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A escrita da Historia clo Rio Grande do Sul ha muitas décadas eaxou de ser realizada segundo parametros estritamente repionais ada vex mais ela se conecta com espacos, tempos ¢ questoes mais mplos, tanto no que diz respeito a redefinicao do conceito de repiao, dlicado ao territ6rio situado no extremo sul da América portuguesa lindeiro ao rio da Prata, como também atentando para conjunturas obais que influenciaram a sua farmiacao social, cultural ¢ politica 50 tem possibilitado que as discuss0es historiogralicas sejam refor: uladas, que passem a levar em conia novos cunceitos ¢ problemas que alcancem outros patamares, icorporando e valorizando as verses influencias e determinacoes externas que resultaram na con. suracao do atual territ6rio do Rio Grande do Sul De fato, por muilo tempo as pesquisas priorizavam a busca pe § “troneds seculares” das familias proeminentes que colonizaram tdiamente estas terras em relagdo as demais regioes do pais, ou vestiain no estudo da fortnacao da “célula basica”, no caso as es- acias que eram consideradas como 0 fundamento constitutive de na sociedade de carater exclusivamente pastoril ¢ militar. Fssas interpretacées tém sido devidamente criticadas, contex- alizadas e matizadas, o que permitii a apontada renovacao da soriografia com a valorizacao da presenca de diferentes agentes siais na formagao da sociedade sul-rio-grandense, como as pop- Ges indigenas, africanas ¢ afrodescendentes, diversas plurais te si, ressaltando a heterogeneictade étnica e social da colonizacao extremo sul da América lusitana Recuperar tais dimensoes, para matizar as interpretacoes pau {as em uma suposta especificidade singular, tem contribuido em tito para fazer frente contra os particularismos e regionalismos 2 por décadas sustentaram a producas de uma “historia diferente” ‘2 0Sul do Brasil. Entre outros ganhos e sem negar as implicacoes gulares selativas & historia de uma regiao de fronteira, a ampliacao. s horizontes de andlise mostram que essa nao foi ou ¢ a “nica” fteira americana AU ll O RIO GRANDE DO SUL REVISITADO: NOVOS CAPITULOS Eduardo Neumann & Carla Brandalise (Organizadores) O RIO GRANDE DO SUL REVISITADO: NOVOS CAPITULOS ‘© Eduardo Neumann e Carla Brandalise Ealtora-chefe Marca Martins Capa e Diagramagio Jardson Corréa Imagem de Capa Biblioteca Pablica Municipal do Porto. MBA, 24 (62) Mapa de les confines el Brazil con las tieras de la Corona de Espafa Revisio Organizadores CONSELHO EDITORIAL Cesar Augusto Barcelos Guazzelli (UFRSS) Denise Fagundes Jardin (UFRSS) Jie Ricardo Quevedo dos Santos (UFSH) Karina Morera Ribeiro da Siva. Melo (UPE) Soraia Sales Domelles (UFMA) Martins Liveeiro Editora LTDA. ‘Ay Vendio Aires 169 Sala 107 ‘CEP: 900401191 Porto Alegre: RS Brasil Fone: (55) (S1) 3224-4798 Site: wonmartnsiveetoedtora.com.bt E-mai martinseditoragtora combr { Dados Interacionas de Catalogag3o na Pubicacio (CIF) (Worgarah Marco, CR€-10/1024) ses O Rio Grande do Sul evisitad. /organizadores Eduardo Neumann e Carle Bendalse Porto Alegre : Martins LUvrelto altora, 2019, 322p. ISBN 978-85.7537-299.9 1.fo Grande do Sul: Histria.2.Reglonalsmo : Rio Grande {0 Sul.3,Poltica:Rlo Grande do Sul. I.Neumann, Eduardo (org). Tuo, ou:94 165) \ Catalogagaeelaborads peta Biblioteca Publica do Estado IRE dE LEE EEL E vedas a reproducSo desta obra, por quaisquer meio, sem a autorizardo do editor, 5 SUMARIO REVISITANDO O RIO GRANDE: UM BREVE BALANCO Eduardo Neumann (UFRGS/RS) GUARANIS NO RIO GRANDE DO SU! ‘TERRITORIALIDADE INDIGENA . Max R. Pereira Ribeiro (Escola Técnica Estadual Portdo/RS) DE ROQUE GONZALEZ A CRISANTO NERENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGRAFICA EM TORNO DAS MISSOES JESUITICAS? smn Artur H. F Barcelos (FURG/RS) ACARTOGRAFIA SETECENTISTA DA COLONIA DO SACRAMENTO E- RIO GRANDE DE SAO PEDRO NA PERSPECTIVA DOS ENGENHEIROS MILITARES normseensnnnnnsnennnreetrtnn renee T Prof. Dr. Fébio Kiihn (UFRGS/RS) ESPIOES, COMUNICAGAO E CIRCULAGAO DE IDEIAS NO RIO GRANDE DESAO PEDRO ENO RIO DA PRATA (SECULOS XVIILE XIX)... Aciriano Comissoli (UFSM/RS) A GUERRA CIVIL FARROUPILHA AO RES-DO-CHAO: EXPERIENCIAS NEGRAS DE RECRUTAMENTO, GUERRA E ESCRAVIDAO (RIO GRANDE DE SAO PEDRO, C.1835 -1850) nome Daniela Vallandro de Carvatho (UNICENTRO/PR) AHISTORIA AGRARIA DA CAMPANHA RIO-GRANDENSE: NOVAS DESCOBERTAS, NOVAS QUESTOES wm Guinter Taija Leipnite (UNIPAMPA/RS) e Graciela Bonassa Garcia (UFRRY/R) MITOS DE FUNDACAO, AUTO REPRESENTAGOES NA INSERCAO DA IMIGRACAO ITALIANA NO ESTADO RIO-GRANDENSEermnrmemnses 47 Carta Brandalise (UFRGS/RS) UMA AFRICANDADE DE PARENTES: FORROS, DIASPORAS AFRICANAS E COMUNIDADES AFRODIASPORICAS NO BRASIL MERIDIONAL (PORTO ALEGRE, SECULO XIX), own Paulo Roberto Staudt Moreira (UNISINOS/RS) seme 119 See SE sou: 209 Rio Grande do Sul. 2004. Tese (Doutorado em Histéria) ~ Programa de P6s- Graduacdo em Histéria, UNISINOS, S30 Leopoldo, RS, 2004. SACK, Robert D. Human Territoriality: a theory. Annals of the Association o! ‘American Geographers, v.73, n. 1. 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F Barcelos' (FURG/RS) Quaiquer leitor que, de maneira desavisada, tomar em mos algum dos muitos livros que se dedicam a Historia do Rio Grande do Sul ira se deparar, de ‘uma forma ou de outra, com uma sequéncia de capitulos que incluirao invarta- yelmente alguns temas tidos como obrigatérios”. Dentre estes, destaca-se as populagées indigenas antes da colonizagao europeia, quase sempre de forma breve; o proceso de ocupacdo espanhola e portuguesa, com alguma énfase na ‘segunda; as Missdes Jesuiticas; os Tratados e guerras de fronteiras; 0 Tropei- rismo e os tropeiros; os Acorianos; a economia da escravidao, da pecuariae do charque; a Revolugao Farroupilha; a imigracao italiana e alem@; 0 Castilhismo ea Repiiblica, Me refiro aqui, obviamente, as obras de carter geral, ¢ ndo co- letaneas de artigos que se dispSem a trazer atualizagdes no estado da arte de tematicas especificas®. Esse repertorio de temas, que se converter em capitulos ‘de uma hist6ria, contém aqueles processos que s4o vistos como elementares para a compreensto da formagao historica do que viria ase tornar o Estado do Universidade Pederal do Rio Grande FURG, Bacharelado em Arqueologiae PPGH Mestrado Profissional 2 Por exemplo: FLORES, Moacyr. Histéria do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, Nova Dimensio, 1990, PESAVENTO, Sandia J. Hstéria do Rio Grande do Sul Porto Alegre, Mercado Aberto, 1984. MAESTRI, Mario. Breve histérie do Rio Grande do Sul: da pré-hstoria aos dias atwals: Passo Pando, Bditora da UPR 2010. MAGALHAES, Mario O, Hist6ria do Rio Grande do Sul 1626-1630. Pelotas, Bd. Armazém Literario, 2002. FAGUNDES, Antonto A Histbria do Rio Grande do Sul. (3* Ed) Porto Alegre, Martins ivreiro, 1997. CARBLL Sandra, KNTERIM, Luiz C, Releturas da iis= ria do Rio Grande do Sul Porto Alegre, Corag, 2011. KOHN, Fébio. Breve Hist6ria do Rio Grande ddo Sul, Porto Alogre, Fd. Leitura XXI, 2007, BOEIRA, Nelson; GOLIN, Tau (Coordenacéo Geral)- Histéria Goral do Rio Grande do Sul, 5 volumes. Passo Fundo: Méritos Eaitora, 2006/2008. > Por exemplo: NEUMANN, Eduardo, GRIJG, Luiz A. (orgs,) 0 Continente em Armas. Rio de Janeiro, Apicuri, 2010. GUAZZELLI, Césat. FLORES, Mariana F da C.. AVILA, Arthur. Frontek: ras Americanas: teoriae priticas de pesquisa. Porto Alegre, Letra & Vida, 2009, GRMO, Luiz A. tail. (orgs.) Capitulas de Histdria do Rio Grande do Sul Porto Alegre, EAUFRGS, 2004. NFU MANN, Eduardo, GRIJO, Luiz A, 0 império ea frontelra: A provincia de So Pedro no oftacentos Sto Leopoldo, Oikos Editora, 2014. POSSAMA, Paulo César (org) Gente de guerra e frontira estudos de histéria militar do Rio Grande do Sul. Pelotas, Ed. da UEPFI, 2010, COLVERO, Ronaldo 1B, MAURER, Rodrigo F MissGes em masaica. Da interpretaao @ prética: um conjunto de expe ‘riéncias. Porto Alegre, Faith, 2011 48. err ne ee eee ee eee eee eee eee eee 6 De ROQUE GONZALEZ. A CRISANTO NERENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGRAFICA Rio Grande do Sul, Nos tiltimos 20 ou 30 anos tem-se visto uma ampliacao des topicos tratados, deslocando ou desmembrando estes temas principai outro lado, novas questées, ensejadas pela recepcao de outras abordagens e outras orientacdes teGrico-metodolégicas trouxeram informacées e interpre- tagdes inéditas, tendo algumas inclusive desafiado narrativas tradicionais ou consensos estabelecidos ma historiografia, Dentre os temas acima arrolados, as Miss6es Jesulticas possem ainda um forte apelo, sendo quase impossivel ignoré-las no momento de se gestar uma coleténea ou um livro autoral sobrea Histéria do Rio Grande do Sul. Muitas sao as razées para essa primazia frentea ‘outros aspectos e processos. Discorrer sobre estas razbes foge ao escopo deste trabalho. Contudo, seu lugar no centro das tens6es de limites entre osimpérios coloniais de Portugal e Espanha, sobretuco no século XVIII, e dada a impor- ‘tincia que a ideia de “fronteira’ alcangou na tradigao historiogréfica gaticha, fa denota que elas se inserem entre os nexos explicativos mais frequentes da histéria regional. Assim, para além da numerosa bibliografia especifica sobre as Missdes Jesuiticas produzida por autores e autoras que atuam no Rio Gran- de do Sul, ha que se reconhecer a consténcia dessa temitica e, a partir desta constatacdo, tratar de interpretar como ela se apresenta e quais as implicagoes paraas imagens projetadas nesse passado e seus agentes. Qual a razdo de uma ‘vez mais voltar a esta tematica? J4 nao ha ensaios, estudos, coletaneas, andlises ¢ interpretagdes suficientes para demarcar o lugar ocupado pelas Missdes na Historia do Rio Grande do Sul? Certameute, Contudy, em que pese os trabalhos {que trataram em parte ou especificamente desta problematica’, restaainda um esforgo a mais para