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Sec Se en aod ery eas eens eee eee A Organizagao do Comportamento: Neurdnios e Horménios © capitulo anterior, falamos sobre os animais como se el fossern dotados de computadores neurais projetados para detectar estimulos basicos, distinguir padrdes de aquisi¢ac de informagées e ordenar reagdes adaptativas. Por exem- plo, quando uma mariposa é exposta ao ultrassom de um morcego predader, seus receptores auditivos sao exci e disparam ume cadeia de eventos neurais, os quais aju- dam o inseto a responder adaptativamente a esse estimulo acstico. A capacidade dos mecanismos neurais de filtrar informagées irrelevantes para perceber fatos importantes e ordenar reagées eficientes faz sentido do ponto de viste bioldgico. Mas os sistemas nervosos fazem mais do que apenas responder de forma X a presenca do estimulo Y. Imagine um macho de mariposa atraido pela trilha de feroménio de uma fémea distante. Se 0 sistema nervoso do macho ope: rar simplesmente mantendo o voo da mariposa em qual- quer lugar no ar onde 0 feroménio sexual da fémea esteja co macho no rastro de cheiro estaria com um problema rea © morcego estivesse por perto. Mas o sistema nervoso da marioosa avalia a relacao risco versus oportunide produtiva’™? de forma que, se a mariposa ouve um pulso ultrassénico muito alto, geralmente aborta sua atividade de seguir 0 rastro de cheiro e mergulha para esconder-se.”"*” Em fungdo do modo como seu sistema nervoso funciona, a mariposa macho pode interromper a precura por fémeas quando um morcego cacador apa- rece em seu caminho, adiando o acasalamen- los to para outra oportunidade 150 John Alcock a FIGURA 5.1. Diferentes exibigdes de corte da rola doméstica macho esto sob Wanios. (A) © comportamento agressivo de andar Ge forma empertigada e a exibicso de curvar-se pata frente estao ligados 8 testos terona, (O macho é a ave & esquerda.)(B) A exibicdo de solicitacao de ninho esta ligada ao estrégeno. Fotografias de Leonida Fusani ‘0 controle de diferentes horm ® ‘Oshorménios com frequéncia ajudam os animais a manter nos eixos suas opgoes comportamentais. Por exemplo, quando uma rola doméstica macho corteja uma fe- mea, ele inicia perseguindo agressivamente sua potencal parceira,elevando 0 peitoe curvando-se na diregio dela de maneira agressiva. Se esse fosse seu tinico comporta- mento de corte, ele nao poderia ir muito longe, porque as fémeas nao acasalam a me hos que essa exibigdo agressiva inical seja seguida por uma exibicio serena chamada solicitar ninho, na qual o macho fica sobre 0 ninho com a cauda levantada (Figura 5.1). Como verificado, o horménio testosterona aumenta a probabilidade de perse~ guigio com peito elevado, enquanto o horm@nio estrégeno aumenta a probabilidade de solicitar ninho.”” O cérebro da rola macho elabora suas varias atividades sexuais tna ordem correta pela producao de uma enzima, a aromatase, no estégio apropriado dda corte; a aromatase catalisa a conversdo de testosterona em estr6geno, permitindo {que o macho mude a exibicao de peito elevado para solicitacio de ninho na sequéncis adequada. ‘A habilidade do sistema nervoso e hormonal para realizar essas proezas na or ganizagio comportamental é 0 assunto deste capitulo, O problema fundamental que ehordaremos é como mecanismos proximais estruturam o comportamento de um in @ividuo—de momento a momento, ao longo do dia, ao longo de poucas semanas ou de uma estacdo reprodutiva, ou mesmo ao longo de todo um ano. Examinaremos trés lasses de mecanismos que controlam essas funcdes: 0s centros de comando neural gue se comunicam entre si, os reldgios que organizam a atividade desses eentros de Gomando e os sistemas hormonais que rastreiam mudangas no ambiente fisicoe social ¢ ajustam as prioridades de centros de comando concorrentes Centros de comando neurais organizam 0 comportamento Como muitos animais t8m a capacidade de fazer coisas diferentes em resposta @ ‘muitos estimulos diferentes, em algum momento eles enfrentam a questo de qual comportamento ativar. Aum nivel