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op © Pau 2007 Fab saan ete eae Ce) Bes Dor nectar de atalosao na Pubs) (Camara Sasa go to, | ‘Onto natels rade denna no as 0 begat 1 clare 2, Cie 3 Sue aa) Ines para logo son: Tsgeto: Nan excnmeno. Ca & eure coma Sasage waz Dattrdb1 so Palo Bre) ‘a (i) 80883068 Fr (1 5570.3627 ori@peul ome Ison s7e.as20026706 Sumario are ‘ SUIETO NO CINEMA. coptutot CO ENIGMA DE KANE ‘aptto2 LUBIQUIDADE € TRANSCENDENCIA, cule (0 OLHO PrivaDo € SEU DUPLO. Cota [RJANELA DO VOYEUR Cotas AESQUIZE 00 OLHAR, ‘tuto CO SISTEMA DA SUTURA, (O ESPECTADOR NO TEXTO capttes IDENTIFICAGAO, PROJECKO, ESPELHO. cotsios (© PONTO DE ESCUTA. [ACRISE DA ENUNCIAGAO a wo ns age © SUIETO No clBERESPACO ‘A AUTOMATIZAGAO DO SUIEITO coptto 2 (© DeMIURGO £0 ROBO — ‘opto 3 [AS PERSONAGENS ARTIICIAIS [ATRAVESSANDO A TELA: A IMERSAO Caples TECHICAS DO OBSERVADOR copie 6 DE VOLTA A CAVERNA ‘A EMERGENCIA DO CORPO ‘to 18 REGIMES DE IMERSAO cite [NOVAS FIGURAS DA SUBJETIDADE SIBLIOGRAFIA ITADA, ‘OBRAS AUDIOVISUAIS€ DIGITAIS CITADAS a O SUJEITO NO CINEMA O ENIGMA DE KANE U “pequenino defeto”, apontado por Pauline Kul (1980, 78), com respeito A coecénca nacativa de Citizen Kene, pode servir de gancho para introduzir nosso problema No filme de Orson Welles, a palaves-chave Reibud é pronunciae ds por Kane nose leito de morte pouco antes de a bola de video cspaifarse no chio e alercar a enfermeira, Quando esta penecta no quarto, refletida num dos estlhagos cBacavos do video, 0 corpo de Kane jéestva efgido na cama, A criadagem, como vite mos a saber mais tarde, haviafcado do lado de fora. Ques dizer: ‘io havia ningwém no quarto de Kane quando ee more e, por tanto, ninguém podera t-lo ouvido pronuaciar as palswra fr ais, Isso quer dizer que o pretexto principal da filme ~ a busca dle tm significado para Ruwbd, que supostamence deveria ‘explicat” 0 homem Chacles Foster Kane ~ enconta-se de cara comprometido por um "equivoco” na construgo de sua estrutu- ‘A observagio de Kael éirelevane, pois se baseia num conceito de verossimilhanga demasiado escrapuloso para a5 liberdades do ‘mundo degético. Mas ofrece um bom peetexto para nos permite indagar sobee a aacureza do plan cinematogrifico. Como se pode dizer que “ainguém” viu (¢ ouviu) Kane pronuaciar a palavea amCaO eno NA TEA final sea imagem e o som corcespondentes aes cena foram efe- tivamentevistos e ouvides no filme? Uma pestos, pela menos, steve presente no quarto de Kane no momento de sua morte ¢ pide cescemunhar o movimento de seus labios pronunciando Rosebud 0 espectador.B, se considerarmos que o olhar que 0 pectadordeposica no filme é subsidise de um outto olhay,aquele ‘que derermina 0 Angulo, a distincia e a duracio segundo os qua, ‘uwtive € dado 8 visto, no € dificil imaginar a presenga de uma fucen testemunhs no lito de more, aquela justamente que 0 espectador assume quando vé 0 filme. De fat, hi sempre “alguém” a mais deneso da cena de um filme, alguém que evencualmente sabe mais que ax personagens, 2s vezes também menos, mas de qualquer forms algun que nio ¢ necessaviamente um procagonista explicitado na acio, Esse lguém € quem v2, no final do filme, 0 trend sendo devorado pelas chamas na fornalha do caselo, enguanto nele apece in rita a palavra Robed. O enigma do filme se vevelard a esse al- ‘guém eapenas a ele (além do espectador que assume o seu ola), pois as personagens aio estavam presentes neste lugar e neste ‘momento, quando o objewo Reed € idenificado pela primeiea vex. Hi, portano, um outro olhardeatro do filme, im olbarefe- tivamente presente, pois é ele que testeraunha a