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© Editora Sinodal, 1994 Caixa Postal 11 93001-970 - Sto LeopoldoiRS Tel.: (51) 3037-2366 editora@editorasinodal.com.br www.editorasinodal.com.br Produgio editorial: Editora Sinodal Produgao grifica: Editora Sinodal Publicado s0b a coordenaglo do Fundo de Publicagdes Teolbgicas/Programa de Pos- Graduagao em Teologia da Faculdades EST. Tel (51) 2111 1400 est@estedu.br Fax: (51) 2111 1411 wwwestedubr ~ Brasil Catalogagdo na Publicagio Bibliotecaria Responsivel: Cristina Troller CRB10/1430 K3in KIRST, Nelson ‘Nossa Liturgia ~ das origens até hoje / Nelson Kirst ~ 3* ed. Rev. ~ Siio Leopoldo, RS: Sinodal, 2003. — (Série Colmeia~ Fasciculo 1) 689, ISBN 85-233.0608-0 ISBN Série 85-2334 -6 1. Liturgia. 2. Teologia Prétia I cDD - 264 CDU-264 {indie para catlogo sistemitico 1. Liturgia ~ Teologia Pritica 2. Teologia Pritica ~ Liturgia Prefacio Ao apresentar o Prontuirio Celebrages do Povo de Deus, em 1991, o Presidente da TECLB fez referéncia aos “ensaios {de renovagaio] da nosse liturgia” como possibilidade de abrir “tesouros ocultos no campo que estamos por lavrar” (p. 5). Encontrar tesouros ocultos, ‘em campos por lavrar! Para auxiliar as comunidades nessa tarefa, foram langados, em 1993 © 1994, os ccademnos da Série Colmeia, os Fasciculos 1 e 2, frutos da dedicagao carinhosa, atenta ¢ didatica do pastor e professor Dr. Nelson Kirst. Na mesma época, surgiu e se espalhou trabalho com as equipes de liturgia. O que se percebe, depois de “garimpar” e “lavrar™ no ‘campo da liturgia por um periodo de aproximadamente oito anos? Renovagto litirgica esti na pauta de um niimero sempre maior de comunidades da IECLB. Elementos da liurgia e 0 culto todo so descobertos, redescobertos e assumidos ‘como tesouros preciosos. Em consequéncia disso, os cultos so cada vez mais alegres, ‘mais participativos, mais envolventes, mais significativos. A vida das pessoas ~ com sua dores e esperangas ~ ganha lugar no encontro entre Deus e sua comunidade. E Deus est cconseguindo falar e se fazer sentir com mais proximidade, [Nessa tarefi proposta de lavrar o campo da liturgia e garimpar os tesouros ocultos, conceitos sio ampliados, aspectos novos slo acrescidos ¢ até, em alguns casos, definigdes slo revistas. Bis os motivos que ensejam a apresentagio de uma edicao revista e atualizada da Série Colmeia, Esses cademos ocuparam um lugar de destaque na caminhada de renovagdo feita até aqui. A nova edigdo indica que os mesmos serdo ferramenta necessiria ros passos dados daqui para frente. P. Dr: Romeu Ruben Martini Coordenador do Consetho de Liturgia da IECLB Unidade 1 O que é culto? (Antes de ini © estudo, com esta unidade, ¢ importante ler "Apresentagdo da Sie Colmeia" € "Como uliza este fcc") Bem, até aqui ji tivemos muita introdugo. Agora, na Unidade 1, podemos ir dito ao assunto. E, para inicio de conversa, preci- ‘Samos clarear algumas palavras. Pode ser que, quando utilizamos a palavra “culto” ou “liturgia”, vooés e eu nao estejamos imaginando cexalamente a mesma coisa. F ai a gente nfo vai se entender. Entlo, antes de mais nada, temos que chegar a um acordo sobre aquilo que pensamos quando empregamos essas duas palavras, Na verdade, hi muitas maneiras de se descrever o que & culto e 0 que é liturgia, Para 0 nosso uso conjunto, vou propor ‘que a gente entenda esses termos assim: culto € 0 encontro da comunidade com Deus liturgia — €oconjunto de elementos e formas através dos quais se realiza esse cencontro ‘Vamos trocar isso em miido, Culto ¢ o encontro da comunidade com Deus. Entio, nds te- mos ai dois