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RES Alan Wood. . AS ORIGENS DA REVOLUGAO RUSSA DE 1861 A 1917 ‘vaducto de Vottereits Saves Dirge Senjamin Ascta Ju ‘samira Yousse! Campos t Proparagio de texto Ari paces Sumario lg date (ito viion Faced eisste om ine HMaroa Anton Farranses “Joss Anacelo Santana se f uteo ronoisgiso 24 cy Notnanna Mapa © mpério Russo em 1917 ° : a eoaenoa 1. Introdugao n DIE OE “eee seers 2. Autocracia e oposi¢ao B 0 regime imperial: contases e conteadicdes 13 A tradigao cevoluciondria 0 3. Reforma e reagdo a : Emandpagso ¢ reforma adminstrativa, 1861-81 24 Poputismo revoluciondtio, 1861-81 28 Retragio ¢ industializasto, 1881-1908 — 36 © 1987 wan wood Title do orginal The origins ofthe Russian Revolution 19651-1917 4. Revolugao versus constituigéo — 2 "oo 60) por Methuen 8 6 ‘ Otigens do marxismo russo a +s Fett! Lane Canon EAP EE owe = 2 i A poliica “constitucional™, 19061681 Cry f OB 5. Guerra @ revolugao 56 {2 \ ‘A Rusia na guerea, de 1914 a feveeio de 1917 56 te [A Revolu de Fevereiro e 0 “poder duplo", 1 ‘ fevereito-alho de 1917 «0 BN 85.08 09017 4 ‘A eaminho da Revotucio Bolcheviaue, » oe agosto-oulubre de 1917 ro °7 soos 9 eat oteradoe pret kuitore Aca SA. = fun Bordo 3b ius 6. Interpretagdes e concluses — m “ol (PABh) 278.022 ~ Calta Postal eee 7. Glossério de termos russos —__ 75 Ene. Felegrtico “Bomivre™ ~ Sao Paulo 8. Indicagao bibliografica ae iain bei i Eine aot sens, Quadro cronolégico | Tait Feodo de agiapto socal intiovual Fria fons eny encanta taro fcomfas eto fauna | ‘Rio ati nce ve Tatoavo co gone lecal & ay a Antes de 1861 mas. Wudicttiass to" veecvsis” | Paes ae agiacin sel © po 7 Torta de acasoinato do Nerang ie Se eit sete a roel, Miguel Rona Twa © “Tarr taneo, etanowinenio eon acon Seer woe 7 tetomos mites 18740 1875 | © movment igo paa FOS 1696-1725, Relnado de Pedro } (Pedro, 0 Grande), a pore 0 Pé Reese stare one peas pa ware Foto a sequen Zomin Toh Sia a ‘A zonipa oie So die usa bans Tae ia os estes Poa See olathe aaa | See 26 Toads Canal Catena «Gane a | vai Dias 16 aeessnads pla Raed 780 Publicagao de Viagem do S8o Petersburgo este ‘Reinad de Alexandre W@ Poste ati Fainco de Moln 182555, a = 1899 | Witla se Lorna minisiro das Financas. 7 convowinia “etiodOaaar 1368 Ag ‘eu 7 Relnade do Wictaw 1 _ sougees oa Eos | [eitssor | Rogan aa a8 Gira ds Gnd Asin dro {607060 | Eat vain na Sera perience peas ae aide de Asan Steen a ‘rane aun sumo de a Prima Congreso do Porae Fabahians femeens else Sones esi “e096 613986 ‘920 Y Primir eagho or srs funcaase 4 Pac 1815 Nicolo 03 toma comandanteemhota, tio SociatstaRevolvclondro (SF {5 rongtes rte gommne 92 Gua a0 eimiam formagas eo Bloce Progen ‘wots ‘Colpo econémica acuidades apres cater incase 316 ‘Aesessinalo de Reseuin som Pubicapao de Gve fare? oe Lin sem Segundo Conuresso do PTASD, divisto , a te menchewagues e bole : _ 7 “conna RvecoJaponesn: a Rinse 6 dene inveio vere | Groves #agiagto iil em Petiograde toda, ee 2627 db foverare | a wopas se Locusam a slat conta oo 1005 “Tumult rvotuclonério em loge @ Rusia imanitslanies: a guarnicdo “adore” 20 depois do mansarie #9 "Deming? San Sronton Genarat, 0 cxar promate uma ‘Bi ae feveweig | Forapae do Sovete dos Depuladoa dos Sonettuicto (agosto) grave geval tora . ‘apatedores de Pevograco {ga do Sovee Ge Sao Petersburg, man io paral autorsando sletgoes pars 18 do merge | Emissdo de Orden af 7,0 Sovme oe bum Estate (outubro represse0 do Paterado: conocagdo 2 legeo bara ivante de Moscou (dzemniro) atcomes oe sided 108 ‘Praia Duma Ester Sielipin se toma 200 marge | Meola Tl absiea:fomagao do prineire pilmaoministeo, ‘owerno Banas; maatcura U6 poset {unio programa de retorma dorccratca seoe afore agra do Solvrn i aie das Hootdades ove 1907 “Segunda Duma Estatar, Stolypin ‘20 abt Linin voila @ Russia; tormura as “Teves | iets tor de Abit invora "Todo poder eos Sve tes oor “Tercera Duma Esta ao Boe aves Protento conta # “nota de guera” ob ‘ai ‘Sloiypin #aasaesnad Borne Minko couse 6 pinels Govero View ‘Massacre nos