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HIGIENE, FEMINISMO E MORAL SEXUAL Elisabeth Juliska Rago Resumo: Este trabalho ¢ parte de uma pes quisa mais ampla sobre 3 médica baiana Francisca Praguer Frées (1872-1931). Envolvi- da na discusséo sobre os direitos da mulher ra ordem burguesa, o estudo busca demons trara manera pela qual a médica participa do debate sobre a construgso de um “Brasil Mo- dderno” e como inscreve 0 tema da higiene, da sauide da mulher e da matemidade no quado do projeto de regeneracao social do pais. Os reformadores brasitsiras do periedo interes- sararn-se amplamente pelas questoes de gé nero, corpo feminino, sexualidade entre ou- Palavras-chave: medizina, feminismo; moral sexual Os estudos feministas t8m colaborado para romper o “esquecimento” imposto as mulheres, revelando experiéncias silenciadas, mesmo que nao totalmente, e de- nunciando a misoginia presente na cultura tradicional. As questées de género assu- mem, nesta reflexdo, um interesse particular, pois permitem langar um olhar sobre as prdticas femininas e fazer emergir da documentacao temas que poderiam passar despercebidos quando, na verdade, estao impregnados de signiticados sociais © po- Iticos. Detalhes aparentemente insignificantes da vida quotidiana - como estratégi- as, costumes, trabalho feminino, resisténcias ¢ a sororidade entre mulheres — podem ser percebidos ¢ analisados pelo pesquisador. Segundo a historiadora francesa, Francoise Thébaud, 0 conceito de género “propde uma releitura sexuada dos acon- tecimentos e fenémenos histéricos, que contribui para a explicacdo de problemas lassicos em histéria social, politica ou cultural” (THEBAUD, 2004, p. 73) Neste momento, a proposta visa analisar, mesmo que brevemente, uma di- mensdo especifica do discurso e da prética de Francisca Praguer Frées, ou seja, a higiene, o feminismo e 2 moral sexual, temas que foram privilegiados pela médica e due se circunscreveram 8 saiide fisica e moral da mulher. Formada pela Faculdade de Medicina e Farmécia da Bahia, em 1893, foi a quinta médica formada na Bahia e a inica mulher entre seus colegas homens.’ Niteréi, v. 6, n. 1, p. 105-116, 2. sem. 2005 105 GEERO Do que se depreende da documentacao consultada, Francisca foi educada de forma diferente da tradicional educagao crista destinada 8s mocas da elite — que antepunha a fé crista a ciéncia — formando-as para serem boas esposas ¢ ndo pro fissionais em dreas de prestigio. Flha de um engenheiro de minas —judeu e croata — e mae baiana, em 1889, a joven, contando 16 anos de idade, iniciou o curso de Medicina. Sua mée, Francisca Rosa, foi uma defensora dos direitos femininos. A estudante teve apoio familiar para seguir a carreira médica que tornava as mulheres, muito visadas na sociedade patriarcal baiana, No perlodo da Primeira Republica, 0 ‘meio intelectual dividia-se entre os defensores da tradicao, que temiam as conquis- tas de mulheres educadas e os grupos intelectualizados e liberals, que atuavam em defesa de sua emancipagéo civil, Ao censurar as tentativas de ampliacio de suas, fungées para além da esfera privada do lar, os conservadores afirmavam que as mu- Ineres correriam o risco de perder a feminilidade. Obviamente, esse discurso era valido para as mulheres das camadas mais abastadas da populacio; ele nao visava atingir diretarente as atividades exercidas por aquelas que ocupavam uma posicao inferior na estrutura de classe e cujas exigéncias de sobrevivéncia pessoal e o susten- to de seus familiares as empurravam para todo tipo de trabalho, Diz Hildegardes, Viana que, “quando iam a trabalho, as mulheres tinham no fardamento o salvo conduto para transitar nas ruas da cidade, forma de se distinguirem e de se afirma- rem” (apud ALMEIDA,1986, p. 53) Apesar de muitas restrigdes, algumas mulheres adentraram a drea da satde & procuraram