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Sill Moderna (COORDENACAO EDNORIAL Lh Han FEpAeAC30 DETETO Paulo Ces San, Ska Ee Kier cOoRDENAGHO DE RODUCAO GRARCA Fernando Dato Doan (COORDENAGAO DE ROMSAO Eatin Visi Eo Je EIGRO DE ARTE, PROKTO GRAFKOE CAPA Rico oss (COORIENACADDE TRATAMENTO DE MAGINS Aris fs (COORRENACAODE FRODUCKD NOUSTRAL Wison Apa TWATAMENTO OEINAGENS Accs fous SAIDADEFMES Heo Fe Sun WARESSAO E ACABAMENTO Yanga Gris © alors es ESI UVEO FOLIMPRESSO EM Cp - papel Inge An 20g At ppel Cs Fie Das 75/0! altos poe Rast VA che «Pape, Noms pat Patrocinios Pripasa Nossa Caiva fnbratel ns —_ — ApoIo aS a pegs Sonare SS Stine ‘ln neraninnai da Cinna Por (1) {Camara Bresieica do Livro, S, Bras) Ensino de misc: propasias para pense © agicem sla de ‘ul / ane Henehie, lca DeBen ers Mo Palo * Noles, 2008, bibiowata 1. Avaliagto edciclonal 2. Mis ~ Esudlo& ersing (Hench, Line Il Del Ben, Lucia 03.495 pp 7007 1. Alig m mine: Eda masa 780.7 2 Educ musical 7507 |3 Misia: Endo cemino 780.7 1S6N ao-lo-usv0e-0 Errors MopERNA LTDA, fh Pace dlino, 758 Beli So Palo = SP Hr CEP 03305904 ends e Atendiment Tel {11 60901500 x (0-11) 6050-501 ‘wow nade cite ane Impress no Brest -_ an ===CAPITULO 2 O SOM E A FORMA — DO GESTO AO VALOR Cecilia Cavalieri Franga Um dia, ainda menina, escrevi um poema. Dizia: Poderia abrir um diciondrio : procurar entre palavras vazias algumas que se enchessem de sensibilidade se transformassem em poema. Nos primeiros anos do aprendizado formal da linguagem, frustrava-me ter \e de lidar com as palayras de uma forma fria, distanciada e técnica, a0 passo que enxergava nelas todos os sons, cores, aromas, sensagGes e afetos. Escrever poe- mas se transformou, entao, em uma necessidade vital. Neles, as palavras poderi- am resgatar o papel a que sao destinadas: falar de coisas que nao elas proprias, tornar-se uma tradugdo simbélica da nossa experiéncia pela corporificagiio espe- cifica do discurso poético, como no final do poema: Escrever 6 sentir cada momento intensamente tragé-los ¢ transformé-los em palavras. Nao foi muito diferente minha frustragao no aprendizado formal da mtisica. O que antes era vitalidade, fluidez e movimento converteu-se em armaduras, teo- tias e marcagdes metronémicas. Momentos ricos em sonoridades e descobertas cederam lugar a disciplinas, datas e fatos. A sincope perdeu um tanto da sua graca i quando deixou de ser um instante em que se flutua sobre os apoios para ser “tem- H po fraco que se prolonga” etc., na pagina tal de um livro qualquer. Em uma brilhante conferéncia realizada em 1998, Terezinha Nunes, entio professora titular do Departamento de Psicologia da Universidade de Londres, 48 oe expressou uma preocupacdo andloga quanto ao ensino basico de portugués e ma- temética. Reconto, em uma traducao livre, um trecho fascinante da sua palestra No ni terra sob nossos pés. Nao temos nenhuma razdo aparente para duvidarmos que 0 nosso planeta seja redondo, como também nfo temos nenhuma divida do significado dos concei- tos “acima” ¢ “abaixo”. Um dia, na escola, nos ensinam que a Terra é redonda, e nos mostram fotos tiradas por satélite incontestaveis, Um fato como esse, quase irrelevante para nossa vida cotidiana, pode se tornar um novo objeto de pensamento. No entanto, pode-se aprender um fato mas nio se compreender a estrutura de pensamento que ele inau- gura, Esse problema foi constatado em um estudo realizado na Inglaterra, no qual pediram aos alunos que imaginassem o mundo visto do espaco através da janela da sua nave espaci- al e que desenhassem continentes, pessoas, nuvens ¢ chuva, Lucas, de 6 anos, desenhou os continentes ¢ paises muito bem —a América do Sul, a Inglaterra, a Austrélia ¢ outros. Ele desenhou a Terra redonda porém com uma concepgao plana: as pessoas € nuvens espalha- das sobre o planeta estavam dispostas verticalmente, todas na mesma diregao. Para ele, existia apenas uma possibilidade de nhou os continentes to bem, mas posicionou o Pélo Norte € 0 Pélo Sul e desenhou as nuvens ao redor de todo o planeta, com a chuva caindo do céu para a terra em quatro diregGes diferentes, Ambos ji haviam aprendido que a Terra é redonda, mas com uma diferenga fundamental: enquanto Lucas aprendeu um fato, Frances apreendeu uma nova indo e expandindo todo o seu univer- cotidiano, vemos a linha do horizonte sobre o oceano, 0 céu acima e a vara cima” e “para baixo”. Frances, 8 anos, nao dese- estrutura de pensamento, um novo paradigma, des so mental (Nunes, 1998, p. 2-5). Da mesma forma, a miisica oferece uma variedade de objetos simbélicos de pensamento. Siio janelas que podem expandir nosso universo interior e refinar nossa percepgao critica do universo que