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eg. ACLS OBRAS DO MESMO AUTOR: LA Vii FAMILIALE ET SOCIALE DES INDIENS NAMBIK- WARA (Paris, Société des Américanistes, 1948) . LES STRUCTURES £LEMENTAIRES DE LA PARENTS (Prix Paul-Pelliot) (Paris, Presses Universitaires de France, 1949). ‘RACE ET HISTOIRE (Paris, UNESCO, 1952). TRISTES TROPIQUES, 22° milheiro. Colegio Torre Humaine. (Librairie PLON, 1955). L¥ TOTEMISME AUJOURD'HUI (Paris, Presses Universitaires de France, 1962). LA PENSKE SAUVAGE (PLON, 1962). MYTHOLOGIQUES Le Cra et le Cuit (PLON, 1964). MYTHOLOGIQUES Du Miet aux cendres (PLON, 1966). EM COLABORAQAO: Georges Charbonnier: .ENTRETIENS AVEC L&VI-STRAUSS (PLON;JULLIARD, 1961). . CLAUDE LEVI-STRAUSS 443-532 ANTROPOLOGIA ESTRUTURAL ‘Tradugio de CHAIM SAMUEL KATZ e EGINARDO PIRES Revisio etnolégica de JOLIO.CEZAR MELATTI 29 edigio TEMPO BRASILEIRO Rio de Janeiro, 1985 rativa, Ao menos é 0 que a anilise de um texto indigena nos pareceu ensinar, Mas, em outro sabe-se bem que todo mito é uma procura do tempo per da técnica xamanistica, que € a psi caracteres particulares do fato de que, na civilizagéo mecinica, tao ba mais lugar para o tempo mitico, seno no proprio ho- mem, Desta constatacéo, a psicanilise pode recolher uma con- firmagéo de sua validade, 20 mesmo tempo que a esperanga de aprofundar suas bases tebricas e de melhor compreender 0 por uma confrontagio de seus mé- todos e de suas finalidades com os de seus grandes predeces- sores: 05 xamis ¢ 05 feiticeiros. 236 CAPITULO XI A ESTRUTURA DOS MITOS (*) “pir-se-ia que os universos, mitol6gi- cos sio destinades a ser pulverizados mal aeabam de se formar, para, que novos universos nasgam de seus frag- ‘mentos.” Franz Boas, inttodugio az Ja- ‘mes ‘Teit, Traditions of the Thompeon River Indians of Britigh Columbia, Memoirs of the American Folklore Sooiety, VI (1898), P. 18. Nos iiltimos vinte anos, apesar de algumas tentativas dis- persas, a antropologia parece ter-se afastado cada vez mais fo estudo dos fatos religiosos, Amadores de diversas provenién- ‘cias se aproveitaram disto para invadir 0 dominio da etnolo- gia. religiosa. Seus passatempos ingénuos se desenvolvem no jeixamos baldio, e seus excessos se ajuntam & nossa caréncia, para comprometer o porvir de nossos trabalhos. ‘Qual é a origem desta situacdo? Os fundadores da etno- logia religiosa —Tylor, Frazer ¢ Durkhelm—. estiveram sem- pre atentos aos problemas psicolégicos; mas, nao sendo psi- Célogos profissionais, no podiam manter-se a par da réj evolugio. das idéias psicologicas, ¢ menos ainda pressenti-la, Suas interpretagées passaram de moda tio rapidamente quanto (1), Segundo o artigo original: The Structural Study of Myth, im: Myra, A Symposium, Journal of American Folklore, vol. 78, 1.9 270, outadez. 1956, pp. 428-444. Traduzido com alguns eomplementos ¢ modificagées. 237 ‘0s postulados psicoldgicos em que it thes contudo.o mérito de ter compreendido que os problemas de etnologia religiosa provém de uma psicolugia intelectualista. ‘A partir de Hocart —que jé 0 observara no comégo de uma obra péstuma, recentemente publicada— lamentar-se-4 que a psicologia moderna tenha se desinteressado, muito freqivente- mente, dos fendmenos intelectuais, preterindo-os pelo estudo da vida afetiva: “As faltas inerentes & escola psicoldgica... se acrescentava assim o érro de crer que idéias claras pudessem hnascer de emogées confusas” (2). Teria sido necessério ampliar ‘os quadros de nossa logica, para incluir ai operagdes mentais, aparentemente diversas das nossas, mas que no deixam de ‘ser de natureza intelectual, Em vez disto, tratou-se de redu- zi-las a sentimentos informes ¢ inet . Este método, the- ido sob o nome de fenomenoiogia religiosa, se mostrow vézes estéril e enfadonho. De todos os capitulos da etnol gia, sobrétudo, que soire com ¢: der-se-iam citar os trabalhos co de H. Grégoire, Mas éles no pertencem prépria einologia. Como hé cingiienta anos, esta continua a se com- prazer no caos. As a interpretagées sio_rejuvenesci- das: devaneios da consci ia coletiva, divinizagio de perso- nagens historicos, ou o inverso, De qualquer modo que se en~ carem os mitos, parecem-se reduzir todos a um passatempo gratuito, ou a uma forma grosstira’ de especulacao filoséfica, ‘Para compreender 0 que é um mito, nao temos, pois, outra __ escolha sendo entre a trivialidade e o sofisma? Alguns preten- dem que cada sociedade exprime, nos mitos, sentimentos fun- damentais, tais come o amor, o édio ou a vinganca, que sio comuns a téda a humanidade. Para outros, 0s mitos con: tuem tentativas de explicacio de fenémenos dificilmente com- preensiveis: astronémicos, meteorolégicos, etc. Mas as socieda~ des no sio impermeaveis 4 adogio de interpretagées positivas, (2) A. M. Hocarr, Social Origins, Londres, 1964, p. 7. 288 mesmo quando falsas; potque prefeririam, ao invés delas, re- pentinamente, maneiras de pensar tio obscuras ¢ complicadas? lado, os psicanalistas, do mesmo modo que alguns as interpretag6es cosmoldgicas fas por outras interpretagées, tomadas de empréstimo 2 sociologia e & psicologia. Mas entéo as coisas se tornam muito féceis. Que um sistema mitologico atribua um lugar pro zeja, explicar-se-nos-& que, na tal s atitude hostil face 2 seus netos; a mitologia sera tida por um reflexo da estrutura social ¢ das relacdes sociais. E se a ob- servacio contradiz a hipétese, insinuar-se-4 logo que o objeto proprio dos mitos & de oferecer uma derivagio a sentimentos feais, mas recalcados. Qualquer que seja a situagio real, uma ‘a to versitil eficontrara sempre o meio de atingir a significacio. Reconhegamos, antes, que 0 estudo dos mitos nos conduz a constatagées contre . Tudo pode acontecer num mito; parece que a sucesso dos acontecimentos nfo esti ai sujei a nenhuma regra de légica