parceiros, ¢ esses dois parceiros se encontram numa certa hora e num certo lugar. Vamos olhar mais de perto para cesses dois parceiros. Eles nilo so qualquer um. So parceiros ‘muito especiais: de um lado, Deus; de outro, # comunidade. Quem geste Deus que ver a se encontrar com a comunida- de no culto? Este Deus € 0 pai ea mac da comunidade, Ou, para usar palavras um pouco"mais complicadas: ele & a propria rizio de ser da comunidade, a fonte da sua existéncia, Esse Deus & quem gerou fez nascera comunidade. Ele chamou pessoas, ado- tou pessoas como suas fihas e seus filhos, através do Batismo. E foi dai que surgu a comunidade. Nao foxse Deus 0 seu cha- mado, nfo haveria comunidade. Entto, esse um dos parceiros Que entendemos por “eulto” e “liturgia”? Culto éencontro da comunidade com Deus Quem é este Deus? E quem gerou efecnascer a ‘comunidade Quem éa ‘comunidade? um corpo viva, em Cristo A comunidade pode ser comparada @ ‘uma grande familia Oencontro no culto acontece por vontade e iniciativa de Deus O-encontro no culto 4 possivel porque Deus se eoloca & disposicito E quem € @ comunidade que se retine ai para se encon- trar com Deus, a fonte de sua existéneia? E uma comunhio de pessoas. Nio é um amontoado de gente que se retine por acaso, assim como 0 amontoado de pessoas que, por exemplo, eruzam umas pelas outras numa rodovisra, na hora de maior movimento. ‘A comunidade é um corpo vivo, como diz Paulo em Rm 12.5: “somos um s6 corpo em Cristo e membros uns dos outros”. ‘Também podemos comparar a comunidade reunida em culto a uma grande familia, ‘Como a maioria das familias, a comunidad tem muitas co sas em comum: um passado conjunto; uma historia, tradigtes, ‘costumes comuns; um jeito mais ou menos parecido de fazer as ‘coisas, de celebrar 0s momentos importantes da vida; uma certa ‘maneita de ser, de pensar, de se comunicar, Bem, esses sdo os dois parceiros. E esses dois parceiros de cencontro ndo sao iguais. Ha uma diferenga infinita entre eles. O eencontro no eulto ndo acontece por vontade ou por iniciativa da comunidade. O éncontro no culto acontece s6 por vontade ¢ ini- Ciativa de Deus. Esse encontro, no culto, ndo é uma coisa que a comunidade pode exigir ou convocar por sua propria autoridade, Oeencontro no culto $6 se toma possivel porque Deus ‘© permite c porque Deus o ordenou, Nio é a comunidade que convoca Deus para um encontro ‘no culto, Bem pelo contrario, & Deus que se coloca a disposigio para 0 encontro com a comunidade no culto, Assim, podemos dizer que 0 fundamento de todo culto cristo é aquela palavra de Jesus que encontramos em Mateus 18.20: Porque onde estiverem dois ou trés reunidos em meu nome, ali estou no meio deles. Nenhum de nds jamais é eapaz de uma atitude como essa. Deus nao indica o monte mais alto ou o lugar mais dificil de se alcangar, Deus no determina épocas e horirios impossiveis para set achado. Ele nos di uma fantistica liberdade e se coloca nas nnossas mios, ao dizer: Voeés podem se reunir onde quiserem, quando quiserem. Basta que estejam dois ou trés reunides em meu nome, é $6 chamar © meu nome, que eu vou comparecer. E por iso, 86 por isso, que uma comunidade crstt pode marcat um horiio ¢ um lugar de cult e confiar que Deus vai estar a para o enconto, Entio, esti claro: o encontro com Deus no culto & possivel no porque a comunidade quer, mas porque Deus permite, Mas isso nilo & tudo. O encontro da comunidade com Deus no culto ndo acontece $6 porque Deus permite. Ele acontece, ‘também, porque Deus assim ordenou. Como lemos em 1 Corintios 11.24 € 25: ‘quando Jesus esteve reunido com seus diseipulos