auxiliar no percurso daqueles que, em muitos casos, entram em contato pela primeira vez com a histéria da “grande experiéncia’, como sio eventualmente adjetivadas as Missdes Jesuiticas, ‘Asrazbes para pavimentar 0 percurso, ou estender 0 fio no labirinto histo- jgrifico, se fundamentam na compreensao de que a significativa produgio textual - e no apenas esta - sobre as Misses Jesuiticas acaba por nos levar a concordar com Melia e Nagel (1995) quando alertam: 1a enorme produccién bibliografica sobre las Misiones susle presentarse como una desordenada acumulacion de titwios ‘que puede desanimar al lector que se inicia en su estucio. Y¥ si bien hay indlcacién de su contenido en el mismo titulo de las publicaciones, éste peca con clerta frecuencia por su lexcesiva generalidad, 0 por el contrério, por parcial y hasta imadecuado. (MELIA & NAGEL, 1995:09) Por exemplos ELIA, Bariomeu& NAGEL, Liane Mari, Guaraniey jesutasen iempo delas “Misiones un bibllografaddéetca AuncioSanto Angelo: CEPAG URI, 1995, GUTEREIND, Toda. A iseoragrafarograndense. Porto Alegre, E2UFRGS, 1992, TORRES, Le. Patnidae {aes na Netorogroiariosrandense (1882-1950), Rio Grande, FAPURG, 1997. TORRES, liz #. Brastidade eplatnidade na produsdo historiagréfica do Rio Grande do Sul (1819-1975), ARTUR H. F BaRCELOS 47 Mais do que desanimar ao leitor, a massa de titulos das mais variadas espécies documentais cria um labirinto, um emaranhado, Desenrolar-se ou desvencilhar-se toma um tempo precioso. Nao se pretende aqui tratar de dis- cutir 0s rumos historiograficos das Missdes Jesuiticas em seu amplo alcance, qual seja, o da Antiga Provincia Jesuitica do Paraguai, para efeitos de América do Sul. 0 que se propde é uma observacao especifica sobre as relagdes entre ‘essas Misses e a Histéria do Rio Grande do Sul. Todo recorte implica em se- lees, apagamentos, omissées, que se tornam necessérias para dimensionar temas de alcance tdo expressivo, como 0 caso em questo. Porém, esses pro- cessos arbitrarios se dao na mesma medida em que ocorrem as repetigdes de certas afirmacées que, contra tudo e contra todos, insistem em permanecer. Explicitar esses aspectos to arraigados na historia rio-grandense pode abrir ;passo ao seu desmonte, 0 qual se pretende demonstrar como necessério, a0 menos em parte. Tomemos entao o que nos legaram anos, décadas, talvez um ou dois séculos, de escritos sobre as MissGes Jesuiticas e sua relacdo com a Historia do Rio Grande do Sul. Em um esforco de sintese, baseada no que se verifica em obras académicas e diletantes®, temos a recorréncia de ao menos 17 assertivas que se encaixam em um proceso interpretativo e, sobretudo, explicativo, Eles podem ser agrupados em blocos que permitem compreender melhor o rol de cada assertiva na visdo global do processo: Ascenstio e éxitos cas Missdes Jesufticas: o “encontro” jesuitico-guarani ‘As MissGes Jesuiticas foram uma experiéncia singular, o que Ihe confere a istingao em relagao aos demais processos transcorridos na regio no periodo colonial. 2) Essa singularidade se da pelo encontro de dois “sujeltos" excepcio- nais, o missionério jesuita, membro da mais afamada ordem daigreja.catélica em termos de evangelizacdo na América, e 0 indio Guarani, o mais afeito a cristianizagao quando comparado a outros grupos autéctones e dotado de capacidades que pareciam preparé-lo para a vida nas Missbes. Uma espécie de acordo ou pacto teria se dado entre os jesuitas ¢ os Iideres politicos guaranis, ‘08 caciques, sendo esses iiltimos beneficiados ao largo do tempo, com cargos e distingdes, 3) Esse encontro resultou em um convivio exitoso e vantajoso para ambos, jesultas e guaranis, permitindo o progresso tanto espiritual dos indigenas quanto de sua vida material, plasmada nas exuberantes Reduces*. 7" Jefiro-me aqul apenas ae produsdes em formato dellvra, Nao considero nessaandlise Teses e Dissertapbes Indes ou artigos em periédicos. © 0 termo Reduséo, em espanhol Reducin,refere-se aos povondos estabelecidos com os {ndfgenas, dotados de ndcleos urbanos e amplas Areas rurais, Normalmente, verfica-se na historiografiaa chagio: Llamames reduccfonesc los pueblos de indios que, viviendo au antigua tusanza en montes, serras y valles, en escondides erroyes, en tres, cuatro 0 sls casas solas los Fedujo adiligenciade as padresa vivira poblaciones grandes avide politica humana, a bene- Fee cn ere vistan, poraue comunmente vivian en desudez. MONTOYA, Antonio. Rene Te enn Cerne eS See nN TTT OT tee 48 DE Rogue Gonzatz A CrisawTO NERENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGRAFICA A configuragdo social e histérico-temporal desse “Encontro” 4) A cristianizacao dos Guarani que viviam no que ¢ hoje o atual territério do Rio Grande do Sul teria ocorrido em duas etapas, ou fases, uma de 1626 a 1640 e outra de 1682 a 1767. A primeira fase teria sido abortada pela acio predatéria dos Bandeirantes de So Paulo, ¢ a segunda fase seria uma resposta dos jesuftas a fundacao da Colénia do Sacramento em territério espanhol, em 1680. 5) A regio que corresponde a presenca jesuitica nessas duas fases era o“Tape’, sendo eventualmente tratada como Banda Oriental do Rio Uruguai, mormente quando se trata da segunda fase, 6) A existéncia de 30 destas Redugdes por mais de 150 anos, em que pese o pouco explicado interregno de 1640 a 1682, seria a comprovagao de que os Guarani haviam se adaptado plenamente a vida reducional. 7) As 30 Reduces ocupavam e controlavam um amplo espaco, atualmente fragmentado em partes do Paraguai, Argenti- na, Brasil e Uruguai, que passou a ser denominado de “espaco missioneito jesuitico-guarani”. Mapas do século XVIII ea cartografia contemporanea por eles inspirada, trataram de dar contornos a este espaco. 8) Nestas reducdes haveria apenas indios Guarani, sendo os demais resistentes e nao afeitos are- ceber a cristianizacao e a civilizagao, como por exemplo Charruas, Minuanos, Guenoas, Yarés, Kaingangs, Guands ¢ tantos outros cujas autodenominacées nos escaparam. 9) As RedugSes alcangaram uma populagao de mais de 150 mil guaranis e desenvolveram uma pujante economia baseada na pecuaria e na exploracao da erva-mate. Essa “riqneza" se traduvia também em uma ar- quitetura majestosa ¢ uma arte refinada, no campo da escultura e da musica 10) No conjunto destas 30 RedugSes, 07 se descalam e se “autonomizam’ em parte do discurso historiografico rio-grandense, como que predestinadas a uma brasilidade avant la lettre, vindo a formar os "Sete Povos das Missdes’,e assim incorporados aos cap{tulos da Hist6ria rio-grandense, A queda e 0 declinio das Misses Jesuiticas 11) 0 fim dessa experiéncia, cuja existéncia assume carater idilico e uts- pico em algumas interpretagdes, se deu pela deciso das coroas de Portugal ¢ Espanha em definir suas fronteiras, desmembrando o “espaco missioneiro”, ‘coma cessao de 07 Redugdes aos portugueses em troca da Colénia do Sacra- mento, 12) 0 tratado de troca, na realidade um tratado geral de fronteiras entre os dois impérios coloniais, denominado Tratado de Madri, celebrado em 1750, foi o inicio de um declinio sem retorno, 13) Como reagao ao Tratado de Madri ea ordem de entrega de suas terras aos portugueses, os Guarani promo- vem uma rebeliao que ser celebrizada como "Guerra Guaranitica’. De 1753 a 1756 lutarao bravamente para defender as Missdes. Mas sero derrotados Rutz de. Conquista espiritual hecka por ls religiosos de la Compania de Jess en tas provincias de! Paraguay, Parand, Uruguayy Tape. Bilbao, Imprenta del Gorazén de Jess, 1892, p29. | Arerur H. E BaRcetos 49 pela esmagadora forca dos exércitos unidos de Portugal e Espanha, apanhados em um massacre final, a batalha de Caiboaté, 14) A Guerra Guaranttica fard emergir 0 herdi completo e sintese da evangelizacao, o guarani Sepé Tiaraju, morto honrosamente entfrentando os algozes das redugées. 15) Mesmo com a anulacao do Tratado em 1761, a expulsao dos jesuftas em 1767 teria sido o ato final e principal causa do esfacelamento das Redugées. Odestino trdgico daquela experiéncia 16) Apés a expulsio dos jesuftas os Guarani abandonaram paulatinamen- te os povoades, indo se internar nas cidades ou nas estancias e fazendas coloniais, chegando mesmo a retornas “aos matos”. 17) 0 descolamento dos Sete Povos se deu pela incorporacao deles ao império portugués em 1801, sem resisténcia, processo quase natural e esperado, cuja explicagao se torna insignificante perante o fato consumado. Com variagées de estilo, énfase em alguns t6picos, relativizagdes e grada- ss6es de matiz, esse 6 o roteiro basico que, em geral, encapsula, isola, dota de inicio meio e fim, oferece inteligibilidade e explica o lugar das Misses Jesui- ticas na histéria do Rio Grande do Sul. Os demais processos correlatos, como principalmente a expansao da rede de cidades e vilas espanholas ao longo da Bacia Platina; o crescimento de Buenos Aires eo paulatino isolamento econd- mico de Asunci6n; e, sobretudo, a projec4o portuguesa rumo ao estudrio do Rio da Prata a0 longo da primeira metade do século XVI, irao comparecer como moldura, entorno, incidéncias, que parecem reforgar ou confirmar a importancia das Misses Jesulticas na colonizagdo do espaso, cristianizacao dos indigenas e sustentacdo das fronteiras do Império espanhol, Nessa es- ppécie de gesta, a qual nao faltam grandes personagens, as Misses podem se acomodar no seio da histéria malor que distinguiria 0 Estado sulino de seus congéneres no resto da Federacao. Claro estd que este roteiro ndo é 0 que norteia as discussdes académicas, ao menos nos tiltimos 30 anos. Porém, para além delas, hd um processo complexo de construcao de sentidos, o qual faz com seja essa trama aceita, gerida e reforgada por uma ndo desprezivel producio literarla, Também é esse roteiro que alimenta as ages em torno do espélio patrimonial das MissGes’. Sendo assim, percorrer, ainda que de forma breve, os principais momentos em que se deram as contribuigdes historio- Bréficas que consolidaram ow rivalizaram com esse roteiro permitir4,talvez, compreender sua permanéncla, Por outro lado, reconhecé-lo em sua forga narrativa, uma vez esmiuisadas suas origens, permite também situar melhor arelevancia de sua superac3o na produgao mais recente, bem como refletit ‘Sobre as construgbes patrimonials e sua relacdo com o discurso historiogréfico em torno ‘ag Misses ver BARCEL.OS, Artur HF Narrativas materiais: as missOes fesulticas e sew sistema solar patrimonial, In; SALINAS, Maria L. & QUARLERI, La. Espacias misionales em didlogo con ‘a gtobalidad. Iberoameérica, Resistencia, Editorial Contexto, 2016, pp. 225-282. 