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| TEXTOS UNIVERSITARIOS DE C!FNCIAS SOCIAIS E HUMANAS EVORA NA IDADE MEDIA Maria Angela Rocha Beirante de reside na auséncia de fontes que fornecam indices numéricos de ‘ou susceptiveis de generalizacao segura. Por isso, todas as tentativas de demogrifica aplicadas 4 Idade Média nos conduzem normalmente ao ais ou menos: ("). ldades atenuam-se 4 medida que nos encaminhamos para os séculos jodo medievo quando, por razdes de ordem militar ou fiscal, os reis ou des ordenam a contagem dos combatentes ou dos contribuintes. As resultantes so sempre de caracter parcial, ndo tanto pelo facto de abran- 6 parte do pais, como principalmente por se fixarem em determinados cuja relacdo numérica com © conjunto da populacao é dificil de preci- ides também sao varidveis no espaco e atenuam-se particularmente no na Italia e na Catalunha onde, na auséncia de verdadeiros recensea- conservaram numerosos documentos fiscais que tém proporcionado tier € J. Glenisson, -La Démographie Frangaise au xiv" Sidcles, Armales, BS.C, 17% année pp. 109-129. Cf. ainda, por exemplo J. Hers, -Les Limites des Méthodes Statistiques pour les ‘Démographie Médiévale-, A.D.H., 1968, pp. 43-72; P. Guillaume ¢ J. Pierre Poussou, ue, Patis, A. Colin, 1970; A. Higounet-Nadal, Périgueux aux xi" et x¥° Siécles, Bordéus, rique du Sud-Quest, 1979. 141 importantes estudos de demografia urbana medieval @). Também em I conservou uma documentagdo particularmente rica em informes demografi inquisitiones post mortem — que permitiu a J. C. Russell a realizacdo de um minucioso da populacao medieval britanica @). Em Portugal, as primeiras tentativas para quantificar a populagao medieva guesa remontam aos finais do século xvi e afirmam-se particularmente no passado. Partindo dos réis de besteiros dos séculos xm e xv e utilizando ciente ja adoptado por Soares de Barros, Rebelo da Silva fez 0 calculo da pop portuguesa medieva, mas as suas conclusdes foram severamente criticadas po Barros, que negou a legitimidade dos valores apresentados ("). Todavia, j admitira a hipotese de avaliar a grandeza e prosperidade comparativas- das des mais importantes de Portugal a partir do rol de besteiros dos fins d e, neste caminho, o Prof. Oliveira Marques péde de facto provar a importine tiva das varias cidades e vilas portuguesas, conjugando os dados fornecidos de besteiros com os informes decorrentes da taxa imposta por D. Dinis aos tal do reino entre 1287 € 12900). E altura de nos interrogarmos sobre a posigo que ocupava Evora no cor das cidades portuguesas nos finais do século xi. Segundo as conclusées do trabalho, a cidade ocuparia um quinto lugar no conjunto das cidades do Pais, de Lisboa, Santarém, Braganca e Guimaries. Note-se que, para 0 caso de Alentejo, a Gnica fonte utilizada s6 péde ser a relacdo da pensdo dos tab comarca de Odiana, pois 0 rol de besteiros abrange somente a zona centro do © Cite-se, entre outros, Ph, Wolff, Les «Estimes- Toulousaines des xiv" et xv’ Siécles, Toulo E. Baratier, La Démographie Provencale du xn au xvf Siécle, Paris, S.EN.P.EN., 1961; A. Higo Les Comptes de la Taille et les Sources de Histoire Démographique de Périgueux au xi Sic SEN.PEN., 1965; C. Klapisch, -Fiscalité et Démographie en Toscane (1427-1430), Annales 24° année (1969), n° 6, pp. 1313-1337; J. Carrasco Perez, La Poblacion de Navarra en ef Pamplona, 1973 € A. Landry, Traité de Démograpbie, Paris, Payot, 1945. ©) British Medieval Population, Albuquerque, 1948, referido por Ph. Wolff em Economies et des Sociétés avant I'Ere Statistique, L'Histoire et Ses Méthodes, Paris, Encyclopédi Pléiade, 1961, pp. 847-892 (© Memsria sobre a Populagdo e a Agricultura de Portugal desde a Fundacdo da Monarchia Parte I, Lisboa, 1868. H, da Gama Barros, Hist6ria da Administragdo Piiblica em Portugal nos Sé xv, 2. ed., dir, Torquato de Sousa Soares, Lisboa, Sa da Costa, 1945-1954, tomo IV, pp. 209-215, ©) -A Populagao Portuguesa nos Fins do Século x1, Ensaios de Historia Medieval Portuguesa, sao, Lisboa, Vega, 1980, pp. 51-92. 