derradciea pa lavra de Kane e depois dsvenda o seu significado, mas no confunde necessaiamence com of alhares que tram ente si as petsonagens do filme. Diff ¢ localiz-lo, pois, como aa maior parce dos filmes, ele permanece invisivel © tempo todo, nfo se dexando marear 90 préprio corpo da naratva, Essa cescemunha invisivel seria — grosteimence falando © sem consideraras mecamorfoses do imaginsrio operadas pela die- ese ~ 0 fordgrafo que “repista” a cena, além de rado 0 pessoal téenico que fabrics 0 filme. Se ot planos em questio — os lbios de Kane promunciando a palavra enigma antes de morrer e 0 «end Ros atdendo nas chamas~estivessem colocados no con- taetn da 1m dacomentiio oa de uma reportagem de tcljornal, nfo restaria a menor divida de que uma testemonhs, pelo menos, presenciara as duas cenas: 0 forégeafo que as “registro” nos permite agora contempli-as, Sem este alho agenciadae do plano, 55 cenas simplesmence alo existiriam para o oferecimenco a0 nosso olbar, Daf que ofato puro e simples da existéncia de um plano jd pressupdeo trabalho de cnzaigy deur sueito que pri> Imordialmente o “olhou” (e eventualmente também 0 “euviu") pars que ele pudese sr finalmente contemplado por nts, espec- {doves Maa se eta iy exten de Boga ~ € o cinema, no fsrorto da sua produsio, nos preenteia habieualmente com pli- ‘os que apontam para sicuagesimagindtias, e nfo para o regis- tro documental ~corna-se problematico identifica ess instncia responsive pela visio eaudiglo, uma vex que sua nacueza€ locs- lieagdo devern seguramente ser de outre ordem, diferentes, por tanco, daquelas que dizem respeito& equpe técnica que as cone ‘6i. Pis, cal como o narradorlierii, a instincia que "ve" € ouve, que, poranto, dia vere ouvie (também dispée os pla- nos, monta-os, ordena-os), é ela também, um fato da fiego e como tal, circunserica a universo da diegese. Mas, enti, que insudncia € essa e como ela se constitai? Por certo, esse problema nfo é novo, A literatura, pelo menos, ‘em calocado com uma insisecia que beira a obsessio, a ponto de muitas obris produsidas pelo menos nos tlcimos cer anos constituicem 0 prSprio aloramenco dessa instincia geradora do dizcueeo, 08, como se coscums dizer nos cfculosespecializado, lum literasuca do “ponte de vista", Em outs cermos, 0 que corre na literatura moderna & que a narragio se deixa.contami- nae cada ver mais pelo seu proceso de enunciagio, fazendo emer- fis, todo momento, ou pelo menos problematizando, esse alguéns” que se incromece na diegese para conformé-la 2 sua visio, As formas como isso se dé variam desde aadogio pelo nar- ‘dor do ponto de vista de uma pertonagem,o que implica a par- calidad e a subjetivagio do universo diegético, até a dissolugio {do narrador numa muleiplicidade de vozes que Se defroncam ¢ st ontraver an long de sires nareativa descenteaizadae aber De qualquer forma, na liceraurs, a sombra do narrador€ sempee i ttiacaio suo wa Tua 2 ‘mais facilmenceidentticivel, pois or sinas de sua presence ertio arcades no pr6peio enunciado, Grove mad, eodo texto lterdtio € consctuido por uma "fla" (puro) Sendo asin, é quase inevi- vel que dessa questo elemeatar (isso € uma fla ou um discue 0") se passe naturalmente @ uma outra questio dela derivads sas quem fala quande de onde? Uma ver ideniticada a vox que oa 0 texto, pade-se perfeitamente questionar a naruteza do seu saber relativizar © seu poder su dimensio ds histéria, Com a literatura moderna, jf no temos propriamente “histérise", mae pontos de vista sobee elas. Esse problema € partcularmente fundante no Citien Ken, pois sabemos que se tata de um filme consteudo