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Masarykova univerzita

Filozofická fakulta

Ústav románských jazyků a literatur

Bakalářská diplomová práce

2015 Zuzana Aurélia Ovšonková


Masarykova univerzita
Filozofická fakulta

Ústav románských jazyků a literatur


Portugalský jazyk a literatura

Zuzana Aurélia Ovšonková

OCULTISMO NA VIDA E OBRA DE FERNANDO


PESSOA
Bakalářská diplomová práce

Vedoucí práce: Mgr. et Mgr. Lenka Kroupová


Brno 2015
Prehlasujem, že som bakalársku diplomovú prácu
vypracovala samostatne s využitím uvedených prameňov a literatúry.

Tlačená verzia práce je zhodná s verziou elektronickou.

.....................................................
Na tomto mieste by som sa rada poďakovala vedúcej práce Mgr. et
Mgr. Lenke Kroupovej za venovaný čas, podnetné rady a pomoc pri písaní
bakalárskej diplomovej práce a ďalej ďakujem za pomoc a za poskytnutie
knižných materiálov Mgr. Silvii Špánkovej, Ph.D.
Índice

Introdução ........................................................................................................................... 1
Personalidade de Fernando Pessoa ..................................................................................... 2
Definição de ocultismo ....................................................................................................... 4
Tendências ocultistas em Fernando Pessoa ........................................................................ 8
4.1 Juventude ..................................................................................................................... 8
4.2 Astrologia .................................................................................................................. 11
4.3 Profecias .................................................................................................................... 17
4.4 Alquimia .................................................................................................................... 23
4.5 Ordens secretas .......................................................................................................... 27
4.6 Magia ......................................................................................................................... 32
Conclusão .......................................................................................................................... 37
Bibliografia ....................................................................................................................... 39
6.1 Fontes primárias ........................................................................................................ 39
6.2 Fontes secundárias ..................................................................................................... 40
Introdução
O meu objetivo neste trabalho é descrever áreas principais do ocultismo, nas quais Fernando
Pessoa estava interessado durante a sua vida. O meu estudo trabalhará para apoiar as minhas
conclusões com escolha de trechos de obras prosaicas bem como com a análise de poemas
escolhidos do escritor.

O trabalho é constituído por dois capítulos introdutórios seguidos pela parte analítica
centrada em tendências ocultistas na vida e obra do autor. Primeiro, introduzirei Fernando
Pessoa e, em seguida, apresentarei o conceito de ocultismo em geral visto que a definição das
artes ocultistas é importante para a compreensão da obra pessoana. Focarei o conceito
principalmente desde uma perspetiva histórica, descreverei o seu significado, a ocorrência e a
sua utilização no passado. Continuando, espero dividir este tema em diversas áreas, que estão
diretamente ligadas ao ocultismo. Segundo elas, os capítulos individuais são chamados.
Delimitarei características da cada categoria e mostrarei como se manifestam em F. Pessoa.

A seguir quero explicar os procedimentos metodológicos, que utilizarei e o processo de


trabalho. Para conhecer melhor a vida e a obra do autor, procederei cronologicamente, desde
a juventude de Fernando Pessoa. Estava interessado no ocultismo desde quando trabalhou como
o tradutor de livros teosóficos e o seu interesse cresceu ao longo da sua vida. Apesar de publicar
apenas um livro português, criou uma série de fragmentos ricos, que contribuíram para o tema
do ocultismo e têm atraído o interesse público e científico. Como o foco da minha análise
escolhi cartas e poemas escolhidos da Mensagem e da coletânea Poemas Ocultistas porque
caracterizam adequadamente as tendências de Fernando Pessoa para o espiritismo. Concentrar-
me-ei nos poemas que se relacionam com temas ocultos como “O Encoberto” ou “O Último
Sortilégio” e dedicar-me-ei ao seu conteúdo. Aplicando informações teóricas da parte
antecedente, analisarei os poemas selecionados e oferecerei interpretações possíveis.
Observarei como o escritor transportou partes do seu pensamento filosófico para a poesia.

O texto discutirá também figuras importantes, com as quais Fernando Pessoa estava em
contato e que tiveram um impacto sobre ele e sobretudo influência na formação das suas
opiniões. Por exemplo, apontarei para a figura do bruxo inglês, Aleister Crowley, com o qual
Fernando Pessoa discutiu o tema da magia e astrologia. Também não omitirei os amigos
próximos do escritor, Mário de Sá-Carneiro e João Gaspar Simões, enquanto a correspondência
entre eles é uma fonte de informações interessante que revela a quantidade de manifestações de
tendências e ideias ocultistas de Pessoa.

1
Personalidade de Fernando Pessoa

Fernando António Nogueira de Seabra Pessoa, escritor e tradutor português, nasceu a 13 de


junho de 1888 em Lisboa, onde também morreu no ano 1935. Os seus pais igualmente estavam
interessados no campo da arte. A sua mãe compunha versos e falava várias línguas. O pai era
um crítico de música e um funcionário público. Após a morte do pai de tuberculose em 1893, a
mãe casou novamente e a família mudou-se para a África do Sul. Lá, Pessoa frequentou escolas
inglesas e começou a trabalhar nos seus primeiros poemas em inglês.1

Em 1894 Pessoa cria «Chevalier de Pas», o seu primeiro heterónimo, que lhe escreve
cartas.2 Para definirmos este substantivo podemos recorrer ao Dicionário Priberam da língua
portuguesa:
“Heterónimo, substantivo masculino
Nome e personagem inventados por um autor para assinar obras com estilos
literários diferentes.” 3

Há múltiplas personagens fictícias inventadas por Pessoa das quais mais conhecidas são
Álvaro de Campos, Ricardo Reis e Alberto Caeiro. Pessoa deu a cada heterónimo a sua própria
vida e personalidade como se fosse real. Cada personagem tinha o seu próprio estilo de escrita
e diferiram um do outro. Mas, na realidade, Fernando Pessoa estava escondido sob estes nomes.

No ano 1905 Fernando Pessoa retornou a Lisboa. Deixou os seus estudos, começou a
trabalhar e estava ativamente envolvido na vida cultural. Pertencia a um grupo saudosista, a
Renascença Portuguesa. Depois outras correntes entraram na sua poesia, nomeadamente o
futurismo e o cubismo. Na primavera de 1915 colaborou na publicação da primeira revista
modernista, Orpheu. Além disso, também escrevia para a revista Portugal Futurista,
Contemporânea, Presença e fundou a revista Athena. Além disso, é autor do denominado
«paulismo», um estilo artístico intitulado pela sua coleção poética Pauis. Usava também estilo
chamado «interseccionismo», influenciado pelo cubismo que é caracterizado por cruzamento

1
Burianová, Zuzana. Slovník spisovatelů Španělska a Portugalska: baskická literatura, galicijská literatura,
katalánská literatura, portugalská literatura, španělská literatura. Praha: Libri, 1999. ISBN 80-85983-54-0.
p.470.
2
Monteiro, George. Fernando Pessoa and Nineteenth-century Anglo-American Literature. Chronology of
Fernando Pessoa’s Life and Work. [online]. Lexington: The University Press of Kentucky, 2000. [cit. 2015-03-
17]. Disponível em:
https://books.google.cz/books?id=5TLLwMasVPUC&printsec=frontcover&hl=sk#v=onepage&q&f=false.
3
Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. [online]. 2008-2013. [cit. 2014-03-17]. Disponível em:
http://www.priberam.pt/dlpo/heter%C3%B3nimo.

2
dos planos, por exemplo o passado e o presente, e decomposição da realidade como no poema
conhecido “Chuva oblíqua” onde dois planos diferentes, o sonho e a realidade, ocorrem
simultaneamente. Durante a sua vida, publicou apenas as coleções de poemas Antinous, 35
Sonnets e English poems I-III escritas em inglês e uma obra poética Mensagem em português.
Também é conhecido pelas suas cartas de amor para Ofélia Queiroz.4

Fernando Pessoa foi considerado um gnóstico. Na sua autobiográfica do ano 1935


Pessoa fala sobre a sua religiosidade: “Sou Gnóstico cristão, fiel à Tradição Secreta do Cristianismo,
que tem íntimas relações com a Tradição Secreta em Israel (a santa Kabbalah) e com essência oculta da
Maçonaria.”5 Descreveu-se como um cristão gnóstico porque acreditava em Deus, mas teve
atitude crítica com a Igreja Católica e admitiu que pudesse haver mais divindades. Este fato
aparece frequentemente na sua obra. Na carta a Adolfo Casais Monteiro de 1935 Pessoa
comentou a sua crença:

“Creio na existência de mundos superiores ao nosso e de habitantes desses


mundos, em experiências de diversos graus de espiritualidade, subtilizando se
até se chegar a um Ente Supremo, que presumivelmente criou este mundo. Pode
ser que haja outros Entes, igualmente Supremos, que hajam criado outros
universos, e que esses universos coexistam com o nosso, interpenetradamente
ou não.”

O fascínio pelo transcendente, pelas ordens secretas e a sua sede de conhecimento levou-
o à viagem ocultística, ou mais precisamente levou-o a estudar o caminho iniciático, alquímico,
as tradições esotéricas, a filosofia hermética, a astrologia, a magia, a profecia e outras artes
relacionadas.6 Portanto, podemos concluir que a vida de Fernando Pessoa era uma procura
constante do entendimento e da verdade oculta.

4
Burianová, Zuzana. Slovník spisovatelů Španělska a Portugalska: baskická literatura, galicijská literatura,
katalánská literatura, portugalská literatura, španělská literatura. Op. cit. p. 470 e 471.
5
Pessoa, Fernando. Escritos íntimos, cartas e páginas autobiográficas. [online]. Edição António Quadros.
Lisboa: Publicações Europa-América, 1986. [cit. 2015-03-19]. Disponível em:
http://gnosisportugal.blogspot.cz/2010/09/luso-gnosticos_07.html. p.252.
6
Quadros, António. Estruturas simbólicas do imaginário na literatura portuguesa. Fernando Pessoa, Gnose,
mito e profecia. Lisboa: Átrio, 1992. ISBN 972-599-040-4. p. 93.

3
Definição de ocultismo

Homem desde tempos imemoriais tentava usar a natureza, manipulá-la e dominá-la. Queria
compreender o funcionamento dela e usá-la para seu próprio benefício. Para ganhar o poder da
natureza, ou, eventualmente, o poder dos deuses, praticava várias práticas mágicas. De acordo
com o historiador Richard Cavendish já em culturas antigas pessoas costumavam recorrer a
uma variedade de rituais. Utilizavam a magia para assegurar boas colheitas e fertilidade do seu
gado. Executavam as danças rituais, bem como várias cerimónias durante as quais davam a
oferta aos deuses, por exemplo, na forma de comida ou animal e pediam-lhes para uma boa
colheita. No antigo Egito, os faraós tinham uma parte importante porque se acreditava que
podiam controlar a chuva e assim afetavam a colheita. Além disso, a magia dos egípcios
manifestava-se ao mesmo tempo nos rios relacionados com a vida após a morte. Faraós
falecidos tinham vida feliz depois da morte, se os seus corpos tivessem sido mumificados. Itens
raros e caros foram inseridos nos seus túmulos para manter a sua riqueza depois da morte.
Ademais estátuas de servos ou trabalhadores foram adicionadas ao túmulo para servir no mundo
vindouro. Era um ritual frequente não só no Egito, mas também em outras áreas do mundo.7

Rituais ocultistas continuaram a ser utilizados para se defender contra o mal e diversas
doenças. Pessoas usavam vários amuletos e objetos mágicos destinados a protegê-las dos maus
espíritos e demônios. Era comum fabricar amuletos, talismãs e estatuetas para proteção. Desde
que se acreditava que as doenças eram causadas por maus espíritos, havia curandeiros, mais
tarde chamados exorcistas, quais expulsavam os espíritos do corpo do paciente. Como explica
o autor R. Cavendish, foram, principalmente, indivíduos mentalmente doentes, porque tal
pessoa age como se fosse obcecada. Os curandeiros usavam também muitas plantas medicinais
e durante a coleta das ervas exerciam rituais especiais e recitavam orações. O doente podia
tomar as drogas viciantes para melhorar o seu estado ou era frequente um corte da veia. Em
tempos pré-históricos, o xamã costumava dançar ao redor do paciente, cantar e recitar
encantamentos. Com a chegada do cristianismo começou-se a usar a água benta para o
tratamento. Considerava-se que os ossos e túmulos de santos, relíquias e imagens também
tinham o poder curativo.8

Em todo o mundo iam aparecendo pessoas às quais poderes miraculosos se atribuíam-


magos, profetas, astrólogos, druidas, xamãs e curandeiros já mencionados. Foram capazes de,

