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this work is in no way to be construed to mean that such names may be regarded
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Publisher:
Novas Edições Acadêmicas
is a tredemark of
Dodo Books Indian Ocean Ltd., member of the OmniScriptum S.R.L
Publishing group
str. A.Russo 15, of. 61, Chisinau-2068, Republic of Moldova Europe
Printed at: see last page
ISBN: 978-620-3-46845-8

Copyrighr © Dora Berger


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Parte XXI Parte XXI


Princípio do impacto social da crise da empresa Princípio do impacto social da crise da empresa

Doutora Dora Berger Doutora Dora Berger


Daniel Almeida Castilho1 Daniel Almeida Castilho
2
Fabrício Santos Neves Fabrício Santos Neves
Filipe Fialho Alves3 Filipe Fialho Alves
4
Kevyn Luciano Rodrigues Ramos Kevyn Luciano Rodrigues Ramos
Maurício Corrêa Brandão5 Maurício Corrêa Brandão

1 Introdução 604
2 Origem e considerações doutrinárias sobre o 1 Introdução
princípio 607
3 Aplicabilidade jurídica do princípio 615 A Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, é marco em nosso sistema
4 Considerações finais 622 jurídico pátrio no que se refere à tratativa na recuperação judicial e na
Referências 623 falência de empresas. É inerente à logicidade empreendedora
empresarial a possibilidade de riscos que venham a constituir o
empresário ou a sociedade empresária à categoria de devedor, isso
1-5
Bacharelandos do Curso de Direito pela Universidade Federal do Espírito em resposta ineficaz a momentos de dificuldade, que podem ser
Santo. Brasil. Endereços eletrônicos em ordem de nomes:
daniel.castilho@aluno.ufes.br; fabricio.s.neves@aluno.ufes.br; impermanentes, ensejando a recuperação judicial, ou definitivos, em
filipefa@yahoo.com.br; kevyn.ramos@aluno.ufes.br; cobramau@yahoo.com.br.
caso de falência.
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Parte XXI Parte XXI


Princípio do impacto social da crise da empresa Princípio do impacto social da crise da empresa

Doutora Dora Berger Doutora Dora Berger


Daniel Almeida Castilho1 Daniel Almeida Castilho
2
Fabrício Santos Neves Fabrício Santos Neves
Filipe Fialho Alves3 Filipe Fialho Alves
4
Kevyn Luciano Rodrigues Ramos Kevyn Luciano Rodrigues Ramos
Maurício Corrêa Brandão5 Maurício Corrêa Brandão

1 Introdução 604
2 Origem e considerações doutrinárias sobre o 1 Introdução
princípio 607
3 Aplicabilidade jurídica do princípio 615 A Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, é marco em nosso sistema
4 Considerações finais 622 jurídico pátrio no que se refere à tratativa na recuperação judicial e na
Referências 623 falência de empresas. É inerente à logicidade empreendedora
empresarial a possibilidade de riscos que venham a constituir o
empresário ou a sociedade empresária à categoria de devedor, isso
1-5
Bacharelandos do Curso de Direito pela Universidade Federal do Espírito em resposta ineficaz a momentos de dificuldade, que podem ser
Santo. Brasil. Endereços eletrônicos em ordem de nomes:
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caso de falência.
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igualmente, interesses de outros agentes do mercado e da