campos auilteros 00 Lona eee Tovas agitagdes na incision,» SH 5 Se malo Formasio go segundo Governa Prvaario rte ce menenevigies #05 bolcaviues {Go"ccalitoy nomeccto cos minetes Stra {eels Kern rea mia dn i268 (© eacndala Rasgulin empliagto do Hato ver Sree govamo es soceaace 3G unne ‘Abertura ao Primero Cangreass dos Re frosetanes cov Tabainasoss 0 Sida sore? vara Dum staal Sow haseos. Dee TH Atwnanna oetara guewa W Rina Gide ono | Otensva na Galea c wa Snertto sumentam 2790 de agosto doe Guardaa. Vermelhos fadaea a ontava Ge gape ce Koraow setembe [Totsk @ ubestade tornase pesioente do Sonate de Petogrado, 09 Sovetes, de Petragraaa e Mosceu cbttre malora bat Shevue, Lenin revive o slogan “Todo oder boa Soviet Tae oulubie | Lenin assise & reutiao do Gomi Bolchevigue: sou epeio eI [imada @ aprovaso, 70a outubro | Primgira eugiao do Goma Wii Revo Elondo do Sonta So Petron 2425 do ooo | Operation soldados armascs, comand ‘Ses pelos Bclzneviguesw orgerizadoe pao ‘Comite Miter Revolyciondto, tomar gt fies» Instaagdes-chave er Potrograco, 7525 aa octubre | 08 minisvos do Governo ProWséxo sto fapisianads, gol bohevique snunclaco frente o segundo Congress gos Save {ioscegaontenchenges se etton 3677 de culubxo | O Congressa dog Sovieies promulga 0 Bosrete sobre a Pare.o Secreto sobre a ‘Tetra namelaopimatt govetra save, 2Cgrsa!e Bolehevque dos Comisearios aoa, som vénin como pesisonte, Fano [Ten une ao bac [pat one | Vitis manips conta Foo stance T7aayine | Oper ute nla cov. . Pek : de puto “Kerenski se tora primairoministro. Né 1d ito] Norn nomen conerniean Be 23 de juiho ‘Trotski 6 preso. a Tae ions | Ohi on anpon aaa aap 2 |) Sabeee eh its's tact 3 2 C val 0 1 Introdugao A Revolusdo Russa de 1917 ¢ sem divide 9 fato mais importance da historia politica do séeulo XX. Um observa dor contemporinco da Revoluséo, o jornalista americano Jobn Reed, deu a seu famoso relato desses acontecimentos ‘titulo de Os dee dias que abataram 0 mundo, € 0s remo- res ¢ as reverberagdes provocados pela sublevasio conti- ruam a ser registrados ainda hoje. Setents anos depois do evento (n0 momento em que escrevo), as ondas de cheque emanadas da Riissia em 1917 provocam um impacto direto 9 indireto em toda uma gama de problemas politicos, €-9- abmicos, ideoldgicas, diplomaticos e militares em todo 0 sundo. Uma avaliagao das causas, rumos e conseqiéncias dda Revolucdo Russa, portanto, 940 se restringe a uma si ples questdo de ineressehistério, mas € algo decisivo para ue se tena um entendimento adequado e bem informado do mundo politico em que vivemas, @ em que a Uniso Sovié tica — como Estado ¢ sociedade nascdos dessa Revolugio = desempenta um papel de extrema importancia Este panfleto se limita a um exame das causas e dos seumos da Revolucdo desde a emancipacio dos camponeses- servos da Russia em 1861 até a comada do poder politica pelos bolcheviques em outubro de 1917. Uma andlise das consegaéncias dessas profundas muidancas sera deixada para um Tauro estude Por que inciar © exame da Revolusio de 1917 no a0 de 1861? Nao € necessiio adotar visio marsst-leniniste da historia para que se concorde com a epini8o do proprio Lana de que as sementes da Revoluca0 foram langadas 20 solo quando da instistatéria lesslacéo que aboliv a servi ao a Rissa em 1861, O ambiguo e contraditério programe de relorna administeativa que se sega a0 Ato de Eevanct ~ paso gerou novasforeasseciais, politica intclectuas que, contudio. foram limitedas pelo rigido quadre politico de uu Estado absolute e autocratic. E uma le fsa, se mao histérea, a que nes ensina aue a forea de pressio do vapor contido ¢m um reipienerisdo, sem espago para sus expan ‘Ho, Sem qualquer estuturacléstica ou viivulas de seguranga, provocard uma exploséo € o estilhagamento desse recipient. Essa pecgosas fora ¢ presbes, tanto latentes quanto ai- yas, podiam ser conststadas por qualquer usm nas décadas que entecederam 0 ano de (917. A revolugio sempre cone tou da agenda tanto da autocracia quanto da oposic4o. Os infetectuasrussos constantemente