50 De Roque Gowzanez A CRISANTO NERENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGRAFICA sobre as dificuldades desse embate fora da esfera académica. Objetivamente, co que se busca é circunscrever os elementos que alimentam as imagens pre- sentes sobre as Missdes Jesufticas. Entendo imagens aqui, nao como sua forma de tratamento no campo conceitual das artes, da historia ou da linguistica, mas sim, como algo mais prosaico, qual seja, a forma como essa histéria é concebida por um ample leque de agentes sociais, dentro e fora dos limites da Academia, Para tanto, propde-se, de modo absolutamente arbitrario, conceber quatro momentos ou tendéncias historiograficas nos quais atuaram autores que trataram das Missdes Jesuiticas. Tomo aqui a definigao de tendéncia his- toriografica eshogada por Luiz. Henrique Torres, ele também um autor que interveio na temética em tela: A tendéncia historiografica é compreendida como os enfoques que privilegiam certos temas, personagens, situacdes ou and- lises metodoldgicas que reforgam ou excluem o papel de determinados agentes de uma formacao histérica, (TORRES, 1997:71) Dos quatro momentos que se convencionou aqui para rascunhar o percurso de onde emanam as assertivas do roteiro descrito, se destacara as obras que mais influenciaram e foram utilizadas pela historiografia rio-grandense, Esses quatro momentos seriam: 1, Séculos XVI e XVIII. A hist6ria produzida pelos jesuitas. 2, Século XIX até meados do século XX. Ordenando e idealizando o tema “Missdes". ida historio- 3, Década de 80 até o inicio do século XXI. A primeira geitica 4, Do ano 2000 até o presente. Uma nova virada historiografica? Os jesuitas e “sua” historia. Como sinalizado anteriormente, é consensual entre os especialistas o fato de que a tematica das Missdes Jesuiticas em geral, e no Rio Grande do Sul em particular, recebe grande atencao e se converte em uma producao expressiva. Como resultado disto, ou possivelmente ao contrario, em um complexo pro- cesso dialético de retroalimentacdo, as Misses tem o destaque em qualquer sumério de sfnteses ¢ coletaneas da Historia do Rio Grande do Sul, Longa éa trajetéria que conduziu a esta situacdo. E ao longo dessa trajetéria 0 texto, a escrita, o registro, teve e tém um papel preponderante. Os estudos relativos a historiografia do tema das Missdes concordam que os préprios jesuitas institufram, exerceram e consolidaram uma préxis de escritura que se tornou um dos eixos da articulado do vasto corpo que compunha a Companhia de ae i Awrur H. F Bancetos 51 Jesus®, desde suas origens, em 1539, até ao menos a supressao da ordem em 1773. E mesmos além deste episédio, mantendo certa forsa bem entrado ja co século XIX. La Compatila, desde su constituci6n, mareé una construceién, desumemoriaen clave apologéticay propagandistica; poresto laescritura tuvo ua lugar relevante dentro de la instituciéa, debido al papel que le otorgaron a la misma, convirtléndola ceninstrumento de goblerno, Ademés delos fines utiitarios, la ‘eseritura se convirtié en un lugar dememoria de ainstituetén, yen una herramienta de defensa de la instituctn frente alos, enemigos que posefa tanto adentro como afuera dela Iglesia’, Dentre os incontéveis textos produzidos pelos jesuitas, os quais merece- riam uma tipologia, encontram-se as Hist6rias. Especificamente para a Antiga Provincia jesuftica do Paraguai tem-se Diego de Boroa, Nicolas del Techo, Pedro Lozano, José Guevara e Domingo Muriel". Porém, seus escritos no foram as principais fontes que se consolidaram como referéncia obrigatéria posteriormente no que tange aos vinculos com Rio Grande do Sul. De fato, quatro missionérios tem sido a base para descrever/explicar os primeiros contatos entre jesuitas guaranis; as origens das Reduces; a organizacao da vida cotidiana e do espaco missioneiro; e as priticas econdmicas e culturais no interior dos povoados, Sao eles Antonio Ruiz de Montoya, Roque Gonzalez de Santa Cruz, José Cardiel e Antonio Sepp". Dos quatro, apenas Roque Gon- INBERG, José. As misses fesulticas eo pensamenta politico maderno, Encontros culturais, ‘aventuras te6ricas Belo Horizonte, Editora UEMG, 2000. ° CARGNEL, Josefina G, Las Historias “generates” de la Compafia de Jessy la regt6n riopla: tense, Trabalho apresentado nas XVI Jornadas Internacionales sobre las Misiones Jesulticas Resistencia, Argentina, 2016, Inédito. %© BARCELOS, Artur H.F.O Mergulo no Seculum.Eeplragtioconquista e organtzagao espacial Jesultica na América espanhola colonial. Porto Alegre, ed. Anima, 2013. Ver ainda o caso de emardo Yoder Echavari candidat #historlador da Proviacia, spresentado ern NEUMANN, Eduardo S. 2/1 (gnara queno he tenido ocosa la Pluma?: a poitmica produsdoesrita de um Jesuta durantea Tratado de imites.Revsta de Estudos da Cultura, n.S, malo-agosto, Aro, UES, 2016, pp. 35-48, e MOURA, Gabriele R. ‘Hombre docto,dilgenteyerudito’ a priticahis- toriegrdfce de Pedro Lozano, SI: ll Encontro de Pesquisas Historias - EPHIS, 2017, Porto Alegre. Anais do If Encontro de Pesquisas Historcas~PPGH/PUCRS, Porto Alegre, EDIPUCRS, 2017 pp. 953-962, —_lllustres Varones croistas historidgrafo da Provincia su tien do Paraguay, ins HCERIA--TICo}6quo Discent de Estudos istricosLatino-Amerianos, 2017, S30 Leopoldo. Estudos Histricos Latino-Americanos:conexdes Brasil e América Latina Porto alegre, orina Diagramacio, 2017p. 191-207. ™ MONTOYA, Antonio Ruiz de. A Conquista Espirtual feta pelos religiosos da Compania de Jesus nas Provincias do Paraguay, Parand, Uruguay e Tape, Porta Alegre, Martins Livreiro Editor, 1985; SEPP, Antonio S}. Viagem as Missdes Jesuticase Trabathos Apostétieas. Belo Ho rHaonte, Ed, atiala/St0 Paulo, EDUSP, 1980; CARDIEL, jose 8), reve Retactén de las Misiones del Paraguay 1757), Prélogo de Ernesto}.A: Maeder Buenos Ares, Secretaria de Cultura dela Nacién, Ediciones Theoria, 1994. (RIP rrr rrr ree EEE EEE EE HEE HEE EEE Ie HEE Eee ee Ere eee Eee eee be Roque Gowzasz A Crisnwro Nemepa: Usta NOVA VIRADA HISTORIOGRATICA sales nao delxou uma obra escrita que tenha alcangado grande circulasao, Os aa is tiveram seus escritos publicados ainda em seu tempo de vida, tendo Sido idos e reconhecidos por seus pares e detratores. Sendo autores de mo- mmentos distintos, guardam entre si relacdes que foram estabelecidas por seus Teftores muitas décadas depots. Paulo Oliveira reconhece os tragos comuns da ‘escrita jesuitica que se aplicam aos quatro aqui referidos Apesar de escreverem em épocas diferentes, ¢ motivados por circunstancias diferentes, 08 historiadores jesuftas Constituem uma espécie de linhagem. Ligados por lagos fnstitucionals e devocionais a um passado em comm cultivam uma reveréncia pela memdria eserita ¢ pelos santos f herdis da Compania. Resulta disso uma historiografia Gutolegitimadora e autorreferente, que combina a pesquisa historica com anarrativa hagiografica, (OLIVEIRA, 2011:26E) Montoya e Roque Gonzales sio cronistas dos primeiros anos, entre 1610 1626, para as evangelizagées nas dreas do Guaira e do Tape respectivarnen: te. Seus textos estio marcados pelas dificuldades da conversio, os conflites vem os bandeirantes eas primeiras medidas para estabelecer uma Redusao. Por esta razao sAo citados exaustivamiente quando destes aspectos se trata ‘Mem disto, Roque Gonzalez fot morto por um Ievante liderado por um Pajé guareni, Negi, um dos poucos @ ter seu nome registrado no roteiro que se aera tratando de decifrar, Roque foi convertido em martir ¢ heatificado em $1932, 0 que contribuiu para sua ascensao ao canon de fonte de inspiragio¢ protagonista das Miss6es. Sepp escreveu no final do século XVII uma série de eeptae ¢ outros textos que serao publicados entre 1696 e 1710. Por ter sido snissiondrio em Sao Miguel e S40 joao Batista, da qual foi fundador, Sepp gust vty ama relacao com os Sete Povos, transformando-se no modelo de jestta abnegado e pratico na administracdo temporal das Reducbes. Cardiel escrevit vvametade do século XVIII e notabilizou-se sobretudo pela defesa das Missées entre os Guarani ea descricdo que iria consolidar uma visdo estatica dos 30 povoades. A projecio de Montoya e Sepp sobre a historiografia gaicha ee tornara mais marcante a partir da década de 80, quando seus textos sero publicados em portugues (SEPP, 1980; MONTOYA, 1985). Antes disso, fardo parte de um conjunto maior de cronistas da Companhia de Jesus que estardo presente entre as fontes dos autores do século XIX e principios do século XX ‘Ainda no século XVIII, no contexto da administracéo Inspirada pela ra cionalidade de Estado, os jesuftas passaram a ser alvo de diversos ataques por parte dos que viam na orem wm tremendo poder de projesio sot 08 epnarcas. Em Portugal, foi Sebastido José de Carvalho e Melo, mais tarde Mar- qués de Pombal, principal adversério da Companhia de Josus. Nao escapow si solhos do Secretario de Estado do Rei Dom José a enorme projesao que os jesuftas haviam alcangado na América, bem como os embaraces provocados Sultas Mav Tae es a. tentadg de Madri. Como forma de sola- Anon H. F BaRcetos par aimagem dos inacianos, Pombal faz publica, deforma