nos rodeia, Na educagao musical temos 0 privilégio de promover o fascinio da descoberta, o desenvolvimento intelectual a individualidade da apreensao simbélica da mtisica. Mas quantas vezes nao nos limitamos a ensinar fatos ou conceitos abstratos e deixamos de “abrir 0 diciondrio e procurar” experiéncias significativas que estes podem oferecer? Tantas vezes os alunos realizam sincopes de forma tio pesada que quase podemos ouvi-los con- tando “ta-&” justamente sobre o prolongamento, insistindo em acentuar o que deve ser suspenso! Por que nao lhes ensinamos que a razo de ser da sfncope é flutuar? Eo que sio escalas? Padres de “tom-tom-semitom” ou simplesmente seqiiéncias de dedilhados? Pergunte-se a Schumann o que é uma escala e ele Ihe ofereceré a vitalidade do terceiro movimento do Quinteto em Mibemol Maior; Tchaikovsky, a resignacao do final do primeiro movimento da Sinfonia n° 6 e Arvo Part; a transcendéncia do Cantus in Memory of Benjamin Britten. Nessas, como em ou- tras tantas obras, escalas ganham impulso vital e revestem-se de humores, falando de coisas que nao elas préprias. Pois essa € uma questao recorrente na literatura e que vem contagiando diversas falas: a mtisica como forma de conhecimento simbélico, como discurso significativo na teoria, nem sempre compreendida; na pritica, raramente alcan- cada. Muitos mergulham em Aguas tio profundas que no conseguem voltar & 49 tona a tempo de encarar a realidade da sala de aula. O propésito deste texto é compartilhar inquietagdes e experiéncias e apontar alguns caminhos para reflexaio © adv. Longe de pretender travar um debate exaustivo com textos filosoficos, limito-me a referéncias essenciais que podem iluminar a relacao professor/aluno/ musica sem afetar-Ihe a espontaneidade. Como ensinar contetidos teGricos, nota- ao, intervalos, escalas, contratempos e modulagdes sem comprometer a natureza da mtisica? Como trilhar 0 caminho entre as quintas diminutas ¢ a apreensio sim- bélica da nossa arte sem roubar-lhe o frescor da experiéncia estética? 2.1 DISCURSO E SIMBOLISMO © poder de compreender simbolos é uma caracteristica humana primordial (Langer, 1942, p. 72). Pelas diversas formas simb6licas e seus inesgotaveis pro- dutos, questionamentos, significados, teorias e praticas, interagimos com o mun- do e nos tomas humanos (Oakeshott, 1962). A partir da iniciagao nessas for- mas de conhecimento podemos participar da dindmica cultural que Oakeshott (1962, p. 198) chama de “conversagao”, uma aventura intelectual na qual somos convidados a nos engajar. As vozes que travam essa conversacao sio maneiras diferenciadas de nos relacionarmos com o mundo e de compreendé-lo. Cada uma delas é uma forma de discurso simbélico, uma manifestacdo organizada de um campo do conhecimento, com sua forma peculiar de reflexao, articulacao e expo- sigdo de idéias e significados. Entre essa vozes, as artes desempenham um papel relevante, tanto quanto a matemitica, as ciéncias ou a linguagem, contribuindo de forma decisiva para desenvolver as miiltiplas potencialidades do ser (Eisner, 1989, p. 7). Elas constituem modalidades genuinas de conhecimento com caracteristi- cas, procedimentos e produtos préprios. Langer (1942, p. 209, 233) acredita que o simbolismo artistico é mais visi- vel na mtisica, pois esta é incapaz de representar objetos externos a ela — a nao ser de forma arbitraria. Hanslick (1854) — um século antes de Langer — também nega aidéia de que a misica seja uma linguagem para denotar ou conotar coisas, even- tos, lugares, pessoas ou emogGes. Para ele, eventos musicais s{i0 como arabescos e caleidoscépios de sons que nos encantam com suas formas plisticas e ondas de movimento constantemente se transformando (certa vez, ao ouvir uma pega de Ronaldo Miranda, um aluno relatou algo como “um espaco tridimensional rodan- do”). Ele escreve que o significado musical reside to-somente nos padrées sono- TOS € suas relagdes; 0 que & expresso so idéias puramente musicais (Hanslick, 1854, p. 87-88). Nao obstante, tanto Hanslick quanto Langer reconhecem que padrées sono- ros podem ser organizados de forma andloga a certas carateristicas inerentes experiéncia humana. Hanslick distingue trés categorias de idéias passiveis de ser expressas em sons: forga, movimento e propor¢do (Hanslick, 1854, p. 37-38). Certas combinagées sonoras podem apresentar, por exemplo, qualidades expres- sivas de vigor, elegancia ou fechamento, como testemunham as escalas em Schu- mann, Tchaikovsky ¢ Part. Crescendo ¢ decrescendo, acelerando e ritardando, tensao ¢ resolugdo, movimento e repouso, hesitacao e determinagiio, preparacao e 50 completude, excitagao e monotonia, expectativa e mudanga stibita, e