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Criton (SOCRATES) — Por que acoraste tio ceo, Crfton? Nao & ainda muito cedo? {CRITON) — sim, muito codo (SOCRATES) — Que horas serio, preisamente? {CRITON) — Acaba de amanhecer (SOCRATES) — Admiro que o guarda tenha te deixado passa. (CRITON) — Somos conhecidos por me ver aqui com fre Btncia e deverme muitos favores ficients. Se optes a ss algoma difcldade hi aqui muitos es ttangatres que coloeam sun renda 4 tus disposigio. B um dees, Simias de Telos, rouxe uma quanta sficente; Cbes te oferce © mesoo e muitos outos também, No pers por eta razdo, a ‘portunidade de salvarte. pelo que dias outro dia dante dos jnies, de que se saises dag desterradonio sabes vier, ro te deteras por sto. Em qualquer parte do mando ser ber re bio. Se foes & Tesi, alt tens amigos que te hovarto como Imereces ¢ te protgerio contra qualquer atague.Além disso, 6 ‘Sécrates, ao te entregares, podenclo entretanto salvarte, cometes, segundo penso, uma agio injusta trabalhando para favorecer @ tua pperda segundo desejam teus inimigos. Além disso, tals a tous fe Thos, abandonando-os quando deverias sustenté-os e educt-los, Recairdo sobre eles todas as calamidades que sempre afligem os ‘pobres drflos. Ou nlo se deve ter flhos ou se os temos devemos ‘pensar neles com todos os cuidados e trabalho que sua educagio impoe, e finalmente, segundo acredito, adotaste a posigio mais moda quando deverias conduzie-te como homem de coragio, ¢ iguém és culpado nisto, tu que sempre te jactaste de pela virtude. Séerates, envergonho-me por tie por nds, teus amigos; nlo se afirma que nossa covardia permitiu a cconsumagio deste fato, observa que rio censurar-te, primeiro pelo teu comparecimento diante deste tribunal, coisa que poderia ter cevitado, depois pela vergonha de teu processo e finalmente, esto 0 mais ridiculo de tudo, nos culpario porque, covardes e vis, ‘abandonamoste, deixamos desalvar-te ese afirmard que por nossa ‘culpa no te salvaste ainda que podendo fazé-o, por pouco que tivéssemos te ajudado. Tal conduta, Séerates, no seria a0 mesmo tempo culpsvel e vergonhosa para ti e para nés? Resolvete de- pressa, no é tempo de consulta, deves decidie-te sem pensar mais, tudo deve ser feito nesta noite; se esperarmos mais, todos nossos ‘esforsos terio sido initis. Acredita-me Sécrates efaca 0 que digo. (SOCRATES) — Tua solicitude teria sido muito lowvével, _meu querido Criton, se fosse conforme aos ditames da justia, 2s, a0 contrério, seré tanto mais passive de aviltamento quanto mais dlistante dela estiver. Antes de mais nada deveremos examinar se devemos ou nio fazer segundo dizes, porque ji sabes que 0 meu costume de no me render a outras razBes serio & nica que me areca mais justa depois de examinar todas as apresentadas € an- tigo. Ainda que a fortuna se declare contra mim nunca poderei abanclonar as méximas que sempre professei, sempre me parece? a5 mesmas ¢ sempre as aprecio do mesmo modo. Se, portanto, 'o encontramos razdes mais firmes, convence-te que no renderei 3s tuas, ainda que todo o poder do povo viesse contra mis € para assustar-me ameagas-me como a tum menino com mil espa" talhos,falando-me de sofrimentos mais dros que minha presente desgraga, com cadeias, peda de minha fortuna e morte. Entretanto, tomo fazer este exame com eqiidade? Indubitavelmentelembran {20.0 que dizias hs um momento acerea das opines, isto € se hs ‘opinides que devem preocupar-nos e oulras que poxlemos despre- dar. Por acaso, 0 que eu disse