andnima, a Relacfo v pbreviada da republica, que os religiosos jesuitas das provincias de Portugal, @ Hespanha, estabelecerdo nas dominios ultramarinos das duas monarchias. em yaa Nela, acusa os jesuftas de estarem por trés dos problemas na execuso do Tratado ¢ de terem planos de formar um Estado independente com os Gua- rani Dois anos depois, Voltaire publica seu Céindido, onde também os jesultas asas MissOes s20 alvo da ironia do fildsofo francés, conhecido eritico da Tareja Catdlica, Uma década apés acirculagdo do livro de Voltaire vem a lume reishgo poema 0 Uraguat, de José Basie da Gama, 1769, Uma obra na qual 0 o stor embora reconhega.a grandeza dos feitos dos padres entre os indigenas, cece cniticas mordazes aos resultados e ao tratamento dispensado aos ndios. Poude-se ainda acrescentar a estes textos antijesuiticos 0 Histotre de Nicolas Roy du Paraguat ex Empereur des Mamelus, publicasao anonima (1756) que arta as faganhas de um certo Nicolau Roubiouni, irmao leigo jesufta que paibou se tornando Nicolau I, rei dos indios rebelados contra o Tratado de Madr, Juntos, estes quatro textos, mas sobretudo a Relagao Abreviada de Pombal,tiveram também influéncia nas imagens projetadas sabre as Misses | dos jesuitas nas fronteiras entre os impérios de Portugal e Espanha, Por a razio sao também consideradas obras que acabam trazendo elementos para 0 roteiro basico dessa tematica™, 0 século XIX e as idealizagées projetadas para o século XX A expulsiio dos jesuitas em 1767 provoca uma dréstica mudanga para 08 povoados que haviam sido administrados dentro de marco de suas redusSos. inves da tutelae da infiuéneia dos jesuftas, os guaranis se viram sob a admi- nistracdo de civis e militares espanhdis ou criolios que passaram a projetar-se Sobre os Cabildos, érazos de govern local em cada povoado. De forma lenta ¢ gradual, com complexos processos de busca de autonomia, confitos inter: hos, alteragdes de jurisdigbes politicas, quedas demogréficas e desmandos de toda ordem, as antigas RedugBes serdo fragmentadas, espoliadas, envol- vidas nas guerras caudilhescas e, finalmente, totalmente descaracterizadas Como Pueblos de Indios, passando pelo arruinamento ou conversdo em Vilas 3 Feiapoakbveiada da Peptic, que os religisas asus das provincas de Portugal ¢ Hespanha, estabelecento nos domintasultramarinos das duas monarchs. ‘Anbinimo.A hstria de Nicolas Rel do Paraguate Imperador dos Mamelucos [1756]. ee nuapbo tek de Rerwanda Verisino, So aul, Edtora Unesp 2017. MELO, Seas) 8e Ce. Repidleajeniton ramarna [1755 “Apresentagdo etranscrigao de illo Quevedo dos tos Fe Aes Martin Livreio, Santo Angelo, Fundames, 1989. GAMA, José Basilio 0 vega 1769}, Onganizacao e apresentagao de Luls Augusto Fisher, Porto Alegre L&PM, 2014: VOUTAIRE(Frangois Male Arouet), Candide ov 0 Oumsma [1753 ‘Porto Alegre, LAPM, 2003 er mals em DOMINGUES, Bet Helens, As mates err of ‘guaranis no context a tustrago. Revista Hist6ia, vOL25, 1.3, Sbo Paulo, UNESP, 2006. pP-44-63. 53 PEE ene eee eee ee 54 De Rogue Gowzatez A CRISANTO NeRENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGRAFICA e Cidades espanholas ou portuguesas e, mais tarde, argentinas, paraguaias ou brasileiras. Confrontados com aquele passado descrito pelos cronistas inacianos, cujas alabadas riquezas to denunciadas por seus adversarios acabariam contribuindo paraa mitificagao, estes lugares pareciam encobertos por uma bruma de desolacao. Serd ento que os iltimos padres ainda vives, principalmente no exilio da Italia, escreverao ainda suas vers6es para gaudio de saudosistas do que ndo conheceram, Mas nao apenas jesuftas tratardo de trazer de volta, na forma textual, aqueles anos perdides. Diversos autores irdo construir suas historias e apresentar interpretacdes que oscilarao entre a ode idealizada e a critica mordaz. Serdo os anos de Jodo Pedro Gay e sua Histdria da Repiiblica Jesufta do Paraguaé (1863)"; de Robert Cunninghame Graham e sua Arcadia Perdida (1901/2000); Leopoldo Lugones ¢ 0 Império Jesuitico (1907); e Hemetério da Silveira e seu As Missdes Orientais e seus An- ‘tigos Dominios (1909), todas obras gestadas no século XIX e que circularam por boa parte da primeira metade do século XX. Outro autor que é pouco lembrado, mas que muito contribuiu para manter a mistica em torno das antigas Missdes dos jesuttas foi Joao Simées Lopes Neto. Em seus Lendas do Sul (1913) e Terra Gaticha (1955) as Missdes estdo presentes. Em Lendas do Sul, Simbes Lopes reforga a aura de mistérios e riquezas, construfdas ainda no século XVIII pelos detratores dos jesuitas, para dar origem aos contos A Casa de M’bororé e Salamanca do Jarau. Em Terra Gaticha, obra inacabada, © autor incluiu as Missées na formagio hist6rica do Rio Grande do Sul”. Os autores aqui arrolados manterao o tema das Missées em voga, cada um a sua maneira, fazendo com o que mesmo chegasse vivo e revigorado no século XX. Na segunda década temos a obra de Carlos Teschauer Hist6ria do Rio Grande do Sul nos dois primeiros séculos, lancado em trés volumes entre 1918 e 1922". Em que pese a grande quantidade de informagGes sobre os primeiros contatos entre jesuitas e guaranis no século XVII, Teschauer ndo se tornou uma refe- réncia cuja influéncia possa ser colocada no mesmo patamar de Pedro Gay € WS” GAY, Joao Pedro, Histéria da Repitbiica Josuita do Paragual desde o descobrimento do Rioda rata até os nossas dias, anode 1861. Rio de Janelro: Typ. de Domingos Luiz dos Santos, 1863 1S GRAHAM, Robert C A vanished Arcadia; being some account of te Jesuits Paraguay, 1607 0 1767. Landon, W. Hainemann, 1901. Robert C. La Arcadia perdida. Una histiriade {as misionesjesuticas. Buenos Aires, Fmecé Editores, 200 SILVEIRA, Hemetério José Velloso da, As Missdes Orientaise seus Antigas Domintas, oto Algre. Universal, 1909. © NETO, Simées Lopes. Terra Gaiicha. Colegio Meridional, Porto Alegre, Bd. Sulina, 1955. BENTANCUR, Paulo (org.) Obra completa de Simdes Lopes Neto, Porto Alegre, Ed. Sulina, Editores, Copesul, 2003, % TESCHAUER Carlos. Histdrtado Rio Grande do Su dos dots primeiros séculos. Porta Alegre, ba. Selbach, 1918. v 1; 1924. . 2; 1922. v. 3, TESCHAUER, Carlos. Historia do Rio Grande do Tega a ate ee a rare eet ot AntUR H. F Barcetos 55 Hemetério da Silveira, isto se deve, em parte, pelo pouco interesse nos anos iniciais frente a exuberdncia tributada as reduces do século XVIII. Contudo, era justamente Teschauer que aportava dados para a presenca espanhola, via jesuftas, no territério que seria mais tarde o Rio Grande do Sul. Seré entdo 0 momento de a historiografia rio-grandense debater sobre o qual o papel das Misses Jesuiticas na formasao hist6rico-social do Estado. Gutfreind demar- cou os campos em oposicao, identificando duas correntes historiogréficas, a Lusa ou Luso-Brasileira ¢ a Platina ou Jesuftico-Espanhola. Para discernir estas duas tendéncias, Gutfriend explica que se tratavam de matrizes histo- riograficas: Pormatrizentende-seumtipode discurso com caracteristieas| comuns encontradas em um conjunto de obras histéricas, ‘eujos conceltos adquirem significados ocultos, conforme fa conjuntura que se desenvolve e, po isso mesmo, mantém uma vitalidade sempre eficaz, Essas matrizes representam a busca da identidade politica-culeural do terrtério sul-rio- grandense (GURFRIEND, 199812} Esse debate, cujos principais expoentes podem ser Moysés Vellinho e Ma- noelito de Ornellas, é central para a estrutura do roteiro que se est tentando elucidar. Engalfinhados em um combate historiogréfico, tratardo de incluir ou refutar a influéncia ou mesmo a insercdo das Missdes Jesuiticas na Historia do Rio Grande do Sul’, Tanto a negativa enfitica de Vellinho quanto as apro- ximagées realizadas por Ornellas acabaram incidindo sobre a imagem que se cristalizou ao longo do século XX. Outros autores, como Souza Docca, Othelo Rosa, Alfredo Varela e Aurélio Porto também participaram do debate. Cabera a este iiltimo, Aurélio Porto, a condi¢ao de principal referéncia para o tema das Missdes, ao menos até a década de 80. Seu Histérla das Miss6es Orientais (1954), em dois volumes, faz um apanhado geral das Misses, vistas como uma ‘civilizagao jesuitica”, Fortemente embasada em fontes documentais, sobretudo os Manuscritos da Cole¢ao Pedro de Angelis, da Biblioteca Nacio- nal do Rio de Janeiro, a obra de Porto destaca-se de todas que a precederam. Nela o indigena é visto no processo civilizatério do qual foi a parte submetida. | i 2 Seré esse {ndio cristfo clvilizado, trabalhado pela mio incansivel dos padres da corapanhia, que contribuiré para a formagao étnica do gaicho. Para A. Porto, & através do pprocesso eivilizatro inteiado pela Companhia de fesus que {oi possivel aparticlpario do indigena na formagfio do gaucho. CCriase assim um lago entre passado e presente, entre o indo missioneiro eo gadcho do campo... (FOCKING, 2023) ‘© “TATSCHr Juliane dscursorepional na constieuipto da identidade do gacho, Revista ES- ‘rita, N, 19, Rao de janeiro, PUCRIO, 2014. pp.243-253 7 ICE@ ATRISANTO NERENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGRAFICA Porto serd desde entao a principal referéncia. Histéria das Missées Orien- fais trés varios dos componentes do roteiro basico, além de quase obliterar Qualquer possibilidade de um protagonismo indigena. &, de certa forma, aco- moda as Misses na Histéria regional, deixando para tras a polémica sobre as origens do Rio Grande do Sul. Porém, isto nao impediré que outra polémica se imponha. Refiro-me ao carter destas Miss6es, E neste particular certamente henhum livro causou maior impacto do que A Repiiblica Comunista Crista dos Guaranis, de Clovis Lugon (1968). Dividido em quatro partes, a primeira de- dica-se aos antecedentes e os primeiros momentos das reducSes. Pelos titulos de seus capftulos percebe-se a defesa dos indigenas como vitimas da cobica dos bandeirantes. Séo eles: I. Os Guaranis antes da chegada dos Jesuitas; IL. Fundacdes ¢ III. Devastagées dos Paulistas - Grandes Migracdes. A segunéa arte trata da organizacdo institucional através dos seguintes capitulos: IV. Situago e aspecto das Reduces - Populacio; V. A Organizagao Politica; VI 0 Exército ¢ Vil, Relagdes com a Coroa da Espanha. Esta parte é que retoma as visdes de uma ordem perfeita, equilibrada, onde os guaranis encontram vaso para seu etos comunitério sob a batuta do cristianismo solidario dos jesuftas. 