sobre direitos individuals homogéneos — 429 3. Repercussio da coisa julgada coletiva no plano individual (§§ 2° e 3° do art. 103 do ag ——— 80 4. Alguns posicionamentos doutrinérios criticos & extens8o da coisa julgada 20 plano individual secundum eventumm Its, a_——_—_—_—___—_—_—_——————————————— 434 5, Transporte in utiibus da colsa julgada penal coletiva pare a esfere coletiva e individu- al fart. 1032, § 42% CDC) x 8 6. Coisa julgads na acSo de improbidade administrative 437 7. Coisa julgada no mandado de seguranca coletivo ———______________. 439 8 Coisa julgada coletiva e os diversos procedimentos para a tutela coletiva aa 9, Art. 16 da Lei ne 7.347/1985 e o art. 2° da Lei n° 9494/1997: 05 limites territoriais & “coisa julgada’. O posicionamento do Superior Tribunal de Justica. an 10. Ainda sobre a questéo: 0 EREsp n° 1.134.957/SP do STH: precedente da Corte Especial {que exclui os limites territoriais da colsa julgada no proceso coletivo 452 yy —bd~ Gapftulo 13 > LiquidacSo e execucdo da sentenca 455, 1. Aliquidacao da sentenca coletiva 455 1.1. Concelto de liquidagso 455 41.2. Processo de liquidago, fase de liquidacao e liquidagéo incidental 457 12.1. A fase de liquidacSo (ou liquidagéo-fase) 457 1.22. O-processo de liquidago 459 1.23. AliquidacSo incidental (ou liquidacSo-incidente) 459 ADA, Sites 61 1.3. AliquidagSo da sentenga genérica proferida em processo em que se discutem direitos individuais homogéneos. Liquidago individual por legitimagso ordinéria e {iquidagéo coletiva por substituicso processual (legitimacso extreordinéria). 461 1.4, Liquidagdo de sentenca proferida em processo coletivo em que se discutem direltos difusos ou coletivos em sentido estrito (prestagbes pecuniérias) 463 VAS. ATES POCO nM 463 466 "95.1. Gerveralilades, 1.5.2. Alternativas atipicas a fluid recovery do art, 100. do CDC, —we————— 16 ‘CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIMIL-Vol.4 - Fredie Didier. € Hermes Zoneti Jr 2 Bxecugio da sentenga no processo COIEtVO, meme 21. Generalidades: $< $< —————— 22. 0 Fundo de defesa dos direltos difusos (FD, art. 13 da Lei n® 7.347/1985) ———— 23. A execugio da sentenga genérica na aco coletiva sobre direitos individuals homo- {géneos. O problema da legitimidade V3, ana 2.4. ExecugSo fundada em sentenca penal coletiva condenatéria 25. ExecusSo coletiva fundada em titulo extrajudicial. O paradigma da execucso das decises GO CADE a 2.6. ExecugSo de deciso que determina a implantacao de politica publica. A possibilida- de de uma execugo negociada 2.7, Regime juridico das despesas processuals na execugso coletiva 2.8, ExecugSo de sentenca coletiva no impugnada pela Fazenda Publica e honorarios advocaticios de sucumbéncia (stimula do STJ, n. 345, € o art. 85, § 7°, do CPC) — 3. Competéncia para a liquidacio e execucSo coletivas Capitulo 14 ® Processo coletivo passivo 1. Nota introdutéria 2 Conceito e classificagao das acdes coletivas passivas, As situacoes juridicas passives coletivas: deveres e estados de sujeicao difusos, coletivos e individuals homogéneos — 3. Exemplos de agées coletivas passivas 4. Aplicacdo subsidiéria das regras do processo coletivo ativo 5. Coisa julgada no processo coletivo passivo 5.1. Considerago geral 52. Coisa julgada nas ages coletivas passivas propostas contra d oe leveres ou estac sujei¢do difusos ou coletivos stricto sensu oneness 53. Coisa julgada nas ages coletivas passivas propostas indivi Celso ulgade propostas contra deveres individuals MOYEN COS a & ConsiderasSofinal Bibliografia i ee 468 468 47 474 479 8@ 88 8 491 91 s 491 495 B28 828 5 CAPITULO 1 Introducdo ao Estudo do Processo Coletivo Sumario - 1. Conceito de processo coletivo, acSo coletiva e tutela jurisdicional coletiva - 2.0 processo coletivo como espécie de ‘processo de interesse public" (public law tigation}: Interesse pablico primério e interesse puiblico secundério ‘no controle jurisdicional de politicas poblicas: 2.1. Generalidades; 22. Modelo experimentalista de reparaco e medidas estruturantes (structural injunctions e specific performance’; 2.3. Interesse publico primério e interesse publico secur dario; 2.4. A implementacéo e controle de politicas piblicas por parte do Poder Judiciério (judicial activism, judicial restraint e ativismo Judicial seletivo): ativismo da lei e da Constituicio em matéria de politicas puiblicas no Brasil 25. Para além da “politizagéo da justica" em uma democracia de direitos: & guisa de conclusso parcial ~ 3. O microssistema processual coletivo, o papel do Cédigo de Defesa do Consumidor e 0 dislogo das fontes com 0 cpc-2015 (ere da recodificagso): 3.1. Generalidades; 32. 0 CDC como um “Cédigo de Processo Coletivo Brasilel- 107,33. O microssistema do processo coletivo ~ 4. Legislagso e procedimentos relacionados & tutela coletiva: procedimento comum das causas coletivas (Art. 21 da LACP e art. 90 do CDC). 4. CONCEITO DE PROCESSO COLETIVO, ACAO COLETIVA E TUTELA . JURISDICIONAL COLETIVA Qualquer teoria pressupde um conceito primario’, do qual todos os demais sao satélites. O conceito primario do estudo sobre 0 processo coletivo 6, obvia- mente, 0 conceito de processo coletivo. A definicao deste conceito serve a clareza do raciocinio a ser desenvolvido. 0 processo é coletivo se a relacao juridica litigiosa (a que é objeto do processo) é coletiva. Uma relagdo juridica é coletiva se em um de seus termos, como sujeito ativo ou passivo, encontra-se um grupo (comunidade, categoria, classe etc.; designa-se qualquer um deles pelo género grupo) e, se no outro termo, a relacdo juridica litigiosa envolver direito (situacao juridica ativa) ou dever ou estado de sujeicao (situag6es juridicas passivas) de um determinado grupo. Assim, presentes 0 grupo e a situacdo juridica VILANOVA, Loutival. “Sobre o concelto do Direito’ Excrtos juridicos e filosdficos. Brasil: Axis Mundi IBET, 2003, v. 1, p. 10; DIDIER Jr, Fredie. Sobre a Teoria Geral do Processo, essa desconhecida. 