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Capítulo 51 A 59
Capítulo 51 A 59
* * »
porém fingiu que era um ser humano comum assustado com a imensa quanti
dade de soldados e recursos de Jarãsandha. Ele deixou o campo de batalha sem
nenhuma arma. Apesar de Seus pés de lótus serem suaves como as pétalas da
flor de lótus, Ele prosseguiu a pé por uma longa distância.
Desta vez, Jarãsandha pensou que Krsna e Balarãma estavam com muito
medo da força militar dele e que estavam fugindo do campo de batalha. Ele
pôs-se a persegui-Los com todas as suas quadrigas, cavalos e infantaria. Ele pen
sava que Krsna e Balarãma eram seres humanos comuns e estava tentando me
dir as atividades do Senhor. Krsna é conhecido como Ranchor, que significa
“aquele que deixa o campo de batalha.” Há muitos templos de Krsna na índia,
especialmente em Gujarat, que são conhecidos como templos deRanchorji,
Normalmente, se um rei deixa o campo de batalha sem lutar, ele é chamado de
covarde; porém, quando Krsna desempenha este passatempo, deixando o cam
po de batalha sem lutar, o devoto O adora. Um demônio sempre tenta medir a
opulência de Krsna, ao passo que o devoto jamais tenta medir Sua (de Krsna)
força e opulência, senão que sempre se rende a Ele e O adora. Se seguirmos os
passos de devotos puros poderemos saber que Krsna, o Ranchorjl, não deixou
o campo de batalha porque estava com medo, mas porque tinha alguma outra
intenção. Como se vai revelar, Ele tinha a intenção de esperar uma carta
confidencial enviada por Rukmini, Sua futura primeira esposa. O ato de Krsna
ter deixado o campo de batalha é uma exibição de uma das seis opulências
dTile. Krsna é o poderoso supremo, o rico supremo, o famoso supremo, o sá
bio supremo, o belo supremo; similarmente, Ele é o renunciante supremo. O
Srlmad-Bhãgavatam afirma claramente que Ele deixou o campo de batalha
apesar de ter uma grande força militar. Contudo, até mesmo sem Sua milícia,Ele
sozinho teria sido suficiente para derrotar o exército de Jarãsandha,como havia
feito dezessete vezes antes. Portanto, o ato d’Ele deixar o campo de batalha
constitui um exemplo de Sua super opulência de renúncia.
Após atravessarem uma longa distância, os irmãos fingiram que estavam
muito cansados. Para poderem mitigar Sua fadiga, Eles subiram numa monta
nha muito alta, que se encontrava a vários quilômetros acima do nível do mar.
Esta montanha se chamava Pravarsana, 'por causa da chuva constante. O pico
estava sempre coberto pelas nuvens que Indra mandava. Jarãsandha tomou
por certo que os dois irmãos estavam com medo de seu poder militar e
tinham Se escondido em cima da montanha. Primeiro ele tentou encontrá-
Los, procurando-Os durante muito tempo, mas como não conseguisse decidiu
apanhá-Los em armadilha e matá-Los, pondo fogo em volta do pico. Assim
ele rodeou o pico com óleo e deitou-lhe fogo. Como a chama se espalhasse
cada vez mais, Krsna e Balarãma pularam de cima da montanha para o solo
— uma distância de cento e quarenta quilômetros. Assim, enquanto o
358 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
fogo consumia o pico, Krsna e Balarãma escaparam sem que Jarãsandha Os vis
se. Jaxãsandha concluiu que os dois irmãos tinham sido reduzidos a cinzas e
que não havia mais necessidade de lutar. Como pensasse que saíra exitoso em
seus esforços, ele deixou a cidade de Mathurã e regressou a sua casa no reino
de Magadha. Aos poucos, Krsna e Balarãma chegaram à cidade de Dvãrakã, que
era cercada pelo mar por todos os lados.
Depois disto, Sri Balarãma casou-Se com RevatI, a filha do rei Raivata, o
governante da província Ãnarta. Isto está explicado no Nono Canto do
Srimad-Bhãgavatam. Após o casamento de Baladeva, Krsna casou-Sc com
RukminT. RukminT era a filha do rei BlíTsmaka, o governante da província co
nhecida como Vidarbha. Assim como Krsna é a Suprema Personalidade de
Deus, Vasudeva, da mesma forma RukminT é a suprema deusa da fortuna,
Mahã-LaksmT. Segundo a autoridade do Caitanya-caritãyfírta, a expansão de
Krsna e Srí RãdhãrãnT é simultânea; Krsna Se expande em diversas formas de
Visnu-tattva e SrTmafí RãdhãrãnT Se expande em diversas formas de sakti-
tattva por intermédio de Sua (d Ela) potência interna, como formas múltiplas
da deusa da fortuna.
Segundo a convenção védica, há oito tipos de casamentos. No sistema de
casamento de primeira classe, os pais do noivo e da noiva arranjam a data do
casamento. Depois, seguindo o estilo real, o noivo vai para a casa da noiva, e
alí a noiva é dada em caridade ao noivo na presença dos brahmanas, sacerdotes
e parentes. Além deste, há outros sistemas, tais como os casamentos de
gandharvas e de rãksasas. Krsna casou-Se com RukminT segundo o estilo
rãksasa porque raptou-a na presença de Seus muitos rivais, tais como Sisupãla,
Jarãsandha, Sãlva e outros. No momento em que davam RukminT em caridade
a Sisupãla, Krsna a agarrou subitamente da arena do casamento, exatamente
como Garuda agarrou o vaso de néctar da mão dos demônios. RukminT, a filha
única do rei Bhlsmaka, era extremamente bela. Ela era conhecida como
Rucirãnanã, que significa “aquela que tem um belo rosto, o qual se expande
como uma flor de lótus.”
Os devotos de Krsna estão sempre ansiosos por ouvir falar nas atividades
transcendentais do Senhor. As atividades em que Ele luta, rapta e foge do cam
po de batalha são completamente transcendentais, pois estão na plataforma
absoluta, sendo que os devotos tem um interesse transcendental em ouvi-las. O
devoto puro não faz a distinção de que devemos ouvir algumas atividades do
Senhor e evitar outras. Contudo, há uma classe de assim chamados devotos, co
nhecidos como prakrta sahafiyãs, que estão muito interessados em ouvir falar
na rasa lllã de Krsna com as gopTs, mas que não têm interesse em ouvir falar
nas atividades em que Ele luta com Seus inimigos. Eles não sabem que as ativi
dades belicosas de Krsna e as atividades amistosas d Ele com as gopTs são igual
mente transcendentais, visto que estão na plataforma absoluta. Os devotos
Krsna, o Ranchor 359
brãhmana não deve jamais se deixar perturbar com nenhuma das condições
adversas da vida, caso se mantenha escrupulosamente fiel a seus princípios reli
giosos. Em conclusão, o Senhor SrT Krsna disse: “Ofereço Minhas respeitosas
reverências aos brãhmanas e Vaisnavas, porque os brãhmanas estão sempre
satisfeitos com eles mesmos, e os Vaisnavas estão sempre ocupados nas verda
deiras atividades beneficentes para a sociedade humana. Eles são os melhores
amigos das pessoas em geral; tanto os brãhmanas quanto os Vaisnavas estão
livres do falso egoísmo e vivem sempre num estado de espírito pacifico.”
Então o Senhor Krsna desejou saber a respeito dos governantes
0ksatriyas) que viviam no reino do brãhmana, e por isso perguntou se todos os
cidadãos do reino eram felizes. Podemos julgar a competência de um rei pelo
temperamento das pessoas que vivem no reino. Se elas são muito felizes em
todos os aspectos, deve-se compreender que o rei é honesto e executa seus de
veres corretamente. Krsna disse que o rei em cujo reino os cidadãos são felizes
é muito querido para Ele. Naturalmente, Krsna pôde compreender que o
brãhmana viera trazendo uma mensagem confidencial; assim, Ele disse: “Se
você não tem objeções, dou-lhe permissão para falar a respeito de sua missão.”
Sentindo-se assim muito satisfeito com estes passatempos transcendentais com
o Senhor, o brãhmana narrou toda a história de sua missão de vir ver Krsna.
Ele tirou a carta que RukminT escrevera para Krsna e disse: “Estas são as pa
lavras da princesa RukminT: ‘Meu querido Krsna, ó infalível e super belo, qual
quer ser humano que acontece de ouvir falar em Sua forma e em Seus passa
tempos transcendentais, absorve imediatamente através dos ouvidos o Seu
nome, a Sua fama e as Suas qualidades; deste modo todas as dores materiais
dele abrandam e ele fixa Sua forma no coração. Através deste amor transcen
dental que ele sente por Você, ele sempre O vê dentro de si mesmo; e com este
processo todos os desejos dele são satisfeitos. Similarmente, ouvi falar em Suas
qualidades transcendentais. Pode ser que eu seja impudente por me exprimir
tão diretamente, porém Você me cativou e tomou meu coração. Talvez você
suspeite que eu sou uma moça solteira, de idade jovem, e talvez duvide de
minha firmeza de caráter; porém, meu querido Mukunda, Você é o leão supre
mo entre os seres humanos, a pessoa suprema entre as pessoas. Qualquer moça,
mesmo que ainda não esteja fora de casa, ou qualquer mulher que talvez seja
muito casta, desejaria casar-se com Você, por se sentir cativada por Seu
caráter, conhecimento, opulência e posição sem precedentes;Sei que Você é o
esposo da deusa da fortuna e que Você é muito amável com Seus devotos; por
isso, decidi tornar-me Sua criada-eterna. Meu querido Senhor, dedico minha
vida e minha alma a Seus pés de lótus. Aceito Sua Onipotência como meu es
poso escolhido, e por isso peço-Lhe que me aceite como Sua esposa. Você é o
poderoso supremo, ó Senhor de olhos de lótus. Agora Lhe pertenço. Se o
chacal roubar aquilo que o leão gosta de comer, isto será ridículo; por isso,
362 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
peço-Lhc que tome conta de mim imediatamente antes que eu seja levada por
Sis'upãla ou outros príncipes como ele. Meu querido Senhor, talvez em minha
vida anterior eu tenha feito obras bcneficèntés para o público tais como cavar
poços e plantar árvores, ou atividades piedosas tais como executar cerimônias
ritualisticas c sacrifícios e servir ao mestre espiritual superior, aos brahmanas e
aos Vaisnavas. Talvez eu tenha satisfeito Nãrãyana, a Suprema Personalidade
de Deus, com essas atividades. Se este é o caso, então desejo que Você, Senhor
Krsna, o irmão do Senhor Balarãma, venha aqui, por favor, e agarre minha mão
para que Sisupãla e sua companhia não possam tocar em mim.’ ”
Já haviam determinado que. RukminT se casaria com Sisupãla; por isso, ela
sugeriu que Krsna a raptasse para que isto se alterasse. Este tipo de casamento,
cm que a moça é raptada à força, c conhecido como rãksasa c c praticado entre
os ksatriyas, ou os administradores, os homens com espírito marcial. Como já
haviam arrumado para que o casamento dela ocorresse no dia seguinte,
RukminT sugeriu que Krsna aparecesse ali incógnito para raptá-la' c depois lu
tasse com Sisupãla e os aliados deste, como, por exemplo, o rei de Magadha.
Como sabia que ninguém podia conquistar Krsna e que Ele certamentc sairia
vitorioso, ela O chamou dc Ajita - o inconquistável. RukminT disse a Krsna
que Ele não Se preocupasse com o fato de que talvez muitos dos membros da
família dela, incluindo outras mulheres, fossem feridos ou ate mesmo mortos
se a luta ocorresse dentro do palácio. Assim como o rei de um país pensa em
meios diplomáticos para atingir seu objetivo, similarmente RukminT, que era
filha de um rei, agiu com diplomacia para sugerir como se podia evitar esta ma
tança desnecessária e indesejável.
Ela explicou que antes dc um casamento a família dela costumava visitar
o templo da deusa Durgã, a deidade da família. (A maioria dos reis ksatriyas
eram Vaisnavas fiéis, que adoravam o Senhor Visnu na forma de Rãdhã-Krsna
ou na forma de LaksmT-Nãrãyana; no entanto, costumavam adorar a deusa
Durgã para conseguirem bem-estar material. Contudo, jamais cometeram o
erro de aceitarem que os semideuses são o Senhor Supremo, ao nível do
Visnu-tattva, como faziam alguns homens pouco inteligentes.) A fim dc evitar
u matança desnecessária dc seus parentes, RukminT sugeriu que seria mais fácil
Ele raptá-la ou enquanto ela estivesse indo do palácio para o templo, ou então
enquanto estivesse regressando ao lar.
Ela também explicou a Krsna a razão porque estava tão ansiosa por-se
casar com Ele, muito embora devesse se casar com Sisupãla, o qual também era
competente, pois era filho dc um grande rei. RukminT disse que não achava
ninguém superior a Krsna, nem mesmo o Senhor Siva, que é conhecido como
Mahãdeva, o maior dc todos os semideuses. O Senhor Siva também busca o
prazer do Senhor Krsna para se libertar de seu enredamento na qualidade da
ignorância dentro do mundo material. Apesar do fato do Senhor Siva ser a
Krsna, o Ranchor 363
maior de todas as grandes almas, mahãtmãs, sobre sua cabeça ele mantém a
água purificadora do Ganges, que emana de um orifício que existe neste uni
verso material feito pelo dedo do pé do Senhor Visnu. O Senhor Siva está en
carregado da qualidade material dg. ignorância, e sempre medita no Senhor
Visnu para manter-se numa posição transcendental. Por isso, Rukmini sabia
muito bem que não é fácil obter o favor de Krsna. Se até o Senhor Siva tem
que se purificar para esta finalidade, por certo que seria difícil para Rukmini, a
qual era apenas a filha de um rei ksatriya. Deste modo, ela desejou dedicar sua
vida a observar austeridades e penitências severas, tais como jejuar e viver sem
confortos corpóreos. Se não conseguisse obter o favor de Krsna nesta vida por
intermédio destas atividades, ela estava pronta a fazer o mesmo vida após vida.