4 terceira parte avanca na organizacdo comunitaria e no cotidiana das atividades econdmicas ¢ culturais: VII. A Agricultura; IX, O Artesanato ©. Industria; X. As Artes; XI. 0 Comércio e a Moeda; XII. 0 Regime de Pro. priedade; XIII. 0 ‘Trabalho e a Repartigao da Renda; XIV. A Vida Social e XV. A Vida Religiosa. Todos aqueles elementos, jé presentes nas obras de Cardicl © Sepp, retornam matizados pelo pendor guarani para as artes e a vida em Comunidade, Vale destacar um dos tantos momentos em que Lugon sintetiza sua visdo geral sobre estas Missdes: Deum pontaaoutrade suahistéria,a RepiblicaGuaraniviveu sob oregime de propriedadecomum das terras. A propriedade Individual do solo nunca se coneretizou em parte alguma de seu territério. Comprar, vender, alugar ou legar + male modesta poredo de terra, utilizar o trabalho de outrem para beneficio elucro préprio, transformar o solo em Instrumente de dominagao ou de exploracdo do homem pelo homem, sf0, ‘antas outras operagoes que se mantiveram desconhecidas até ao fim Olote vitalicio que se tentou introdur, encontrou, 8 indiferenca total dos guaranis, muito satisfeitos com seu. regime de comunidade integral. A malaria dos padres, que 6 agiu sob pressdo do rei © ameaga de seus adversarios, também ndo insistiu, de resto, compreendende muito bem ue 0 desenvolvimento dos interesses ego(stas acarretaria a ecadéncia religiosa e social de suas comunidades, edificadas sobre 0 alicerce da solidariedade (LUGON, 1976:42) De uma tentativa de estabelecer um Estado Teocrético ou um Império esuitico no corasae da Amética espanhola, como acusavam o Marqués de ombal e outros seus contemporaneos do século XVIII, as Missdes passam a ARTUR H. F Barcexos 7 ser vistas como um projeto idilico, realizado pelo zelo e engenho dosjesuitas eas habilidades e qualidades naturais dos guaranis, Resulta daf talvez a mais forte influéncia em todas as visdes romanticas subsequentes e que se mantém em alguns circuitos até os dias atuais. Originalmente publicado em Paris, em 1949, chegou ao Brasil em 1968. E deitou rafzes. Pode se perceber seu eco em diversos livros posteriores. Taivez o que mais tenha deixado transparecer essa insplragdo tenha sido 0 sacialismo missioneiro, de Décio Freitas (1982). ‘Sem a mesma repercussio que o livro de Lugon, Freitas conseguiu ao menos atrair a atencao no Ambito regional. Apesar de sua tese pecar pelo anacro- nismo do conceito de socialismo, os indigenas so tratados como agentes ativos do processo de construcdo e consolidagio das Misses. E a sociedade comunitaria que ensaiavam foi vitima da ambico dos impérios ibéricos. De Festo, ndo escapou da encruzilhada de nao saber ou no ter como explicar 0 destino daquelas populares decaidas. Como uma reagao a todas estas visdes que vinham se desenrolando desde o século XVIII até a década de 70 do século XX surge Miss0es: uma utopia politica, de Arno A. Kern, no mesmo ano em que Freitas lanca a primeira edigo de seu livro, 1982. 0 livro de Arno encerra um ciclo e inicia outro na divisao aqui proposta. f, portanto, uma obra de transi- so, Produzido originalmente como uma dissertacao de mestrado que Arno Kern decidiu finalizar em Paris, quando iniciava seu doutoramento, Missdes; ‘uma utopia politica contou com o reforco de fontes que o autor pode acessar € que Ihe deram elementos para sustentar seus argumentos. Kern conseguiu desmistificar as vis6es idilicas e idealizadas, av mesmo tempo que inseria em definitivo o tema das Missdes no ambito académico rio-grandense. Toda uma nova geracdo de autores ird surgit a partir do patamar de debates que 0 livro inaugurou, As Misses na obra de Kern sio vistas em seu lugar dentro do Estado Colonial espanhol c em seu papel nas fronteiras imprecisas com as possesses portuguesas. Embora Kern mantenha a ideia de um pacto entre ‘aciques e jesuitas e trabalhe na perspectiva de Reduces habitadas apenas por guaranis, o livro aponta para a importancia dos agentes indigenas na ad- ministrag3o dos povoados e na organizacao das atividades econémicas, Assim, 9 cardter politico nao recai apenas sobre uma capacidade jesuftica de manipw lar os grupos reduzidos, mas sim como um jogo entre as praticas tradicionais de lideranca indigena Guarani e a acomodacao nos sistemas hispanicos do Cabildo e da burocracia. Por essas e outras razbes, 0 livro de Kern permane- ce entre os mais citados na bibliografia utilizada por especialistas e leigos. Apés 34 anos, 0 livro recebeu uma segunda edic3o, pela PUCRS. Missdes uma utopia politica é, portanto, um marco da primeira virada historiografica efetivamente ocorrida no tema das Missdes Jesuiticas no Rio Grande do Sul. E acabow atraindo a atengao de historiadores e antropdlogos de outros Estados do Brasil que se dedicavam a presenca jesultica no periodo colonial. No ano 8 De RoQUE GONZALEZ A CRISANTO NERENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGRAFICA seguinte, Moacyr Flores langaria Colonialismo e Missdes Jesuiticas™. Diferente de Arno, que realizou um estudo denso e com farta apresentagao de fontes, Flores dedicou-se a sinteses, voltadas também para 0 uso no ensino, tanto secundario come de graduagdes. Antes que a década de 80 chegasse ao fim, ‘outro livro que exerceria certa influéncia, sobretudo em autores diletantes ‘ot externos ao ambiente académico foi Os Trinta Povos Guaranis, de Arnaldo Bruxel (1987), Uma espécie de sintese, esse livro trazia uma imagem um tanto quanto estitica dos povoados, sobretudo no que toca aos panos urba- nos, Suia descri¢éio acabou sendo repetida em diversos trabalhos posteriores, contribuindo para a aura de grandeza urbano-arquiteténica que as Missdes desfrutavam no imagindrio social. A obra de maior Importdncia deste perfodo fora do circuito de autores da historiografia rio-grandense tardou um pouco a ser assimilada, Trata-se de BI Guaranf Conquistado y Reducido: ensayos de etnohistéria, de Bartomeu Melid, de 1988, Seu autor, um jesuita espanhol, possufa j4naquela altura grande experiéncia entre os Guarani atuais do Para- guai. Seu olhar antropol6gico trouxe outra perspectiva, abordando categorias indigenas como o “modo de ser guaran’, sua cosmologia, a lingua guarani, a tensao da conversio, além de introduzir a leitura etnogréfica das fontes coloniais, abstraindo destas o protagonismo dos indios. Em suma, El Guarani Conquistado y Reducido antecipava algumas chaves de leitura que aparece- riam com mais énfase na década de 90. Outro livro externo & historiografia gaticha que teria grande recepsao nos circultos académicos fui ful ¢ jesus rno tempo das Miss6es, de Maxime Haubert. Originalmente publicado na Franca em 1967, chegava com 23 anos de atraso para o pitblico brasileiro, em 1990". Com uma abordagem que partia da cosmovistio Guarani, Haubert tratou de analisar a compreensdo ind{gena do fenémeno reducional. Junto com Melia, Haubert consolidava a importéncia dos aspectos antropol6gicos e etnolégi- cos para a interpretacao do proceso que levou a constituicao das reduces ‘entre os Guarani. 0 campo da Histéria ia cada vez mais cedendo espaco para analises baseadas em marcos teéricos e metodol6gicos da Etnohistéria e da Antropologia. Ainda que se estefa tratando de historiografia, nao é possivel desconsiderar 0 impacto do filme A Missdo, de Roland Joffé, langado em 1986 ‘ecom Robert De Niro, Liam Neeson e jeremy Irons no elenco. Com um roteiro centrado no conflito provocado pelo Tratado de Madri, o filme trazia uma vi- ‘so romantica dos jesultas e dos guaranis, pegos em uma trama urdida pelas 3 FLORES, Moacyr Colonialismo e Missbes Jesuiticas. Porto Alegre, EST/ Inst. de Cultura ispanica, 1983. 5 BRUXEL, Arnaldo, 0s rinta poves Guaranis. Porto Alegre: EST/Nova Dimensao,2*ed, 1987, 2 MBLIA,Bartomeu. Ef Guaranf Conguistad y Redueldo: ensayes de etnohistéria. Biblioteca Paraguaya de Antropologia Vo. 5. Asuncién, CEPAG, Uni Catélica, 2° ed. 1988. 