3° ed Salvador: Editora JusPodivm, 2013, p. 75 € segs. 32 ‘CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CMIL-Vol.4 - Fred Didier Jr. @ Hermes Zonetist. Assim, processo coletivo é aquele em que se postula um direito coletivo lato sensu (situacao juridica tiva ativa)? ou que se afirme a existéncia de uma situa¢ao juridica coletiva passiva (deveres individuais homogéneos, p.ex,} de titularidade de um grupo de pessoas. Observe-se, ento, que o nticleo do conceito de processo coletivo esta em seu objeto litigioso e na tutela do grupo: coletivo é o processo que tem por objeto litigioso uma situagao juridica coletiva ativa ou passiva de titularidade de um grupo de pessoas. Essa definigdo se distingue da proposta por Antonio Gidi, “Segundo pensamos, ago coletiva é a proposta por um legitimado auténomo (legi- timidade), em defesa de um direito coletivamente considerado (objeto), cuja imutabilidade do comando da sentenca atingiré uma comunidade ou coletividade (coisa julgada). Af est4, em breves linhas, esbocada a nossa definicao de aco coletiva. Consideramos elementos indispensdveis para a caracterizagao de uma ago como coletiva a legitimidade para agir, o objeto do processo e a coisa julgada’* Nao parece correto p6r, na definicao de processo coletivo, as circuns- tancias de ser instaurado por um legitimado autonomo e de ter um especial regime de coisa julgada. Em primeiro lugar, a legitimidade extraordinaria nao é uma exclu- sividade dos processos coletivos - no , enfim, uma sua especificidade. Basta lembrar os casos de legitimacao extraordinaria individual existentes em todos os ordenamentos juridicos; vg., no ordenamento brasileiro, a legitimagao extraordindria: a) do Ministério Publico para promover acao de alimentos para incapaz; b) da administradora de consércio para cobrar valor mensal do consorciado; c) do terceiro que pode impetrar mandado de seguranga em favor de outra pessoa, nos termos do art. 3° da Lei n. 12.016/2009 etc. Além disso, é possivel cogitar, ao menos no direito brasileiro, umaacao coletiva ajuizada pela propria comunidade envolvida: a aco coletiva pro- posta pelas comunidades indfgenas: art. 37 da Lei Federal n® 6.001/1973 (Estatuto do Indio): “Os grupos tribais ou comunidades ind{genas sio partes legftimas para a defesa dos seus direitos em juizo, cabendo-lhes, no 2 Direltos fuses, dretos coletivos em sentido esttto € direitos individuals homogéneos, no caso do ‘ireto brasileiro (ar. 81 do Codigo de Defesa do Consumidon). 3. Sobre 0 procesto coletvo passivo, ver capitulo préprio neste volume do Curso. 4. GID, Antonio, Colsajulgada e itspendéncia em arbes coetives. Sho Paulo: Saraiva, 1995, p. 16. Regis- tre-se que seguimos substanciaimente, com pequena diferenca, © concelto de Gid até a & ed. deste volume do Curso, Cap. « INTRODUCAO AO ESTUDO DO PROCESSO COLETIVO 33 caso, a assisténcia do Ministério Publico Federal ou do érgao de protecao ao indio”, Nestes casos a legitimacao é ordindria. Também o regime da coisa julgada nao é uma especificidade do proces- so coletivo. Dizer que a coisa julgada vincularé a coletividade, em processo coletivo, nao acrescenta nada ao conceito, j4 que, sendo a situacao juridica litigiosa pertencente a coletividade, obviamente eventual coisa julgada a ela diré respeito. 0 préprio julgamento de casos repetitivos (art. 928, CPC) é incidente que serve A tutela coletiva e no produz coisa julgada, como se vera no capitulo sobre as situagGes juridicas coletivas, nesse volume do Curso. Além disso, nada impede que o legislador crie uma disciplina de coisa julgada coletiva que, em certos casos, néo vincule a coletividade - por exemplo, a coisa julgada penal somente ocorre nos casos de sentenca absolutéria, ou ainda, o regime da extensdo dos efeitos da coisa julgada_ secundum eventum litis apenas para beneficiar os titulares dos direitos _ “individuais, disciplinado no Cédigo de Defesa do Consumidor (art. 103 da Lei n? 8,078/1990). Legitimidade, competéncia e coisa julgada coletivas nao compéem o conceito de processo coletivo. Todas elas poderao receber disciplina juri- dica prépria, peculiar em relagao ao processo individual, mas nao é isso que torna coletivo um processo. O exame de cada uma delas é importante para identificar como se estrutura 0 processo coletivo em determinado pafs, mas nao para identificar o que é um proceso coletivo, £ certo que apés a definico do processo coletivo sera necessério definir um regime de garantias processuais adequadas ao objeto nele definido, assim como sao previstas garantias para os processos jurisdi- cionais individuais, mas esse 6 um momento seguinte, que nao interfere no conceito definido. Alias, a importancia da distingao é exatamente esta, isolar os objetos permite perceber as diferencas no arco de seu desenvol- vimento tedrico. 0 proceso coletivo brasileiro, por exemplo, tem suas préprias carac- teristicas - varidveis, pois decorrentes de regras jurfdicas que podem ser alteradas. Essas caracteristicas compdem o devido processo legal coletivo brasileiro; compéem, enfim, o perfil dogmatico do processo coletivo no Brasil. So elas: a) a legitimagdo para agir, normalmente atribuida a um legitimado extraordindrio ope legis; b) o regime da coisa julgada coletiva, que permite a extenso in utilibus para as situacées juridicas individuais; CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL: Vol.4 ~ FredieDidierJ. e Hermes Zaneti c) a caracterizacdo da litigacao de interesse publico, que ¢ requisito para o Prosseguimento de um processo coletivo, flexibiliza o procedimento a favor aa tutela de mérito e determina a interven¢ao obrigatéria do Ministério Puiblico como fiscal do ordenamento juridico em todas as ages. Todas sao caracteristicas contingenciais do processo coletivo brasileiro - nao compéem, porém, o conceito de processo coletivo. Note que, alterada regra sobre legitimidade (permitindo a legitimagao ordinaria coletiva, como no caso das comunidades indigenas, ou criando uma regra aberta, como no direito estadunidense) ou sobre a coisa jul- gada (estendendo a coisa julgada também para prejudicar os individuos membros do grupo, como acontece nas aces eleitorais