No Bhagavad-gitã se diz que bs devotos puros do Senhor executam serviço de-
vocional com grande determinação. A determinação que RukminTdevi mos
trou é o único preço para poder se comprar o favor de Krsna e é o caminho
para se alcançar o sucesso último na consciência de Krsna.
Após explicar a declaração de RukminTdevi a Krsna, o brahmana disse:
“Meu querido Krsna, chefe da dinastia Yadu, trago-Lhe esta mensagem confi
dencial de Rukmini, que agora se encontra diante de Você para Sua considera
ção. Depois de deliberar devidamente, Você pode atuar como quiser, mas se
quiser fazer algo, tem que fazê-lo imediatamente. Não resta muito tempo para
agir.”
Neste ponto encerra-se ü significado Bhaktivedaríta do Capítulo Cin-
qüenta e Um de Krsna, intitulado (‘Krsna, o Ranchor. JJ
52/ Krsna rapta Rukmim
• • • ■*- •
mil e quinhentos quilômetros os separa, mas os cavalos eram tão rápidos que
chegaram a seu destino, uma cidade conhecida como Kundina, dentro de uma
noite, ou, quando muito, doze horas.
O rei BhTsmaka não estava muito entusiasmado para dar a mão de sua fi
lha a Sisuplla, porém foi obrigado a aceitar a decisão do casamento por causa
do apego afetuoso que sentia por seu filho mais velho, o qual havia negociado
o casamento. Por uma questão de dever, ele estava decorando a cidade para a
cerimôni^ do casamento e estava atuando com grande seriedade para que a
cerimônia resultasse exitosa. Em todas as ruas se esborrifou água e a cidade es
tava muito bem limpa. Uma vez que a índia está situada na zona tropical, a
.atmosfera é sempre seca. Por causa disto, a poeira sempre se acumula nas ruas
*e estradas; de modo que pelo menos uma vez por dia deve-se borrifá-las com
água, e em cidades grandes como Calcutá, pelo menos duas vezes. As estradas
de Kundina foram arranjadas com bandeiras e festões coloridos e em certos
cruzamentos construiram portões. Toda a cidade estava muito bem decorada.
A beleza da cidade se intensificava com os habitantes, tanto os homens quanto
as mulheres, que estavam vestidos com roupas limpas, enfeitados com polpa de
sândalo, colares de pérola e guirlandas de flores. Em toda a parte havia incen
so queimando, e o ar estava perfumado com fragrancias como o aguru. Alimen
taram suntuosamente aos sacerdotes e brõhmanas e, de acordo com a cerimô
nia ritualistica, deram-lhes riqueza e vacas suficientes em caridade. Dessa
maneira, eles se dedicaram a cantar hinos védicos. RukminI, a filha do rei,
estava extremamente bela. Ela era muito limpa e tinha dentes bonitos. O
auspicioso cinturão sagrado envolvia-lhe a cintura. Deram-lhe diversos tipos de
jóias para usar e um longo tecido de seda para cobrir as partes superior e
inferior do corpo. Sacerdotes eruditos deram-lhe proteção cantando mantras
do Sãma Veda, do Rg Veda e do Yajur Veda. Depois disso eles cantaram
mantras do Atharva Veda e ofereceram oblaçÕes ao fogo para apaziguar as
conjunções de mau agouro de diferentes estrelas.
Quando ocorriam tais cerimônias, o rei BhTsmaka tinha muita experiência
em lidar com os brõhmanas e os sacerdotes. Ele distinguia especificamente os
brõhmanas, dando-lhes grandes quantidades de ouro e prata, grãos misturados
com melaços, e vacas decoradas com ornamentos dourados. Damaghosa, o pai
de Sis'up2la, executava todos os tipos de execuções ritualisticas, com o fim de
invocar a boa fortuna para sua própria família. O pai de Sislipãla era conhecido
como Damaghosa por causa de sua grande habilidade em diminuir cidadãos
desregulados. Dama significa diminuir e ghosa significa famoso; de modo que
ele era famoso por controlar os cidadãos. Damaghosa pensou que se Krsna
viesse perturbar a cerimônia de casamento, certamente ele O cortaria com seu
poder militar. Assim, após executar as diversas cerimônias auspiciosas,
Damaghosa reuniu suas divisões militares, conhecidas como Madasravi. Ele
366 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
eles tivessem ficado irados e tivessem tentado frustrar o plano dela. Similar
mente, ela pensou que talvez a deusa Durgã, a esposa do Senhor S~íva, tivesse
tomado o partido de seu esposo. O Senhor Siva c conhecido como Rudra e sua
esposa é conhecida como Rudrãnl. RudrãnT c Rudra aplicam-se àqueles que
estão muito habituados a pôr outras pessoas num estado aflito para que elas
chorem para sempre. Rukminl estava pensando que a deusa Durgã era Girijã,
a filha das montanhas dos Himalaias. As montanhas dos Himalaias são muito
frias e duras, e RukminT considerava a deusa Durgã impiedosa e fria. Em sua
ansiedade por ver Krsna, RukrmnT, que afinal de contas ainda era uma criança,
pensou dessa maneira a respeito dos diferentes scmidcuscs. As gopls adoraram
a deusa KãtyãyanT para obter Krsna como esposo; similarmente, RukminT es
tava pensando nos diversos tipos de semideuses, não para alcançar benefícios
materiais, mas sim em relação com Krsna. Não ê irregular orar aos scmidcuscs
para se alcançar o favor de Krsna, e RukminT estava totalmente absorta pen
sando em Krsna.
Embora se pacificasse pensando que ainda não expirara o prazo para
Govinda chegar, RukminT sentia que estava esperando por uma coisa irreali-
zável. Ela começou a verter lágrimas e. quando o choro se intensificou, fechou
os olhos, desamparada. Enquanto RukminT se encontrava mergulhada neste
pensamento profundo, apareceram sintomas auspiciosos em diferentes partes
de seu corpo. Sua pálpebra esquerda c seus braços e coxas começaram a tre
mer. Quando ocorre tremor nessas partes do corpo, este c um sinal auspicioso
que indica que podemos contar com algo lucrativo.
Foi precisamente então que RukminT, cheia de ansiedade, viu o mensagei
ro brãhmana. Como é a Supcralma de todos os seres vivos, Krsna pôde perce
ber a ansiedade de RukminT; por isso, mandou que o brãhmana entrasse no
palácio para que ela ficasse sabendo que Ele (Krsna) tinha chegado. Ao ver o
brãhmana, RukminT pôde compreender o tremor auspicioso de seu corpo e se
extasiou imediatamente. Ela sorriu e perguntou ao mensageiro se Krsna já
tinha chegado ou não. O brãhmana respondeu que SrT Krsna, o filho da dinas
tia Yadu, tinha chegado, c animou-a ainda, dizendo que Krsna prometera levá-
la sem falta. RukminT ficou tão extasiada com a mensagem do brãhmana que
quis dar-lhe tudo que possuía em caridade. Contudo, como não encontrasse
nada adequado que pudesse presentear, ela simplesmente ofereceu-lhe suas
respeitosas reverências. O significado dc se oferecer respeitosas reverências a
um superior ê que a pessoa que oferece as reverências agradece á pessoa res
peitada. Em outras palavras, RukminT deu a entender que permanecería
eternamente grata ao brãhmana. Qualquer pessoa que obtêm o favor da deusa
da fortuna, como aconteceu com este brãhmana, fica sem dúvida sempre
feliz na opulência material.
368 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
espada e precipitou-se bem rápido em direção a Krsna, assim como uma mosca
que se dirige para um fogo. Assim que Rukml se aproximava de Krsna, Krsna
cortava-lhe a arma em pedaços. Dessa vez, Krsna tirou-lhe a espada afiada e já
estava pronto para matá-lo imediatamente; porém, Rukminl, a irmã de Rukml,
compreendendo que dessa vez Krsna não perdoaria seu irmão, caiu aos
pés de lótus de Krsna e começou a rogar a seu esposo num tom muito aflito,
tremendo com grande medo.
Primeiramente Rukminl chamou Krsna de “Yogesvara.” Yogesvara signi
fica aquele que possui opulência e energia inconcebíveis. Krsna possui opulên
cia e energia inconcebíveis, ao passo que o irmão de Rukminl tinha apenas
uma potência militar limitada. Krsna é incomensurável, ao passo que o irmão
dela era medido a cada passo de sua vida. Portanto, Rukml não era nem sequer
comparável a um inseto insignificante diante do poder ilimitado de Krsna. Ela
também chamou Krsna de o Deus dos deuses. Existem muitos semideuses po
derosos, tais como o Senhor Brahma, o Senhor Siva, Indra e Candra; Krsna é
o Senhor de todos estes deuses, enquanto que o irmão de Rukminl era não
apenas um ser humano comum, como também, de fato, o mais baixo de todos
os seres humanos, porque não tinha nenhuma compreensão de Krsna. Em ou
tras palavras, um ser humano que nao tem idéia alguma da posição verdadeira
de Krsna é o mais baixo na sociedade humana. Rukminl também chamou
Krsna de “Jagatpati”, o senhor de toda a manifestação cósmica. Comparado a
Jagatpati, o irmão dela não passava de um príncipe ordinário.
Dessa maneira, Rukminl comparou a posição de Rukmí à de Krsna e com
muito sentimento rogou a seu esposo que não matasse seu irmão exatamente
antes do momento auspicioso em que ela ia se unir com Krsna; assim, ela pediu
que Krsna perdoasse seu irmão. Em outras palavras, ela exibiu sua verdadeira
posição como uma mulher. Ficou feliz de conseguir Krsna como seu esposo
bem no momento em que se ia executar o casamento dela com outro, mas não
queria que isso prejudicasse seu irmão mais velho, que, afinal de contas,
amava sua jovem irmã e quis dar a mão dela a uma pessoa que era, segundo os
próprios cálculos dele, um homem melhor. Enquanto Rukminl suplicava a
Krsna pela vida de seu irmão, todo o corpo dela tremia, seu rosto parecia estar
seco por causa da ansiedade, sua garganta ficou sufocada, e, por estar tremen
do, os ornamentos que havia em seu corpo afrouxaram e caíram, espalhados
no chão. Imediatamente, o Senhor Krsna sentiu compaixão e concordou em
não matar o tolo Rukml. Porém, ao mesmo tempo, quis dar-lhe algum castigo
leve, de modo que o atou com um pedaço de pano e cortou-lhe o bigode, a
barba e o cabelo, com uma tesoura, deixando algumas manchas aqui e ali.
Enquanto Krsna lidava com Rukml dessa maneira, os soldados da dinas
tia Yadu comandados pelo próprio Balarãma, irromperam toda a foiça do
exército de Rukml assim como um elefante num reservatório desfaz o débil
376 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
caule de uma flor de lótus. Em outras palavras, assim como um elefante irrom
pe toda a construção de uma flor de lótus enquanto se banha num reservatório
d ’água, da mesma forma a força militar dos Yadus decompôs a força de
Rukrní. Contudo, ao regressarem para ver Krsna, os comandantes da dinastia
Yadu ficaram surpresos quando viram o estado em que se encontrava RukmT. O
Senhor BalarSma sentiu compaixão especial por Sua cunhada, a qual recém -
casara-se com o irmão d’Ele. A fim de agradar RukminI, Balarãma desamarrou
RukmT pessoalmente, e para agradá-la ainda mais,.Balarãma assumiu a posição
do irmão mais velho de Krsna e falou-Lhe algumas palavras de punição. “Krsna, o
que Você fêz não é absolutamente satisfatório”, disse Ele. “Isto é uma abomi-
nação que é muito contrária à tradição de Nossa família! Cortar o cabelo de al
guém e raspar-lhe o bigode e a barba é quase comparável a matá-lo. Não impor
ta o que RukmT possa ter sido, agora ele é Nosso cunhado, uma parente de
Nossa família, de modo que Você não devia tê-lo colocado em tal estado.”
Depois disso, o Senhor Balarãma falou as seguintes palavras para tran-
qüiüzar RukminI: “Você não devia se lamentar só porque seu irmão ficou com
uma aparência muito estranha. Todos sofrem ou desfrutam os resultados de
suas próprias ações.” 0 Senhor Balarãma quis convencer RukminI de que ela
não devia ter se lamentado pelas conseqüências sofridas pelo irmão devido às
ações dele. Não era necessário sentir tanta afeição por um irmão como esse. O
Senhor Balarãma voltou-Se outra vez para Krsna e disse: “Meu querido Krsna,
um parente deve ser perdoado mesmo que cometa um disparate tal que mereça
ser morto. Pois quando um parente assim se conscientiza de seu próprio erro,
esta consciência em si é como a morte. Portanto, não é necessário, matá-lo.”
