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dos: lar e a danga dos sent distintas faces do mesmo Capa do disco 0 amor, o sorriso @ a flr, de Jodo Gilberto (cet). usica popu Am Adalberto Paranhos Professor do Departamento de Ciéncias Socials da Universidade Federal de Uberlndia/UFU. £ autor, entre outros livros, de O roubo da fala: origens da ideologia do trabalhismo no Brasil. $0 Paulo: Boitempo, 1999. akparanhos@triang.com.br a musica popular e a dancga dos sentidos: distintas faces do mesmo* Resumo Este texto pretende evidenciar que uma cangao, concebida como artefato cultural, esta longe de ser portadora de um sentido fixo. Para tanto, retoma algumas composicges e sugere que elas — imersas em toda uma rede de relagdes historicas no plano musical — so apropriadas reapropriadas segundo diferentes cconstelacdes de sentido, Como um camaledo sonoro, os sentidos de uma cango podem migrar a ponto dela perder 0 significado que Ihe foi originalmente atribuldo pelo seu autor, Paralelamente a andlise de diversificadas performances em torno de uma mesma composicgo, este artigo procura também chamar a atencSo para precaugSes meto- dolégicas que devem informar o Pesquisador no seu trabalho com a linguagem musical. —_____Abstract This text aims to show how a song, as @ cultural artifact, is far from having a fixed meaning, To do so, it retakes some compositions — immersed in a whole net of historical relationships in the musical domain =, suggesting they are appropriated and reappropriated according to different set of meanings. Asa sound chameleon, their senses move to an extent where the song loses its original significance given by its author. In parallel with the analysis of different performances of the same song, this paper also searches to draw attention to some metho- ological precautions the researcher must take in dealing with musical language Palavras-chave: produgao de sentidos; ressignificago; musica popular. Keywords: meaning production; re-signification; popular music. Que se acomeda em bale Palowra décil Palasra d'égua pra qualquer moldura em verso, em mdgoa Qualuer feito de ce manterpalavra Chico Buarque Empseender uma viagem musical pelo tempo a borde de alguzsas composicaes, eis 4 proposta-convite deste artigo. Ao atiavessat cinco décacas * VersB0 amplisds de texto spre Santado no V Congresso da IASPH da nossa historia musical, procurarelrecolher detalhes da paissgem cultural e pguedono V Congreso da IAS sonora do Brasil, bem como revelar certos aspectos da danga dos sentidos da Intometional Association for the Study of Popular Music), sediado cobra attistica. Serio expostas distintas faces do mesmo 4 medida que buscarei_ S\U0¥,0f Fopulat Music), sedan demonstrar como uaa cancio no cacsegs, em si mesma, um sentido uaivoco, 2008 Uber india, 8, jul-dez. de 2006 ArtCultura " CERTEAU, Michel de e GIARD Luce. A inveneao do catiaian.V. 2: Morar, cozinnar. 3. od. Potro polis: Vozes, 2000, 9. 938, 2 "Samba da minna terra” (Dorval Caymmi), Bando da Lua. 78 rpm Columbia, 1940 (rolangada om co letanea com diversos interpretes (CO Samba dia minha terra, Revi= vendo, 1991) 2 "Samba da minha terra” (Dorval Caymmi), Jogo Gilberto. LP Jogo Gilberto, Odeon, 196% relanga mento. C0 de Jodo Gilberto 0 ‘mito. Emi, 1982) congelado no tempo, que exprimisia a sua esséncia, Pelo contuisio, uma cancio, historicamente situada, comporta significados errantes, suibmetendo-se a um flisxo permanente de apcoptiacdo ¢ rea Esta ¢, por sinal, uma das c: que, dia apés dis, vém ganhando destaque no ambito da Historia Cultucal ou da Histéxia Social da Cultusa. Dai que este texto esteja em linha de sintonia com a -optiacio de sentidos. iclusdes que podemos extiair de estudos perspectiva analitica de Michel de Cesteat, pata quem o sentido de uma obia ou de uma atividade nfo se define a pastic de um depésito, de ums inten autoral. Nao é por ontra razio que ele cstica a “ccenca erxénea na transpaxéncia