formagao na arte obstétrica, em medicina e odontologia, em Salvador. Dr? Praguer Frées, como era chamada, especializou-se em ginecologia e obstetricia Em seus escritos, registrou que a escolha dessa especialidade médica tinha sido sua opsao desde o inicio do curso, nos “bancos escolares" da faculdade. ‘Alguns estudiosos do tema da mulher na medicina observam que 0 acesso &s instituigdes de ensino e de trabalho era faciitado aquelas que desejassem tratar de mulheres ou de criancas. Rodhen (2001, p. 80) demonstra que ‘2 entrada da mulher no campo médico se fundamentou na nosso de que as mulheres méci- «cas seriam as profissionals adequadas para atencer as ourras mulheres eas criangas © que everiam se restingir a estes pacientes e aos conhecimentos des temas que envalvassem a reproduso ea infinca Do ponto de vista moral, uma médica que tratasse de doencas de homens adultos, muito provavelmente, seria considerada uma parente préxima da “degene- rada nata” teorizada por Cesare Lombroso, Em meados do século XIX a oposicdo 4s mulheres que optavam pela medicina era muito maior do que a resisténcia em relagdo as protissoes de menor prestigio como a de parteira e a carreira do magistério. Neste sentido, Perrot observa que essa porta que o feminismo nao se cansa de tentar abrir completamente, ressaltan- 106 Niterbi, v6, n. 1, p. 105-176, 2. sem. 2005 do a contradigao entre a proclamagao da universalidade dos direitos e a exclusao das mulheres” (PERROT, 1998, p. 72). Diante dos varios aspectos realgados, também, por Francisca Praguer Frées em suas citicas & organizacéo social de género, pode-se perceber as muitas contradigdes com as quais se defrontou na sua vida pessoal e profissional, Contextualizando um pouco essa afirmacao, vejamos: a médica exercia ‘a miltSncia feminista por meio da imprensa baiana e nacional; chamou para si ques- tes difceis como a defesa da satide da mulher, a reivindicacio do divérci, recusa- do de maneira irefutével tanto pela Igreja quanto pelas préprias feministas catdlicas baianas ¢ pelos legisladores. Além disso, a Repiblica representou uma mudanga no regime politico, sem que se tivesse renovado ou demacratizado as formas de subje- tividade e de convivio em sociedade Essas contradigées do liberalismo agiram como mola propulsora do feminismo na luta pela igualdade de direitos cvise politicos, As feministas do period enfrenta- vam o paradoxo de, por um lado, agirem como reformadoras sociais, escrevendo e propondo mudancas nos costumes nas leis mas, por outro lado, estavam excluidas da politica, fazendo parte de um grupo minoritério do angulo do poder, em virtude de seu sexo. Débora Ferreira, seguindo Mary Pratt, escreve que o ideal da Repiblica que “instaura as mulheres como geradoras de cidadaos” ndo Ihes reservava o lugar de cidadas (FERREIRA, 2004, p. 27) No imagindrio do século XIX e do comeco do século XX, 0 sexo feminino esta- va a mercé de seu aparelho reprodutivo, que, segundo se acreditava, tornava seu comportamento emocional errdtico e imprevisivel. Na Bahia, como em outras te- gides, era ampla a misoginia do pensamento médico dominante, além do idesrio Feligioso que reiterava 0 pressuposto da oposicao “natureza x cultura’, enfatizando ‘© argumento biolégico que atribui as mulheres o papel exclusivo de esposa e mae. O determinismo biolégico esteve presente no pensamento hegeménico da época e foi ntrojetado pelas préprias mulheres, a exemplo da educadora Amélia Rodrigues, fi- {ura de destaque na sociedade baiana do periodo. A educadora catélica chegou ase “opor 8 profissionalizagao da mulher em cursos superiores" (ALVES, 1999, p. 110) Francisca, por sua vez, formula uma critica ao saber médico dominante na Bahia ue, inspirado em determinada corrente da medicina européia, concebia a diferenca sexual como 0 fundamento da inferioridade das mulheres. Esta crenga