no Brasil), nao se altera o conceito de processo coletivo: altera-se, apenas, a sua estrutura dogmatica. Alteragées deste tipo, no entanto, devem ser feitas:com muita cautela, sobretudo porque tocam em pontos sensiveis, relacionados ao contraditério e ao devido processo legal. Conceituado processo coletivo, chega-se mais facilmente ao conceito de aco e tutela jurisdicional coletiva. jletiva &, pois, a demanda que da origem a um processo coletivo, afirme a existéncia de uma situagao juridica coletiva ativa ou ida para a tutela de grupo de pessoas, al coletiva é a protecao que se confere auma situacdo_ juridica coletiva ativa (direitos coletivos lato sensu de um grupo de pessoas)_ efetivacdo de situagbes juridicas (individuais ou coletivas) em face de uma coletividade (grupo), que seja titular de uma situapdo juridica coletiva passiva (deveres ou estados de sujei¢do coletivos). ‘A conceituacao correta de um objeto nao € tarefa de somenos. O primeiro ato de qualquer abordagem cientifica do Direito é identificar 0 que se est investigando. Se se pretender, por exemplo, fazer um estudo de direito comparado entre os sistemas de protecao aos direitos coletivos, nos mais diversos paises, antes de tudo é preciso definir o que se entende por processo coletivo, para, em seguida, iniciar a compara¢ao. A identificacao precisa do que seja processo coletivo serve, ainda, para evitar um equivoco comum: confundir agao civil publica com agao coletiva. Aco civil publica é um exemplo, uma espécie, de a¢ao coletiva. HA diversos procedimentos para a tutela coletiva; o procedimento da acao civil pablica é apenas um deles. Gap. 1» INTRODUGAO AO ESTUDO DO PROCESSO COLETIVO. 35 Ha outros procedimentos especialmente criados para servir as causas coletivas: a aco popularS (Lei n? 4717/1965 e art. 52, inc. LXXIIN), a aco civil publica, o mandado de seguranga coletivo (art. 52, inc. LXX, da CF/88) e as agdes coletivas para defesa de direitos individuais homogéneos (arts. 91 a 100 do CDC), a aco de improbidade administrativa (Lei n? 8.429/1992) etc. Também existe tutela coletiva no ambito eleitoral: a a¢ao de impug- nag&o de mandato eletivo é, sobretudo, uma ago coletiva.$ Os diss{dios coletivos trabalhistas também sao exemplos de aco coletiva. Para uma determinada concepcdo, a acao penal condenatéria é, tam- bém, substancialmente, uma aco coletiva, evidentemente aqui a confusao & parecida com aquela que ocorre no controle de constitucionalidade concentrado, toma-se o interesse piiblico na aplicagao da lei penal, como se fosse um direito difuso. E um equ{voco tanto do ponto de vista teérico, quanto do ponto de vista histérico. Nao h4 um direito subjetivo coletivo a pena por parte do cidadao, evidentemente a antiga “pretensdo punitiva” estatal nao se constitui em posicao juridica coletiva, em direito difuso. Mas é possfvel, contudo, pensar em outros exemplos de agées penais de conte- tido coletivo, como, vg., © habeas corpus coletivo. Também é possfvel uma visio diferente, reservando um espaco privilegiado de discusso para bens juridicos novos, que se identificam com os direitos coletivos defendidos pelos autores deste texto, o meio ambiente, o direito econdmico, o direito do consumidor, a ordem urbanistica etc. Para esses bens, teria surgido um direito penal supraindividual, no qual se verifica que a tutela desses bens juridicos coletivos, surgidos com mais forca apés a Constituicao de 1988 - bens ligados muitas vezes a uma macrocriminalidade - se da de forma especial, diferente da tutela do “direito penal basico’, “restrito a tipificacao de condutas atentatérias contra a vida, a sate, a liberdade e a proprie- dade (denominado também de Direito Penal nuclear) (...)””, inclusive com a possibilidade de aco coletiva ex delicto para tutelar a responsabilidade civil decorrentes do ato ilfcito. 5. Sobre a defese de direltos dfusos pela acho popular, ver MOREIRA, José Carlos Barbosa. “A acko po- ppular do direlto brasileiro como instrumento de tutela jurisdicional dos chamados interesses difusos" In: Temas de direito processual civil. Sbo Paulo: Saraiva, 1977, p. 110-123. ¥ ‘6 CHEIM JORGE, Pivio; ABELHA RODRIGUES, Marcelo “A limbagdo 8 utitzagso do Inquéstto cl no diet eleltora a inconstitucionalidade do art. 105-A da Le 9504/1997" Revista de Processo,v. 235, 2014, p. 13-20, FISCHER, Douglas. Delinguéncia econémica e estado social e democrético de diretta: uma teoria @ luz 4a consttuigdo. Porto Alegre: Verbo Juridico, 2006. No mesmo sentida: SILVEIRA, Renato de Mello Jorge Silveira ‘Direito Penal Supra-individuat’. Séo Paulo: Revista dos Tribunals, 2003. Note-se que © 2 36 (CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL- VoL 4 ~ Free Didier. e Hermes Zane 2. O PROCESSO COLETIVO COMO ESPECIE DE “PROCESSO DE INTE- RESSE PUBLICO” (PUBLIC LAW LITIGATION): INTERESSE PUBLICO PRIMARIO E INTERESSE PUBLICO SECUNDARIO NO CONTROLE JU- RISDICIONAL DE POLITICAS PUBLICAS 2.1, Generalidades Na “nossa tradig&o juridica atual o processo é um vefculo para ajus- tar disputas entre partes privadas a respeito de direitos privados’,® com essas palavras Abram Chayes, professor da Universidade de Harvard, inicia o desenho de um novo modelo de litigaco:* a litigacao de interesse piblico (public law litigation), Adotaremos aqui a sigla LIP (litigacao de interesse puiblico)..