distal, éfécil entender porque animais reramente tentam fazer duas coisas ao mesmo tempo. Mas, a um nivel proximal, como s40 or ganizados os sistemas nervosos dos animais para evitar que ocorram contlitos nao adaptativos? ‘Um caminho para estabelecer prioridades comportamentais é ter um sistema ner~ voso dotado de centros de comando, o qual inclui mecanismos liberadores inatos, ge- Comportamento Animal_151 Ganglio protocerebral (cérebro) Ganglio 6ptico Conexéo exciatéria ‘adores de padrao central, sistemas de controle de canto e coisas semelhantes a0 que jé vimos =x capitulos anteriores. Cada centro de coman- do pode ser responsével por ativar principal- Conexses “mente uma resposta em particular, mass varios inbitérias “ceniros de comando se comunicam uns com os ‘eutros numa ordem hierdrquica, de forma que ‘=m centro ativo pode suprimir sinais competi- ores de outro centro (ou vice-versa). Observe “que, embora um “centro de comando” possa ser ‘gm simples feixe de neurdnios em uma regio ‘especifica do cérebro, ele pode também consistir "em uma bateria de neurdnios capazes de unifi- “ezr uma tomada de decisao. Kenneth Roeder usou a teoria dos centros ‘de comando para examinar a tomada de decisto em louva-a-deus.’™ Um louva-a-deus pode fazer ‘suitas coisas: procurar por pares, tomar sol, co- _pular, voar, fugir de morcegos, etc. Na maior par- ‘do tempo, no ertanto, um tipico louva-a-deus _permanece imével sobre uma folha, até que um ‘Eesouro desavisado vague pelas proximidades. ‘Quando os receptores visuais do louva-a-deus © FIGURA'S.2 Sistema nervoso de um louva-a-deus. Se as conexées entre o sobre a presenca da presa, ele executa ré- _ganglio do protocérebro e do ginglio subesofagico forem interrompidas, 0 dos, precisos e fortes movimentos para agarrar _ganglio subesofgico envia uma corrente de mensagans excitatérias a0 gan- | eee POLES reese ate eae Roeder propés que o sistema nervoso do Suva-a-deus ordena suas opgdes gracas as rela- inibitérias entre uma variedade de centros de comando dentro de sua rede neu- (O desenho do sistema nervoso do louva-a-deus (Figura 5.2) sugere que o controle miisculos em cada segmento do inseto esté sob responsabilidade do ganglio da- segmento. Roeder testou essa possibilidade cortando a conexao de um ganglio entar com o resto do sistema nervoso. Como esperado, os miisculos do segmen- ‘solado falharam em reagir quando outro local do sistema nervoso era ativado; ito, se o ganglio isolado era estimulado eletricamente, os miisculos e alguns embros naquele segmento produziam movimentos vigorosos e completos. Se os ganglios segmentares sio, de fato, responsdveis pelo comando de seg- wos especificos para executar certos movimentos, qual é papel do cérebro do ‘a-a-deus? Roeder suspeitava que certas células cerebrais eram responsdveis "por inibir (bloquear) a atividade neural no ganglio segmentar, mantendo algumas ccélulas em repouso até que elas fossem especificamente estimuladas por um entro de comando no cérebro. Nesse caso, a interrupgao da conexao entre as células ebrais inibitorias e o ganglio segmentar teria 0 efeito de remover essa inibicio respostas conflitantes inapropriadas. Quando Roeder separou as conexdes © ganglio protocerebral (0 cérebro do louva-a-deus) do restante de seu sistema _=rv0s0, ele produziu um inseto que caminhava e agarrava simultaneamente, o que oderia ser desastroso na natureza. O ganglio protocerebral aparentemente assegu- que um louva-a-deus intacto caminhe ou agarre, mas nao faca as duas coisas a0 esmo tempo. Entretanto, quando Roeder removeu toda a cabeca ~ procedimento que elimi- tanto o ganglio subesofagico como 0 protocérebro ~ 0 louva-a-deus ficou imé- el. Cutucando 0 animal fortemente, Roeder pode induzir movimentos simples ¢ “srelevantes, mas nada além disso. Esses resultados sugerem que o protocérebro de Jouva-a-deus intacto envia uma corrente de mensagens inibitérias ao ganglio su- igico, impedindo a comunicagao entre os nieurdnios desses dois ganglios. No Ganglo ssubesofigico Primero ganglio torécico Ganglios