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Coordenadores de segurança e saúde na construção

Article · January 2007

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2 authors:

Camilo Valverde Marianne Lacomblez


Universidade Católica Portuguesa - Porto - SCHOOL OF ECONOMICS AND MANAGE… University of Porto
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COORDENADORES DE SEGURANÇA E SAÚDE NA CONSTRUÇÃO
- FORMAR PARA TRANSFORMAR
Safety and Health Coordination in Construction – Training for Change

Camilo Valverde Marianne Lacomblez


Faculdade de Economia e Gestão Centro de Psicologia da Universidade do Porto
da Universidade Católica Portuguesa lacomb@fpce.up.pt
e Centro de Psicologia da Universidade do Porto
cvalverde@porto.ucp.pt

Resumo and health coordination figure in the building


industry. This figure is seen as actors´ diversity
O objecto desta comunicação é a formação em interface management of all those involved, from
coordenação de segurança e saúde no sector da upstream to downstream, in the building yards.
construção. Within a scientific-methodological approach
Reflecte-se sobre a filosofia que presidiu à criação similar to a case study, it is characterized a training
no sector da construção desta figura da programme developed in this domain. A set of
coordenação de segurança e saúde, perspectivando- suggestions is presented in order to transform the
a como gestora de interfaces entre a pluralidade de representations and the practices of occupational
actores envolvidos nos estaleiros e na sua safety and health in the building industry. The aim
envolvente, a montante e a jusante. of this change is to structure both, representations
Caracteriza-se, numa abordagem científico- and practices, around the building yards
metodológica de tipo estudo de caso, um programa specificities and the concrete work conditions of
formativo realizado neste domínio e apresentam-se the working processes.
um conjunto de sugestões que possam contribuir
para que as concepções e as práticas da prevenção Keywords: Prevention professionals training,
em segurança e saúde ocupacionais (SSO) na safety and health coordination, building and
construção se perspectivem e estruturem ancoradas construction sector, prevention management.
nas especificidades dos estaleiros em que decorrem
as obras e nas condições concretas em que se
realizam os processos de trabalho. 1 Introdução
O sector da construção é particularmente
Palavras-chave: formação em prevenção, problemático no plano da SSO [2, 3, 4]. Para fazer
coordenação de segurança e saúde, Directiva face a esta especificidade a União Europeia (UE)
Estaleiros 92/57/CEE, sector da construção, gestão publicou em 1992 a Directiva Estaleiros
da prevenção. (92/57/CEE) que introduz o conceito de
coordenação de segurança e saúde destinado a
Abstract promover a redução do número de acidentes e
doenças profissionais nesta indústria.
The subject of this paper is the safety and health Neste enquadramento, assumimos o pressuposto
coordination training in the building sector. que os coordenadores de segurança e saúde podem
The authors develop their reflection around the desempenhar um importante papel enquanto
underlying philosophy to the origin of the safety instrumentos promotores de novas formas de
conceber e regular intervenções preventivas que Um decisor (dono de obra) acima do
promovam uma melhor organização do sector da empregador (empreiteiro ou subempreiteiro);
construção, da segurança e do bem-estar dos A relevância das opções do projecto na
trabalhadores. determinação dos processos de trabalho;
A formação destes técnicos de prevenção pode O processo produtivo organizado em etapas
constituir uma importante ferramenta para sequenciais distintas: concepção, organização,
compreender e transformar representações que execução.
estão na base das concepções e das práticas da Existe no sector grande pressão para a
prevenção neste importante sector da nossa competitividade empresarial e tendências
economia. organizativas que se caracterizam por fenómenos
Assim, optamos por eleger como objecto de análise de downsing e outsourcing, externalização das
a estrutura e o desenvolvimento duma intervenção áreas produtivas, redução de efectivos e crescente
formativa neste domínio, cujo conteúdo recurso pela subcontratação das várias fases de
programático e desenvolvimento descrevemos no execução [3].
ponto 3. Para uma melhor contextualização do Nesta tendência os donos de obra e os empreiteiros
programa estudado, analisa-se no ponto 2 a gerais reservam para si a coordenação geral e o
filosofia que presidiu à criação no sector da consequente aumento das pequenas empresas em
construção da função de coordenadores de regime de subempreitada, muitas delas com
segurança e saúde. pessoal intensivo, habitualmente pouco qualificado