° Os processos coletivos servem A “litigaco de interesse ptiblico” (LIP); ou seja, servem as demandas judiciais que envolvam, para além dos interesses meramente individuais, aqueles referentes 4 preserva¢ao da harmonia e 4 realiza¢ao dos objetivos constitucionais da sociedade e da comunidade. Interesses de uma parcela da comunidade constitucio- nalmente reconhecida, a exemplo dos consumidores, do meio ambiente, do patriménio artistico, histérico e cultural, satide, educacdo, bem como, na defesa dos interesses dos necessitados e dos interesses minoritarios nas demandas individuais classics (nao os dos habituais polos dessas demandas, credor/devedor), como os das criancas e adolescentes, das pessoas institucionalizadas em hospitais e presidios, dos negros, dos indios, das mulheres, podem ser passiveis de serem veiculados como situagdes juridicas coletivas merecedoras de tutela através de acdes co- letivas que permitam a tutela molecular de todo o grupo. Fale-se em minorias, mas seria melhor deixar claro que essas minorias nao so quantitativas, nao ha interesses “minoritarios’, mas & CHAYES, Abram. “The role of the judge in public law litigation’. Harvard Law Review, vol. 89, n* 7, p. 1281-1316, may 1976. esp. p. 1282. A distingéo fundamental entre 0 modelo de compensagso de -danos (justiga reativa) ¢ injunctions (Justica proativa) remete 2 diferenca entre os tribunals de common Jaw e equity ocorrida na Inglaterra medieval até a primeira metade do século XX nos Estados Unidos da América do Norte, FISS, Owen; RESNIK, Judith. Adjudiction and its Alternatives: No Introduction to Procedure. Foundation Press, p. 26/32. Para uma critica ao modelo de litigacSo tradicional em relacso. 205 direltos coletivos, ver ainda, VIOLIN, Jordbo. Protagonismo judicidrio e proceso coletivo estrutural. ‘Salvador: JusPodivm, 2013. p. 50-55. 9. Utlizamos a expressio “litigacSo” sugerida por Salles, ou seja: “no mesmo sentido de tigation, termo ‘usual na doutrina norte-americana pare designar 0s confittos socials orientados no sentido de uma Solucto pelas normas ofcias, aclonando ou amescando acionas 0 aparelho estata’. (SALLES, Carios Alberto de. Processo civil de interesse puiblico, p. 54-55). 10, Utiliza essa terminologia 0 trabalho de NUNES, Dierle; TEIXEIRA, Lucimfla. Acesso @ democrdtica, Brasilia: Gazeta Juridica, 2013, p. 86 @ ss, eae (Gap, 1» INTRODUGAO AO ESTUDO DO PROCESSO COLETIVO 37 sim interesses e direitos “marginalizados”, j4 que muitas vezes estes esto representados em mimero de pessoas infinitamente superior aos interesses ditos “majoritérios” na sociedade, embora nao tenham voz, nem vez." Nao nos referimos, assim, ao carater eminentemente pubblico, aliés ineliminavel em seu cardter de fundo, do préprio Direito Processual Civil como instrumento de exercicio do poder estatal e pacificacao de conflitos, ou seja, ao seu contetido piiblico de retorno a sociedade de respostas estabilizadoras dos conflitos e ao seu cardter ptiblico na elaboragao formal das normas - ainda que mitigado pelo respeito ao autorregramento da vontade e & tutela adequada dos direitos pelo CPC. Queremos ir além: a defesa do interesse publico primério por meio de processos civeis, inclusive na atuacdo de controle e realizacéo de politicas publicas, permite falar aqui de uma expanso da tradicional judicial review brasileira voltada ao controle dos atos da administraao e da constitucionalidade das leis em casos individuais, para uma judicial review em defesa de direitos coletivos, permitindo o controle e a ade- qua¢ao dos atos da Administracao Publica e do Poder Legislativo a luz do direito material coletivo, tutelando todos os membros do grupo, de forma indistinta. A LIP nesses casos visa a medidas estruturantes (ver capitulo sobre aspectos gerais, item sobre decisdes estruturais), postu- ladas por meio de acées coletivas ou certificadas em compromissos de ajustamento de conduta (acordo coletivo celebrado por 6rgao publico legitimado tutela coletiva) que permitam coordenar as atividades pela intervencio dos érgéos de garantia (Ministério Piiblico e Poder Judicidrio) até a satisfacao integral da tutela do direito coletivo. Como afirmou a doutrina: “A questo é ainda mais grave no campo da tutela coletiva. Nesse tipo de proceso, pela peculiar interferéncia por ele gerada no ambito econémico, politico, social ou cultural, os pro- blemas [..] so amplificados. Basta pensar no quao complexo é decidir uma agio coletiva que pretende o fornecimento de medica¢4o a todo um grupo de pacientes, a construcao de escolas ou de hospitais, ou a eliminagao de certo cartel”. Este € 0 sentido ‘ample de tigacio de Interesse pablico bem identiicado por SALLES, Carlos Alberto de. "Processo civil de interesse piiblico’ In: SALES, Carlos Alberto de (org). Processo cle interesse pili: 0 processo como insrumento de defesa social. Sto Paulo: APMP/RT, 2003, p. 39-77. 12, CLARENHART, Sergio Cruz Decisbes estrutuals no dirlto processual cll brasileiro. Revista ce Processo, vol. 225, p. 389, 2013; VIOLIN, Protagonismo Judicldrio processo coletivo estrutual,p. 23, nBrertonle 38 ‘CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL-Vol.4 ~ Fredie DidierJr. e Hermes Zaneti.t. 2.2, Modelo experimentalista de reparagéo e medidas estruturantes (structural injunctions e specific performance) A complexidade da matéria envolvida na implementagao e aplicacao de politicas publicas forca a migracao de um modelo meramente responsi- vo e repressivo do Poder Judici: modelo de atuacao posterior aos fatos j4 ocorridos para aplica¢ao da norma jurfdica; para um modelo resolutivo e Participativo, que pode anteceder aos fatos Jesivos e resultar na construgao conjunta de solucées juridicas adequadas. Essa mudanga est4 amplamente amparada pela 6tica do Processo Civil do Estado Democratico Constitucional adotada pelo CPC, a exemplo dos princfpios da solugao consensual, da primazia do julgamento do mérito, da boa-fé processual objetiva e da cooperacdo (arts. 32, 42, 5° e 6? do CPC), mas € ainda mais necessaria para solucdo dos problemas surgidos em razio da sindicabilidade judicial de politicas publicas por meio de acdes coletivas. A partir dai comecaram a surgir na doutrina discussdes sobre 0 modelo experimentalista de repara¢éo, através do qual o juiz abre mao da centralidade no processo, reconhecendo a complexidade do problema da escolha das medidas necessarias, trazendo para 0 processo aampla partici pacao de todos os envolvidos, inclusive a sociedade civil, para delimitagao de um programa de resolugao do conflito. Assim, sao tomadas decisGes mais flexiveis e provisérias, com inclusdo dos envolvidos na supervisao das medidas adotadas, com a possibilidade de continuas revisées para adequacdo dessas medidas aos problemas surgidos ao longo de sua implementacao, iniciando-se por decisdes estru- turantes (organizativas) que estabelecam metas, objetivos e parametros de controle do cumprimento e da efetividade das medidas judiciais adotadas.? Audiéncias publicas (arts. 927, § 2%, 983, § 12, 1.038, II, CPC-2015) ea intervengao de amicus curiae (art. 138, CPC-2015) so naturais na adocao desta nova forma de decidir questées complexas, Aprdpria nogao de execugao muda, passando a ser exigida a execuglo civil desdobrada no tempo, a execucao das chamadas “medidas judiciais estruturantes’."