As crises econômicas e sociais fazem parte da ideia de vida em comunidade na qual está inserida. Neste ínterim, estimar, em alguma
sociedade e advém de diversos fatores, como a excepcionalidade de medida, a aplicabilidade jurídica do princípio do impacto social da crise
uma pandemia ou mesmo mudanças no mercado, pela introdução de da empresa, face a matéria do direito falimentar, induz possibilidade
uma nova tecnologia, pela constatação de prejuízo em se adotar doutrinária e processual, que poderá asseverar argumentação neste
determinado hábito. Este rol minimamente exemplificativo apascenta a ponto, vindo a contribuir nesta estruturação.
convicção consentânea de que haverá evidentes reflexos na
concepção das empresas que coabitam ao macro cenário dessa crise. Assim é conveniente escrutar: o princípio do impacto social da crise da
empresa é aplicável nas ações que versem ou se correlacionem à
No âmbito da empresa, onde dispomos de um micro cenário, é onde matéria da recuperação de empresas?
evidentemente vamos observar as consequências desta adversidade.
Os impactos serão mensurados na vida das pessoas que se envolvem Primariamente se pressupõe que o princípio em questão é sim
na conjuntura, quer seja pelos colaboradores, terceirizados, aplicado juridicamente para prevenção e solução de crises no intuito
quarteirizados. Em um sem fim de imbricamento, o encerramento de de se preservar a atividade empresarial, de modo que o deslinde
atividade empresarial é fonte de sequelas, por vezes incomensuráveis, desta lacônica análise deverá conformar razão neste propósito.
em se esquadrinhando as interferências indiretas, ademais as diretas,
mensuráveis, deste dissabor. É patente a dificuldade em se encontrar produção científica aplicada
especificamente ao recorte dado, uma vez que o levantamento é rico
Nesta seara se faz pertinente o estudo do princípio do impacto social no que concerne à dispersão da temática, inclusive trazendo o
da crise da empresa como um dos constituintes para o ensejo do princípio destacado como acepção contida em outros princípios, razão
soerguimento da atividade empresarial, o qual decorre do princípio da que aduz relevância aos direcionamentos ora propostos, numa busca
função social da empresa, anunciado no artigo 47 da Lei nº 11.101, de pela individualização deste arrazoado.
9 de fevereiro de 2005 (BRASIL, 2005), já que este último preceito
fundamenta soluções de conflitos de interesses procurando manter a
atividade empresarial, realizando interesse não só do empresário,
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Trata de uma pesquisa qualitativa, sob o procedimento de análise permitem que sejam classificadas na concepção tradicional de
bibliográfica e jurisprudencial, perfazendo uma breve sondagem das atividade comercial. Diante desses fenômenos econômicos que
considerações já consubstanciadas sobre o assunto. ampliaram o objeto do direito comercial, tornou-se indispensável a
atualização da designação tradicional desse ramo do direito. Então,
Utilizamos o método dedutivo, buscando colacionar a Lei que regula a consagrou-se na doutrina a designação direito empresarial como o
recuperação, judicial e extrajudicial, do empresário e da sociedade ramo do direito que “tem por objeto a regulação de direitos e
empresária, com os diversos artigos e levantamentos doutrinários interesses dos que exercem atividades de produção ou a circulação
sobre o tema, confrontando a sua aplicabilidade tendo por égide a de bens ou de serviços com finalidade econômica” (MIRAGEM, 2004,
situação de crise sistêmica que se passa em nosso país, visando p. 25).
corporificar algum constructo que venha possibilitar reflexão atinente
aos argumentos ora produzidos. Essa regulação se dá por meio de normas jurídicas, sendo estas
divididas pela dogmática entre duas categorias: regras e princípios.
2 Origem e considerações doutrinárias sobre o princípio Barroso e Barcellos (2003, p. 148-149) ensinam que as regras
constituem relatos objetivos, descritivos de determinadas condutas e
A necessidade de matérias-primas que não eram encontradas em seu aplicáveis a um conjunto delimitado de situações, e que os princípios,
território levou os governantes das primeiras cidades a expandir seus por outro lado, constituem relatos com maior grau de abstração, sem
contatos com outros povos através do comércio (PINSKY, 2015, p. especificação da conduta a ser seguida e são aplicáveis a um
66). Desde então, do surgimento de um sistema rudimentar de conjunto amplo, até mesmo indeterminado, de situações. No sistema
intercâmbio de bens com a finalidade de satisfazer as necessidades jurídico, enquanto as regras desempenham o papel referente à
das pessoas, já se fazia necessária a elaboração de normas de segurança jurídica, os princípios, em razão de sua flexibilidade,
conduta para viabilizá-lo, nasce, assim, o denominado direito conduzem à realização da justiça do caso concreto.
comercial (MIRAGEM, 2004, p. 8).