para altima ceia, ele determinou que continuassem a ce- lebrar aquele ato: “fazei isto em memoria de mim”. Entlo, celebrar a Ceia ~ 0 que para a primeira comunidade dos cristios era o mesmo que eelebrar culto ~ ndio é uma coisa ‘que a comunidade cristt pode fazer ou deixar de fazer. Celebrar 0 cencontro com Deus no culto é uma coisa que a comunidade crit tem que fazer, cumprindo uma ordem de Jesus. Deus no apenas permite que a comunidade se reiina com ‘le. Deus também ordena que a comunidade se rena com ele = porque Deus permite = €porque Deus ‘ordenow Cetebrar eatto & obedecer a uma ‘ordem de Jesus 13 Consequéncias: Como membro da comunidad, eu son responsével Ocutto éde responsabilidade da comunidade toda E isso tem uma consequéncia muito importante para cada pessoa que se diz crista. Para a pessoa que ¢ crist, ir a0 culto ndo é simplesmente questo de gosto, de boa disposigo. Nao & questo de dizer: Ah, hoje estou com vontade de ir ao eulto. Ou: Ah, hoje nfo, esté tio bom aqui na cama, nfo vou! ‘A questi de “ir ao culto ou no” se coloca de forma dife- rente. Ela se coloca assim: Deus ordenou & sua cormunidade que se encontre com ele no culto, Eu sou membro dessa comunidad. Portanto, eu sou responsive! para que essa comunidade se retina com Deus no horirio e no local marcados pela comunidade, Mais, ‘como cristl ou cristo e como ‘eu sou responsivel para que a pare ¢ realize um bom encontro com Deus. Com isso, chegamos a um ponto crucial: O encontro da co- ‘munidade com Deus no culto nao € simplesmente da responsabi Jidade do pastor ou da pastora. O encontro da comunidade com Deus no eulto é da responsabilidade da comunidade toda ¢ de cada uma das pessoas que fazem parte dela, Podemos resumir isso assim: ‘© culto nao € do pastor ou da pastora; 0 culto é da co- ‘munidade; io so as pessoas da comunidad que ajudam o pastor ‘ow a pastora a celebrar culto; € 0 pastor ow a pastora que ajuda a comunidade a ce- lebrar cult. ‘Voce, que fez parte da sua comunidade, vooe é uma das pes- seas responsiveis para que, na horae no local indicados, aconte- ‘92 um encontro significativo da sua comunidade com Deus. Essa uma enorme responsabilidade de cada comunidade e de cada pessoa cist. E esta série de estudos sobre liturgia quer ajudar ‘ocd e sua comunidade a cumpriem com essa frets, Unidade 2 O que é liturgia? Até aqui, tentamos desdobrar um pouco 0 que significa cul- to. Agora vamos ver 0 que quer dizer liturgia, Para comegar, vejamos 0 seguinte: O que acontece quando dois parceiros se encontram? Eles se comunicam, eles trocam rmensagens, Essas mensagens podem articularse através de palavras, ‘iio mensagens verbais. Por exemplo: “Oi, como vai? Mas que bom te ver de novo!” ~ “Olha, eu recebi ontem a plantinha que vocé me mandou. Esti uma beieza! Parabéns! Vocé é uma étima Jardineira, E eu fico muito agradecida.” ~ “Pai, seri que vood Podia me dar uma ajudazinha?” Reparem que nesses palavras encontramos: saudaso, agra: ‘lecimento, lowvore um pedido. Eas mensagens também podem articularse sem o emprego de palavras, s6 com o olhar ou com gestos. Sto mensagens nfo- verbais Por exemplo: um soriso amavel, um grito de alegra, um thar fulminante, um abrago, um tapinha nas costes Da mesma forma, Tio culo acontece uma toca de mensagens verbals © nilo verbais entre os dois parceiros, entre a comunida- dee Deus. Antes de prosseguitmos, proponho neste ponto ds leitoras e Ieitores 0 seguinte xeric fazer uma lst de mensagens verbs nto verbais que sie trocada ‘entre comunidade e Ded no culo. Sugiro que fomem tempo para esse exercicio~ pelo menos une 20 