142 pensio global paga anualmente pelos tabelides da comarca (1416 s parcelares solvidos pelos tabelides das diversas localidades que quizar as principais povoacdes alentejanas (Evora com 480 libras; 200; Elvas com 150, etc.) € confronté-las depois com as das restantes que € também a partir destes quantitativos ¢ tendo em conta, sem paga por cada tabelido noutras localidades, que o Prof. Oliveira para todo o Alentejo um ntimero de 25 tabeliaes, atribuindo cinco a Devemos contudo observar que, tanto quanto os documentos nos cluir, © ntmero de tabeliaes da comarca seria superior ao proposto e Evora, ele seria seguramente superior. De facto, um documento de mporaneo do arrolamento dos tabelides, regista a presenca de , 08 estudos demograficos realizados entre nés € aplicados a Idade tido como base documental as inquirigdes(), mas a conservacdo de tos de natureza fiscal proporcionou também a realizacao de estudos m ica circunscritos a algumas localidades portuguesas (*) so de Evora, conservou-se uma extensa lista de contribuintes do seu em 1475-1476, concederam a D. Afonso V empréstimos destinados guerra com Castela °). em questao foi cuidadosamente estudado por Iria Gongalves, nos fiscal, s6cio-econémico e antroponimico ("). M. 7, doc. 6, transcrito por Gabriel Pereira, 1, pp. 32-44, Chane. D. Jodo I, |, fl. 13v. Il, doc. 1 da Costa, O Bispo D. Pedro e a Organizacdo da Diocese de Braga, vol. 1, Coimbra, “Para a Histria da Populacao Portuguesa dos Séculos xv € xvI (Resultados ¢ Problemas Tempo e da Histéria, vol. | (1965), pp. 7-46. J. J. Alves Dias, A Beira Interior em 1496, do e Demografia, sep. de Arquipélago, Ponta Delgada, 1982. Oliveira Marques, Estratificagao Economico-Social de Uma Vila Portuguesa da Idade de Hist6ria Medieval, pp. 121-133 Mil, M. Il, doc, 1. Fundo Antigo, pasta 186, n.° 3. imo Concedido a D. Afonso V nos Anos de 1475 e 1476 pelo Almoxarifado de Evora, e Técnica Fiscal, Lisboa, 1964. Amostra de Antroponimia Alentejana do Século xv, sep. de ‘Historia, Lisboa, 1971. 143 Antes, porém, de tentarmos esgotar todas as possibilidades de apt demogrifico do referido documento, detenhamo-nos um pouco na relat ntimeros de tabeliaes e de besteiros e a populacao eborense dos fins Média. 1.1, Relagdo entre o niimero de tabeliaies ¢ a populacao de culos x1v-xv O ntmero de tabelides em Evora nao parou de crescer durante o sécul isso os procuradores da cidade pediram ao rei, nas cortes de 1398, que os ao ntimero antigo ("), Este ntimero parece ser igual a 12, a fazer f numa datada registada por Cunha Rivara ("*) e corresponderia somente aos tabelii A comuna dos judeus, por seu tuo, tinha direito a trés tabelides do nt tualmente, como acontecia com os cristéos, podia ultrapassar essa cifra(¥). Entre os referidos tabelides, destacam-se dois nticleos: os «das n paco», que lavravam as escrituras sem intervencdo do juiz e que deviam: paco dos tabeliaes aguardando os clientes; ¢ os «das audiéncias- ou «do auto que registavam as escrituras por ordem dos juizes do civel ou do crime, audiéncias estavam presentes (") Sabemos que o niimero dos tabeliaes das notas em Evora era de quatro, D. Afonso V, a pedido de alguns fidalgos, criou mais dois isentos, 0 que de protestos por parte dos tabelides sujeitos 4 pensio("*). Nas cortes de 1477, curadores da cidade constatam, com certo alivio, que o ntimero dos tal decrescido, mas manifestam certo receio de que volte a subir para povo-("), De facto, verificamos que os tabelides de Evora abrangidos pelo timo de 1475-1476, incluindo os da comuna judaica, atingiam somente a di A subida do ntimero dos tabelides, ao longo dos séculos xtv-xv, com a’ das Gltimas décadas, nao parece traduzir rigorosamente a evolugio dem cidade, pois sabemos que as suas nomeag6es nio obedeciam propriamei ©) Livro 1° de Pergaminbo, 11. 