abdominais 152 _John Alcock entanto, quando um determinado sinal sensorial atinge 0 protocérebro, seus neurénios deixam de inibir determinados médulos no ganglio subesofagico. Livres da supressao, esses neurdnios subesofagicos enviam mensagens excitat6rias para varios ganglios segmentares, onde novos sinais sao gerados para ordenar ages especificas aos miisculos. Dependendo de qual secio do ganglio subesofégico nio esta mais inibida, 0 Jouva-a-deus pode andar para frente, rastejar com as pernas anteriores, voar ou fazer outra cois: Curiosamente, machos maduros de louva-a-deus nem sempre obedecem a “regra” de que a remogao completa da cabeca elimina um comportamento, Em vez disso, um macho adulto sem cabeca realiza uma série de movimentos rotativos {que balancam seu corpo de um lado para 0 outro em um cir- culo, Enquanto isso acontece, o abdome do louva-a-deus esta girando para baixo, movimentos normalmente bloqueados FIGURA 5.3 Um macho acéfalo. A perda da cabeca edo cé- por sinais provenientes do protocérebro. Essa estranha res~ Tobro neo eliminou o comportamento de acasalamento desse Hosta a decapitagdo comeca a ter sentido se vocé considerar louva-a-deus macho montado sobre o dorso de uma fémea que um louva-a-deus algumas vezes literalmente perde a ca- intacta. Fotografia de Mike Maxwell 2 beca por uma fémea, quando ela o agarra e o consome, come- cando pela cabeca. Mesmo sob essas dificeis circunstancias, 0 macho ainda consegue copular com a parceira canibal (Figura 5.3), gracas 8 natureza do sistema de controle que regula seu comportamento de acasalamento. Acéfalo, suas pemnas carregam o que restou dele em um caminho circular, até seu corpo tocar o da fémea, momento no qual ele sobe no dorso dela e gira o abdome para baixo para co- pular competentemente. Macho ou fémea, adulto ou imaturo, 0 louva-a-deus, como muitos animais, tem tum sistema nervaso que parece funcionalmente organizado como um grupo de cen- tros de comando, cada um com responsabilidades especificas. Alguns centros produ- zem seu proprio sinal, inibindo as atividades de outros centros, 0s quais possibilitam a0 louva-a-deus fazer apenas uma coisa de cada vez. A importancia das relagdes ini- bitorias dentro do sistema nervoso também é evidente na alimentacao da mosca va- rejeira, alvo dos estudos classicos de Vincent Dethier."* Esses insetos ingerem varios ‘exsudatos de plantas, sucos de corpos de animais em decomposigao e outros “saboro- 508” fluidos ricos em acticar e proteinas. Durante a noite, os nutrientes coletados nas refeicdes diurnas so metabolizados para prover energia ao inseto. De manha, a mos- ca voa para encontrar alimento adicional, localizado em parte pelo odor e em parte pelo sabor detectado pelos pés, quando ela pousa em algo timido. A entrada sensorial adequada ativa comandos de alimentagao: a mosca estende sua probéscide, expande seu labelo e ingere o liquido. Dethier mostrou experimentalmente que a velocidade na qual o fluido é sugado ‘ea duracio da alimentagao sdo proporcionais @ concentracio de agicar no fluido. Se o liquido nao for muito doce, os receptores orais da mosca cessam 0 disparo ra- pidamente e a stcgao para. No entanto, se as concentracées de agticar forem eleva- das, os receptores orais continuam disparando por cerca de 90 segundos antes de cessarem, finalizando aquele turno de alimentagao. Num curto espago de tempo, as células sensoriais dos pés tornam-se ativas novamente, causando nova extensio da probéscide e mais ingestdo de liquido. Entretanto, mais cedo ou mais tarde, a mosca para totalmente de beber, mesmo quando permanece sobre 0 liquido mats rico em acticar existente. A dissecacao de uma mosca saciada revelou que seu papo, um saco que estoca alimento no trato digestivo, estava transbordante, forcando o fluido para o intestino, Dethier levantou a hipétese de que a distensao do trato digestivo anterior € detectada pelo estiramento de receptores presentes nessa parte do trato digestivo. Ele acreditava que esses receptores poderiam enviar mensagens ao cérebro, estimulando suas