Balarãma voltou-Se outra vez para RukminI e lhe disse que, de acordo com os
princípios da luta, o dever corrente do ksatriya na sociedade humana é fixado
de tal modo que nosso próprio irmão pode tornar-se um inimigo no lado opos
to. Um ksatriya não hesita em matar seu próprio irmão. Em outras palavras, o
Senhor Balarãma quis instruir RukminI de que Rukml e Krsna estavam certos
por não terem mostrado misericórdia um pelo outro durante a luta, apesar da
consideração familiar de que eram cunhados. Sri Balarãma continuou dizendo a
RukminI que os ksatriyas são os emblemas típicos do modo de vida materia
lista; sempre que há uma questão de aquisição material eles se inflam de orgu
lho. Portanto, quando dois ksatriyas beligerantes lutam entre si por causa de
reino, terra, riqueza, mulheres, prestígio ou poder, eles tentam um pôr o outro
no estado mais abominável. Balarãma instruiu RukminT de que a afeição dela
para com seu irmão Rukml, o qual criara inimizade com tantas pessoas, era
uma consideração perversa própria de uma pessoa materialista comum. O
caráter do irmão dela não era adorável em absoluto, se consideramos o jeito
como ele tratava outros amigos; e mesmo assim RukminI, como uma mulher
Krsna derrota todos os príncipes e leva RukminI para Dvãrakã 377
comum, sentia tanta afeição por ele. Apesar dele não merecer ser irmão de
RukminI, esta ainda era clemente para com ele.
“Além disso”, continuou Balarãma, “de um modo geral são as pessoas
que estão no conceito de vida corpóreo, que consideram que uma pessoa é neu
tra ou é amiga ou inimiga dela. Tais pessoas tolas se confundem com a energia
ilusória do Senhor Supremo. A alma espiritual tem a mesma qualidade pura em
qualquer corporificaçao de matéria que se encontre, mas aqueles que não são
suficientemente inteligentes só veem as diferenciações corpóreas que cobrem a
alma espiritual pura — animais e homens, letrados e iletrados, ricos e pobres e
assim por diante. Tal diferenciação, observada puramente com base no corpo,
é exatamente como a diferenciação que se faz entre fogos em termos dos di
ferentes tipos de combustível que eles consomem. Não importa qual seja o ta
manho e a forma do combustível, para o fogo que sai tal variedade de tamanho
e forma não existe. Similarmente, no céu não há diferenças de tamanho ou de
forma.”
Dessa maneira, Balarãma os aplacou com Suas instruções morais e éticas.
Ele disse ainda: “Este corpo faz parte da manifestação material. Devido ao go
zo ilusório, a entidade viva ou alma espiritual que está em contato com a maté
ria transmigra de um corpo para outro, e isto é conhecido como a existência
material. Este contato que a entidade viva tem com a manifestação material
não tem integração nem desintegração.Minha querida e casta cunhada, natural
mente a alma espiritual é a causa deste corpo material, da mesma forma que o
sol é a causa da luz do sol, da visão e das formas da manifestação material. O
exemplo do brilho do sol e da manifestação material é muito apropriado para
que compreendamos o contato das entidades vivas com este mundo material.
De manhã o sol nasce, e gradualmente o calor e a luz se expandem durante
todo o dia. O sol é a causa de toda a produção material e das formas e aparên
cias; é por causa do sol que ocorrem a integração e desintegração dos elemen
tos materiais. Mas assim que o sol se p õ e, a manifestação cósmica inteira já
não tem ligação com o sol, que passa de um lugar para outro. Quando o sol
passa do hemisfério oriental para o ocidental, permanece o resultado da inte
ração causada pelo brilho do sol no hemisfério oriental, mas o brilho do sol em
si pode ser visto outra vez no hemisfério ocidental. Similarmente, a entidade
viva aceita ou produz diferentes corpos e diferentes relações corpóreas em de
terminada circunstância, mas logo que abandona o corpo atual e aceita outro
corpo, já não tem nada a ver com o corpo anterior. Similarmente, a entidade
viva não tem nada a ver com o corpo seguinte que ela aceitar. Ela está sempre
livre do contato com esta contaminação corpórea. Portanto, a conclusão é que
o aparecimento e o desaparecimento do corpo não têm nada a ver com a enti
dade viva, da mesma forma que o crescer e o diminuir da lua não têm nada a
378 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
ver com a lua. Quando a lua cresce pensamos falsamente que a lua está se de
senvolvendo, e quando a lua diminui pensamos que a lua está decrescendo. Na
verdade, a lua, como ela é, é sempre a mesma: ela náo tem nada a ver com tais
atividades visíveis de crescimento e decrescimento.
“Podemos comparar a consciência da existência material com o sono e o
sonho. Quando um homem dorme, ele sònha com muitos acontecimentos
irreais, e como resultado do sonho sujeita-se a diferentes tipos de aflição e feli
cidade. Similarmente, quando uma pessoa se encontra no estado onírico de
consciência material, ela sofre os efeitos de ter aceitado um corpo e tê-lo aban
donado outra vez na existência material. Em oposição a esta consciência mate
rial está a consciência de Krsna. Em outras palavras, quando um homem se ele
va à plataforma da consciência de Krsna, ele se livra desta concepção falsa de
vida.”
Dessa maneira, Srl Balarama os instruiu a respeito do conhecimento espi
ritual. Ele disse o seguinte a Sua cunhada: “Doce e sorridente Rukmini, não se
aflija com motivos falsos causados pela ignorância. É so'por causa de noções
falsas que nos tornamos infelizes, mas podemos remover esta infelicidade ime
diatamente se discutimos a filosofia da vida verdadeira. Simplesmente seja feliz
nesta plataforma.”
Depois de ouvir Sr! Balarama falando essas instruções tão esclarecedoras,
RukminT imediatamente se tranqüilizou, ficou feliz e harmonizou seu estado
de espírito, que era de muita aflição por ela ter visto a posição degradada de
Rukmi, seu irmão. Quanto a Rukml, este não cumpriu com sua promessa nem
tampouco saiu exitoso em sua missão. Ele viera de casa com seus soldados e
falange militar para derrotar Krsna e libertar sua irmã; porém, pelo contrário,
perdera todos os soldados e a força militar. Pessoalmente ele estava .muito de
gradado, e estava muito pesaroso nesse estado; mas pela graça do Senhor pôde
continuar vivendo até o destino fixado. Como era ksatriya, pôde lembrar-se da
promessa que fizera de que não regressaria a Kundina, sua cidade capital, se
não matasse Krsna e libertasse sua irmã, coisa que não conseguira fazer; assim,
irado, ele decidiu não regressar a sua cidade capital. Construiu uma pequena
cabana na aldeia conhecida como Bhojakata e ficou morando ali para o resto
da vida.
Após derrotar todos os elementos adversos e levar RukminT à força;
Krsna trouxe-a para Dvãrakã, Sua cidade capital, e então casou-Se com ela em
conformidade com o princípio ritualístico védico. Após esse casamento, Krsna
tornou-Se o rei dos Yadus em Dvãrakã. Na ocasião em que Ele Se casou com
RukminT, todos os habitantes ficaram felizes e houve grandes cerimônias em
todas as casas. Os habitantes da cidade de Dvãrakã ficaram tão satisfeitos que
se vestiram com os ornamentos e roupas mais belos possíveis, e deram presen
tes ao par recém-casado, Krsna e RukminT, de acordo com seus recursos.
Krsna denota todos òs príncipes e leva RukminT para Dvãrakã 379
engoliu Pradyumna logo que este foi atirado ao mar. Mais tarde um pescador
pegou este peixe em sua rede, e logo depois este mesmo peixe foi vendido ao
demônio Sambara. Na cozinha do demônio havia uma criada que se chamava
Mayavati, a qual anteriormente tinha sido esposa de Cupido e era então co
nhecida como Rati. Quando presentearam o peixe ao demônio Sambara, seu
cozinheiro ficou encarregado de transformá-lo numa saborosa preparação de
peixe. Os demônios e os raksasas estão habituados a comer carne, peixe e ali
mentos não vegetarianos similares. Similarmente, outros demônios, como, por
exemplo, Ravana, Kamsa e Hiranyakaslpu, costumavam comer carne sem dis
criminação, apesar de terem nascido de pais brahmanas e ksatriyas. Esta práti
ca ainda prevalece na índia, e aqueles que comem carne e peixe são geralmente
chamados de demônios e raksasas.
Quando estava cortando o peixe, o cozinheiro encontrou um belo bebê
dentro da barriga do peixe; ele confiou o bebê imediatamente aos cuidados de
Mayavati, que ajudava nos afazeres da cozinha. Esta mulher ficou surpresa de
ver que um bebê tão belo tivesse conseguido permanecer dentro da barriga de
um peixe, e a situação a deixou perplexa. O grande sábio Naxada apareceu en
tão e explicou-lhe a respeito do nascimento de Pradyumna, de como Sambara
tinha raptado o bebê e mais tarde o tinha atirado ao mar, e assim por diante.
Dessa maneira, Narada revelou toda a história a Mayavati, que outrora tinha
sido Rati, a esposa de Cupido. Mayavati sabia que anteriormente tinha sido
esposa de Cupido; depois que seu esposo foi reduzido a cinzas pela cólera do
Senhor Siva, ela esteve sempre esperando que ele voltasse outra vez na forma
material. Esta mulher fora contratada para cozinhar arroz e dhal na cozinha;
quando conseguiu este belo bebê e percebeu que ele era Cupido, seu próprio
esposo,-ela naturalmente encarregou-se dele e passou abanhá-lo com grande
afeição. Miraculosamente, o bebe cresceu muito rápido, tornando-se dentro de
muito pouco tempo um jovem formosíssimo. Os olhos dele eram como as pé
talas de flores de lótus, seus braços eram muito longos, descendo até os
joelhos, e qualquer mulher que por acaso o via sentia-se cativada pela beleza de
seu corpo.
Mayavati pôde compreender que Cupido, seu ex-marido, nascido agora
como Pradyumna, tornara-se um jovem muito atraente, e aos poucos ela
também ficou cativada e sentindo luxúria por ele. Ela sorria diante dele com
um encanto feminino, exprimindo seu desejo de unir-se sexualmente com ele.
Por isso, ele lhe perguntou: “Como é possível que primeiramente você era
afetuosa como uma mãe e agora está exprimindo os sintomas de uma mulher
luxuriosa? Qual é o motivo de tal mudança?” Ao ouvir esta declaração de
Pradyumna, Rati, a mulher, respondeu: “Meu caro senhor, você é o filho do
Senhor Krsna. Antes de você ter dez dias de idade, o demônio Sambara o rou
bou e mais tarde 'o atirou à água e então você foi engolido por um peixe.
Pradyumna nasce de Krsna e Rukmirn 383
Dessa maneira, eu acabei tomando conta de você; mas na realidade, em sua vi
da anterior como Cupido, eu fui sua esposa; por este motivo, não é absoluta
mente incompatível que eu manifeste sintomas conjugais. Sambara queria ma
tá-lo. Ele é dotado de diversos tipos de poderes místicos; portanto, por favor,
mate-o logo que possível com seu poder divino, antes que ele tente matá-lo
outra vez. Desde o dia em que Sambara o roubou, Rukminidevi, sua mãe, tem
estado num estado muito aflitivo, tal qual um cuco que perde seus bebes. Ela
sente muita afeição por você, e desde o dia que o levaram dela tem vivido
como uma vaca aflita pela perda de seu bezerro.”
MãyãvatI tinha conhecimento místico de poder sobrenatural. Os poderes
sobrenaturais são conhecidos geralmente como mãyã, mas há um outro poder
sobrenatural, chamado mahãmayã, que suplanta todos esses poderes sobrena
turais. Como tinha o conhecimento do poder místico de mahãmayã, Mãyavatl
entregou a Pradyumna este poder energético específico, para que ele pudesse
destruir os poderes místicos do demônio Sambara. Logo depois que sua esposa
lhe concedeu estes poderes, Pradyumna apresentou-se diante de Sambara e o
desafiou a lutar. Pradyumna começou a tratá-lo com uma linguagem muito
violenta para que ele se irritasse e sentisse vontade de lutar. Com as palavras
de Pradyumna, o demônio Sambara sentiu-se insultado; ele sentiu a mesma
coisa que sente uma serpente depois que alguém lhe dá um pontapé. Uma ser
pente não é capaz de tolerar quando um outro animal ou um homem dão-lhe
um pontapé, de modo que morde imediatamente o oponente.
Sambara sentiu as palavras de Pradyumna como se fossem um pontapé.
Ele imediatamente pegou sua maça com a mão e se apresentou perante
Pradyumna para lutar. Com grande ira, começou a espancar Pradyumna com a
maça, assim como um raio bate numa montanha. Além disso, o demônio gemia
e produzia um som semelhante ao som produzido por uma nuvem trovejante.
Protegendo-se com sua própria maça, Pradyumna atingiu por fim o demônio,
com muita violência. Dessa maneira, começara uma luta muito séria entre
Sambarãsura e Pradyumna.
