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A ILUSTRAÇÃO E A

SOCIEDADE CONTRATUAL

O nascimento da Ciência Econômica

Prof. Maria Clara


Introdução: uma nova etapa no
pensamento burguês
O Renascimento desenvolveu nas pessoas novos
valores, diferentes daqueles vigentes na Idade Média.
Os valores renascentistas estavam mais adequados
ao espírito do capitalismo, um sistema econômico
voltado para a produção e a comercialização, para a
expansão comercial, para a circulação crescente de
mercadorias e para o consumo de bens materiais.
Instalava-se uma sociedade baseada na distinção
pela posse de riqueza e não pela origem, nome ou
tradição.
Essa mudança radical no mundo ocidental exigia uma
nova ordem social, dirigida por pessoas dispostas a
buscar um espaço no mundo, a competir por
mercados e a responder de forma produtiva à
ampliação do consumo.
Pessoas cuja vida estivesse direcionada para a
existência terrena e suas conquistas, e não para a
vida após a morte.
Todas essas mudanças se anunciavam no
Renascimento e se tornavam, cada vez mais radicais
à medida que se adentrava a Idade Moderna e a
Revolução Industrial se tornava realidade.
A nova concepção de lucro, elaborada e praticada
pelo comerciante burguês renascentista, é a
marca decisiva da ruptura com os valores e as
idéias do mundo medieval.
O lucro não é mais apenas o valor que se paga ao
comerciante pelo trabalho realizado. O lucro
expressa a premissa da acumulação, da
ostentação, da diferenciação individual e assim
realiza a idéia de que “tenho o direito de cobrar o
máximo que uma pessoa pode pagar”.
A idéia e a realização do lucro não eram de forma
alguma novas (VER PÁGINA 29 DA APOSTILA).
"É impossível fazer a guerra sem homens, manter homens sem salário,
fornecer-lhes o salário sem tributos (impostos), arrecadar tributos sem
comércio.” (In: Pierre Deyon. O Mercantilismo. Tratado de Economia Política.
P. 51)
Se um comerciante pode auferir numa transação comercial
o maior preço possível - resultante da relação entre oferta
e procura e de outras condições produtivas e de mercado-,
então é preciso que a produção seja organizada de
forma mais racional e em larga escala.

O fato de a concorrência ser cada vez maior também


exige maior racionalidade e previsão. A procura por
novas técnicas mais eficientes se torna uma constante.
Muitos prêmios são oferecidos aos inventores, e projetos
como os de Leonardo da Vinci, que ficaram apenas no
papel, passam a fazer enorme sucesso.
Desenvolvem-se a ciência e a tecnologia, enquanto na
filosofia cada vez mais se procuram as raízes das
formas de pensar.
O Renascimento introduziu e desenvolveu o
antropocentrismo, a laicidade, o individualismo
e o racionalismo.
Com relação à vida social, passou a concebê-la
como uma realidade própria sobre a qual os
homens atuam; percebeu-se também a existência
de diferentes modelos na política - a República, a
Monarquia - e passou-se a analisá-los e a
defender um ou outro modelo.
Conseguiu-se vislumbrar a oposição entre
indivíduo e sociedade, entre vontade individual e
regras sociais.
O Renascimento
correspondeu a uma
primeira fase da
sistematização do
pensamento burguês na
medida em que procurava
trazer de volta à Europa os
valores laicos, o gosto pela
vida terrena e o
racionalismo, e atribuía ao
indivíduo valores pessoais
que não provinham da sua
origem. Embora ainda
tivesse um certo caráter
religioso, o Renascimento
exaltava a natureza e os
prazeres da vida terrena.
A Ilustração (ou ILUMINISMO), movimento filosófico que
sucedeu o Renascimento, deu um passo além.

Concebeu novas idéias de vida social e entendeu a coletividade


como um organismo próprio. Começou a discernir aspectos e
áreas da vida social com diferentes características e
necessidades - a agricultura, a indústria, a cidade, o campo.

O conceito de nação, como forma de organização política pela


qual as populações estabelecem relações intersocietárias, já se
cristalizara na Ilustração.