células a inibir a resposta de alimentacio Recepto de estiramento Intestine médio Trato digestive anterior Cérebr0 Z Nero secorrente, Fsofago. ee Cordio nervose ventral ccheios. ‘Como predito pela sua hipétese, receptores semelhantes aos receptores de es- tramento presentes em outros organismos foram encontrados na parte anterior do trato digestivo da mosca. Esses receptores alimentam a entrada sensorial em uma ‘via chamada de nervo recorrente, 0 qual se estende do trato digestivo anterior até ‘© cétebro (Figura 5.4); entretanto se o nervo recorrente for cortado experimental- mente, a mosca nao para de se alimentar, continuando com turno apés turno de 4alimentacdo até seu corpo literalmente explodir. Moscas com nervos recorrentes in- ‘actos ndo explodem a si mesmas, gracas ao arranjo inibit6rio entre os elementos do ‘sistema nervoso. eee 5.1. A Figura 5.5 mostra © registro da atvidade de um neurénio especifico no cérebro de um grilo, que parece atuar como célula de comand contralande o chamado estridu- ante do macho, produzido quando ele esfrega suas asas. Préximo aos 3 segundos de re- «isto, 0 gfe foi submetido a um abrupte sopro de ar que atingiu seus cercos, im par de péndices sensoriais projetados de parte posterior do abdome. Qual é a relevancia dessa ilustragao para 0 tépico que acabamos de discuti? Qual valor adaptative voc8 atribui 30 _sparente mecanismo proximal que ausilia os gros machos a tomar as decisdes compor- tamentais mostradas aqui? Cronogramas comportamentais Ahhabilidade dos comandos neurais centrais de se comunicar ¢ inibir uns aos outros ‘ajuda a organizar as prioridades do comportamento de um animal. Mas e se a or- enagio hierarquica dos centros de comando tiver que mudar a fim de satisfazer as demandas de um ambiente em mudanga? Algumas atividades sio melhor realizadas determinados periodos do dia do que outros. A fémea do grilo Teleogryllus, por ‘=xemplo, costuma se esconder em tocas ou sob folhas da serapilheira durante o dia e “s= expor apenas apos 0 crepuisculo, quando estérelativamente segura para procurar _parceiros."” Como seria de se esperar, grilos machos esperam pela noite para comecar ‘2chamar por parceiras."” Essas observagdes sugerem que as relacdes inibitorias entre ‘eentros de chamadono cérebro de um grilo macho e outros elementos neurais respon- Comportamento Animal 153 FIGURA 5.4 O sistema nervoso e o sistema digestivo da mosca varejeira. O corte do nerve Labele recorrente elimina a retroalimentacao para cére- . bro relacionada a plenitude do papo sinais que eventualmente bloqueiam a alimentagio dda mosca varejeira, cujo papo e estémago esto 154 John Alcock FIGURA 5.5 Registro da ativi- dade neural e comportamental de um grilo em atividade de canto. (A) Grilos machos cantam esfregando suas asas dianteiras. {B) O registro de um neurénio de comando no cérebro de um macho em atividade de canto ‘submetido a um breve estimulo, ‘téctil, um sopro de ar na ponta do abdome. O movimento das {sas do grlo e 0 seu canto so mostrades em linhas separades ‘A, fotografie de Edward S. Ross: B, de Hedwig." e) Sopro de ar 1 “| Neurénio i il il se IIRIIr| See, séveis por outros comportamentos devem mudar ciclicamente durante um perfodo de 24 horas, Um mecanismo de rel6gio pode ser titil para controlar o comportamento dde cantar, assim como o relégio biol6gico da borboleta monarca permite-lhe ajustar sua biissola solar com passar das horas, ao longo do dia (ver Figura 4.43). Pesquisadores interessados no modo como os animais podem mudar suas prioridades ao longo do tempo tém desenvolvide duas das maiores teorias concor- Tentes. A primeira teoria sugere que animais podem mudar suas prioridades em resposta a um relégio biolégico, mecanismo temporal com planejamento embuti do que atua independentemente de qualquer sinal a0 redor do animal. A existencia esse mecanismo temporal independente do ambiente € plausivel para qualquer pessoa que tenha voado através de varias zonas temporais e tentado ajustar-se de imediato as condig6es locais. A segunda teoria, entretanto, sugere