* Essas medidas sao voltadas para a tutela especifica das 13, NUNES; TEIXEIRA, Acesso a justica democrdtico, p. 94/96, Confertr ainda, citados pelos autores, SABEL, ‘Charles Fs SIMON, Wiliam H. ‘Destabilization Rights: How Public Law Litigation Suceeds". Harvard Law Review, v.17, p. 1016/1095, 2004; BERGALLO, Paola. Justice and Experimentalism: Judicial Remedies in Public Law Litigation in Argentina. SELA (Seminario en Latinoamérica de Teoria Constitucional y Politica) Papers, Paper 44. Disponivel em httpJ//digitalcommons Jawyale.edu/yis_sela/44, 14.46 existern no Brasil alguns interessantes trabalhos sobre o tema, cf. ARENHART, Sergio Cruz. Decisbes estruturais no direto processual civil brasilelro. Revista de Processo, vol. 225, p. 389, 2013; JOBIM, Cap. 1 + INTRODUCAO AO ESTUDO DO PROCESO COLETIVO 39 rédito em_ai “Trata-se de medidas dé performance especifica (specific performance) em decisées com carater estruturante (structural injunctions), adotando-se, na espécie, um modelo muito parecido com o modelo de execugao do common law, voltado para a adequacao da medida executiva as necessidades praticas de efetivacao."*A nocao experimentalis- ta e as medidas estruturantes permitem a um s6 tempo 0 conhecimento _colaborativo do problema pelas partes e pelo juiz z (colaborative learning) “é uma maior responsabilizaco e legitimacio democratica (democratic accountability), visando & efetividade da decisao judicial.” As decisées estruturantes foram analisadas em item especifico deste Curso, no capitulo sobre os aspectos gerais do processo coletivo. 2.3. Interesse publico primario e interesse publico secundario H4 uma disting&o doutrinéria importante para compreender a exten- s&0 ea intenco do termo “interesse piblico”. Como ficoubem marcado pela melhor doutrina de direito administrativo, interesse puiblico verdadeiro é 0 interesse primério, de acordo com o qual deverao atuar sempre os érgaos do Poder Executivo, Legislativo e Judiciario. 0 interesse ptblico secundério, representado nos interesses ime- diatos da administracdo ptiblica, jamais pode desenvolver-se fora deste quadro estrito de consonancia com o interesse publico primério, que confere legitimidade e fundamento constitutivo aos atos do Poder Publico. Na doutrina, transcrevendo a leitura de Renato Alessi (Sistema Istituzio- nale del Diritto Amnistrativo Italiano) assevera Celso Ant6nio Bandeira de Melo: “o interesse coletivo prim4rio ou simplesmente interesse ptiblico é 0 complexo de interesses coletivos prevalente na sociedade, ao passo que o interesse secundério & composto pelos interesses que a Adminis- traco poderia ter como qualquer sujeito de direito, interesses subjetivos, Marco Félbc A previsio das medidas estruturantes no artigo 138, 1V, do novo Cédigo de Processo Civil Brasileiro, In: ZANETI JR, Hermes (coord). Processo Coletivo (ColegBo Repercussbes do Novo CPC. v. 8, Fredie Didier Jr). Salvador. usPodivm, 2016, 415. ALMEIDA, Gregério Assagra de. “Execucéo Coletiva em Relaco aos Direltos Difusos, Coletivos e Indiv dutis Homogeneos: Algumas Consideracbes Reflexivas”. Mima Clanc! e Rita Quartier (coords). Temas “atuas de Execucdo Ci: Estudos em Homenagem ao Professor Donaldo Armen. S8o Paulo: Saraiva, 2007, 'p 216. No mesmo sentido, reforgando o papel da tutela executiva indireta, com meios de coercio, &. VENTUR,, Elton. Execucéo da Tutela Coletiva. S80 Paulo: Malhelros, 2000, p. 160. 16. Cf. para uma comparacio entre os modelos de execusSo, TARUFFO, Michele. A arvacao executiva dos direitos: perfs comparados. in: TARUFFO, Michele. Processo Civil Comparado: Ensaios. Apresentacéo, ‘organizacho e traducho de Daniel Mitidlero, So Paulo: Marcial Pons, 2013, p. 85/116. 17. SABEL; SIMON, Destabilization Rights: How Public Law Ltigation Suoneds,p. 1.071. § ¢ ¥ 40. CCURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL Vol.A = Fredie Didier Jr. ¢ Hermes Zanet patrimoniais, em sentido lato, na medida em que integram o patriménio do sujeito. Cita como exemplo de interesse secunddrio da administrarao 0 de pagar o m{nimo possfvel a seus servidores e de aumentar ao maximo os impostos, a0 passo que o interesse publico primdrio exige, respecti- vamente, que os servidores sejam pagos de modo suficiente a coloc4-los em melhores condigées e tornar-lhes a ac&o mais eficaz e a no gravar os cidadaos de impostos além de certa medida’ Os direitos coletivos lato sensu so direitos de interesse publico pri- mario quer em razao da dimensao do ilicito ou dano, quer em razao dos valores atrelados aos bens juridicos tutelados ou do ntimero de pessoas atingidas, extensio do grupo atingido. Quando falamos de interesse publico primério falamos também de determinados interesses individuais especialmente tutelados como direi- tos fundamentais do cidadao, Essa perspectiva ampla inclui os direitos coletivos lato sensu e também os direitos individuais indisponiveis carac- terizados como interesses de ordem social e publica pela legislago ou pela Constituigao. Essa parece ter sido a intencao do legislador brasileiro. A tese de que determinados direitos individuais devem ser compre- endidos como direitos de interesse publico foi defendida na doutrina e acothida pelo Supremo Tribunal Federal, “J4 temos defendido que a ténica da intervengao do Ministério Publico consiste na indisponibilidade do in- teresse. Hoje vamos mais além. A par dos casos em que haja indisponibili- dade parcial ou absoluta de um interesse, ser também exigfvel a atuacio do Ministério Puiblico se a defesa de qualquer interesse, dispontvel ou nao, convier & coletividade como um todo. [..] Num sentido lato, portanto, até o interesse individual, se indispontvel, é interesse publico, cujo zelo é acometido ao MP” (STE, RE 248.869/SP, 2 T, rel. Min. Mauricio Corréa, }. 