ou de continuidade, Qualquer su- jeito pode ter um predicado qualquer; toda relagio concebf- vel € possivel, Contudo, ésses mitos, aparentemente arbitrérios, ‘se reproduzem com os mesmos caracteres e segundo os mesmos detalhes, nas diversas re do mundo, Donde 0 problema: se 0 contetido do mito € inteiramente contingente, como com- preender que, de um canto a outro da terra, os mites se pa- recam tanto? & somente com a ‘condigéo de tomar consciéncia desta antinomia fundamental, que provém da natureza do mito, que se pode esperar resolvé-la. Com efeito, esta contradigio se parece com aquela que descobriram os primeiros filésofos que se interessaram pela linguagem, e, para que a lingifstica pudesse constituir-se como ciéncia, foi necessdrio primeira re- solver ésse problema. Os antigos da linguagem, como o fazemos ainda acérca do mito. Bles constataram que, em cada lingua, certos grupos de sons cor- respondiam a sentidos determinados, ¢ procuraram compreen- der, desesperadamente, que necessidade interna unia ésses sen- tidos e ésses sons. A emprésa era va, visto que os mesmos sons se encontram em outras linguas, mas ligados a sentidos 239 diferentes. A contradigio s6 foi resolvida no dia em que se aperceberam que a funsio significativa da lingua nfo esté di- Tetamente ligada aos préprios sons, mas 4 maneira pela qual 0s sons se encontram combinados entre si. ias recentes sdbre a mitologia procedem de sagées_precisas estariam ligadas a certos temos Ge denomina arquétipos. Isto equivale a raciocinar & moda dos fildsofos da Jinguagem, que estiveram por ‘tempo convencidos (8) de que os diversos sons possufam uma afinidade natural com @ste ou aquéle sentido: assim, as semi-vogais “liquidas”. te- iam a miso de evocar o estado correspondente da matéria, as vogais abertas seriam escolhidas de preferéncia para formar ‘0s nomes de objetos grandes, grossos, pesados ou sonoros, etc. © principio saussureano do cardter arbitrério dos signos lin gilisticos deve ser certamente revisto ¢ corrigido (4); mas to- dos os lingiiistas estargo de acdrdo em reconhecer que, de um ponto de vista’ , Ge marcou uma etapa indispensével da reflexio lingii Nao basta pois convidar o mitdlogo a comparar sua si- tuagao incerta com a do lingitista da época pré-cientifica. Pois nos arriscarfamos muito, se nos ativéssemos a isto, a cair de uma dificuldade na outra, Em nada ajuda cotejar o mito e a linguagem: 0 mito faz parte integrante da lingua; & pela pala~ vyra que éle se nos da a conhecer, éle provém do discurso. Se queremos perceber os caracteres especific mento mitico, devemos pois demonstrar que o multaneamente, na linguagem e além dade nio é, também guagem no engioba niveis diferentes? Di Tingua & a palavra, Saussure mostrou que a linguagem oferecia dois aspectos complementares; um estrutural, 0 outro estat tico; a lingua pertence ao dominio de um tempo reversi € a palavra, ao dominio de um tempo irreversivel. Se j (3) Esta hipétese ainda tem sous defensores, como Sir, I. A. Pacer, Tho Origin of Language... Journal of World History, 1 ne 2, Uren, 1058. |. (4)' Cf. E, BunvEnrsts, Nature du signe linguistique, Acta Linguistica, Y,1, 1989 0 capitulo V da presente obra." 240 possivel isolar éstes dois niveis na linguagem, nada impede que possamos definir um tercei Z ‘Acabamos de distinguir a lingue ea palavra por meio dos sistemas temporais aos quais cada uma pertence. Ora, também © mito se define por um sistema temporal que combina as propriedades dos dois outros, Um mito diz respeito, sempre, a acontecimentos passados: “‘antes da criagio do mundo”, ou “durante os primeiros tempos”, em todo caso, “faz muito tem- po”, Mas 0 valor intrinseco atribuido ao mito provém de que éstes acontecimentos, que decorrem supostamente em um mo- mento do tempo, formam também uma estrutura permanente. Esta se relaciona simultineamente 20 passado, ao presente ¢ 20 futuro, Uma comparagdo ajudaré a precisar esta ambigiti- dade fundamental, Nada’ se assemelha mais ao pensamento mitico que a ideologia poli Em nossas sociedades contem- pordneas, talvez esta tenha ado a substituir aquéle. Ora, © que faz o historiador quar joca a Revolugéo Francgsa? Ble ge refere a uma seqiiéncia de acontecimentos passados, cujas conseqiiéncias longinquas se fazem, sem duivida, ainda sentir através de téda uma série, ndo-rev de acontecimentos intermedidrios, Mas, para o homem politico e para os que 0 seguem, a Revolugio Francesa é uma realidade de outra or- dem: seqiiéncia de acontecimentos passados, mas também es- quema dotado de uma eficécia permanente, permitindo inter- pretar a estrutura social da Franca atual, os antagonismos que hela se manifestam, e entrever os lineamentos da evolugéo fu- tura, Assim se exprime Michelet, pensador politico ¢ historia dor ao mesmo tempo: © futuro estéve presente. pago da eternidade” (5) tempo histé do-his € nao-hist ‘explica que 0 mito pode per- tencer, simulténeamente, ao d da palavra (e ser ana- lisado ‘como tal) € ao dominio da lingua (na qual éle € formu- lado), e ainda oferecer, num terceiro nivel, o mesmo cardter de objeto absoluto, Bsse terceiro niyel possui também uma natureza lingiiistica, mas é, entretanto, distinto dos outros dois. (6) Micumuex, Histoire de la Révolution francaise, IV, 1. Empresto esta citagho de Maurice Muntnav-Ponty, les Aventu- ‘ree de la dialectique, Paris, 1956, p. 273. a4t Que se me permita abrir aqui um pequeno paréntese, para ilustrar, por uma observagio, a originalidade que oferece 0 mito em relagio a todos os outros fatos lingiiisticos. Poder-se-ia de- finix © mito como esta modalidade do discurso onde o valor da f6rmula traduttore, traditore tende priticamente a zero. Desta perspectiva, o lugar do mito, na escala dos modos de i » € oposto ao da poesia, néo importando ‘para aproximi-los. A poesia é uma forma de Tinguagem sumamente dificil de ser traduzida para uma lin- gua estrangeira, e qualquer tradugio acarreta milltiplas defor- mages, Ao contrario, o valor do mito como mito ito da pior tradugéo. Qualquer que seja nossa ignorin- ingua e da cultura da populagio onde foi colhido, um percebide como mito por qualquer leitor, no mundo 0. A substincia do mito nfo se encontra nem no estilo, nem no modo de narragio, nem na sintaxe, mas na histéria que é relatada. O mito é i tem lugar em um nivel muito elevado, ¢ onde qual comegou rolando. Resumamos, pois, as conclusées provisdrias a que chega~ mos, Elas so em ramero de trés: I) Se os mitos tém tm sentido, éste nao pode se ater aos elementos isolados que ¢n- tram em sua composigio, mas 4 maneira pela qual éstes ele- mentos se encontram combinados. 