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Capitulo 1. Desigualdade social: objeto e modelo proteérico de analise Veit Bader | Albert Benschop* 1. 0 QUE E A DESIGUALDADE? “Bu concebo na espécie humana dois tipos de desigualdade: uma, que se chama desigualdade natural ou fisica, porque é estabelecida pela n: e consiste nas diferengas de idade, satide, forca do corpo e pelas qualida- des do espirito ou da alma. A outra pode ser designada como desigual- dade moral ou politica, porque depende de uma espécie de convengio € Geestabelecida ou, pelo menos, validada pelo consentimento das pessoas. Consiste esta nos diferentes privilégios de que gozam alguns em detri- ‘mento de outros, tais como serem mais ricos, mais honrados, mais pode- 0508 do que os outros, ou mesmo estarem em condigdes de se fazerem obedecer. xt Benschop, qu fleceu 27 de te com Manuel Calo Silva, para prestar hhomenagem pésturs no sé pelos seus contributor taGricosinovadoressobreas desigual dades,designadamente as desigualdades de class, mas também pel se enpenocivico renovagio do CPN (Partido Comunista Holandis). A propésito da merscids homena- gem aocolegs Man 1aUniversidade do Minhoa 4 de outubro de 2017, ena para portgués deste segundo coptule da obra publicadaem 1988 em holandés em 1989 em al iolandesa Maria Johanna Schouten revisio da trad, » veranoer resposta encontra-se enunciada na simples definigio da palavra. menos se pode procurar saber se haveria alguma relagio essenci as duas espécies de desigualdade; isso equi por outras palavras, se aqueles que mandam valem necessariamente mais do que 08 que obedecem; e se a forga do corpo e do espfrito, a sabecoria oa virtude se encontram sempre nos mesmos individuos em proporsio do poder ow da riqueza, questo talvez boa para ser agitada entre escravos owvidos por seus senhores mas que nao convém a homens razosveis e livres que bus~ camaverdade” (Rousseau, 1755/1983, p. $3) 1.1. A DIVERSIDADE DAS PESSOAS ‘Todas as pessoas so desiguais, mas algumas so mais desiguais do que ‘outras. As pessoas podem diferenciar-se entre si de modos muito diver- ‘808. Se designéssemos estas diferengas como desigualdade, nenhuma ‘pessoa poderia ser socialmente igual a outra. Sem explicagio adicional, niio seria de antemio claro 0 que se entende por ‘desigualdade social’ Por isso, fazendo um resumo de velhas € novas discusses, procurare~ mos dar conta de que ‘desigualdades’ se trata, Na esteira de Dahrendorf (2966), distinguiremos desigualdade, antes de mais, a partir de dois eixos: () desigualdades por caraeteristieas naturais dos indivictuas e desigual- dades relativas & sua posigio s i) desigualdades As quais nfo est associada qualquer valoragio e desigualdades socialmente valorizadas. Se combinarmos estes dois eixos, podemos distinguir quatro formas de desigualdade social: (As pessoas diferenciam-se umas das outras por caracteristicas herdadas, inatas ou adquiridas. Esta diversdade natural & sobretudo determinada por resultados contingentes de dupla raiz genética. Os resultados desta lotaria genética manifestam-se nas diferengas que por ineréncia nfo sio desigualmente valorizaveis, tas como diferenga na cor da pele, no sexo, na constituigo do corpo. Ou, se io depende’ num certo momento se tornam dominantes. dos critérios a determinados tragos ‘natu- ‘ou seja, somente quando estes so valorizados e normatiza~ dos. Diferengas na forga 1a altura, na velocidade e similares so 0 resultado combinado de disposigdes herdadas, de is io, treino e ali- vamente grande por parte das eiéncias naturais. Alguns ‘io, por exemplo, mais altos, mais velozes e/ou mais fortes do que outros; por isso, medidos por critérios normativos de prestacio aids especificiveis, podem ser qualificados como ‘melhores’ ou ‘piores, ‘superiores’ ou ‘inferiores. (0A divisiio do trabalho e a diferer rentes tipos de atividades e pos see quando estas atividades io de papéis conduzem a dife- es sociais, Este & também 0 caso desde Sorokin (1927) ~ deve ser analiticament preciso da desigualdade social no sentido especifico do termo. (@Apenas poderemos falar de desigualdade social quando as diferen- tes posigées sociais implicam recursos e recompensas estrutural~ mente assimétricas que silo valorizadas como desiguais no sentido deuma ordenagio hierrquica’. 