7
Cavendish, Richard. Dějiny magie. Praha: Odeon, 1994. ISBN 80-207-0509-0. p.7- 13.
8
Ibid., p. 40-65.

4
por exemplo, interpretar os sonhos, ler o futuro das estrelas ou fazer várias cerimônias. Alguns
deles eram altamente estimados na sociedade. Aconselhavam o rei ou eram responsáveis pela
educação da família real. No entanto, nem todos os apreciavam. Alguns tinham medo que a sua
magia poderia ser prejudicial e perigoso. Segundo o estudo de Richard Cavendish, acreditava-
se que os bruxos podiam tornar a terra infértil, invocar uma tempestade, chuva ou seca ou evocar
doença. Os eventos infelizes foram atribuídas à ação de magia prejudicial que foi caracterizada
pela maldição, vingança contra o inimigo, doença ou exantema. Além disso, magia era
conhecida pelo uso de estatuetas que imitavam pessoas. A figura feita à mão foi torturada e
queimada para ferir o homem a qual se quis fazer mal. Na Idade Média, bruxas eram acusadas
de tais atos durante a Inquisição. Dizia-se que podiam matar seres humanos ou gado, destruir
colheita, infligir loucura e influenciar o amor e a beleza. Além do mais, sabiam lidar com
venenos e preparar poções do amor. Mesmo invocavam espíritos para revelar-lhes o seu futuro.9

Em termos de etimologia, a partir do livro The Brill Dictionary of Religion, a palavra


ocultismo vem da França. Apareceu na primeira metade do século XIX no dicionário de Jean-
Baptiste Richard como «occultisme» e espalhou-se para o mundo principalmente graças ao
mago e escritor francês Eliphas Lévi (1810-1875). Aparentemente é derivada do latim, do
adjetivo «occultus», que significa «escondido». A palavra é frequentemente usada como
sinónimo do termo esoterismo, que também surgiu pela primeira vez na França. No entanto, o
sociólogo Edward A. Tiryakian na década de 70 do século XIX declarou, que o ocultismo não
era o sinônimo da palavra esoterismo, senão o seu uso prático.10 O esoterismo é, assim, uma
forma de pensamento enquanto o ocultismo inclui atos realizados. Todavia o ocultismo
desenvolveu-se desde século XIX e hoje em dia o termo é tão amplo que a diferença entre o
ocultismo e o esoterismo está borrada e os seus significados são muito semelhantes.

Sobretudo desde o Renascimento expressões relacionadas ao ocultismo começaram a


ser usadas, nomeadamente filosofia oculta e ciências ocultas. Estas ciências respetivamente
artes incluíram mais frequentemente magia, astrologia e alquimia.11 O mago Eliphas Lévi
derivou o termo ocultismo a partir da expressão «philosophia occulta», que remonta ao século
XVI, para designar e nomear observações e práticas relativas a estas artes ocultas. Desde então,
a palavra ocultismo é usada em dois sentidos: 1) qualquer prática que lida com ciências ocultas,
ou seja, um grupo de procedimentos utilizados. 2) Alguns especialistas entendem o ocultismo

9
Ibid., p. 44.
10
The Brill Dictionary of Religion. [online]. Vol. 3. Edição Kocku von Stuckrad. Leiden: Brill, 2006. [cit. 2015-
02-17]. Disponível em: https://www.academia.edu/1984053/Occultism. p. 1364-1368.
11
Ibid., p. 1365.

5
como uma corrente, que apareceu na segunda metade do século XIX em relação a Eliphas
Lévi.12 O ocultismo é, portanto, o estudo das propriedades e forças escondidas da natureza e
este termo abrange as práticas e rituais usados para manipular essas forças.13

A investigação oculta pode ser dividida em várias áreas básicas de interesse. Uma delas
é a astrologia, que estuda a influência dos planetas e estrelas sobre a vida humana. Tenta revelar
o destino através dos sinais celestiais e observa a posição dos corpos celestes que afetam não
só a natureza, mas também cada indivíduo. O uso mais comum da astrologia é a criação de
horóscopos que avaliam a saúde, a riqueza, a felicidade da família ou o sucesso profissional e
contêm previsões para o futuro. Já os babilónios formaram o zodíaco dividido em doze partes
representando os doze signos.14

Outra área importante, a alquimia, apareceu na Idade Média na Península Ibérica. Foi
baseada na manipulação de substâncias para alcançar mudanças e consequentemente obter
novas substâncias, por exemplo, o ouro. Acreditava-se que tudo era constituído por quatro
elementos- ar, água, fogo e terra e os alquimistas combinaram os para causar modificações
fundamentais na composição do material. Em seguida recriaram esse material alterado como
nova forma desejada. Além disso, outro objetivo dos alquimistas era criar um elixir da vida que
proporcionasse imortalidade.15

Este assunto está relacionado com muitas organizações, cultos, religiões e ordens como
a Maçonaria, organização Golden Dawn, cabala e Templarismo. O seu objetivo principal era
aprofundar o conhecimento do oculto. Outra das organizações que lidam com o ocultismo é a
Sociedade Teosófica fundada em 1875 por Helena Blavatsky. A sua intenção era estudar e
ensinar filosofias e ciências antigas, principalmente gregas, e religiões do mundo, por exemplo,
budismo, para adquirir conhecimento do oculto, de Deus e coisas divinas. Isso inclui o
autoconhecimento, a consciência da sua alma, o contato com o transcendente e, em fim, a união
com a entidade divina. A palavra Teosofia é um termo derivado do grego «theos», que é deus,
e «sophos», ou seja, sábio e significa literalmente sabedoria divina.16

12
Faivre, Antoine. Access to Western Esotericism. [online]. Albany: State University of New York Press, 1994.
eBook Collection. [cit. 2015-02-19]. Disponível em: EBSCOhost. p. 34.
13
Golden, Richard M. Encyclopedia of Witchcraft : The Western Tradition. [online]. Santa Barbara, Calif.:
ABC-CLIO, 2006. eBook Collection. [cit. 2015-02-19]. Disponível em: EBSCOhost. p. 846.
14
Ibid., p. 64 e 65.
15
Ibid., p. 27 e 28.
16
Blavatsky, Helena P. “O que é Teosofia?” Theosophical Articles. [online]. Los Angeles: Theosophy Company,
1981. [cit. 2015-03-25]. Disponível em: http://www.filosofiaesoterica.com/ler.php?id=801#.VRKgWY6G-JQ.
p. 39-47.

6
É interessante notar que algumas das práticas ocultistas foram preservadas até hoje.
Ainda hoje muitas pessoas recorrem aos oráculos e videntes. A sua prática de adivinhação inclui
leitura de cartas de tarô, interpretação dos sonhos ou quiromancia, que é a leitura das linhas da
mão. Muita gente confia em astrólogos e lê regularmente o seu horóscopo. Além disso,
preservou-se a crença que os planetas afetam a vida na Terra. Acredita-se, por exemplo, que a
Lua tem um efeito sobre o crescimento das plantas e, portanto, alguns usam o calendário lunar
em horticultura para saber quando é o momento certo para plantar. Algumas pessoas voltam
também para curandeiros naturais semelhantes a xamãs que utilizam métodos não
convencionais. No passado principalmente curavam os doentes e expulsavam demônios. Mas
pessoas tentam também conectar-se com os espíritos dos mortos e comunicar com eles.
Realizam sessões espíritas para comunicar com os seres sobrenaturais ou intencionalmente
perdem a consciência para entrarem em transe. Tudo isso mostra que o ocultismo não
permaneceu esquecido e continua aos dias de hoje.

7
Tendências ocultistas em Fernando Pessoa
4.1 Juventude

É um fato que o interesse de Fernando Pessoa pelo ocultismo nasceu muito cedo. Já durante os
seus estudos apareceu um dos primeiros heterónimos Alexander Search, a quem a maioria da
criação poética escrita em inglês é atribuída. Entre 1903 e 1909 criou poemas ingleses nos quais
manifestou-se o tópico de ocultismo e espiritismo e é considerado o seu heterónimo inglês
principal.

Em 1915 Pessoa recebeu uma encomenda da Livraria Clássica Editora de Lisboa para
traduzir duas obras de C. W. Leadbeater e Annie Besant, a líder da Escola Teosófica, para a
língua portuguesa. Foram os livros teosóficos intitulados Compêndio de Theosophia e Os
Ideaes da Theosophia.17 Fernando Pessoa confidenciou ao seu amigo muito próximo que outra
razão para a sua crise intelectual eram os livros teosóficos. Escreveu-lhe na carta datada de 6
de dezembro de 1915 sobre este assunto:

“A primeira parte da crise intelectual, já você sabe o que é; a que apareceu agora
deriva da circunstância de eu ter tomado conhecimento com as doutrinas
teosóficas. O modo como as conheci foi, como você sabe, banalíssimo. Tive de
traduzir livros teosóficos. Eu nada, absolutamente nada, conhecia do assunto.
Agora, como é natural, conheço a essência do sistema.”18

Embora no início não entendia a teoria e não tinha experiência nesse campo, a Teosofia
chamou a sua atenção. Pessoa continua na carta escrevendo: “A possibilidade de que ali, na
Teosofia, esteja a verdade real me «hante».”19, que confirma o seu interesse pelo assunto. No
entanto, critica a semelhança da Teosofia com a religião e descreve-a como uma «religião-
filosofia». Rejeita todas as ideias cristãs porque, como diz na carta, são incompatíveis com o
seu paganismo essencial. Apavora-lhe não só o mistério da Teosofia, mas também o
humanitarismo e apostolismo presente nela.20

17
Monteiro, George. Fernando Pessoa and Nineteenth-century Anglo-American Literature. Op. cit.
18
Pessoa, Fernando. Obra essencial de Fernando Pessoa. Cartas. Edição Richard Zenith. Rio de Mouro: Círculo
de Leitores, 2007. ISBN 978-972-42-4099-2. p. 139 e 140.
19
Ibid., p. 140.
20
Ibid.

8
Fernando Pessoa foi iniciado nas artes ocultas pela sua tia, Ana Luísa Pinheiro Nogueira
de Freitas, com quem viveu por algum tempo em Lisboa. Ela foi a única irmã da mãe de Pessoa,
uma espiritualista e médium. Pessoa participava em sessões espíritas na casa dela.

Na carta à tia Anica de 24 de junho de 1916 descreve o seu primeiro encontro com a
escrita automática:
“Aí por afins de Março (se não me engano) comecei a ser médium. Imagine!
Eu, que (como deve recordar-se) era um elemento atrasador nas sessões
semiespíritas que fazíamos, comecei, de repente, com a escrita automática.
Estava uma vez em casa, de noite, tendo vindo da Brasileira, quando senti a
vontade de, literalmente, pegar numa pena e pô-la sobre o papel.”21

Depois de voltar do Café Brasileira para casa, sentiu a necessidade de escrever. Durante
esta experiência noturna Fernando Pessoa escreveu, inconscientemente, a assinatura do seu tio
Manuel Gualdino da Cunha, que parecia uma assinatura manuscrita do próprio tio. Como ele
afirma, não tinha nenhum motivo para fazer isso nem estava pensando no tio Cunha. Naquela
noite continuou escrevendo mas o que produziu foi insignificativo. Isso lhe aconteceu muitas
vezes depois. Desta maneira comunicava com os espíritos. Às vezes as comunicações não foram
claras e por vezes foram compreensíveis. Fez perguntas aos seres misteriosos que lhe
responderam através do seu papel e a caneta. A resposta era, usualmente, na forma de número
ou desenho, respetivamente, era um rabisco. Como Fernando Pessoa declara, não foram
desenhos de coisas, mas de sinais cabalísticos e maçónicos, símbolos do ocultismo quais
considerou como muito misteriosos. Perguntando «Quem é que fala?» o espírito fez-lhe
desenhos ou escreveu-lhe números. Consultou estes acontecimentos com o seu bom amigo
(segundo o editor do livro Richard Zenith o nome de amigo era provavelmente Mariano
Santana), ocultista e magnetizador. Sabia explicar o simbolismo dos números, com a exceção
de apenas três dígitos. Não obstante, Pessoa não menciona a explicação na carta à tia.22

Nesse mesmo período não só participava em sessões, mas também compunha


horóscopos. Este interesse deu origem a um outro heterónimo, o astrólogo Raphael Baldaya,
em 1915. Era conhecido pela criação de horóscopos e escreveu uma obra intitulada Tratado de
Astrologia. Deu também consultas astrológicas por dinheiro e horóscopos pelo correio. Em
1916 o próprio Fernando Pessoa até considerou a possibilidade de se tornar um astrólogo em

21
Ibid., p. 146.
22
Ibid., p. 146 e 147.

9
Lisboa, mas não o realizou. No entanto, fez numerosos estudos baseando se na data do seu
nascimento e criou o seu mapa astrológico mesmo como mapas de alguns dos seus heterónimos.