outras, sfio propriedades dinamicas vivenciadas a todo momento na nossa experiéncia cotidia- na (Langer, 1942, p. 228). A mésica produz uma transmutagao simbolica dos nos- sos ritmos internos (p. 227), mas sua tradugdo nunca é fixa. Langer considera essa ambivaléncia de contetido um privilégio da misica pois, enquanto palavras masca- ram, ela pode revelar (p. 243), explicar o inexplicavel, dizer 0 indizfvel (p. 101). Para que nossa imaginagao estabeleca relacdes entre sons e significados, basta que o simbolo tenha uma organizagio interna de seus elementos andloga A do objeto (p. 68-71). Com grande rapidez nos agarramos as caracteristicas mais salientes do simbolo e deixamos nossa fantasia delinear os mais diversos signifi- cados (p. 70). E por isso que Langer afirma que o significado envolve um aspecto légico, ou seja, um objeto que é representado, e um psicolégico, 0 sujeito que o experiencia (p. 53-57). Os sons propriamente ditos niio se relacionam diretamente. com simbolos: somos nés que lhes anexamos significados. Associagdes extramu sicais nao sao lgicas, mas psicolégicas. Logo, o significado musical sera consu- mado na mente de cada individuo da forma que seu background determinar (p. 240-241). Ou seja, a obra (0 aspecto légico de Langer) atinge 0 componente psi- colégico, que se aproxima do que Hanslick denomina “o érgao da pura imagina- ¢aio”. A misica se torna, portanto, uma importante fonte de significados tanto no nivel psicolégico individual quanto no coletivo (Swanwick, 1994, p. 24). Podemos identificar pontos de contato entre a visio desses autores e a pers- pectiva sociolégica de Green (1988, p. 12-31), que qualifica o significado musical como inerente e delineado. O primeiro diz respeito exclusivamente aos sons € suas relag6es, aproximando-se da estética formalista. O segundo envolve toda e qualquer associag4o que a escrita possa sugerir, sejam elas relativas as praticas culturais que as criam e perpetuam ou aquelas coletivamente determinadas ou idiossincraticamente construfdas. Tais associagdes nao podem ser evitadas nem devem ser repudiadas, pois sao parte legitima da construgao do significado sim- bédlico da musica para o individuo. Langer (1942, p. 226) observa que a constatagdio da analogia entre padrées musicais ¢ certos padrées da experiéncia humana se tornou uma doutrina psicol6- gica. A semelhanga entre a estrutura da musica e a estrutura psicodinamica de nossas vivéncias convida nossas memérias a integrar a experiéncia, “Quando so- mos tocados pela miisica, 0 que se move em nés sao as sombras de nossas vivén- cias passadas” (Swanwick, 1994, p. 20). A experiéncia estética culmina quando eventos plasticos de peso, espago, movimento ¢ tenso relativos de uma obra se relacionam aos nossos esquemas cognitivos, que guardam a representac%io dos eventos vivenciados (Swanwick, 1979, p. 36-37). “E nesse sentido e nesse nivel que [a miisica] possui significado e pode ser um vefculo para a comunicagao de informagao” (p. 37). Significados, pensamentos, idéias e argumentos so articulados por meio dos gestos musicais (Paynter, 1997, p. 10). Gesto é, “essencialmente, uma articu- lagdo do continuo” (Wishart, 1982, p. 313-314); a informagio gestual é veiculada pela morfologia dos eventos sonoros, contornos, frases e estruturas maiores. “A UF! ESCOLA DE MUSICA St BIBLIOTECA \ | | menor unidade musical significativa é a frase ou gesto, ¢ nao um intervalo, pulso ou compasso” (Swanwick, 1999, p. 44). Sons individuais combinados passam a ser ouvidos como linhas € contornos que incorporam niveis de expressividade espectficos, fazendo brotar impressées, climas, sensagdes e emocdes. Uma passa- gem pode, entao, ser graciosa, enérgica, leve, pesada, expansiva, retraida, delica- da ou agressiva (Swanwick e Taylor, 1982, p. 9) ~ caracteristicas essas que so propriedades dinamicas, e no denotagoes cristalizadas. O cardter expressivo é determinado pelas escolhas quanto 4 combinagio dos materiais sonoros. Graus conjuntos produzem uma sensaciio espacial e psico- lgica bastante diferente de saltos imprevisfveis, assim como escolhas de registro (um tema no grave ou no agudo), do tamanho das frases (longas e discursivas, ou curtas e irregulares), de andamento, articulagiio (legato ou staccato), ataque (sfor- zato ou aveludado), métrica (regular ou imprevisivel) e/ou textura (Swanwick e Taylor, 1982, p. 10-11; Swanwick, 1994, p. 131). Os gestos expressivos ent&a se encadeiam a outros gestos, estabelecendo relacdes. Pode-se criar monotonia pela repetigdo ou gerar expectativa pela seqiiéncia de contrastes. Uma passagem pode se transformar de graciosa em agressiva num processo gradual ou