foi comparti- thada por boa parte dos médicos da Faculdade de Medicina da Bahia, influenciados pelos trabalhos de Spencer e Proudhon, autores que reafirmaram os esteredtipos da neapacidade e da domesticidade. No tocante a essa questo, Francisca sustenta que “A inferioridade da mulher nao ¢ fisil6gica, nem psicolégica; ela & social. Sua escra- vidao sexual determina sua dependéncia econémica” (FROES, 1917), Dessa forma, refutando 0 dogmatismo de certas idéias, a médica apreende os mecanismos de domesticac3o do corpo feminino presentes no saber médico hegeménico. Faltava as mulheres, segundo ela, tdo-somente o suporte de uma edu- aco mais qualificada para que pudessem participar, com seu estudo e trabalho, do Niteréi, v. 6, n. 1, p. 105-116, 2. sem. 2005 107 progresso da nacao. Refletinds sobre a raiz da dominagao masculina, de mancira otimista, observa, seguindo o escritor Frederic Stackelberg, que o predominio sexual masculino haveria de “se extinguir um dia e com ele também as diferencas somaticas anieriormente consideradas como peculiares a0 sexo feminino” (FROES, 1917). En- tretanto, & preciso ressaltar que o saber médico comportava varias perspectivas, nem todas miséginas, ndo podendo ser visto como algo homogéneo. Alguns médicos foram sensiveis em relacio as aspiracées femininas. Francisca recebeu apoio do m dico e professor Climério de Oliveira desde os tempos de faculdade.? 15 no periodo final de sua formagéo, em 1892, a estudante foi indicada pelo médico para ser admitida como interna da enfermaria de partos do Hospital Santa Isabel, pertencen- te 8 Santa Casa de Misericérdia, que era procurada por mulheres extremamente pobres, indigentes, em ntimero muito reduzido e servia, também, & prética obstetr a por parte de estudantes de medicina. Neste local, as instalacdes eram rudimenta- res e 0 aparelhamento, incompleto. Francisca ali permaneceu durante um ano, De- pois de formada continuou trabalhando como “parteira-assistente”? na clinica de partos que deu origem & Maternidade da Bahia, pertencente & Faculdade de Medici na da Bahia, Em 1911, esta passou a se chamar Maternidade Climério de Oliveira, em homenagem ao seu fundador. ‘Aclientela era formada por mulheres das camadas desprivilegiadas da popula- <0, engomadeiras, cozinheiras, passadeiras, operdrias, desempregadas vivendo em situagio de precariedade, como é possivel observar nos prontuérios clinicos consul- tados. Dificlmente uma gestante levava roupas para o recém-nascido, tal era o gra de pobreza reinante, Muitas das parturientes recorriam aos servicos médico-hospita- lares como ditimo recurso, por falta de abrigo ou familia. A documentacéo consulta da permite a identificagdo das caracteristicas socioeconémicas das gestantes (vide modelo de ficha em anexo). Maria Joana, baiana, 14 anos de idade, parda, residente em Boa Viagem, solteira e trabalhadora em servicos domésticos, compareceu 20 Servigo Médico em 9 de janeiro de 1912. Chegou acompanhada por D. Amalia Tolantina da Trindade, sua depositéria,* em virtude de pracesso por crime de defloramento. Aqui, & possivel verificar que a Justica foi procurada para reparacéo de uma ofensa (desvirginamento) contra sua honestidade. A parturiente foi admiti- da na data acima, tendo alta em 27 do mesma més, portanto permanecendo sob cuidados médicos durante 16 dias. A “Secdo de Puérperas” registrou que Maria Joana levou para a Maternidade “duas anaguas, um vestido, um corpinho, uma camisa, um par de meias, um lenco, um par de botinas, um broxe (sic), duas pulsei- ras, 1$ reis em niqueis e nenhuma roupa para crianca”. Atendida pela Dr? Praguer Frées, logo apés 0 parto ocorreu a morte dos fetos, dois meninos gémeos, como conseqiiéncia da posicao dos fetos e da insuficiéncia de contragoes uterinas.