Encontramos menções sobre a astrologia mesmo na carta à tia: “Como eu tinha previsto,
pela astrologia, a situação do Mário não só melhorou mas parece tender para melhorar cada vez mais.”23
Isso é mais uma prova de que, Pessoa estava ativamente interessado na astrologia. Após a morte
do escritor foram encontradas cartas astrais no seu espólio e esta tendência reflete-se também
na sua poesia, o que podemos observar no capítulo 4.3 “Astrologia”.

A carta à tia Anica revela também outras capacidades ocultistas que adquiriu. Uma delas
é mediunidade, ou seja, a capacidade de sentir almas e espíritos em si mesmo. Descreve que
sentiu o estado emocional e mental do seu amigo Mário de Sá-Carneiro:

“Descobri uma outra espécie de qualidade mediúnica, que até aqui eu não só
nunca sentira, mas que, por assim dizer, só sentira negativamente. Quando o Sá-
Carneiro atravessava em Paris a grande crise mental, que o havia de levar ao
suicídio, eu senti a crise aqui, caiu sobre mim uma súbita depressão vinda do
exterior, que eu, ao momento, não consegui explicar-me.”24

Mário de Sá-Carneiro foi um poeta e o melhor amigo de Fernando Pessoa. Conheceram-


se na universidade em Coimbra e quando Sá-Carneiro foi estudar a Paris, ficaram em contato
através de cartas. No ano 1916 Sá-Carneiro escreve a Pessoa que considera cometer suicídio.
Posteriormente morre de envenenamento por estricnina tóxica. Além disso, no ano anterior
ainda um outro acontecimento triste ocorreu e afetou Pessoa. A sua mãe Maria Madalena que
viveu na África em Pretória teve um acidente vascular cerebral. Curiosamente, Pessoa alegou
que graças à astrologia tinha previsto o acidente da sua mãe. 25

Não surpreende que o suicídio do amigo e os problemas de saúde da mãe causou-lhe a


depressão grave. Devido ao fato de que o seu pai morreu em 190626, é natural que teve medo
de perder a mãe também. Mas é notável que nesse estado emocional, Pessoa não perdeu o
interesse pelas artes ocultas e conseguiu comunicar com o outro mundo.

23
Ibid., p. 146.
24
Ibid., p. 147.
25
Biderman, Sol. “Mount Abiegnos and the masks. A study of occult imagery in William Butler Yeats and
Fernando Pessoa”. Alfa, revista de linguística [online]. Vol. 10, 1966. [cit. 2015-3-9]. Disponível em:
http://piwik.seer.fclar.unesp.br/alfa/article/viewFile/3282/3009. p. 39.
26
Monteiro, George. Fernando Pessoa and Nineteenth-century Anglo-American Literature. Chronology of
Fernando Pessoa’s Life and Work. Op. cit.

10
4.2 Astrologia

No livro de Richard Golden aprendemos que a arte de astrologia desenvolveu-se


independentemente em três regiões. Pela primeira vez apareceu na Mesopotâmia por volta de
2000 anos antes de Cristo. Em seguida espalhou-se para a China e, posteriormente, mesmo para
a América Central, onde é praticada até hoje. Por causa das conquistas de Alexandre o Grande,
no quarto século aC, as técnicas da astrologia mesopotâmica espalharam-se para o leste, a Índia
e o oeste para o Egito, onde combinaram-se com a filosofia e matemática grega e a religião
egípcia. No início do primeiro século dC já havia um sistema desenvolvido de signos do zodíaco
originalmente do Egito, uma lista de planetas com os seus efeitos e havia uma crença na
predestinação.27

Os astrólogos lidam com a influência dos astros e os movimentos dos planetas sobre a
vida humana. Observam como os corpos celestes afetam a natureza. Por exemplo, acreditava-
se, que Marte causa calor e a Lua traz chuva. Na Idade Média esta arte foi chamada astrologia
natural. Além disso, naquela época foi criada mais uma área, astrologia judicial, que, com base
em mapas do céu chegava-se a conclusões específicas sobre a saúde, o sucesso profissional ou
a riqueza. Mais, os astrólogos tentaram fazer previsões baseadas na data e a hora exata de
nascimento e a posição dos planetas no determinado dia. Também analisavam história e eventos
passados através dos planetas. Por último, mas não menos importante é de salientar que os
astrólogos tentavam responder às questões relacionadas com o futuro, prestavam atenção aos
sinais e presságios no céu estrelado e tentavam interpretar o destino. Por conseguinte, muitas
vezes tentavam influenciar o futuro utilizando magia ou amuletos planetários. Por volta do
século XVIII a astrologia foi usada também para detetar bruxas. Usando um mapa astral foi
possível determinar se a pessoa acusada era uma bruxa ou não. Isso foi evidenciado pela
presença de planetas Saturno e Marte no mapa astral, que foi a prova de que a pessoa tende à
bruxaria, enquanto Vénus e Júpiter provavam o contrário.28

A astrologia sofreu declínio após a queda do Império Romano e experimentou


hostilidade do cristianismo. Mas o ensinamento antigo foi preservado no Mediterrâneo e no
século XII desenvolveu-se junto com a alquimia e a medicina. Contribuíram para o seu
progresso, por exemplo Jean Bodin e Johannes Kepler. Séculos mais tarde, passos significativos

27
Golden, Richard M. Encyclopedia of Witchcraft : The Western Tradition. Op. cit. p. 64 e 65.
28
Ibid.

11
para a manutenção da astrologia foram feitos pela Sociedade Teosófica e o movimento New
Age.29

Fernando Pessoa estava interessado na prática da astrologia quase toda a sua vida.
Estudou muitos textos, por exemplo os manuais do astrólogo inglês Alan Leo. Pessoa foi um
teórico e também um praticante desta arte, criava mapas astrais e horóscopos. Segundo escritos
de Pessoa o horóscopo é definido de seguinte modo:

“O horóscopo não relata o que há antes do nascimento, nem o que há depois da


morte, embora se possa admitir que aspectos (direcções) em retrocesso, e em
sucessão da morte, possam indicar certos fenómenos externos relativos à vida,
por assim dizer, pré-natal e pós-mortal do indivíduo. Isto, porém, é duvidoso.

A vida é essencialmente acção, e o que o horóscopo indica é a acção que há na


vida do nativo.”30

O professor Jerónimo Pizarro no livro Cartas Astrológicas de Fernando Pessoa indica


que depois da morte do autor, os seus fragmentos foram encontrados no envelope com a
inscrição «Astrologia (theoria e pratica) e Separar». Entre eles havia numerosos horóscopos e
também o manuscrito Tratado da Astrologia de 1915, que escreveu sob o nome do seu
heterónimo, Raphael Baldaya. No livro descreve o que é a astrologia, a sua antiguidade, história
e teorias. O heterónimo Baldaya criou escritos teóricos que tratam de astrologia e horóscopos.
Os seus serviços profissionais custaram de 500 a 5000 reis. Um horóscopo de experiência, curto
e breve, valia 500 reis, um horóscopo completo que continha uma leitura detalhada da vida e
da sorte Baldaya oferecia por 2500 reis e um horóscopo detalhado custava 5000 reis. Mas,
curiosamente, Baldaya não assinou nenhuma carta astrológica. Na verdade, é Fernando Pessoa
que tinha o hábito de criar as cartas.31

É interessante que Pessoa escrevia horóscopos e mapas astrais mesmo antes de ter
inventado o astrólogo R. Baldaya. Este fato é comprovado pelos pedidos escritos de diferentes
pessoas. Essas ordens incluíram o nome, a data e a hora de nascimento do cliente. A partir
destes dados Pessoa foi capaz de determinar a posição dos planetas e criar uma previsão do

29
Ibid.
30
Pessoa, Fernando. A procura da verdade oculta: textos filosóficos e esotéricos. [online]. 2.a edição. António
Quadros. Lisboa: Publicações Europa-América, 1986. Coleção “Livros de Bolso Europa-América”. [cit. 2015-
3-7]. Disponível em: http://books.google.cz/books?id=V43uAAAAMAAJ. p. 158.
31
Pessoa, Fernando Cartas Astrológicas de Fenando Pessoa. [online]. Edição de Paulo Cardoso com a
colaboração de Jerónimo Pizarro. Lisboa: Bertrand Editora, 2011. ISBN: 978-972-25-2261-8. [cit. 2015-3-12].
Disponível em: https://www.academia.edu/1830141/Cartas_Astrol%C3%B3gicas. p. 21-23.

12
futuro. Também costumava horoscopar para si mesmo. Esboçou o seu mapa astrológico, os
mapas de alguns dos seus heterónimos e também de personalidades conhecidas como por
exemplo o décimo sexto rei de Portugal, D. Sebastião, como evidencia Figura 1.32

Figura 1: Mapa do céu do Desejado33

Os espaços iguais chamavam-se as doze casas do céu e o círculo, que as circunscreve


chamava-se o círculo de posição. Ao redor do círculo são escritos os signos constitutivos do
zodíaco. Na parte inferior esquerda da imagem vemos vários símbolos planetários,
concretamente são o Sol, Júpiter, Úrano, Mercúrio, Marte, e a Lua. Há vinte e um símbolos
constitutivos do alfabeto astrológico. Nove para os planetas, doze para os signos do zodíaco.
Cada planeta tem a sua própria significação, influencia no homem e dá lhe traços de
personalidade específicos.34

Paulo Cardoso, o renomado astrólogo português, teve acesso ao material vasto que
Fernando Pessoa deixou após a morte na célebre arca. Eram cerca de 27000 documentos que
estão atualmente na Biblioteca Nacional de Portugal. Encontrou um total de 318 horóscopos
feitos para os heterónimos poéticos de Pessoa e múltiplas pessoas entre os quais eram mesmo

32
Ibid., p. 23,24 e 94.
33
Ibid., p. 94.
34
Synesius. A astrologia: a astromancia kabalistica ; A astrologia scientifica judiciária e esférica. [online].
Lisboa: Livraria Clássica Editora, 1917. Coleção “Psicologia Experimental”- XI. [cit. 2015-03-26]. Disponível
em: http://casafernandopessoa.cm-lisboa.pt/bdigital/1-148. p. 19 e 46.

13
personalidades mundiais como artistas e políticos. Junto com o doutor Jerónimo Pizzaro, quem
explora a obra pessoana, publicou o livro Cartas astrológicas sobre todo esse material
astrológico incluindo interpretações dos horóscopos feitos pelo próprio Pessoa. No entanto,
como Paulo Cardoso confessou na entrevista do ano 2010, o grande problema era a dificuldade
de leitura dos manuscritos porque eram escritos a lápis e alguns deles continham frases
praticamente ilegíveis.35

Na entrevista conduzida por George Jorge e Márcia Bernardo, ambos astrólogos, Paulo
Cardoso definiu Fernando Pessoa como um astrólogo muito avançado. Disse que “os seus
conhecimentos eram tão profundos que ele realizava técnicas bastante complexas tais como:
progressões, direções primárias e secundárias, trânsitos, revoluções solares e lunares. Isto dá uma ideia
do tipo de relação e de profundidade com que ela trabalhava com a Astrologia.”36 O trabalho
astrológico de Pessoa juntamente com os cálculos complexos podemos ver na Figura 2.

Figura 2: Mapa astrológico de Fernando Pessoa feito por ele37

35
Jorge, George e Márcia Bernardo. “Entrevista: Paulo Cardoso, astrólogo português”. Escola Santista de
ASTROLOGIA. [online]. [cit. 2015-03-26]. Disponível em:
http://www.escolasantistadeastrologia.com.br/ent_Paulo_Cardoso.asp.
36
Ibid.
37
Ibid.