2) O mito provém da or- dem da linguagem, ¢ faz parte integrante dela; entretanto, a linguagem, tal como é utili a proprieda- des especificas. 3) Essas propriedades is das acima do nivel habitual da expresso Hingiiistica; dito de outro modo, elas so de natureza mais complexa do que as que se encontram numa expressio [i de qualquer tipo. Se aceitarmos éstes trés princi - cam a presenga daquelas que intervém normal tura da lingua, ou seja, os fonemas, os morfemas € os seman- temas, Mas elas esto para os semantemas assim como os se- mantemas estio para os morfemas e assim como os morfemas 242 esto para os foneinas. Cada forma difete da que a precede, por um mais alto grau de complexidade. Por esta razio, de- nominaremos os elementos que provém particularmente do mito (e que so os mais complexos de todos): grandes unidades constitutivas. ‘Como se procederd para reconhecer ¢ isolar essas grandes itutivas, ou mitemas? Sabemos que elas no nem aos fonemas, nem aos morfemas, nem aos semantemas, mas se situam em um nivel mais elevado: se- no 0 mito seria indistinto de qualquer outra forma de dis- curso, Seré necessario pois procuré-las no nivel da oragéo. No estgio preliminar da pesquisa, proceder-se-4 por aproxima~ {G6es, por ensaios e erros, guiando-se pelos principios que servem de base & andlise estrutural sob tddas as suas formas: ¢co- idade de solugio; possibilidade de re- partir de um fragmento ¢ de prever os desenvolvimentos ulteriores a partir dos dados atuais. ‘Até agora, utilizamos a seguinte técnica: cada mito é ana- lisado independentemente, procurando-se traduzir a sucesso de acontecimentos por meio de frases 0 mais curtas possiveis. Cada frase € inscrita numa ficha que traz um nimero cor- respondente a seu lugar na narrativa. Percebe-se, entdo, que cada cartio consiste na atribuigio de um predicado a um su- jeito. Ou melhor, cada grande unidade constit tureza de uma relagéo. A definigio que precede ndo é ainda sat por duas razdes. Em primeiro luger, os tas sabem exatamente que tédas as qualquer o nivel em que sejam isoladas, consistem em relagies. Qual é pois, a diferenca entre as grandes unidades ¢ as outras? Em segundo lugar, o método que acabamo: sempre no seio de um tempo nao-reversivel . 0 cal séo numerados na ordem da narrat reconhecemos ao tempo mitico — st tempo reversivel ¢ irreversivel, sincrénica e diacrénica — per- manece, pois, inexplicado, Estas observagées conduzem a uma nova hipétese, que nos situa no centro do problema. Supomos, com efeito, que as ver- dadeiras unidades constitutivas do mito néo séo as relagdes 24s planéta, quando téda vida humana j4 tiver desaparecido da su- perficie da terra, a investigar o sitio de uma de nossas bibliote- cas, Bsses arquedlogos ignoram tudo de nossa escrita, mas tratam de decifré-la, 0 que supGe a descoberta prévia de que oalfabeto, tal como o imprimimos, se 1 da esquerda para a direita ¢ de cima para baixo. Contudo, uma categoria de volut mes permaneceré indecifravel desta maneira. Serdo as parti- turas de orquestra, conservadas no departamento de musicologia, Nossos sdbios obstinar-se-Ao, sem diivida, em ler as pautas mu- ponhamos um observ ie ignore tudo acérea de nossas 24 cartas dé jogar, a escutar uma adivinha durante um periodo prolongado, Ble vé ¢ classifica os clientes segundo sua idade aproximada, seu sexo, sua apaténcia, sua situagio social, etc., riter diferencial, Ja & tempo 0 método mais diretamente. To- mito de Edipo, que oferece a vanta- existido a seu respeito. Mas ndo se trata pretar 0 mito de Bdipo de um modo verossimil, e menos ainda de oferecer déle uma explicagio aceitével para o especialista, Queremos simplesmente ilustrar por éste modo — ¢ sem déle tirar nenhuma conclusio naquilo que Ihe concerne — uma certa técnica, cujo emprégo néo 6-provavelmente legitimo neste caso cular, em virtude das incertezas que acabam de ser lem- bradas. A “demonstragio” deve ser pois entendida, nao no sen- tido que o sibio dé a éste térmo, mas, quando muito, no sentido do camelé: no obter um resultado, mas explicar, tio rapida- ‘mente quanto possivel, o funcionamento da pequena méquina -que éle trata de vender aos basbaques. ‘O mito vai ser manipulado como o seria uma partitura de 245 inteiros, do tipo 1, 2, 4, 7, 8, 4, 6, 8,1, 4,5, 7,8 1,2, 5, 7, 3,4, 5, 6, 8, sendo-nos atribuida a tarefa de’reagrupar todos ‘08 1, todos os 2, todos os 3 etc., sob forma de quadro: 12,4 78 234 6 8 145 78 eZee: 3456 8 Proceder-se-& do mesmo modo com o mito de Bdipo, expe- rimentando sucessivamente diversas disposicées dos mitemas, até que se enicontre uma que satisfaca as condigdes enumeradas & pig. 243. Suponhamos, art sigdo seja representada pelo segi ‘uma vez mais, que nfo se trata de impo: sugeri-lo, aos especialistas da mitologia clés certamente modificd-lo, ou até mesmo re , que tentariam Cadmo _procura sua ima Buro- a, raptada por Zeus Cadmo mata © dngio ‘or Spartoi se ex- ‘teeminam mitua- mente Libdaco (pai de