Mas Sambarãsura conhecia a arte dos poderes místicos e era capaz de
subir aos céus e lutar do espaço exterior. Há um outro demônio chamado
Maya, com o qual Sambarãsura aprendeu muitos poderes místicos. Desse
modo ele subiu bem alto no céu e começou a atirar diversos tipos de armas
nucleares no corpo de Pradyumna. A fim.de combater os poderes místicos de
Sambarãsura, Pradyumna lembrou-se de outro poder místico, conhecido como
mahãvidyã, que era' diferente do poder místico negro. O poder místico
mahãvidyã baseia-se na qualidade da bondade. Ao perceber que seu inimigo era
formidável, Sambara valeu-se do auxílio de diversos tipos de poderes místicos
demoníacos pertencentes aos Guhyakas, aos Gandharvas, aos Pisãcas, às
serpentes e aos Rãksasas. Mas apesar do demônio exibir seus poderes místicos
384 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
Nesse mesmo momento, o Senhor Krsna, juntamente com Seu pai e Sua
mãe, Devakl e Vasudeva, entrou em cena. Krsna, a Suprema Personalidade de
Deus, pôde compreender tudo, porém Se manteve calado naquela situação. En
tretanto, pelo desejo do Senhor Sri Kr§na, o grande sábio Nãrada também
entrou em cena e pôs-se a revelar todos os incidentes —como Pradyumna tinha
sido roubado da maternidade e como tinha crescido e chegado ali com sua es
posa MãyãvatI, que anteriormente fora Rati, a esposa de Cupido. Quando
foram informados a respeito do desaparecimento misterioso de Pradyumna e
de como ele havia crescido, todos ficaram maravilhados porque tinham conse
guido seu filho morto de volta depois que já quase não tinham esperança de
tê-lo novamente. Quando entenderam que era Pradyumna quem estava presen
te, eles se puseram a recebê-lo com grande deleite. Um após o outro, todos os
membros da família - Devaki, Vasudeva, o Senhor Sri Krsna, o Senhor
Balarãma, RukminI e todas as mulheres da família - começaram a abraçar
tanto Pradyumna quanto sua esposa MãyãvatI. Quando se espalhou a noticia
da volta de Pradyumna por toda a cidade de Dvãrakã , todos os cidadãos,
admirados e com grande ansiedade, vieram ver o Pradyumna perdido. Eles co
meçaram a dizer: “O filho morto regressou. O que poderia causar mais prazer
do que isso?”
Srlla Sukadeva Gosvãml explica que a princípio todas as residentes do pa
lácio, as quais eram todas mães e mães adotivas de Pradyumna, confundiram-
no com Krsna e ficaram completamente envergonhadas, contagiadas pelo de
sejo de ter amor conjugal. A explicação é que a aparência pessoal de
Pradyumna é exatamente igual à de Krsna, e que na verdade ele era o próprio
Cupido. Portanto, não era de admirar que as mães de Pradyumna e outras mu
lheres o confundissem dessa maneira. Com essa declaração fica claro que as
características do corpo de Pradyumna eram tão similares às de Krsna que até a
mãe dele o confundiu com Krsna.
montado, e levou a jóia para sua caverna. Jãmbavãn, o rei gorila, recebeu a no
ticia e então matou esse leão na caverna, roubando a jóia. Jãmbavãn tinha si
do um grande devoto do Senhor desde a época do Senhor Rãmacandra, e por
isso não considerou que a jóia valiosa fosse algo muito necessário. Ele deu-a a
seu filhinho para que este brincasse com ela.
Enquanto isso, na cidade, Satrãjit ficou muito abalado, pois Prasena, seu
irmão mais novo, não voltava da floresta com a jóia. Ele não sabia que seu
irmão tinha sido morto por um leão e que o leão tinha sido morto por
Jãmbavãn. Em vez disso, estava pensando que, como Krsna queria a jóia e não
Lha haviam entregado, Krsna devia ter roubado a jóia de Prasena à força e de
via tê-Lo matado. Esta idéia transformou-se num boato que Satrãjit estava es
palhando em todas as partes de Dvãrakã.
O boato falso de que Krsna matara Prasena e roubara a jóia espalhara-se
por toda a parte, com a velocidade do relâmpago. Krsna não gostou de .ser
difamado dessa maneira, e por isso decidiu que iria até a floresta e encontraria
a jóia Syamantaka, levando conSigo alguns dos habitantes de Dvãrakã, Krsna
saiu em busca de Prasena, o irmão de Satrãjit, juntamente com homens impor
tantes de Dvãrakã, e foi encontrá-lo morto, morto pelo leão. Ao mesmo
tempo, Krsna tafnoém encontrou o leão, que tinha sido morto por Jãmbavãn,
o qual é conhecido geralmente pelo nome Rksa, Descobriu-se que Rksa tinha
matado o leão com a mão, sem o auxílio de nenhuma arma. Depois, então,
Krsna e os cidadãos de Dvãrakã descobriram um grande túnel na floresta, o
qual, se dizia, era o caminho què levava à casa de Rksa, Krsna sabia que os
habitantes de Dvãrakã teriam medo de entrar no túnel; por isso, Ele lhes disse
que permanecessem fora, entrando Ele próprio sozinho no túnel escuro para
encontrar Rksa, Jãmbavãn. Após entrar no túnel, Krsna viu que a valiosíssima
jóia conhecida como Syamantaka tinha sido dada ao filho de Rksa para este
brincar; desse modo, Krsna foi até onde estava o menino e parou na frente dele
com o fim de tomar-lhe a jóia. Quando a babá que tomava conta do filho de
Rksa viu Krsna parado na frente dela, ficou com medo, pois pensou que Ele
podería roubar a valiosa jóia Syamantaka. Amedrontada, ela começou a gritar
alto.
Ao ouvir a babá gritando, Jãmbavãn entrou em cena muito encolerizado.
Na realidade, Jãmbavãn era um grande devoto do Senhor Krsna, mas como es
tivesse encolerizado não pôde reconhecer .seu senhor; ele julgou que Krsna era
um homem comum. Isto nos faz recordar da declaração do Bhagavad-gltã em
que o Senhor aconselha Arjuna a livrar-se da ira, da cobiça e da luxúria para
poder elevar-se à plataforma espiritual, A luxúria, a ira e a cobiça correm para
lelamente no coração e impedem nosso progresso no caminho espiritual.
Como não reconhecesse seu senhor, Jãmbavãn primeiramente 0 desafiou
a lutar. Então Krsna e Jãmbavãn travaram uma grande luta, na qual se bateram
390 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
Suprema, o Senhor Visnu: “Meu querido Senhor, Você é o criador dos criado
res das coisas universais.” Esta declaração é muito instrutiva para o homem co
mum, que se espanta com as atividades de uma pessoa que tenha um cérebro
excepcional. O homem comum fica surpreso quando ve as invenções de um
grande cientista, mas a declaração de Jãmbavãn confirma que mesmo que o
cientista crie muitas coisas maravilhosas, Krsna é o criador dos cientistas. Ele é
o criador não apenas de um único cientista, mas de milhões e trilhões de cien
tistas em todo o universo. Jãmbavãn disse ainda: “Você é o criador não só do
criador, mas também dos elementos materiais que os assim chamados criadores
manipulam.” Os cientistas utilizam os elementos físicos ou as leis da natureza •
material e fazem algo maravilhoso, mas na realidade tais leis e elementos tam
bém constituem a criação de Krsna. Isto é que é compreensão cientifica verda
deira. Os homens pouco inteligentes não tentam compreender quem criou o
cérebro do cientista; para eles o simples fato de verem a criação ou a invenção
maravilhosa do cientista já os satisfaz.
Jãmbavãn continuou: “Meu querido Senhor, o fator tempo que combina
todos os elementos físicos também é um representante Seu. Você é o fator
tempo supremo no qual toda a criação acontece, é mantida e finalmentc ani
quilada. E não só os elementos físicos e o fator tempo são partes integrantes
Suas, mas as pessoas que manipulam os ingredientes c as vantagens da criação
também o são. Portanto, a entidade viva não é um criador independente. Se
estudamos todos os fatores na perspectiva correta, podemos ver que Você é o
controlador supremo e o Senhor de todas as coisas. Meu querido Senhor, posso
pór isso compreender que Você é a mesma Suprema Personalidade de Deus
que eu adorei como Senhor Rãmacandra. Meu Senhor Rãmacandra quis cons
truir uma ponte sobre o oceano, c eu vi pcssoalmcntc que o oceano ficou agi
tado pejo simples fato de meu Senhor ter lançado Seu olhar sobre ele. E
quando todo o oceano se agitou, as entidades vivas, tais como as baleias, os
aligatores èr\os peixes timihgila, todos eles ficaram perturbados.[Os peixes
timingila no oceano são capazes de engolir de um só trago grandes seres aquá
ticos, tais como as baleias.] Dessa maneira, o oceano foi obrigado a abrir cami
nho e permitir que Rãmacandra o atravessasse até a ilha conhecida como
Lahkã^fque agora é supostamente o Ccilãoj.Esta construção de uma ponte
'sobre* o oceano desde o CaboComorin até o Ceilão é bem conhecida ainda hoje
pop todas as pessoas. Após a construção da ponte, todo o reino de Rãvana foi
incendiado. Durante a luta com Rãvana, cada parte dos membros de Rãvana
foi retalhada e cortada em pedaços por Suas flechas afiadas, e a cabeça dele
caiu na superffcie da terra. Agora posso compreender que Você não é ninguém
mais além de meu Senhor Rãmacandra. Não há nenhuma outra pessoa que
tenha força tão incomensurávcl; nenhuma outra pessoa poderia me derrotar
dessa maneira.” - .
392 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
servou-a sempre consigo. Mas quando Krsna e Balar ama estiveram ausentes,
muitos homens tramaram uma conspiração — incluindo até Akrüra e
Krtavarmã (os quais eram devotos do Senhor Krsna) —a fim de tomarem a jóia
de Satrãjit. Akrüra e Krtavarmã aderiram à conspiração porque queriam que a
jóia ficasse com Krsna. Eles sabiam que Krsna queria a jóia e que Satrãjit não a
tinha entregue devidamente. Outras pessoas aderiram à conspiração porque es
tavam desgostosas por não terem conseguido a mão de Satyabhãmã. Alguns
deles incitaram Satadhanvã a matar Satrãjit e roubar a jóia.
Geralmente se pergunta: por que um devoto grandioso como Akrüra
aderiu a esta conspiração? E por que Krtavarmã, que era um devoto do
Senhor, também aderiu à conspiração? Grandes autoridades como Jlva
Gosvãmi e outros respondem que embora Akrüra fosse um grande devoto, os
habitantes de Vrndãvana o haviam amaldiçoado por ele ter tirado Krsna do
meio deles. Como ferira os sentimentos dos habitantes de Vrndãvana, Akrüra
foi obrigado a aderir à conspiração declarada por homens pecaminosos. Simi
larmente, Krtavarmã era um devoto que, por causa de sua associação intima
com Karhsa, também estava contaminado pela reação pecaminosa, e também
aderiu à conspiração.
Inspirado por todos os membros da conspiração, Satadhanvã entrou uma
noite na casa de Satrãjit e matou-o enquanto este dormia. Satadhanvã era um
pecador de caráter abominável, e embora não fosse viver por muitos dias de
vido a suas atividades pecaminosas, ele decidiu matar Satrãjit enquanto este
dormia em casa. Quando entrou na casa para matar Satrãjit, todas as mulheres
que ali se encontravam começaram a gritar bem alto; porém, apesar de Seus
grandes protestos, Satadhanvã assassinou Satrãjit sem misericórdia e sem hesi
tar, exatamente como um carniceiro mata um animal no matadouro. Como
Krsna estivesse ausente de casa, Sua esposa Satyabhãmã, que também estava
presente na noite em que Satrãjit foi assassinado, começou a gritar: “Meu que
rido pai! Meu querido pai! Com que crueldade você foi morto!” Não remove
ram o cadáver de Satrãjit imediatamente para ser cremado, porque Satyabhãmã
quis ter com Krsna em Hastinãpura. Por isso, preservaram o corpo num depó
sito de óleo, de modo que Krsna pudesse regressar para ver o cadáver de
Satrãjit e tomar uma providência concreta contra Satadhanvã. Satyabhãmã
partiu imediatamente para Hastinãpura a fim de informar Krsna a respeito da
terrível morte de seu pai.
Quando Satyabhãmã informou Krsna a respeito do assassínio de Seu so
gro, Ele pôs-Se a lamentar como um homem comum. O grande pesar d*Ele é,
por outro lado, uma coisa estranha. O Senhor Krsna não tem nada a ver com
ação e reação, mas como estava representando o papel de um ser humano, ex
primiu Sua total compaixão pela aflição de Satyabhãmã; quando ouviu falar na
morte de Seu sogro, Seus olhos encheram-se de lágrimas. Ele pôs-Se a lamentar
396 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
deste modo: “Oh ! Que incidentes infelizes ocorreraml” Dessa maneira, tanto
Krsna quanto Balarãma, juntamente com Satyabhãmã, a esposa de Krsna, re
gressaram a Dvãrakã imediatamente e começaram a fazer planos para matar
Satadhanvã e tomar a jóia. Apesar de ser um grande proscrito na cidade,
Satadhanvã ainda estava com muito medo do poder de Krsna, e deste modo fi
cou com mais medo quando Krsna chegou.
Ao saber que Krsna planejava matá-lo, ele imediatamente buscou a prote
ção de Krtavãrma, Mas quando se aproximou de Krtavãrma, este disse: “Jamais
serei capaz de ofender o Senhor Krsna e Balarãma porque Eles não são pessoas
comuns. Eles são a Suprema Personalidade de Deus. Quem é que, tendo ofen
dido Balarãma e Krsna, pode ser salvo da morte? Ninguém pode se livrar da ira
dTEles.” Krtavarmã disse ainda que Kamsa não conseguiu se livrar da ira de
Krsna, apesar de ser poderoso e de muitos demônios o auxiliarem, e isto para
não falar de Jarãsandha, que Krsna tinha derrotado dezoito vezes e que todas
as vezes teve que regressar da luta decepcionado.