Com o desenvolvimento das sociedades, surgiu um sem-número de


atividades econômicas marcadas por características que não
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Nesse sentido, Coelho (2012), em sua obra Princípios do Direito a empresa desempenha na sociedade hodierna, tornando viável a
Comercial, elenca um conjunto de princípios da disciplina referida, introdução no direito falimentar da recuperação de empresas.
dentre eles o princípio do impacto social da crise da empresa, objeto
do presente estudo. A atividade empresarial, a qual consiste na produção ou circulação de
bens ou prestação de serviços, em conformidade com a teoria da
Por um período muito longo a solução para a crise das empresas não empresa prevista no caput do artigo 966 da Lei nº 10.406, de 10 de
integrava os interesses estatais. A solução para a insolvência, ou seja, janeiro de 2002, que institui o Código Civil (BRASIL, 2002), ocupa um
passivo (dívidas, obrigações) consideravelmente acima do ativo relevante papel no desenvolvimento econômico do país e da
(haveres, créditos) na empresa ficava a cargo do devedor e de seus coletividade humana, porque é responsável pela produção e
credores e, somente a partir do século XX, surge o interesse do distribuição de bens e ou serviços, pela geração de postos de trabalho
Estado na conservação do organismo empresarial dada sua e de tributos recolhidos aos cofres públicos. Por este motivo, o
importância social. legislador inseriu a recuperação judicial e extrajudicial como
instrumento legal para preservar a empresa, mantendo a atividade
Nos dias atuais, a empresa ou a atividade empresarial não é mais empresarial e, dessa forma, permitindo que a empresa cumpra sua
vista como uma atividade lucrativa dos titulares, sócios ou acionistas, função social, como expressamente previsto no artigo 47 da Lei nº
mas como uma instituição social. Magalhães (2009, p. 5) pondera que 11.101, de 9 de fevereiro de 2002 (BRASIL, 2005).
isso acontece porque o Estado deixou para a livre iniciativa a
participação direta na produção ou na circulação de bens ou de O fim social a que a lei se refere consiste em viabilizar a superação da
serviços, que transformou-se no projeto de desenvolvimento situação de crise econômico-financeira, a fim de preservar a atividade
econômico da sociedade humana. empresarial, como é do interesse de todos os envolvidos, em
benefício do bem comum.
Acerca do assunto, Guimarães (2007, 351), leciona: A situação
concedeu uma clara transferência da matéria, anteriormente de índole O princípio do impacto social da crise da empresa justifica os
privatística, para a esfera publicística. O Estado passou a proteger mecanismos jurídicos de prevenção e solução da crise que protegem
interesses coletivos, reconhecendo a indispensável função social que os interesses dos empresários, dos credores, dos trabalhadores, os
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interesses metaindividuais vinculados à continuidade da atividade sendo tomadas medidas para a contenção da pandemia, atos e
empresarial (COELHO, 2012, p. 58). decretos determinam o fechamento de fronteiras, escolas,
universidades, shopping centers, academias, bares, fechamento do
Habitualmente, as causas da crise e dissolução de sociedades comércio e serviços não essenciais, dentre outros.
empresárias estão associadas a um conjunto de fatores de forma
cumulativa, inclusive provocada por fatores externos e sobre os quais A crise universalizada reflete-se nos mais diversos setores da
as pessoas que estão a frente dos negócios não têm controle, como economia nacional. A bolsa de valores oficial do Brasil (B3, Brasil,
desastres ambientais, crise da pandemia de Covid-19, criando um Bolsa, Balcão) sofreu substancial queda, a expectativa do Produto
ambiente de instabilidade e uma série de problemas. Exemplos: Interno Bruto (PIB) é de redução, a paralisação das importações de
refinanciamento de dívidas pelos bancos, suspensão de contratos, produtos da China, maior parceiro comercial do país, inviabiliza a
redução de salários, adiamento de contribuição das empresas para o atividade desenvolvida por diversos setores, sobretudo os que
Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), restrição a circulação das dependem da importação de tecnologias e aparelhos eletrônicos, de
pessoas, que podem sair apenas para comprar alimentos, remédios motores à indústria Têxtil, etc. Isso significa paralisar um universo
ou buscar auxílio médico (lockdown), funcionamento unicamente de imenso de indústrias e comércios por todo o território nacional. Além
serviços considerados essenciais, aforamento de pedidos de disso, tem a questão da saúde, que afasta trabalhadores de suas
recuperação judicial ou de falência. funções, a queda do consumo frente ao cenário de mais absoluta
insegurança sobre o tempo e a extensão da crise, além disso, há
No momento, o mundo vivencia inúmeras turbulências que, de forma menos dinheiro circulando e até o comércio eletrônico foi afetado.
direta ou indireta, refletem no desenvolvimento da empresa.
Os empresários serão grandes protagonistas no enfrentamento da
O ano de 2020 começou para razoável parte dos empresários crise, percepção do mercado e na tomada de decisões. Crê-se que,
brasileiros com um bom grau de otimismo em termos de investimento. mesmo após o controle da pandemia, os reflexos da crise se manterão
Todavia, a pandemia de Covid-19, com o primeiro caso constatado em por certo tempo até que o mercado se adapte. O cenário da crise
26 de fevereiro de 2020, na cidade de São Paulo, está causando ultrapassará a pandemia, dado que, seus impactos levarão tempo
potenciais impactos sobre a economia do país. Desde então, estão para serem absorvidos.
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na aplicação da lei que venha incidir, na hipótese de estar o