2 HAUBERT, Maxime, fndios ejesultasno Tempo das Missbes. Ro de Janeiro, Companhia das Anerur H RCELOS 5 coroas ibéricas. Com imagens dramaticas tipicas do cinema da década de 80, explorando a exuberdncia da floresta subtropical e das cataratas do Iguac a histéria termina com a destruigao das Missdes e o fim daquela vida crist plena e harm6nica, Plantava-se assim, mais um reforgo para a idealizacio do pasado. A recepco nes cinemas foi razodvel e, no Rio Grande do Sul, apés a langamento em fita VHS, o filme tornou-se quase obrigatorio nas aulas de Histéria das escolas da rede ptiblica e privada. A reagiio mais contundente, ro entanto, veio de um cineasta, o documentalista Syvio Back. Esse havia realizado em 1981 0 documentério Repiiblica Guarani, coma participasao de expoentes da historiografia, como Maxime Haubert, Bartomeu Melia, Ernes- to Maeder. Back chegou a trazer o sufgo Clovis Lugon, que pode finalmente ‘conhecer a regido sobre a qual escrevera ¢ as rufnas das reduces, Em 1989, ‘trés anos apés o lancamento de A Missdo, Back langou 0 livro Pensar es Insa- Jubre, onde fazia uma critica dura e mordaz contra os jesuitas, a colonizagao e cristianizacao dos indigenas, e incluiu um capitulo sobre o filme de Jofié. O livro nao chegou a causar reagdes entre os historiadores do Rio Grande do Sul, que, aquela altura, tratavam de seguir ampliando os estudos sobre as Miss6es, como visto pelos titulos citados acima. A década seguinte seria da expansao de vertentes. A Academia assume 0 controle ‘A partir dos anos 90 ha um significativo aumento de pesquisas e publi- cagées. Isto se deve, em parte, a consolidacao de trés programas de pos- -graduacao em Histéria, na Pontificia Universidade Catélica, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e na Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Em ‘cada uma destas instituigdes, e mesmo fora do Estado, realizavam mestrados ‘e doutorados aqueles que constituiriam a préxima geracdo a frente das pes- guisas no tema das Missdes Jesuiticas, Além destes, autores ja com alguma trajetéria voltarao ao tema, com novos estudos. Ao longo da década os livros resultantes desse processo comecariam a circular. Jilio Quevedo dos Santos da inicio a esta nova fase com Rio Grande do Sul. Aspectos das Miss6es ¢ logo depois Missdes: crise e redefinicéio*.O primeiro, alcanca um publico mais am- plo, como uma linguagem mais direta e destacando tépicos mais relevantes. O segundo é um estudo voltado a interpretar a crise politica que se desdobra a partir do Tratado de Madri e impdes aos jesutas, e sobretudo aos guaranis das redugées, uma redefinigéo de seus papéis como agentes envolvidos no conflito de fronteiras. Arno Kern volta ao tema das aspiracdes ut6picas pro- 2 BACK, Sylvia Pensar eb insalubre. A polémica sobre as Misses fesuftcns. Rio de Janeiro, Imago 1989, 2 SANTOS, io R. 0, dos. Rio Grande do Sul. Aspectos das Missdes. Porto Alegre, Martins Lit vrei 19ST StcTOS fallo RQ, dos. As MissBes: crise e redefinisao. Szo Paulo, Bd Atica,1993. 60 De ROQUE GONZALEZ A CRISANTO NERENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGRAFICA jetadas sobre os jesuitas e suas Missdes", Repassa os autores cldssicos e os modelos utépicos desde a antiguidade, passando pelo medievo, até alcancar 05 contemporaneos da Companhia de Jesus no século XVI. Para Kern, a utopia presente nas missdes estava limitada pela insercao do projeto missional no cerne do Estado colonial espanhol. 0 trabalho talvez tenha recebido menos atencio do que o merecido, haja vista a permanéncia da ideia de uma utopia missioneira jesuitico-guarani. Apés ter sido orientando de Arno Kern, Eduar- do Neumann faz sua estreia como especialista publicando 0 trabalho guarani ‘issioneiro no Rio da Prata colonia”. Um dos primeiros trabalhos, sem duivida © primeiro na historiografia rio-grandense, a enfocar os guarani reduzidos fora do Ambito de seus povoados. Na esteira da linha inaugurada por Kern, segundo a qual as Misses adquirem sentido quando vistas em sua insergio no Estado colonial, Neumann apontaré para a presenca e a importancia dos Guarani missioneiros nas obras das cidades coloniais, nas ages armadas dos conflitos regionais, em consonancia com a formacao de uma mao-de-obra especializada no interior das Reduces. 0 objeto deixava de ser as Missées, enquanto lugar da evangelizacdo ¢ civilizagao, e passava a ser a integracdo destas ao mundo colonial espanhol e circulacao dos guaranis para muito além dos povoados. Na medida em que as Missdes iam sendo vistas em suas relagdes com o contexto mais amplo das frentes de colonizacdo lusa e espa- hola, e consequentemente também dos choques entre estas, varios campos se abriram, Protasio Langer retomou as origens de alguns assentamentos em territ6rio portugueses que se deviam a transmigragao de guaranis durante 0 conflito da Guerra Guaranitica®, Assim, a Aldela dos Anjos, atual Gravatai, & analisada a luz desta ampliacao do fendmeno das Misses e, néio menos im- portante, das estratégias de negociagao dos guaranis para decidir seu futuro espremidos entre dois impérios coloniais. 0 velho Guaira, tao importante para ‘a compreensao dos primeiros passos no contato entre jesultas e guaranis, é retomado por Erneldo Schallenberger™, 0 autor, valendo-se dos conceitos de colonialismo interno e fricco interétnica, aprofunda a questo dos con- flitos com os encomenderos espanhbis na regido em que os jesultas tratavam de instalar suas primeiras redugdes. Assim, desviava o foco da questo dos bandeirantes e da resisténcia xamAnica, to presentes na obra de referén- cia de Antonio Ruiz de Montoya. Schallenberger comegava a preencher uma importante lacuna, tal como 4 0 havia feito Regina Gadelha para a regido do 3 KERN, Arno A. Utopias e MissGes Jesulticas, Porto Alegre, Editora da UFRGS, 1994. 2 NEUMANN, Eduardo SO trabalho guarant missionelro ne Rio da Prata colonial, 1640-1750. Porto Alegre, Martins Livreiro, 1996 LANGER, Protisto PA Aldela Nossa Senora das Anjo. resistoncta do guaran missioneiro ‘a0 processa de dominagdo da sistema luso. Porto Alegre, EST digBes, 1997, 2 SCHALLENBERGER, Erneldo. A integrapdo do Praia no sistema colonta. Colontalisma in terno e Misséies Jesulticas do Guatrd. Toledo, Editora Toledo, 1997: Pee Artur IF Barcenos 61 Itatin™, Apesar da consideravel producdo da historiografia rio-grandense, carecemos ainda de um trabalho equivalente para o velho “Tape” do século XVII, onde Roque Gonzalez, Cristévao de Mendonza e outros realizaram as pri- meiras incursées no que seria parte do atual Rio Grande do Sul. A explicaco da saida dos jesuftas apés 1640 baseada apenas nas razias dos bandeirantes é por demais simpléria. Essa regiao era alvo da atengdo da Companhia de Jesus em terras portuguesas e chegou a haver um esboso de aproximagao com os compankeiros do lado espanhol. Beatriz Franzen fol a Gnica autora a aprofundar um estudo sobre essa presenga de jesuitas portugueses no Sul em contraponto e complementagao ao que se vinla produzindo sobre os jesuttas nas porgdes espanholas"'. A Guerra Guaranitica, um dos t6picos centrais do roteiro basico sobre as Miss6es Jesutticas foi objeto do livro de Tau Golin, em, 11998, Golin publicou na integra 0 Diario do Demarcador do Tratado de Ma- dri na Primetra Partida, José Custédio de Sé e Faria, Uma edicao comentada, com extensas notas de rodapé, que faz 0 cruzamento da fonte principal com outros textos contempordneos ¢ a produgao sobre a tematica até ento dispo- nivel, Ainda nos anos 90 cabe destacar um livro que abriria varios caminhos teéricos e impulsionaria uma Histéria Indfgena que se anunciava em alguns trabalhos. Em 1994, John Monteiro lancava Negros da Terra", Com base em sélida pesquisa documental, John Monteiro demonstrou a real dimensdo da mo-de-obra ind(gena na producao agricola do Brasil colonial. Os indfgenas no texto de Monteiro sio protagonistas, na medida em que sao eles os princi- pais agentes da conquista e colonizacao dos territérios pelos luso-brasileiros, sejaatravés da associacao e colaboracio, seja através da resisténcia e oposigéo de toda ordem, 0 autor explicita a necessidade de um tratamento das fontes voltado pata localizar os ecos das vozes indigenas, Sua recepedo fard com que mais tarde ocorra uma inflexo importante no binémio jesuita-guaranis nos estudos sobre as Missdes, Seos anos 90 foram marcados pela proeminéncia clara dos estudos acadé- micos sobre as especulagées mais generalistas e interpretacées com menos densidade documental, a década seguinte colocaria em definitivo 0 tema das Misses Jesuiticas em uma escala global, ao mesmo tempo que era ana- lisado por referenciais te6ricos de diversas areas do conhecimento, como ®GADELHA, RM, A F.As missdes esulticas do Itatim:estruturas sécio-econdmicas do Paro: ‘Quai colonia, séculas XVi e XVI. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980, * ERANZEN, Beatrie V Os fesutas portugueses e espankis apo missiondria no Sul do Brasit « Paraguai (1500-1640) estado comparativo. Sto Leopoldo, Ed, UNISINOS, 1999, ® GOUIN, Tau. A Guerra Guaranitica. Como os exércitos de Portugal e Espanha destruiram 03 Sete Povos dos jesuitasetndios guaranis no Rio Grande do ul (1750-1761). Porto Alegre: Edicora da Universidade, 1998. 2 MONTEIRO, John, Negros da Terra. fndios © Bandeirantes nas origens de Sto Paulo, Séo Paulo, Companhia das Letras, 1994 62 De Roque Gonzauaz A CRISANTO NeRENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGRAFICA a antropologia, as artes, a etnohistéria, a etnoarqueologia, a arqueologia, a geografia cultural, entre outros. £ nesse infcio dos anos 2000 que identifi- co as caracteristicas, ow os elementos, que podem indicar uma nova virada historiografica, a qual ainda nao se completou. As publicacdes entre 2000 2010 permitem ver a ampliacao de recortes, subtemas e temas correlatos 3s Misses Jesufticas, bem como a diversidade de probleméticas. Acompanhan- do uma tendéncia que j se esbogava na década de 90 e, como jé dito, deve muito as pesquisas vinculadas a Teses e Dissertacdes académicas, as sinteses gerais ou interpretagdes amplas sobre as Misses Jesuiticas tornam-se cada ver mais raras, para nao dizer inexistentes. Em seu lugar temos os trabalhos dedicados a aspectos especificas, como a religiosidade, adiversidade étnicado ‘componente indigena, a organizacao espacial do territério, aarte escultérica, 0 cotidiano, a perspectiva ea interpretacdo indfgena desse passado, 0 “mis- sloneirismo’, releituras sobre mitificacdo de personagens, como Sepé Tiaraju, etc, Jé no infcio do século XXI as relacdes entre os dados arqueoligicos & 0 espago manejado e organizado pelos Guarani das Misses era objeto de um Jevantamento, com base no caso de uma Redugdo em particular, Tratava-sede um esforgo para superar a énfase dada aos aspectos urbanos e arquitetonicos que havia sido proeminente nas duas décadas anteriores quando da espacia- lidade dos povoados se tratava™. Uma sintese foi ainda apresentada, com a singularidade de que tomou por fonte os Anais dos Simpésios Nacionais de Estudos Missionciros, que haviam sido realizados bianualmente na cidade de Santa Rosa, entre 1975 e 1993*. Beatriz Franzen revisitou a questo da cio jesuftica sob a coroa portuguesa nas terras sulinas, ampliando