Quando Krtavarmã negou-se a ajudar Satadhanvã, este dirigiu-se a
Akrüfa e implorou-lhe sua ajuda. Akrüra também respondeu: “Tanto Balarãma
quanto Krsna são em pessoa a Suprema Personalidade de Deus; qualquer pes
soa que conheça a força ilimitada que Eles tem jamais ousaria ofende-Los ou
lutar com Eles.” Ele disse ainda a Satadhanvã: “Krsna e Balarãma são tão po
derosos que estão criando toda a manifestação cósmica, mantendo-a e dissol
vendo-a simplesmente porque desejam. Infelizmente, as pessoas que estão
confusas com a energia ilusória não são capazes de compreender a força de
Krsna, embora toda a manifestação cósmica esteja completamente sob o
controle d ’EIe.” Para dar um exemplo, ele citou que Krsna, já com a idade
de sete anos, levantara a Colina de Govardhana e Se mantivera sustentando a
montanha por sete dias, exatamente como uma criança que leva um pequeno
guarda-sol. Em poucas palavras, Akrüra disse a Satadhanvã que ofereceria
sempre suas mais respeitosas reverências a Krsna, a Superalma de tudo que
ê criado e a causa original de todas as causas, Quando Akrüra também se
negou a dar-lhe proteção, S~atadhanvã decidiu entregar nas mãos de Akrüra
a jóia Syamantaka. Depois então, montado num cavalo que era capaz de
correr'a uma grande velocidade e que num galope podia fazer seiscentos e qua
renta quilômetros, ele fugiu da cidade.
Quando foram informados da fuga de Satadhanvã, Krsna e Balarãma
montaram em Sua quadriga, cuja bandeira estava marcada com 0 quadro de
Garuda, e seguiram imediatamente. Krsna estava particularmente irado com
Satadhanvã e queria matá-lo, pois este havia matado Satrajit, uma personalida
de superior. Satrãjit era o sogro de Krsna, e nos sãstras se prescreve que qual
quer pessoa que se rebele contra uma pessoa superior, ou gurudruha , deve
ser castigada na proporção da intensidade da ofensa. Como Satadhanvã tinha
A morte de Satrajit e Satadhanvã 397
Senhor Krsna abraçou cada um dos Pãndavas que, ao serem tocados pela Su
prema Personalidade de Deus, livraram-se imediatamente de todas as reações
de contaminação material, e por esse motivo sorriam em bem-aventurança es
piritual. Como haviam visto o rosto do Senhor Krsna, todos estavam transcen
dentalmente satisfeitos. Embora seja a Suprema Personalidade de Deus, o Se
nhor Krsna estava representando o papel de um ser humano comum, e deste
modo tocou imediatamente nos pés de Yudhisthira e Bhlma porque estes eram
Seus dois primos mais velhos. Arjuna abraçou Krsna como um amigo da
mesma idade, ao passo que os dois irmãos mais novos, a saber: Nakula e
Sahadeva, tocaram nos pés de lótus de Krsna para mostrar-Lhe respeito. Após
uma troca de cumprimentos de acordo com a etiqueta social conveniente à
posição dos Pãndavas e à do Senhor Krsna, ofereceram um assento exaltado a
Krsna. Quando Se encontrava confortavelmente sentado, a recém-casada
DraupadT, jovem e muito bela com sua natural graça feminina, apareceu
diante do Senhor Krsna para oferecer-Lhe seus cumprimentos respeitosos.Os
Ysdavas que acompanharam Krsna até Hastinãpura também foram recebidos
com muito respeito; também a Sãtyaki, ou Yuyudhãna, especificamente,
ofereceram um assento confortável. Dessa maneira, quando todas as outras
pessoas estavam devidamente sentadas, os cinco irmãos sentaram-se no seu
lugar, próximos ao Senhor Krsna.
Após encontrar-Se com os cinco irmãos, o Senhor Krsna foi pessoalmen
te visitar SrTmatf KuntTdevi, a mãe dos Pãndavas, que era além disso a tia pa
terna de Krsna. Ao oferecer Seus respeitos a Sua tia, Krsna também tocou nos
pés dela. Os olhos de KuntTdevi se encheram de lágrimas, e ela abraçou o
Senhor Krsna com muito sentimento e amor. Depois, eia Lhe perguntou como
estavam os membros de sua família paterna —seu irmão Vasudeva, a esposa dc
Vasudeva e os demais membros da família. Similarmente, Krsna também per
guntou a Sua tia como iam indo as famílias Pãndava. Embora KuntTdevi esti
vesse relacionada com Krsna por laços familiares, ela soube logo depois que O
encontrou que Ele é a Suprema Personalidade de Deus. Ela se lembrou das
calamidades passadas de sua vida e de como, pela graça de Krsna, os Pãndavas
e a mãe deles tinham sido salvos. Ela sabia perfeitamente bem que sem a graça
de Krsna ninguém poderia tê-los salvo do acidente do incêndio, planejado por
Dhrtarâstra e seus filhos. Com voz sufocada, ela começou a narrar para Krsna
a história passada da vida deles.
SrTmatT KuntT disse: “i\íeu querido Krsna, lembro-me do dia em que
Você mandou meu irmão Akrüra colher informações sobre nós. Isto quer dizer
que automaticamente Você sempre Se lembra de nós. Quando Você mandou
Akrüra até nós, pude compreender que não havia possibilidade de estarmos em
perigo. Toda a boa fortuna de nossa vida começou quando Você mandou
Akrüra até nós. Desde então, tenho estado convencida de que não estamos des-
402 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
devastador. Por esse motivo, este antigo demônio tornou-se um grande amigo
de Arjuna. A fim de satisfazer Arjuna, Maya construiu uma bela casa de
reuniões dentro da cidade construída por Visvakarmã. Alguns cantos desta ca
sa de reuniões eram tão intrincados, que quando Duryodhana veio visitar a
casa ele ficou mal orientado, aceitando água como terra e terra como água.
Deste modo, Duryodhana sentiu-se insultado com a opulência dos Pãndavas,
tornando-se dai um inimigo determinado deles.
Após alguns dias, Krsna pediu permissão ao rei Yudhisthira para regres
sar a Dvãrakã. Quando recebeu a permissão, Krsna foi para Seu pais acompa
nhado de Sãtyaki, o lider dos Yadus que estava vivendo com Ele em Hastinã-
pura. KãlíndT também regressou a Dvãrakã com Krsna. Após voltar, Krsna con
sultou muitos astrólogos eruditos para descobrir o momento adequado em que
devia casar-Se com KãlindI, e depois então casou-Se com ela com grande pom
pa. Essa cerimônia de casamento deu muito prazer aos parentes de ambos os
cônjuges, que desfrutaram todos a grandiosa ocasião.
Os reis de AvantTpura, conhecida agora como Ujjain, chamavam-se Vinda
e Anuvinda. Ambos os reis estavam sob o controle de Duryodhana. Eles
tinham uma filha única chamada Mitravindã, uma moça muito qualificada,
erudita e elegante, que era filha de uma das tias de Krsna. Ela iria escolher seu
esposo na assembléia dos príncipes, mas desejava fortemente ter Krsna como
seu esposo. Porém, durante a reunião em que Mitravindã escolhería seu esposo,
Krsna estava presente e levou-a à força na presença de todos os outros prínci
pes reais. Como fossem incapazes de resistir a Krsna, os príncipes ficaram sim
plesmente olhando uns para os outros.
Após este incidente, Krsna casou-Se com a filha do rei deKosala. O rei da
província Kosala chamava-se Nagnajit. Ele era muito piedoso e um seguidor
das cerimônias ritualísticas védicas. Sua filha mais bela chamava-se Satyã. Ãs
vezes, Satyã era chamada de Nãgnajití, pois era a filha do rei Nagnajit. O rei
Nagnajit queria dar a mão de sua filha a qualquer príncipe que fosse capaz de
derrotar sete touros muito fortes e vigorosos, mantidos por ele. Como ninguém
na ordem principesca conseguisse derrotar os sete touros, ninguém podia ter
pretensão sobre a mão de Satyã. Os sete touros eram fortíssimos, e não
podiam sequer suportar o cheiro de algum príncipe. Muitos príncipes aproxi
mavam-se desse reino e tentavam subjugar esses touros, porém, em vez de do
miná-los, eles próprios eram derrotados. Esta notícia se espalhou por todo o
país; quando Krsna ouviu que só era possível conseguir a moça Satyã derrotan
do os sete touros, Ele Se preparou para ir até o reino de Kosala. Acompanhado
por muitos soldados, Ele Se aproximou dessa parte do país, conhecida como
Ayodhyã, fazendo uma visita de Estado regular.
Quando o rei de Kosala ficou sabendo que Krsna viera pedir a mão de sua
filha, ele ficou muito satisfeito. Com grande respeito e pompa, ele recebeu
406 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
Krsna no reino. Quando Krsna aproximou-Se dele, ele ofereceu um lugar apro
priado para Krsna sentar-Se e artigos para recepção. Tudo parecia muito ele
gante. Krsna também ofereceu Suas respeitosas reverências ao rei, consideran
do que este seria Seu futuro sogro.
Quando Satyã, a filha do rei Nagnajit, ficou sabendo que o próprio Krsna
viera para casar-Se com ela, ela ficou satisfeitíssima de que o esposo da deusa
da fortuna tivesse tão bondosamente vindo ali para aceitar-lhe a mão. Por
muito tempo esteve acalentando a idéia de casar-se com Krsna e esteve seguin
do os princípios de austeridade a fim de obter o esposo que desejava. Aí então
ela começou a pensar: “Se tenho executado quaisquer atividades piedosas da
melhor maneira possível e se desde o princípio tenho pensado sinceramente
em ter Krsna como meu esposo, então pode ser que Krsna Se digne satisfazer
meu desejo há muito acalentado.” Ela começou a oferecer orações a Krsna
mentalmente, pensando: “Não sei como é que a Suprema Personalidade de
Deus pode estar satisfeito comigo. Ele é o amo e o Senhor de todo mundo. Até
a deusa da fortuna, a qual se encontra próxima da Suprema Personalidade de
Deus, o Senhor Siva, o Senhor Brahmã e muitos outros semideuses de diferen
tes planetas, sempre oferecem suas respeitosas reverências ao Senhor. O Senhor
às vezes também desce a esta Terra em diferentes encarnações para satisfazer o
desejo de Seus devotos. Ele é tão exaltado e grandioso que não sei como
satisfazê-Lo.” Ela achava que a Suprema Personalidade de Deus só podia Se
sentir satisfeito por Sua própria misericórdia sem causa para com o devoto; de
outro modo, não havia outra maneira de satisfazê-Lo. Da mesma maneira, o
Senhor Caitanya orou em Seus versos Siksãstaka: “Meu Senhor, sou Seu servo
eterno. De uma forma ou de outra caí nesta existência material. Por favor, se
Você me apanhar e me colocar como um átomo de poeira a Seus pés de lótus,
Você estará prestando um grande favor a Seu servo eterno.” Só é possível
satisfazer o Senhor com uma atitude humilde, cultivada com o espírito de
serviço. Quanto mais prestamos serviço ao Senhor sob a direção do mestre
espiritual, mais avançamos no caminho de aproximação do Senhor. Não
podemos exigir nenhuma graça nem misericórdia do Senhor por causa do
serviço que Lhe prestamos. Ele pode aceitar ou não aceitar nosso serviço, mas
só podemos satisfazer o Senhor através da atitude de serviço, nada mais.
Como já fosse um rei piedoso e como Krsna Se encontrasse agora no palá
cio dele, o rei Nagnajit pôs-se a adorá-Lo tanto quanto sabia e podia. Ele se
apresentou ao Senhor deste modo: “Meu querido Senhor, Você é o proprietá
rio de toda a manifestação cósmica; Você é Nãrãyana, o descanso de todas as
criaturas vivas. Se Você é auto-suficiente e está satisfeito com Suas opulências
pessoais, como posso eu Lhe oferecer algo? E como podería eu satisfazê-Lo,
oferecendo alguma coisa? Não é possível, porque eu sou um ser vivo insignifi
cante. Na realidade, não tenho competência para Lhe prestar nenhum serviço.
Krsna casa-Se com cinco rainhas 407
ainda assim estava apegada a Krsna. Com o fim de animá-la, Ele Se expandiu
imediatamente em sete. Isto significa que Krsna é um só, mas que Ele tem ili
mitadas formas de expansões. Ele Se casou com muitas centenas de milhares
de esposas, mas isto não quer dizer que enquanto Ele estava com uma esposa,
as outras ficassem desprovidas da associação d*Ele. Krsna podia Se associar
com cada esposa por intermédio de Suas expansões.
Quando Krsna controlou os touros, refreando-lhes o focinho, a força e o
orgulho deles foram esmagados de uma só vez. Foi assim que foram subjugados
o nome e a fama que os touros tinham logrado. Quando Krsna refreou os tou
ros, Ele os puxou vigorosamente, assim como uma criança puxa um touro de
brinquedo, feito de madeira. Ao ver esta vantagem de Krsna, o rei Nagnajit
ficou admiradíssimo e imediatamente, com grande prazer, trouxe sua filha
Satyã perante Krsna e deu-a a Ele. Krsna também aceitou Satyã imediatamen
te como Sua-esposa. Depois, então, houve uma cerimônia de casamento com
grande pompa. As rainhas do rei Nagnajit também ficaram muito satisfeitas
porque sua filha Satyã conseguira Krsna como esposo. Uma vez que o rei e as
rainhas ficaram muito satisfeitos nesta ocasião auspiciosa, por toda a cidade
celebraram em honra do casamento. Em toda a parte se ouviam os sons do
búzio e do timbale e de várias outras vibrações de músicas e canções. Os
brãhmanas eruditos começaram a encher o par reeém-casado de bênçãos.