Laie) = “cor xo” (2) Edipo mata seu Laio (pai, de pai Laio Baipe) = “tor te” Baipo imoa 2° Esfinge Bdipo = “pe jinchado” (7) Eidipo esposa Jo- asa, sua mie Etéocles mata seu jnmfo Polinice Estamos assim perante quatro colunas verticais, cada qual agrupando indimeras relagdes pertencentes ao mesmo “feixe”. Se tivéssemos de narrar 0 mito, néo levariamos em conta esta disposigo em colunas, e leriamos as linbas da esquerda para a direita © de cima para baixo. Mas, desde que se trata de compreender o mito, uma metade da ordem diacronica (de cima para baixo) perde seu valor funcional, ¢ a “leitura” se faz da esquerda para a direita, uma coluna apés 2 outra, tratando-se cada coluna como um todo. “Todas as relagGes agrupadas na mesma coluna apresentam, por hi ., um trago comum que se trata de evidenciar. ‘Assim, todos os incidentes reunidos na primeira coluna es- querda concernem a parentes consangiiineos, cujas relagdes de proximidade so, por assim dizer, exageradas: ésses paren- tes sio objeto de um mento mais intimo do que admitido pela ras sociais. Admitamos, pois, que trago comum A primeira coluna consista em relagdes de parentesco superestimadas, Evidencia-se imediatamente que a segunda co- luna traduz a mesma relagio, mas afetada de signo inverso: re- lagdes de parentesco subestimadas ou depreciadas. A terceira coluna concerne a monstros e sua destruicio. Para a quarta, necessita-se de alguns esclarecimentos. Foi freqiientemente ob- servado 0 sentido hipotético dos nomes proprios da linhagem * paterna de Edipo. Mas os lingiiistas nao Ihe atribuem nenhuma importéncia, visto que, segundo a regra, 0 sentido de um térmo s6 pode ser definido substituindo-o em todos os contex- tos em que seja encontrado. Ora, os nomes préprios esto, por definigio, fora de contexto. A dificuldade poderia parecer me- nor com nosso método, pois o mito é reorganizado de tal ma- neira que éle proprio sa constitui como contexto. Nao é mais © sentido event .da nome tomado isoladamente que ofe- rece um valor significative, mas 0 fato de que os trés nomes tenham um cardter comum: a saber, de comportar significa «g6es hipotéticas, e que tédas evocam uma dificuldade em andar corretamente. Antes de conti as duas colunas da tros: 0 dragio inicialmente, monstro ct{nico que € necessirio destruir, a fim de que os homens possam nascer da Terra; em ar, interroguemo-nos sobre a relagio entre ita. A terceira coluna se refere a mons- aur que se esforga, por meio de enigmas que & natureza humana, em arrebatar a exis- téncia as suas vitimas humanas. O segundo térmo reproduz, pois, o primeiro, que se refere & autoctonia do homem, Jé que os dois monstros séo, definitivamente, vencidos por homens, pode-se dizer que o trago comum da terceira coluna consiste na ‘negagdo da autoctonia do homem (6). (6) Sem pretender travar uma diseussio com os especia- 8, que seria, de nossa parte, presungosa e até sem sentido, ‘que o mito de dipo é tomado aqui como um exemplo ex: ‘de maneira arbitréria, 0 eardter cténico atribuido & Es ; parece-nos que ela estabeleceu de mancira con- monstro £8- ti ‘uma perso- nificagso de um © que ex- slica que, na bela iconografia reunida por Delcourt’no fim de ua obra, o homem e a mulher se eneontrem sempre em posi- Gio “céu/terra” invertida. _ Como indieamos adiante, escolhemos 0 mito de fdipo como primeiro exemplo em virtude’ das analogias notéveis que parecent existir entre cortos aspectos do pensamento grego areaico e 0 Pensamento dos indios Pueblo, de quem sfio tomados os exem- hag”, velha feiticeira de aspecto repagnante que prope, por sua aparéneia fisica, um enigma a0 jovem herdi: se éste decifra 0 enigma — isto é, responde As investidas da abjeta criatura — encontraré em seu leito, 20 despertar, una jovem mulher res- plendente que o faré chegar & soberania (sob esta forma, tema igualmente eéltico). A Esfinge ovoca mais ainda a “child-protrud- ing woman”, dos indios Hopi, méo féliea, por assim dizer: esta jovem mulher, abandonada pelos seus ao longo de uma dificil mi- grasii, no exato momento em que parla, e que erra daf por diante'no deserto, Mae dos Animals, que cla recusa aos eaga~ dores. Aquéle qué a encontra, as vestes ensangtentadas, “fica to aterrorizado que tem uma’ ere¢ao”, da qual ela se aproveita para violé-lo, recompensando-o em seguida com um sucesso infar 248 Estas hipéteses ajudam a compreender o sentido da quarta coluna, Em mitologia é freqiiente que os homens nascidos da Terra sejam representados, no momento da emergéncia, como ainda incapazes de andar, ou andando desajeitadamente. Assim, entre os Pueblo, 08 séres ctonicos, como Shumaikoli, o1 Muyingwa (7), Ensangiientado”, dos nos textos). A mesma observagio vale para os Koskimo da mitologia Kwakiutl: depois que 0 monstro cténico Tsiakish emergéncia, so coxos (“ os devorou, éles retornam a superficie terrestre, “cambaleando para a frente ou de lado”. O trago comum da quarta coluna poderia, pois, ser a persisténcia da autoctonia humana. Resulta disto que a quarta coluna mantém com a coluna 3 a mesma relago que a coluna I, com a coluna 2. A impossibilidade de ;pos de relagées é superada (ou mais exa- irmagdo de que duas relagées con- as, na medida em que cada uma : ia consigo mesma, Esta maneira de formolar a esirutura do pensamento mitico nio tem ainda sendo um valor aproximado, Ela nos basta por ora. pois, o mito de Edi le exprimiria a impos ‘se encontra uma sociedade que professa a crenca na autoctonia do homem (assim, Pausanias, VIII, XXIX, 4: o vegetal € 0 modélo do homem) de passar, desta teoria, ao reconhecimento do fato de que cada um de nés nasceu realmente da uniéo de ‘um homem e de uma mulher. A dificuldade é insuperdvel. Mas fo mito de Bdipo oferece uma espécie de instrumento ldgico que permite langar uma ponte entre o problema