230, minutos. rimeio, fam anotagdesiviualmente Depis comparti- Them seus apontarsents. Por im, coloquem uma ist no gue on sect sobre aque desc, 0 que é tiurgia? ‘Quando dots perceiros se encontram, hi una ‘roca de mensagens verbaise ndo verbais Assim, também. ‘no culto Dewsea comunidade trocam ‘mensagens verbuis ¢ Indo verbais através de “elementos ¢ Jormas” luirgicos Liturgiaé um conjunto de elementos e formas Porque “conjunto”? Liturgia &0 todo Liturgla é como Tem partes imprescindivels partes itis Feito isso, podemos prosseguir, Na sua lista, vocés provavelmente mencionaram boa parte dos “elementos e formas” que comptem a liturgia, tais como: leitura biblica, prédica, louvor, confissdo de fé, gesto da béngto, Jjuntar as maos, inclinar a cabesa e outros, Podemos dizer que Titurgia ¢ um conjunto de “elementos ¢ formas Ao falarmos de conjunte, estamos dizendo que a liturgia nao é um amontoado desordenado de “elementos e formas”. Ao contririo, ela é um todo, inteiro, ordenado, organizado. Ela tem um estrutura tem partes que se encaixam ordenadamente den- tro dessa estrutura, Isso também significa que liturgia nto é ~ como muitos pen- sam — apenas aquele pedago do culto que vem antes da prédica, Liturgia & 0 todo dos “elementos ¢ formas” do culto. A prédica, portanto, € um dos elementos da liturgia, assim como a oraga0 de intercessdo ou a confisstio de fé, A prédica é uma parte da liturgia. Para entender melhor que a Titurgia & um eonjunto de ele ‘mentos ¢ formas, a gente pode compari-la a uma casa. ‘Uma casa ¢ composta de diversas dependéncias. Ha certas ‘dependéncias que ndo podem faltar numa casa por exemplo, cozinha ou o dormitéio. Usando uma palavra mais dificil, pode- 'mos dizer que essas partes da casa sto impreseindiveis. Ili ou- tras partes que sio itis, sem ser imprescindiveis; por exemplo, asala de estar, a sala de janta ow a varanda. Essas partes da casa ‘io so imprescindiveis. Elas s2o apenas tteis, e podem faltar, ‘Sem que a casa deine de ser uma casa. ‘Assim, também a liturgia tem partes imprescindiveis, {que nunea podem faltar, e partes que sio titeis, mas podem faltar num cult, Na comparagdo da liturgia com uma casa também se apren- de alguma coisa sobre a disposigo das diversas partes dentro do Conjunto. A entrada de uma casa geralmente vai ser pela sala de estar, ou perto da sala de estar € no pela cozinha ou pelo dormi- trio. Por outro lado, o banheito pode estar entre o dormitério e a sala ou entre o dormitério e a cozinha, ea sala de estar pode estar do lado esquerdo ou do lado direito da entrada, Assim, também na liturgia hd certas partes que tém seu li gar fixo; por exemplo, o canto de entrada $6 pode estar no inicio do culto e a interpretagto da Palavra s6 pode vir depois das lei- turas biblicas. Quanto a outras partes, hi uma cert liberdade na sua colocagdo. Finalmente, hi muita liberdade na maneira como so feitas as diversas pegas de uma casa. Hi liberdade quanto a0 material, as cores, as cortinas, a decoragao, Assim, também hi muita liber- dade quanto a forma da liturgia, isto é, quanto a mancira ou a0 estilo de se realizar as partes da liturgia: por exemplo, a maneira de se fazer a oragao de intereessio ou a distribuigdo da Ceia. Facer liturgia é moldar liturgia E moldé-la de tal maneira, que ela possbilite o melhor en- contro possivel entre Deus © a comunidad. ‘A maneira de moldarmos a liturgia vai depender ~ do motivo especial da celebragio, do lugar onde ela se realizar, ~ do tempo que temos & disposigio € ~ das pessoas que vio participar. Ao moldarmos a liturgia, vamos respeitar as partes impres- Cindiveis