significante dos entunciados, fora do processo de enunciacio”! Uma composicio é, por assim dizer, um novelo de mmitas pont circular socialmente, ela, em seu moto-perpétuo, pode ser inclusive pon Ao 10 de convergéncia de diversas tradi econtestacdes, espaco aberto pata a piutalidade de significados e ps mesmo contflitantes incorporacio de vatios sentidos, si, Tomando por base estas bi metodolégicas vine recossexci, de inicio, a uma cancio de Dorival Caymmi, vista, ouvida einterpretada observacdes introdtorias, que tocam em quest adas & investigagio em tomo da miisica populas, sob trés oticas que a ligam a diesentes constelacdes de sentido, Afirmagao nacionalista e negagao internacionalista amba da minha terra”, gravada ¢ lancada em 1940, em 78 rotacdes pilotado pelo Bando da Lux, veio ao mundo em meio & ditacura do “Estado Novo”, debaixo de um clima politico-cultural saturado de nacionalismos de toda espécie. Composicio afinada com uma das vertentes do seu tempo, converten-se, jd de nascenca, em peca da attilhasia musical de exaltacao nacionalista. Ela celebrava, sem qualquer ceriménia, 0 casamento to decantado entre samba e brasilidade. Seu ato cantos, 0 novo simbolo ya) On doente do pé. Teatava-se, efetivamente, da afirmagio de uma determinada tradi¢io versos-chave proclamaram, 208 musical nacional: Oven nie gosta de samba) Boon sujeito no é/ EE rine da cal musical simultanea ‘no samba usbano que tinha como centio de itzadiacio Rio de Janeizo, cidade- sede das trés gravadocas existentes no pais naquela época, Alguns ingredientes da bem-condim da mink base de p: Bando da Lua, Aloysio de Oliveiza, cuja interpreta nente ja constituida e em processo de constituicio, caleada la gravacio original de “Samba tera” metecem registro. O molho de sua cozinha sitmica é todo ele sco ¢ violdo. O peato principal é servido pelo vocalista e lider do , seguindo © modelo dominante de cantar, essoa uns tantos elementos do de/ canta, ainda que mais ou ‘menos moderadamente. O timbre dessa produedo soa as harmonizacées vocais, ¢instrumentais dos anos 30 ¢ 40 no Brasil, revestindo-se de wma cevta “tipicidad’ fem termos de linguagem musical brasileis, num pesiodo ant do conjunto Os Casioeas. Se deisarmos para trés © ano de 1940 e nos transpostarmos para 1961, em plena efervescéncia da Bossa Nova, vamos nos deparar com a regravacio de “Samba da mina terra” por Joio Gilberto”. A uma simples audicio € possivel 20 advento perceber que, dialeticamente, estamos diante da afirmacio e da tuadicho music sgacio da buasileit, movimento préprio da zevolucio sonosa bossa-novista ‘Aclimatada 20 ambiente musical mais intimista da primeira Bossa Nova, ‘quase tudo ai é diferente. E outro 0 cor antanjo denota economia de recursos, apela tiatas, com o expucgo do acessério e do vist sxto timbristico, zecheado de dissonfincias. do pata © colorido das meias ismo. A parte sitmiea combina batesia, violio (este com 2 marcagio percussiva e harménica cassctesistica de Joao Gilbeito) © 0 érgio de Walter Wanderles, tendo, de quebia, a percussio voeal de Joo, no comeco e no final da faixa. Em vez do canto do falo, desponta © canto-falado, com uma inflesdo cologuial que leva 4 supressio dos vibyatos, cenfim, 4 “lagrima seca” da Bossa Nova, que tantas incompreensdes provocou, a e 2008 ponto desse modo de cantar ser considerado pelas Kinguas do inconformismo como pouco mésculo, para nio dizer afeminado. Quanto a isso, cabem alguns pasalelos com o cvoljazz, que, desde a visada dos anos 40 para 05 50, injetava novos ares na miisica note-americana e despertava sca de outros nem de longe sum meto afluente da eaudalosa producio jazzistica made in USA, nfo se pode ‘entusiasmo nos jovens que assumiriam o posto de comando nab dleixo, Sem ver na Bossa Nov caminhos no cenisio musical rnegar que, de uma forma ou de outea, o jag no seu jeito cvo/ (para ao falas aqui, do bebgp), foi um dos alimentos de que se nutsi © movimento bossa- novista