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8 Métodos de Cálculo de Tensões e Deformações

8.1 Introdução

O emprego dos métodos de cálculo em conformação plástica tem por objetivo determinar os
esforços, tensões e deformações a que estão submetidas a peça conformada e as ferramentas a
fim de:

 prever possíveis falhas durante o processamento tais como: imperfeições de


escoamento, acúmulo de tensões em regiões críticas, defeitos nos produtos;
 definir o tipo e a capacidade dos equipamentos a empregar;
 definir o número de etapas necessárias ao processamento de uma dada peça metálica.

Um processo de conformação pode ser analisado como um sistema que envolve


parâmetros do material a conformar, do processo propriamente dito, do equipamento, bem
como de características do “tarugo” e do produto conformado. A figura 8.1 apresenta a
relação entre esses diversos parâmetros de processamento.

8.2 Hipóteses simplificadoras

A fim de simplificar os modelos aplicados aos métodos de cálculo, assume-se algumas


hipóteses a respeito do material a conformar, das ferramentas e de algumas variáveis de
processamento.
Sobre o material a conformar, assume-se que sejam:

 isotrópicos, ou seja, apresentam as mesmas propriedades mecânicas em todas as


direções de solicitação;
 incompressíveis, não apresentam variação de volume durante o processo. Na realidade,
ocorre um pequeno aumento de volume devido ao aumento da densidade de
discordâncias;
 contínuos, não apresentam poros ou vazios que compromentam sua continuidade;
 homogêneos e uniformes, apresentam a mesma composição química, morfologia de
grãos e distribuição de partículas ao longo de seu comprimento.

Outras hipóteses sobre o material referem-se ao comportamento mecânico. Na figura 8.2


apresenta-se seis modos de escoamento, relacionados aos campos elástico e plástico e à
ocorrência ou não de encruamento.
Sobre as ferramentas, assume-se que sejam rígidas ou seja, que não sofram
deformações elásticas durante o processo.
Sobre o processo, as hipóteses mais importantes referem-se ao coeficiente de atrito
que é assumido como sendo constante ao longo de todo o processo e à velocidade que
também é assumida constante.
A respeito da quantificação do coeficiente de atrito existente na interface ferramenta-
tarugo, existem dois modelos propostos:

1. Modelo de Coulomb ou Amontons, estabelece que a tensão cisalhante ( t) necessária


para provocar o movimento relativo entre as superfícies em contato, é diretamente
proporcional à pressão aplicada (p):

t = .p

O coeficiente de proporcionalidade .é constante ao longo do processo, dependendo


apenas das propriedades dos materiais em contato e do lubrificante, sendo
independente da geometria e da velocidade com que se efetua o movimento relativo.

1
Esse modelo apresenta resultados confiáveis quando aplicado a processos em que a
lubrificação é eficiente e os níveis de pressão na interface são reduzidos. Para níveis de
pressão elevados, onde o contato entre as superfícies é elevado, o valor de t necessário
para ocorrer o movimento atinge um valor máximo igual à tensão limite de escoamento
sob cisalhamento do material da peça (k).
Assim, a expressão anterior torna-se

k

p

A partir da aderência total, quanto maior a pressão aplicada, menor o coeficiente de


atrito entre as superfícies, o que é fisicamente incorreto.

2. Num segundo modelo, denominado fator de atrito constante, define-se um fator m que
independe da pressão aplicada e que relaciona a tensão cisalhante necessária ao
movimento relativo à tensão limite de escoamento sob cisalhamento do material menos
resistente em contacto (k), geralmente, o material do tarugo.

t = m.k

O valor de m pode variar de valores próximos de zero (deslizamento quase perfeito) a


valores próximos da unidade (aderência total - cisalhamento sob a interface peça-
ferramenta).

A aplicação de um desses dois modelos depende dos fatores como o nível de pressão
desenvolvido na interface e à maior ou menor eficiência dos lubrificantes.