O nacionalismo emergente do Renascimento, identificado


com o monarca e preso ao sentimento de fidelidade e sujeição,
dá lugar à noção de organismo representativo da
coletividade, independentemente de quem ocupa, por certo
tempo, os cargos disponíveis.
Nos séculos XVII e XVIII, a burguesia avança na concepção de uma
forma de pensar própria, capaz de transformar o conhecimento não
só numa exaltação da vida e dos seus benefícios , mas também
num processo que frutificasse em termos de utilidade prática.
Afinal, o desenvolvimento industrial se anunciava em toda sua
potencialidade e era preciso preparar a sociedade para receber os
resultados desse trabalho. Os próprios sábios deveriam se
interessar em desenvolver conhecimentos de aplicação prática.
A sociedade apresentava necessidades urgentes ao
desenvolvimento científico: melhorar as condições de vida;
ampliar a expectativa de sobrevivência humana a fim de
engrossar as fileiras de consumidores e, principalmente, de
mão-de-obra disponível; mudar os hábitos sociais e formar uma
mentalidade receptiva às inovações técnicas.
A prática de elaboração dos projetos científicos para o
desenvolvimento da indústria passa a ser aplicada à sociedade,
pois sem um planejamento racional dos meios de transporte
terrestres e marítimos, da distribuição e armazenamento dos
produtos, da melhoria da infra-estrutura, todo o esforço produtivo
estaria perdido.
O planejar e o projetar o futuro trouxeram consigo
também o conceito de nação, correspondendo à
extensão territorial onde a burguesia de determinado
país teria total controle sobre o mercado.
A nação deveria se submeter a uma organização
política que pudesse favorecer o desenvolvimento
econômico e estimulá-lo.
Dentro dessa nova organização política da sociedade
deveria privilegiar-se o indivíduo, principal motor
do progresso econômico.
Este deveria estar livre das amarras impostas até
então pela sociedade feudal, pois, de posse de sua
total liberdade de agir, mover-se e estabelecer-se, o
indivíduo poderia promover o progresso econômico.
Novos valores guiando a vida social para sua modernização, maior empenho
das pesquisas e do saber em conquistar avanços técnicos, nas condições de
vida, tudo isso somado levou a esse surto de idéia conhecido pelo nome de
Ilustração.
As novas formas de pensar e agir aliavam-se à necessidade de a burguesia
libertar-se das amarras estabelecidas pelas monarquias absolutas, que não
permitiam a livre iniciativa, a liberdade de comércio e a livre concorrência
de salários, preços e produtos.
Assim, a Ilustração foi essencialmente pragmática e liberal, uma vez que a
burguesia queria uma ordem econômica, política e social em que tivesse
participação no poder e pudesse realizar seus negócios sem entraves.

A burguesia já se sentia suficientemente forte e confiante em seus


próprios objetivos de vida para dispensar a figura do rei como seu aliado.
Fortalecida, a burguesia propunha agora formas de governo baseadas na
legitimidade popular, até mesmo governos republicanos. Conclamava o
povo a aderir à defesa da igualdade jurídica e do sufrágio universal.
A filosofia social dos séculos XVII e XVIII
O pensamento da Ilustração, apoiado principalmente na contribuição dos
fisiocratas (escola econômica da época), defendia a idéia de que a
economia era regida por leis naturais de oferta e procura que tendiam a
estabelecer, de maneira mais eficiente do que os decretos reais, o melhor
preço, o melhor produto e o melhor contrato, pela livre concorrência.
Além desse apreço pelo livre curso das relações econômicas, os fisiocratas,
opondo-se ao uso ocioso que a nobreza fazia de suas propriedades
agrárias, propunham melhor aproveitamento da agricultura, atividade que
consideravam a principal fonte de riqueza das nações.
Segundo esse ponto de vista, as relações econômicas e sociais eram,
regidas por leis físicas e naturais que funcionariam de maneira
racional, desde que não prejudicadas pela intervenção do Estado
absolutista.
O controle das relações humanas surgia, portanto, da própria dinâmica da
vida econômica e social, dotada de uma racionalidade intrínseca, cuja
descoberta era a principal meta dos estudos científicos.
Reconhecia-se no homem, portanto, a capacidade de
pensar e escolher, de opinar e resolver sem que leis rígidas
perturbassem sua conduta.
No plano econômico essa idéia se traduzia na ânsia por
liberdade de ação, empreendimento e contratação.
Traduzia-se ainda na concepção de que as relações entre
os homens resultariam na livre contraposição de vontades,
na liberdade contratual.