Conclui-se com a apresentação no ponto 4 de um em termos escolares e profissionais e muitas vezes
conjunto de sugestões de melhoria, das quais se em situação de precariedade de emprego.
destacam: a) maior multidisciplinaridade, b) Estas características ajudam a compreender o
melhor articulação com as condições concretas das surgimento da Directiva Estaleiros (92/57/CEE),
actividades da prevenção praticadas no terreno; c) transposta para o nosso país através do Decreto-Lei
incrementação do protagonismo e da atitude 273/2003 de 29 de Outubro, que foi a primeira
reflexiva dos formandos na execução e regulação directiva sectorial sobre higiene, segurança e saúde
do programa formativo; d) promoção/inserção em ocupacionais.
redes profissionais que partilhem experiências e De acordo com Alves Dias [1, 2] esta directiva
pugnem pelo empowerment dos profissionais e das introduz na construção uma nova forma de
actividades da prevenção no sector. perspectivar a coordenação da segurança e saúde.
Altera-se a cadeia de responsabilização (passam a
2 A coordenação de segurança e estar incluídos o dono de obra e o projectista)
saúde na construção criam-se novos documentos para a prevenção de
riscos profissionais (comunicação prévia, plano de
Neste ponto referem-se algumas especificidades do segurança e saúde e plano de intervenções
sector da construção e analisam-se as lógicas que posteriores) e novos protagonistas para a
deram origem a novas abordagens preventivas em prevenção (coordenadores de segurança e saúde
torno dos coordenadores de segurança e saúde. para a fase de projecto e para a fase de execução)
A sinistralidade no sector da construção tem maior procurando abranger-se todas as etapas do
amplitude, e maiores consequências do que nos processo construtivo (concepção, execução e
outros sectores industriais [4]. Na UE, em 2003, exploração/manutenção).
este sector representa aproximadamente 8% do A missão principal dos coordenadores de
emprego, cerca de 18% dos acidentes (mais de 3 segurança em projecto consiste em assegurar que
dias de trabalho perdidos por ano) e 24% dos os projectistas integrem os princípios gerais da
acidentes mortais [2]. prevenção (de acordo com a Directiva Quadro
Tendo em vista a contextualização da emergência 89/391/CEE e a sua transposição nacional através
da figura do coordenador de segurança e saúde do Decreto-Lei 441/91) de modo a proteger a
salientamos algumas características do sector: segurança e saúde de todos os intervenientes no
Sector muito pulverizado, com grande estaleiro.
predomínio de pequenas empresas; A missão principal dos coordenadores de
Uma grande diversidade de actores envolvidos; segurança em obra consiste em promover e
coordenar a aplicação dos princípios gerais da
prevenção de riscos profissionais durante a Em Portugal tem vindo a realizar-se formação
realização da obra, tendo em conta as opções específica neste domínio da coordenação de
técnicas e organizativas relacionadas com a segurança e saúde, embora estas acções não sejam
planificação das etapas e processos de trabalho; reconhecidas oficialmente por ausência de
verificar o cumprimento das obrigações por parte legislação sobre este assunto, estando em
dos empregadores e trabalhadores independentes; e apreciação pública há vários anos o respectivo
coordenar a efectiva implementação e adaptação projecto de diploma [1, 5].
do Plano de Segurança e Saúde que a entidade O programa adoptado está conforme com este
executante deve elaborar a partir de projecto de diploma [5] e existe a expectativa de
desenvolvimentos e especificações do plano de que as formações entretanto ocorridas venham a
segurança e saúde em projecto. ser alvo de processos de equivalência.
Perspectivamos sobretudo o papel do coordenador
como um gestor de interfaces que garante a 3.1. Estrutura e desenvolvimento do
coordenação dos diferentes intervenientes, que programa
muitas vezes se conhecem mal, que não têm
relações contratuais e têm de interagir com grande Empreendida numa perspectiva de estudo de caso,
interdependência em projectos que por vezes a análise do programa combinou no plano
apenas são definidos pouco tempo antes do início metodológico a participação como observador da
dos trabalhos [8]. maioria dos módulos do programa; a análise da
documentação distribuída; a observação do
desempenho no terreno de coordenadores em
3 A formação em coordenação de
contextos de projecto e de obra, o recurso a
segurança e saúde na construção entrevistas e à análise das verbalizações de
Neste ponto caracteriza-se a intervenção formativa formadores e formandos.
estudada, que consistiu num curso de formação de A estrutura do programa está sintetizada no quadro
coordenação de segurança na construção 1.
promovido pela Ordem dos Engenheiros da Região
Norte, cujo programa caracterizamos no ponto 3.2.