stibito. Repeti- goes, variagdes, contrastes, superposi¢Ges, simultaneidades e deslocamentos de- terminam a articulagao estrutural e convidam nossas vivéncias andlogas a tonali- zar a experiéncia. Entram em cena o jogo imaginativo e a capacidade de prever 0 futuro com base nos eventos anteriores, com os novos eventos confirmando ou quebrando nossa expectativa. Nao é dificil enxergar 0 paralelo entre as categorias de idéias de Hanslick e os elementos do discurso musical de Swanwick (1994): materiais sonoros deter- minam 0 cardter expressivo e sugerem impress6es de forca e movimento; forma, em Swanwick, ¢ proporgao, em Hanslick, dizeus respeito 2 estrutura, sendo cor- respondentes. Swanwick (1994, p. 39) afirma que a caracterizacdo expressiva e a forma elevam os sons da sua condig&o material e sensorial ao nivel do discurso. Em Discovering music (Swanwick e Taylor, 1982), cardter expressivo e estrutura aparecem como pilares do significado e da compreensao musical motivando a experiéncia direta com obras musicais por meio de atividades de composicao, apreciagao e performance. Ainda nao havia, entretanto, uma clareza quanto a se- qiiéncia légica desses dois elementos (articulacao estrutural e caracterizacéio ex- pressiva). A partir da génese do Modelo Espiral (Swanwick e Tillman, 1986), essa seqiiéncia é desvendada. Constata-se que a cumulatividade que acontece na pr6- pria mtisica reflete-se no desenvolvimento musical: a compreensdo dos materiais combinados produzindo gestos expressivos, estes, por sua vez, organizados em estruturas e estas conduzindo ao valor, & consciéncia da vitalidade e do poder da misica como discurso simbélico. Em Ensinando nuisica musicalmente (Swanwick, 2003), essas transformagées cumulativas so concebidas como saltos metaféri- cos, processos psicolégicos internalizados cuja percepgao é vital para a compre- ensao simbélica da misica. A experiéncia musical possui um componente individual intocavel, quase sagrado, pois é fruto do encontro entre padres sonoros experimentados e padrées emocionais jé vivenciados. Ou seja, essa experiéncia simbélica resulta da intera- giao entre 0 objeto musical e 0 sujeito que o experimenta. Por isso, precisamos considerar tanto a natureza da miisica, explorando e penetrando na sua estrutura interna, quanto a natureza humana, reconhecendo esse componente individual como parte legitima da construgao do significado. Apesar de a mtisica nos causar um efeito impalpavel e etéreo, 0 que provoca tal estado de espirito € algo bastante concreto: as relagdes sonoras artisticamente combinadas (Reimer, 1989, p. 54). Logo, € crucial tentarmos partir desse componente concreto para a inefavel expe- riéncia estética. 2.2 OS SONS COMO PONTO DE PARTIDA Os sons sao, por si sds, to fascinantes e irresistiveis que podem nos iludir, aprisionando-nos na sua condigio fisica — a menos que essa seja uma escolha deliberada. Mas muitos se prendem aos sons porque nio conhecem outra forma de lidar com eles. Programas de ensino de miisica so freqiientemente delineados em fungdo dos parametros altura, duracao, timbre e intensidade, provocando a fragmentagao e redugao da mtisica aos seus elementos materiais. Por certo, isso torna os planejamentos mais objetivos e as préprias aulas mais previsiveis e “con- trolaveis”. F mais seguro falar de conceitos abstratos e generalizados ou de quin- tas e contratempos do que arriscar descobrir como esses elementos se relacionam com nossa maneira psicolgica, emocional e simbélica de ser no mundo. Dentro de programas assim constituidos, podemos passar aulas ou anos tra- balhando no nivel do aspecto fisico do som sem nos voltarmos de forma musical e consistente para a integridade estética a individualidade expressiva das obras musicais. Swanwick (1979, p. 56) compara essa fragmentagao com o estudo labo- ratorial de uma borboleta presa por alfinetes a uma superficie plana. Nao pode- mos perder de vista que aquilo que nos fascina nas borboletas so as cores, 0 formato e tamanho das asas, a leveza, a imprevisibilidade do movimento, 0 pulsar das asas, seja no v6o ou quando se detém sobre uma flor. Estudar e ouvir interva- los, acordes e contrapontos e no penetrar na vida das obras de arte, onde esses elementos ganham vida, é como se contentar em apreciar a borboleta morta em um quadro na parede. Treinam-se padrées ritmicos e melédicos, abstragdes e conceitos, mas raramente se vai além da exploracdo material isolada desses elementos. As vezes é necessdrio fragmentar a mtisica em seus elementos para se ga- rantir a apreensdo dos conceitos; mas as fronteiras entre eles devem se dissolver to logo sejam assimilados. Qualquer solfejo pode e deve’ser cantado de forma expressiva, com contornos