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A RITMICA DE JAQUES - DALCROZE ‘Traducdo da ficha pratica de trabalho elaborada por Musique et Culture , Strasbourg- Franca I Emile Jaques Dalcroze (1865-1950) Emile Jaques nasceu em 06 de julho d em Viena (Austria), numa familia suica. Em 1875, a familia Jacques se instalou em Genebra onde Emile entrou no conservatério e no colégio, e mais tarde na universidade. Logo passou a compor, escrever poemas e brilhar por seus dons de improvisador a0 piano. De 1884 a 1886, Emile Jaques sequiu seus estudos musicals em Paris com Marmontel, Lavignac, Delibes e Fauré. Em seguida, se engajou como regente substituto de orquestra no Teatro de Argel (Argélia) para uma temporada. A partir de entdo sua vocac3o musical pode afirmar-se e ele comecou a tomar consciéncia da importancia do ritmo na misica. Emile Jaques Dalcroze’ residiu ainda em Viena onde estudou piano, harmonia e composic&o com Fuchs e Bruckner. De volta a Paris em 1889, recebeu ensinamentos de Mathis Lussy, “o _brimeiro a se ocupar das leis da expressdo © do ritmo’(*), que exerceu-uma profunda influencia sobre ele. Dalcroze encontrava-se num momento decisivo de sua vida: “ele poderia ter sido compositor somente, poderia ter sido um homem de teatro. Porém, se tornaré um grande pedagogo (...)".? Em 1891, Jaques-Dalcroze se estabeleceu em Genebra onde foi nomeado professor de harmonia e solfejo no conservatério. Ensinou igualmente piano e participou de uma companhia teatral. Durante esses anos frutiferos e apaixonantes, Dalcroze se deu conta de que uma educacéo corporal poderia_aludar na formagéo musical @, pouco a pouco, elaborou seu método. 01 a 1904, deu forma & sua Ritmica e efetuou uma primeira [SAN sge ee ee emer Em 1906, 0 célebre ator Adolph Appia o contatou. Os dois criadores estabeleceram uma colaboracéo musical e cénica que durou até 1923. Dalcroze dirigiu de 1911 a 1914 o primeiro Instituto de Ritmica em Hellerau, perto de Dresde. Em 1915, fundou 0 Instituto Jaques-Dalcroze de Genebra, que adquiriu rapidamente um brilho universal, em particular no * Emile Jacques acrescenta Dalcroze a seu sobrenome, em 1887, por exigéncia de um editor pparisiense que acreditava num risco de confuso com o compositor Jaques, da cidade de Bordeaux. (*) Todas as citagées no identificadas de Dalcroze ao longo desse texto foram extraidas de seu livro Le Rythme, la Musique et Education , Ed.Foetisch, Lausanne e da obra coletiva Emile Jaques-Daleroze. Ed.La baconniere, Neuchatel ® DUTOIT-CARLIER, Claire-Lise. Jaques-Dalcroze ~ criador da Ritmica. In Emile Jaques-Dalcroze. ‘Neuchatel: La baconniere, 1965. mundo do teatro e da danga moderna’. Em 1926, teve lugar em Genebra o Primeiro Congresso do Ritmo, levando a constituicgo da Unigo Internacional dos Professores do Método Dalcroze, que se tornaria a atual Federation Internationale des Enseignants de Rythmique (FIER). A ritmica dalcroze é aplicada desde 1922 na terapia de jovens cegos. Foi adotada sucessivamente na dpera de Paris (de 1919 a 1925), no Conservatério de Stuttgart (1929), no Instituto de Gindstica Sueca de Estocolmo (1934), na Escola de Musica de Berlim (1947), etc. Escolas e associagées autorizadas pelo Instituto Jaques-Dalcroze se abriram no mundo inteiro (Franca, Inglaterra, Japao, Estados Unidos, Alemanha, Suécia, etc). Emile Jaques-Dalcroze morreu em Genebra em 01 de julho de 1950. II - A RITMICA JAQUES-DALCROZE A - OBJETIVOS —— Para Dalcroze, “toda crianca nasce artista, quer dizer, ela ama sonhar, imaginar e criar.” © objetivo dos ensinamentos da Ritmica é que ao final de seus estudos 0s alunos possam dizer ndo somente: “eu sei’, mas também "eu_ experimento, eu_sinto”- e, ainda, que se possa criar neles o desejo de expressao.” (*) . ees Jaques-Dalcroze associa Ritmica um objetivo ainda mais nobre: *(...) canalizar as forcas vivas do ser humano, resgatd-las do inconsciente e orienta- las para um objetivo definitivo que é a vida ordenada, inteligente e independente”.