cos seus lugares, ¢ vamos usar de flexibilidade e criati- vvidade na utilizagao das partes Gteis eno jeito de fazer as coisas, ‘Mas, para sermos apazes de moldarliturgia dessa maneira, precisamos ter algum conhecimento de causa Por isso, nas unidades que seguem, neste fasciculo, vamos tentar descobrir, entre outras coisas: como comegou a liturgia’ ‘como era ela bem nas ongens da igreja?, como surgiram e o que A lsposigao das partes Ha tiberdade quanto 4 maneira ou ao ‘estilo de se realizar 4s partes Como moldar Tiuurgia? E preciso ter conhecimento de 0 que vamos ‘entar descobrie ‘nas unidades que ‘segue ificam as diversas partes da liturgia?, como & que aliturgia foi se desenvolvendo através dos tempos? E, para facilitar inicio dessa caminhada, proponho a vocés © seguinte exerci: Auntem um certo mimero de lturpas diferentes © procurem come Baré-lns entre si com a Liturla de Lima, que se oncoatns vo ban) este fascia, Unidade 4 A liturgia das primeiras comunidades Na unidade anterior fizemos uma pequena introdugo a hi ‘ria © as fontes do culto cristo. Agora, vamos dircto ao assunto. ‘como era aliturgia mais antiga de que se tem noticia? O culto eristdo pode ser visto como um rio com duas verten- tes principais. A primeira vertente & encontrada logo nos inicios da primeira comunidade crist2, que surgiu em Pentecostes. ‘Sugiro, neste ponto, um xeric: ler em conjunto todo o capitulo de Atos 2. Com essa leitura, vocés semtirio como se eriow aquela co- munidade que se tomou o vente onde foi gerada a larga erst de todos os tempos. ‘Ao descrever a vida da comunidade cristd primitiva, At 2.42-47 menciona duas vezes 0 “partir do pao”. Fsse partir do plo é nada mais e nada menos que aquele ato litirgico que logo veioa ser chamado Ceia do Senhor ou Eucaristia (e que em nosso ‘meio geralmente denominamos Santa Ceia) Nas origens,o rito da Eucaristia era bem diferente daquilo ue celebramos hoje. Falando simplificadamente, é muito prova- vel que, nos primérdios, ele deve ter passado pela seguinte evo- lugao: |. Primeiro, a Eucaristia era duas coisas a0 mesmo tempo: luma refeico comunitiria e uma celebragaio litirgica. A comu- nidade se reunia para comer em conjunto, para matar a fome, ‘todos juntos, em comunhifo, [sso geralmente acontecia na casa de alguém, Entdo, o dono da casa comegava a refeigto, levantando 0 po com as maos e proferindo uma oragio de louvor (P). Depois disso, transcorria a comida, ou refeigio (ref.), acompanhada de ‘outros atos, como oragdes, salmos e hinos. Ao final, o dono da ‘casa levantava um eile de vinho e proferia uma orasdo de lou ‘or, gratidio e siplica (V). (Isso, alids, nlo quer dizer que nio tivessem bebido antes.) Como era atturgia ‘mais antiga de que setem noticia? O cultoeristio tem ‘duas verientes Da comunidade cristdprimitiva veio Eucaristia A evolupao do rito da Euceristia 23 Da Sinagoga veio Linargia da Patasra AEwcarisia, combinada com @ Liturgia da Palavra, forme 24 eae Poderiamos representar essa Eucaristia assim: P ref, v 2. Num sezundo passo, continuou-se com a refeigio, mas as palavras sobre 0 po (P) e sobre o vinho (V) foram juntadas «e colocadas no fim da refeigfo (ref.). Com isso jf se acusa uma tendéncia que vai marcar o restante da evolugio: os elementos po e vinho comegam a se tomar independentes. Ganham mais destaque. Ao mesmo tempo, a refeigio comunitiria perde signifi- ceado. A Eucaristia comega a ser menos uma refeig8o comunitiria © mais um rito ao redor do pio e do vinho. Fica assim: PV 3. Por ilkimo, os atos do pio (P) ¢ do vinho (V) se separa. completamente da refeigio comunitiria. Esta