As dificuldades econômicas, financeiras, técnicas e gerenciais da empresário ou sociedade empresária em crise econômico-financeira,
empresa não preocupam somente ao devedor e a seus credores, deve-se atender aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do
igualmente, ao poder público e à coletividade humana, sendo certo bem comum.
que, além e acima do interesse privado de composição dos conflitos
entre devedor e seus credores, há o interesse público e social da De forma que, estão atrelados às empresas não só os interesses dos
preservação, reorganização, saneamento e desenvolvimento da empresários, que visam o lucro, toda a coletividade também tem
empresa. interesses, metaindividuais, afetados pelos sucessos e insucessos
dessas instituições sociais. A atividade empresarial promove vários
Mamede (2010, p. 54) assevera que a proteção da empresa não efeitos para a coletividade humana, por exemplo, a subsistência de
significa apenas proteção do empresário e da sociedade empresária, grande parte da população do país, a produção e distribuição de bens
do mesmo modo, proteção da comunidade e do Estado que se e serviços, a arrecadação fiscal e também a própria economia, seja
beneficiam - no mínimo indiretamente – com a produção de riquezas. local, regional, nacional e até mesmo global.
Aliás, não somente o empreendedor, o empresário, igualmente,
terceiros que contratam com a empresa e cujos direitos e interesses De acordo com Patrocínio (2021, p. 4): “O Estado não sobrevive sem
possam se também afetados pela função social da empresa. atividade econômica, a partir da qual são coletados os tributos
necessários à prestação dos serviços públicos essenciais como saúde
Para Requião, citado por Perin Júnior (2009, p. 33), a sociedade e segurança, bem como o pagamento do funcionalismo e dos
empresária e sua atividade econômica organizada são um repositório investimentos em infraestrutura”.
de interesses privados e gerais, com alta e importante função social,
sua extinção constitui fato grave, que somente em casos extremos De modo que, a crise da empresa pode representar extremo impacto
deve ser admitida. social negativo. A título de mais um exemplo, pode-se citar o caso do
Grupo Oi, que protagonizou em 2016 o maior pedido de recuperação
Pacheco (2007, p. 2) releva que tendo em vista a multiplicidade de judicial da história do Brasil (ALVARENGA, 2017, online), informações
interesse na permanência, continuidade e preservação da empresa, extraídas do processo indicam que a eventual falência desse grupo
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econômico poderia resultar na interrupção das telecomunicações, em crise, visando à preservação da empresa ou da atividade
internet e telefone, em 2.051 municípios brasileiros (BARBOSA, 2017, empresarial na transposição ao instituto da falência.
p. 46).
Deste modo, possível é identificar ao que versa a necessidade de
Diante dessa exposição dos interesses metaindividuais à eventual construção de um ambiente institucional que viabilize o esforço de
crise das empresas, Coelho (2012, p. 57-58) extrai do disposto no reorganização, sobretudo quando se trata de uma lei de ordem
artigo 47 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, o princípio do pública, que tem por intuito a proteção da produção de bens e
impacto social da crise da empresa, o qual aponta que “os serviços, dos empregos e dos interesses dos credores. Assim, viável é
mecanismos jurídicos de prevenção e solução da crise são destinados identificar o especial desempenho social da empresa.
não somente à proteção dos interesses dos empresários, mas
também, quando pertinentes, à dos interesses metaindividuais Ínsito a isso, o procedimento de recuperação judicial caracteriza-se na
relacionados à continuidade da atividade empresarial”. imposição legal de sacrifício aos credores, alicerçada na percepção de
um bem maior que é a solução de crises no intuito de se preservar a
Esse princípio é classificado pelo doutrinador como: legal, posto que é atividade empresarial. Inicialmente, a adoção do procedimento
extraído da Lei de Recuperação Judicial e Falência; especial, por ser encontrou alguma resistência no cenário empresarial após o início da
aplicável apenas ao direito falimentar; e implícito, visto que não está vigência da norma, tal receio prescindia, principalmente, aos
positivado, mas corresponde a conclusão doutrinária à vista dos enunciados normativos do diploma legal não estarem submetidos ao
dispositivos vigentes (COELHO, 2021, p. 58). crivo jurisprudencial (POZZO, 2017, p. 36-37).