de frases, pontos culminantes, de tenso e relaxamen- to, agégica e dindmica apropriados. Entretanto, professores e alunos freqiiente- mente se dao por satisfeitos tao logo solfejos sejam “soletrados” com as alturas e ritmos corretos. Os andamentos geralmente so mais lentos do que o necessario para se alcangar autenticidade estilistica. Preocupados com as notas, os alunos nfio conseguem perceher as melodias. Da mesma forma, raramente ouvem frases, relag6es e apoios harménicos nos ditados musicais, ficando presos a identificagao nota por nota. A distancia entre esse manuseio quase penoso dos sons individuais e a experiéncia simbélica da musica nunca ser vencida se os programas nao pri- orizarem a qualidade da experiéncia, mesmo correndo-se 0 risco de cobrir menos capitulos do livro de teoria. Quando esses alunos comecario a fazer miisica se a urgéncia dos curriculos impde contetidos progressivamente complexos? Seguirao eles exercitando o reconhecimento e 0 solfejo de estruturas sem jamais experi- mentar, por exemplo, como uma mudanga de registro ou modulacao de um tema pode nos arrebatar? Certamente é possivel contemplarmos contetidos, ampliando gradativamente o conhecimento, a capacidade analitica, a técnica e os horizontes dos alunos e, a0 mesmo tempo, mantermo-nos fiéis ao estatuto interno da mtisica como forma de discurso simbélico. Desde as primeiras experiéncias é fundamental percebé-la ¢ vivé-la com toda sua inteireza, seu movimento, fluidez, surpresas e sensagdes. Relato, a seguir, algumas possibilidades experimentadas com grupos de natureza e idades diferentes. Todas envolvem de forma decisiva a composigao, que desen- volve a capacidade de julgamento, a sensibilidade as possibilidades expressivas do material sonoro e a compreensao sobre o funcionamento das idéias musicais. A composic¢ao permite agir criativamente, selecionar e rejeitar idéias, transformé- las, reconstrui-las e reintegra-las em novas formas. Os alunos podem articular e compartilhar seu pensamento musical, sendo as criagdcs resultantes expressdes | legitimas de sua vida intelectual ¢ afetiva. Essa é uma forma de se engajarem na “conversagdo” de uma maneira critica e construtiva, desenvolvendo a “sua voz”. Vejamos caminhos possiveis. 2.2.1 Curto e longo Muitas vezes, leituras ritmicas sao realizadas de uma maneira mecinica e pouco musical. Acredito que isso decorre da forma como 0 contetido é abordado. A semibreve, por exemplo, foi-nos apresentada como “um som que dura quatro tempos”. O aparecimento daquela figura indicava 0 momento de esperar e contar “um-dois-trés-quatro”. Mas sera que uma nota longa pode mesmo ser reduzida a uma matemiatica quadrada? Certa vez, um aluno de sete anos de idade sugeriu que a semibreve demora para dar-nos a chance de imaginarmos quantas possibilida- des ela pode conter. Ritmo € a forga vital da misica; em uma semibreve pulsa vida e nao simplesmente “um-dois-trés-quatro”. | Dentro do parametro duracao, é aconselhdvel abordarmos a relagdo entre os conceitos curto e longo com base no ritmo nao medido para chegarmos a propor- co de dobro e metade relativos. Sons longos podem guardar expectativa ou com- pletude, conter variagdes de dinamica ou contrapor-se a outros eventos, levando- nos a experimentar simultaneamente estados expressivos ambiguos (como em A pergunta ndo respondida, de Charles Ives). Sons curtos podem ter um carater de pressa, urgéncia, leveza, delicadeza ou brilho (como em Jardins sous la pluie e outras tantas obras de Debussy). A proposta relatada a seguir explora esses aspec- tos. Utilizamos os seguintes elementos graficos: campos com pontos, represen- tando sons curtos, e linhas retas, indicando sons longos. O siléncio entra como elemento expressivo, podendo gerar tensio, diivida ou repouso, e estrutural, sina- lizando a articulagao de segdes (uma garota comentou que o siléncio nos dé a chance de imaginarmos “‘o que vem depois”). O material ilustrado na figura 2-1 € extremamente simples. O que faz a diferenca € partirmos dos sons para delinear- MOs gestos expressivos e estruturas. Figura 2-1: Padrées de sons curtos, longos e siléncio Os primeiros passos sao bastante conhecidos: os alunos analisam ¢ léem os cartdes vocalmente ou utilizando instrumentos disponiveis. Praticam também a discriminagao auditiva reconhecendo cartées confeccionados pelo professor ou por um colega, podendo ainda grafar seqiiéncias ditadas. Leitura e reconhecimento sao etapas importantes e eficientes do processo da aprendizagem do ritmo. Mas ainda que sejam realizados de uma forma dinami- ca e musical, cuidando-se da qualidade sonora e do senso de participag’io em grupo, no sdo mais do que exercicios de leitura