ainda persiste por algum tempo, sob o nome de Agape. Os atos do po e do vino {omam-se um ato litirgico separado. Fic assim: ref, Pv Esse ato litirgico autinomo passa a chamar-se Eucaristia © ocupa 0 centro do culto cristo. Eucaristia significa agao de tgragas. A Didaqué registra que “no Dia do Senhor” (isto é, no domingo) a comunidade cris celebra a Eucaristia. A outra vertente do culto cristio é encontrada na sinagoga judaica, de onde se originow aguela parte do culto que chamamos de Liturgia da Palavra. Na sua forma original, ea tinha a segui te estrutura: leituras biblicas interpretagdo oragido de intercesséo. ‘Aos poucos, a Eucaristia foi combinada com a Liturgia da Palavra, cada bloco com trés partes. Essa combinagio esté docu ‘mentada pela primeira vez em Justino, o que significa que ja deve ‘er sido praticada algum tempo antes, Ou seja, essa estrutura bsica do culto ctisido & quase tio antiga quanto os itimos escrtos do "Novo Testamento, Fssaestrutura basica do cultoeristio & que veio ser chamada missa. Esse ¢ 0 cere mais antigo do culo cristo, ‘que podemos documentar. F, olhando para a histéria posterior do calto cristo, vamos constatar que essa estrutura bisica foi a que ue se manteve através dos tempos e de todas as transformagbes. Entdo, fica assim aestrutura bisica mais antiga do culto cristo: LITURGIA DA PALAVRA leituras biblicas interpretagio oragio de intercessio EUCARISTIA preparo da mesa Oragao Eucaristica distribuigdo Para nés, essa estrutura bisica esti, portanto, carregada de ‘uma enorme autoridade. F isso por duas razdes: 4) é estrutura mais antiga que podemos documentar, ¢ b) éa estrutura basica que se manteve através dos tempos (vindo a ser alterada apenas por algumas tradigdes descendentes dda Reforma ~ mas nfo por Lutero nem por Calvino!) A partir desses fatos, a maioria das igrejas oriundas da Re- forma deveria rever, hoje, a pritica dos seus cultos dominicais, ‘Num culto dominical regular ~ que & o culto principal da commu nidade ~ nao deveria faltar nenhum dos elementos da estrutura bbisica descrita acima. ‘Com base na historia do culto cristo, precisamos reconhecer, pportanto,o seguinte: Num culto principal da comunidade crista po- dem faltar elementos como a confissdo de pecados ow a confissao de fe afinal, elas 86 vieram a fazer parte do cult cristo muitos sé- culos mais tarde). Mas um culo principal sem Eueuaristia é um cul- toppela metade. Assim como um culto principal sem interpretagdo da Palavra ou sem a oragio de intercessao & um culto mutilado, ss esteutura isiea do culo cristo Aantoridade dessa cestrutura bésica Deveriamon rever a ritica dos nossos ‘eultos dominicais Aistéria da Uiturgia€ como 0 crescimento de uma As descobertas desta unidade tém consequéncias muito importantes para quem se preocupa com uma prtica litngica que seja teologicamente bem fundamentada ¢ ecumenicamente compartilhada, ‘Antes comparamios a histéria do culto cristo a um rio eom dduas vertentes. Também podemos comparara histéria da liturgia crista ao creseimento de uma drvore. A plantinha emergiu li na ‘comunidade primitiva de Atos 2. Surgiu de duas raizes: a primei- ra comunidade crista, que Ihe deu a Liturgia da Eucaristia, e a sinagoga, que contribuiu com a Liturgia da Palavra A partir dat, a arvorezinha da liturgia foi desenvolvendo-se ao longo dos primeiros séculos, de geragdo em geragdo ¢ nas imais diferentes regides da Asia, Affica e Europa, com uma racterstica singular: adaptava-se, na forma e no estilo, aos dife- rentes ambientes culturais, enquanto mantinha inalterada aquela cestrutura basica original. © tronco