14
A mera interpretação do próprio horóscopo de Pessoa foi apresentada por muitos, desde
astrólogos e pesquisadores para leigos que estavam interessados. Além disso, hoje em dia estão
disponíveis também programas de computador, que criam a imagem astrológica com base nos
dados pessoais. Para este efeito recorremos à interpretação de Robert Hand no sítio
www.astro.com. Para os cálculos astrológicos, é necessário saber a data e a hora exata do
nascimento e o nome completo. De acordo com a data de nascimento de Pessoa, 13 de junho
de 1888, o seu signo do zodíaco é Gêmeos (de 21 de maio a 20 de junho). Portanto, não é
surpreendente, que tendia a criar outras personalidades, respetivamente heterónimos. Pelo fato
de que nasceu às 15h13m, embora na sua certidão de nascimento consta 15h20m38, o seu signo
ascendente é Escorpião. O ascendente revela aspetos da personalidade de Fernando Pessoa
como a sensibilidade, a introversão e a teimosia. Planetas Vénus, Sol e Plutão na casa oito
mostram o interesse de Pessoa pela dimensão oculta, o seu amor de investigar e o desejo de
crescimento pessoal.39

Os pesquisadores mencionados Paulo Cardoso e Jerónimo Pizzaro descobriram que


Fernando Pessoa foi capaz de determinar através da astrologia o momento da sua morte. Pessoa
fez o seu mapa astral e revelou corretamente o ano quando está destinado a morrer, 1935, mas
cometeu um erro no cálculo. Previu que morreria em janeiro ou março, mas estava errado. Paulo
Cardoso, especialista na astrologia, refez o mapa e corrigiu o número incorreto. Por conseguinte
calculou que o mês correto é novembro. Assim Fernando Pessoa quase previu a sua própria
morte.40

Fernando Pessoa usou o tema da astrologia também na sua criação poética. No seu único
trabalho lançado em português, Mensagem, publicou poemas para cada signo do zodíaco. O
livro é composto por três partes. A segunda parte intitulada “Mar Português” contém doze
poemas e cada um deles corresponde a um signo. Para demonstrar este fato nos podemos
concentrar no poema VII, chamado “Ocidente”, que de acordo com as teorias astrológicas tem
uma notável relação com o signo Libra:

38
Hipólito, Nuno. “Fernando Pessoa, Uma biografia do íntimo”. Um Fernando Pessoa. [online]. 2012/2013. [cit.
2015-03-30]. Disponível em: http://www.umfernandopessoa.com/uploads/1/6/1/3/16136746/fernando-pessoa-
biografia.pdf. p. 9.
39
Hand, Robert. “AstroClick Portrait for Fernando Pessoa”. [online]. Astrodienst AG 2006 [cit. 2015-03-31].
Disponível em: http://www.astro.com/cgi/aclch.cgi?btyp=ack&lang=e&nhor=3#cid=denfilec7xob3-
u1427791163&lang=e&btyp=ack&uniq=123643_22943&sx1=1&adult=1&AstroClick.x=8&AstroClick.y= 221
40
Blanco, José. “Fernando Pessoa ainda é o homem mais moderno do Mundo”. Correio de Manhã. [online].
2006. [cit. 2015-03-30]. Disponível em: http://www.cmjornal.xl.pt/domingo/detalhe/fernando-pessoa-ainda-e-
o-homem-mais-moderno-do-mundo.html.

15
“Com duas mãos – o Acto e o Destino -
Desvendámos. No mesmo gesto, ao céu
Uma ergue o fecho trémulo e divino
E a outra afasta o véu.

Fosse a hora que haver ou a que havia


A mão que ao Ocidente o véu rasgou,
Foi a alma a Ciência e corpo a Ousadia
Da mão que desvendou.

Fosse Acaso, ou Vontade, ou Temporal


A mão que ergueu o facho que luziu,
Foi Deus a alma e o corpo Portugal
Da mão que o conduziu.”41

Vitorino de Sousa interpretou astrologicamente o poema começando por explicação do


seu título. O poema é sétimo na ordem no livro. O número sete representa a sétima casa do céu,
mas mais importante, simboliza o sétimo signo do zodíaco, Libra. Além disso, o nome do
poema “Ocidente”, além de indicar para a direção dos descobrimentos, é associado com a
astrologia porque o signo Libra está localizado no oeste no zodíaco, ou seja, no ocidente. 42

As duas mãos no primeiro verso simbolizam visivelmente os braços da balança que


mede a massa. Em seguida, vemos um ato durante o qual força da gravidade empurra um braço
da balança para baixo, enquanto o outro se move para cima, para o céu. Isso simboliza a
cooperação das duas partes da balança que é necessária para o seu funcionamento específico.43

O poema refere-se à era das Grandes Navegações. Como indica o título, trata-se da
viagem para o ocidente durante a qual o Brasil foi descoberto. Como esclarece o professor
António A. Cirurgião, a Ciência e a Ousadia na segunda estrofe simbolizam as propriedades
necessárias para a descoberta bem-sucedida de novos mundos.44 Na última estrofe Fernando
Pessoa diz que durante a época das descobertas marítimas “Foi Deus a alma e corpo Portugal”45,
significando que a nação portuguesa foi predestinada por Deus a chegar às terras do Ocidente.

41
Pessoa, Fernando. Mensagem e outros poemas afins. Introdução, organização e biobibliografia de António
Quadros. 2.a edição. Mem Martins: Publicações Europa-América, 1986. p. 112.
42
Sousa, Vitorino de. “Astrologia e Fernando Pessoa II”. Espaço Astrológico. [online]. 2011. [cit. 2015-03-31].
Disponível em: http://espacoastrologico.org/a-astrologia-e-fernando-pessoa-ii/.
43
Ibid.
44
Cirurgião, António. O «olhar esfíngico» da Mensagem de Pessoa. Lisboa: Instituto de Cultura e Língua
Portuguesa, 1990. ISBN 972-566-115-X. p. 175.
45
Pessoa, Fernando. Mensagem e outros poemas afins. Op. cit. p. 112.

16
4.3 Profecias

Várias previsões sobre o futuro do mundo apareceram na história. Uma delas é a profecia que
fala do retorno do rei de Portugal perdido, Dom Sebastião I, e deu origem a fé chamada
sebastianismo. Outra das muitas hipóteses ou mitos bem conhecida fala sobre o Quinto Império,
o império, cujo estabelecimento criará uma nova era. Não é apenas um território terrestre
comum. Inclui todo o mundo, seja material, bem como espiritual. Esta crença na forma da
unificação do mundo mais alta e final é baseada numa previsão do segundo capítulo do Livro
de Daniel. Foi desenvolvida pelo jesuíta português António Vieira no século XVII. O conceito
é frequentemente associado com Portugal. Tornou-se conhecido graças ao trabalho poético
Mensagem do autor português, Fernando Pessoa, no qual não só a gloriosa época das grandes
navegações dos portugueses é retratada, mas também esperanças para o futuro, sebastianismo
e a esperança de renovação do país estagnado. As ideias são mais desenvolvidas por Pessoa no
livro Sobre Portugal- Introdução ao problema nacional.

As raízes deste conceito podem ser encontradas já no Velho Testamento- no livro 32 de


Daniel, capítulo dois, que conta a história bíblica conhecida intitulado “O sonho do rei”. O
soberano de Babilônia Nabucodonosor, que reinou de 605 a 562 aC, teve um sonho perturbador.
Por isso, convocou magos e videntes para dizer-lhe e explicar o sentido da visão. No entanto,
ninguém foi capaz de cumprir o pedido, apesar das ameaças do rei. Até o dia em que Daniel,
através da oração, recebeu uma revelação divina do sonho do rei e também a sua interpretação.
Disse ao rei o que tinha visto. Em frente de ele estava uma estátua grande e assustadora de um
homem de materiais diferentes. A cabeça era feita de ouro, o peito e os braços eram de prata, e
a barriga e as coxas de bronze. Pernas de ferro e os pés com os dedos em parte de ferro e em
parte de barro. Depois uma pedra caiu, sem justa causa, e atingiu a estátua nos pés. Quando
foram esmagados, tudo ruiu independentemente de se tratar de ouro ou prata. Não permaneceu
nada da figura inicial, mas a pedra caída transformou-se numa grande montanha.46

Tendo descrito as visões da noite, Daniel começou a interpretar o sentido profético


delas. Primeiramente disse que Nabucodonosor era rei porque tinha recebido o poder de Deus.
Ele fê-lo poderoso e famoso. Portanto, ele é como a cabeça de ouro da estátua no sonho. Passou
a explicar a importância dos outros materiais utilizados. Como a cabeça de ouro, ou seja,

46
The Bible, Douay-Rheims: Book 32: Daniel. [online]. Etext n. 8332. Edição 10. Preparado por David Widger.
Project Gutenberg, 2005. [cit. 2014-12-30]. Disponível em:
http://www.gutenberg.org/cache/epub/8332/pg8332.txt. Sem paginação.

17
Nabucodonosor, representa Babilônia, também os restantes três substâncias simbolizam três
impérios. Eles ocorreram após a queda do império anterior, mas foram mais fracos do que o
Império Babilônico, que estava condenado a queda. Por último o quarto reino de ferro surgiu,
mas a mistura de ferro e de barro simboliza a incongruidade e incoerência do império. Naquela
época, virá o reino criado por Deus, mais forte do que todos os outros. Destruirá e substituirá
os impérios na terra e durará para sempre,47 quer dizer, o Quinto Império.

O motivo é desenvolvido em um estilo semelhante no sétimo capítulo, em que se escreve


sobre uma outra visão de Daniel. Sonhou sobre quatro ventos rebeldes acima do nível do mar
e, em seguida, sobre quatro grandes bestas divergentes saindo da água. Uma parecia um leão
com asas de águia. No entanto, as suas asas foram quebradas e de repente a besta estava em pé
na terra como um homem e recebeu um coração humano. Outra tinha aparência dum urso e o
seu papel era comer um monte de corpos. A terceira parecia ser um leopardo, mas com quatro
cabeças e com quatro asas de pássaro nas costas. A este animal foi dado o poder. A quarta besta,
a mais assustadora, tinha uma força enorme. O que não destruiu com os dentes de ferro, pisoteou
com pernas poderosas. Tinha dez cornos. De repente, três deles caíram e em vez deles apareceu
um outro com boca orgulhosa. O sonho continua com a revelação de figura divina em branco
sentada no trono de fogo, representando o tribunal. O quarto animal foi matado pelas chamas
por causa do seu orgulho e os outros animais foram privados do seu poder. Finalmente, um
homem veio para a frente de Deus e foi-lhe dada fama e poder eterno sobre o reino sem fim.48

Os quatro animais que saíram do mar, representam, assim como as partes do corpo da
escultura no segundo capítulo, quatro reinos. O último deles engoliu e pisoteou o mundo inteiro.
Os dez chifres simbolizam dez reis do reino. No entanto, três deles, como três chifres na cabeça
da besta, deporá um outro rei. Fará guerra contra os santos, mas Deus dará um julgamento que
destruirá o seu poder e atribuirá os reinos ao povo santo para sempre. 49 O corno com boca
representa, portanto, o último governante antes de estabelecimento do Reino de Deus eterno na
terra.

A visão apocalíptica tornou-se um assunto de interesse de muitos teólogos que se


dedicaram não só à escatologia. O Livro de Daniel não menciona os nomes dos impérios, que
resultou em formação de várias teorias e interpretações do texto bíblico. Uma delas é a ideia
dum missionário, sacerdote e escritor religioso, Padre António Vieira. Segundo ele, o primeiro

47
Ibid.
48
Ibid.
49
Ibid.

18
império foi liderado por Nabucodonosor, Império Assírio ou Babilónico. O segundo reino foi
Pérsia sob o domínio do rei e fundador do Império Persa, Ciro II, o Grande. Para o terceiro
considerava o Império Grego. Como o quarto menciona César, ou seja, o Império Romano.
Ponderava que após os quatro governos terrestres ocorrerá quinto, império de Deus, que será
implementado através de Portugal.50

O escritor e pregador barroco deixou depois da sua morte uma obra inacabada, Clavis
prophetarum, cuja edição e tradução do latim ainda não está completa. O seu próximo livro
intitulado História de Futuro publicado no século XVIII é escrito em português porque foi
dedicado à nação portuguesa e serviu não só como uma celebração do povo português e a sua
história, mas também como uma guia de como o país deve reconstruir-se para poder realizar o
sonho do Quinto Império. Ambos os livros tratam de estabelecimento do império, que seria
liderado pelo rei português. P. Vieira começou a trabalhar com esta questão escatológica pela
primeira vez já numa carta de 1659, que foi enviada ao seu amigo, bispo do Japão.51

As suas teorias e também as ideias de Fernando Pessoa foram inspiradas, sem dúvida,
num escritor português do século XVI, António Gonçalves de Bandarra. Pessoa dedicou-lhe
um poema intitulado “O Bandarra” que prova o seu interesse pelas teorias proféticas dele. No
poema Pessoa fala sobre este “plebeu”, o sapateiro de Trancoso:

“Sonhava, anónimo e disperso,


O Império por Deus mesmo visto,
Confuso como o Universo
E plebeu como Jesus Cristo.