07.08.2003). Trata-se, portanto, de reconhecer, mais uma vez, as diversas dimen- s6es da democracia: politica, civil (autonomia da vontade), liberal (direitos de liberdade) e social (direitos sociais), 18. MELLO, Celso Antonio Bandetra de. Curso de direito administrativo, 15. ed. Sbo Paulo: Malheiros, p. 603. f, no original, ALESSL Renato, Sistema isttuzionale del dirtto amministrativo Raiano. Mlano: Giuffre 1953. p. 148-155. 0 STF tem reconhecido essa distingBo fundamental (cf, RE 393175/RS, Rel. Min. Celso e Mello, Brasfia, Ye. de Fevereiro de 2006, Boletim Informativo n* 414). 19. CE MAZZILLL, Hugo Nigro.‘ atuacSo do Ministrlo Piblico no Processo Chl Braslei Revista dos Tribunals, $80 Paulo: RT, vol 910, p. 223, ago/2011. Sobre o atual papel do Ministério Publico na ‘ordem juridica, cf, ZANETI JR, Hermes. “Comentérlos aos art. 176 a 181 do CPC’ In: STRECK, Lento: NUNES, Dierle: CUNHA, Leonardo Cameiro da. Comentdrias a0 Cédigo de Processo Civ. Saraiva: S80 Paulo, 2016, p. 260-282. ‘Cap. 1 + INTRODUGAO AO ESTUDO DO PROCESO COLETIVO, 4 Nao ha, no entanto, uma supremacia abstrata (independentemente do caso) do interesse publico sobre o interesse individual.” A supremacia do interesse ptiblico deve ser verificada caso a caso, nao sendo razoavel que se estabelega, a priori, que, em qualquer conflito envolvendo o interesse publico e o interesse particular, deva aquela prevalecer sobre esse.” A pre- valéncia do interesse pitblico é, apenas, "uma regra abstrata de preferéncia em caso de coliséo (Kollisionspriferenzregel)” 2.4. A implementacio e controle de politicas publicas por parte do Poder Judicidrio (judicial activism, judicial restraint e ativismo Judicial seletivo): ativismo da lel e da Constituicéo em matéria de politicas publicas no Brasil Supremo Tribunal Federal tem permitido, em situagdes de extrema- da necessidade, a implementagio de politicas publicas mediante interven- 40 direta do préprio Poder Judiciario;* da mesma forma tem decidido o Superior Tribunal de Justica™. 20. AVIA Humberto. “Repensando © ‘principio da supremacia do interesse publico sobre © particular” In: SARMENTO, Daniel (org). nteresses plbicos versus intereses privados. Rio de Janel: Lurmen Juris, 2005, p. 171-215. 21. AVILA, Humberto. “Repensando 0 ‘principio da supremacla do interesse publico sobre © particular, itp. 202. 22 AVILA Humberto. “Repensando 0 ‘principio da supremacta do interesse piblico sobre o particular”, ct, p. 185. 23. sto ocome, quer no atendimento de creches a implementacSo da educagSo infantil pré-escolar, (Al 761908 RG, Rel. Min Luiz Fux, julgado em 24/05/2012, AcbrdBo EletrOnico Dje-155 Divulg 07-08-2012 Public 08-08-2012, autoaplicabllidade do art. 208, N, da Consttuigho Federal. Dever do Estado de assegurar 0 atendimento em creche e préescola as criancas de zero a sels anos de idade, julgado lem repercussdo gerall; quer no reconhecimento extraordingrio de leitimacao a0 Ministério Publico, reconhecimento da repercusséo geral quanto 8 legitimacéo do MP (RE 605533 RG, Rel. Min. Marco ‘Auréii, julgado em 01/04/2010, Dje-076 Divulg 25-04-2010 public 30-04-2010 ement vol-02395-09 'pp-02040 lexst v. 32, n. 377, 2010, p 243-246, possul repercussio geral a controvérsia sobre a legit- ‘midade do Ministrio Publico para ajuizar aco chil pblica com objetivo de compelr entes federados 2 entregar medicamentos a pessoas necessiadas e Enunciado da simula do STF n® 643 “O Ministerio Piblico tem legitimidade pare promover aco civil piblica cujo fundamento sele a ilegitimidade de reajuste de mensalidades escolaes’ e ainda o RE 631.111/60); politica publicas de satde, (ADPE 45 -MC/DF, ARE 745745 AQR, Rel. Min, Celso De Mello Segunda Turma julgado em 02/12/2014, processo eletrénico Die-250 divulg 18-12-2014 public 18-12-2014, impossibidade de alegar a reserva do pos. sivel ante do minimo exitencal tutela para manutengSo da rede de asistencia & sae da cranga € adolescente, entre outras tuelas do diretto subjtivo & sade) Cf, ainda, FREIRE JR; Ameéres Beas © controle judicial de poltcas piblicas. So Paulo: RT, 2005. 7 24, Existem diversos acérdos do ST, sea em direto materiale processual:REsp 1488639/SE, Rl Herman Benjamin, Segunda Turma,julgado em 20/11/2014, Dle 16/12/2014, possiblidade de, Judi de potas piblicas em casos excepcionas,sendo inoponivel a reserva do possivel auendo nc pcan her eva 8 ol an Determinacto de bloqueio de verbas publicas e a fiacho de mula daria pare © descumeroe de determinacéo judicial consistente em fomecimento de mi ares ioe ee st SR ns st rem rr ee Ministro ‘controle \% VAAN AAAAAY FAVAANNN PTF SAPPPPPPP? a2 ‘CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL-Vol 4 = Free Didier. © Hermes Zaneti dr Em especial, deve ser ressaltada a limitaco do ativismo judicial (judi- cial activism) ao conteiido da lei e da ConstituicAo (judicial restraint), nos termos expostos pelo Min. Herman Benjamin: “No Brasil, ao contrario de outros pafses, o juiz no cria obrigagdes de protecaio do meio ambiente. Elas jorram da lei, apés terem passado pelo crivo do Poder Legislativo. Daf nao precisarmos de juizes ativistas, pois 0 ativismo é da lei e do texto constitucional. Felizmente nosso Judiciario nao 6 assombrado por um oceano de lacunas ou um festival de meias-palavras legislativas. Se lacuna existe, nao é por falta de lei, nem mesmo por defeito nalei” (REsp 650.728/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 23/10/2007, Dje 02/12/2009). Isto significa dizer que assumindo a postura interpretativa realista moderada e responsdvel, mesmo que seja reconhecido um dever de re- construggo do ordenamento juridico ao julgador, ndo pode ele se eximir da responsabilidade de aplicar a lei e a Constituico. Alico do Min. Herman Benjamin precisa ser completada, diante do Cédigo de Processo Civil brasileiro. 