continuou subindo, homogéneo e iinico até a se- ‘gunda metade do século HI. Foi por essa época que a liturgia da igreja oriental tomou rumos bem proprios. Mesmo mantendo a estrutura bisica do culto ctistio, desenvolveu caracteristicas dis- ints. Assim, aquele tronco dividiu-se em dois, e cada qual foi crescendo a sua maneira, sem jamais perder a estrutura bisica © tronco da igreja ocidental continuou subindo, atravessan- do os séculos, passando por transformagdes culturais ¢ também teol6gicas, até que, no século XVI, veio a Reforma, produzindo ‘cimbios radicais na litugia utero ¢ Calvino ainda pretendiam conservar a estrutura bi- sica do culto cristo dominical, depurando-o apenas dos desvios que julgavam inadmissiveis na pritica litirgica da igreja medie- val. Nao 0 quis assim 0 movimento que se seguiu Nas igrejas da Reforma e suas herdeiras dos mais diversos paises, a Liturgia da Palavra acabou por independentizar-se ¢ as- sumir o primeiro plano. O culto dominical ficou limitado exclusi- vamente a Liturgia da Palavra, enquanto a Liturgia da Eucaristia cra transformada, quase sempre, em mero apéndice, celebrada ‘apenas poueas vezes por ano, A Liturgia da Palavra, originalmente um empréstimo da si= ‘nagoga, assumiu o lugar central e quase exclusivo do culto cris- to dominical, enquanto a Liturgia da Eucaristia ~ esta, sim, de origem genuinamente crista ~, passou a um plano menos do que secundirio. AA partir dat, as muitas igrejas herdoiras da Reforma desen- volveram suas préprias liturgias, produzindo um confuso pano- rama de estnuturas,ritos e formas, Voltando a figura da rvore: com o século XVI sai, portanto, tum novo gatho do tronco da liturgia ocidental e desse galho bro- ta uma infinidade de outros galhinhos, ramalhos e ramos, eres- cendo cada qual & sua maneira. E ali, em algum lugar, no meio dessa confusa galharia, que se situam hoje as liturgias das igrejas latino-americanas procedentes da Reforma. A historia da liturgia ajuda-nos a localizar uma base, sobre ‘2 qual poderemos desenvolver uma reflexiio e um fazer litirgico {que seja ecuménico e teologicamente bem fundamentado. Essa base nilo pode estar em meio aos ramalhos ¢ ramos daquele galho que saiu do tronco no século XVI. © caminho litirgico que se vai impondo no mundo ecumé- nico —e que foi to bem exercitado na Liturgia de Lima (Com ‘slo de Fé e Constituigto, Consetho Mundial de Igrejas, 1982) -, a volta ds fontes, o etomno as origens comuns do culto cristio, nos primeiros séculos da drvore liturgica, ‘Nossos reformadores, ao reagirem contra desvios da igre- ja ocidental medieval, tomaram medidas bastante radicais, am- putando partes essenciais do culto cristdo dominical, Acontece ‘que eles desconheciam a liturgia dos primeiros sévulos. Sabemos hhoje que eles ignoravam muitos documentos relevantes daqueles {tempos primordiais (como, por exemplo, a Didaqué). ‘Quanto a nés, podemos sustentar os prineipios teolégicos {que levaram nossos reformadores a romper com a jgreja estabe- lecida, sem acompanhé-los nas mutilagdes liirgicas resultantes das limitagdes do seu conhecimento. Volta as fontes 27 Redescobrire fazer nosso 0 ‘alto dominicat da comunidade ‘rita dos primeiros séeulos 28 Porta rn ponies pesca tropoligieat~ 6 importnteredescobrimeos¢faermos nosa'o cult dominic como era elebrado na Comunidade ct doo primeironséulos com sun esta hisica de itis de Pa, ve Litgia da carta Nossa reflex nossa pris itigicasdeverim erguerse sobre essa base comum ea telogia de cute que clacmaee Estamos preparados para explorar, agora, as ampliagées & 8 cortes que aquela pequena