JA se estabeleceram aproximacdes, em que pesem as diferencas, entre 0 estilo interpretativo de Joio Gilberto © 0 de Chet Baker. Mas também é perfeitamente admissfvel tracar paralelos entre © modo Miles Davis de tocar trompete, durante 0 reinado do «al jax, e 0 modo Joto Gilberto de cantar. Ambos como que se dio as mios, pelo menos 12 pralil sie pelos claroescuros; na escolba de uma sonoridade velada sem vibrates; no uma maneita especialissima de di sefecic especificamente a delicadeza e 4 densidade do toque de Miles Davis, que a podtica, em que salta aos ouvidos er a miisica, como afirma um cxitico a0 se dle associa ainda a uma certaveia de meloncoiat Pouco importa a opinido do préptio Joao Gilberto a respeito das relagdes — ou melhor, interacdes — entre a Bossa Nova e o jagz. Importa, sim, constatar que, nesse mesgulho em ditecio 4 tradicio musical brasileic “Samba da minha terra” como em outras cancées, traz & tona uma composi szelaboracla e conectada, de algoma maneita, a procedimentos que a aproximam do cixenito internacional do jag. Moral da histéxia: “Samba da minha tessa” ele, ndo apenas em acaba sendo parcialmente despido de sen cariterestritamente nacionalist, presente no ato que comandou a sua exiacio. Logo se vé que as interpretacdes, quaisquer que sejam elas, sio sempre portadoras de sentido, Isso recoloca, a todo instante, problemas de ordem metodolégica. Do meu ponto de vista, Incvitavelmente, quando alguém canta ¢/ou apresenta uma misica sob essa aquela ronpagem instrumental, atua igualmente, num determinado sentido, como compositor. O agente opera, em maior on menor medida, na perspectiva de decompor e/ou secompor uma composicio. Nao é A toa que intelectuais identificados com a Histéuia Cultusal, 20 retomarem as pegadas de Certeau, pdem em evidéncia a produto dos consumideres presar implica também com ¢ enfatizam que em hipétese alguma estes devem ser encarados como sujeitos passivos, cujo compostamento estatia predeterminado pela natureza mesma dos produtos que consomem ou pela forca dos meios que o impoem’, O que fez Joo Gilberto, no caso da regeavacio analisada? Consumidor entusiasta dos sambas de Dosival Caymmi, ele no consumiu “Samba da minha tesa” tal e «qual essa cancio foi produzida e industsalizada em disco. Repaginou-a, atualizou- a, como quem se recusa a colocar na moldusa de 1940 0 quacto do final dos 50 «© principio dos 60. tba da minha terra” cetosnava Viremos a pagina. Cosvia 0 ano de 1973,“ a boca de cena, desta vez pelas mios dos Novos Baianos', Numa leitusa oster ente p6s-tropicalista, conjugam-se em sua gravacio aspectos musicais 4 primeira vista conteaditérios: Bossa Nova e rack val, vemperados por pitad de samba sasgado. A performance dos Novos Baianos se abre sob nitida inspixacio bbosss-novista colada a0 violio e ao canto de Mosaes Moseisa, No seu desencolae, © som elettificado escorre, com estridéncia, da guitania de Pepeu Gomes. Li pelas tantas, © samba, para sambista nenhum botar defeito, pede passagem e souba a cena. Nese liqitidificador sonozo em que se tritusam miiltiplas linguagens musicais, a partir do arranjo de Moraes & Pepeu, assiste-se ao enlace entre 0 ipieo de cosmopolitisme. Que, de mais a mais, percone todo © LP Novos Baiazos FC, no qual figura essa regravacio. Se, internacional e o vegional, um lance Julstez. de 2008 “ CANDINI, Pino. Miles Davis. fn: ‘Miles Davis. um enigma da misica egro-americana. Colegs0 Sigan (0 daz2. $30 Paulo: Abril Cut tural, 1980. p. 2 A assimilagso de procedimentos Jazzistcos, sem a perda de con {ato com 6 legado do samba, fics finda mais evidente em outra In terpretacso do periodo do auge a Bossa Nova, Ver 2 Vers20, 0D © titulo de “0 samba da minhs {orra", com a callgrata propria do Jamba Trio. LP Avango, Philips, 1963 (faux relancada na colotanes = CD duplo— Tambe Trio. PolyGrezn, 3997}, Nos Estados Unidos doatre- ram varias tentativas de unir ja22 @ samba, como so ouve em gra ‘vag6es