o que jé havia tratado na década anterior®. Os 250 anos da morte de Sepé Tiaraju, personagem destacado desde o século XVIII por diversos autores e eleito protagonista da Guerra Guaranitica, ensejou, como era esperado, uma sériede eventos, celebracdes e andlises por parte dos especialistas. Mdltiplos olhares foram langados sobre esse guarani, desde o mais laudatério até aquele que tratava de matizar sua figura e compreendé-la mais em relacdo as interpre- ‘tages e apropriagées contemporaneas do que o personagem que emerge das fontes histéricas. Neste sentido, destaca-se o denso trabalho de Ceres Brum, que insere Sepé Tiaraju na perspectiva mais ampla das representagées sobre o passado missioneiro™. Ainda em 2006, Maria Cristina Bohn Martins 55 BARGELOS, Artur fi. F Espaco & Arqueologia nas Missdes jesuttcas: 0 caso de Sto Jodo Botista. Porto Alegre, FAPUCRS, 2000, CHRISTENSEN, Teresa N. de S, Hstérla do Rio Grande do Sul em suas origens missioneira. jut, EAUNIFUL, 2001 © FRANZEN, Beatra VJesultas Portugueses eEspanhdis no Sul do Brasil Paraguat Colonia. ‘io Leopoldo, fd, UNISINOS, 2002. BRUM, Cores K.Bsta tra tem dono, RepresentagBes to passado missioneito no Rio Gran- ‘de do Sul, Santa Maria, Editora UFSM, 2006. __. Sené Tiaraju missioneite: tim talto pau cho. Yr Aprun HF Bancstos 63 langava Sobre Festas e Celebrag6es, como obra escolhida para publicacdo pela Associacao Nacional de Hist6ria, Regional Sul ANPUHRS.”, Aarte em madeira aque tanto fascinou os viajantes e visitantes da regido das antigas Misses e inspirou a cria¢o do Museu de Sao Miguel voltou a atrair a atencdo, Marilda Oliveira, Claudete Boff e Teniza Spinelif acrescentaram mais trés titulos aos j4 existentes em torno da estatudria missioneira e sua musealizacao. Em 2007, um trabalho que ndo tinha as caracterfsticas - quase sempre di- fusas ~ para circular entre as leituras académicas, acabou recebendo menos atencao do que merecia. TAVA MIRI Sao Miguel Arcanjo Sagrada Aldeia de Pedra: os Mbyé-Guarani nas Missdes® foi resultado da aplicacéo da metodo- ogia do Inventario Nacional de Referéncias Culturais (INRC) do Instituto do Patriménio Histérico e Artistico Nacional - IPHAN, Nele, os pesquisadores buscavam compreender, em parceria com mbyé-guaranis, quais elementos de sua cosmologia dotavam de sentido seu modo de ser e estar. E como es- ses elementos poderiam ser considerados entre aqueles que referenciam escolhas patrimoniais. A pesquisa iniciou com os moradores da Aldeia Tekoa Koenju (Alvorecer), que fica préximo as rufnas da antiga Reducao de San Mi- guel, Porém, desdobrou-se para outras comunidades do Estado. Mais do que encontrar os argumentos para reconhecimento de um patriménio imaterial ‘mbyé-guarani vinculado a Sao Miguel, que j4 patrimOnio da humanidade pela UNESCO, a pesquisa revelou como o passado missioneiro era interpre- tado pelos Mby4 e como se inseria em uma cosmologia mais ampla. Desvelou uma geografia Mbyd-guarani que se dé sobre o mesmo territério que outrora foi chamado de Espaco Missioneiro, e para além dele, Seus autores voltaram ao tema em 2009" e trouxeram uma reflexdio que deverd, no devido tempo, impactar com mais vigor a “Hist6ria das Misses Jesuiticas’, 0 tltimo ano da primefra década do século XXI traria ainda algumas contribuigées que corro- boram o que se vem tratando de demonstrar. Pairando sobre esse passado to ‘Santa Maria, Pallotti, 2006, PESAVENTO, Sandra J (07g). Sepé Tiaraju: muito além da lenda, Porto Alegre, Comunicagdo Impressa, 2006. ASSIS BRASIL, Ptolomeu de. Hatalha de Calboaté. Episédio culminante da Guerra das Misses. Braslia, edicbes do Senado Federal, 2005, % MARTINS, Maria C.B. Sobre Festase Celebragdes: as redugées do Paraguat (séculos KVIT XVII). Passo Fundo, UPF Beitora, 2006. OLIVEIRA, Marilda 0. de. dentidade e interculturatidade,Histria e Arte Guarani. Santa Maria, Editora UFSM, 2004. BOFR Claudete. A imagindria Guarani: 0 acervo do Musew das Misses Santo Angelo, CCM/URL EeiURI, 2005. SPINELLL, Tenaa, Esculturas missionetras em ‘musous do to Grande do Sul. Porto Alegre, Evangraf, 2008, © Souza, jose 0.€.de. etal. TAVA MIRI Séo Miguel Arcanjo Sagrada Aldea de Pedra:os Mbyd- ~Guarani nas Missoes Inventario de Referéncias Culturais INRC. Porto Alegre, IPHAN, 2007. * souza, José 0. . de. MORINICO, José C.P. Fantasmas das brenhas ressurgem nas ruinas: Moyd-guarant reaeam sua versdo sobre as Missbese depois delas In: BOEIRA, Nelson GOLIN, ‘Tau (Coordenacio Geral), Histria Geral do Rio Grande do Sul Vos, Povos Indigenas, Passo Rundo: Méritos Editora, 2009. pp. 301-330, 64 De Roque GoNzALEZ A CRISANTO NERENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGRARICA esmiucado ¢ 0 territério a ele vinculado esté o denominativo “missioneiro” Usado como uma forma de distinguir e classificar elementos de toda sorte, como lugares, objetos, territérios, pessoas, estilos arquitetdnicos e artisticos, entre outros, acabou chegando aos dias atuais, com a conotacdo ampla de tudo que diga respeito a regiao das “Missdes’, no noroeste do Estado, Roselene Pommer‘? apresentou a mais densa reflexio sobre esse conceito para chegar a uma identidade regional. Preencheu uma lacuna importante, oferecendo uma ferramenta te6rica para os autores quando se deparam com as questaes identitérias e o passado “missioneiro”. No mesmo ano foi publicado o quinto volume da série Histéria Geral do Rio Grande do Sul, dedicado aos Povos indigenas. Nele, seis capftulos estavam direta ou indiretamente relaciona- dos as Misses Jesuiticas, assim como no volume 01, denominado Colénia, ‘trés capitulos tratavam do tema. Um capitulo em especial, sem demérito aos demais, merece ser destacado a luz do que se vem desenvolvendo acima, ‘Trata-se de A visibilidade étnica nos registros coloniais. Missdes Guaranis ou Misses indigenas?®, de Jean Baptista. Seu autor tras a questdo que desatla um dos t6picos mais resistentes do roteiro basico até poucos anos, qual seja o de que as 30 Redugdes que resultaram das incursdes evangelizadoras no Guairé, Tape e Itatin e suas transmigrages, abandonos, fundagdes e refunda- ‘ces. partir de 1610 seriam compostas apenas de indios da etnia Guarani. 0 retorno as fontes, no espfrito de uma nova Histéria indfgena“, permitiu nao apenas relativizar aquela assertiva, como trouxe elementos para discutir a diversidade de pautas culturais com as quais tiveram que lidar os jesuftas, colocando em xeque também a assertiva segundo a qual as caracteristicas dos Guarani explicariam, em parte, o éxito das Reduces das quais foram partf- cipes. Ainda que proporcionalmente, até onde as fontes permitem inferir, os grupos gualachos, guafianas, minuanos, charruas, guenoas, apontados pelo autor, sejam numericamente inferiores ao componente Guarani, a constatagdo de sua presenca no regime reducional implica em rever varios aspectos até ento pouco explorados, como por exemplo a existéncia ou nao de bairros étnicos nos micleos urbanos. Este ano que fechavaa primeira década seria também o ano que apareceria o livro que, no meu entender, atua como emblemético na virada historiogrs- ‘= POMMER, Roselene M. G. Misstoneirisme, Histéria da producdo de wma idencidade regione. Porto Alegre, Martins Livreirs, 2009. Ver alnda FREITAS, André Luis. Redugdes Jesultico- -Guarant Espago de diversidade éxnica, Nhanduti Editors, Si0 Bernardo da Caropo, 2013. © BAPTISTA, Jean. visiilidade étnica nos regstras colonia. MissGes Guaranis ou Missbes {ndigenas? ln: BOEIRA, Nelson; GOLIN, Tau (Coordenaglo Geral. Histérla Geral do Rio Grande do Sul Vol, Povos indigenas, Passo Fundo: Méritos Editora, 2009, pp.207-228, + CUNHA, Manuela Carneiro da, (Ore) Histéria dos indios no Brasil S40 Paulo, Companhia das Letras, 1992. MONTEIRO, John M. op cit,1994, ALMEIDA, Maria Regina Celestina de. Os Indias na Hist6ria do Brasil. Rio de janeiro, Editora FGV, 2010. ee Pe | I Arron H. F Baxcenos 65 fica que se vislumbra, ‘Trata-se de Religion y Poder, de Guillermo Wilde. (Obra densa, que abarca um amplo marco temporal, esse livro tornou-se rapi- damente uma leitura obrigatéria para os especialistas nas 30 redusdes e sua histérla. Wilde se detém com profundidade na constituigo de um novo tipo de lideranga forjado no processo reductonal jesuitico. Apresenta os diver- sos mecanismos que levaram ao fortalecimento do poder dos Mburubichas {Caciques), da mesma forma como desvela outras expressées de liderancas, nas figuras vinculadas burocracia letrada. 