no foi razoivel aé antes de pro- hhunciada minha sentengae depois deverd permanecer no ar como Conversa ini e no fundo como brincadeira jogo de criangas? DDesejo pesquisar este asunto contigo © examinar se, em minha nova situag, este principio me parceers diferente, ou se perma- necerd sempre o mesmo, para que nos determinemosaabandons-lo 1 seguito Be no me engano é verdade quesustente muitas vezes, frente aqueles que acreditavam dizer coisas séras, que as opines Inu ‘manas devem sr, algumas, das em alta conta eoutras io. Crito, pelos deuses, areditas também nisto? Porque, segundo as aparéir as humanas no estés em risco imedito de morte e deve pre ‘sumir que nao hs nenhu riseo que corras presetemente que te impeca a percepsio e te induza a err, Pensa bem. Nio acreditas «que se disse muito acertadamente que nio devem ser consideradas todas as opinides dos homens, mas algumas apenas, eno as de fodos os homens, mas a de alguns apenas? Que dizes? Nao falam acertadamente aqueles que asseguram isto? (CRITON) — Dizem muito bem. (SOCRATES) — F ent3o, nfo devem seraprovetadas apenas ‘as boas opinides e desprezadas as més? {CRITON) — Sem divida. (SOCRATES) — Fas boas opinides no Sio as dos judiciosos cas mis dos insensatos? (CRITON) — Outra coisa 6 impossivel suceder (SOCRATES) — lo significa enti que cada coisa depende de seu estilo? Um homem que se exercita no ginssio ouvir aofensa ‘010 louvor do primi passante ou somente aqueles do médico ‘ou monitor que dirige o ginsio? {CRiTON) — Ouvit ndubitavemente a estes (SOCRATES) — Devers conseqiientementetemer ao vitup& rio e desejr apenas 0 aplauso deste homem, desprezando o de todos 08 demais? (CRITON) — finde (SOCRATES) — De tal modo, que elativamente ginssica ee eta tea eae vn ad reste eno se reger de modo algum pelo capricho dos demain? (CRITON) — E evidente. (SOCRATES) — Fique isto entao convencionado. Porém se a0 desobedecer a este mestre e a desprzar sia estima e louvers, devas sedusis peas carase louvores do povo e dos ignoa nao Ihe adviré nenhum mal? = ad (CRITON) — Como nao hé de suceder-Ihe 0 mal? (SOCRATES) — Entretanto de que natureza sera? Qual ser seu fin? Que parte do homem iré ata? (CRITON) — Sem diivida alguma, a seu corpo, que assim seri desruido pouco a poco (SOCRATES) — Muito bem, fgue isto também conversa nado: Mas ni aconlece precsamente mesmo com a Osco {hat For que sazto acerca do justo do injuso, sobre o honest co desonento, sobre 0 bem ¢ 0 mal, que sero agora 0 ojto de ones conversaio,teremos que consierarprincpalmente a op miso da multidgo que a de um tnico homem, se existe um que a io expertoe hil que nos inspite mas tepeito eto que {ello mundo? E se nfo nos conformamos com a opiiso dese homer, nao 6 verdade que destruremos completamente to aqur Teague hi em née, apenas pea justgaalgure novas forse apes pu injustiga prece? Ou tudo ito serve para nada? {CRITON) — isto, 6 Sécrates, sou de toa opiniso. (SOCRATES) ~ Continua, pois, atento:se ao seguir apie dos ignorantes destrissemos aquilo que apenss por um rie seuadive ae conserva e que elo mas regime se dest, poderemo® iver depois da destruigio do primeito? E,digeme, nio é ete (CRETON) — Sem avid, nosso comp. (SOCRATES) — E poctemos viver com um corpo ou destrutdo? (CRITON) — Seguramente, nfo se (SOCRATES) —E poeremos viverdepis da corpo anil que apenas pela jstiga vive em nés e do.que ® rompido I. destri? Ou julgamos menos nobre que o corpo, essa parte de és tmesmos, qualquer que sj, a que se refira a justia