e reconhecimento, O problema é que, as vezes, damo-nos por satisfeitos com essas atividades e passamos em se- guida para outro contetido, encerrando 0 assunto, na verdade, quando poderiamos comegar a fazer mtisica. Se paramos nesse ponto estamos nos limitando ao nivel dos materiais sonoros. Talvez nem tenhamos percebido que nao € somente o para- metro duragao que est4 em jogo, mas também a altura, timbre e intensidade dos sons emitidos e as texturas resultantes das suas combinagoes. E necessario avancarmos além do parmetro duragao. Podemos sugerir que os alunos ordenem os cartdes como desejarem, dando forma a uma miisica. Nessa atividade aparentemente simples surgem oportunidades para escolhas seriamente artisticas e estéticas. Em grupos pequenos, as criangas tém a oportunidade de tomar decisées criativas: “com qual cartdo seria interessante comegar? Vamos deixar mais sons longos no inicio e depois aparecer com os curtos? E se virarmos alguns cartées na vertical para sobrepormos elementos? E 0 siléncio, onde deverd entrar?”. Questées analiticas sofisticadas como unidade, contraste, variagdo, em- bricagao, inversao e retrogradagao aparecem naturalmente, antecipando o apren- dizado formal e teérico das mesmas. Segue-se a exploracio sonora e a performan- ce da peca resultante conforme a intengdo expressiva dos alunos. Podemos pedir que selecionem instrumentos de percussio ou fontes sonoras nao convencionais; 0 proprio piano pode ser aberto, expondo as cordas ¢ a caixa de madeira, irresisti- 5 velmente convidativas. Deixamos que explorem livremente as possibilidades, cha- mando-lhes a atengdo para as qualidades expressivas de cada descoberta. Passamos a preciosa etapa da selegao das idéias. Um aluno pode se encantar pelos sons curtos tocados com baquetas na harpa do piano, no registro agudo e com intensidade piano. “E se estendermos 0 campo de sons curtos para além do registro agudo? E se variarmos a velocidade das batidas, produzindo adensamen- tos ritmicos? E se mudarmos a dindmica e o ataque? E que tal utilizarmos 0 pe- dal?” Inaugura-se aqui o trabalho consciente e intencional no nivel da expressivi- dade pelas escolhas no nivel dos materiais. Um som longo com crescendo grada- tivo, seguido do siléncio stibito e da entrada dos sons curtos em pianissimo, pro- duz nuances de expressividade de grande impacto. Esse é apenas um exemplo entre incontaveis possibilidades que diferentes fontes sonoras podem oferecer — do ziper de um porta-lépis a conjuntos de cordas A conseqiiéncia natural dessa exploragao expressiva é a escolha da suicessfio dos eventos, determinando-se a estrutura da peca. “Ela ser homogénea? Ou terd contrastes marcantes, com uma segio de cardter delicado e tranqiiilo antecedendo outra enérgica e impetuosa? Haver um retomo ao clima inicial’? Uma superposigao dos dois estados expressivos? O final ser stibito ou se deixard dissolver em ecos rarefeitos? A essa altura, 0 nivel de envolvimento dos alunos provavelmente ter ultra- passado a dimensio artistica e tocado a dimensio estética e simbélica. Aqui ha mais para se experimentar do que explicar. Observe-se que somente é possivel chegar a esse nfvel uma vez que se tenha passado pelas etapas anteriores. De que vale apren- der fatos e contetidos sendo para viver a aventura de nos engajarmos na conversagao musical, expressando nossa pr6pria voz? Tanto melhor se pudermos abrir outros canais da conversagao com a apreciagao de pecas como Snowforms de Schafer, a Aria da 4 Corda de Bach, ou pegas de Debussy & Ligeti nas quais a expluragio de curto ¢ longo € levada & extrema sofisticag’o, com resultados musicais completa- mente distintos. Cada experiéncia é tinica; nao hé receitas prontas nem bulas, ape- nas possibilidades que irdo se concretizar na interag&io com os alunos. 2.2.2 Teclas e temas No inicio do aprendizado de piano (ou qualquer outro instrumento) é preci- so aprender nomes de teclas, cordas, acordes etc. Podemos iniciar esse trabalho nas primeiras aulas, tomando como referéncia as teclas dé e fa, & esquerda dos grupos de duas e trés teclas pretas, e fixar as outras gradativamente. Podemos, por exemplo, utilizar estes cartées progressivos: a série I, com seqtiéncias de dé e fé; a série II, com dé, ré ¢ mi; a séric IL, com fa, sol, 14 ¢ si; ¢ a série TV, com quaisquer notas, como mostra a figura 2-2: I I ul IV TR nl ne all si-ta-t | merrell d6 - fa - fa - 6 || ré-mi-d6-ré| | si-la-fa- sol | ré-si-la-d6 I |] Figura 2-2: Séries progressivas para fixagio dos nomes das teclas Novamente é perigoso nos limitarmos ao treinamento de nomes de notas e teclas. Entretanto, nao é dificil converter esse exercicio em uma atividade de composigdo acessivel