que os animais alteram as relagdes entre centros de comando no seu sistema nervoso estritamente ‘com base em informages de retroalimentagao obtidas por mecanismos que mo- rnitoram o ambiente circundante. Esses dispositivos habilitariam os individuos a ‘modular seu comportamento em resposta a determinadas mudangas no ambiente ao seu redor, como redugao da intensidade luminosa quando anoitece. ‘Vamos considerar essas das possibilidades no contexto do ciclo de canto do grilo macho Teleogryllis. Cada turno de canto diézio poderia comesar no meso fordrio porque os grilos possuem um temporizador interno que mede quanto tem- po teria passado desde o infcio do tiltimo turmo; eles poderiam usar esse sistema Comportamento Animal 155 FIGURA 5.6 Ritmo circadiano do compor- tamento de cantar em grilos. Cada linha hori- zontal na grade representa um dia; cada linha vertical representa meia hora em uma escala de 24 horas. Marcas escuras representam periodos de atividade ~ neste caso, canto. As barras no topo e no meio da figura representam a con- igo de luminosidade. Nos primeiros 12 dias desse experimento, os grilos machos s40 man- tidos em luz constante (LL), e para o restante, eles s30 submetidos a ciclos de 12 horas de luz de escuro (LE). Grilos machos mantidos sob luz constante exibem um ciclo disrio de canto e de ausércia de canto, mas a cada dia 0 canto ‘comeca mais tarde. O inicio do “anoitecer” no dia 13 atua como um sinal que reajusta o ritmo de canto, qual logo para de mudar e, final- mente, comeca uma hora ou duas antes das luzes se apagarem todos os dias. Adaptada de Loher.*™ \dente do ambiente para ativar 0 infcio de um novo turno de cantos a cada et. Alternativamente, o mecanismo neural do inseto pode ser projetado para ‘canto quando a intensidade de luz.cai a um nfvel especifico. Se essa segun- ‘Ripétese for correta, entao grilos mantidos sob luz constante nao deveriam can- Mas, de fato, grilos de laboratério mantidos em salas nas quais a temperatura wece a mesma e as luzes ficam acesas 24 horas por dia continuam cantando jente por varias horas a cada dia. Sob condigdes de luz constante, o canto cerca de 24a 26 horas apés o horério de inicio do dia anterior (Figura 5.6), ¢ 6 ciclo de atividade que nao segue 0s sinais ambientais chamado de livre-curso. © 0 comprimento, ou periodo, do ciclo de livre-curso do canto do grilo é des- do do ciclo ambiental de 24 horas, causado pela rotagao didria da Terra sobre €ixo, podemos concluir que o padrao ciclico do canto do grilo é causado, em . por um ritmo circadiano interno que independe do ambiente (circadiano sig- “cerca de um dia”). “Agora colocaremos os grilos em um regime de 12 horas na luz e 12 horas no 0. A mudanga de claro para escuto oferece uma pista ambiental externa que os ps podem usar para ajustar seu mecanismo temporal. De fato eles usam, da mes- forma que as borboletas monarcas e os pombos reajustam seus relégios quando ridos a um laboratério com luz artificial (ver Capitulo 4). Apés poucos dias, smachos comegam a cantar cerca de 2 horas antes das luzes serem apagadas, an- spando precisamente 0 “anoitecer”, e continuam até cerca de 2,5 horas antes das =: se acenderem novamente pela “manha” (ver Figura 5.6). Esse ciclo de canto nde ao ciclo natural, sincronizado com o crepiisculo; ao contrario do ciclo de 9, ele no desvia da fase de 24 horas ao dia, mas € reajustado, dia apés dia, modo a comecar no mesmo periodo em relacdo ao apagar da luz." A partir desses tados, podemos concluir que o completo sistema de controle do canto do grilo tanto componentes independentes quanto dependentes do ambiente: um tem- dor independente de ambiente, ou rel6gio biol6gico, baseado em um ciclo que tem exatamente 24 horas e um dispositive ativado pelo ambiente que sincroniza elogio com as condigdes locais de luz, ate. 156 _John Alcock Pesquisadores com perspectivas evolutivas poderiam esperar que membros da mesma espécie possuissem diferentes mecanismos circadianos, se esses individuos ganhassem por ter diferentes planejamentos comportamentais didrios. Um desses animais é 0 grilo da areia Gryllus firmus, espécie com diferentes formas, incluindo um ‘morfotipo com longas asas, capaz de voar, e outro morfotipo com asas curtas, que nao consegue voar. Os dois morfotipos diferem no tamanho das asas, nos miisculos de voo, nos horménios, na genética, nos ritmos circadianos e nos comportamentos.