3 Aplicabilidade jurídica do princípio No entanto, podemos identificar uma crescente anual nos pedidos de
recuperação desde a entrada em vigor da Lei de Recuperação Judicial
O novel normativo que regulamentou a Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro e Falência, podendo-se constatar que o corte da empresa em crise é
de 2005, cria um novo foco delimitado no processo de recuperação vastamente explorado no decorrer de um processo de recuperação
judicial da empresa traduzido no seu artigo 47 (BRASIL, 2005), o qual, judicial. Assim, as consequências resultantes da aplicação do impacto
amplia as possibilidades de saneamento financeiro das sociedades social devem ser relevantes para a manutenção da atividade
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empresarial, encontrando a sua funcionalidade social (SILVEIRA, situações nas quais é necessário definir qual juízo detém a
2019, p. 74). competência para praticar atos de execução incidentes sobre o
patrimônio de empresas em recuperação.
Nessa ótica, destacam-se no repertório jurisprudencial do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) as diversas decisões atinentes ao conflito de A aplicação do princípio da função social da empresa compete ao
competência com a Justiça do Trabalho, situação que personifica à juízo universal da falência e recuperação judicial, sob o risco de dispor
preservação da sociedade empresária e a manutenção da atividade sua aplicação a qualquer Tribunal uma crise societária ainda mais
econômica em benefício do bem maior social em prevalência de grave caso percorra por via de interesses particularizados.
execuções individuais trabalhistas, mesmo após a aprovação do plano
(POZZO, 2017, p. 231): Em outro julgamento, a Segunda Seção do Superior Tribunal de
Justiça, no conflito de competência nº 118.183 MG (2011/0162516-0),
Nessa continuidade, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça de Relatoria da Ministra Nancy Andrighi, julgado em 9 de novembro de
no conflito de competência nº 73.380-SP (2006/0249940-3), de 2011, que compreendia a aprovação de plano de recuperação no juízo
Relatoria do Ministro Hélio Quaglia Barbosa, julgado em 28 de Estadual que previa a transferência do parque industrial da
novembro de 2007, pontificou que, conforme precedentes, existe recuperanda para terceiros mediante arrendamento, sendo que, ao
incompatibilidade entre o plano de recuperação judicial aprovado e julgar ação trabalhista de empregado da recuperanda, o juízo
homologado e execuções individuais trabalhistas, porque um trabalhista reconheceu a existência de sucessão trabalhista, ou seja, a
procedimento prejudica o outro. O objetivo principal da Lei nº 11.101, arrendatária seria responsável pelo pagamento dos débitos
de 9 de fevereiro de 2005, consiste na recuperação da atividade trabalhistas do arrendador. A Segunda Seção do Superior Tribunal de
empresarial em benefício da função social que desenvolve, o diploma Justiça destacou que tal julgamento implica invasão da competência
legal aludido não terá operacionalidade se a sua aplicação puder ser do juízo da recuperação judicial, ao qual compete verificar se o
partilhada pelos juízos da Justiça dos Estados e Distrito Federal e os arrendamento do parque industrial foi cumprido corretamente, se há
da Justiça do Trabalho (BRASIL, 2007). ou não sucessão quanto aos débitos trabalhistas. A Ministra Relatora
acrescentou que as decisões proferidas sempre têm como norte o
Compreende-se que, o Superior Tribunal de Justiça depara-se com princípio da continuidade da atividade empresarial, devido o papel
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econômico e social que desempenha, cabendo ao juízo universal da consumidores, fornecedores, fisco e coletividade humana.
falência decidir acerca dessas questões. Nesse contexto, o parágrafo
único do artigo 60 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 Em outro caso, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no