1.2. DESIGUALDADE NATURAL E SOCIAL Adistingao classicamente formulada por Rousseau (1755/1983) entre desi- sgualdade natural e desigualdade social referida na citagao introdut ‘uma importincia fundamental para a moderna discussio pol ica. A pergunta sobre a origem da desigualdade social foi ubordada deuma maneira totalmente nova, Gom a assungio da igualdade democré- ia por direito natural, operou-se uma rutura radical com a tradig&o aris~ clegitimada remetendo para as diferencas naturais entre as pessoas: “Bevidente que & da natureza haver livres e escravos e écerto ¢ justo que estes Do mesmo modo é também cla natureza a relagio entre ,que um & mais, a outra é menos e que o primeiro manda ‘eseravo sejam a mesma coisa. (Aristételes, sa, 1254b, 1951) Na tradigio de diteito natural é criticada a desigualdade social par- tirda idefa de uma ‘gualdade natural de todas as pessoas’. O contributo de Rousseatt foi um prekiio para a explicagio dos direitos das pessoas dos cidadiios de 1789: “Todas as pessoas sio lives eiguais em direitos por nascimento. As diferencas sociais podem apenas basear-se no interesse origem da desigualdade. Eela ‘0 €atéhoje, se tivermos em conta duas imitagoes: () A igualdade ‘natural’ de que se fala nas teorias do diteito natural democritico nao deve ser entendida como uma afirmagio sobre a ‘original’ igualdade histérica. A assungio de uma original ‘situagio natural’ live e igual nao é seguramente uma premissa necesséria da abordagem cientifica critica da desigualdade social’, desigualdade natural e a social niio podem ser assim tio sim- plesmente separadas, tal como, conforme a citagio de Rousseau, tem ocorrido ¢ ainda ocorre amitide: desigualdade ‘natural’ vista como geneticamente determinada e totalmente independente das relagdes sécio-histéricas do meio versus desigualdade si uum lado, no programa genético (gendtipo) estio jé implicadas as seleges do meio de geragbes anteriores; por outro lado, todas as diferengas em saide, forga fisicae tragos psiquicos e espi s6cio-historicamente determinadas e num gra que é pressuposto em explicagGes ‘naturalizantes' A diversidade natural abarca todas as diferengas fisioldgico-| centre as pessoas: (i tragos hereitdrios, ou sefa, por transmissio genética de determinadas diferencas,tais como sexo, cor da pele, forma do nariz& ‘outras similares; (i) diferengas inaas, ow seja, earact tal como algumas deficiéncias corporais e me: das, tais como forga compor msequéncia de acidentes ou doengas cocorridas no decurso da vida individual de cada um. As fronteiras entre ‘estas trés categorias sao fluidas e amitide muito controversas. Disto so ainda ilustrativas as discusses correntes sobre a hereditariedade da “inteligeneia’s ‘Todos os esforcos para explicar as estruturas de desigualdade social remetendo para as diferengas ‘naturais' entre os i circulares so elas préprias o resultado de desiguais oportunidades (de educacio, de jmentaco, entre outras)’. E mesmo quando e na medida em que estas 1 Gentenido 1 As earactersticas inatas ds individos so dretamenteiden- asbioligica | Budo o que ¢ into ~ on que se aesume corn iferengas ‘naturais’ nao podem ser interpretadas como resultado prévia desigualdade das oportunidades sociais, estes modelos exp! tém reduzida importiineia, Para a explicagio da origem e continuidade da cestruturada