Figura 8.1 - Interrelacionamento dos parâmetros de processamento em conformação

2
Figura 8.2 - Comportamento mecânico de materiais conformados plasticamente.

Como exemplo, em processos onde o acesso do lubrificante à interface de contato é


dificultado e os níveis de pressão são elevados (forjamento a quente em matriz fechada), o
uso do modelo do fator de atrito fornece resultados mais confiáveis do que o modelo de
Coulomb. Já em processos onde os níveis de pressão são menores e a presença de lubrificante
na região de deformação é constante, pode-se aplicar o modelo de Coulomb.

8.3 Teoria da plasticidade

A fim de avaliar o início do escoamento plástico de um material metálico durante um


processo de conformação, torna-se necessário relacionar os diversos estados de tensão e
deformação aos esforços externos desenvolvidos. Para tanto algumas definições são feitas:

 Estado de tensão plana, onde as tensões normais atuam num plano em direções
perpendiculares entre si, sendo nula a tensão normal na terceira dimensão, como pode
ser assumido no caso de uma chapa fina submetida a tensões no plano da chapa.
 Estado de deformação plana, onde o escoamento ocorre em planos paralelos a um dado
plano. Na direção normal a esse plano a deformação é desprezível, como é o caso da
torção pura e da laminação de chapas largas em que somente a espessura e o
comprimento são deformados (Figura 8.3).

3
t
k

t t

-k

Figura 8.3 - Representação do estado plano de deformação.

No caso da laminação, como assume-se que não há mudança de volume, a deformação


na espessura é igual à do comprimento porém de sinais contrários. No estado de
deformação plana, existe o componente de tensão normal na terceira dimensão (z),
como mostrado:

z 
1
E

 z    x   y   0 
assim,

 z    x   y 

onde  : módulo de Poisson.

 Tensões principais: tensões normais que atuam em planos nos quais não ocorrem
tensões tangenciais. São representadas por 1, 2 e 3, sendo por convenção:

1 > 2 > 3

 Estados de tensão presentes nos processos de conformação, representados por círculos


de Mohr. A figura 8.4 apresenta os diversos estados de tensão que representam os
processos de conformação.

4
Figura 8.4 - Representação dos estados de tensão para processos de conformação.

5
8.4 Critérios de escoamento

Os critérios de escoamento foram elaborados a fim de definir o estado limite de


tensão que define o escoamento plástico dos materiais metálicos. Ou seja, a partir de qual
valor de tensão aplicada, dar-se-á o início do processo de deformação plástica.
O primeiro critério foi desenvolvido por TRESCA (1865) e definia que o escoamento
tem início quando a tensão de cisalhamento máxima ( tmax) atinge um valor crítico,
característico e constante para um dado material (condições definidas de microestrutura,
velocidade e temperatura de trabalho) independentemente do estado de tensão aplicado.

Pela análise do círculo de Mohr, verifica-se que

 max   min
t max  A
2

Ou seja, tmax = A (A constante para um dado material sob condições específicas de


microestutura e propriedades)
Assim, no ensaio de tração

t max  A   1 2   0 2

onde 0 é definida como tensão limite de escoamento sob tração, facilmente medida nos
ensaios de tração convencionais.
Já no ensaio de torção, o valor da tensão limite de escoamento sob cisalhamento puro
(k) não é facilmente obtido. Utilizando-se o critério de TRESCA, tem-se

t max   1   2  k  A   0 2
ou
k 0 2

O critério de TRESCA apresenta como erro o fato de não considerar a tensão


intermediária, a qual apresenta influência significativa no comportamento plástico dos
materiais.
Desta forma, von MISES propôs em 1.913, o critério denominado de critério de
escoamento por energia de distorção, que define que o escoamento tem início quando a
energia de distorção atinge um valor crítico B, constante para um dado material sob
condições definidas e independente do estado de tensões.
Equacionando:

1
6
 
 1   2  2   2   3  2   1   3  2  B

Assim, como no ensaio de tração:

1   0 e  2   3  0

tem-se:
1
6
 
  0   2  2    2   3  2    0   3  2  1  02
3

6
1 2
donde B 0
3

Já no ensaio de torção, como:

1 = +k 2 = 0 e 3 = -k

tem-se
1
6
 
 k  0 2  0    k  2    k   k 
2 2 2
k 2

donde B = k2

como B foi obtido do ensaio de tração, tem-se que a tensão limite de escoamento sob
cisalhamento puro, pelo critério de von MISES é dada por:

0
k
3

O critério de von MISES apresenta resultados mais confiáveis visto que considera a
tensão intermediária, porém, deve-se destacar que em estados cilíndricos de tensão, a
aplicação de um ou outro critério fornece o mesmo resultado.
A comparação entre os dois critérios de escoamento pode ser feita traçando-se os
mapas de escoamento para um estado bidimensional (figura 8.5), com

1   2  0  3  0

Figura 8.5 - Comparação entre os critérios de TRESCA e von MISES.

7
Observa-se que:

 para tensão uniaxial (ou  2  0  1   3  0 ) e para tensão biaxial balanceada (


1   2  3  0 ) os critérios apresentam o mesmo resultado.
 para estados de cisalhamento puro (  1    2  3  0 ) ocorre a maior divergência,
algo em torno de 15%.

Outras formas de comparação entre os dois critérios de escoamento podem


ser observadas em DIETER, pp. 73-76.

8.5 Métodos de cálculo aplicados aos processos de conformação

As hipóteses anteriormente definidas são hipóteses gerais empregadas na quase


totalidade dos métodos desenvolvidos para cálculo de tensões e deformações. As hipóteses
particulares de cada método serão proporcionalmente em menor número quanto maior for a
precisão do método.
Os métodos teóricos e empíricos desenvolvidos para o estudo da conformação são os
seguintes:

 energia uniforme
 divisão e equilíbrio de elementos
 linhas de deslizamento
 limite superior de energia
 visioplasticidade
 simulação
 elementos finitos

Um método será tão mais preciso quanto mais parcelas de energia forem consideradas
durante o cálculo. Num processo de conformação apresentam-se três parcelas de energia:

 a energia uniforme ou de deformação homogênea, relacionada com a modificação das


formas e/ou dimensões do corpo metálico;
 a energia de atrito relativa à interação existente entre as superfícies da peça trabalhada
e das ferramentas e,
 a energia redundante relacionada às mudanças na direção de escoamento do material
durante sua deformação.

Dessas três parcelas, as duas últimas não contribuem para a qualidade do produto final e
dependem diretamente da qualidade e da geometria das ferramentas empregadas.
Como exemplo, através da figura 8.6 pode-se analisar o processo de trefilação com
matrizes cônicas, mantendo-se a redução de área constante e variando-se o ângulo de
conicidade da matriz.

8
W WA

WR
WT

W
U

 ótimo 

Figura 8.6 - Variação das parcelas de energia em função do ângulo de conicidade da fieira
de trefilação.

8.5.1 Método da energia uniforme

É o método mais simples e menos preciso de todos, pois assume uma série de
hipóteses simplificadoras:

 coeficiente de atrito é considerado desprezível;


 a geometria das ferramentas não afeta o escoamento do material.

Essas duas hipóteses fazem com que tanto a parcela de energia de atrito quanto a de
trabalho redundante sejam desprezadas. Isto obviamente acarreta um erro nos resultados de
forma que esse método serve apenas para uma primeira análise, dando uma idéia da ordem de
grandeza dos esforços e tensões.
Um exemplo de aplicação do método é o uso na trefilação de barras cilíndricas com
matrizes de pequeno ângulo de conicidade ( ~ 0) e lubrificação efetiva (~ 0). Assim,
poder-se-ia calcular a força necessária para trefilação pelo seguinte procedimento.
O trabalho externo dispendido para trefilar uma barra de diâmetro i e comprimento li até
uma barra de diâmetro f e comprimento lf é dado por:

We  Ft l f
dividindo pelo volume

We Ft l f Ft l f F
   t  t
V V Af l f Af

O trabalho interno desenvolvido durante a deformação pode ser definido por:

- com ~ 0 e ~ 0, o estado de tensão na região de deformação apresenta-se como


mostrado na figura 8.7.