e delimitada (mas no limitada!). Os nomes escritos nos cartdes nao determinam a diregao dos intervalos entre os sons; tampouco indicam aspectos como registro, duragio relativa, intensidade, ataque ou arti- culag&o. Estes se convertem em uma lista de possibilidades para a exploragdo musical. Digamos que uma aluna esteja trabalhando com a série TV e toque varios cartées, explorando as diregdes dos intervalos (nao € raro os alunos acharem que devem se limitar 4 extensfo de uma oitava). Insisto nesse ponto porque tais escolhas alteram completamente o perfil melédico e delineiam contornos e frases. Com 0 mesmo cart&o pode-se ter motivos variados, seme- Ihantes ou quase irreconheciveis, gerando melodias com mais ou menos sal- tos, mais ou menos regulares. A figura 2-3 mostra como 0 cartio da série IV, acima, pode se transformar. ré si, ; 96 Figura 2-3: Motivos melédicos derivados Nesse momento, as notas dos cartdes se transformam em melodias ou mo- tivos. Podemos pedir A aluna que escolha dois cartées de sua preferéncia e expe- rimente andamentos, registros, padrées rftmicos, articulagdes, dindmica e re- cursos de pedal. Essas escolhas no nfvel dos materiais vio determinar de forma decisiva o carater expressivo. Também no € preciso se limitar aquelas melodias criadas; pode-se acrescentar um ostinato em quintas no grave ou ornamentos no agudo, por exemplo. Resta decidir sobre a organizagio das frases, explorando- se repetigdes ou contrastes. Um ostinato no grave, lento e contido, pode apare- cer como introdugao, depois retornar entre as segGes, articulando-as, ou ao fi- nal, fechando a idéia musical, com o motivo se dissolvendo na textura até desa- parecer. De uma forma ltidica e simples cumpre-se todo 0 ciclo do processo artistico, culminando em uma experiéncia significativa para a aluna, que tera absorvido da aula muito mais do que nomes de teclas podem oferever. Bla tera aprendido esse contetido e, principalmente, exercitado sua capacidade criativa e suas habilidades pianisticas. A medida que momentos assim se acumulam, vai- se construindo uma relacao profunda e duradoura com a misica; 0 individuo se apropria dela, sentindo-se parte da conversagao. Poderfamos ter encerrado a atividade tao logo a aluna tivesse decorado os nomes das teclas. Mas podemos ir mais longe, como no poema do inicio deste texto. 2.2.3 Padrées ritmicos Atividades de leitura, reconhecimento e escrita de padrées ritmicos pro- gressivos sfo trabalhadas exaustivamente e, nao raro, de forma pesada e pouco musical. Entretanto, o melhor que esses padres podem oferecer para o desenvol- vimento musical dos alunos é a possibilidade de se revestirem dos mais variados andamentos, perfis melédicos, articulagdes e outras tantas possibilidades. E no pulsar, na fluidez dos movimentos e no seu impulso vital que eles se transformam em misica. Qualquer padrio ritmico pode desencadear uma atividade musical- mente completa, envolvendo novamente a composigao. A estrutura abaixo (figura 2-4: exemplo musical 1), ainda que modesta, demanda uma especulagio artistica que vai além do exercicio ritmico. il mi mp 2. ML po for 4 og A oe om. mp > r r tod Figura 2-4: Exemplo musical 1: estrutura para composigao que utiliza ritmo composto Essa estrutura pode ser apresentada aos alunos para andlise e improvisagio vocal ou instrumental. Observam-se as notas repetidas e 0 salto ascendente ao final da frase sobre uma linha descendente e de fluxo mais lento. Os intervalos dos saltos, entretanto, nao so definidos, podendo sugerir desde um semitom a, talvez, uma décima. As primeiras escolhas, portanto, comecam a se delinear entre infindéyeis possibilidades. O motivo (frase A) realizado no registro agudo em andamento moderato e com intervalos consonantes produz um cariter dolce, pas- toral; experimentando-o grave, lento e forte, utilizando-se segundas e tritonos, com toda a frase emoldurada por um crescendo gradativo, temos outra musica! (e a estrutura que originou ambas mal pode ser reconhecida). F isso que os alunos precisam compreender sobre padrées ritmicos. Ao realizar grupos de quatro semi- culcheias, por exemplo, devem procurar transcender o mecanico “ta-ta-td-ta” e imagind-las “gitando em arabescos e caleidoscépios”. Passamos, entio, a explorar possibilidades para a frase B. Mantém-se a cé- lula de notas repetidas, semente da qual toda a estrutura foi gerada? Surge um novo motivo? Como sera a ligagao com a repetigdo da frase A? Haverd uma tlti- maa parte, seja ela repetigdo de B ou uma parte C? Quo contrastante deve ser a ultima frase’? Podemos ter um AA’ AB, ABAB’ ou ABAC e ainda um gesto inicial e uma coda. Esse esquema, trabalhado com dezenas de grupos, jd se