e institu ada desiguakiade de posigdes tais perspetivas naturalistas fornecem: puras especulagies sobr (cl. turalmente desiguais sio simplesmente pressupostas e funci comolegitimagao da alocagao dos individuos ou grupos através de individualistas-meritocriticos ou coletivo-adscritivos. Isto vale em geral também para as tentativas de explicar as desigualdades sociais a parti de desigualdades individuais, independentemente de estas serem interpreta- iduos e grupos nao pode portanto o significa contudo que essas dife- rengas sejam ‘verticalizadas, hierarquicamente valorizadas, observadas, vivenciadas ¢ definidas, desde que sejam apresentadas como ‘maldade desigual natural, oferecem igualmente pontos de ligaglio e critérios na base dos quais podem fechar-se relagies socinis e oportunidades de vida. Namedida em que isto ocorre defacto, juntam-se padrées de esigualdade diversidade natural. E da mesma na seja, a divers tio-pouco pode Apenas a sua ‘verticalizagio’ comporta desigualdade da valoracio, a qual é caracteristica da desigualdade social. Esta valoracio desigual pressupde todavia uma estruturada desigualdade do poder de disposico sobre os recursos sociais. 1.8. A DESIGUALDADE SOCIAL £ UMA DESIGUALDADE ESTRUTURAL A desigualdade social & definida, em primeira instincia, como uma desigualdade de posigdes sociais, que se caracterizam pela assimétrica de recursos e recompensas. Em sentido estrito, porém, s6 poderemos falar de desigualdade social quando ela se torna estrutural em dois aspetos: (A divisio desigual do poder de disposicio sobre recursos e recom- ppensas, a qual constitui posigSes desiguais, nfio pode ser casual. Para se poder falar propriamente de posigies 30 podem tais posigées ser fluidas; elas terdo de ser em larga medida cristalizadas e institucionalizadas. A desigualdade das posigies das de recrutamento deve portanto apresentar uma certa regulari- dade de ‘estrutura! no sentido mais geral do termo?. 9 Falamosde ‘estrtur’ sempre qu as oportnidades de or anise 8 () Igualmente, a ocupagio de lugares deve apresentarum grau minimo de durabilidade. A desigualdade de posiges, institucionalizada, estabilizada ou usurpada, toma-sejustamente um problema quando se juntam barreiras de mobilidade (certamente & 0 que ocorre, de facto, quase set . quando determinados grupos, orga~ nizagdes ou individuos estio em condigies de monopolizar as posi~ ‘es estruturalmente desiguais ou de limitar duma maneira mais ou menos dristiea o acesso as mesmas®. Portanto, a desigualdade social estruturada pressupde uma certa medida de sistematizacao, estabilidade e duragao. As formas incidentais ou formas niio durdveis de desigualdade caem fora do conceito de desi- gualdade social estruturada, 1.4, ESTRUTURAGAO DE POSIGOES E RECRUTAMENTO DE Ipiviovos: Antes de analisar as desigualdades sociais, devemos fazer uma distingZo © mais precisa possivel entre (i) o problema da estruturagao das p Bes desiguais ~ ou seja, das condigdes do aparecimento e da reprodugio dos ‘lugares vazios’ na estrutura social, os quais se caracterizam por uma desigual distribuigio do poder de disposigio sobre recursos, recompen- sas e valoragSes desiguais ~ e (i) 0 problema do recrutamento dos i viduos nestas desiguais posigées estruturadas ~ ou seja, dos critérios € 10 Quando algudm, por explo, dos de certas posigie: Em qualquer anilise nfo reducionista da relagio entre desigualdades posicionais (por exemplo, posigdes de classe ou posigées de elite) e desi- gualdades adscritivas (por exemplo, racistas, sexistas) faz-se uso, pelo na tradigiio marxista, por cexemplo, é bem significativa a afirmagio de que 2s posigées de classe como tal niio tém cor de pele, sexo ou idade, cultura, religifo, nacionalidade ou estado de cidadania, Sio ‘lugares vazios’ em determinadas estruturas © 'Senhor