No plano político, expressava-se no objetivo de livre escolha


dos governantes segundo o ideal de um Estado
representativo da vontade popular.
Finalmente, no plano social, manifestava-se na noção de
que as sociedades se baseavam em acordos mútuos entre
os indivíduos que as compunham.
Jean-Jacques Rousseau
(1712-1778)
Um dos pensadores que mais desenvolveu essa idéia de um
pacto social originário foi Jean-Jacques Rousseau. Em sua
obra Contrato social, Rousseau afirmava que a base da
sociedade estava no interesse comum pela vida social, no
consentimento unânime dos homens em renunciar as suas
vontades particulares em favor de toda a comunidade.
Para alicerçar suas idéias a respeito da legitimidade do Estado
a serviço dos interesses comuns e dos direitos naturais do
homem, Rousseau procurou traçar a trajetória da humanidade
a partir do igualitarismo primitivo até a sociedade diferenciada.
Para ele, a origem dessa diferenciação estava no
aparecimento da propriedade privada. Justamente por essa
crítica à propriedade, distingue-se dos demais filósofos da
Ilustração.
John Locke (1632-1704)
John Locke, pensador inglês, também defendeu a idéia de que a sociedade civil
resultava da livre associação entre indivíduos dotados de razão e vontade. Para
Locke, essa contratação estabelecia, entre outras coisas, as formas de poder, as
garantias de liberdade individual e o respeito à propriedade. Seus princípios
deveriam ser redigidos sob a forma de uma constituição.
Entre os filósofos da Ilustração, ganhava adeptos a idéia de que toda matéria
tinha uma origem natural, não-divina, e que todo processo vital não era senão o
movimento dessa matéria, obedecendo a leis naturais. Esses princípios guiavam o
conhecimento racional da sociedade, na busca das leis naturais da organização
social.
Podemos afirmar que a filosofia social da Ilustração levaria à descoberta das
bases materiais das relações sociais. Percebe-se claramente que os filósofos
dessa época já desenvolviam a consciência da diferença entre, indivíduo e
coletividade. Já percebiam que esta possuía regras próprias que regulavam a vida
coletiva, como as regras naturais regiam o surgimento, o desenvolvimento e as
relações entre as espécies.
Adam Smith: o nascimento da ciência
econômica
Foi Adam Smith (1723-1790), considerado fundador da ciência
econômica, quem demonstrou que a análise científica podia ir além do
que era expressamente manifesto nas vontades individuais.
Em sua análise sobre a riqueza das nações descobriu no trabalho,
ou seja, na produtividade, a grande fonte de riqueza.
Não era somente a agricultura, como queriam os fisiocratas, a
principal fonte de bens; mas o trabalho capaz de transformar
matéria bruta em produtos com valor de mercado.
Adam Smith revela a importância do trabalho ao pensar a sociedade
não como um conjunto abstrato de indivíduos dotados de vontade e
liberdade, tal como fizeram Rousseau e Locke, mas ao perceber a
natureza própria da vida social segundo a qual o comportamento social
obedece a regras diferentes daquelas que regem a ação individual.
Legitimidade e liberalismo
As teorias sociais da Ilustração no século XVIII foram ainda
o início do pensar científico sobre a sociedade.

Tiveram o poder de orientar a ação política e lançar as


bases do que viria a ser o Estado capitalista, desenvolvido
no século XIX, constitucional e democrático.

Lançaram também as bases para o movimento político


pela legitimação do poder, como na Revolução Francesa.

A filosofia social desse período teve, em relação à


renascentista, a vantagem de não constituir apenas uma
crítica social baseada no que a sociedade poderia
idealmente vir a ser, mas de criar projetos concretos de
realização política para a sociedade burguesa emergente.
A idéia de Estado como uma entidade cuja legitimidade se baseia na
pretensa representatividade da sociedade é um avanço em relação
à idéia de Monarquia absoluta.
O Estado já não é a pessoa que governa, mas uma instituição
abstrata com relações precisas com a coletividade.
Além da circulação de leis e de riquezas, o Estado criava o princípio
da circulação de poder.
O confronto de interesses também está subjacente às idéias
propostas pelos políticos iluministas.

As idéias de Locke e de Montesquieu, outro importante pensador da


Ilustração, foram a base da Constituição norte-americana de 1787.
Ambos pregaram a divisão do Estado em três poderes:
legislativo, incumbido da elaboração e da discussão das leis;
executivo, encarregado da execução das leis, tendo em vista a
proteção dos direitos naturais à liberdade, à igualdade e à
propriedade; e judiciário, responsável pela fiscalização à
observância das leis que asseguravam os direitos individuais e seus
limites.

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