e&injustica? (ERITON) — De modo algum. (SOCRATES) — E no éa mais preciosa? {CRITON) — Muito mais. (SOCRATES) —Portanto, querido Criton, nto devemos nos preocupar com aquilo que 0 povo venha a dizer, mas sim pelo fque venha a dizer o nico que conhece o justo eo injusto e este {nico juiz €a verdade, Donde poderésconcluir que estbeleceste prinepios falsos quando diseste inicialmente que deviamos fazer {Ease da opin do pove acerca do just, © bom o digno e seus postos.Talver se me diga: 0 povo pode fazer-nos morer. (CRITON) — Dire assim, seguramente (SOCRATES) — Dizes a verdad. Mas, admiesvel amigo, as axes que aduzimos parece me permanecer as mesmas que anes. E, portato, examina se nio devemos dar suma importincia a0 viver, mas sim ao viver bem. (CRITON) — Trad iso continua sendo certo (SOCRATES) —E permanece serio certo que o bem, 0 belo 0 justo confinuam sendo ima mesma coisa? (CRITON) — Depois de tudo o que acabas de conceder-me, devemos examinar antes de mais nada se é justo ou injusto sair ‘aqui sem permissio dos ateninses, pos esto justo, devernos tenti-lo, mas, se ¢ iusto, devemos abandonar a ideia, porque todas as conseragBes que apresentaste de bens, reputgio © fa- rf, no so por acsoconsieragSes préprias dagueles que fazem rmorter sem razdo alguma e que gostaiam de fazer ressuscta, também, sem razio alguma, sesso les fosse possivel? Refro-me 2 multiddo,Porém, o que nds, segundo nosso principio, devemos ‘onsderar, és fazemos uma coisa justa dando dinheiroe perma- fecendo agradecdos acs que daqul nos etiram ou se nist, eles tens, comclemos alguma injustiga. Se a cometemos, nio se deve Fadocinar tanto, devese morrer aqui ou sofer todas as coisas, antes de agit ijustamente (CRITON) — Tens razio, Sécrates, vejamos o que deveros fazer. {GOCRATES) — Vejamo-lo juntos, meu amigo, e se quando cstiverfalandotiveres alguma objeio a fazer-me, faa, para aqui apesar dos atenienses, eu te peso isso. Suzpreenier-meia fom certeza que pudesses me convencer do contrério, mas no posso fazé-lo sem estar convencido. VE, portant, sete star 9 pl il You cone ese ae ta Je rede mints perguntas com teda sinceridade que te aca possive (CRITON) —Fare'deste modo Pe (SOCRATES) — E correto que nunca se deve cometer: tia? E Lito comettla em certs ccasiGes? Ou 6 absolutamente certo que toda injustiga deva ser evitada como jéconcordamos ht pouco? E todas essas opines, nas quaisacordamos,dissiparamse km ti pouco tempo e seria possvel que em nossa cidade, Cito, ‘ossas mais srias controvésis vessem sido como as dascriangas sem que nos apercebéssemos? Ou devemos nos ater uniamente a0 que diseros, de que toda njustica 6 vergonbosa enociva para aquele que a comete,diga 0 que quira dizer a mulid,eresulte dela o bem ou o mal? Falaremos asim, ou no? (cRETON) — Assim. (SOCRATES) — Enid, também nfo devemos cometr in justcarelativamente aqueles que no-lafazem, ainda que este povo acredite que isto seja ict, uma vez que concordas que sto mio pode se feito de modo algum. (CRITON) — Assim me parece (SOCRATES) — E ou mio let fazer mal a uma pesos? (CRITON) — Nao 6 justo, erates. (SOCRATES) — E justo, como 0 vulgo aceite pagar 3! com 0 mal? Ou 6 injusto? (CRITON) — £ injust. (SOCRATES) — E correto que entre fazer omal ese isto ‘io Ii diferenga? (CRITON) — Concord. (SOCRATES) — Portanto, nunca ve deve come ne ‘nem pagar o mal com o mal, se If © que for que nos tere feito, portanto cuidado, Criton, e que ao aceder-me nisto ni) © vvoltes contra tua opiniao, porque hé muito poucos que concore = “quanto a isso Bem, & impossivel que aquees que nio tena P ‘ides conformes possi chegar a um acordo, porque, a0 desprezar fada um a opiniio do outro, cestuma também desprezar a0 que fs profess. Examina,portanto, se é totalmente da mink opinio fe admites © principio de que nfo devemos cometerinjustica fem momento algum, ainda quand sejamos vtimas dela, nem pa- far o mal com o mal. Dizerme, portanto, se mudaste de opinito qual a ra2io disto, mas se permaneces fl ao que convenciona- tas, prossegue me ouvind. {ciTON — Permaneso fel ao dito e perso como pensis, fala pois, que te excuto. (SOCRATES) — Prossgo, ou melhor, te pergunto: homer que prometeu uma coisa just, deve cumprila ou faltar a ela? (CRITON) — Deve cumprila (SOCRATES) — Segundo 0 que dissemos, se a0 sir dagul sem o consentimento da cidade, fazemos ou rao fazemos 0 mal Drecisamente aos que no o merecem. Cumprizemos © que con- ‘Vencionamos ser justo ou ni? {CRITON) — Nio posto rexponder a0 que me perguntas porque, na verdade, 6 SScrates,néo o ented. (SOCRATES) — Vejamos se assim 0 envendes melhor. Se chegado © momento de nossa fuga, ou como queres chamar, nossa saida a leis da Replica, apresentandose a nés, nos ds- Sesser: "Sécraes, 0 que Vais fazer? Leva teu projto a cabo nto implica destrir-nos completamente, uma vez que de i dependem, para nés, as leis da Repiblicae a todo o Estado? Acreditas que tim Batado pode subsistir quando as sentengaslegaisnele no tem forga eo que é mais grave, quando os individuos as desprezam ¢ destroem” Que responderiames, Cito, a estas € a outas acu- fagdes parecidas? Quantas coisas néo poderam se ditas, mesmo por unt retérico acerca da destrigso desta lei que exige 0 cum Drimento das sentencasditadas? Diremos por acaso que a Reps- Bia foi insta e nos julgou mal? F isso que responderemos? {CRITON) — Sim, Sérates, €0 que Ihes diremos. {GOCRATES) — Ea iso responderio as leis: "Nio conven- cionamos, 6 Sécrates, que te submetrias a0 juizo da Repablea Ese ll linguagem nos surpreendesse,talvez eno nos disessem: ‘No te surpreendas, Sécrates, mas responde-nos, uma vez que ests habituado a discutir por perguntas erespostas. Diga-nos as queixas que tens contra a Repiblica © contra nbs, para que jes de molde a tudo fazer para nos desta. Em primi lugar, deve. os a Vida, uma ver que por nds easoute te pak com aguela que te dew a luz. Que reparos tens a fazer nas leis que estabelecemos acerea do mattiménio” Nenhum, Ihe responderel “E quanto as que se rterem & alimentagdo e educasio dos fihos 3s quai deves ta educagio? Nio te parece justo que tenham cordenado a teu pai que te educasse em todos 08 exercicios da inteligenciae do corpo? ‘Com muita justiga, responder "E entio, depois de dever-nos o nascimento, 0 sustento a ceducagio terds 0 atrevimento de sustentar que nao & ross filko fe servidlor, da mesma forma que teus pais? Esendo dessa forma, acreditas por acaso teres 08 mesmos direitos que nis, de mado {ue te sja listo devolver tudo 0 que te faremos soft? Esse dreito {ue ni podes ter relativamente a um pai, ou a um encaregado, para devolverthe mal por mal, aronta por aftonta e golpe por folpe, pensas telo relativamente a tua ptria e contra suas les? Ese tratassemos dete fazer perder, acresitardo ser usta tun peda, fem estando prevenido,trataria de perder-nos, bem como a tua ptria? Chamarias isto justiga, tu que fazes profissio de praicar 2 virtude? Acaso tua sabedoria te de’eaignorar que pstriaé mais

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