Capital’ nfo é senhor, aparenta uma natureza social 6 definida pelo poder de disposigio privado sobre as condi- Bes objetivas de produgio numa estrutura econémica que esta orientada para a otimizagio da rentabilidade, Nas sociedades burguesas estes luga- res vazios sio ocupados como consequéncia, em maior ou menor m: sao racista, sexist ends fas podem, em maior ou menor grau, cruzar-se ou sobrepor-se. ‘Uma forma mais avangada de sobreposicio ocorreu nas clivagens racistas ede classe no Sul dos Estados Unidos no século XIX e no sistema do apar- theidda Africa do Sul até 1994. Por isso, é importante manter esta distingio de modo (relagio de exploragao) e ‘que individuos so recrutados para essas posi- ‘bes? (relagio de exclusio). 2. CAUSAS DA DESIGUALDADE SOCIAL A questao sobre a origem da desigualdade social siio dadas respostas muito divergentes. A heterogeneidade dessas respostas depende parc ‘mente do facto de nao ser claro 0 que se entende por ‘causas; ‘funda tos’ ou ‘bases’ de desigualdade e para que é quese procuram as causas. Esta imprecisio ocorre porque as explicagbes causais ou histérico-eausais da d gualdade social nao se demarcam claramente das explicagoes teleoligieas ‘ou fincionais (cf. 2.1.); nfo € feita uma adequada distingo analitica entre ccausas do aparecimento histérico das desigualdades e causas da existén- cia, da reproducio e da transformagao da desigualdade social (cf. é clara a distingio entre causas da desigualdade estrutural de p causas do desigual reerutamento ou alocagio das pessoas (ef. 2.3. 2.1. EXPLICAGOES HISTORIGO-CAUSAIS E EXPLICAGOES TELEOLOGICAS Como é sabido, as questdes orientadas para as ‘causas’ e para o ‘porque’ podem ser entendidas de duas maneiras: como ‘perguntas'histrico-eau- stas sobre estratificagio social. Tal como é sabido, Davis e Moore (1945), para sustentar a sua afirmagiio de que “nao ha nenhuma sociedade sem classes ou ni estratficada’ (1945, p. 242)”, aduziram dois argumentos de putida esteretigad de quase toda a gio de que a dosigualdade dade um fndmeno ais: (7) a estratificagao é necessdria porque determinadas posigdes so funcionalmente mais importantes que outras; e (i) pela desi- Idade de recompensas as “sociedades garantem [...] que as posigées importantes so conscientemente preenchidas pelas pessoas mais 45, P. 243). Pata além de todas as objegdes de contetd nuclear é ade que as explicagies fiancionais, indepen- loque elas possam também explicar (e, no caso da socio- ionalista sobre estratificagao, sobretudo mascaram), niio dio resposta & questio das causas histdrico-causais do aparecimento da desi- sgualdadesocial (cf. Wiehn, 1968, p. 41). Comas suas afirmagies abstratas sobre a necessidade secular e a importncia socialmente constitutiva da tas contribuem sobretudo para . Nao é de modo algum necessa- -a do chamado 'comunismo primitivo"® para que esta questio jamais s rio partir da existéncia 14, Pelosvsts nfo se ocupam com tis quests apenas “os escravos que se resignam aos reconhecer a importéncia das explicagdes histérico-causais das formas especificas de desigualdade social: “A desigualdade so tém sido sobretudo e em primeira instncia monocausais precisa de uma 967, p. 192). Osesforcos para expliear, numa a origem da desigualdade social estruturada (Nas teorias de cocrgoe violencia, a origem da desigualdade social e da dominagiio de classes é explicada por guerras e conquistas, usurpa- {ges violencia fisiea. Apenas na base do ‘dieito do mais forte’ e da “forga da espada' estariam determinados povos, ‘em condiges de submeter a si outros povos, apropriar para si de modo duravel privilégios especificos™; ‘rail (1984). Nao oereceremoe aqui um 0 quao de referéncia prd-terico que remes devenvolver tora ‘ar numa perspetirageral, em terms tedricose metodolgicos Pontos fortesefaquezasdestasabordagens (cfoesforgodeStraser, 1985, 1987). Dada que ‘steno ¢o principal propésitedo nosso ext, no faemostum resumo dos onto forts (Gi nas teorias da propridade privada, a‘apropriagio primitiva’ ~ na maior dos casos, do solo eda terra - é vistacomoa origem da desigualdade social’; (i) no centro das teorias marxistas das soci priagdodo sobretrabalho ou do sobreproduto™; ) nos modelos tedricos de diferenciagio, a origem da desigualdade social é explicada a partir da divisao do trabalho e da diferenciagao de desde classe estiaqpro- € explicada a partir da necessidade de serem sancionadas normas sociais”. Estes modelos explicativos que so aqui expostos frente a frente de modo abstrato nao so al sivos e contraditérios entre si, Por exemplo, nas explicagdes marxistas sobre a origem das sociedades de classe, organizadas em base estatal, a superior violénciafisica, a erosio da propriedade coletiva, assim como a diferenciagio teenie, econdmica e social da divisio do trabalho desempenta(r}mcera- I 9 muito pouco adequados para a investigagio histérica. A confrontasio até hoje dominante sobre os ‘primeitos’ atore: 8) queso tedreae hstricamente relevantes, podcrom ‘er subsequntemente preenchidos, nomeadamente ox modelos que estabelecem coma resultado duma rivalidade improdutiva do que um contributo para uma investigagao histérica fecunda. 2.2. CAUSAS DA ORIGEM E CAUSAS DA CONTINUIDADE E DA MUDANGA Sustentamos que est por fazer uma disting&o analtti rica de determinadas estruturas de desigualdade; zada;e (if) causas da mudanga ou transformagao das estruturas de desi- ‘gualdade, a institucionalizada’s. As respetivas causas (ou conjunto de causas) podem globalmente ser id@nticas, mas tal nao é necessariamente 0 caso.". Assim, uma superior violéncia pode ser um fator decisivo para o aparecimento duma nova rela~ ‘glo de exploragao. Isto é vilido para as guerras expansionistas das cidades- estado gregas, as campanhas de conquista por parte do império romano, 2 ais’ por némadas através de expedi- poneses pelos ‘cavaleiros da indiistria’ até a0 colonialismo capitalista e 20 imperialismo, assim como as praticas de extorsio pelas diversas méfias modemas. Porém, tal como Marx (1867/1970) demonstrou, a violencia é caracteristica da chamada acumulacio primitiva do capital que nas- cceu “da cabega aos pés, de todos os poros, escorrendo sangue e sujidade” (cE MEW 23, p. 788), certamente o ponto de partida do modo de producio P os fatoresexigenos qua nos origem da dsigualdade socal é ep 08, 9.248) bre pon 26 Amenos que se acted ser elevante a etratégia deo poder expicar ou se responsive! por tudo. Fazendo a este respeito um wo tio amplo e generalzado do conceito de poder (calcomo ocore entre outros, com Lens (3966), Eis (1963) Eisenstadt (171) Fopecult (0975) e Wiehn (1968), que se pode contrapor a este entendimento & qe semehantes| abordagens ao trivia etém pocaforsaexplicativa, 2 verreaven’ as no o seu prdprio resultado” Logo que o modo de produ- ‘do capitalista assente nos seus prdprios pés, na reprodugao alargada deste avioléncia passa para segundo plano, paraaretaguarda: “A violencia diteta, no econémica, é certamente aplicével, mas apenas de modo excecional" (MEW 23, p. 765). A sua continuidade é primariamente causada pelo pro- ‘cess0 econémico ‘normal’ ~ formalmente pacifico ~ de acumulagio de ital. Do ponto de vista metodoligico, samente da mesma maneira. Em otestante€0 espirito do c (1905), 0 autor aponta para o papel so que o protestantismo ascético preencheu na génese do sistema econdmico capitalista. Porém, para com- preender a especificidade do seu desenvolvimento, Weber coloca a énfase numa “determinada e consttutiva componente do estilo de vida, que esteve no bergo do capi intamente com imi- eras outras fo 169)". A ética prote ‘0 sewacento t6nico no dever