Não foi nem santo nem herói,


Mas Deus sagrou com Seu sinal
Este, cujo coração foi
Não português mas Portugal.”52

No trabalho Trovas do Bandarra o autor de Trancoso interpretou as profecias bíblicas


sobre o fim do mundo e descreveu o destino de Portugal e o conceito do Quinto Império. Além
disso, predisse o retorno do Encoberto, que nos leva à ligação com D. Sebastião e a fé no seu

50
Marques, João Francisco. “A utopia do Quinto Império em Vieira e nos pregadores da Restauração”. E-topia:
Revista Electrónica de Estudos sobre a Utopia. [online]. Porto: Universidade do Porto, 2004. [cit. 2015-04-
02]. Disponível em: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/artigo10551.pdf. p. 3.
51
Valdez, M. Ana Travassos. Historical Interpretations of the „Fifth Empire“: The Dynamics of Periodization
from Daniel to António Vieira, S. J. [online]. Leiden: Brill, 2011. [cit. 2015-04-02]. Disponível em:
https://books.google.cz/books?id=6mLKZ9tuLzUC&printsec=frontcover&hl=sk#v=onepage&q&f=false. p. 39.
52
Pessoa, Fernando. Mensagem e outros poemas afins. Op. cit. p. 119.

19
retorno, que se espalhou sob o nome de sebastianismo. O rei desapareceu a 4 de agosto de 1578
no norte de Marrocos durante a Batalha de Alcácer- Quibir.53 O que é interessante é que António
G. de Bandarra morreu em 1556, antes do desaparecimento de D. Sebastião. Embora a perda
do rei de Portugal, Sebastião I, marque o fim de dinastia de Avis, deu origem a este novo culto,
a crença que o monarca retornará para salvar o país e trá-lo-á ao Quinto Império próspero.
António Vieira acreditava na profecia de António de Bandarra e também no sebastianismo, o
que se refletiu na sua obra.

No livro Sobre Portugal Pessoa dedica uns capítulos inteiros à crença sebastianista.
Explica os princípios essenciais da fé, apresenta uma definição de religião e depois concentra-
se na nação. Após esta introdução desenvolve a sua teoria sebastianista:

“O sebastianismo, fundamentalmente, o que é? É um movimento religioso, feito


em volta duma figura nacional, no sentido dum mito.

No sentido simbólico D. Sebastião é Portugal: Portugal que perdeu a sua


grandeza com D. Sebastião, e que só voltará a tê-la com o regresso dele,
regresso simbólico - como, por um mistério espantoso e divino, a própria vida
dele fora simbólica - mas em que não é absurdo confiar.

D. Sebastião voltará, diz a lenda, por uma manhã de névoa, no seu cavalo
branco, vindo da ilha longínqua onde esteve esperando a hora da volta.”54

De acordo com Fernando Pessoa três falsos Encobertos apareceram na história. O


primeiro foi o rei D. João IV que veio poucos anos após o desaparecimento de D. Sebastião.
Considerou o Marquês de Pombal como o segundo por causa da sua obra benéfica para o país.
O terceiro foi Sidónio Pais que impressionou a Pessoa com o seu poder. 55 Ele até mesmo
dedicou-lhe um poema intitulado “À memória do presidente-rei Sidónio Pais”.56 Desta forma,
tentava renovar o mito sebastianista e encontrar aquele que liderará o povo ao Mundo Novo.
Mas como este Império Novo surgirá?

António Vieira no seu livro utópico a História do Futuro afirma, que o quarto e assim
último império, antes de formação do Quinto Império de Deus, é o Império Romano. Retratou
este país como decadente, que incentiva a teoria de um outro reino, que seguirá depois do fim

53
Ibid., p. 25 e 26.
54
Pessoa, Fernando. Sobre Portugal: introdução ao problema Nacional. [online] Lisboa: Ática, 1978. [cit. 2015-
1-2]. Disponível em: http://minhateca.com.br/tetykelly/Livros/Fernando+Pessoa+-
+Sobre+Portugal*2c+Introducao+Ao+Problema+Nacional,3847381.rtf. p. 162.
55
Ibid. p. 149.
56
Pessoa, Fernando. Mensagem e outros poemas afins. Op. cit. p. 127.

20
inevitável dos Romanos e representará o passo seguinte na história do mundo. No entanto, o
império novamente formado será superior a todos os reis da terra e terá duração eterna. Ainda
define o significado de termo eternidade e afirma que deveria ser entendido mais como a
continuidade. O poder do império será nas mãos de Cristo, que reinará através de seus vigários-
o papa e o imperador. O Papa representará o poder espiritual e o imperador a autoridade sobre
todas as nações. Mas não menciona a necessidade da segunda vinda de Cristo na terra. Este
império será, sem dúvida, um país de cristãos, os quais reunirá como unirá o mundo inteiro
através do evangelismo.57 Portanto, podemos dizer que é uma continuação da Igreja Católica.

Na obra Clavis prophetarum prevê o nascimento do Quinto Império após a derrota do


Anticristo e quando haver uma conversão global. De acordo com a sua teoria, o Anticristo são
os turcos, mais precisamente o Império Otomano, porque enfraquecem a fé cristã.
Definitivamente derrotá-los-á o Rei de Portugal, o que dará a possibilidade de formação de um
novo reino.58 É possível que tenha relação com a lenda da Batalha de Ourique, que ocorreu em
1139. Neste mito D. Afonso Henriques foi visitado por um velho homem que lhe mostrou uma
revelação profética da vitória e ordenhou-lhe sair o acampamento. Afonso I obedeceu e depois
viu um feixe de luz que criou o símbolo da cruz. Subitamente Cristo prometeu-lhe a vitória
nesta e em outras batalhas seguintes contra os inimigos da Cruz. No dia seguinte, o rei realmente
venceu a Batalha de Ourique, derrotando cinco reis mouros.59 Isto deu origem não só para a
nova aparência da bandeira portuguesa, mas também assegurou a crença, que Portugal é
certamente escolhido e predestinado por Deus para governar o Quinto Império.

Séculos mais tarde, Fernando Pessoa descreveu um sistema de impérios semelhante.


Embora bem como António Vieira, pensasse que Portugal se tornaria o Quinto Império,
parcialmente reformulou a teoria. A sua interpretação não se assemelha mais à de Daniel e ao
sonho do rei. Criou uma nova divisão começando com a Grécia. Considerava o Império
Romano como o segundo, seguido pelo Império Cristão. O quarto em linha era a Europa e o
quinto pertencia a Portugal.

“No plano intelectual, como o reino da Intelligencia começa só com a Grecia,


onde nasceu o espirito critico, que é o em que a intelligencia se define, os quatro

57
Valdez, Maria Ana T. Rethinking the Fifth Empire: António Vieira and the Clavis Prophetarum. [online].
SciELO- A Scientific Electronic Library Online. 2012. ISSN 1645-6432. [cit. 2015-1-1]. Disponível em:
http://www.scielo.gpeari.mctes.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-
64322012000200003&lng=pt&nrm=iso&tlng=en.
58
Ibid.
59
“Lenda do Milagre de Ourique”. Lendarium. [online]. [cit. 2015-1-2]. Disponível em:
http://www.lendarium.org/narrative/lenda-do-milagre-de-ourique/.

21
impérios são o grego, o romano, o cristão ou medieval, o europeu, e ainda falta
o quinto, que deverá ser o Universal.”60

Pessoa anunciou esta divisão também na sua obra poética Mensagem, onde incluiu três
poemas sobre os profetas António Gonçalves de Bandarra, Padre António Vieira e o último
possivelmente ele próprio. Passemos à terceira parte chamada “O Encoberto”, o segundo poema
intitulado “O Quinto Império”:

“Grécia, Roma, Cristandade,


Europa- os quatro se vão
Para onde vai toda idade.”61

O autor da Mensagem apresentou o seu ponto de vista não só na sua obra. Durante a
entrevista para a Revista Portuguesa respondeu à pergunta, qual é na sua opinião o futuro da
raça portuguesa:

“O Quinto Império. O futuro de Portugal- que não calculo, mas sei- está escrito
já, para quem saiba lê-lo, nas trovas do Bandarra, e também nas quadras de
Nostradamus.”62

Vemos assim que refletindo a partir de António Bandarra e outros profetas apresenta o
seu interesse em sebastianismo e Quinto Império, sobretudo no trabalho Sobre Portugal:
introdução ao problema nacional. Segundo ele, todo o império é baseado na criação da
civilização espiritual. Não é mais uma forma terrestre, mas o mundo espiritual localizado fora
do material, que subjugará o povo na terra porque, como diz Pessoa, contra a força do espírito
não há resistência. Isto acontecerá sob a liderança da nação portuguesa, porque só ela tem um
poder espiritual suficiente e, além disso, já tinha mostrado este poder durante o período dos
Descobrimentos. 63

60
Uribe, Jorge e Pedro Sepúlveda. “Sebastianismo e quinto império: o nacionalismo pessoano à luz de um novo
corpus”. Pessoa Plural. [online]. Nº 1. 2012. Disponível em:
https://www.academia.edu/1948338/Sebastianismo_e_Quinto_Imp%C3%A9rio_O_nacionalismo_pessoano_%
C3%A0_luz_de_um_novo_corpus. p. 14.
61
Pessoa, Fernando. Mensagem e outros poemas afins. Op. cit. p. 117.
62
Pessoa, Fernando. Prosa Publicada em Vida. Rio de Mouro: Círculo de Leitores, 2006. ISBN 978-972-42-
3897-5. p. 201.
63
Pessoa, Fernando. Sobre Portugal: introdução ao problema Nacional. Op. cit. p. 162.

22
4.4 Alquimia

As raízes da alquimia podem ser encontradas na China antiga, e a sua origem está intimamente
relacionada com o desenvolvimento da metalurgia. Esta alquimia do Oriente concentrava-se
sobretudo na criação de um elixir da longa vida que proporcionasse a saúde, a regeneração, a
longevidade ou até mesmo a imortalidade. Subsequentemente a alquimia evoluiu na Europa
Ocidental. Passou para Alexandria, Bizâncio, Egito, Pérsia, Grécia, Roma e após a conquista
do Egito e da Pérsia, a arte se espalhou também entre os árabes. Consequentemente foi
introduzida na península Ibérica pela nação árabe.

O objetivo dos alquimistas mais conhecido era conseguir ouro de metais inferiores.
Portanto, tentavam obter uma substância chamada pedra filosofal, com qual seria possível
transmutar qualquer metal em ouro. Manipulavam matéria para provocar modificações e por
conseguinte produzir novas substâncias. O processo frequente foi a douração e a coloração.

A alquimia pode ser entendida de diversas maneiras:


“(…) é uma filosofia hermética, uma doutrina espiritual, arte sagrada ou ciência
oculta, para outros é um método, uma técnica, que se funda em um conjunto
coerente de teorias relativas à constituição da matéria, à formação das
substâncias inanimadas e viventes.” 64

De acordo com a autora da definição proporcionada, a primeira perspetiva considera-a


como um sistema filosófico cujo objetivo é entender o funcionamento do mundo, compreender
a si mesmo e assim aperfeiçoar-se. É um processo semelhante à transmutação de chumbo em
ouro. Mas em vez de chumbo, a própria personalidade é transformada. O resultado é a obtenção
de ouro ou, por outras palavras, da sabedoria.
A segunda vertente relaciona-se com a química moderna. A alquimia é considerada
como precursora da química porque os alquimistas contribuíram para o desenvolvimento da
ciência graças a muitas descobertas de novas substâncias utilizando procedimentos, que são
semelhantes aos atuais. Como no presente, para o seu trabalho precisavam de dispositivos
especiais, nomeadamente o athanor que é um forno usado para transmitir calor. Outro foi o
alambique que é um equipamento de destilação da origem antiga.65

64
Lima, Tania Andrade. “Alquimia, Ocultismo, Maçonaria: o ouro e o simbolismo hermético dos cadinhos
(Séculos XVIII e XIX)”. [online]. SciELO- A Scientific Electronic Library Online, 2001. [cit. 2015-03-04].
Disponível em
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-47142001000100002. p. 22.
65
Golden, Richard M. Encyclopedia of Witchcraft : The Western Tradition. Op. cit. p. 28.