Quadro 1 – Estrutura do programa


Duração Data de Horário Avaliação Módulos da Formação em contexto de
realização formação em sala trabalho
200 16/09/2005 Formação Formação em sala: 1. Legislação e Estrutura proposta para
horas a em sala: avaliada através regulamentaçã elaboração do relatório do
120 05/12/2005 sexta-feira de 4 testes escritos o relativa à projecto individual:
horas de das 18h30’ sem consulta construção civil 1. Caracterização da obra.
formação às 22h30’ realizados ao e obras 2. Coordenação da
em sala e sábado longo do percurso públicas. segurança na fase de
e 80 das 9h às formativo (cada 2. A acção do projecto:
horas de 13h e das teste com a coordenador Princípios gerais da
formação 14h às duração de 2 de segurança prevenção.
em 18h. horas). em projecto e Plano de segurança e
contexto Horário Formação em do saúde.
de formação contexto de coordenador Compilação técnica.
trabalho em trabalho: avaliada de segurança 3. Coordenação de
contexto através da em obra. segurança em fase de
de elaboração e 3. Prevenção de obra:
trabalho: discussão (com um riscos Princípios gerais da
de júri de 3 pessoas) profissionais. prevenção.
segunda- de um projecto 4. A coordenação Adaptação/complemento
feira a individual sobre a de segurança do plano de segurança e
sexta- elaboração de um em projecto ou saúde.
feira. relatório com as em obra. Adaptação/complemento
actividades da compilação técnica.
desenvolvidas no 4. Conclusões.
terreno.
lógicas normativas, de controlo, de conformidade,
de verificação e de prescrição. Aparentemente,
Esta acção de formação foi financiada por fundos eram menos valorizadas lógicas preventivas que
comunitários e pelo Estado português e a sua equacionem a gestão da variabilidade, do aleatório,
execução foi apoiada nos planos técnicos, do imprevisível e do incerto, tantas vezes presentes
logísticos e administrativo por uma empresa de no quotidiano dos estaleiros.
formação acreditada. A síntese de Damien Cru [6] sobre as concepções
Foi frequentada por 17 formandos, todos dominantes da prevenção mostra-se adequada para
engenheiros: 6 eram do sexo feminino. Na sua caracterizar as lógicas que parecem estar
maioria possuíam experiências ligadas ao sector da subjacentes ao discurso de muitos destes técnicos
construção e alguns possuíam experiência e/ou de prevenção. Nomeadamente, que a prevenção:
formação no domínio da segurança e saúde Está demasiado focalizada no acidente. Não tem
ocupacionais, como técnicos de segurança, ou já em conta as micro-regulações que caracterizam
como coordenadores de segurança. o trabalho normal;
Os formadores eram também maioritariamente Efectua uma marcada clivagem entre factor
engenheiros com conhecimento e experiência na humano e factores técnicos ou materiais na
actividade de coordenação de segurança e saúde análise dos riscos;
e/ou com especialização em determinados Considera os humanos de forma abstracta: como
domínios ligados à construção. fonte de erros e de acidentes, como seres vistos
Os modos de trabalho pedagógico eram de forma isolada. As resistências à segurança
eminentemente expositivos, com recurso frequente são naturalizadas e os trabalhadores são
a apresentações em PowerPoint, à projecção de frequentemente “menorizados” e devem ser
fotografias e, por vezes, à exibição de filmes. orientados e instruídos pelos especialistas e
Na realização da formação em contexto de trabalho pelos técnicos da prevenção.
os formandos foram distribuídos em três grupos Concebe a análise dos riscos sobretudo a partir
que eram apoiados por um orientador. Cada um do interior da organização/estaleiro sem implicar
destes três orientadores, que era formador na parte os actores que estão a montante e sem valorizar
de sala do programa, tinha de apoiar 5 ou 6 os problemas a jusante.
formandos. Para além das três reuniões
predefinidas, os formandos podiam contactar os
respectivos orientadores por via telefónica ou 4.1 Alterações ao programa
electrónica.
Para promover que os coordenadores de segurança
possam configurar-se como instrumentos de uma