profissional e na € uma das componentes constitutivas do ‘espirito capita~ vida religiosa dos protestantes, de iosas, do seu estilo de vida influen- feber (1905/1965) argumenta preci- 5 processode separagiio entre produtores 1970.p-742)- ia-se explicitamente de uma interpetagioidesista ete queas formas con ticdemotivoseigioos. ein de quewm qualquer tiraponas desi priprioo stoma econdiea capitalist cs (Weber PE, 1905/1965, p. 303). tea;S0 purament copii A releviincia da ética protestante e do estilo de vida para o nascimento do capitalismo no necessita ser necessariamente prolongada na sua conti- nuago, Perante resisténcias psiquicas violentas e tradigdes pré-capita- -8e a importéincia da ‘ética profissional burguesa’ até que ‘a base puramente mecfinica possa dispensar esse Por outras palavras, por muito importante que se apresente a ética protestante eo sewestilo de vida como fator explicativo no nascimento do capitalismo, para a conti sistema econémico este fator é cada vex mais irrelevant 1920-21/1963, pp. 36 , $5 5s, 205). Estes dois exemplos ilustram a importa no sentido de distinguir entre ‘causas do apare tengao' da desigualdade social estruturada” 2.3. CAUSAS DA DESIGUALDADE PO! No parigrafo 1.4. destacdmos a importéncia da distingo analitica entre posigdes estruturalmente desiguais e a estrutural desigualdade de recruta- ‘mento. Esta diferenga entre pontos de referéncia posicionais e pessoais deve ser também tida em conta relativamente & questio das causas da desigual- dade social. A questo sobre o ‘porqué da génese, manutengfo e mudanga de posigdes desiguais’ niio remete simplesmente para o mesmo conjunto de razSes sobre o porque da origem, da mamutengio e da mudanga de citérios ‘e mecanismos de exclusio. Em nosso entender, a primeira questio tem de ser respondida pela andlise das causas histdricas e fimdamentos socioes- truturais da desigual distribuiglo do poder de disposicio sobre recursos € dicémos que esta pergunta deve logicamente ser colocada ‘antes’ e tratada indepenclentemente da segunda). A segunda questio, na nossa ética, deve ser respondida pela andlise das causas hist ricas ¢ fundamentos socioestrutwrais de especificos critérios adscritivos e meritocréticos e de especificos mecanismos de alocagio. 3. ESTRUTURAGAO ANALITICA DAS DESIGUALDADES SOCIAIS: NIVEIS DE ABSTRACAO E EIXOS DO PROBLEMA Dada a complexidade da desigualdade social, é recomendével desenhar uma rede analitica mais fina por etapas metodicamente controladas, Propomos distinguir de modo preciso e entre si os seguintes niveis de abstracio e eixos do problema: os diferentes niveis de abstragio de and- lise tebrica da desigualdade social e as unidades de andlise que so sele- cionadas em pesquisa histérico-empirica diferentes anilise dos contextos sociais de agio e das ag rentes niveis de estruturaciio da ago coletiva (cf. 3, de estruturagio das condigbes objtivas de vida (cf. 3.4.)™. 3.1. NIVEIS DE ABSTRAGAO E UNIDADES DE ANALISE A desigualdade social estrutuada pode ser analisada a quatro niveis: (0 universal ou, em todo 0 caso, abarcando diversas épocas histéricas ou formagies 80 especifico para uma determinada formagio social ou para um determinado periodo duma formagio soci para determinadas relagGes socias, subsistemas ou ca delimitadas temporal, geografica e social- is de abstragio podem desenvolver-se'teo- vel. Ainvestigagio. histérico-empitica € delimitada pela escolha das ‘unidades' de anilise. ddemodo mais aprofundado, Esquema1. Niveis deabstragioe unidades de andlise da desigualdade social Tire denkstocio® Desigualdade social estruturad ‘unidades deanalise Universalon Universal ou conjunto de varias formagoes soci abran- abrangendo varias gendo conceitose ‘teorias’ sobre desigualdade posicional e ng desigualdades de classe ede género),teorias re