(*) Por isso, a Ritmica se propée a: (> Desenvolver 0 sentimento musical (no sentido grego do termo, mais | forte e mais amplo que o sentido atual) no corpo por inteiro; {> Despertar os instintos motores que dio consciéncie & noclo de ordem e de equilibrio; | > Ampliar 0 desenvolvimento da imaginacéo “por meio de um livre \ intercambio e de uma unigo intima” entre o pensamento e o \_ movimento corporal. * A Ritmica Dalcroze funda seus objetivos sobre um certo numero de principios basicos, que o compositor deduziu de sua experiéncia e de sua reflexdo pedagégica, aliadas a uma intuico penetrante. 2 BARIL, Jacques. La danse moderne. Paris: Ed. Vigot, 1977. “Idem B - PRINCIPIOS —_——_, A Ritmica Dalcroze propde uma unio entre movimento e musica, estabelecendo estreita relacdo “entre dinamismo sonoro e dinamismo corporal, em todas as nuances da duracao”.® f “Todo professor de Ritmica deve ter estudado a fundo a improvisacdo ao piano e todas as relagées entre a harmonia dos sons e a dos movimentos”, declara Emile Jaques-Dalcroze no inicio de sua Ritmica.* Ao longo de uma progressdo pedagégica estruturada, a Ritmica se apoia sobre algumas observac6es e principios fundamentais: * Audico interior: desde seus primeiros anos de ensino no conservatério de Genebra, Dalcroze percebeu que 0 ensino de solfejo e da_técnica_instrumental_deveriam ser_precedidos de uma educacdo sensorial e ativa. Com as criancas, em particular, hé a necessidade de uma comunicacéo direta entre sua_intelig@ncia e seus recursos sensoriais. Pouco a pouco, Dalcroze elaborou séries de exercicios destinados a favorecer a consciéncia de som, primeiramente fisica, ou melhor dito, uma escuta interior. Esses exercicios combinam, desde a iniciag3o basica, movimentos corporais muito elaborados e ritmo musical, e exercitam principalmente a memoria auditiva do aluno, as ‘como sua faculdade de improvisacdo gestual. + Qcorpo: Dalcroze descobriu em seguida a importancia fundamental do corpo, em posicao intermediaria entre o som e o pensamento..O corpo , a0 mesmo tempo, lugar de passagem e ressonador da musica e dos sentimentos que ela suscita. Mais ainda, 0 corpo é a sede de um sexto sentido, que Dalcroze denominou sentido ritmico_muscular; Ernest Ansermet nos lembra que “(...) a experiéncia tinha dessa forma conduzido Jaques-Dalcroze a usar de um sentido até entdo desconhecido, ou pelo menos nao analisado e inexplorado, que ele chamou ‘sentido ritmico muscular’ - virtude que em geral_limitava-se aos sentidos cerebrais - que faz de nosso corpo o instrumento onde se roduz o ritmo, o transformador no qual ndmenos de tempo se transformam_em fenémenos de espaco. Fonte ignorada de nosso ser, riqueza latente da qual os Gregos, sem duvida, tiveram consciéncia e 5 Conferéncia dada no congresso Internacional de EducagSo Musical em Bruxelas,1953 (Music Aprendre - CENAM, Pari, 1984) * Dalcroze: La Rythmique (6° vol.) ~ Ed. Jobin Lausanne, e, Le Rythme, la musique et Education ~ Ed. Foetisch Irméos, Lausanne, que desenvolveram entre eles, dancarinos, regentes de orquestra, ou, 0 que seriam hoje virtuoses”. Em todos os niveis de seu método, Dalcroze propés desenvolver este “sexto sentido” através de séries de exercicios apropriados. Todos os exercicios da Ritmica tendem, igualmente, a desenvolver o sentido ‘muscular. aries Consciéncia ritmica: em terceiro lugar, Dalcroze prega a necessidade da tomada de consciéncia do sentido ritmico pelo intelecto, pois, n’o ha sentido estético, emogdo artistica sem consciéncia: “Comecando a -Sauidar as els ¢-08 efettas _do_ritmo, nosso espirito trabalhou sobre a matéria. Porém, toda a educacdo completa deve se esforcar para elevar a matéria ao plano do espirito, na falta do que sua influencia permanece va. Fabricar_um instrumento nao é suficiente, é preciso colocar esse instrumento a servico do pensamento”. Para Claire Dutoit-Carliere, “a consciéncia do ritmo é a faculdade de compreender as relacées entre os movimentos fisicos e intelectuais e de experimentar as modificagdes que os impulsos da emogdo e do pensamento imprimem a