transformou em pecas de caréter, estrutura e idiomas os mais variados, com predominancia do atonalismo. Optei por transcrever aqui uma das pecas mais simples, composta por uma aluna de 11 anos de idade (figura 2-5: exemplo musical 2). A idéia surgiu quase instantaneamente. A pega é extremamente pianistica e de facil leitura e, por isso, tornou-se repertério de performance para outras criangas iniciantes. | | | | Figura 2-5: Exemplo musical 2: balada | Dada a simplicidade, o carater delicado, a clareza estrutural e a coesio da pega, resolvemos dar continuidade ao trabalho por meio de um projeto de varia- oes. Alimentados pela apreciacao de variagées (de Elgar ou Beethoven) e arran- jos (como O Trenzinho do caipira e Na baixa do sapateiro), os alunos compuse- ram suas variagdes para a pega, tomando decisées sobre uma gama de possibilida- des expressivas e estruturais. Em algumas, o fluxo ritmico das vozes se inverteu, com 0 acompanhamento ficando mais rapido e a melodia caminhando a passos lentos ou fragmentada por pausas irregulares. Depois, organizamos os temas € variag6es de cada turma, decidindo sobre a seqiiéncia musicalmente mais interes- sante para as mesmas. Partir da leitura ritmica e chegar a esse ponto € como ter a revelacdio de que a Terra € redonda! 2.2.4 Semitons O aprendizado de tons e semitons envolve atividades de fixacao visual auditiva, utilizando-se 0 teclado e a harpa do piano ou 0 metalofone cromatico, além da enarmo- nia com nomes das notas e destas no pentagrama. Esse processo demanda tempo e pode facilmente se tomar tedioso, a menos que seja ventilado com experiéncias intrinseca- 59 mente musicais de criagio e apreciagao. Muitas pecas exploram semitons em appoggi- aturas ou em frases espiraladas, sugerindo tensio, hesitacdo, melancolia ou leveza. Va- rios eventos com conotagGes expressivas caracteristicas podem ser experimentados em improvisages ou composigGes mais refinadas. Na composigao transcrita a seguir (figu- ra 2-6: exemplo musical 3), a aluna explorow a idéia do semitom com um forte senso especulativo. Um ostinato tenso em semitons pulsa no registro grave preparando a entra- da do tema, um motivo dramatico que explora a expressividade da sincope. Apés apre- senté-lo e reiter4-lo, ela comega a desenvolver uma frase ascendente que ganha corpo coma oulla indo se juntando em unissuno € que depois desce alé a cadéncia, que allema tensao e relaxamento com ténica e dominante. O ostinato retoma com a mio direita conduzindo o tema para registros progressivamente agudos até o gesto final, ritardando, calando. Todo 0 processo de criagdo durou menos de 20 minutos. Passados meses, ainda relutévamos em fazer a transcrig&io da peca pois, na partitura, uma idéia tao forte e expressiva parece inerte como a borboleta espetada no alfinete. Figura 2-6: Exemplo musical 3: composigdo sobre “semitom” Essa pega foi composta por uma aluna de 12 anos extremamente timida que, ao ter a oportunidade de compor, produziu algo diferenciado e imaginativo, mos- trando-se muito a vontade para explorar os extremos grave e agudo do piano. Ela testemunha o poder da mtisica como uma forma de articulagiio simbélica da nossa experiéncia no mundo. 2.3 CONSIDERACOES FINAIS As atividades aqui relatadas retratam o desejo de estar com os alunos e com a miisica de uma forma inteira, legitima e musical. So encontros celebrados pelas metamorfoses dos sons em estruturas relacionadas entre si €, a0 mesmo tempo, com nosso repert6rio simbélico particular. A percepgdio de cada um desses elementos é moldada pela nossa complexa rede de representagao que, por sua vez, é enriquecida e refinada por essas novas experiéncias. Por isso, a misica tem o poder de nos envolver e mover tio profundamente, mobilizando e elaborando nossa vida intelec- tual e afetiva como nenhuma outra forma de conhecimento. Ao nos engajarmos no fazer musical, podemos participar de uma forma de discurso altamente organizado, refinado e significativo. Abrem-se novas possibilidades de articulagdo expressiva, ampliando-se nosso repert6rio simbélico. Isso toma a misica uma poderosa voz entre aquelas que formam essa dinamica conversagio na qual estamos inseridos. Diria, junto com Beto Guedes e Ronaldo Bastos: “A ligdo sabemos de cor, s6 nos resta aprender”... Que essas palavras nao sejam vazias para que os sons se transfor- mem em poemas, cumprindo sua missao simbélica. 2.4 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS BISNER, Elliott. The polite place of the arts in American higher education. Liberal Educa- tion, v. 75, n. 2, 1989. GREEN, Lucy. Music on deaf ears: musical meaning, ideology and education. 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