desigualdade social. formagoes soctais, Formagiosecial__ Formashistéricas de estruturasexpecificas, mecanismos de im como desta disposicfo: vg, formagoes specifica reerutamento ¢ tran sgarantia de desigual poder burguesas ou feudais, vidades nos sis- RelagBesfatividades Diversas formagées sociaisabrangendo ‘oucampos de riticas temas econémico, politico, de parentesco, etc. diferenciadas specifies da formasio social: desigualdade social no sis- tema econémico cap 1ademocracia parlamentar,na sociedade burguesa tc. Unidades deanslise Desigualdades emunidades del histérico-empirieas itadastemporal, geogrfica 1, No nivel mais elevado de abstragio que se possa pensar sobre ‘a socie- dade como tal, foram e sio formuladas hipéteses e teorias sobre a desi- gualdade social como um fendmeno universal, que seria constitutive de todas as sociedades humanas e, portanto, nfo erradicével (1g, nas abor- dagens sociobiologista, funcionalista e normativista, assim como nas perspetivas sociolégicas centradas no poder)”. Em regra, semelhantes 51 A pengunta sobre sea desigualdade soe ea qualquer vere empirica. Por isso, so pouco O grande mérto de Marx (1867/1970) consist em ter refrido pel primeira vez e com grande afinco as diferengas fundamentals na estrutura las mum conceito te6- algum validade ao facto de que se abre um caminho para um nivel médio fecundo de generalizagio para as teorias sociais em geral e para as teo- rias da desigualdade social em particular. S6 na base de teorias e hipd- teses sobre estruturas de desigualdade em formagies sociais histéricas (este é0 termo pornés preferido) particulares, éque as teorias e hips de trabalho sobre a evoluco da desigualdade social se podem perfil E através da compreensiio das configuragdes especificas das estr desigualdade que se cria um novo espago para conceitos e teses histori- ‘camente informadas sobre estruturas de desigualdade que também ocor~ rem noutras ~ ow em todas formagbes sociais (por exemplo, sobre classes forg0s de constr be os concetosbsios tis como formagio soc e desigualdade de classes, desigualdade de género, nacionalista, racista). E, como tal, as estruturas e mecanismos especificos que sio cara as para a propria formacio social atual nfo sio suscetiveis de serem automa- ticamente generalizadas”. Para evitar a conhecida confusao de conceitos e problemas, éem todoo distingo o mais precisa possivel ent emecanismos de desigualdade so. caso necessirio que fagamos w 1 deve ser sempre explicitadaa sua abrangéncia reivindicagiiode validade. 2. A desigualdade social pode ser analisada como um fenémeno que é especifico para uma dada formacio social ou um determinado period de desenvolvimento dessa formacio social. A este nivel de absteagio, as, xelagdes reciprocas podem ser analisadas na formacio social burguesa em geral ou em determinados estdios do seu desenvolvimento (por exemplo, sii complexas. Elas pressupdem nao apenas anilises de estruturas de desigualdade especificas (por exemplo, nas rela ges de produgao, de educac bbém hipdteses verificéveis sobre a sua recfproca dependéncia. niio s6 abarcar uma anilise das relagBes dominantes de importantes recursos sociais ~ os quais determinam a posigio objetiva de potenciais, ‘grupos de conflito ~, mas também fomnecer uma exposicio dos mecanis~ de determinadas formagées sociais especificas. 43. Teorias sobre desigualdades ‘especificas de determinado campo' server, ise das estruturas de desigualdade em subsistemas analitica ou 1% Neste pont acrtca de Marx (1867/1970) sobre a espectica economia buguesa & ainda bom exemplar 35 Cf acatereapeto, Bader 1988, p. 3258) nomeadamente sobre ‘mento’ Sobre o tatamento do concito de classe ea especie estat dade de classe, ef Bader & Henschop (988, se eet io da desigual-

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