de sficcionados das ino: vapses bossa-novistas. entre 0 Quais o guitarrista Charlie Byrd ‘Quo inclu "Samba of my country hho LP Once more. Charlie Byrd's Bossa Nova. Riverside, 1963 (olan {Gado no CD Bossa Nova polos passa fos ~ Bossa Nova by the Birds — Riverside, 1992). PARANHOS, Adalborto. Sons do sins fede naps: linguagom musical @ 2 produg&o de sentides. Projeto Vistérta, n 20. Sa0 Paulo: Educ FAPESP/Finep, 2000, p. 224 * Ver CERTEAU, Michel de. A inven 80.do cotidiano. V. 1: Artes de fo 21,6. ed. Patrdpols: Vozes, 2001 1b 88, OKARTIER, Roger A Historia Culturet: entre preticas e repre: sentegies Lisoa/Rio de Janeiro DBitel Bertrane Brasil, 1000, p58 Entre outros autores sintontzados com essas precoupacdes, ver DAMS, Natalie Zemon. 0 pove @ & ppalavia imprassa. In Culturas do ppovo. sociedade @ cultura no inicio da Franca moderna. Ric de Ja nero: Paz @ Terra, 1900, "Samba da minna terra" (Dorval CCaymm), Noves Batanos. LP flovos Balanos FC. Continental, 1973 (e langado n9 GD dupio Sarrir@ cantar como Bahia. Warnes, 1997) ArtCultura + Eis um peculiar prooesso dom: gracao dos sentidos, como airta ORLANDI, Eni Puccineil #8 formas {do siénco: no movimento dos sen tidos. 4 ed. Campinas: Editors da Unicamp, 1997, p. 131 "© DARNTON, Robert. 0 boijo do La ‘mourette: midis, cultura 9 revolu 80. So Paulo’ Compania das otras, 1985, p. 167 "THOMPSON, €. PAs peculiorda es dos ingleses e outros artigos. Campinas Editora da Unicamp, 2001, p. 243, " “Chao de estrelas" (Silvio Caldas Orestes Berbasa), Silvio Caldas 7B rpm Odeon, 1837 (relangada em {duas coleténeas com diversos in lempretes: CD Vetha Guarda Emi 1998, caixa de CDs Historia de (Odeo as primoiras musicas do sé cculo XK. CD n. 2 — 1927-1842 — Emi, 2003), de um lado, se lanca mao da guitarra elétrica, de outro, onvem-se violio, eraviola, bandolim e cavaquinho. Amuncia-se a festiva celebracio da convivéncia pacifica de instrumentos aparentemente dispares. Nao foi Pepeu que declason convives bem com a sua porgio Jacob do Bandolim e a sua porsio Jimi Hendrix mundo, habitado pelos Novos Baianos, de ampla permissividade musical, 1, por exemplo, alinha instrumentos de origem afro (como o afoché) ow indigena (como as maracas 0 © chocalho), sem contar o bumbo, o bongs, o pandeizo ¢ o tuiingulo, postos em pé de igualdade com a eletrificacio do som Como nunca, “Samba da minha terra” adquitin, ent#o, uma inequivoca prontincia intemnacionalista, indo além dos estreitos limites a que esteve um dia confinada*, Numa época em que, mais do que consumir a chamada “misica cestrangeir brasileita — e © teopica qualquer maneita de musicat vale a pena: a perc! a foi deliberada e programaticamente integrada a miisica popular smo fornecen testemunho disso ~, os Novos Baianos setabalharam componentes da nossa tradi¢io ¢ aprofundaram o dislogo que entietiveram com producto mundo afor, pasticularmente nos seus cruzamentos com 0 rock € 0 pop. Seja como for, 0s Novos Brianos, sem nenbuim indicio de semorso ou peso na consciéncia, continuavam a cantar alegremente as palavras de Caymmi, embora a gerformance do grupo — enunciadora de sentido — subvertesse seu Tinguagem especifcamente musical parece, aqui, confirma as afimacées de Robert Datnton, ao salentar que ove pode iron si mesna, De fat, ele pode E preciso, portant, estar aleria para eventiais relagdes confitivas entre imtsica e leta,alen da complementaidade que possa wails E-mas: se os aztefatos culturais nio retém sentidos fixos, ¢ impsescindivel situé-los historicamente. Como se sabe, a Historia nio € seni wma disciplina do contexte e do _processe: todo siguificade é um signfzade-dentrocde-um-contesto, Dai decosse que swihas ses novas" . Pasando a questio para o que me intexessa imuais de perto, acrescentatia: velhas cangées, como se vin em “Samba da minha formas podem exprescar teria”, sio capazes de exptimir novos significados, desde que nio fiquemos seféns da mera literalidade das palaveas. Quando