(BRASIL, 2005), dispõe que na hipótese em que o plano de Recurso de Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial nº
recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial, o objeto da 1433265-SP (2019/0014668-2), de Relatoria do Ministro Marco Buzzi,
alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do julgado em 26 de agosto de 2019, em sede de recuperação judicial de
arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza uma sociedade limitada, em decisão monocrática, ratificou o
tributária, derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de entendimento do juízo de primeiro grau, no sentido de que a
acidente de trabalho. O que buscou o legislador, com tal regra, foi convolação da recuperação judicial em falência exige prova de que a
efetivar a ideia de que a flexibilização de algumas garantias de crise econômica seja insuperável, o que não é o caso dos autos, pois,
determinados credores, conquanto possa implicar aparente perda vislumbra-se viabilidade de soerguimento da empresa, cuja solução é
individual, numa análise imediata e de curto prazo, pode significar mais adequada ao princípio da preservação da empresa. No texto do
ganhos sociais mais efetivos, numa análise econômica mais ampla, à acórdão foi mencionado trecho do Recurso Especial nº 1207117/MG,
medida que a manutenção da atividade empresarial pode implicar da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, de Relatoria do
significativa manutenção de empregos, geração de novos postos de Ministro Luís Felipe Salomão, julgado em 10 de novembro de 2015,
trabalho, movimentação da economia, manutenção da saúde que serviu de orientação ao julgamento, nos seguintes termos: O
financeira de fornecedores, entre inúmeros outros ganhos na hipótese artigo 47 da Lei de Falências destina-se a orientar decisões que serão
(BRASIL, 2011). prolatadas pelo Magistrado que preside o processo de recuperação
judicial, não podendo, todavia, ser o único fundamento para
Percebe-se que a expressão - função social da empresa - inserida no concessão do pedido, impondo-se a observância de outras
texto do artigo 47 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 postulados, com objetivo de atender a finalidade do dispositivo legal
(BRASIL, 2005), reflete que o exercício da atividade empresarial não é que consiste em viabilizar a superação da situação de crise
de interesse apenas do empresário, do mesmo modo, de pessoas econômico-financeira do devedor, ensejando a manutenção da fonte
cujos interesses giram em torno do desenvolvimento da atividade produtora, do emprego dos trabalhadores e a proteção dos interesses
empresarial, tais como, sócios, acionistas, investidores, trabalhadores, de pessoas vinculadas direta ou indiretamente a atividade
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empresarial, propiciando a preservação da empresa, sua função social economicamente, para que logrem alcançar o restabelecimento
e o estímulo à atividade econômica (BRASIL, 2019). econômico-financeiro, bem como acelerar o encerramento das
atividades de empresas inviáveis economicamente. As mudanças
Evidente é a conjuntura das decisões do Superior Tribunal de Justiça procuram adaptar a legislação à realidade econômico-social do país,
na forma de Corte uniformizadora da interpretação da legislação todavia, ainda estão distante do ideal. Resta aguardar para verificar se
federal, o que busca trazer ao princípio trabalhado a adequada a recente Lei nº 14.112, de 24 de dezembro de 2020, possui
atribuição dos julgados ao paradigma da função social da empresa. abrangência necessária e capaz de superar efetivamente ocorrências
de crise econômico-financeira.
O ano de 2020 foi árduo com crises em diversos segmentos de
mercado, impactando todas as áreas da vida e exigiu do Estado 4 Considerações finais
medidas com escopo de impulsionar a economia para assegurar a