12v (*) Copias e Leituras, fl. 50v. 3) Chanc. D. Afonso V, XIX, fl. 22. () H. da Gama Barros, obra cit,, tomo VIII, pp. 427-437. ©) Odiana, I, £1. 198. C9) Adem, WV, 117v. 144 das populacg6es, antes constituiam um meio de que o rei dispunha privilégios. As constantes reclamagdes dos concelhos em cortes, los XIV € XV, contra 0 excessivo nimero de tabelides parecem ser que a sua criagdo nao correspondia as necessidades locais("”). Em © maior ou menor nimero de tabelides duma cidade nao deixa de indice do seu peso demogrifico e econémico. co entre o nimero de besteiros do conto ¢ a populacio ebo- nos séculos x1v-xv segundo indice numérico adoptado pelo Prof. Oliveira Marques para | importancia relativa das varias cidades portuguesas nos fins do século neto de besteiros do conto —, constatamos que, em Evora, 0 seu valor é ente decrescente ao longo dos séculos xiv-xv, 0 que, a primeira vista, -concluir que a populagio diminuiu neste periodo, hipétese que ia ‘pds de lado ao criticar Rebelo da Silva"). , 9 primeiro rol conhecido dos besteiros do conto da comarca de Entre- , das tltimas décadas do século xiv, da-nos 0 ntimero de 150 para into o segundo rol, do primeiro quartel do século seguinte, que esta des Afonsinas, atribui a cidade o nimero de 100 besteiros (”). o de besteiros, Evora € entdo largamente suplantada por Lisboa, com 3, Mas esta ao mesmo nivel de Santarém, Coimbra e Guimaraes, que Imente com 100 combatentes de besta, o dobro dos de Braga e Guarda. de Evora neste rol estao Beja ¢ Elvas, com 80, e que contam por sinal dos do Porto e Leiria. mente, a pedido dos vizinhos, o nimero de besteiros eborenses é Fe, em 1468, dizem os procuradores da cidade as cortes de Santarém mais de 40 besteiros(*). Alegam entéo que este decréscimo se deve Barros. obra cit., pp. 437 € segs. Os protestos contra 0 excessivo ntimero de tabe- 05 Nas cortes cle 1481 (Livro 2° de Originais, fls, 37v-38v). 1, p. 214. Jodo I, 1, fis. 112v-113. Ordenagodes Afonsinas, Livro 1, tit. 69. Observe-se que estes niime- © termo da cidade, mas o recrutamento seria predominantemente urbano, atendendo a que € bem visivel no primeiro numeramento da populacao (cf. nota 41). MH, fl. 7, transcrito por Gabriel Pereira, Il, 104-106, J. H. da Cunha Rivara, Copias 145 ao grande numero de escusados por influéncia de fidalgos. Mas, nas cortes de 1479, apontam como causa desta restrigio as medidas proibitivas tomad os cacadores de besta (*). j Confrontando os valores que nos sao fornecidos pelos dois réis de citados para as mesmas povoagoes da comarca de Entre-Tejo-e-Guadiana, que nas 41 localidades coincidentes houve aumento em 22 casos; mante nario em seis e registou-se decréscimo em 13 casos, incluindo-se, neste tltim Evora (com uma perda de 33,3%) € outras vilas importantes como Alcdcer Montemor-o-Novo. (Quadro I — Niimero de besteitos do conto da comarca) Os totais obtidos sao, no primeiro caso, de 954 besteiros e, no 1008, © que acusa 0 ligeiro aumento de 5,6%. De qualquer modo, co geral, uma relativa estagnacao no recrutamento dos efectivos da besta na Entre-Tejo-e-Odiana, Algumas causas deste estacionamento vamos encontré-las nas proprias O Afonsinas. Os apuradores dos besteiros informam o rei de que nesta co: também no Algarve, € por vezes dificil encontrar mesteirais que possam ser af como besteiros do conto, pela simples razio de que também se dedicam parti 3 lavoura com uma junta de bois, facto que os dispensa legalmente desse verdadeiros lavradores, esses, lavram aqui continuadamente com duas, ués € juntas de bois e, pela natureza das suas funcdes, estao igualmente isentos@). Segundo o titulo 71, do regimento dos coudéis, sabemos que, no Algarve, e ainda na Beira, a contia exigida para o acontiado em cavalo | 20 marcos de prata, metade da estabelecida para as outras comarcas

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