Cheios de alegria, todos os habitantes da cidade vestiram-se com roupas e
ornamentos coloridos. O rei Nagnajit ficou tão satisfeito que começou a dar o
seguinte dote à filha e ao genro.
Em primeiro lugar, ele lhes deu dez mil vacas e três mil jovens criadas
bem vestidas, cheias de ornamentos até o pescoço. Este sistema de dote ainda é
corrente na índia, especialmente entre os príncipes ksatriya. Além disso,
quando um príncipe ksatriya se casa, são dadas pelo menos doze criadas de
idade similar juntamente com a noiva. Após dar as vacas e criadas, o rei tam
bém enriqueceu o dote dando nove mil elefantes e cem vezes mais quadrigas
que elefantes. Isto significa que ele deu novecentas mil quadrigas. E além disso
deu cem vezes mais cavalos do que quadrigas, ou seja, noventa milhões de ea-
yvalos, e cem vezes mais escravos do que cavalos. Os príncipes reais mantinham
tais escravos e criadas com todas as provisões, como se eles fossem seus pró
prios filhos ou membros familiares. Após dar este dote descrito anteriormente,
o rei da província Kosala fez sua filha e seu eminente genro sentarem-se numa
quadriga. Ele permitiu que os dois fossem para seu lar, defendidos por uma
divisão de soldados bem equipados. Quando os dois estavam viajando rapida
mente para o seu novo lar, o coração do rei encheu-se de afeição por eles.
Antes desse casamento de Satyã com Krsna, tinha havido muitas competi
ções com os touros do rei Nagnajit, sendo que muitos outros príncipes da
dinastia Yadu, e de outras dinastias também, tinham tentado conquistar a mão
Krsna casa-Se com cinco rainhas 409
prepararam-se com muita ira para lutar com Krsna. Equiparam-se com as armas
necessárias e puseram Pltha, um outro demônio, para atuar como comandante
na batalha. Por ordem de Bhaumãsura, todos eles atacaram -Krsna juntos.
Quando apareceram na frente do Senhor Krsna, começaram a enchê-Lo
de muitos tipos de armas, como, por exemplo, espadas, maças, lanças, flechas e
tridentes. Contudo, eles não sabiam que a força da Suprema Personalidade de
Deus é ilimitada e invencível. Com Suas flechas, Krsna cortou todas as armas
dos homens de Bhaumãsura em pedaços, como se fossem grãos. Aí então
Krsna atirou Suas armas, e Pltha, o comandante supremo de Bhaumãsura, jun
tamente com seus assistentes, caíram, seu vestuário militar foi cortado e suas
cabeças, pernas, braços e coxas, cortadas. Todos eles foram enviados para
Yamaraja, o superintendente da morte.
Bhaumãsura também era conhecido como Narakãsura, pois acontecia de
ser o filho da terra personificada. Quando viu que todos os seus soldados, co
mandantes e lutadores foram mortos no campo de batalha pelos golpes das
armas da Personalidade de Deus, ele ficou excessivamente irado com o Senhor.
Então ele saiu da cidade com um grande número de elefantes que haviam nas
cido e tinham sido criados no litoral. Eles estavam todos muito embriagados.
Quando saíram, viram que o Senhor Krsna e Sua esposa encontravam-se bela
mente situados no espaço exterior, tal qual uma nuvem escura sobre o sol,
cintilando com a luz da eletricidade. O demônio Bhaumãsura atirou imediata
mente uma arma chamada SataghnT, com a qual poderia matar centenas de
guerreiros de um só golpe, e simultaneamente todos os assistentes dele também
atiraram suas armas respectivas na Suprema Personalidade de Deus. O Senhor
Krsna começou a neutralizar todas essas armas atirando Suas flechas de pena.
O resultado desta luta foi que todos os soldados e comandantes de Bhaumãsu
ra caíram por terra, com os braços, as pernas e as cabeças separadas dos tron
cos, sendo que todos os cavalos e elefantes deles também caíram com eles.
Dessa maneira, iodas as armas atiradas por Bhaumãsura foram cortadas em
pedaços pela reação das flechas do Senhor.
O Senhor lutava nas costas de Garuda, que também ajudava o Senhor
dando golpes nos cavalos e nos elefantes com suas asas e arranhando-lhes as ca
beças com suas unhas e bico afiados. Os elefantes, que estavam sentindo muita
dor com o ataque de Garuda contra eles, estavam todos se dispersando do cam
po de batalha. Bhaumãsura ficou sozinho no campo de batalha e passou a lutar
com Krsna. Percebeu que Garuda, o transportador de Krsna, estava causando
grande distúrbio para seus soldados e elefantes, e, muito irado, golpeou Garuda
com toda a sua força, a qual desafiava a força do raio. Felizmente, Garuda não
era uma ave comum; ele sentiu as pancadas dadas por Bhaumãsura da mesma
forma que um grande elefante sente o impacto de uma guirlanda de flores.
0 salvamento do demônio Bhaumasura 413
ricórdia sem causa. Mentalmente, elas decidiram aceitar o Senhor Krsna como
esposo delas, sem nenhuma hesitação. Cada uma delas pôs-se a orar à provi
dência para que Krsna Se tornasse esposo*delas. Com sinceridade e seriedade,
elas ofereceram seus corações aos pés de lótus de Krsna, com uma atitude de-
vocionál imaculada. Na qualidade de Superalma no coração de todo mundo,
Krsna pôde compreender o desejo não contaminado delas, e concordou em
aceitá-las como Suas esposas. Deste modo, Ele providenciou roupas e ornamen
tos adequados para elas, e cada uma delas, sentada num palanquim, foi enviada
para a cidade de Dvãrakã. Além disso, Krsna arrecadou riqueza ilimitada do pa
lácio, juntamente com quadrigas, cavalos, jóias e tesouros. Ele levou cinqüenta
elefantes brancos do palácio, cada um dos quais com quatro dentes, e todos
eles foram enviados para Dvãrakã.
Após este incidente, o Senhor Krsna e Satyabhãmã entraram em Amarã-
vatl, a cidade capitai do planeta celestial, e daí entraram imediatamente no pa
lácio do rei Indra e Sua esposa, Sacldevl, os quais deram-lhes as boas-vindas.
Nessa ocasião Krsna deu os brincos de Aditi de presente a Indra.
Quando Krsna e Satyabhãmã regressavam da cidade capital de Indra,
Satyabhãmã lembrou-se da promessa que Krsna fizera de que lhe daria a planta
da flor pãrijãta. Aproveitando a oportunidade de ter vindo ao reino celestial,
ela colheu uma planta pãrijãta e conservou-a nas costas de Garuda. Certa vez
Nãrada colheu uma flor pãrijãta e deu-a de presente a SrT RukmimdevT, a
esposa mais antiga de Krsna. Por causa disto, Satyabhãmã desenvolveu um
complexo de inferioridade: ela também queria uma flor de Krsna, Krsna pôde
compreender a natureza competitiva feminina de Suas co-esposas, e sorriu. Ele
perguntou imediatamente a Satyabhãmã: “Por que você está pedindo apenas
uma flor? Eu gostaria de lhe dar uma árvore inteira de flores pãrijãta, ”
Na realidade, Krsna havia levado Seu esposa Satyabhãmã conSigo de pro
pósito para que ela pudesse colher a pãrijãta com sua própria mão. Mas os habitan
tes dos planetas celestiais, incluindo Indra, ficaram muito irritados. Sem que
eles permitissem, Satyabhãmã tinha colhido uma planta pãrijãta, a qual não é
encontrada no planeta Terra. Indra, juntamente com outros semideuses, fez
oposição a Krsna e Satyabhãmã por esta ter roubado a planta; porém, para
agradar Satyabhãmã, Sua esposa favorita, Krsna tornou-Se determinado e
inflexível, e por isso os semideuses lutaram com Krsna. Como de costume,
Krsna saiu vitorioso e trouxe triunfantemente a planta pãrijãta escolhida por
Sua esposa para Dvãrakã, neste planeta Terra. Depois disso, instalou-se a plan
ta no jardim do palácio de Satyabhãmã. Por causa desta árvore extraordinária,
o jardim de Satyabhãmã tornou-se extraordinariamente belo. Como a planta
pãrijãta descera ao planeta Terra, a fragrância da flor também descera, e os cis
nes celestiais também migraram a esta Terra em busca da fragrância e do mel
desta flor.
416 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
O comportamento do rei Indra com Krsna não foi muito apreciado por
grandes sábios como Sukadeva Gosvãmi. Por Sua misericórdia sem causa,
Krsna tinha visitado AmarãVatT, o reino celestial, para dar de presente ao rei
Indra os brincos da mãe deste, os quais Bhaumãsura tinha roubado, ao que
Indra ficou muito contente de recebê-los. Mas quando Krsna levou uma planta
florida do reino celestial, Indra fez menção de lutar com Ele. Isto foi interesse
egoísta da parte de Indra. Ele ofereceu sua oração, curvando sua cabeça aos
pés de lótus de Krsna, mas logo que serviu seu fim, transformou-se numa cria
tura diferente. Assim são as relações das pessoas materialistas. Os materialistas
estão sempre interessados em seu próprio lucro. Com este fim, são capazes de
oferecer qualquer tipo de respeito a qualquer pessoa; mas quando o interesse
pessoal deles acaba, não são mais amigos. Verificamos esta natureza egoísta
não só entre á classe de homens mais ricos que vivem neste planeta, mas
também até em personalidades como Indra e outros semideuses. A rique
za em demasia faz que um homem se torne egoísta. Um homem cgofsta não
está preparado para aceitar a consciência de Krsna e é condenado por grandes
devotos como Sukadeva Gosvãmi. Em outras palavras, a posse de riquezas
mundanas em demasia nos incapacita de avançar na consciência de Krsna.
Após derrotar Indra, Krsna fez arranjos para casar-Se com as dezesseis mil
e cem moças que soltara da custódia de Bhaumãsura. Expandindo-Se em dezes
seis mil e cem formas, Ele casou-Se simultaneamente com todas elas em dife
rentes palácios num momento auspicioso. Deste modo, Ele estabeleceu a ver
dade de que Krsna, e ninguém mais, é a Suprema Personalidade de Deus. Nada
é impossível, pois Krsna é a Suprema Personalidade de Deus; Ele é todopode-
roso, onipresente e ímperecivel, e como tal este passatempo não tem nada de
maravilhoso. Todos os palácios das mais de dezesseis mil rainhas de Krsna esta
vam cheios de jardins adequados, mobílias e outras parafernálias, que não têm
igual neste mundo. Esta história do Sfimad-Bhãgavatam não tem nenhum exa
gero. As rainhas de Krsna eram todas expansões de LaksrmjT, a deusa da fortu
na. Krsna vivia com elas em diferentes palácios e as tratava exatamente da mes
ma forma que um homem comum trata sua esposa.
Devemos nos lembrar sempre de que Krsna, a Suprema Personalidade de
Deus, estava representando exatamente como um ser humano; e embora tenha
exibido Suas opulências extraordinárias, casando-Sc com mais de dezesseis mil
esposas em mais de dezesseis mil palácios, quando estava com elas. comporta-
va-Se tal qual um homem comum, e seguia estritamente a relação entre esposo
e esposa, necessária em lares comuns. Portanto, é muito difícil compreender as
características do Brahman Supremo, a Personalidade dc Deus. Até mesmo
semideuses como Brahmã e outros são incapazes de sondar os passatempos
transcendentais do Senhor. As esposas de Krsna tiveram uma fortuna tal que
obtiveram a Suprema Personalidade de Deus como esposo, se bem que a perso-
0 salvamento do demônio Bhaumasura 417
Krsna experimentara que quando Nãrada Muni ofereceu uma flor pUrijãta
a RukminT, Satyabhãma tivera inveja de sua eo-esposa e imediatamente exigira
de Krsna uma flor similar. De fato, não foi possível acaimá-la até que se lhe
prometeu a árvore inteira. Krsna fez isso de verdade: a árvore foi trazida do
reino celestial para o planeta Terra. Após esse episódio, Krsna esperou que, já
que Satyabhãmã" tinha sido premiada com toda uma árvore de pãrijuta,
RukminT também exigiría algo. Contudo, RukminT não mencionou nada a
respeito do acidente, pois ela era grave, e só o serviço dela já a satisfazia. Krsna
quis vé-la um pouco irritada, e por isso urdiu um plano para ver o belo rosto de
RukminT manifestando um estado de irritação. Embora tivesse mais de dezes
seis mil e cem esposas, Krsna costumava comportar-Se com cada uma delas ex
primindo afeto familiar; Krsna costumava criar uma situação particular entre
Ele Mesmo e Sua esposa na qual a esposa O criticava na irritação do amor, e
Krsna sentia prazer com isto. Neste caso, como Krsna não conseguisse criticar
nada em RukminT, pois ela era muito solene e sempre se dedicava a servi-Lo,
Ele começou a falar-lhe sorridentemente e com grande amor. RukminT era a
filha do rei BhTsmaka, um rei poderoso. Deste modo, Krsna não a chamou de
RukminT; dessa vez Ele a chamou de a princesa. “Minha querida princesa,isto’
muito Me surpreende. Muitas eminentes personalidades pertencentes à ordem
real quiseram casar-se com você. Apesar de nem todos serem reis, todos pos
suíam a opulência e a riqueza da ordem real; eram todos bem comportados,
eruditos, famosos entre os reis, belos em suas características corpóreas e quali
ficações pessoais, liberais, muito poderosos em força, e avançados em todos os
aspectos. Não eram incompetentes de maneira nenhuma e, além disso, seu pai
e seu irmão não tinham nada contra seu casamento com tais pessoas. Pelo con
trário, eles deram sua palavra de honra de que você se casaria com Sis'upãla;
foram os seus pais que aprovaram o casamento. Sísupãla era um grande rei e es
tava tão luxurioso e louco por sua beleza que, se tivesse se casado com você,
Eu acho que ficaria sempre a seu lado tal qual um servo fiel seu,
“Não sou nada comparado com Sísupãla e suas qualidades pessoais. E
você mesma pode perceber isto. Estou surpreso que você tenha rejeitado o ca
samento com Sísupãla e tenha Me aceitado, a Mim que sou inferior, compara
do com Sísupãla. Considero-Me completamente incompetente para ser seu
esposo porque você é tão bela, sóbria, grave e exaltada. Permita-Me perguntar-
lhe: que motivo a induziu a Me aceitar? Evidentemente, agora posso chamá-la
de Minha bela esposa, mas ainda assim devo dizer-lhe qual é a Minha posição
verdadeira — que sou inferior a todos aqueles príncipes que queriam casar-se
com você.