falavam ¢ ecreviam sobre la, os atvistas se organizavam para ela, ¢ govern leislava contra ela, ¢ a8 forsas militares ¢polciais,combinadas entre si, estavam em censtante alerta para sufocésla. Mas foram 85 maasas, 0 pove TUSS0, que por fim a coneretzoU. As pagi- nas que se seguem procoram descrever ¢ analisar algunas das circunscncias objetvase alguns dos fatores subjetivos ‘que contriburam para esse proceso, criando as tenses © contradigoes dentro do Impfrio Russo que $6 poderiam set resolvdas pela revolugdo. Antes, porém, ¢necesano ident ficarelgumas das importantes caracteristicas do regime cZa- a © a5 antigas tradigbesrevoluconérias a ele opostas 2 Autocracia e oposi¢aéo © regime imperiat: cantrastes © contradicées 0 Império Russo na época da Revolugio era uma retra Ae incriveis contrasted: Era 6 maior império em terras Con tinuas do mundo. Estendendo.se da Europa Oriental até a esta do Pacifico, e do Oceano Artico até os desertos da ‘Asia Central ea fronteiras chinesss, 0 Império cobria — como Unido Soviética de hoje — uma dea quase equiva lente & um sexto das terras emersas do planeta, Nesse con- junto imperfeito de teritscios ¢ povos, contudo, enquante mais de dois tegos das certas Ficavam @ leste dos Montes Urais, nas vasias e geladas extensdes da Siberia, 0 grosso Us populagto vivia ¢ rabalhava nas provincias européias «48 Russia, Bielo-Rulssis, Ucrania, Polénia (que era entio parte imtegrame da Tmpério) © do Céucaso. © primeico sgovernante rusio a se proclamar inperador (diferenciando- s¢ do titulo de czar) fot Pedro 1 (Pedro, 0 Grande, que governou de 1696 a 1725). teinn que herdara de seus ante ceessores moscovitas do sécvlo XVII jd era de dimensoes consideriveis, ocupando grande parte da Eurdsia, mas sua maior € mais duradoura realizado seria 0 estabelecimento da presenga da Rissa como poténcia dominante no norte tno leste da Europa, como conseqinca de sua vit6ria Sobte 0s suecos na Grande Guerra do Nore (1700-2). © significado da entrada da Rissia para a Europa nao deve Ser exagerado.Igualmente poderosos foram os elttor _eipr0cos da ifludncia da Europa sobre a Russia, © prin- cipal efeito das reformas empeeendidas por Pedto foi a remodelagio da administeagdo civil © liar de seu pas segundo 0s padres europeus; outro resultado importante desas reformas Toi o fato de Pedro ter obrigado o¢ mem: bros de sua nobreza latitundiaria (dvoryanstvo) a adotarem hlbitos, modos, educayao € attudes ocidentalt. Assim, Ped ctiow uma grande divisio na gociedade ruta — ou melhor, con duas sociedades: De um ladoy hava a edu. cada e'ocientaiada d707jansi¥o, que, nos $0 anos que Se seguiram & morte de Ped, se rornou wna nabreza pre tensiosa, ociosa, possuidora de teras e servos, € gorando da maiotia, e ndo de todos, dos rivigios de uma ariso ‘rain curopéia BG out lado, havia a povs rss (harod), ‘os eamponeses transforma em servos, que contnuava 8 serimplacavelmenteexplorade3,espoliados ¢confinades, 20 meio tempo que continuayam merguthados em wm vasto lodagal de ignoelncia, milériat super _peridcica. © abisino sora e intelectual que separava nobreza do narod era uma manifestaggo da ratseza com plea © ambivaleate da celacdo entce @ Europa “moderna”? 2 Russia “atrasada”, que se conatuiy em vm grande ‘eitmotiy da Wisteria do pals durante todo o séoulo XIX. Outros exemplos da ambiglidade © da contradieao Poder ser encontrados na estrutura politica, 88 telagdes condmicas, no poderio militar e ae meso nas Tease es culturas da Rusia bs vésperas da Revolusdo, Em primero lugar, o impecadorrusto era um auto- rata absoluista. © que equivale a dizer que nie hava qualquer restrigdo legal ou consticucional 0 seu exeeisio 4 poder politic, da escolha dos ministos a funcionévios do governo, ou a formulagdo éx poltica nacional. Uma Dalavra do czar era sufeiente para altear,sapit v abo- lie qualquer fepslagdo ou instiuigdo ensente. Durante os séeulos XVIII e XIX foram feta wérias tentativas de se Dropor wm tipo de reforma consitucional que limitasse os poderes do czar, mas nenhuma