0 Brasil adota, com 0 art. 927 e incisos do CPC, um modelo de prece- dentes normativos formalmente vinculantes; logo, para além da lei e da Constituicdo os juizes e tribunais estardo obrigados, normativamente, a seguir os precedentes-norma®, S4o considerados precedentes-norma as Die 12/04/2012, determinacSo de internacSo em rede privada inexistindo vaga de UT na rede po blica: REsp 1068731/RS, Rel Minitro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 17/02/2011, Die (08/03/2012, "2 reserva do possivel nfo configura carta de alforia para o administrador incompetente, relapso ou insensivel & degradacSo da dignidade da pessoa humana, jé que impensivel que possa legitimar ou justfiar @ omissio esttalcapaz de matar o cidadSo de fome ou por negacto de apoio médlico-hospitala. A escusa da “lmitacdo de recursos orramentaris”frequentemente no passa de biombo pare esconder 8 opcbo do administredor pelas suas proridades partculares em vez daquelas ‘estatuidas na ConsituigSo e nas leis, sobrepondo o interesse pessoal as necessidades mais urgentes da coletividade. O absurdo e a aberracdo orcamentérias, por ultapassarem e vlipendiarem os mites do razodvel, as fronteiras do bom-senso e até poltcas piblicas legisladas, s6o plenamente sindicdvels pelo Judicirio, néo compando, em absolute, a esfera de discricionariedade do Administrador, nem indicando rompimento do principio da separasao dos Poderes"; AgRg na Suspensio de Liminar e de Sentenca né 11427/CE.o ativismo judicial pode legitimar-se para integrar a legislagdo onde no exista norma escrita, recorrendo-se, entéo, 8 analogia, 205 costumes € 20s principios gerals do ditelto; REsp 666.419/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeire Turma, juigado em 14/06/2005, DJ 27/06/2005, p. 247, entendendo possibilidade de dligenciar o juiz acerca dos bens do devedor mediante o BACEN JUD, tornando-se {despiciendo imaginar-se um prévio pedido de quebra de siglo, ndo 56 porque a medida é limitada, ‘mas também porque ¢ 0 proprio julzo que, em ativismo desejével, colabora para a répida prestacio da justice. Acaso a constrigbo implique em impenhorabilidade, caberé a0 executade opor-se pela via propria em juizo; REsp 666.419/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, ulgado em 14/06/2005, 1) 27/06/2008, p. 247, ativismo judicial em matéria probatéria diante de perplexidade no processo. 25, ZANETIJR, Hermes. O valor vinculante dos precedentes: teoria dos precedentes normativos inculonts. ed. evista atuslzada, Salvador. huspodivm, 2006, ‘emnaimere cap. 1 « INTRODUGAO AO ESTUDO DO PROCESSO COLETWO 8 decisbes em controle de constitucionalidade concentrado, as stimulas vin- culantes, as decisdes em incidente de resolucao de demandas repetitivas, recursos especial e extraordinario repetitivos e incidente de assun¢ao de competéncia, as teses consagradas em stimula do STF, em matéria cons- titucional, e do STJ, em matéria infraconstitucional, além das decises dos érgios plendrios e das cortes especiais as quais os juizes e tribunais estiverem vinculados (art. 927, incisos I, II, IIL, IVeV, CPC). ‘Aregra passa valer imediatamente, atingindo as decisées anteriores. Portanto, em matéria de politicas publicas e controle judicial aplica-se sobre os casos j4 julgados com potencial de formarem precedentes. Por exemplo, o bloqueio judicial de verbas publicas, decidido no regime do art. 543-C do CPC-1973, nos casos de fornecimento de medica- mentos: cabe ao juiz adotar medidas eficazes a efetivacao de suas decisdes, podendo, se necessério, determinar até mesmo, o sequestro de valores do devedor (bloqueio), segundo 0 seu prudente arbitrio, e sempre com ade- quada fundamentacdo (REsp 1069810/RS, Rel. Ministro Napoledo Nunes Maia Filho, Primeira Seco, julgado em 23/10/2013, DJe 06/11/2013 - art. 543-C do CPC/1973 c/c Res. 08/2009 do STJ). 0 STF decidiu que 0 Poder Judiciario pode determinar que sejam realizadas obras ou reformas emergenciais em presidios para garantir os direitos fundamentais dos presos, sua integridade fisica e moral. A acio civil publica ajuizada pelo Ministério Publico do Rio Grande do Sul foi julgada em recurso extraordinério com repercussao geral reconhecida e reverteu entendimento do Tribunal de justica do Rio Grande do Sul que entendia que o Poder Judiciério nao poderia adentrar matéria reservada A Administraco Publica. 0 juiz de primero grau havia determinado a reforma do presidio em seis meses, pois o MPRS comprovara o risco de vida para os detentos, ndo sé pelas condi¢des degradantes, mas pela expo- sigdo A flacdo elétrica e a possibilidade de choques que poderiam causar a morte dos apenados. A decisdo aborda os direitos fundamentais como fundamento para reverter 0 quadro dos presidios brasileiros, nos quais mais de 600 mil presos encontram-se em situacdes degradantes, Ao final o relator aponta a existéncia de recursos no Fundo Penitenciario Nacional, da ordem de 2,3 bilhbes de reais, o que impediria qual quanto & reserva do possivel fatica. rhe cadence Foi entao aprovada a seguinte tese de re] ai percussdo geral pelo Pl nério do STF (tema 220), Portanto, com forca vinculante: “E iicito a Judiciario impor & Administracao Pablica obrigagbes de fazer, consisten- te na promocao de medidas ou na execugao de obras emergenciais em CURSO DE DIRETO PROCESSUAL CVE $4__CURSODE DRETTO PROCESSUAL CVAL-Wol 4 = Frade Deter « Meme en ___—_ estabelecimentos prisionais para dar efetividade ao postulado da digni- dade da pessoa humana e assegurar aos detentos o respeito & sua inte- gridade fisica e moral, nos termos do que preceitua o artigo 5® (inciso XLIX) da Constituigo Federal, nao sendo oponivel & decisdo 0 argumento da reserva do possivel nem o principio da separacdo dos Poderes-” (RE 592581, Relator(a): Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 13/08/2015, acérdao eletrénico repercussao geral ~ mérito Dje-018 divulg 29-01-2016 public 01-02-2016) Evidentemente, o controle judicial de politicas piblicas tem regras e nao deve ser um cheque em branco passado ao 6rgao julgador para ele questionar politicas publicas exitosas fundadas em normas constitucionais e legais. 