23
Os processos de operação não foram muito diferentes de química moderna, mas o que
foi diferente é o entendimento da composição da matéria. Como Fernando Pessoa escreve:

“A chimica occulta, ou alchimia, differe da chimica vulgar ou normal, apenas


quanto à theoria da constituição da matéria; os processos de operação não
differem exteriormente, nem os apparelhos que se empregam. É o sentido, com
que os apparelhos se empregam, e com que as operações são feitas, que
estabelece a differença entre a chimica e a alchimia.”66

Acreditava-se que existiam quatro elementos principais a partir dos quais tudo foi
construído. Os alquimistas trabalharam com estes elementos, fogo, terra, ar e água,
combinaram-nos e mudaram-nos para alcançar as mudanças desejadas. Cada um dos elementos
tem certas características. O fogo é quente e seco mas a água é fria e húmida. A terra é fria e
seca e o ar é quente e ao mesmo tempo húmido. O fogo e o ar são, portanto, em harmonia,
porque compartilham a mesma qualidade, o calor, enquanto ambos os elementos, a terra e a
água, são frios.67
O processo alquímico tinha várias etapas principais: a primeira foi a purificação,
também chamado enegrecimento, quando o alquimista tomou a sua matéria-prima e purificou-
a. Em seguida, o material resultante foi separado e subsequentemente unido novamente na
forma alterada. Foi uma série de operações complexas incluindo o aquecimento do material, a
destilação e outras alterações repetidas tantas vezes quanto foi necessário.68 Desta maneira
tentaram criar metais preciosos de metais considerados de menor qualidade. Devido a esse
processo, surgiu a ideia de que os próprios alquimistas podem submeter-se à transformação
espiritual. Fernando Pessoa ocupava-se desta ideia e acreditava que a própria personalidade
podia ser transformada, o que observamos na carta a Adolfo Casais Monteiro de 1935:

“Há três caminhos para o oculto: o caminho mágico (incluindo práticas como
as do espiritismo, intelectualmente ao nível da bruxaria, que é magia também),
caminho esse extremamente perigoso, em todos os sentidos; o caminho místico,
que não tem propriamente perigos, mas é incerto e lento; e o que se chama o
caminho alquímico, o mais difícil e o mais perfeito de todos, porque envolve

66
Centeno, Y. K.. Fernando Pessoa, o amor, a morte, a iniciação. [online]. Lisboa: Regra do Jogo, 1985. [cit.
2015-3-6]. Disponível em: https://books.google.cz/books?id=kjATAQAAMAAJ. p. 125.
67
Golden, Richard M. Encyclopedia of Witchcraft : The Western Tradition. Op. cit. p. 28.
68
Ibid.

24
uma transmutação da própria personalidade que a prepara, sem grandes riscos,
antes com defesas que os outros caminhos não têm.” 69

Fernando Pessoa compara a transformação de alquimista à criação poética de poeta.


Segundo ele há quatro fases no processo alquímico, processo no qual realiza a sua poesia:

“O génio é uma alquimia. O processo alquímico é quadruplo: 1) putrefação; 2)


albação; 3) rubificação; 4) sublimação. Deixam-se, primeiro, apodrecer as
sensações; depois de mortas embranquecem-se com a memória; em seguida
rubificam-se com a imaginação; finalmente se sublimam pela expressão.”70

No estudo de Mathias Rogério Ribeiro podemos ver que Fernando Pessoa tende para a
ideia de transformação através da poesia:

“A transmutação, o desdobramento e uma série de facetas pessoanas podem


estar relacionados com sua busca alquímica, podem ser degraus que levam o
poeta ao encontro de sua natureza, da compreensão da vida e da morte, do
conhecimento de si e do outro. A poesia, através do ilegível, do simbólico, do
simulado, da reflexão e de outros atributos, pode ser a via para a obtenção do
“ouro”.”71

O autor explica que de acordo com Fernando Pessoa há o corpo, ou seja, o «eu terrestre»,
e o «eu verdadeiro», profundo, que permanece oculto. O poeta deve aproximar-se do seu eu
verdadeiro por meio da alquimia e assim alcançar o autoconhecimento libertando-se do seu eu
terrestre. É um caminho de purificação espiritual, no fim do qual o corpo volta ao seu estado de
pureza, ao eu profundo. Durante esta viagem o homem toma consciência das suas imperfeições,
percebe as suas deficiências e, por conseguinte, pode aperfeiçoar-se e transformar-se. Fernando
Pessoa estava convencido de que as transformações podem ser obtidas pela alquimia que seria
feita pela sua criação poética. O autor do estudo considera que a heteronímia pessoana pode ser
uma via alquímica e um método para obtenção de ouro, o mais perfeito de todos metais, que
neste sentido representa a perfeição e a inteligência: 72

69
Pessoa, Fernando. Obra essencial de Fernando Pessoa. Cartas. Op. cit. p. 425.
70
Quadros, António. Fernando Pessoa, vida, personalidade e génio. [online]. Lisboa: Publicações Dom
Quixote, 1984. [cit. 2015-3-6]. Disponível em: https://books.google.cz/books?id=f-obAQAAMAAJ. p. 283.
71
Ribeiro, Mathias Rogério. Esoterismo e ocultismo em Fernando Pessoa. [online]. Dissertação (Mestrado).
Instituto de Letras. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2009. [cit. 2015-3-7]. Disponível em:
http://www.bdtd.ndc.uff.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=3709. p. 20.
72
Ibid., p. 68 e 69.

25
“Para Fernando Pessoa, o desdobramento da personalidade em diversos
heterônimos será algo necessário; somente depois de sentir tudo de todas as
maneiras, de ser vários, ele poderia chegar a uma unidade. Esse desdobramento
pode estar ligado ao caminho alquímico, seria um processo alquímico, um
desenvolvimento e um caminho evolutivo, (…)”73

Em textos alquímicos foram utilizados símbolos, metáforas complexas e termos


técnicos. Por isso a alquimia não foi acessível a qualquer pessoa. O seu conteúdo foi escondido
na rede de símbolos para evitar que seja interpretado mal ou caia nas mãos de alguma pessoa
indigna. Deve se ao fato de que a alquimia era considerada uma arte perigosa e privilegiada,
apenas para os iniciados e os dirigidos por um mestre. Os símbolos individuais representavam
sobretudo as partes da natureza como os quatro elementos (fogo, ar, terra e água), animais,
plantas e planetas. Segundo Fernando Pessoa cada objeto no mundo material tem o símbolo
correspondente. O simbolismo alquímico é analisado por Pessoa nas linhas seguintes:

“Mas, ao mesmo tempo, os elementos que compõem a materia teem um outro


sentido; existem não só como matéria, mas tambem como symbolo. Ha, por
exemplo, um ferro-materia; ha, porem, e ao mesmo tempo, e o mesmo ferro, um
ferro-symbolo. Cada elemento symboliza determinada linha de força
supermaterial e pode, portanto, ser realizada sobre elle uma operação, ou acção,
que o atinja e o altere, não só no que elemento, mas tambem no que symbolo.
E, feita essa operação, o efeito produzido excede transcendentemente o efeito
material que fica visível, sensível, mensuravel no vaso ou aparelho em que a
experiencia se realizou.”74

Entretanto, a simbologia nos escritos alquímicos causou inacessibilidade desta arte e


consequentemente o declínio da credibilidade. O declínio da alquimia foi provocado também
pela impossibilidade de comprovar empiricamente os resultados. A alquimia tornou-se, assim,
enfraquecida e muitos dos seus investigadores migraram para pesquisas no campo da química.
E, além disso, da alquimia derivaram não só a química mas também a farmacologia e outras
vertentes, por exemplo, a filosofia hermética.75

73
Ibid., p. 69.
74
Centeno, Y. K.. Fernando Pessoa, o amor, a morte, a iniciação. Op. cit. p. 125 e 126.
75
Oliveira, Anderson Amaral. A alquimia da palavra: Fernando Pessoa e as ciências ocultas. [online].
Dissertação (Mestrado). Centro de Artes e Letras. Santa Maria: Universidade Federal de Santa Maria, 2011.
Disponível em: http://cascavel.cpd.ufsm.br/tede/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=4264. p. 35

26
4.5 Ordens secretas

Com um interesse crescente nas artes ocultas durante a história, pessoas começaram a agrupar-
se e formar várias associações secretas. Entre os grupos mais significativos, que atraíram
interesse público não só em Portugal, entram a Maçonaria, a Ordem Templária e a Ordem Rosa-
Cruz. O seu objetivo principal era preservar os ensinamentos e proteger os membros das Ordens
às hostilidades dos não envolvidos. As associações formaram Mestres para transmitirem os
ensinamentos e as suas tradições. O papel do Mestre era iniciar candidatos que desejaram
tornar-se membros e revelar-lhes segredos e simbologia secreta. A compreensão da simbologia
comprovava eventualmente a filiação do membro na ordem e distinguia-o dos não-iniciados.76
Para compreendermos melhor o significado da palavra iniciação, podemos recorrer ao
Dicionário Priberam da língua portuguesa:

“Iniciação, substantivo feminino


1. Acto ou efeito de iniciar.
2. Comunicação do conhecimento de coisas secretas.
3. Entrada em qualquer sociedade secreta.
4. Primeira experiência numa actividade ou no conhecimento de algo.”77

Fernando Pessoa também lida em detalhe com o conceito de iniciação e oferece-nos


uma definição:

„Iniciar alguém, no sentido hermético, é conferir-lhe conhecimentos que ele não


poderia obter por si, quer pela leitura de livros, quer pelo exercício da sua
inteligência, por forte que ela seja, quer pela leitura de livros à luz dessa mesma
inteligência.“78

No tocante à Maçonaria, que existe até hoje, os integrantes geralmente procuram o


aperfeiçoamento espiritual. Isso pode ser conseguido libertando o espírito da materialidade,
aderindo os princípios morais e ajudando os outros. Não buscam a perfeição do seu caráter
senão a perfeição de toda a humanidade. 79 Os membros são divididos de acordo com o grau de

76
Lima, Tania Andrade. Alquimia, Ocultismo, Maçonaria: o ouro e o simbolismo hermético dos cadinhos
(Séculos XVIII e XIX). Op cit. p. 40.
77
Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. [online]. 2008-2013. [cit. 2014-04-14]. Disponível em:
http://www.priberam.pt/dlpo/inicia%C3%A7%C3%A3o.
78
Centeno, Y. K.. Fernando Pessoa, o amor, a morte, a iniciação. Op. cit. p. 69.
79
Rodrigues, Rubi. “A missão permanente da Maçonaria: Um sacerdócio maçónico”. Revista Ciência &
Maçonaria. [online]. Vol. 2, n. 2, 2014. ISSN 2318-0129. [cit. 2015-4-9]. Disponível em:
http://www.cienciaemaconaria.com.br/index.php/ce/article/view/36/30. p. 116.

27
conhecimento. Há três graus básicos da Maçonaria: Aprendiz, Companheiro e Mestre e além
disso existem graus filosóficos, de número 4 a 33.80 Os Mestres Maçons ensinam os seus
conhecimentos, que estão escondidos na simbologia específica, ou como Pessoa escreveu: “Ora
os dirigentes superiores da Maçonaria forçosamente são aqueles que entendem e usam o que está contido
nesses símbolos.”81

A ligação de Fernando Pessoa com as associações secretas é conhecida e visível na sua


prosa bem como na criação poética. O escritor teve conhecimento amplo sobre as ordens e no
artigo contra a lei do deputado José Cabral, que proibia o funcionamento das associações
secretas, publicado no ano 1935, Pessoa explica princípios da Maçonaria e compara Lojas
maçónicas em países diferentes. Começa por expressar a sua atitude em relação à Maçonaria.
Nega que é Maçon, mas afirma o seu interesse pelo assunto e o fascínio pelas ideias:

“Começo por uma referência pessoal, que cuido, por necessária, não dever
evitar. Não sou maçon, nem pertenço a qualquer outra Ordem, semelhante ou
diferente. Não sou porém antimaçon, pois o que sei do assunto me leva a ter
uma ideia absolutamente favorável da Ordem Maçónica.”82

No artigo manifesta o seu desacordo com a lei e considera-a inútil e um malefício para
o país. Além disso usa adjetivos como improfícuo, injusto e cruel. Argumenta, que o Sr. José
Cabral não possui os conhecimentos suficientes sobre a Ordem e por isso a critica injustamente.
Explica, que a Maçonaria é na realidade uma ordem tolerante que respeita diversas culturas e
religiões. O ensinamento e o foco principal da Ordem difere em cada país segundo a
mentalidade de Maçons individuais, que, como cita Fernando Pessoa, são cerca de seis milhões
no mundo. Portanto, o espírito maçónico não pode ser definido nem caraterizado em geral. A
Maçonaria em cada país toma aspetos diferentes, de política até a rituais.83

O fato que Pessoa publicou o artigo para defender as associações secretas no ano 1935,
o ano da sua morte, é uma prova que se dedicou à Maçonaria até o fim da sua vida. Isso é
evidenciado também pela carta de 1935 enviada a Adolfo Casais Monteiro. Na carta descreve
a maneira pela qual os Maçons conceberam a teoria de Deus:

80
Lima, Tania Andrade. Alquimia, Ocultismo, Maçonaria: o ouro e o simbolismo hermético dos cadinhos
(Séculos XVIII e XIX. 2001). Op. cit. p. 40.
81
Pessoa, Valdenir Araújo. O Pensamento Maçônico De Fernando Pessoa. [online]. Santarém: Clube de
Autores, 2014. [cit. 2015-4-10] Disponível em:
https://books.google.cz/books?id=01NRBQAAQBAJ&pg=PA9&dq#v=snippet&q=os%20dirigentes%20superi
ores&f=false. p. 110.
82
Pessoa, Fernando. Prosa Publicada em Vida. Op. cit. p. 412.
83
Ibid. p. 415- 419.