delas obteve sucesso. of $6 com os dstrbiosrevoluconéros de 1908 que 0 imo azar rusio, Nicolau i (que reinou de 1894 a 1917, fl for ado 3 auiaizar a eeallzgio de cedex pare uma assem- bisa nacional convultora © Vexsatve, conhecida como Inmperial Duma Esiatal. Contudo, a despeto da retante eoncordlacia do czar com o principio de certo tipo de poltica de partcipacdo limiada, legalizagio dos partidos polices e da promulgc¢do das Leis Fundamentae, forma de governo continuava a ser a autocracie absoiuta. Em loutraspalavas, s 0 autocrat desjasse aboir a constitue {io (€ com ela'8 Duma), eno a consiulgdo 0 investiria da autordade necessria iso, Sem qualquer definigto, a nogdo de ama “utocracia consiueiona” no er imprtitvel as ambém secon abeurdo pa tio Sones 40 frase. Em termos econBmicos, a stuacko ea igualmente pro- blematica, © ateaso industeeb da Russia com relagdo.& ‘outcas potenciaseutopéias importantes ficou patente depois da derrota do pals na Guerra da Criméia (1853-6). Como. ‘sisegUénia, embora ngo de imediat, 0 governo dew ine tio a um programa inensivo de industalizasdo por vol ieada’ do séeul, conseguinde wansformat «Ril de om dos pales, menow dereivvil6s economicarnente 44 Europa, em ua das principals potas industrials 60 ‘monde, Dusene eve proceso, o pels rapidamente asumi {oda a aparéncia e substincia de urna modema economia capitalist. Pela primeira ver em sua Nistéria, a Rosia dssenvolveu ume grande forga de trabano industrial, ow prltasiad, uma classe media economicamente poderora “ de negociantes, banqueiros, advogados,fintntsase ids ‘vais Ao mesmo tempo, contedo, a grande m Populagao, cerca de 80 gor centoy ainda era constiuida or camponess organizadoscomunitariament,trabalband £ vivendo em suas vias em condiges que haviam sofido foueas mudangas desde oséculo XVI. Asé mesmo autos habitantes das cidaaes estavasn ofiialmente regisiados somo camponeses,¢ a Rissa anda era uma sociedade sus reendentementesgréra. Esa coenstncia entre ura soce~ {Gate saddernae industrial e um imenso campesinto avido or terras, cds intereses econ ha ito ran negl- fenciadss pelo govetno, consttuse em fator-chave para um entendimdivo da natureza da Revolucio de 1917.» 7 “Sanrbém vital para um entendimento dos eventos oc tidos nese ano €o-bapel dos ailtares € aqui, mais ma vez, veme-nos diane de outro paradoxo aparentc, O poder 0 pestis do Império Russo dependiam em itima instan- Cia do poder de suas forges armadas. O exrcto £080 era 4 mai forga militar do mundo e era aiizada ado apenas ‘es campanhas militares no exterior mas também na manu. tengdo dl ordem icerna e a cepressdo dos distirbios cvs cue ameagavam 3 establidade Go regime. Apés a drzota russa na Criméia, houve uma sétie de relormas stares, radicals, principlmente durante a dévada de 1870, com 0 objetivo de reorganizar e reeuipar as Forgas arradas do pals de acordo com as madera tdnicas belieas, Entre favo, eas mudancasfizram com que OS Fuss supeces- imassem suas forga, © um novo desaste militar acontceu, clea feta diane do Japdo, durante a guerra de 9045. © poderoro Império Russo fot decotedo por ur pais aitica Felaivamente poqueno que, contudo, hivia-se modecnds de manera mais Dem-stcedil e eficiente que seu enorme “nino, apareatemente mais podetoso. As previses quanto 20 envolvimento da Rissia ma Petra Guerra Mundial ‘tam, portanto, pouco auspiciosas, Se 0 desastroso empe- tho de pals nese cont ito preiptou ov ndo a Revolusao de 1917 € uma quest2o que discutizemos mais adiante, mas © paradoxo & claro: de wm lado, uma grande poteneia impe tial que ainda contava com formidveis recursos mitre, 4, de outro, um exército que patecia cada vez mais incapaz 4 desempenhar suas fung6es, seja a vitéria em batalhas seja a contencdo das desordens civis internas ‘Também cultural ¢ intefectualmente; a Russia de Nico- fay {1 era um pals que apresentava ao tundo das. diferentes. As cerca de duas décadas que antecederamm 1917 {iy sido deseritas como a “dade de Praca” da cultura rassa, a “renascenga russa” € outras expressées