0 risco do ativismo judicial seletivo,?” ow seja, o controle indevi- do de decisées judiciais sobre politicas puiblicas que implantam normas constitucionais e legais € um efeito colateral da possibilidade de controle das politicas puiblicas que deve ser combatido no direito brasileiro, mas que nao infirma a necessidade de decisGes judiciais para implementacao de politicas piblicas legais e constitucionais. ST], por exemplo, negou a possibilidade de o Poder Judiciario servir de instrumento para a reversao de politicas ptiblicas em prol de interesses de grupos ou setores da economia, por exemplo, no caso da importacao de pneus usados. Como ficou assentado, na aco movida em face da Unido e do IBAMA, a proibicdo institufda pelo Estado sobre a importacao de pneus usados é de 16_Assim, "REPERCUSSAO GERAL. RECURSO DO MPE CONTRA ACORDAO DOTURS. REFORMA DE SENTENCA (QUE DETERMINAVA A EXECUGAO DE OBRAS NA CASA DO ALBERGADO DE URUGUAIANA. ALEGADA (OFENSA AO PRINCIPIO DA SEPARAGAO DOS PODERES E DESBORDAMENTO DOS LIMITES DA RESERVA DO POSSIVEL INOCORRENCIA. DECISAO QUE CONSIDEROU DIREITOS CONSTITUCIONASS DE PRESOS [MERA NORMAS PROGRAMATICAS. INADMISSIBILIDADE. PRECEITOS QUE TEM EFICACIA PLENA E APLI- CCABIUDADE IMEDIATA. INTERVENCAO JUDICIAL QUE SE MOSTRA NECESSARIA E ADEQUADA PARA PRESERVAR O VALOR FUNDAMENTAL DA PESSOA HUMANA. OBSERVANCIA, ADEMAIS, DO POSTULADO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDICAO, RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA MANTER A SENTENCA ‘CASSADA PELO TRIBUNAL I licito ao Judiciaio impor & Administragbo Publica obrigaglo de fazer, consistente na promoglo de medidas ou na execucdo de obras emergencials em estabelecimentos prisionais I - Supremacia da dignidade da pessoa humana que legitima a intervencso judicial. I~ Sentenga reformads que, de forma correta, buscava assegutar © respeito & integridade fisica e moral dos detentos, em observancia ao art. 5°, XX, da Constituigio Federal. V ~ Impossibilidade de ‘oporse & sentence de primeiro grau argumento da reserva. do possivel ou principio da separacso dos poderes. V - Recurso conhecido provide, (RE 592581, Relatoria: Min. Rieardo Lewandowski, ‘Tibunal Pleno, julgado em 13/08/2015, acérd8o eletrénico repercusséo geral ~ mésito Die-018 divulg 29-01-2016 public 01-02-2016). Vale a lettura da integra do brithante, detalhado e extenso voto do Relator, Min, Ricardo Lewandowski" 27. O ativismo judicial seletivo decorre de uma posicSo revanchista em relacSo &s poltias pablicas deft nidas na lei e na Constituicéo NUNES; TEIXEIRA, Acesso 4 Justica Democrdtico, p. 86 e ss. Em especial, argumentam os autores: “Hoje parece inegdvel a relevanciz dos atores do Judiclérlo no contexto democratico vigente. Parte-se do pressuposto de que a judiciaizacSo indica ¢ catalisa a formacto de ‘uma ‘cidadania ative no Ambito da sociedade civil, mas no debra de abrir a porta dos fundos pore @ subministragdo de uma racionalidade finalistica, propria da a¢So palltica, no campo do direto” (p. 89). Gap. 1+ INTRODUGAO AO ESTUDO DO PROCESSO COLETIVO 45 alcance geral, sem exce¢ao, e decorre do exercicio do poder de policia, neste caso com 0 objetivo de conter prejuizo real e potencial a satide e ao meio ambiente, além de originar-se de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. Como regra,nao passa de despropésito querer submeter politicas Puiblicas, mais ainda as legisladas, & pericia judicial, exclufda a possibilidade de exigéncia de Estudo Prévio de Impacto Ambiental Estratégico, quando a sua implementagao e concretizacao demandarem a realizagao futura de obras ou atividades potencialmente causadoras de significativa degrada- 540 do meio ambiente (REsp 1129785/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Rel. p/ Acérdao Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 15/12/2009, DJe 04/05/2011). Esse caso é particularmente relevante pois © STF jé havia decidido pela constitucionalidade da lei em ago de controle de constitucionalidade (STF, ADPF 101/DF), havendo, consequentemente, precedente vinculante na matéria (art. 927, I, CPC-2015). 2.5. Para além da “politizaco da justica” em uma democracia de direl- tos: uma conclusdo parcial Acreditamos que ao conceito de ages coletivas para tutela dos direi- tos difusos, coletivos stricto sensu e individuais homogéneos no Brasil, de acordo com a nossa Constituigao e as nossas leis, deva imperativamente aderir este novo elemento: a acao coletiva precisa caracterizar-se como um processo de interesse ptiblico primario. A doutrina internacional preocupa-se, desde h4 muito, com o tema do processo civil de interesse pubblico. Alguns exemplos podem ser citados, Para além do trabalho de Abram Chayes e outros ja referidos, o excelente trabalho de Mauro Cappelletti: “O Papel do Ministre Pu- blic, da Prokuratura e do Attorney General na Litigacdo Civil - Com 0 ‘Acréscimo de Outras Formas de Representacio do Interesse Puiblico e dos Grupos nos Procedimentos Civeis” 4 guisa de relatério geral a0 IX® Congreso Internacional de Direito Comparado publicado em: CAPPELLETTI, Mauro; JOLOWICZ, A. “Public interest parties and the ‘Active Role of the Judge in Civil Litigation’. Milano /New York: Giuffré/ Oceana Publications, 1975. ‘Ainda, vale conferir 0 profundo trabalho de Mirjan R. Damaska. “The Faces of Justice and State Authority: A Comparative Approach to the Legal Process”. New Haven/London: Yale University Press, 1986, Neste trabalho o autor configura trés tipos de relacio entre as faces da Justica e a autoridade estatal: a) 0 modelo hierérquico de autoridade, vocacionado a implementacao de politicas piiblicas (Europa continental); b) omodelo coordenado de utilizagao do poder, vocacionado para a solugao dos conflitos (Estados Unidos da América do Norte); e, por iltimo, o modelo hfbrido que est em formacao e SPPPPPPPETTITILLAVANAANANAALLALARY

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