inicial — nascemos de um tnico ou de dois? — ¢ o problema derivado, que se pode formular, aproximadamente: o mesmo nasce do mesmo ou de outro? Por ste meio, uma correlagéo se evidencia: a superes- tima do parentesco consangiineo est para a subestima déste, livel na caca (cf. H, R. Vor, The Oraibi Summer Snake Cere- mony, Field Cotumbian Museum, publ. n° 88, Anthropol. Series, vol. Il, n° 4, Chicago, 1908, pp. 852-863 e $53, n° I) (DE nfo Masauwa, ‘cujo nome aparece no dete estado, em conseqiineia de um érro de datilografia. inglés 249 como o esférgo para escapar & autoctonia esta para a impossi- bilidade de consegui-lo. A experiéncia pode desmentir a teoria, mas a vida social confirma a cosmologia na medida em que ambas traem a mesma estrutura contraditéria. Entao, a cos- € verdadeira, Abramos um paréntese aqui, para intro- ‘ir duas observagées. Na tentativa de interpretagio que precede, foi possivel ne- gligenciar uma questo que preocupou bastante os especialistas do passado: a auséncia de certos motivos nas versGes mais an- tigas (homéricas) do mito de Edipo, como o suicidio de Jocasta eo cegamento voluntério de Edipo, Mas éstes motivos nio alteram a estrutura do mito, na qual podem, aliés, tomar lugar ficilmente, o primeiro como um névo exemplo de auto-destrui- so (coluna 3) € 0 segundo como um névo exemplo de enfer- midade (coluna 4). Bstes acréscimos apenas contribuem para explicitar o mito, visto que a passagem do pé A cabeca aparece em correlacio significativa com outra passagem: a da autoc~ tonia negada 4 auto-destrui (© método nos livra, p tituiu, até agor dos estudos: mi 18 a0 progresso verso autén- njunto de tédas as suas versdes. ito permanece mito enquanto € percebido como tal. Piste principio € bem ilustrado por nossa interpretagéo do mito de fidipo, que se pode apoiar sdbre a formulacdo freudiana, € the € certamente aplicdvel. O problema pésto por Freud em térmos: “‘edipianos” nfo é mais, sem davida, o da alternativa entre autoctonia e reproducéo bissexual, Mas se trata sempre de compreender como um pode nascer de dois: como se di que no tenhamos um nic genitor, mas uma mie, e um pai a mais? Ngo se hesitard pois em classificar Freud, depois de Séfocles, na relagio de nossas fontes do mito de Bdipo. Suas verses merecem o mesmo crédito que outras, mais antigas ¢, aparentemente, mais “auténti Do que precede, resulta uma conseqiiéncia importante. Visto que um mito se compée do conjunto de suas variantes, a andlise estrutural deveré consideri-las, tédas, ao mesmo titulo. 260 ‘Apés haver estudado as variantes conhecidas da versio tebana, ter-se-4 em vista, pois, também as outras: narrativas concer- nentes & finhagem colateral de Labdaco, que compreende Agave, Penteu ¢ a propria Jocasta; as variantes tebanas sébre Lico, ‘onde Anfion e Zeto tém o papel de fundadores de cidade; outras, mais afastadas, relativas a Dionisio (primo matrilateral de fdipo), e as lendas atenienses onde a fungéo reservada por Tebas a Cadmo cabe 2 Cecrops, ete. Para cada uma dessas Fig. 16, variantes, estabelecer-se-4 um quadro, onde cada elemento sera disposto de modo 2 permitir a comparagéo com o elemento cor- respondente dos outros quadros: a ‘Irsiruigéo da serpente por Cecrops com o episédio paralel Cadmo; 0 aban- dono de Dionisio e 0 de Edi i isto é, andando as avessis; a busca de Europa e a de Antiope; a fundagio de Tebas, ora pelos Spartoi, ora pelos didscuros ‘Anfion € Zeto; Zeus raptando Europa ou Antiope, ¢ 0 episédio similar onde Sémele serve de vitima; 0 Edipo tebano ¢ o Perseu argivo, ete. Obter-se-Ao assim inémeros quadros de duas di- mensées, cada qual consagrado a uma variante, e que se justa~ 251 porio como outros tantos planos paralelos, para chegar a um conjunto tri-dimensional, 0 qual podera Pde trés modos diferentes: da esquerda para a direi cima para baixo, da frente para o . Bsses quae dros nao serao jamais ia prova que os afastamentos diferen oferecem entre si correlag tivas, que permitem meter seu conjunto a operagées por meio de si cages sucessivas, e de chegar finalmente 4 lei estrutural do mito siderado. jetar-se-4, talvez, que uma tal emprésa no poderia ser levada ao seu térmo, visto que as inicas verses de que dis- pomos so as atuzalmente conhecidas. O que aconteceria, se uma nova versio desordenasse os resultados obtidos? A dificuldade & real quando se dispbe de verses muito pouco numerosas, mas ela se torna rapidamente tebrica & proporsio que seu ni mero se acresce, A experiéncia ensinaré a ordem de grandeza aproximada do mimero de verses requerida; Jevado, Se nés conhecemos © mobi dois casos. Com os mero de imagens seria . Se, a0 contrario, em relagio 20 outro, em proporsio ao Angulo. ‘Mas, mesmo neste filtimo caso, quatro ou cinco imagens bas- tariam, senfo para nos fornecer uma informasio total, ao me- nos para nos assegurar que nenhum mével importante pode permanecer desapercebido, complexo de Edipo fazem — como o cremos — parte do mito de Bdipo, a questo de saber se a transcri Cushing do mito ‘de origem dos Zuni é bastante fiel para ser conservada, nao tem mais sentido, Nao existe versio “verda- deira”, da qual tédas as outras seriam cépias ou ecos defor- mailos, Tédas as versies pertencem a0 mito, 252 bp eerie cgameennennincm Eis-nos em posigio de compreender porque muitos estu- dos de mitologia geral produziram resultados desalentadores, Primeiramente, os comparatistas quiseram selecionar versbes iadas, ao invés de considerar todas. Depois, vimos que estrutural de wma variante de wm mito, recolhido em uma tribo (as vézes, até em uma aldeia), chega a um esquema de duas dimensées. Desde que se empreguem diversas varian- tes do mesmo mito, para a mesma aldeia ou para a mesma a comparagio, o ndmero de dimens6es requeridas cresce tio jue nao é mais possivel