subte “postos dle vista". © tema jf estava aa mira de Orson Welles na época de realizagio de seu célebre filme: nfo se pode esquecer que 4 sua intenglo original, assim que chegou a Hollywood, ert adaptat para a tela Hear of Darknas, de Joseph Conca, um romance fem que diversosfocos saratves (0 do nazeador anénimo, 0 de Marlow eo de Kurta) se encaixam. Mas of “pontos de vista” mil- Liplos de Citizen Kane s80 pontos de vista litertios, colocados pelo texto (roteir), nfo coincidindo,entretanta, com @ ponto de vista do plano, ou sea, com a posigio que o olho da cimera cca ‘em relagio ao motivo. Isso quer dizer que a “nareadares” que apa recem no filme “contando” vesbalmente aspectos diferentes © contraditérios da personlidade de Kane (Thatcher, Bernstein, Leland, Susan e Raymond) nio correspondem exaramente 20 sujeico cinematogeifco no sentido mais préprio do termo, Al- ‘guns exemplos podem nos sjudar a entender isto, Leland, béba- {doe dormindo em cima da méquina de esceever, do podera tet uvido a conversa entre Kane e Bernstein sobre seu artigo para o Jornal, anda que esa eqUénca esteja clocada no filme "denteo” de seu depoimento. Da mesma forma, Sussn, desfulecida depois dda encativa de suicdio, nfo poder saber © que converssram Kane € o méiico a sew respeito, ainda que sja ela quem “natcs” ess cena. Quer dizer: depois que cada “naridor”liceritio comes 1 falar, o filme ganba autonomia eceminha “soxinho", a despeito B ‘he visio pessoal desse“natradoe". Os “pont de vista litersrios {iio resolvem, portanto, o problema do cestemunho do plano {Ghnvinuamos sem saber quem exava presente no escrtirio de Lando no quarto de Susan para observar aquilo que os “marae ves” ltesvioe no poderiam tee visto ou ouvido. A mesma ent ‘ie invsivel ¢ misterosaretoena: quem & el? Talvez se puss dizer que Thompson, o repérter que "amat- 1a" os diversos "pontos de vise” pars no fim concluir da impos- Sibidade de se chegae # wena ida unitaeia sobre a personage Kane, De fat, ele esté presente no filme numa esteutura tipi de “visio subjetiva": ele raramente aparece denero do plano e, ‘quando aparece, estén penumbra, aio podemos ver a sua face. {Una yer ou outea,observaros dele apenas uma sthuetsfurcva ‘A sejéncia do depoimento de Leland, por exemplo, aparece quase {otalmente em cimerasubjetiva, sem aunca mostrar o concraam- po onde estaria Thompson e par 0 qual se dirige o olhar daquela petsonagem. Quer dizer: © panto de vista “Gsico" de Thompson fm eelasdo a plano coincide com o poato de vista da cimera em ‘muitos momentos, constugia tipics da subjetividade no cinema, fu seja, da encarnacio do sujito da visio. Talver baja aqui um ‘eco do malogeado projeo anterior de Welles (eart of dorkna), ‘tue consistia em spresenear a personagem principal (Marlow) ateavés de um uso extensivo da chmerasubjeiva. Welles empres- ‘aria apenas a sua vor personagem, uma vez que esa dltims 0 seria eepeesencada no plano da imagem: ela seria encarnada pelo flho da cimera, Pestoalmente, Welles atuara como autra perso- fnagem, © misterioso Kurtz, na verdade uma espécie de alter eo iverido de Marlow (Kawin, 1978, pp. 43-44). Nio tendo con- seguidocesolver todos os problemas téenicos eeconémicos desse filme, Welles teria desistido dele, mas poderia cer transferido parte dos procedimencas para Citizen Ken. "No encanto, aincevengio de Thompson € apenas episGdica em em, de modo que uma possvel sugestio de cimera subjeciva no chega set um procedimento dominance no filme. Ao longo de toda crams, nfo € Thompson quem véo desenolar dos eventos: ami C30

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