estrutura bisica original do culto cristdo fbi sofrendo através dos tempos, Esse sera o assunto das Préximas unidades. Unidade 8 A liturgia que a tradi¢A0 nos legou Esta ¢ a unidade de conclusto do Fascieulo 1 “Nossa litur: ‘sia: das origens até hoje”. ‘Vamos recordar: Onde é mesmo que nds queriamos chegar? Com a nossa caminhada, nés queriamos habilitar pessoas © especialmente equipes de liturgia -, a responsabilizarem-se, ‘com a pastora ou © pastor, pelo culto da comunidade. Queriamios preparar pessoas € equipes para serem mais do que apenas “Iei- ores” e ajudantes nos cultos. Queriamos preparé-las para, junto ‘com a pastora ou o pastor, moldar liturgias, Por isso foros ver a historia da liturgia, das origens até hoje. Descobrimos que, no inicio, havia um mécleo essencial, ‘uma estrutura bésica, e vimos que com 0 tempo essa estrutura biisica foi evoluindo, sofrendo ampliagdes ¢ cores, Assim, constatamos que na liturgia ha partes ¢ elementos. que sio essenciais, impreseindiveis, que no podem faltar em rnenhum culto completo. So os elementos da estrutura bis E pereebemos que todos os demais elementos sio apenas tteis, mas no imprescindiveis. Ou seja, eles podem estar presentes out podem faltar, sem que isso prejudique a liturgia, Também nota- ‘mos que mesmo entre esses elementos tteis hi uma certa hierar- quia. Alguns, sem divida, sio mais importantes do que outros, Para concluir nosso trabalho com 0 Fasciculo 1, vamos ago- ra efetuar um levantamento de todos os elementos littirgicos que «a Ladigdo da igreja colocou em nossas maos. Sio todos esses elementos que fomos conhecendo ao longo das unidades anteriores, Esto alguns outros elementos mais, que ainda nao abordamos ao longo desta caminhada inicial. Podemios enconiré-los na Liturgia de Lima ¢ em outras que voces possam ter mio. Uma breve recapitlagio: = qual era nosso objetivo? qual foi 0 caminko pereorrido? Para conciuir: ‘montar a iurgia toda que atradigo nos tegow 45 46 A cestrutura da lturgia que a tradigdo nos legou fica mais ou LITURGIA DE ABERTURA ‘edintico de entrada saudagao oracdo preparatéria (confissio de pecados) Korie Gloria in excelsis coleta (oragiio do dia) LITURGIA DA PALAVRA leituras biblicas cdinticos intermediirios (com Aleluia) imerpretagdo (prédica) confisito de fé ofertas oragdo de intercessiio LITURGIA Da EUCARISTIA reparo da mesa e ofertévio ‘oragdo eucaristica Pai-Nosso _gesto da paz fracao Cordeiro de Deus ‘comunhao (distribuiedio) ‘oragdo de agradecimento LITURGIA DE DESPEDIDA ‘encado Conclimos, pois, o estudo da “nossa liturgia: das origens até hoje”. Leitoras, leitores e equipes devem estar percebendo, a estas alturas, que estdo, aos poucos, reunindo os instrumentos de ‘que necessitam para ajudar a assumir responsabilidade pelo culto de sua comunidade. Mas até aqui cobrimos apenas o inicio. Ain. da deve haver muitas dividas ¢ incertezas que serio eselarecidas mais tarde, © que nos espera no Faseieulo 2? L4 vamos aprofuundar nosso conhecimento, O titulo do Fas- ciculo 2.é A liturgia toda: parte por parte”. ‘Vamos percorrer a liturgia toda, do inicio ao fim, parte por parte ¢ elemento por elemento. Vamos tentar clarear, da maneira ‘mais s6lida possivel, cada parte ¢ elemento: = qual a sua Fungo, © que significa, = qual a sua importineia, ~ qual o seu lugar na liturgia, ~ de que formas e maneiras pode ser realizado, ‘Com tudo isso, quando encerrarmos o Fasciculo 2, teremos conhecimento de causa suficiente para contribuir na importante tarefa de moldar liturgia, que nos espera no Fascieulo 2? 47

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