apreendé-las por procedi- As confusdes ¢ as banalidades, a que chega jemente a mitologia geral, devem-se, pois, 20 desconhecimento dos sistemas de referéncia multi-dimensionais efetivamente , 08 quais se acredita, ingénuamente, po- verdade, existe pouca esperanga de que a ssenvolver semi invocar um sit complexos para nossos métodos empiricos tradi Nés experimentamos, em 1952-1954 (8), v sumariamente exposta nas paginas precedentes, por uma andlise exaustiva de tddas as verses conhecidas dos mito Zuni de origem © de emergéncia: Cushing, 1883 © 1896; Stevenson, por uma comparacéo dos resultados obtides dos outros grupos Pueblo, tanto ociden- iu da experiéncia como que iluminada por um névo mas chegou-se a entrever, ¢ as vézes a definir, opera ses logicas de um tipo muito freqientemente negligenciado, ou que haviam sido observadas em dominios bastante afastados do (8° Cf. Annuaire de Boole pratique des Hautes Studes, Scctior den Sclences religiouses, 1962-1963, pp. 19-21 © 1958-1964, Pp. 258 | | | nosso, Nao é possivel entrar em detalhes aqui, e limitar-nos- femos 2 apresentar alguns resultados. Um quadro, sem divida excessivamente simplificado, do mito Zuni de emergéncia ofereceria o aspecto geral abaixo (pag. 255). ‘Basta um rapido exame déste quadro, para compreender sta natureza. ® uma espécie de instrumento légico, destinado a operar uma mediagio entre a vida e a morte, A passagem é dificil para o pensamento Pueblo, pois ée concebe a vida hu- mana de acérdo com 0 modélo do reino vegetal (emergéncia fora da terra). Esta interpretagio Ihe é comum com 2 Grécia antiga, ¢ no foi de modo absolutamente arbitrario que toma- mos o mito de fdipo para primeiro exemplo: No caso ameri- cano aqui considerado, a vida vegetal é sucessivamente anali- sada sob varios aspectos, ordenados do mais simples ao mais complexo. A agricultura ocupa o lugar supremo ¢, contudo, oferece um cardter periddico, ou seja, consiste em uma alter- nancia de vida e de morte, em contradigéo com 0 postulado i Que se negligencie esta contradicao, e ela ressalta, mais adiante, no quadro: a agricultura é fonte de alimentacao, de vida, pois; ora, a caga também acarreta a alimentagfo, asse~ melhando-se A guerra, que é morte. Existem, pois, diferentes A versio Cushing esté centrada numa oposigio entre as atividades alimentares cujo resul- i jantas silvestres) e aquelas cujo resultado néo pode ser auferido senZo no fim. Dito de outro modo, a morte deve ser integrada 4 vida a fim de que a agri- cultura seja possivel. Na versio Parsons, passa-se da caga a agricultura, en- quanto a versio Stevenson procede em ordem inversa. Tédas ‘as outras diferencas entre as trés vers6es podem ser correla- cionadas com essas estruturas fundam¢ Assim, as trés versées descrevem a grande guerra travada pelos Zuni contra uma populacéo os Kyanakwe, introduzindo na narrativa variagdes significativas que consistem: 1.° na alianga ou na hostilidade dos deuses; 2.° itorga da vitéria final ‘2 um dos campos; 3.° na fungio si atribuida aos Kyanakwe, ora descritos como cagadores (tém ento arcos de 254 eS ee MUDANCA MoRTE to mecinico dos emergéncia, con- incexo do jemio exteminio dos Vege (can ia pln Gee frm ne flor don, bo ‘af don Seon Bem-Ama- gem da aga) mene Brundosinferio. dos i fos (poe. afog me) testo) romeo migico travado contra 0 Povo do Orva- go alientar das igri, cond, antag slvestteszida pelos doit _ Newekwe (p- gor cern Tho. ‘(eoletores mn) Conta Sgeketor = serif di vm mio. de uma 2 (para obter Mlogfo de um ie- ioe de oma ite ma (em toes do mnilbo) carder periddieo Gre hividades Sgucolse Z guerra contra of Ryanakwe Gate fultors contes adores) so alimencar da ina goecea, conduai- Sn pelos doie Beans da Gvers aoe snevitablidade da salvagio da ti bose (Gescbeits do femi (gars ven" fro Sian) MORTE eee 255 corda feitos de tendées animais), ora como agricultores (seus arcos sio guamnecidos de fibras vegetais) : cusaING PARSONS Dense, : STEVENSON lease, { alisdos, wrili- [Homens 6s, cordas Como a fibra vegetal (agri corda de tendoe: itura) & sempre superior & , € como (em menor medida) a alianga sua hostilidade, resulta que, na versio ntagem (deuses hostis, ido na versio Stevenson es Passo que a versio Par- sons ilustra uma situagdo intermedidria (deuses propicios, mas cordas de tenddes, visto que a humanidade primitiva vive da caga). Oposicées Cushing Parsons Stevenson deuses/homens = + See tibra/tendao _ = + AA versio de Bunzel oferece a mesma estrutura que a de Cushing. Mas difere dela, assim como da versio Stevenson, no sentido de que essas duas versées apresentam a emengéncia, como o resultado dos esforgos dos homens para escapar de sua condigio miserdvel nas entranhas da Terra, enquanto a versio Bunzel representa a emergéncia como a conseqiiéncia de um apélo feito aos homens pelas poténcias das regiGes stuperiores, ‘Também, entre Bunzel de uma parte, Stevenson e Cushing de ‘outra, os empregados para a emergéncia se sucedem em ordem simétrica ¢ inversa. Em Stevenson e Cushing, das plantas aos is; em Bunzel, dos mamiferos aos insetos, ¢ dos insetos as . 2568 Em todos 0s mitos dos Pueblo ocidentais, a formalizagéo Jogica do problema permanece a mesma: o ponto de partida ¢ ‘© ponto de chegada do raciocinio so inequivocos, ¢ a ambi- giidade aparece no estado. intermediario ‘viDA (= cRESCIMENTO) ‘Uso (mecinico) do reino ve- getal, levando em conside- Tago sdmente o ereseimento once couera AGRICULTURA contradigao joie que ne- gagéo da vida = Gestruig&o, donde:) cAca Uso alimentar do rei mal limitado aos ani Destruigée do reino animal, Piendida aos homens coveana ‘MonTE (= DE-CRESCIMENTO) © aparecimento de um t itério justamente no meio do processo dialético est em relagéo com a emergéncia de tuma dupla série de pares diosearicos, cuja funcéo operat uma mediaggo entre os dois polos: 1. 