esses movimentos.” ” Essa consciéncia do ritmo é portanto uma representago mental do ritmo a qual deve se refletir em todos os musculos do corpo: “A consciéncia do ritmo exige a participacdo de todos os musculos conscientes ou inconscientes, em conseqiiéncia, € 0 corpo inteiro que a educaggo deve colocar em movimento para criar 0 sentimento ritmico”. Para Ernest Ansermet, ela é “uma gramética do gesto, regulando a correspondéncia entre movimento e ritmo”. Masica: como reafirma Frank Martin ®, a musica é a base da educagao dalcroziana, é nela que se retinem as nocdes que acabamos de evocar e cujas relagdes podem ser visualizadas no esquema que se segue: Sentido ritmico muscular ___, Sentimento estético = Emogao musical Tomada de consciéncia do aes ? DUTOIT-CARLIER, Claire-Lise. Jaques-Dalcroze ~ criador da Ritmica. In Emile Jaques-Dalcroze. Neuchatel: La baconniere, 1965. ® Conferéncia dada no congresso Internacional de Educagso Musical em Bruxelas,1953 (Music ‘Aprende - CENAM, Pari, 1984) + Tensao e Repouso, Relaxamento: a expressio ritmica se fundamenta sobre a constante oposicéo entre “tensdo e repouso, contracdo e descontracéo, que mantém um estado prazeroso de equilibrio e liberagdo.”_ Esta expressdo ritmica comecga com os exercicios de respiracao.” Na mesma ordem de idéias, Jaques-Dalcroze enaltece o relaxamento. Ele encontra no “estado completo de relaxamento” um retorno ao nada, a busca da “leveza interior", uma descontracéo de todos os musculos do corpo, associado a uma descontracdo total do espirito. Entretanto, essa descontracao é bem mais frequentemente parcial e ainda assim benéfica, pois, tem sua acdo prolongada pela abolicao de movimentos indteis, pela economia das forgas em jogo (ver os pontos seguintes); ela permite uma recarga da atividade que Dalcroze pretende ser sempre criadora. Como escreve 0 professor Adolph Ferriére, “o_exercicio cotidiano do relaxamento confere (...) 0 _poder maximo de criagao.” + Educacdo Psicomotora : Dalcroze observa em muitos dos seus alunos um fenémeno de arritmia, resultante da falta de coordenacao entre a concepcao do movimento e sua realizacao; o sistema nervoso nao chega a transmitir (seja imediatamente, seja corretamente) uma ordem vinda do cérebro aos musculos, agentes executores dessa ordem As causas da arritmia provem geralmente, segundo Dalcroze, de uma andlise muito enfatica de fatores intelectuais, ocasionando para o ser a impossibilidade de associar seu pensamento a acgéo muscular, do que resulta a falta de coordenacado que provoca desordem e perda de tempo. Dalcroze propée uma série de exercicios destinados a combater a arritmia, restaurando a ligacdo, a continuidade cérebro-misculos, diminuindo 0 tempo perdido entre a concepgéo dos atos e sua realizacao. Pela automatizacdo dos gestos e criacgdo de numerosos habitos motores e reflexos, esses exercicios permitem fornecer o minimo de esforco para obter 0 maximo de efeito. Desenvolvendo dessa maneira 0 conceito de “Lei da Economia”, Dalcroze criou um verdadeiro método de educacSo psicomotora visando abolir todas as inibigdes que impedem o ser de se expressar: “Possuir seu corpo em todas as suas relacdes com 0 espirito e a sensibilidade, é romper as resisténcias que paralisam o livre desenvolvimento de nossas faculdades de imaginacao e criacdo.” ® JAQUES-DALCROZE, Emile. La Rythmique (6° vol.). Lausanne: Ed. Jobin C - CODIFICAGAO ~ PROGRESSAO PEDAGOGICA Dalcroze articulou seu método em torno de trés nogdes basicas: TEMPO- ESPACO-ENERGIA, que formam “o império do ritmista’; ele 0 codificou em torno de trés pontos essenciais presentes em todos os estagios da Ritmica’?: 1 - Repeticdo: repetindo intmeras vezes os movimentos (aliados & misica) o ritmista cria em si automatismos liberadores. 2 - Encadeamento légico das causas aos efeitos: do ritmo musical nasce a aco, por intermédio da imagem motora do movimento (ou imagem mental do ritmo) e das leis da harmonia musical e corporal. Os gestos dos ritmistas nao sao gratuitos, mas respondem a uma necessidade musical e humana (biolégica, sensivel, mental). 