similares ue enfatizam a natureza inovadora e alta qualidade esté- tica ae suas sesizagdes artisticas e Uterévias. Realmente, muitos poetas, pintores ¢ musicos russos fenmavam a van- guarda da cultura europtia contemporines. As peeas ¢ os contos de Anton Tehekhoy ¢ Maximo Gorki, 2 poesia de Alexandre Blok © a escola simbolista, a musica de Scriabin, Stravinski e Prokofiev, as téenieas dramdticas pioneiras de Stanislavski e Meyerhold, © as idéias filossfico-religiosas de Berdyaev ¢ Rozanov foram todas caracterisicas dessa epoca de intensaatvidade culoeal. Suasreaizagdes si0 ine- aveis mas sem divida se destinavam 3s clases Supertones ceducadas e a elise intelectual. Pelos padedes ocidentais con- ‘tempordneos, os niveis de educaeao ¢_alfabetizacao, da. Povo russo eram constrangedorament® baixog A maioria| dos camponeses éra anaifabetae, de qualquer modo, eles tinkam problemas eotidianos de sobrevivéncia muito mais ‘urgeates do que aprender a ler e escreyer. Havia pouco lirismd ou belera na vida das massas,© paca muitos pacecia que as elegantes produgdes da Invelligentsl eram resultados de wma omissdo diame da responsabilidade moraf com rela do a0 ove cusso. Mais uma ver estamos diante de uma contradieo: um pals cajas brilhantes ealzagSes aristicas e lterdrias colocavam-no na vanguarda européia, mas cuja opulacio, em sua maiotiayynio conseguia lee Ou escrever sua propria lingua ee Bee ‘Outro fator confitante a ser considersdo na avatiag2o das condinses.da. Impéria Russo as vésperas da Revoligéo & a composicio étnica de sus populaci9. Em 1917, de uma populagda taial de 163 milhdes, oF russos s6 formavam 40 por cent, O restante era composto por uma massa enorme g hecrorénen de minors nacional que fava mips Tinguas e variavam em muito quanto'ao nimero de compo- hentes ¢ 20 nivel de eviliago, Durante toda a hisdria Go Inpro, estas minorias haviam periodicamente expressido seu descontentamento quanto & sua condigao de vassalot ¢ A continuidade da dominacdo russe. Esse descontentamento se manifestava de vérias formas, indo do protesto indivi- dual ¢ da desobediéncia civil a insurteigdes nacioneis arma das ¢ em grande escala que exiiam separacdo e autonomia Tais revoltas eram sempre impiedosamente sufocadas. AS insureigdes polonesas de 1830 e 1863, por exemplo, foram sequidas de execug6es e pelo exlio permanente de patriotas poloneses na Sibéria, Das outras nscioralidades, ox judeus ‘em particular sofreram uma variedade de restrgdes no tocante, A habitacdo, educagio, oportunidades profissionaise ativ des econémicas. Também foram vitimas de campanhas cole tivas de violnda, inctndios premeditados, saques ¢ estupros ~ 06 Famosos pograms —, que eram desenvolvidos com a) ‘GOhvencia do governo’»Além da Poldnia © do “tersterio| judea, 6 Seitimentos ants-russos grassavam pot todo 0 Impétio, e entre as forcas centrifegas que impeliam 0 regime cearista em direrdo a seu colapso fina os movimentos pela independéncia nacional dos povos néo ressos coasttulam ‘um elemento de forte carga emocional ¢ extreme vigor. [| © Império Russo do comeso do séeulo XX, portato, “) | Jeoneinia ume misturg exsemamente lit de siqueea asien: |siva e dolorosa pobreza, de forca e fraqueza, de atraso ¢ | moderidade, de despotismo ¢ uma urgente exigdncia de 7s, Por toda parte, conviviara exemplos de barba- eTisticago, de tecnologia e téenicas primitivas, de esclarocimento ¢ ignorincia, de tadieSes europa ¢ asi ica. claro que essa no & uma situagéo historicameate peculiar & Russia, pois na verdade pode ser encontrada em muitas sociedades subdesenvolvidas e em desenvolvimento de todo o mundo de hoje. Entretanto, os fortes contrates « contradigdesexistentes na Russia do perlodo inter-revolu- siondrig due vai de 1905 a 1917 levaram o grande eseritor ‘ussorLelo Tolstoi a observar com ionia que a Russia ray 0 unico pais do mundo em ave Géngis-Khan desfruta do uso do telefone™ A tradicéio revolucionéria AA dinastia Romafiov, que foi destruida pela Revolusdo de 1917, teve origem durante um periode de 25 anos de 2: aso cevolucionéria que sacudiy a Rissia na virada do séeulo XVI e é tradicionalmente conhecido como o "Tempo das Dificuldades” (1584-1613), A escolha de Miguel Roma ‘oY como novo ezar em 1613, apesar de resolver o problema Politico imediato, néo ofececia qualquer soludo Facil para 4s continuas dificuldades sociais e econémicas do pals, © (0 meados do século XVII foram rarcados por muitos d- Linbios, motins, rebeiges e cismas reigiosos: por iso. 0 historiader russo Klyuchevski charaouw ene *periodo de “Tempo da Revolta’”. Desde seus inicio, portano, 0 n0¥0, regime foi ameagado por uma série de desafios poteicil ymente revoluciondrios & sua autoridade que acabou par extabelecer um modelo para os proximos trés seculos. de avtoctacia ¢ oposicao, ‘A maioria dessas primeires desordens era elementar, selvagem, andrquica e ndo drigida para qualquer propasite Politico especifico. Nao eram particularmente diigidas con- {a0 czar ou, mais precisamente, contra a autocracia como insttuigdo. Na verdade, crs earacterfstico de muitos movi- ‘mentos populares dos siculos XVII e XVIII 0 fato de serem comendados yor um pretendente a0 trono, am impostor ‘pe afirmava ser 0 verdadeito czar © promeia restaurar os a — direitos do povo e dar fim a seus sofrimentos. © reinado de terror de Pedro, 0 Grande, provocou uma grande resis tincia popular que, em seu todo, ele conseguiu conter, embora lancando mao de uma série de represses brutais. 0 fato de ele nio ter apontado um sucessor antes de sua morte em 1725 deu inicio a um periodo de confusto poll tica que 6 por vezes denominado a “Era das Revolugées Palacianss". Entretanto, a répida sucessio de personagens rmedlocres que ocuparam 0 trono rasso entre 1725 ¢ 1762 ndo teve qualquer implicacdo revoluciondria para o Pstado fou 2 Sociedade russa, Tratava-se apenas da mudanca de ‘um monarea para outro como mera figura de proa de um ou outra facjdo, panela ou favorito da corte. Entretanto, ‘uma coisa fol demonstrada por essas “revolugBes palaciax nas”, ou seja, a importincia de se preservar a lealdade dos ‘anigos militares, particularmente dos regimentos da guard palaciana, que aimiide surgiam no papel de ‘fazedores de soberanos”, Essa ttadigao de goipes militares, originada no séeulo XVIII, e © papel decsivo desempenhado pelos militares em tempos de crise politica sero por nds nova- mente abordedos mais adiante Uma das mais significativas dessas conspiragdes pala- cianas foi a de 1762, que resultou na ascensio ao trono da, imperatriz Catarina I (Catarina, a Grande). Foi durante seu longo reinado (1762.96) que ocorreram dois eventos fe extrema importancia, cada um deles sepresentando uma direcdo importante no desenvolvimento do movimento revo- luciondrio durante o séeulo e meio seguinte. O primeira eles foi 2 grande revolta dos cossacos © camponeses, comandada pelo pretendente Emelyan Pugachev entre 1773 © 1775. Por sua extensio geografica, seu apoio numérico, pelo alcance de seu apelo popular e pela grande variedade de seus partcipantes — eossacos, religiosos cismaticos, ope 1r4ri0s, membros de tribos e camponeses — a rebeido Paga- chev Fepresentou a mais siria ameaga a estabilidade do Estado russ desde o Tempo das Dificuldades, Por fim, a revolta foi esmagada, 0 corpo de seu lider, esquartejado, une insets suceso de excites € repent ft ts reveluconin ae mas tae ancien nes itua peo arottaiteo cet areas Se Pugchey ft « prone ta elt ropalah 9 caso de Alexandre Radishchey (1749-1802}-resume“o. tore ue ina asm propose mace ee Tord Rss de Clee oo sae ise nae ‘age inulado Vege de So Poorbane ae 1 Sates Hee por ss aac ces to Dem Come pour dere ok Reads ere hmanor da iedade nal sa oes Dombe eae poli, Rudstehey ft ea Ween tou milan; por fn evotucosdne. aguante or {ts poptle coreenlads por Page cok aaten ae Sata resend por Recneke eomencara ute Portia il do Sta RX nalecrnedcep need nisin tiesto sates mn coubeneae ar aoe Pergo someon quo, 4 elote dias ae tou a orden sociopolitica czarista, da qual. amboseram medion dria Continua opto ncaa cone ees a ites