* Quintiliana Maria da Conceigao, baiana, roceira, 25 anos, solteira, parda, deu & luz uma menina, Permaneceu na Maternidade durante 14 dias. Trouxe consigo um ves- tido, uma andgua, uma camisa, roupa para crianga, um par de sandalias e um de argolas. Foi mandado para o oficial do distrito de Nazareth o registro da filha, de nome Zulmira, em 15 de junho de 1911.6 108 Niterbi, v6, n. 1, p. 105-176, 2. sem. 2005 Note-se que as mulheres de camadas alta e média davam & luz em casa. Se- undo Maria Licia Mott (2002, p. 198), Dar luz fora de casa era uma situacio anormal, considerada apavorante @ procurada ape- ras em casos extremos, sobretudo por pessoas tidas como descassificadas socialmente. Nos «casos de partes complicadas, apenas mulheres mais pobres,indigentes, prstitutas e mies solteirasrecorsiam &s Santas Casas, mantidas por caridade religioss e benemeréncia. Creio que 0 contato com uma realidade que talvez desconhecesse até entio, por sua origem de classe, acentuou os tracos inconformistas de Francisca em relacao 8s injusticas socias e de género, o que ela exprime ao afirmar que todas as mulheres do “victimas provavels das mesmas inusligas sociaes e das mesmas injurias pessoaes” (FROES, 1923, p. 14). Para ndo perder de vista o que hd de inovador no discurso da médica baiana & preciso ancoré-lo no seu devido tempo e espace histéricos. Na virada do século XIX para 0 século XX, no Brasil, 0 espaco puiblico sofreu modificacbes pela crescente urbanizagao das cidades o que propiciou uma abertura, apesar de limitada, & entra da de mulheres em profissdes antes exclusiva ou predominantemente masculinas. Contudo, isto no significou o fim das represdlias Aquelas que conseguiram ingres- sar nas profissGes de prestigio, embora alguns defendessem a forac3o de mulheres, médicas. Por outro lado, desde o final do século XIX, a questéo da igualdade de direitos ja se fazia presente na Bahia. Francisca manifesta-se publicamente contra a dominacao masculina, embora a sua aspiracéo & liberdade nao tenha sido um senti- mento exclusivo, pois estava presente na voz de vérias feministas brasileiras do pe- riodo. Muitas dentincias em relacdo as injusticas ¢ desigualdades entre os sexos fo- ram feitas por professoras, escritoras, jomalstas brasieiras, as vezes de maneira provocativa, outras mais cautelosas, desde o final do século XIX, como Josefina Alva- res de Azevedo, Presciliana Duarte de Almeida entre muitas outras. Maria Lacerda de Moura, escritora libertiria, nascida em 1887, na entio provincia de Minas Gerais, tornou-se conhecida pelos ensaios em que analisa e discute a condigdo feminina; ela caminhou na contra-corrente de idéias que enfatizavam @ posigéo subserviente da mulher, colocando-se ostensiva e corajosamente contra a “tirana clerical e fascista” (LEITE, 1984, p. wi). A escritora buscou redefinir o papel da matemnidade na vida das mulheres contra os preceitos da Igreja catélica, uma vez que defendia o amor plural € 0 dircito de ter e de criarfihos fora do casamento (HAHNER, 2003, p. 321). Francisca Frées enfrentou, nao sem dificuldades, as elagSes de poder no cam- po da medicina. Criticou 0 meio social e politico baiano, o sexismo arraigado e ace! tou 0 mito do “excesso sexual” dos brasileiros, causador, segundo ola, da desmora- lizag3o da familia. Tocou num tema tabu — até mesmo para a Federacao Brasileira pelo Progresso Feminino (1922) —, dirigido por Bertha Lutz e Carmem Portinho, no Rio de Janeiro, ou seja, 0 divércio. Niteréi, v. 6, n. 1, p. 105-116, 2. sem. 2005 109 Uma das alternativas vislumbrada para transformar a posigdo de mulheres educadas, segundo a médica baiana, e muitas outras, seria a unio de forgas para a conquista dos direitos cvis ¢ politicos, usurpados pelo poder masculino ¢ a urgente reforma do Cédigo Civil brasileiro (1916), 0 que confirma a importancia atribufda por ela & conquista da cidadania politica. No ambiente extremamente conservador da sociedade baiana, Francisca teve um papel ativo em relagio a luta pelo voto, pelos direitos da mulher. Foi uma das fundadoras da Federacao Sahiana pelo Pro- {gresso Feminino (FBPF) e da Unigo Universitaria Feminina, da qual se tornou presi- dente, em 1931. Trabalhou ao lado de Edith Mendes da Gama e Abreu, escritora, formada em Pedagogia, Maria Luiza Doréa Bittencourt, baiana, formada em Direito, no Rio de Janeiro, entre outras, As mulheres que participaram da fundacao da FBPF eram altamente escolarizadas e pertenciam 4s camadas média e alta da populagao. 