3 - Habito do menor esforgo: Dalcroze & 0 primeiro a estabelecer os “preciosos métodos de economia corporal” (Dr. Weber-Bauler), tendo Por conseqiiéncia a abolicao das inibigdes e dos reflexos de resisténcia. A progressao adotada pela ritmica dalcroziana compreende trés etapas sucessivas, recobrindo uma formag&o musical completa (sem falar dos estudos instrumentais especificos, claro): 1 - “O estudo do Ritmo desperta o sentido ritmico corporal e o sentido auditivo (dos ritmos)” (sem negligenciar a realizaco vocal dos sons): constitui uma iniciago musical aprofundada no nivel sensorial e motor. 2 - "0 estudo do solfejo desperta o senso dos graus e das relagbes de elevacéo dos sons (tonalidades) e a faculdade de reconhecer seus timbres”, desenvolvendo a audico interior, a leitura, a leitura a primeira vista, a improvisagéo e a composic&o musical. O solfejo dalcroziano requer as aquisicdes da iniciaco ritmica: ele reune gesto e musica. 3 ~ O estudo da improvisacao no piano “combina igualmente as nocbes de ritmica e de solfejo tendo em vista sua exteriorizag3o musical através do tocar, desperta o sentido tatil-motor, e ensina os alunos a traduzir no instrumento os pensamentos musicais melddicos, harménicos e ritmicos”. A presenca constante do movimento aliado a musica ao longo desta progresséo conduz naturalmente a Ritmica a uma etapa suplementar, a “Plastica animada", que tem implicagées muito importantes no dominio da danca " SAQUES-DALCROZE, Emile, La Rythmique (6* vol. Lausanne: Ed. Jobin III - DALCROZE, A MUSICA, A PLASTICA E A DANCA + Para Dalcroze, a plastica é uma experiéncia que deve permitir a0 individuo interpretar toda uma gama de sentimentos. Isso necessita um estudo aprofundado, por um lado, das relacdes entre ritmo interior - produzido pela musica - e ritmo corporal; e, por outro, da sintese das qualidades ritmicas e motoras. Essa experiéncia conduziu Jaques-Dalcroze a se interessar de perto pela danga. + Dalcroze define a danca como a arte de expressar as emocies através dos movimentos corporais ritmicos. Sua concepgao sobre a danca & governada por trés principios: 1- A misica dos sons e a miisica dos gestos devem ser animadas pela mesma emocao. 2- Amisica deve espiritualizar o corpo afim de que ele se transmute em sonoridade visivel. 3- A danca se torna um elemento carregado de sentido afetivo, estético e social. Dalcroze quer, portanto, que 0 bailarino dance com a miisica e néo que esta se reduza a um suporte, comodo mas secundério, para uma alta técnica gestual estereotipada (danca classica), ou ainda, que ela governe completamente o gesto, submetendo o dancarino & uma improvisagéo perpétua e nado estruturada (Isadora Duncan). & importante constatar que os discipulos de Dalcroze foram coreégrafos muito avangados, e que o impacto de sua Ritmica nos Estados Unidos a partir dos anos 20, desempenhou um papel fundamental no grande Movimento de renovacao da danca contemporanea (ver especialmente a obra coreografica de Marta Graham).** Iv - CONCLUSAO Emile Jaques-Dalcroze, ao elaborar sua Ritmica, dos principio fundamentais até aos detalhes do curso de formacdo, fez uma obra de pioneiro na Educacao Musical e nas artes do movimento. Mas, antes de tudo, fez a obra de um humanista e de um fildsofo, impulsionando um #1 BARIL, Jacques. La danse moderne. Paris: Ed. Vigot, 1977, movimento educativo e de pensamento humanista que marcou nossa época. ” O que é préprio & musica, escreveu ele, é antes de tudo provocar na alma dos homens uma necessidade de imaginacdo e de realizacéo. Por que renunciar a este poder?” Principais centros de difusdo da Ritmica Jaques-Dalcroze: + Féderation Internationale des Enseignants de Rythmique ~ FIER Terrassiére, 44 - CH 1207 - Genebra (Suissa) http:www.fier.com http: www.dalcroze.ch * Association Frangaise de Rythmique Dalcroze 97, Boulevard St Germain - 75006 - Paris (Franca) + LM.M.A.L. 8, Rue du Platre- 69001 - Lyon (Franca)

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