28
“(…) a Ordem Externa do ocultismo, ou seja, a Maçonaria, evita (excepto a
Maçonaria anglo-saxónica) a expressão «Deus», dadas as suas implicações
teológicas e populares, e prefere dizer «Grande Arquitecto do Universo»,
expressão que deixa em branco o problema de se Ele é Criador, ou simples
Governador, do mundo.84

Fernando Pessoa também estava ativamente interessado nos Rosacrucianistas e nos


Cavaleiros Templários de Portugal. Como menciona na carta de 1915, possuía o livro de
Hargrave Jennings, Os Ritos e os Mistérios dos Rosa-Cruz.85 Portanto, não há dúvida que
estudou detalhadamente esta área originada na Alemanha no início do século XVII. Segundo a
lenda presente em vários documentos rosacrucianos, a Ordem teria sido fundada por Christian
Rosenkreutz que viajou para o mundo árabe e lá estudou ciências e as artes mágicas. Em seu
retorno à Alemanha, fundou a fraternidade de Rosa-Cruz para difundir sabedoria, mas sempre
trabalhando incógnito. A sua filosofia mostra a necessidade de reforma da sociedade humana,
do ponto de vista cultural e religioso.86 Este tema reflete-se na poesia pessoana. Inspirado pela
lenda sobre Christian Rosenkreutz Pessoa compõe um poema intitulado “No Túmulo de
Christian Rosenkreutz” para honrar a memória dele. O poema começa por um excerto do
documento rosacruciano do ano 1614, Fama Fraternitatis, que fala de corpo bem preservado
do fundador Rosenkreutz:

“Não tínhamos ainda visto o cadáver do nosso Pai prudente e sábio. Por isso
afastamos para um lado o atar. Então pudemos levantar uma chapa forte de
metal amarelo, e ali estava um belo corpo célebre, inteiro e incorrupto…, e tinha
na mão um pequeno livro em pergaminho, escrito a oiro, intitulado T., que é,
depois da Bíblia, o nosso mais alto tesouro nem deve ser facilmente submetido
à censura do mundo.
fama Fraternitatis Rosas Crucis”87

Nas sociedades ocultistas, nomeadamente na fraternidade Rosa-Cruz, a simbologia é de


grande importância. Os símbolos não são considerados religiosos. Possuem um significado
mais profundo e os membros da ordem usavam-nos como códigos secretos. Vamos analisar os
símbolos principais da ordem, a Rosa e a Cruz. Como explica o autor José Suárez, segundo os

84
Pessoa, Fernando. Obra essencial de Fernando Pessoa. Cartas. Op. cit. p. 424 e 425.
85
Ibid., p. 140.
86
McIntosh, Christopher. The Rose Cross and the Age of Reason : Eighteenth-century Rosicrucianism in Central
Europe and Its Relationship to the Enlightenment. [online]. Albany: State University of New York Press, 2011.
eBook Collection. ISBN 9781438435596. [cit. 2015-4-12]. Disponível em: EBSCOhost. p. 23 e 24.
87
Pessoa, Fernando. Poemas Ocultistas. [online]. Belo Horizonte: Livraria Garnier, 2004. [cit. 2015-4-12].
Disponível em: https://www.academia.edu/7882332/fernando_pessoa. p. 39.

29
Rosacrucianistas o sentido básico da Rosa é o amor e a pureza, enquanto a Cruz representa o
corpo humano. A simbologia pode ser interpretada do seguinte modo. Neste mundo todos os
seres vivos, representados pelo símbolo da Cruz, morrerão um dia. A vida é efêmera mas a
Rosa, ou seja, o amor, pureza, justiça e outras virtudes, são eternas.88

Fernando Pessoa aprendeu os símbolos da Rosa-Cruz e aplicou-os no seu livro


Mensagem, no poema intitulado “O Encoberto”:

“Que símbolo fecundo


Vem na aurora ansiosa?
Na Cruz Morta do Mundo
A Vida, que é a Rosa.

Que símbolo divino


Traz o dia já visto?
Na Cruz, que é o Destino,
A Rosa, que é o Cristo.

Que símbolo final


Mostra o sol já desperto?
Na Cruz morta e fatal
A Rosa do Encoberto.”89

Neste caso, Pessoa usa o conceito da Rosa e a Cruz para enfatizar dois opostos- a morte
e a vida. A Cruz simboliza o povo e a sua predestinação a morrer. A Rosa permanecerá para
sempre porque representa Jesus Cristo. Ele personifica o amor e bondade e também a vontade
de Deus. O Encoberto voltará graças a Deus e Portugal estagnado restabelecerá o seu lugar
entre as outras nações no mundo.90 Mas primeiro é necessário, de acordo com os ensinamentos
rosacrucianos, aceitar que a nossa existência não é infinita.

Na Ordem Rosa-Cruz como nas outras ordens, rituais especiais usados variam de acordo
com o grau de entendimento. Os ritos e procedimentos para aperfeiçoamento espiritual são

88
Suárez, José I. “Pessoa's "O Encoberto" in Mensagem: The Sebastianist Facet of his Occultism”. Romance
Notes [online]. Vol. 47, n. 1. 2006. Academic Search Complete. ISSN 00357995. [cit. 2015-04-14]. Disponível
em: EBSCOhost. p. 74.
89
Pessoa, Fernando. Mensagem e outros poemas afins. Op. cit. p. 118.
90
Suárez, José I. “Pessoa's "O Encoberto" in Mensagem: The Sebastianist Facet of his Occultism”. Romance
Notes. Op. cit. p. 74.

30
sempre protegidos pelo segredo. Fernando Pessoa conhecia alguns dos rituais secretos e usou-
os na sua obra poética. Na epígrafe do poema “Eros e Psique” menciona rituais templários:

“… E assim vedes, meu Irmão, que as verdades que vos foram dadas no Grau
de Neófito, e aquelas que vos foram dadas no Grau de adepto Menor, são, ainda
que opostas, a mesma verdade.
Do Ritual do grau de Mestre do Átrio
Na Ordem templária de Portugal”91

Depois do aparecimento de poemas com temática aparente de iniciação, teorias


começaram a surgir, falando que Pessoa pertence à Ordem dos Templários, Rosa-Cruz ou à
Maçonaria. Os pesquisadores António Arnaut e Jorge de Matos lidam com a questão se as
ordens mencionadas foram apenas a inspiração para o trabalho de Pessoa ou o escritor
participava ativamente nos rituais privados. Mas para obter acesso aos ritos e ensinamentos
secretos, é preciso primeiro ser iniciado.92 Portanto, as associações são chamadas também as
ordens iniciáticas. Por outras palavras, é possível que Pessoa tenha passado por uma iniciação.
Em sua defesa, Pessoa disse uma explicação na carta a Adolfo Casais Monteiro:

“Quanto a «iniciação» ou não, posso dizer-lhe só isto, que não sei se responde
à sua pergunta: não pertenço a Ordem Iniciática nenhuma. A citação, epígrafe
ao meu poema «Eros e Psique», de um trecho (traduzido, pois o Ritual é em
latim) do Ritual do Terceiro Grau da Ordem Templária de Portugal, indica
simplesmente – o que é facto – que me foi permitido folhear os Rituais dos três
primeiros graus dessa Ordem, extinta, ou em dormência, desde cerca de 1888.”93

Não nos surpreenda que Pessoa negou a sua ligação às ordens. Como Mathias Rogério
Ribeiro apontou no seu estudo, Pessoa podia haver duas razões sérias. Em primeiro lugar, nessa
época o estado impôs sanções fortes a cada membro de alguma associação secreta. Isso foi
devido à lei do deputado José Cabral proibindo o funcionamento das sociedades secretas. Em
segundo lugar, não foi permitido a um membro admitir a sua participação na ordem a ninguém.
Portanto, é ainda questionável se Fernando Pessoa foi ou não foi um membro ativo ou só estava
interessado no assunto.94 Mas não há dúvida nenhuma que Pessoa tinha conhecimentos sobre o
funcionamento das associações secretas e os rituais.

91
Pessoa, Fernando. Poemas Ocultistas. Op. cit. p. 13.
92
Ribeiro, Mathias Rogério. Esoterismo e ocultismo em Fernando Pessoa. Op. cit. p. 31-34.
93
Pessoa, Fernando. Obra essencial de Fernando Pessoa. Cartas. Op. cit. p. 425.
94
Ribeiro, Mathias Rogério. Esoterismo e ocultismo em Fernando Pessoa. Op. cit. p. 33.

31
4.6 Magia

Permanece a dúvida se Pessoa foi um iniciado ou não. O fato é que participou em alguns rituais
mas como é possível que isso lhe foi permitido? O pesquisador Jorge de Matos assume que
Fernando Pessoa foi iniciado através do mago inglês, Aleister Crowley.95 O bruxo que usava o
pseudónimo Mestre Therion foi um membro da Ordem Hermética da Aurora Dourada mais
conhecida como Hermetic Order of Golden Dawn. Esta associação secreta criada na Inglaterra
foi focalizada principalmente na elevação de personalidade para entrar em contato com o
divino.96 Talvez Pessoa pertencesse à Aurora Dourada pelo fato de que estava em contato
próximo com Aleister Crowley.

O relacionamento entre os ocultistas começou em 1930 graças a carta de Fernando


Pessoa. Nela o escritor português aponta para um erro no horóscopo contido no primeiro
volume do livro Confissões escrito por Aleister Crowley em seis volumes. Isso confirma o
próprio Fernando Pessoa:

“Como sou astrólogo, estudei atentamente esse horóscopo, e, quando remeti aos
editores a importância do volume, pus na minha carta uma nota final: disse-lhes
que comunicassem ao sr. Crowley que o seu horóscopo estava errado, devendo
ele ter nascido um pouco antes da hora que supunha. De aí a dias recebi uma
carta de Crowley, agradecendo a minha indicação e achando-a muito aceitável.
Assim começaram, à distância, as nossas relações.”97

Conhecimento avançado da astrologia de Pessoa demonstrado na carta de 1930


impressionou o mago de tal modo que a partir desse momento começou a trocar
correspondências com ele. Pessoa enviou-lhe os seus versos em inglês. Crowley gostava dos
poemas e até mesmo gostaria de consultar a poesia pessoalmente com Pessoa.98 Os ocultistas
planejaram o seu encontro em Portugal ou Londres através da astrologia, o que é evidenciado
pelas cartas de Fernando Pessoa dirigidas a Aleister Crowley de 6 de janeiro, 25 de fevereiro e
29 de maio de 1930.99 Na carta de 6 de janeiro Pessoa explica como a astrologia ajudou-o
escolher o momento mais adequado para o encontro com o mago:

95
Ibid., p. 34.
96
Oliveira, Anderson Amaral. A alquimia da palavra: Fernando Pessoa e as ciências ocultas. Op. cit. p. 40- 41.
97
Pessoa, Fernando. Prosa Publicada em Vida. Op. cit. p. 381.
98
Ibid.
99
Pessoa, Fernando. Obra essencial de Fernando Pessoa. Cartas. Op. cit. p. 307, 317 e 324.

32
“À parte tudo isso, razões astrológicas aconselham-me a sugerir Março; de
facto, é o próprio sentido da direcção, que torna Janeiro e Fevereiro meses
impeditivos, que faz de Março um mês propício, especialmente para me
encontrar consigo, estando a direcção solar de base (pro. Sol * Júpiter) em
notável harmonia com a circunstância.”100

No entanto, este plano não foi realizado em março. Como afirmou Fernando Pessoa,
tornou-se realidade alguns meses mais tarde. Porque os escritores desejavam conhecer-se,
combinaram encontrar-se em Lisboa. O mago inglês chegou a 2 de setembro de 1930 na
companhia de uma senhora jovem da Alemanha, Miss Hanni Larissa Jaeger. Fernando Pessoa
encontrou-os depois só duas vezes- no dia 7 e no dia 9. A 17 de setembro a assistente de Crowley
desapareceu, deixando apenas uma nota: “voltava em breve”. No dia seguinte, Pessoa recebeu
uma carta do seu amigo inglês. Aleister Crowley estava preocupado com o desaparecimento de
Miss Jaeger porque sabia que ela tinha tendências suicidas. Na carta a Pessoa disse que, na noite
de 16 Miss Jaeger tivera um ataque histérico. Por conseguinte, Pessoa decidiu ir à polícia e
pediu ajuda ao seu amigo o Segundo-Comandante, Major Joaquim Marques. Mas não
conseguiram encontrar a desaparecida.101

A 23 de setembro Pessoa encontrou-se com Aleister Crowley pela última vez. O mago
foi para Sintra onde supostamente se demoraria até ao fim de semana. No entanto, uma carta de
suicídio de Crowley do dia 23 foi encontrada na Boca do Inferno em Cascais102:

“L. G. P. Ano 14, Sol em Balança.