d gale mii ma dante panceaeis a ue reinow de 1801 4 1825, preciptow os planos de um fnupo altamente educado, mas de patente médi de ofciais {do exército; estes planos consstiam em ee estabelecer um pulsch militar que derrubaria a autocracia © introduziia ‘um tipo de monarguia consttucional ou até mesmo uma forma de governo tepublicano. A rebelita fot facilmente sufocsda; cinco de seas lideres foram enforcados € mais de 100 outros, sentenciados a0 exiio na Sibéria. A princ- pal razio de a revolusao ndo ter acontecido- foto fara de ima situaedo revoluciondria, Quando os Decem- ecidiram tomar as ruas no havia' i Badd Te femergisicia nacional’ mas apenas uma peauena desavenca, ‘com relagdo & sucessio imperial. Tampoueo bavia uma erie evonémica, ima ameaga externa, uny desartanjo na ordem ‘éeial ou uma agitagto popular; na verdade, nenhuma das circunstincias abjetivas que normalmente ‘se constituem em pré-requistos de uma revslugio bem-sucedida se fazia presente, come aconteceu depois em 1997. Mas, apesar de ter falnado — talvez porque tena falhado —, a Revolts Decembrista pode ser realmente considerada como o inicio do movimento revoluciondrio do século XIX. Seus mem- bros patsaram a ser reverenciadas como marie, ¢ 0s ide- ais ¢ 0 exemple desses “nobres revolucionérios™ continua am a inspirar as geracdes seguintes de reformadores, radi- cals ¢ eevolucionérios. ‘0 reinado do novo czar, Nicolau I, que governou de 1825 a 1835, tem sido deserito come "‘o apopeu do abso tismo", Mas, adespeiio da natureza reacionaa, ltarista ‘ obscurantista de seu governo, este também conheceu uma atividade jatelectual extremamente vigorosa, da qual uma ‘das mais importantes manifestagSes foi o assim chamado debate ““Eslav6filo-Ocidentalista”” durante a década de 1840, Simplificando, os Ocidentalistas eram intelectuais que acreditavam que a resposta para os problemas russ devia ser buscada no exemplo da civilzacdo européia oci dental. Bram objetos panticulares de sua admiracdo as tra digdes ocidentais de um governo consttecional, do cespeto ~ 2 pelas les € o individuo, da filosofia racional ¢ d& predomi- hnéncia da tei Ntguns dos Ocidentalisas mais radicais tar. ‘bém foram influenciados peics pensadores socialistas fran- ceses contempordneos ¢ pelas teorias do Fiécofo alemao Hegel, todos descritos por um importante Ocideatalista como a “algebra da revolugio". Rebelando-se instintiva- mente contra a erueza da realidade russa conterspordnea, 5 Ocidentalistasradieais da década de 1840 comegaram a pensar na cevoluedo como a unica forma de uma mudanga essa realidade para melhor. Por outro lado, os Eslavsfilos afirmavam que 0 que havia de errado com a Russia de Nicolau | devia ser identi- Ficado na jé excessiva europeizacdo, na evorme burocracia © 20 rompimento com aquilo que cles acreditavam set a ‘harmonia tradicional da sociedade russa. Tomando como onto de partida de sua filosofia as tradicdes ¢ of ensina mentos da Igreja Ortodoxa Russa, os Eslavéfilos achavara que a futura grandeza da Rissa estava no retorno das vir ‘des imagingrias de seu passado moseovita, Todos falavam da decadéncia © da “‘podridio" da moderna civilizacio européia ¢ cerastavam-nas com as imaculades virtudes| ‘ortodoro-cristés do campesinato rasso. Acima de tudo, cles apresentavam a organizacao coletiva a comuna cam- pponesa tradicional (a obshchina) como prova da inerente superioridade moral e social do povo russo com relagio ‘0 individualism, & competitividade a0 egocentrisma divisor da sociedade do nomem europeu. Nao € preciso exagerar 0 impacto da controvérsia centre Ocidentalstas ¢ Eslavéfilos na Tutura historia intelec- tual, ¢ aié mesmo politica, da Russia. Muitae das posterio- 5 disputas e divisbes entre os intelectuas rusos, entre dfe Fentes facg0es, escolas de pensamento € partidos politicos, Dodem ser analisadas em cermos dos que buscavam 0 que. acteditavam ser uma solugio racional, Iégica e universal para os problemas da Russia e dos que defendiar o respeito Dela idiossincrasias das préprias tradigdes