0 projeto polit 0 regenerativo Desde meados do século XIX, 0 poder médico estabelecia uma alianga com 0 Estado € tornava como seu objeto e encargo os cuidados com a populacio. Nos anos que se seguiram 8 Primeira Guerra Mundial, as correntes alinhadas 8 moder ago do pats dirigiram seus esforcos para solucionar os problemas ligados & preven- 80 de doencas fisicas e morais. Além disso, @ medicina conquistava relevante poder sobre as esferas do piblico e do privado no pais. Os reformadores brasileiros, entre (5 quais nos deparamos com Francisca Praguer Frées, visavam 8 construgao de uma sociedade normatizada e sadia. Esta “intelligensia” revelou um grande interesse pe- los temas da mulher, da sexualidade e da reproducdo. A tematica fazia parte das discusses da medicina nos anos 1920 e 1930, de modo especifico, entre os espe- cialistas em ginecologia e obstetricia A posisdo assumida por Francisca Frées esté intimamente vinculada a sua for magéo intelectual, a0 ferinismo — ao qual aderiu desde muito jovern —, e ao lugar que ocupava como uma mulher advinda de uma classe social favorecida, casada com Joao Américo Garcez Frées, médico e professor catedratico da Faculdade de Medicina da Bahia. Ela filiou-se ao higienismo, o qual representava, segundo a cren- «a da época, 2 possibilidade de “redencSo” do povo brasileiro pelo saneamento. ‘A Faculdade de Medicina foi uma porta de entrada e de propagagio de novas idéias, em particular, das que diziam respeito & higienizacio das cidades, dos hospi- tais, das residéncias, enfim as medidas profiléticas para controlar os corpos e preve- nir as doencas, Na virada do século XIX para o XX, as instituigées formadoras de consciéncias cientificas, no Brasil, foram as Faculdades de Medicina do Rio de Janeiro a Faculdade de Medicina da Bahia, Até 1891, esta dllima era a Unica instituigo de ensino superior na Bahia, sendo considerada “um centro gerador e difusor de c ra.e de poder” (BITTENCOURT, 1992, p. 283). Em outras palavras, foi um nicho institucional de formagéo intelectual das elites que, apesar de no serem portadoras, 110 Witerbi, v6, n. 1, p. 105-176, 2, sem. 2005 de um pensamento nico, @ que se pode observar pelas miitiplas divergéncias e tensoes presentes no discurso médico da época, estavam de acordo, no entanto, quanto 8 convicgio de que seria capazes de intervir no processo de modernizacso, ede higienizacao do pais. Um dos pressupostos determinantes do atraso brasileiro, segundo a visdo de ‘médicos, tais como Raimundo Nina Rodrigues e Afranio Peixoto, era a miscigenacao. ‘As teses de Nina Rodrigues sao marcadas pelo determinismo étnico de fundo racista, posto que classificava as “tacas hurnanas” em superiores e inferiores, extraindo des- sa hierarquizacao miltiplos efeitos de saber e poder, notadamente no campo juridi- co, Embora ndo desconhecesse essas teorias, a questao racial ndo aparece nos textos, de Francisca consultados até o presente. Ela observa, a0 contrério, que o problema da educacao e da satide, as doencas venéreas, principalmente a sfilis, teriam sido causadoras da degeneracso, além do alcoolisma e de um meio social extremamente “permissive” (© “excesso sexual” masculino seria um dos principais responsaveis pela propa-

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