0 poder, seu exercicio e as conse- quéncias sécio-histbricas para os Guarani so o cerne do trabalho de Wilde. Contudo, outra contribuicéo importante reside no fato de que ele avanga para 1 perfodo posterior a expulsao dos jesu(tas, enfrentando com eficdcia outra assertiva do roteiro basico, aquela que diz respeito a0 abandono dos povoados pelos Guarani e a decorrente decadéncia econ6mica. Ao contrario, o que se tem é um quadro de busca por autonomia politica e pelo efetivo controle de seus destinos colocando os Guarani em confronto com a administragao civil espanhola. Por outro lado, tem-se uma andlise da rivalidade entre caciques e cabildantes, desfazendo também a nogao de que apenas os caciques de “linhagem’ compunham o poder polftico indigena nos povoados desde os tempos jesutticos. Por essas e outras razées, se fosse necessario eleger uma obra entre as tantas que apontam para uma segunda virada historiogréfica no tema das Missdes Jesuiticas, creto que Religion y Poder poderia assumir 0 papel de livro-emblema dese processo que ainda nao se consolidou. Se, em 1982, Kern trouxe o tema das Misses Jesulticas em definitivo para o debate historiografico académico, Wilde avanga e aporta elementos para que esse tema seja ampliado nas suas relagdes transdisciplinares, ao mesmo tempo em que suscita 0 aprofundamento em tépicos especificos, como parece sera tendéncia que predomina na década em curso. Em que estamos? Com essa pergunta inquiriu-me uma vez Guillermo Wilde. Tratei de dizer- -Ihe que eram tantas as portas abertas nos iltimos anos que um quadro de sin- tese ainda resultava dificil. Contudo, os iltimos sete ou oito anos demonstram ue a tendéncia geral de desmontar o roteiro basico, ou ao menos retirar-Ihe a primazia de versdo mais eficaz se mantém, Vou me deter entdo em dols as- ectos que jé se anunclaram acima: as outras formas de poder e o destino dos Guarani apés a expulsio dos jesuitas. Sem nenhuma pretensdo de apropriar- -me de trabalhos alheios ou trazer algo inédito, pretendo apenas destacar algumas vertentes e sous desdobramentos, Quando Wilde aponta para uma lideranga dual, oscilando entre os caciques que tiveram suas linhagens refor- ‘© WILDE, Guillermo. ReligiOn y Poder en las misiones de guaranies. Buenos Aires, Editorial 88, 2009. a sadas pelos jesuitas e aqueles indigenas que, sem os "dons" da chefia tradicio- nal, alcancaram proje¢do pelo exercicio de mando e oficios na vida politica e econémica, abre-se o caminho para decifrar essa segunda forma de distingao. Enela se insere o trabalho de Eduardo Neumann, quando rastreia os indios letrados, A razdo gréfica acessada pelos indigenas no processo reducional significou um elemento de distinao, além de um instrumento que reformula as concepdes de tempo, atuando no campo da meméria‘”. Em outro sentido, essa razao grafica, consubstanciada na escrita, permite a disputa pelo presen- te, ao mesmo tempo que atua na disputa pelo passado, pelo registro para ofu- turo. Isso explicaria a atencao destinada a um documento em guarani, datado de 1704, relacionado ao cerco espanhol a Colénia do Sacramento que contou com contingentes das milicias guaranis das Redugdes. Para Melia trata-sede um documento de autoria de um Guarani, Para Thun, Cerno e Obermeier”, Tesponsaveis por sua traducdo e publicacio na integra, seria um documento escrito por um jesuita, com alguma participacdo direta ou indireta de um ou mais indigenas. A exegese a que submetem o texto trata de confirmar essa hipétese, Neumann, que também lidou com a problematica dessa fonte, cr’ que mais do que estabelecer uma autoria indigena ou jesuitica para o texto, deve-se compreendé-lo como um documento “missioneiro", no sentido de que 86 fol possivel ser forjado no entramado de relagdes dos padres e dos jesuitas com a escritura. Da mesma forma, outro documento que, diferente do texto de 1704, hd muito era conhecido dos pesquisadores, voltou a ser visitado, agora com novas chaves de leitura e interpretacao. f assim que o relato de Crisanto Nerenda, mayordomo [Administrador] da Redugao de Sao Luis capturado pelos portugueses no contexto da Guerra Guaranitica e posteriormente liber- tado, retorna como fonte indigena. Nas artes da hist6ria, onde o protagonismo passa pela existéncia no texto, nao & pouco que um indigena seja o autor ¢ © personagem da prépria historia escrita. Desconhecendo as formas que a ciéncia historica assumiria no futuro, Nerenda ao menos intufa que registrar Poderia ser a possibilidade de uma perenidade, expressa no texto: “ _ NBUMANN, Eduardo 8. Letra de fnios. Cultura esrita, comunicasdo e memériaIndigena nas Redupdes do Paraguay. Sao Bernardo do Campo, Nhanduti Fditora, 2015, © NEUMANN, Eduardo S, #scrita © meméria indigena nas redupdes quaranis: sécuto XVit. Revista Métis: historia & cultura, v6, n. 12, ju/dex. 2007, pp, 45-64. Nerenda e seu relato foram também objeto da Dissertagéo de SILVA, Marina G.O ‘Indo Historiador da redupao de Sto Luis: escrita e autor a partir do relato de Crisanto Neranda (1754-1772), Porta Alege, PPGH-UFRGS, 2017, “ _ MELIA, Bartomeu. Escritos Guarani como fontes dacumentais da histéria rio-platens. I ‘SUBSS, Paulo. et all, (orgs. Conversdo dos Gatives, Povos indigonas e missdo jesultica Sao Ber, nardo do Campo, Nhanduti Editors, 2009, pp.129-142, © THUN, Harald. CERNO, Leonardo. OBERMEIER, Franz (Introducel6n y notas), Guarinthape tecocue to que pasé en laguerra (1704-1705), Fontes Americanea VS, Kiel Westwnsee Ver, 2015, i RCELOS” ae 0 interesse dos Guaranis em deixar registras de suas experi@ncias © inquletagbes demonstra como escrita e memdrla estavam imbricadas no cotidiano da populagio missioneira, em um jogo social no qual procuravam estabelecer uma versio Indigena dos acontecimentos por eles, protagonizados®. assim que hoje conhecemos Crisanto Nerenda, Pasqual Yaguap6, Miguel Arayecha, Primo Ybarenda, e tantos outros cujos nomes vao acordando de um Jongo sono através da escrita de Neumann, ‘Ainda no tocante ao perfodo p6s-jesuitico, campo a ser mais explorado®, tem-se as trajetdrias de alguns sujeitos sendo descobertas em locais que a historiografia nao vincula com as Missdes Jesuiticas, como so por exemplo Alegrete e Santa Maria, Max Ribeiro e Luis Farinatti® encontram esses “mis- sioneiros” sendo batizados ou casando em capelas destas duas cidades. Nos registros de batismos pais e maes se identificam como naturais de Sao Luiz, Sao Borja, Yapeyu ou La Cruz, por exemplo, demonstrando que no haviam se rompido de todo os lacos com seus povoados, mesmo jé na segunda década do século XIX, Poderia estar af 0 indicio para a identidade pueblerina de que fala Maurer? E essas seriam capas de identidades que se constroem na etnogénese esbocada por Wilde? Como se entrelacam? Como sao urdidas e postas em relevo a depender do contexto. Max Ribeiro busca tragos de uma identidade com o “Tape” ainda presente na metade do século XVIII e além® Wilde aponta para uma identidade “missioneira’,fruto de 150 anos e mais de olto geragoes nascidas nas Reducdes. Pueblo, terra ancestral, trinta povos, qual © pertencimento identitério? Serao identidades em constante negociagao ao ‘Hem, 9.64. © E preciso voltar aos trabalhos ja escritos sobre esse perfodo como plataforma de partida para avangar no pés-1767. Ver: MAEDER, Ernesto J. A. Misiones del Paraguay: conflictoy diso- Iucidn de Ia sociedad guarant. Madrid, Ed, MAPFRE, 1992. POENITZ, Edgar. POENITY, Alfredo. ‘Misiones, Provincia Guaranttica: defensay disolucib, Posadas, Editorial Universidad Nacional de Misiones, 1993 TELESCA, Ignacio. Tras ls expulsos. Cambios demogrdficos yerritariales en el Paraguay después dela expulsiin de los esuttas.Asuncién, CEADUC, 2009, 5 FARINATTI, Luis A. RIBEIRO, Max R.P. Guarani nas capelas ca froncetra: migrapbes e pre: ‘senga missioneira no Rio Grande de Sdo Pedro (Alegrete e Santa Marta 1812-1827).ini SANTOS, Julio R.Q dos (Org. Missdes:reflexdes equestionamentos Santa Maria, Editor e Grafica Cax: 2016, pp. 251-274. Hem, p.261. 5 MAURER, Rodrigo & Da alocagdo ds intrigaso caso da antiga Redusdo de San Francisco de Borja eo estigma refratirto, ln COLVERO, Ronaldo B. MAURER, Rodrigo F. Missdes em masaico. a interpretagto a prética: um conjunto de experténcias, Porto Alegre, Fath, 2011, pp-101-108. RIBEIRO, Max R, PA terra natural dessa nagto Guarani. dentidade, memériaereprodusdo soctal indigena no Vate do foc (1750-1601) Tese de Doutorade. Sao Leopoldo, Programa de Pés-Graduagdo em Histria P9GH, Universidade do Vale do Rio dos Sinos UNISINOS, 2017, Erne rr err enennernrrrrrr re rere eee eee |8 DE ROQUE GONZALEZ A CRISANTO NERENDA: UMA NOVA VIRADA HISTORIOGEAFTCA largo de uma hist6ria que comega agora a ser desvelada com miiltiplas cores? E quantos t6picos ainda serao trazidos a baila desbancando os 17 pontos co rotelro basico? Parece que hd félego ainda, Eliane Fleck® brindou a comu- nidade de pesquisadores com um robusto trabalho sobre curas, doencas ¢ priticas médicas dos jesuftas nos séculos XVII e XVII, superando em muito fo que havia sido tangenciado por Palacios e Zofolli nos anos 90°” Esse livro mostra que o campo da ciéncia, das préticas de cura, da farmacopéla ¢ dos conhecimentos tradicionais indigenas esta em expansdo. Como também est tem expansio 0 protagonismo indigena™ c a ruptura com o binémio jesuifta- “guaranis como pedra de toque das interpretacbes sobre as Missbes Jesufticas. Enfim, respondendo a meu amigo Wilde, em que estamos? Estamos no inicio de uma segunda virada historiografica no tema das Misses Jesufticas. Apos 25 anos de convivio com essa literatura me vejo nessa atalaia, olhando peta tras, para os lados e para frente. Vejo uma hist6ria com uma ampla curva, que vai de Roque Gonzalez, essa espécie de “herdi civilizador” que veio flu- minar o Tape e alcanga Crisanto Nerenda, que soube ser protagonista de sua prépria histéria. Vejo um roteiro basico, hermético e quase autoexplicativo que se desfaz diante de uma renovagao de ares. Contudo, ¢ longo o camino entre essa renovacio e seus efeitos sobre a Historia das Missdes Jesuiticas produaida, patrimonializada, vivenciada e encenada para além das paginas fa historiografia académica. Como também é larga a distancia entre nossas especulacdes interpretativas e us cusmologias ¢ apropriagdes dos Guaranis na contemporaneidade, ainda quando, supostamente, estamos olhando para ‘um mesmo passado. Peco ainda, uma vez mais, que se tena em conta que fesse levantamento foi felto apenas no que foi produzido no formato livro ou capitulos de livro, nZo incluindo artigos, teses e dissertacdes, salvo quando pareceu necessario. WPLBCK, Eliane © D. Entre a caridade e a cléncia: a pritica missionaria e clentifica da Companhia de Jesus (América Platina, séculos XVI e XVII}. S80 Leopoldo, Ed. Oikos, Eitora Unisinos, 2034. PALACIOS, Sllvio, ZOFOLL!, Ena, Gloria y tragedia de las misiones guarantes. Hist6rla de tas Relgeciones jesufticas durante los siglos XVII y XVI en el Rio dea Plata. Bilbao, Edicones Mensajero, 1991. &1 SANTOS, Maria Cristina dos. FELIPE, Guilherme G, (orgs) Protagentsmo amerindio de sad=brs, eae | t 69 REFERENCIAS ‘ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. 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