9
Figura 8.7 – Estado de tensão na trefilação com atrito e ângulo de trabalho nulos.

Para um aumento de comprimento dl o incremento de energia necessária é dado por


dWi:

dWi = .A.dl

dividindo pelo volume V = A.l:

dWi Adl

V Al
assim,
dWi dl

V l

integrando,
Wi lf
dW dl
0 V i  l  l
i

como dl/l = d e V é constante,


f
Wi
  d
V i

assumindo que o material de partida esteja recozido ( i = 0):

f
Wi
  d
V 0
onde

lf   A 
 f  ln   ln i 
A 
 li   f 

e a integral é a área sob a curva  x  entre 0 e f, como

10
f

 d
  0

f
assim,

Wi  A 
   f   ln i 
V A 
 f 

Igualando Wi a We tem-se:

Ft  A 
  ln i 
Af A 
 f 

ou ainda,
 A 
Ft  A f  ln i 
A 
 f 

que é o resultado da força de trefilação considerando somente a energia de deformação


homogênea.

Como Ft/Af é igual à tensão de trefilação t, pode-se calcular a redução máxima por
passe rmax para a condição de que  t   , obtendo-se rmax < 63%.

8.5.2 Método da divisão e equilíbrio de elementos

Também denominado “slab method” ou método de Sachs, considera o atrito na


interface tarugo-ferramentas, bem como a geometria das ferramentas porém só como fator
geométrico e não como influente na energia de trabalho redundante. O coeficiente de atrito é
assumido constante.
O método consiste na divisão da região de deformação em elementos infinitesimais,
seguindo-se o equilíbrio de esforços nas direções x, y e z.
Do equilíbrio de esforços pode-se determinar as tensões aplicadas em cada ponto do
material deformado.
Como exemplo será analisada a trefilação de barras cilíndricas e empregado o
esquema mostrado na figura 8.8.
Fazendo o equilíbrio de esforços na direção x (  Fx  0 ):


D2
 x 
 D  dD 2
 x  d x   pD cos dx
 pDsin
dx
0
4 4 cos  cos 

dividindo por , por D e por -1:

 x dD Dd x
 pdx  pdx tan   0
2 4

11
p
  +d
x x x
D D+dD D
0 D
f

y p
x dx

Figura 8.8 – Parâmetros da trefilação de barras cilíndricas para o MDEE.

dD
como dx 
2 tan

 x dD Dd x pdD pdD


  0
2 4 2 tan 2

multiplicando por 4:

Dd x  2dD x  p1   cot     0 (*)

Já o equilíbrio dos esforços em y (  Fy  0 ) relativos às tensões radiais, fornece:


 dx   dx 
 y  Ddx    p D  cos  p D  sin
 cos   cos  

com  e  pequenos tem-se: tan   0

Assim, 1 = x e 2 = 3 = -p

Pelos critérios de Tresca e von Mises, 1 - 2 = 0

ou x + p = 0

ou p = 0 -x

substituindo-se na equação (*):

Dd x  2dD x   0   x 1   cot   


ou
d x 2dD

 x B   0 1  B  D

com B = cot 
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Integrando entre D0 e Df, com as condições de contorno:

x = 0 para D = D0
x = tref para D = Df
tem-se

1
ln B x   0 1  B    2 ln D
B

e finalmente,

 tref 1   Df 
2B

 1  B  1    
0 B   D0  

Definindo r como redução de área:

2 2
Af  Df   Df 
r  1  1    donde    1  r
A0  D0   D0 

obtendo-se

 tref
0
1

 1  B  1  1  r 
B
B

A redução máxima pode ser calculada considerando-se que no limite tref = 0, o que
leva à expressão:

1
B
 
1  B  1  1  rmax  B  1

Adotando-se como valores adequados para a trefilação de fios  = 0,05 e  = 10o,


tem-se B = 0,28 e obtém-se rmax  55%, que é um valor menor que os 63% obtidos pelo
método de energia uniforme que não considera as perdas por atrito nem a geometria da
ferramenta.

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