historieizamos a semitica estamos aptos a compreender que nao se pode falar simplesmente da coisa em si mesma, pois, dialeticamente, ela abriga também a outea-coisa, Pasa além dela, quantas vezes no nos colocamos diante da sobre-coisa? E esta, em certas ciccnastincias, se transforma até na anticoisa ‘Tradigao e traigao Cancio alguma uma ilha voltada para dentio de si, Nem sesia possivel submeté-la a uma blindagem que a mantivesse a salvo de qualquer teatativa de seapioptiacio de sens sentidos. Pox mais existalizadas que sejam as leitaras que se facam dessa ou daquela cancio, semp com novos sopros de vida. E, conforme caso, mais do que evidenciar a agtegacio de outtos significados, uma composi¢io pode sair inteiramente dos subsiste @ possibilidade de reanimi-la Vejamos 0 exemplo da gravacio original e de uma das regravacées de “Chio de estielas”, composta nos anos 1930 ¢ tomada um clissico da misica popular brasileira. Transposta para o disco pelo autor de sua melodia, Silvio Caldas, ela fora imaginada a0 sitmo dolente que embalava as serestas, do violio. Quando mais néo seja, essa cancio cavou seu Ingar na histécia da nossa misica pelo texto poético de fino acabamento formal (com os célebres, vversos de Orestes Barbosa, fx pisavas nas astrosdistraida). Nels, 0 drama pungente do personagem masculino transparece na interpretacio bem-comportada de Silvio Caldas: 0 mundo desaba sobre sua eabeca quando sua mulher — pombacrola que voou ~ bate asas ramo a outtas paragens. julodez, de 2008 Nem por isso “Chao de estzelas” foi poupada do chaque de deboche promovido pelos Mutantes, na virada dos 60 pata os 70 do século passado’ Esses “elementos provocadoses” a elegesam como bode expiatério aa propositalmente tidicula metamorfose do sério em hilariante. A parifrase cede espaco a parédia, Assim, numa performance que configura um procedimento parodistico, eles sublinham a difeenea e instituem a inversio, Como quem, de dedo indicador em riste, aponta ¢ denuncia a fadiga da tradicio, os Mutantes projetam seu dcido saxcasmo sobve essa composicia, Na sua zefiguaacio, “Chio de estrelas” se destigusa, pata horror dos “tzadinacionalistas’ A primeira impressio — que logo se de que estamos diante de wma geavacio cespeit do solo inicial de sax (em tonalidade espeitosa. E o que insinus: ve) € 0 acompanhamento que se prolongs 30 violio, Ato continuo, 0 vocalista Amaldo Baptista introduz um fator de estranhamento, Mais contido no comeco da gravacio, ele, 208 poucos, se revela sem disfa snearna o papel wremedo de cantor, uma espécie de cantor chinfiim de chusascasia chinfiim. Na sua intespretaczo detramada, de apelos melodramiticos ficeis, Arnaldo mal controla sua respitacio. Pusa escancaradamente, o ar para seguir adiante, beica a todo momento a desafinacio ela , por fim, se precipi Capitulo & parte 0 artanjo do grupo e de Rogério Duprat. O maestro xa earticula uma metalinguagem ao comentar musicalmente alingnagem textual de “Chio de estuelas”. Tzafegando na contuamio da exaltacko da tradicio musical brasileira, 2 sonoridade desse registro fono; sponte cuitico. Quase tudo ai € puso deboche. Ou, 200 deleite, entzecostado por modificacdes inesperadas no andamento sitmica, Nessa angio, 6 homem chora a pastida da companheisa: Faste a sonoridad ou) E.haje g Da nontba-rola a simulagio do bater de asas slavidade! Forra meu bei Instantaneamer de wma poms, que se mistuca a0 conco do motor de um helicéptero. Ao mesmo tempo, soa tuma bental e abrupta alkera 19 titmiea: a oxquestaa, 4 moda de uma jaggband tradicional, nos remete de volta 20 pasado, escorada num naipe de metais, num banjo © em tudo 0 mais que 0 fei nlbacio total. Nessar roxpar comune Ps de efeitos sonoros, a0 fiémito dos festivais de Tnstansa-se, na seq{léncia, uma esculh. mnduradas/ Na corda qual entio reconduzidos, pela v: “MPB da década de 1960) rasgado)/ 1 a dies noses trapescolrios (am pano é estrepitosamente Es toque dos clarins e ao