4 Análise do programa e sugestões prevenção mais contextualizada, de acordo com as
de melhoria sugestões desenvolvidas anteriormente, sugerimos:
Que o programa formativo adopte uma
Neste ponto salientamos algumas características
abordagem mais multidisciplinar através da
desta intervenção formativa e propomos algumas
incorporação de outras valências como, por
sugestões de eventual melhoria.
exemplo a psicologia do trabalho (análise do
De acordo com os nossos objectivos de relacionar
trabalho e das suas condições de realização,
a formação destes técnicos de prevenção com uma
condução de reuniões…), gestão (gestão de
mais efectiva gestão da prevenção no sector,
projectos…), medicina do trabalho (prevenção
pareceu-mos que os conteúdos privilegiados nesta
de doenças profissionais…), etc.…
intervenção se focalizavam eminentemente em
Maior articulação com a actividade de trabalho
torno de questões de natureza legal e de natureza
real dos coordenadores no terreno, que poderia
técnica. Evidenciava-se particularmente a
ser concretizada por um modelo de verdadeira
regulamentação e os procedimentos de cariz
alternância entre a formação em sala e a
técnico e administrativo operacionalizados em
formação em contexto de trabalho. A parte [3] Baganha, M., Marques, J e Góis, P. O Sector da
prática no terreno poderia iniciar-se desde o Construção Civil e Obras Publicas em Portugal.
princípio do programa articulando-se de forma 2001. http://www.ces.fe.uc.pt/publicacoes/oficina/
permanente com a formação em sala. Evitava-se, 173/173.pdf. Acesso em Julho de 2005.
assim a separação e dicotomia clássica entre [4] Trinquet P. Maîtriser les Risques du Travail:
teoria e prática. Le cas du Bâtiment et de l’Industrie Française.
Maior envolvimento dos formandos na Paris, Presses Universitaires de France, 1996.
concepção, implementação e regulação do [5] Ministério da Segurança Social e do Trabalho.
programa; Exercício da Coordenação em matéria de
Contrariar a tendência defensiva/ auto- Segurança e Saúde na Actividade de Construção de
protectiva/ burocrática de reduzir/ limitar a Edifícios e Engenharia Civil, bem como o
prevenção a procedimentos/ prescrições/ normas Reconhecimento dos Respectivos Cursos de
que contornam/ tornam imunes a problemas Formação – Projecto de diploma para apreciação
legais, mas nada têm a ver com a promoção da pública. Boletim do Trabalho e do Emprego -
segurança e do bem-estar (atitude que se pode Separata 5 (2004).
ilustrar na hipotética postura: “se correr mal, [6] Cru, D. Prévention et Formes du Dialogue
estou protegido: nada me pode ser imputado!”); Social: Mise en Perspective Socio-historique.
A construção de colectivos profissionais de Revue de médecine du travail, tome XXVII, 2,
técnicos de prevenção que se concretizam como (2000) 119-126.
redes de representações profissionais e de [8] Guffond, J-L.; Leconte, G. Le Pilotage
partilha de conhecimentos, de experiências e de d’Activités Distribuées: Le Cas du Chantier.
instrumentos ao serviço da actividade dos Sociologie du Travail, 43, 2001, 197-214.
coordenadores de segurança e saúde na
construção. Alguns exemplos para a
concretização desta finalidade poderiam passar
pela dinamização de organismos representantes
das profissões ligadas à prevenção; pela
organização de fóruns de reflexão e de discussão
das problemáticas ligadas às actividades de
coordenação; pela utilização de plataformas
electrónicas destinadas à difusão de
instrumentos, à partilha de experiências e ao
empowerment desta actividade profissional

Agradecimentos
Agradecemos à Ordem dos Engenheiros da Região
Norte na pessoa do Eng.º João Baptista as
facilidades de acesso ao estudo desta acção de
formação.

Referências
[1] Alves Dias, L. Segurança e Saúde no Trabalho
da Construção em Portugal. Segurança, 168,
Suplemento Especial, Novembro/Dezembro/2005,
3-5.
[2] Alves Dias, L. Segurança e Saúde no Trabalho
da Construção na União Europeia. Segurança,
168, Suplemento Especial, Novembro/Dezembro/
2005, 7-22.

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