cultura e socials dda Russia, 3 Reforma e reacdo Emancipagio @ reforma administrotiva, 1861-81 ‘A emancipasdo dos servos vem sida deserta tanto como o “mais importante ato leisativo de toda a historia da Russia” quanto como “indigna do papel em que foi escrita”. Nao vale a pena nos determos na polémica sobre a raz5es que levaram 0 governo a tomar essa decisio. O {que n9s interessa so as condlgdes € conseqilncias desse sto, Contudo, ¢ importante Jembrar, sinda que de forma sucinta, que Alexandre I (feinando de 185S a 1881) ndo aboliu sxviddo em consegincia de um desejo aliruista de melhorar a sorte do narod russo. Mais que a flantrapia, foi o meda que o forgow a embarear num processo visto, epois da derrota na Criméia, como essencial & sobreviven cia econdmiea e politica do Império. A meméria das hor- das de Pugachev ainda atormentava Alexandre quando este Geclarou em 1836 que, se a servidao tinha que ser abolida, ““e melhor que seja abolida a parte de clma, © nfo esperar ‘que sua autoliberasto parta de baixo". ‘Considetemos as caracteristicas exserciais desse com- plexo ato juridice. Em primeiro lugar, foi dada aos servos sua liberdade téenica ¢ legal, ou sea, eles no erasn mais propriedade privada de seus mestres ¢ estavam livees para, negociar, se casar, pleitear © adquirir propriedades. Em. segundo lugar, depois de um periodo de “‘obrigacdo tempo- riria’, durante o qual continuavam @ desempenhar algu- sas das obrigagdes pertinentes & sua antiga condigao de servos, deviam comesar @ fazer uma série de ‘pagamentos ‘ompensatérios™ 20 governo pelos lotes de terra que Ines foram destinados; esses lotes eram desmernbrados da pro- priedade de seus antigos amos. O alto nivel desses pagamen- tos compensatoros, finado em 6 por cento de juros por tum periodo de 49 anos, significava que 0s camponteses eran foryados a pagar um prego por suas terras muito acima do valor correate de mercado, ¢representava uma compen: Sato disimslaa” & choryonsivo pla peda do trabalho ‘Qutca caracteristca importante desse ato legislative cera o fate de os camponeses,embora livres, ainda continua cem organizados ¢ legalmente ligados a vila de sua comun, (ou obshchina, Tanto a iperdace quanto a terra que recebe- ram thes eram atribuldas nao de maneira individual, mas coletiva. A comuna exereia amplos poderes econdmicos € ‘entijuridicos sobre seus membros. Os impostos, 06 asa rmentos compensat6rios e outras obrigagdes eratn recolhi «dos e pagos comunalmente; em areas onde a terra era perio dicamente redistribulda entre 03 camponeses, em ver de ‘ransmitida por herang@, a olshchina era responsével pela ‘edistribuigdo dos lots entre as familias da comuna; nenhun ‘eamponés podia deixar a comara sem permissa0 dos ancitos 4a vila; © a comuna tinha 0 poder de exlar seus membros Indesejaveis para a Sibéria. Os camponeses ainda estavam sujetos ao castigo corporal, 20 recrutamiento militar, a0 pagamento de impostos individuais a certas outras obvi ‘es de que outras classes sociis eram isentas. Em outras palavras, © compesinato ndo gozava do mesino status que 6 outras classes da sociedade russa, Constituia mais uma “casta’" em separado, com suas proprias estrvturas inter: ras, procedimentos, les e arranjos econdmicos. Além disso, fa manutenglo da obshchina como inatituigéo oficial, ape. sat de firmemente enraizada na tradigao russa, significava, ‘que 0 camponés havia simplesmente trocado @ submissio a zeu amo pela submissio a comuna, A falta de invest- mento de capital, as periédicas redistribuipdes de terras, ‘05 métodos agricolas primitives, os danosos encargos finan ceiros ¢ os impedimentos & mobilidade garantiam que 0 setor agricola da economia russa pecmaneceria mais ou menos estagnado nos préximos 40 anos. Tambérm em ter ‘mos de protesto popular, © campo permancocu inere durante ‘ste periodo, embora as Gbvias iniquidades e as dificulda- des exondmicas impostas pelos estatucos de emancipagao fenham sido mais tarde postes cm evidéncia de mancira

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