2 mensageiros 2 palhacos cerimoniais 2 deuses da guerra aivinos homoy easal par heterogéneo eae (maride. Gave, (2 irmios) mulher) neto) isto & uma série de variantes combinatérias que preenchem a mesma fungio em contextos diferentes, Compreende-se assim porque os palhagos podem, no ritual Pueblo, ver-Ihes atribuidas fungées guerreiras. O problema, que fora freqientemente con- siderado insoltivel, desaparece quando se reconhece que os pa- Thagos ocupam, em relacio a producio alimentar (éles sio glutées que podem abusar impunemente dos produtos agricolas) 257 ‘a mesma fungio que os deuses da guerra (a' qual apareee, no processo dialético, como um abuso da’‘caga: -caga a6-homem, ‘em lugar de animais préprios ao consumo humano). Alguns mitos dos Pueblos centrais ¢ orientais Brocedem d a coutra maneira, Comegam por estabelecer por exemplo, do mito da origem do milho, 0 qual € obtido pelo Pai dos Animais, semeando, & guisa de grdos, espordes de patas de cervo, Experimenta-se entio deduzir térmos extremos serem simples ¢ os térmos intermedidrios des- dobrados (como entre os Pueblo ocidentais); so os extremos plano (o Poshaiyanne dos Zia), mas le proprio dotado de atributos equivocos. Gragas a éste esquema, podem-se até de- verses, segundo o momento em que iage. su longo do mito: benfazejo, quando se manifesta uma estrutura. si- jo de ordem de ‘distinguir certas operagies Iégicas que estio no funda mento do pensamento mitico (9). Desde jé, trés tipos de ope- rages podem ser isolados. ~""O personagem geralmente denominado trickster na mito- logia’ americana constituiu por muito tempo um enigma, “Como explicar que, em quase téda a América do Norte, ésse papel (9) Paré uma outra aplicagho diste método, ver nosso es ‘tudo: On four Winnebago Myths, que deverd aparecer em 1958, em um volume'de homenagem ao Prof. Paul Radin, por ocasiéo do sou 15.0 aniversério 258 fosse destinado ao coiote ou ao corvo? A razko dessas escolhas aparece, se reconhecermos que 0 pensamento mitico procede da tomada’ de consciéncia de certas oposigées ¢ tende-a sua’ me- diagio progressiva. Estabelegamos, pois, que dois: térmos, en- tre os quais a passagem parece impossivel, sejam inicialmente substituidos por mos equivalentes que admitem um outro como interme Apés © que, um-dos' térmos pola~ sio, por suz vez, substituidos por uma nova triade, ¢ assim por diante, Obtém-se entio uma ¢s- trutura de.mediagio do seguinte tipo: Par inisial Primeira triade Segunda triade Vida Agricultura Herbivoros Cage Carniceires Guerra PYedadores Morte Esta estrutura substitu’ o raciocinio ceiros so como os predadores (cons mas séo também como os produtores de no matam o que comem). Os Pueblo, para quem 2 vida agri- cola € mais “‘significante” do que a caga, formulam 0 mesmo raciocinio de maneira um pouco diversa: ‘0s corvas estio para as plantagSes, assim como os predadores estio para os herbi- voros, Mas {4 era possivel trater os herbivoros como media jo como coletores (vegetarianos) € fornecem um alimento animal, sem serem éles proprios cagado- res, Obtémese assim mediadores de primeiro, segundo ¢ ter- ceiro graus, etc., cada térmo gerando o seguinte por oposicio € correlagio. Esta seqiiéncia de operagies & tio evidente na mitologia das Planicies, que pode ser ordenada numa série: | de "Star-Husbond”). 259 Enquanto que, entre os Pueblo (Zuni), a série corres pondente € do tipo: : indor (corondo de sucesso) entre Céu e Terra: (Poshaiya silema) . de mediadores: ’ar homogéns + (0s dois Abaiyu Correlagées do ms eixo -horizontal tipo podem aparecer também num dade, mesmo no plano lingitistico, miiltiplas da raiz pose em Tewa, segundo névoa, escalpo, etc.). O coiote (que é um rmedidrio entre herbivoros « ca: e Terra; como o ‘ agricultura (0 escalpo é uma “colheita alforra entre plantas silvestres ¢ plantas cultivadas senvolve sobre as iiltimas, do mesmo modo que as como as vestimentas entre “natureza” & ” ia habitada e © mato; como as ira (no chio) ¢ o telhado (i . Esta cadeia de mediadores — se ito. exprimir-se que permitem resolver diversos problemas da mi © deus do orvalho é também um s deus detentor de ricas vestimentas é muitas vézes um Cinde- relo macho (Ash-boy) ; porque os escalpos produzem o orvalho; porque a Mae dos Animais esta associada a alforra, etc. Mas, também podemo-nos interrogar se no atingimos, por i modo universal de organizar os dados da expe- Quando se comparam aos exemplos que pre- 1 névoa, lat, nebula; © 0 papel o limpa-chami pare também o ciclo americano de Ash-Boy e peu da Cinderela. Ambos os personagens sio (mediadores entre os sexos) ; senhores do orvalho e dos ani- possuidores de vestimentas suntuosas; e me- , entre ricos e pobres). Ora, é impossivel atribuir-se 260 ste paralelismo a um empréstimo (como o pretenderam algu- mas vézes), pois as narrativas relativas a0 dsh-Boy ¢ a Cin- derela so. simétricas e inversas nos a narrativa de Cinderela, tal como f zida na América (cf. 0 conto Zi permanece. paralela ao protéti Europa América gex0 feminino masculino z familia fomflia dupla, sem familia (6rii0) (pai recasado) aspecto /moga bonita rapar repelente atitade fninguém @ ama ‘amor nao retribufdo transformag&o |eoberta de vestimentas| despojado de sua apa- suntuosas, gragas | a gra uma ajuda sobrena-| cas sjuda so- tural brenaturs Como Ash-Boy e Cinderela, o trickster & pois, um me diador, € esta funcéo explica porque le retém qualquer coisa da dualidade que tem por fungéo superar. Donde seu cardter ambigue e equivoco, ot tri ferece a tinica for- mula possivel de mediaggo. Alguns mitos parecem inteira~ mente consagrados a esgotar tédas as modalidades possiveis da passagem da dualidade 3 unidade. ( as variantes do mito de emergé uma série ordendvel de fungdes medi tante da