própria subsistência das empresas. Se em dias normais o instituto da Diante o excogitado, fica claro que o princípio do impacto social da
recuperação judicial é indispensável e considerado como um salvo crise da empresa, no direito falimentar, está contemplado nas diversas
conduto às empresas, em época de pandemia pode ser a única abordagens sob a temática da recuperação de empresas, tendo seu
solução para a vida empresarial. À vista disso, foi finalizado o projeto cerne fundamental insculpido nas decisões judiciais das contendas
de lei que tramitava no Congresso Nacional durante quase quinze com esse fim.
anos e publicada em caráter de urgência a Lei nº 14.112, de 24 de
dezembro de 2020 (BRASIL, 2020), em vigor desde 23 de janeiro de Contudo, isso se dá, em alguma medida, tacitamente, uma vez que a
2021, para atualizar a legislação referente à recuperação judicial, à defesa doutrinária deste rótulo é muito tímida e a sua contribuição
recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade expressa se dá principalmente pelos ensinamentos do catedrático
empresária. Mencionada lei altera diversos artigos e inclui outros Fábio Ulhoa Coelho. De sorte sua compreensão não é menos
tantos na Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, sobretudo, na parte importante e argumentação sob seu arnês consubstancia realce fático
que versa sobre recuperação judicial e extrajudicial, com propósito de à demanda de tutela.
aumentar a proteção da atividade empresarial, concedendo amparo e
segurança jurídica mais ampla para empresas viáveis
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Subsidiariamente os caminhos deste trabalho evidenciaram que a Lei BARBOSA, Luciano Martins. A aplicação dos princípios da Lei n.
11.101/2005 no processo de recuperação judicial do Grupo OI.
nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, se constituiu verdadeiro advento
2017. 97 f. Monografia (Graduação em Direito) - Curso de Direito,
no ensejo de demandas nesta temática, compondo marco à Universidade Federal do Maranhão, São Luís, 2017. Disponível em:
http://hdl.handle.net/123456789/2041. Acesso em: dez. 2020.
legislação, em maior medida, civilista e processual, tendo sua
efetividade plenamente estabelecida. BARROSO, Luís Roberto; BARCELLOS, Ana Paula de. O Começo da
História. A Nova Interpretação Constitucional e o Papel dos Princípios
no Direito Brasileiro. Revista de Direito Administrativo, v. 232, pp.
O princípio do impacto social da crise da empresa estabelece medida 141-176, abr./jun. 2003. Disponível em:
https://doi.org/10.12660/rda.v232.2003.45690. Acesso em: nov. 2020.
juridicamente relevante no ensejo da lide e além dos destinatários
habituais de um processo neste objeto, indiretamente importa à BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.
Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil. Brasília (DF), 10 jan.
sociedade, pois o encerramento das atividades de uma empresa
2002. Disponível em:
constitui dano a um sem-número de indivíduos, tendo repercussão em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm.
Acesso em: out.-dez. 2020.
toda uma comunidade.
BRASIL. Lei n° 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a
recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da
Deste modo o princípio atua na prevenção dessas reverberações, não
sociedade empresária. Diário Oficial [da] República Federativa do
só sob a lógica da preservação da empresa e da manutenção de sua Brasil. Brasília (DF), 9 fev. 2005. Disponível em:
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os 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, 10.522, de 19 de julho de 2002,
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à recuperação judicial, à recuperação extrajudicial e à falência do
empresário e da sociedade empresária. Diário Oficial [da] República
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