“Em primeiro lugar, saiba que Eu estava com tanto medo de Jarãsandha
que não Me atreví a viver na terra, e por isso construí esta casa dentro da água
do mar. Eu não devia revelar este segredo aos outros, mas você tem que saber
Conversas entre Krsna e RukminT 421
que não sou lá muito heróico; sou um covarde c tenho medo deles. Ainda
assim não estou a salvo, porque todos os grandes reis da terra são inimigos
Meus. Fui Eu pessoalmente que criei este sentimento de inimizade lutando
com eles de muitas maneiras. Outro erro é que não tenho direito imediato ao
trono de Dvãrakã, apesar de Me encontrar nesta posição. Embora tenha obti
do um reino por matar Karhsa, Meu tio materno, o reino devia passar a ser de
Meu avô; de modo que na realidade não possuo nenhum reino. Além disso,
não tenho nenhum objetivo fixo na vida. As pessoas não conseguem Mc com
preender muito bem. Qual é o objetivo último de Minha vida? Elas sabem mui
to bem que em Vrndãvana Eu era um pastorzinho de vacas. As pessoas espera
vam que Eu seguisse os passos de Meu pai adotivo, Nanda Mahãrãja, e fosse
fiel a SrlmatT Râdhãrãnr e a todas as amigas d ’Ela que vivem na aldeia de
Vrndãvana. Mas, de repente, Eu as deixei. Queria tornar-Me um príncipe famo
so. Contudo, não consegui ter reino algum, nem consegui governar como um
príncipe. As pessoas estão confusas, sem saber qual é meu objetivo último na
vida; elas não sabem se sou um pastorzinho de vacas ou um príncipe, se sou o
filho de Nanda Mahãrãja ou o filho de Vasudeva. Como não tenho objetivo
fixo na vida, pode ser que as pessoas Me chamem de vagabundo. Por isso, estou
surpreso de que você tenha escolhido um esposo vagabundo como Eu.”
“Além disso, não sou muito educado, nem sequer em etiqueta social. Uma
pessoa deve se satisfazer com uma única esposa, mas você tem experiência de
que tenho Me casado muitas vezes, e que tenho mais de dezesseis mil esposas.
Não sou capaz de satisfazê-las a todas como um esposo educado. Meu compor
tamento com elas não é muito satisfatório, e Eu sei que você está bem cons
ciente disso. Às vezes crio uma situação para Minhas esposas que não é muito
feliz. Como fui educado numa aldeia durante Minha infância, não conheço
muito bem a etiqueta da vida urbana. Não sei como agradar uma esposa com
palavras delicadas e comportamento satisfatório. E pode-se ver pela experiên
cia prática que qualquer mulher que siga Meu caminho ou que se sinta atraída
por Mim, acaba finalmente a chorar pelo resto de sua vida. Em Vrndãvana,
muitas gopls sentiram-se atraídas por Mim; mas agora Eu as deixei, e por isso
elas vivem, mas simplesmente a chorar por Mim, em separação. Ouvi Akrüra e
Uddhava dizerem que desde que deixei Vrndãvana, todos os Meus amigos pas-
torzinhos de vacas, as gopls e Rãdhãrãnl, c Meu pai adotivo, Nanda Mahãrãja
- simplesmente choram por Mim constantemente. Deixei Vrndãvana para sem
pre e agora, em Dvãrakã, estou compromissado com as rainhas, porém não Me
comporto bem com nenhuma de vocês. Assim, vocc pode compreender facil
mente que não tenho caráter estável; não sou um esposo de muita confiança. O
resultado final para uma pessoa que se atrai por Mim é que ela adquire uma vi
da de pura privação.
422 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
“Minha cara e bela princesa, saiba também que estou sempre sem dinhei
ro. Logo depois que nasci, fui levado sem dinheiro para a casa de Nanda Mahã-
rãja, e fui criado tal qual um pastorzinho de vacas. Embora Meu pai adotivo
possuísse muitas centenas de milhares de vacas, Eu não possuía nem sequer
uma delas. Fui simplesmente encarregado de cuidar delas c apascentá-las, mas
não era o proprietário. Aqui também não sou proprietário de nada, mas estou
sempre sem dinheiro. Não tenho motivo para Me lamentar por tal estado de
pobreza; se no passado Eu não possuía nada, por que havería de lamentar por
não possuir nada no presente? Observe também que Meus devotos não são
pessoas muito opulentas; eles também são muito pobres em bens mundanos.
Aqueles que são muito ricos, que possuem riqueza mundana, não estão interes
sados em devoção a Mim, ou na consciência de Krsna. Muito pelo contrário,
quando uma pessoa fica sem dinheiro, seja à força, seja devido às circunstân
cias, pode ser que ela se interesse por Mim, no caso.de obter a devida oportuni
dade. As pessoas que se orgulham de suas riquezas não tiram proveito da cons
ciência de Mim, mesmo que se lhes ofereça a associação com Meus devotos.
Em outras palavras, pode ser que a classe de homens mais pobres sinta algum
interesse por Mim, mas a classe de homens mais ricos não tem nenhum interes
se. Por isso, acho que você não foi muito inteligente ao Me escolher. Parece
que você é muito inteligente, pois foi educada por seu pai e seu irmão; porém
no finai das contas, você cometeu um grande erro ao escolher o companheiro
de sua vida.
“Mas não faz mal; antes tarde do que nunca. Você tem liberdade para es
colher um esposo adequado que esteja realmente no mesmo nível que você
em opulência, tradição familiar, riqueza, beleza, educação —em todos os as
pectos. Qualquer erro que você tenha cometido pode ser esquecido. Agora
você pode esboçar seu próprio caminho lucrativo de vida. Geralmente, uma
pessoa não estabelece uma relação marital com uma pessoa que tenha uma po
sição superior ou inferior à dela. Minha cara filha do rei de Vidarbha, acho que
você não considerou com muita sagacidade antes de seu casamento. Deste
modo, você fez uma seleção errada ao Me escolher como esposo. Você ouviu
por engano que Eu tinha um caráter muito exaltado, se bem que na realidade
Eu não passasse dc um pedinte. Simplesmente porque oüviu falar de Mim, você
Me escolheu como seu esposo, sem ter Me visto nem conhecer Minha verdadei
ra posição. Você não fez isto corretamente. Por isso, Meu conselho é: antes
tarde do que nunca; agora você pode escolher um dos grandes príncipes
ksatriya e aceitá-lo como o companheiro de sua vida, e pode, assim, Me rejei
tar.”
Krsna estava propondo que RukminT se divorceasse d ’Ele numa época em
que RukminT já tinha muito filhos crescidos. Portanto, toda a proposta feita
por Krsna a RukminT parecia algo inopinado, porque, de acordo com a cultura
Conversas entre Krsna e Rukminí 423
védica, não existia essa coisa de separação de marido e mulher pelo divórcio.
Tampouco era possível que Rukminí fizesse isto numa idade avançada, quando
já tinha muitos filhos casados. À Rukminí parecia que cada uma das propostas
de Krsna era disparatada, e ela estava surpresa de que Krsna pudesse dizer tais
coisas. Simples como era, sua ansiedade aumentava cada vez mais em face da
idéia de ter que se separar de Krsna.
Krsna continuou: “Afinal, você tem que se preparar para sua próxima vi
da. Por isso, aconselho que escolha alguém que possa ajudá-la tanto nesta vida
quanto na vida seguinte, pois Sou completamente incapaz de ajudá-la. Minha
cara e bela princesa, você sabe que todos os membros da ordem principesca,
incluindo SisupUla, Salva, Jarasandha, Dantavakra e até mesmo Rukiní, seu
irmão mais velho, são todos inimigos Meus; eles não gostam nada de Mim.
Eles Me odeiam no mais fundo do coração. Todos estes príncipes estavam in
flados de orgulho com suas posses mundanas, c não ligavam a mínima para
ninguém que se lhes assomava. Para dar-lhes algumas lições, concordei em
raptar você de acordo com o seu desejo; de outro modo, na realidade não te
nho amor por você, se bem que você Me amasse mesmo antes do casamento.
“Como já expliquei, não estou muito interessado na vida familiar ou no
amor entre esposo e esposa. Por natureza, não gosto muito de vida familiar,
esposa, filhos, lar e opulências. Assim como Meus devotos jamais prestam
atenção a todas estas posses mundanas, Eu também sou assim. Na realidade,
estou interessado na auto-realização; é isto que Me dá prazer, não esta vida
familiar.” Após apresentar Sua declaração, o Senhor Krsna parou de repente.
A grande autoridade Sukadeva Gosvãmí observa que Krsna quase sempre
passava Seu tempo com RukminT, e que Rukminí estava um pouco orgulhosa
de ter uma fortuna tão grande que Krsna jamais a deixava, nem sequer por um
momento. No entanto, Krsna não gosta que nenhum de Seus devotos seja or
gulhoso. Logo que o devoto se torna orgulhoso, Krsna corta esse orgulho com
alguma tática. Também neste caso, Krsna disse muitas coisas que para
Rukminí foram duras de ouvir. Ela só pôde concluir que a qualquer momento
Krsna podia Se separar dela, embora ela estivesse com orgulho de sua posição.
Rukminí estava consciente de que seu esposo não era um ser humano co
mum. Ele era a Suprema Personalidade de Deus, o senhor dos três mundos. Da
forma como o Senhor estava falando, ela estava com medo de ter que se sepa
rar d’Ele, pois nunca antes ouvira Krsna falar palavras tão ásperas. Deste modo,
ficou perplexa com medo da separação, e seu coração começou a palpitar. Sem
responder a nenhuma palavra que Krsna dissera, ela simplesmente chorava com
grande ansiedade, como se estivesse afogando num oceano de aflição. Silencio
samente, riscava o solo com as unhas dos dedos do pé, as quais refletiam uma
luz avermelhada no solo. As lágrimas cor-de-rosa de seus olhos, misturadas com
o cosmético negro de suas pálpebras, escorriam, lavando o kurikumac o açafrão
424 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
dos seios dela. Sufocada por causa da grande ansiedade, incapaz de falar sequer
uma palavra, ela mantinha a cabeça baixa e permanecia parada, tal qual uma
vara. Devido ao temor extremamente doloroso e à lamentação, perdera todo o
seu poder de raciocínio e ficou tão fraca que imediatamente seu corpo perdeu
muito peso, tanto que os braceletes em seus pulsos afrouxaram. A vareta
câmara, com a qual estava servindo a Krsna, caiu imediatamente de sua mão,
seu cérebro e sua memória ficaram confusos, e ela perdeu a consciência. Seus
cabelos bem penteados desmancharam, e ela caiu dura, como uma bananeira
cortada por um,redemoÍnho de vento.
O Senhor Krsna compreendeu imediatamente que RukminT não tinha le
vado Suas palavras na brincadeira. Ela as tinha levado muito a sério e, em sua
extrema ansiedade por causa da separação imediata d'Ele, caíra neste estado. O
Senhor SrT Krsna é naturalmente muito afetuoso, com Seus devotos, de modo
que quando viu o estado em que se encontrava RukminT, Seu coração enterne
ceu-se imediatamente. De imediato, Ele teve misericórdia dela. A relação entre
Krsna e RukminT era a mesma que entre Laksml e Nãrlyana; assim, Ele apare
ceu diante dela em Sua manifestação de Nãrãyana com quatro mãos. Desceu
da cama, ergueu-a pelas mãos, e, colocando Suas mãos refrescantes sobre o ros
to dela, alisou os cabelos espalhados sobre sua cabeça. O Senhor Krsna secou
os seios molhados de RukminTjT com Sua mão. Compreendendo a seriedade do
amor de RukminT por Ele, Krsna abraçou-a contra o peito.