Não posso viver sem ti. «A outra Boca do Infierno» apanhar-me-á - não
será tão quente como a tua.

Hisos Tu Li Yu.”103

De acordo com o testemunho de Pessoa, as iniciais L. G. P. pertencem provavelmente a


perdida Miss Jaeger e a assinatura pertence a Aleister Crowley. Pessoa explicou que Tu Li Yu
era um sábio chinês de quem Crowley dizia ser a incarnação presente. Esclareceu que o ano 14
era o ano 1930 segundo a cronologia especial do Crowley. Sol em Balança representa a data.104
Pessoa continua explicando:

100
Ibid. p. 308.
101
Pessoa, Fernando. Prosa Publicada em Vida. Op. cit. p. 381 e 382.
102
Ibid., p. 382 e 383.
103
Ibid., p. 383.
104
Ibid., p. 383 e 384.

33
“Ora o Sol entrou no signo de Balança às 18 horas e 36 minutos do dia 23 de
Setembro; nesse signo permanece até cerca de 22 de Outubro. Essa carta foi
portanto escrita entre essa hora do dia 23 e a hora em que foi encontrada.”105

O Mistério da Boca do Inferno atraiu interesse da polícia e grande público. A 5 de


outubro Augusto Ferreira Gomes publicou a reportagem em O Notícias Ilustrado sobre o
desaparecimento de Aleister Crowley baseada no depoimento de Fernando Pessoa. No
testemunho Pessoa não só explicou o sentido da carta que o mago deixou, mas também afirmou
que tinha visto Crowley, no dia 24 de manhã em Lisboa. O porteiro do hotel em Sintra onde
Crowley estava hospedado também confirmou que o tinha visto no mesmo dia. Ainda mais
curioso foi o fato que de acordo com a polícia internacional, o mago saiu do país no dia 23.106
Com base nessas declarações surgiu a questão se o suicídio era simulado ou real.

Na revista Girassol mais uma teoria apareceu dizendo que Aleister Crowley tinha sido
assassinado. A alegação foi apoiada por um recorte do diário Oxford Mail que Fernando Pessoa
proporcionou durante a entrevista. O artigo falava sobre um médium inglês, A. V. Peters.
Alegou que tinha entrado em transe e viu como Aleister Crowley foi assassinado por um agente
da Igreja Católica Romana. Pessoa continuou esclarecendo que essa presunção é justificada
porque os católicos já tinham atacado Crowley no passado.107 Mas foi apenas uma das
conjeturas e investigações não encontraram evidências que a podiam apoiar.

Na entrevista para o semanário português Girassol Pessoa revelou um fato importante,


que Miss Hanni Larissa Jaeger já apareceu e tinha regressado à Alemanha a 19 de setembro.108
Por isso e porque o Mestre Therion foi visto no dia 24 em Lisboa, começou a espalhar-se a
hipótese que o suicídio do mago era uma farsa.

Trata-se de uma mistificação e um truque de mágica de Crowley? Na realidade o


ocultista não cometeu suicídio. Estava vivo mas noutro país. Isso é evidenciado pela carta de
Pessoa a João Gaspar Simões, editor e escritor português, de 5 de outubro de 1931: “O Crowley,
que, depois de se suicidar, passou a residir na Alemanha, escreveu-me há dias e perguntou-me pela
tradução – ou, antes, pela publicação da tradução.”109 Daqui decorre que Pessoa estava em contato

105
Ibid., p. 384.
106
Ibid., p. 382 e 383.
107
Ibid., p. 386- 390.
108
Ibid., p. 387 e 388.
109
Pessoa, Fernando. Obra essencial de Fernando Pessoa. Cartas. Op. cit. p. 375.

34
com o Inglês e sabia sobre a sua partida de Portugal. É questionável se colaborou com o mago
e se todo o mistério do suicídio criaram intencionalmente.

Fernando Pessoa admirava a obra de Crowley que mesmo traduziu os seus versos
ingleses para a sua língua materna. Depois do desaparecimento do mago enviou o poema “Hino
a Pã”, originalmente “Hymn to Pan” de prefácio do livro Magick in Theory and Practice, a João
Gaspar Simões. O editor inicialmente considerava que o autor do poema Mestre Therion podia
ser mais um heterónimo de Pessoa. Na carta a Gaspar Simões de janeiro 1931 Pessoa esclarece
a dúvida do seu amigo:
“O Mestre Therion não é heterónimo meu; é esse simplesmente o «nome
supremo» do poeta, mago, astrólogo e «mistério» inglês que em vulgar se chama
(ou chamava) Aleister Crowley, que também se designava por «A Besta
666».”110

Alguns meses antes Pessoa escreveu um poema semelhante com o tema do ocultismo
intitulado “O Último Sortilégio”. No dia 16 de outubro 1930 descreveu recursos básicos do
poema a João Gaspar Simões. Marcou o poema como uma interpretação dramática da «magia
de transgressão». O sujeito lírico era uma mulher, por isso os adjetivos se referem a ela. Esta
mulher era uma bruxa111, sublinhando o tema evidente da magia. Na primeira estrofe a feiticeira
recita um encanto mas sem sucesso:

“Já repeti o antigo encantamento,


E a grande Deusa aos olhos se negou.
Já repeti, nas pausas do amplo vento,
As orações cuja alma é um ser fecundo.
Nada me o abismo deu ou o céu mostrou.
Só o vento volta onde estou toda e só,
E tudo dorme no confuso mundo.”112

Nas estrofes seguintes a bruxa lamenta que perdeu as suas habilidades mágicas. No
verso: “Já, se o círculo traço, não há nada”113 descreve a situação durante o ritual quando a maga
desenha o círculo mágico mas nada acontece. E continua lamentando que o seu dom da magia
está a desaparecer: “Já me falece o dom com que me amavam.”114

110
Ibid., p. 364.
111
Ibid., p. 351.
112
Pessoa, Fernando. Poemas Ocultistas. Op. cit. p. 43.
113
Ibid.
114
Ibid.

35
No final fala com o Sol e a Lua para a ajudarem a libertar-se do corpo físico e
transformar-se. O símbolo de ouro colocado no primeiro verso incentiva a ideia que o trecho
trata do processo alquímico:

“Tu, porém, Sol, cujo ouro me foi presa,


Tu, Lua, cuja prata converti,
Se já não podeis dar-me essa beleza
Que tantas vezes tive por querer,
Ao menos meu ser findo dividi -
Meu ser essencial se perca em si.
Só meu corpo sem mim fique alma e ser!

Converta-me a minha última magia


Numa estátua de mim em corpo vivo!
Morra quem sou, mas quem me fiz e havia,
Anônima presença que se beija,
Carne do meu abstrato amor cativo,
Seja a morte de mim em que revivo;
E tal qual fui, não sendo nada, eu seja!”115

É indubitável que a criação de Fernando Pessoa foi influenciada pela magia e


possivelmente por estar em contato com Aleister Crowley. Na carta a Augusto Ferreira Gomes
admitiu que se inspirou no mago inglês: “Saiu-me directo e corrente essa poema, escrito, você notará,
na atmosfera do Crowley.”116 Alguns meses depois na carta de janeiro 1931 ao editor João Gaspar
Simões comparou os poemas dedicados à magia, o “Hino a Pã” de Crowley e o seu poema “O
Último Sortilégio”:

“Lembrei-me um dia de traduzir o «Hino a Pã», o que fiz, conforme o meu


critério de traduzir verso, em absoluta conformidade rítmica com o original.
Mandei a você o poema para, como lhe disse, você ver o que é propriamente
um «poema mágico», em comparação com um simples «poema a respeito de
magia», como é o meu «Último Sortilégio».”117

O encontro com o mago, sem dúvida, aprofundou o seu conhecimento do ocultismo e,


além disso, deu-lhe um ímpeto à criação da poesia excecional com o tema da magia.

115
Ibid., p. 44.
116
Pessoa, Fernando. Obra essencial de Fernando Pessoa. Cartas. Op. cit. p. 350.
117
Ibid., p. 364.

36
Conclusão

No início, apresentamos a vida e a obra de Fernando Pessoa. Observamos os seus inícios na


esfera literária e ficamos a saber que contribuiu significativamente para o desenvolvimento da
literatura do século XX trazendo novos estilos artísticos. Além disso, o escritor tornou-se
famoso graças à criação de heterónimos. Um deles era Alexander Search, o primeiro, em que
se manifestou o tema do ocultismo.

Entendemos que o campo das artes ocultistas é vasto. Para percebermos melhor a obra
pessoana começamos pela definição geral do ocultismo com uma breve descrição das suas áreas
como a alquimia e a astrologia. Este capítulo fornece uma introdução ao assunto e descreve
quais práticas ocultistas foram utilizadas não só no passado mas também hoje em dia.

Já na juventude apareceu a inclinação incipiente de Fernando Pessoa para o ocultismo.


Chegamos a saber que o seu interesse surgiu durante a tradução dos livros teosóficos de Annie
Besant e C. W. Leadbeater e graças a sua tia Ana Nogueira que realizava sessões espíritas.
Revelamos também o fato menos conhecido- que Pessoa descobriu dentro de si a capacidade
mediúnica. Declarou que era capaz de comunicar com espíritos através a escrita automática.
Além do mais, desde muito cedo estava interessado na astrologia. Isso é evidenciado pela
criação do heterónimo, o astrólogo Raphael Baldaya, que escrevia horóscopos e dava consultas
astrológicas por dinheiro.

No tocante à astrologia, notamos o fato que o próprio Fernando Pessoa compunha


horóscopos e mapas astrais e até mesmo pensou em tornar-se um profissional. Os astrólogos
experientes Paulo Cardoso e Aleister Crowley admitiram que o escritor tinha um conhecimento
notável desta arte. Encontramos os elementos da astrologia também na sua poesia,
nomeadamente no poema “Ocidente” do livro Mensagem que se relaciona com o signo do
zodíaco Libra.

No capítulo seguinte definimos o conceito do Quinto Império e sebastianismo e


introduzimos as suas variações quais apareceram no passado com ênfase nos autores
portugueses. Observamos que Fernando Pessoa trabalhava com o tema na prosa bem como no
livro de poesia Mensagem. Estudava o Livro de Daniel, as teorias de Padre António Vieira e
António Goncalves de Bandarra e depois de tantos séculos reviveu as profecias trazendo uma
nova perspetiva. Introduziu uma nova divisão dos impérios e considerava Portugal como o
quinto.

37
O trabalho mostra que Fernando Pessoa sempre tentava aperfeiçoar-se. Na sua prosa
observamos que se dedicava à alquimia buscando o caminho para a transformação da sua
própria personalidade. Descobrimos que o escritor estava inclinado para a ideia de
aperfeiçoamento através da criação poética e a sua poesia é, portanto, vista como um processo
alquímico.

O envolvimento do escritor com as associações secretas foi investigado por vários


pesquisadores. Embora Fernando Pessoa negou o seu pertencimento a qualquer ordem secreta,
observamos na sua obra referências aos rituais templárias e também a simbologia rosacruciana
no poema “O Encoberto”. O poeta até mesmo dedicou um poema intitulado “No Túmulo de
Christian Rosenkreutz” ao fundador lendário da Ordem Rosa-Cruz. É possível que o assunto
fosse apenas uma fonte de inspiração para a sua criação literária. A participação de Fernando
Pessoa nas sociedades secretas permanece duvidosa, mas uma coisa é certa, que tinha
conhecimentos amplos sobre as ordens secretas e rituais privados.

Pessoa adquiriu o seu conhecimento do ocultismo também através do mago Aleister


Crowley. Aprendemos que o seu encontro deu origem à versão em português do poema inglês
do mago “Hino a Pã”. A influência de Crowley para Fernando Pessoa refletiu-se no poema “O
Último Sortilégio” onde encontramos os elementos do ocultismo, nomeadamente a magia e a
alquimia.

Chegamos a conclusão que a obra pessoana oferece uma variedade de manifestações de


tendências ocultistas. Fernando Pessoa estava sempre interessado no assunto e não há nenhuma
dúvida que foi experiente nas artes ocultistas. A vida do autor era rica em experiências com o
ocultismo desde a juventude até os últimos anos da sua vida.

38
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