precedente, por oposigéo e correlagéo: messias >> diéscuros > trickster > {ie ecuagg>> erate : Fado > neo > F termes > tle Na versio Cushing, esta dialética € acompanhada da pas- sagem de um meio espacial (mediagio entre Céu e Terra) a um meio temporal (mediagéo entre verdo: ¢ inverno, ou melhor, ente nascimento e morte). Todavia, ¢ se bem que a passagem se opere do espaco ao tempo, a formula iiltimia (a triade) rein- 261 troduz 0 espaco, visto que wma triade consiste aqui num par diosciirico dado simulténcamente co upla permatagio de fungée: Ponto, depois que tivermos © ide de natureza que pertence lade: ora benfazeja, ora mal- as variantes do s que & (Masauwi : 2) = (Muyingwa : Masauwt) = (Shalako : Muyingwa) = onde + © y represent necessério postular pai mtrario, na versio 0 que Masawwa alako o é relativamente mais que Muyin- como na versio 3, gwa, Pode-se_reconstri versoes Keresan de u (Poshaiyanki : x) = (Lea : Poshaiyanki) = (Poshaiyanki s ‘Tiamoni) = (y : Poshaiyanki) 262, Bote tipo de estrutura merece, especialmente, nossa aten- ios: 0 das relagées de subordinaggo entre os galindceos is (pecking-order) ; e 0 dos sistemas de pa- 0 denominamos de troca generalizada, Isolan- do-o agora num terceiro plano —o do pensamento mftico— podemos esperar estar em melhor posigio para discernir seu verdadeiro papel nos fendmenos sociais e para Ihe dar uma interpretagéo tedrica de alcance mais geral. Enfim, se se chega a ordenar uma série completa de va- riantes sob a forma de um grupo de permutagées, pode-se es- perar descobrir a lei do grupo. No estado atual das pesquisas, deveremos nos contentar agiti com indicagées bastantes aproxi- mativas, Quaisquer que sejam as precisées ¢ modificagdes ca- recidas pela formula abaixo, estamos desde logo convencidos que todo mito (considerado como o conjunto de suas varian- tes) € redutivel a uma relagio canénica do tipo: Fe (a) ¢ By (b) = Fi (b) : Fer (y) que existe uma relagdo de equivaléncia entre duas’ situagées, definidas respectivamente por uma inverséo de térmos e de relagées, sob duas condigdes: 1° que um dos térmos seja substituido por seu contrario (na expressio acima: @ e 1) ; 2° que uma invers&o correlativa se produza entre o valor de funsao e 0 valor de térmo de dois elementos (a yea). “A formula acima adquiriré todo seu sentido se nos re- cordarmos que, pata Freud, slo exigidos dois traumatismos (e n&o apenas um, como se tem a ten¢ creditar, to freqitentemente) para que nasca ésse mito it m que consiste uma neurose. Tratando de aplicar a formula & and- lise désses traumatismos (dos quais se postulard que satisfagam respectivamente as condigées 1 ¢ 2 acima enunciadas), chegar- se- sem divida a dar, da lei genética do mito, uma expres- sio mais precisa e rigorosa. Principalmente, estarfamos habi- litados a desenvolver paralelamente o estudo sociolégico ¢ psi- colégico do pensamento mitico, tratando-o, talvez, até mesmo 209 como no laboratério, submetendo as hipdteses de trabalho 20 contréle experimental E lamentével que as condigées precarias da pesquisa cien- tifica na Franga néo permitam, no momento, o desenvolvimento do trabalho, Os textos miticos sio extremamente volumoso3. Sua andlise em unidades constitutivas exige um trabalho de equipe e um pessoal técnico. Uma variante de dimensio média fornece algumas centenas de cartées. Para descobrir a melhor disposigio désses cartées em colunas ¢ em linhas, seriam ne- cessirios classificadores verticais de aproximadamente ...... 2m x 1,50m, guarnecidos de compartimentos onde se pudessem repartir € deslocar os cartes & vontade, E desde que nos pro- ponhamos elaborar modelos de trés dime para comparar diversas variantes, sio necessarios tantos classificadores quan- tas variantes houver, bem como um espaco suficiente para mo- ‘vélos ¢ dispé-los livremente, Enfim, se 0 sistema de referéncia apela para mais do que trés dimens6es (0 que esté sujeito a acontecer rapidamente, como o mostramos na pég. 252) seré necessério recorrer aos cartées perfurados ¢ a mecanografia. ‘Sem esperanca, no nto, até de ‘os locais indispen- siveis para a constituiggo de uma dnica ¢¢ nos-emos em apresentar trés observagées, a guisa de concli- sho desta exposiga usam tio freqien- mitos, ¢ mé radruplicagio de uma temente a manifesta a estrutura do estrutura sincro-diacrénica qi wma estrutura folheada que funas). Todo mito possui i 10 dizer, no e pelo processo transparece na superficie, de repetigio, Contudo (e € 0 segundo ponto), as camadas nfo so ja- mais rigorosamente idénticas. Se é verdade que o objeto do mito é fornecer um modélo légico para resolver uma contra- digo (tarefa irrealiz4vel, quande a contradigéo € real), um 264 nimero tedticamente infinito de camadas sera eriado, cada qual mente diferente da que a precedeu, O mito se desenvol- 4 como em espiral, até que 0 i ve em oposigio a sua nos permite uma ccupa, no dominio da palavra, ui ‘0 € um ser verbal que r comparavel aquele que ia fisica. Face a lingua, de estrutura molecular. logos, que colocaram a questo das rela- lade di ” @ 0 pensamento cien- fico, resolveram-na, geral wosando diferengas quali- © espirito se aplicava sempre aos mesmos objetos. ‘As paginas que precedem conduzem a uma outra cot gio. A logica do pensamento mitico nos pareceu tio quanto aquela na qual repousa o pensamento pi ha bastante tempo, em seu d uum machado de a um machado de pe dra porque um se © outro, Ambos igualmente bem feitos, mas o ferro no é a mesma cois a pedra. eee eae duz no pensamento mitico € no pensamento cientifico, ¢ q homem pensou sempre do mesmo modo. O 0 — to se posca aplicar 0 térmo— nao mundo, onde uma humanidade ntes ter-se-ia encontrado, no decorrer longa histéria, continuamente a5 voltas com novos objetos, 265

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