A Personalidade Suprema é muito habilidoso em exprimir uma coisa sen
satamente para que a compreendamos, e deste modo Ele tentou retratar tudo
que dissera antes. Ele^é o único recurso de todos os devotos, e por isso sabe
muito bem como satisfazer Seus devotos puros. Krsna compreendeu que
RukminT não foi capaz de compreender as declarações que Ele fizera como
brincadeira. Para neutralizar a confusão dela, Ele começou a falar novamente,
como se segue.
“iMinha querida filha do rei de Vidarbha, Minha querida RukminT, por
favor, não Me entenda mal. Não seja cruel assim coMigo. Sei que você está
sincera e seriamente apegada a Mim; você é Minha companheira eterna. As pa
lavras que a afetaram tanto não são verdadeiras, Eu queria irritá-la um pouco,
e esperava que você replicasse essas palavras galhofeiras. Infelizmente, você as
levou a sério, pelo que lamento muito... Eu esperava que seus lábios vermelhos
tremessem de raiva ao ouvir Minhas palavras, e que você Me punisse 'com
muitas palavras. Õ perfeição do amor, jamais esperei que você ficasse em tal
estado. Esperava que você colocasse seus olhos cintilantes sobre Mim em
represália, e dessa maneira Eu seria capaz de ver seu belo rosto com essa
disposição irada.
“Minha querida e bela esposa, você sabe que nós somos chefes de família.
Estamos sempre atarefados com muitos assuntos domésticos, de modo que an-
Conversas entre Krsna e RukminT 425
ram que a posição material é a região mais escura, a qual impede o progresso
da iluminação espiritual. Se Seus servos nao gostam da supremacia material,
que dizer então de Você? Meu querido Senhor, também está perfeitamente
correta a declaração que Você fez de que não atua como uma pessoa comum
que tem um objetivo particular na vida. Até os Seus grandes devotos e servos,
conhecidos como grandes sábios e pessoas santas, mantêm-se num estado tal
que ninguém é capaz de conseguir indicação alguma sobre o objetivo das vidas
deles. A sociedade humana os considera loucos c cínicos. 0 objetivo da vida
deles permanece um mistério para o ser humano comum; a pessoa mais baixa
da humanidade não é capaz de conhecer Você, nem conhecer Seu servo. Um
ser humano contaminado nem sequer pode imaginar Seus passatempos e os
passatempos de Seus devotos. Ó ilimitado, se as atividades e esforços de Seus
devotos permanecem um mistério para o ser humano comum, como podem
eles compreender Seu motivo e esforço? Todas as espécies de energia e opulên
cia estão ocupadas servindo a Você, mas ainda assim elas descansam sob Sua
proteção.
“Você Se descreve como sem dinheiro, mas este não é um estado de po
breza. Uma vez que na existência não há nada além de Você, Você não preci
sa possuir nada - Você próprio já é tudo. Ao contrário de outras pessoas,
Você não precisa adquirir nada vindo de fora. Todas as coisas contrárias que
aparecem em Você podem ser harmonizadas porque Você é absoluto. Você
não possui nada, porém não há ninguém mais rico que Você. Ninguém pode
ser rico no mundo material sem ter posses. Uma vez que Sua Onipotência é
absoluto, Você pode retificar a contradição de não possuir nada e de ao mes
mo tempo ser o mais rico. Nos Vedas se declara que embora Você não tenha
mãos nem pernas materiais, Você aceita tudo que os devotos oferecem com
devoção. Você não tem olhos nem ouvidos materiais, mas mesmo assim pode
ver todas as coisas em toda a parte, e pode ouvir todas as coisas em toda a
parte. Embora Você não possua nada, os grandes semideuses, que aceitam
orações e adoração de outras pessoas, vêm e O adoram para solicitar Sua
misericórdia. Como é possível classificar Você entre os pobres?
“Meu querido Senhor, Você também declarou que a seção mais rica da
sociedade humana não 0 adora. Isto também é correto, porque as pessoas que
se inflam de orgulho com posses materiais, pensam em utilizar sua propriedade
para satisfazer os sentidos. Quando um homem na miséria enriquece, eíe faz
um programa para satisfazer os sentidos. Isto se deve â ignorância dele quanto
à forma de utilizar o dinheiro que ganhou com o suor do rosto. Sob o encanto
da energia externa, ele pensa que seu dinheiro está sendo empregado correta
mente para satisfazer seus sentidos, e deste modo descuida de prestar serviço
transcendental. Meu querido Senhor, Você declarou que as pessoas que não
possuem nada são-Lhe muito queridas; renunciando a tudo, Seu devoto só
Conversas entre Krsna e Rukminl 427
quer possuir Você. Percebo, então, que um grande sábio como Nãrada Muni,
que não possui nenhuma propriedade material, é não obstante muito querido
para Você. E tais pessoas não ligam para nada além de Sua Onipotência.
“Meu querido Senhor, Você declarou que um casamento entre pessoas
de mesmo status quanto à posição social, à beleza, às riquezas, à força, à in
fluência e à renúncia, pode ser um casamento adequado. Porém, só podemos
atingir este status de vida por Sua graça. Você é a fonte perfeccional suprema
de todas as opulências. Qualquer status de vida opulento que tenhamos pro
vém inteiramente de Você. Como se descreve no Vedãnta-sutra, janmãdyasya
yatah: Você é a fonte suprema da qual tudo emana, o reservatório de todos
os prazeres. Portanto, as pessoas que são dotadas de conhecimento desejam
apenas alcançá-Lo e nada mais. Para alcançarem Seu favor, elas abandonam
tudo - até a realização transcendental de Brahman. Você é o supremo e
objetivo último da vida. Você é o reservatório de todos os interesses das
entidades vivas. Aqueles que são realmente bem motivados só desejam Você
e por esse motivo abandonam tudo para lograrem o sucesso. Por isso, eles
merecem estar associados com Você. Na sociedade dos servos c dos servidos
em consciência de Krsna, não nos sujeitamos às dores c aos prazeres da socie
dade material, a qual funciona de acordo com a atração sexual. Portanto,
todos, homens ou mulheres, devem procurar ser um associado em Sua socie
dade de servos e servidos. Você é a Suprema Personalidade de Deus; nin
guém é capaz de ultrapassá-Lo, nem pode ninguém chegar ao mesmo nível
que Você. O sistema social perfeito é aquele no qual Você permanece no cen
tro, sendo servido como o Supremo, e todos os outros se ocupam como Seus
servos. Numa sociedade construfda perfeitamente assim, todos podem manter-
se eternamente felizes e bem-aventurados.
“Meu Senhor, Você declarou que só os pedintes louvam Suas glórias, o
que também é perfeitamente correto. Mas quem são esses pedintes? Todos
esses pedintes são devotos exaltados, personalidades liberadas e pessoas na
ordem renunciada da vida. Todos eles são grandes almas e devotos que não
têm outro objetivo além de glorificá-Lo. Tais grandes almas perdoam até o
pior dos ofensores. Estes assim chamados pedintes executam seu avanço
espiritual de vida, tolerando todas as espécies de tribulaçÕes que existem no
mundo material. Meu querido esposo, não pense que eu O aceitei como
esposo por minha inexperiência; na realidade, segui os passos de todas essas
grandes almas! Segui os passos destes grandes pedintes e decidi entregar minha
vida a Seus pés de lótus.
“Você disse que não tem dinheiro, e isto é correto. Você Se distribui
completamente a estas grandes almas e a estes devotos. Como sabia perfeita
mente bem deste fato, rejeitei até personalidades eminentes da categoria do
Senhor Brahmã e do rei Indra. Meu Senhor, o grande fator tempo atua uni
428 Krsna, a Suprema Personalidade de Deus
camente sob Sua direção. 0 fator tempo é tão grandioso e poderoso que numa
questão de momentos pode efetuar a devastação em qualquer parte da criação.
Depois de considerar todos estes fatores, achei que Jarãsandha, Sisupãla e ou
tros príncipes similares que queriam casar-sc comigo não eram mais importan
tes que insetos ordinários.
“Meu querido e todopoderoso filho de Vasudeva, a declaração que Você
fez de que Sc refugiou dentro da água do oceano por estar com medo de todos
os grandes príncipes é bastante adequada; mas a experiência que tenho com
Você contradiz isto. O que vi na verdade foi que Você me raptou à força na
presença de todos esses príncipes. Na ocasião da cerimônia de meu casamento,
com um simples puxão da corda de Seu arco, Você afastou os outros facilmen
te e bondosamente deu-me refúgio a Seus pés de lótus. Ainda me lembro
vividamente de que Você me raptou da mesma maneira que um leão toma à
força seu quinhão de presa caçada, afastando num piscar de olhos todos os
outros animais pequenos.
“Meu querido Senhor de olhos de lótus, não consigo compreender a de
claração que Você fez de que as mulheres e as outras pessoas que se refugiaram
sob Seus pés de lótus passam seus dias unicamente na privação. Podemos ver
que na história do mundo príncipes como Ariga, Prthu, Bharata, Yayãti e Gaya
foram todos imperadores eminentes do mundo, e que ninguém podia competir
com suas posições exaltadas. Porém, para poderem alcançar o favor de Seus
pés de lótus, eles renunciaram a suas posições exaltadas e entraram floresta
adentro para praticar penitências e austeridades. Por acaso o fato deles aceita
rem voluntariamente tal posição, aceitando que Seus pés de lótus são tudo que
se deve considerar, por acaso isso significa que eles estavam na lamentação e
na privação?
“Meu querido Senhor, Você me avisou que ainda posso escolher outro es
poso da ordem principesca e me divorciar de Sua companhia. Porém, meu que
rido Senhor, sei perfeitamente bem que Você é o reservatório de todas as boas
qualidades. Grandes pessoas santas como Nãrada Muni estão sempre ocupadas
simplesmente em glorificar Suas características transcendentais. Sc uma pessoa
simplesmente se refugia numa dessas pessoas santas, ela se livra imediatamente
de toda a contaminação material; e porque entra em contato direto com Seu
serviço, a deusa da fortuna concorda em conceder a essa pessoa todas as suas
bênçãos. Neste caso, que mulher que tenha uma vez ouvido fontes autorizadas
falarem em Suas glórias e de uma forma ou outra tenha saboreado o gosto
nectáreo de Seus pés de lótus — que mulher será tola ao ponto de concordar
em se casar com alguém deste mundo material que está sempre com medo da
morte, da doença, da velhice e do renascimento? Foi por isso que aceitei os
Seus pés de lótus, não sem antes considerar, mas depois de uma decisão madu
ra e deliberada. Meu querido Senhor, Vocc é o Senhor dos três mundos. Você
Conversas entre Krsna e Rukminl 429
iCrsna falou o seguinte com RukminT: “Minha querida e casta esposa, Minha
querida princesa, Eu estava esperando que você desse tal explicação, e foi só com
esta finalidade que falei todas aquelas palavras galhofeiras, para que pudesse
enganá-la a respeito do ponto de vista verdadeiro. Agora Meu fim está servido.
E completamente real a explicação maravilhosa que você deu para cada uma
das Minhas palavras, e Eu a aprovo completamente. Õ belíssima Rukminí,
você é a Minha mais querida esposa. Estou muito satisfeito de saber o quanto
você Me ama. Por favor, esteja certa de que estou sempre a seu serviço, não
importa que ambição e que desejo você tenha e o que você espere de Mim.
Também é verdade que Meus devotos, Meus mais queridos amigos e servos,
estão sempre livres da contaminação material, mesmo que não se sintam
inclinados a Me pedirem tal liberação. Meus devotos jamais desejam nada dc
Mim, exceto estarem ocupados a servir-Me. E ainda assim, como dependem
completamente de Mim, mesmo que por acaso Me peçam algo, isto não é
material. Em vez de se transformarem na causa do cativeiro material, tais
ambições e desejos transformam-se na fonte de liberação deste mundo material.”
“Minha querida, casta e piedosa esposa, baseado na castidade estrita, exa
minei o amor que você tem por seu esposo, e você passou no exame com mui
to sucesso. Agitei-a de propósito, falando muitas palavras que não eram apro
priadas para seu caráter, mas estou surpreso de ver que sua devoção por Mim
não desviou nem um pouco de sua posição fixa. Minha querida esposa, sou
Eu quem concede todas as bênçãos, mesmo até o nível da liberação deste
mundo material, e Eu sou o único que pode parar com a continuação da exis
tência material e mandar uma pessoa de volta ao lar, de volta ao Supremo.
Uma pessoa cuja devoção por Mim é adulterada, adora-Me em troca de algum
benefício material, só para se manter no mundo da felicidade material, que
culmina no prazer da vida sexual. Uma pessoa que se dedica a penitências c aus-
íeridades severas só para alcançar esta felicidade material, está ccrtamentc sob
a ilusão de Minha energia externa. São certamente muito tolas as pessoas que
se ocupam em Meu serviço devocional simplesmente com o'objetivo de conse
guir ganhos materiais e gratificação dos sentidos. A felicidade material baseada
na vida sexual é disponível nas espécies dc vida mais abomináveis, tais como os
porcos e cães. Ninguém deve tentar se aproximar de Mim buscando por tal fe
licidade, porque até uma pessoa que se encontre numa condição de vida infer
nal pode dispor dessa felicidade. Portanto, para as pessoas que estão simples
mente buscando a felicidade material, e não a Mim, é melhor que elas
permaneçam nessa condição infernal.”
A contaminação material é tão forte que todos trabalham duramente dia
e noite em busca de felicidade material. O show de religiosidade, austeridade,
penitência, humanitarismo, filantropia, política, ciência —tudo objetiva a rea
lizar algum benefício material. Em troca do êxito imediato de benefícios mate
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