rufar dos tamboves, a sensacio que se tem éa de estarmos que nos morvos m w oriade nacional (agi, 20 no meio de uma parada militay)/ 4 festa co barraco era sem trinco! Mas sso inca (e 08 disparos contta a tradicio se fazem ouvir ao pé da letra, rmando-se em tiros)/ Salpicava de estelas nosso chao) Tu pisavas was astros 2 (um muido esteai alguém caminhando sobre estzelas)/ Sem " Nio satisfeitos com a desconstrusio de “Chio de Estrelas”, 0 desfecho nfo é menos insoleate: &imagem somantien da eabrocha, do hnar edo violko em comuthio opdem-se versos posticos que despoctizam a poesia: E a cab scorresandlo wo cabito/ Eas gato (sit) miand no porte. Tanto muma como noutra versio, a anisica é a m ma, a letua, no geral, & to foi deliberadamente if Adinal, jd tkisou Paul Zumthor, o intéspeete nifica'*, E.os Mutantes, numa sadicalizacio da proposta tropicalista, lancavam- se, de maneira iconoclasta, a mesma, No entanto, 0 sentido primeiso dessa ea implodido por uma nov 2.0 culto as nossas “raizes”, Nessa tarefa, valeram- se, para tanto, de um simbolo da teadigao nmsical brasileira, desfazendo-o em cacos numa regiavacio onomatopaic Plugaclos em outzas sonouidades que se difundiam no cenatio internacional, eles reagjam iqueles que insistiam em: 2 MPB, conformando-a a estilos de expresso artistiea de forte teor nacionalista Era o seu jeito de tomar presente para s Uber dla, n° 8, jul-de de 2008 "8 “Chie de estralas" (Silvio Caldas f Orestes Barbosa), Mutants. LP A aivina comédia ou ando meio ‘esligado. Patydor, 1970 (relange ‘mento. CD homénimo. Polydor. s 4). O resultasa, ai, 8 muito diver gente do que so tinha, natural mente, em regravacses de Silvio. Caldas ou num registro dessa mes ‘ma 6poca, em tom grave # aflitvo, ‘ome no LP Cansedo apres ‘aysa. Copacabans, 1989 (lan sgamento a. Série 2 om Emi. 2003) ZUMTHOR, Paul. A letra @ a vo2: “literatura” medieval. S60 Paulo. Compania das Letras, 2001. p Be ArtCultura % Oepoimento. de Carlos Lyre tontida no sau [P25 anos do Gos _ fiova St 1087 (roman da stone Outras promincias, outras dicgées fete aisca for gravaco so vivo Gurente, show’ reelizado no . ‘Jazamania, no Rio de vanaira). Na (Os sentidos mutantes de uma cangio nio guardam relagio de dependéncia Zontrevape. do disco am que Spareca ntuencia do jane" (LP Depots do carnaval. o sambelenco 8gor de Carlos tyra. Pili, 1982) Siro compositor capecsta, Nol ° Sov Lise bars. eeerera. arios opstam com a cancio tyra, aue sceie, om parte, @ Embarquemos de novo nos anos 1960, todo ele pontuado por intensas {8 transtormagao do nosso sam hutas, inclusive no terreno cultural. Em 1962, uma dessas hutas estalava no interior a pum samba.jaz2, um ibra> do movimento Lossi-uovista, A miisicasiaibolo da quedi-de-bisgo que entio Carlos Lyra era taxativo. sou Se Vetificou foi “Influéncia do Jazz”. Seu autor, 0 bossa-novista de primeira favor ae tosubncias estrargeres, ora Cazlos Lyra, mantinha esteeitos vincvlos com © CPC da UNE (Ceateo desde que nao destruam 2 1205 Poyutar de Cultura da Uniio Nacional dos Estudantes). Como uum dos idezes {ja Colegio Historia da Wusi¢a da faccio que deplorava wns tantos “descaminhos” da Bossa Popular Brest. Abr cultura 4071, 1. cantracopa tio-somente com 0 transcurso do tempo, Num mesmo tempo, num mesmo histésia do presente igualmente comporta, é dbvio, dimensSes distintas mices de sentido relacionadas com o tipo de intervencao dos sujeitos que Nova, ele achou por bem demunciar a demasiada influencia smisica brasileira Protesto dessa nanuzeaa mio exa algo inédito na carseia de Catlos Lyra s “critieando” (Carlos tyra), 08 Cerigeas. 78 rpm Continental A 1957 (langamento: CD Os Carto- precisamente do som a3. Serie Mestres da IPB. Warner, Ire samba men Fo em See Vesites da EP Caulos Lyra lastima: Pob Fei ce mi Fidades = — por cus nba dw Superioridade do samba em com araG0 com o bolero, a misica : ; Raliana, o bebop e'2 cangao

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