* O morfo- tipo que pode voar exercita sua habilidade principalmente 8 noite para dispersar com seguranca de uma area inadequada ou para ampliar sua busca por machos noturnos em atividade de canto. Fémeas voadoras usam sua habilidade para conseguir pares distantes, enquanto machos voadores podem aproximar-se de rivais para interceptar a fémea atraida por eles. Em contrapartida, individuos de asas curtas sao incapazes de voar e, entao, nao precisam planejar um periodo no qual seria proveitosa a busca de ‘machos em atividade de canto em outros locais. Ao contro, eles investem em maior produc de prole, uma vez que nao precisam investir em estruturas para dispersio. Para comparar 0 ritmo circadiano dos dois morfotipos de grilos da areia, An- thony Zera e colegas levaram grilos recém-coletados para o laboratério e retiraram amostras de sangue em intervalos ao longo de 24 horas. Ao analisarem o horménio juvenil (H]) no sangue de grilos com asas curtas, eles nfo encontraram mudancas significativas em relacao ao periodo do dia. No entanto, o sangue de grilos voadores, revelou algo muito diferente, com concentracdes de HJ que aumentavam acentuada- mente no final da tarde ou a noite em relagao aos niveis basais, comparaveis aos dos grilos nao voadores (Figura 5.7). | Zera e seus colaboradores ficaram surpresos ao descobrir que formas voadoras | de G. firmus de fato tém maiores concentragbes de HJ por uma quantidade de horas a0 dia do que formas que nfo voam. Sabe-se que o hormédnio causa interrupgio dos | miisculos de voo em algumas situades, 0 que parece ser um obstéculo para um grilo que pretende dispersar-se no ar. Entretanto, em alguns casos, tem sido registrado que 0H] facilita o voo; por exemplo, como vocé pode lembrar, o aumento na concentracso de H] em opersrias de abelha melifera ests associado com a transformacio ligada & jidade que ocorre nas abelhas a medida que mudam de sedentarias operarias nutri- doras da colmeia para amplas forrageadoras, que voam longe da colmeia em busca | de pélen ¢ néctar. Desse modo, é provavel quem, de algum modo, a onda circadiana de HJ em grilos com asas ajude a preparar esses individuos para uma sessao de voo notumno, embora o modo pelo qual o H] exerce seu efeito ainda nao tena sido com- pletamente determinado." “= Gros de asas longas + Grilos de asas curtas Concentragéo de HJ em G, firmus fémeas (oa/il) FIGURA 5.7 No inicio da noite, o morfatipo de Gryllus firmus de asas longas, com habil | dade para voar (8 direita na fotografia) tem concentragGes de horménio juvenil (HJ) mais al- tas do que 0s grilos com asas curtas (@ esquerda). Fotografia dos morfotipos com asas curtas ce asas longas de G. firmus de Derek Roff, aciaptada de Zera, Zhao e Kaliseck."“* Comportamento Animal 157 Cérearo ee Retina Lobo gptico aS FIGURA 5.8 0 sistema nervo- 30 do grilo. A infermacdo visual 6 transmitida ao lobo dptico de cérebro do grilo. Se os lobos Sp- ticos forem cirurgicamente des- cconectados do restante do cére- bro, 0 grilo perde a capacidade de manter um ritro circadiano. ‘Adaptada dos diagramas de F Huber e W.E Shurmann. “Ganglio suberofigico Como os mecanismos circadianos funcionam? Em alguns grilos, a liberacao ciclica de horménio juvenil parece contribuir para a re- -gulacao da atividade comportamental em um cronograma didrio. Outros elementos do mecanismo circadiano incluem os lobos dpticos, por exemple, se forem cortados s nervos que levam a informacio sensorial dos olhos de um grilo macho para os Jebos dpticos em seu cérebro (Figura 5.8), 0 inseto entra em um ciclo de livre-curso. -Alguns tipos de sinais visuais sao evidentemente necessarios para ajustar o ritmo rio as condicdes locais, mas o ritmo persiste na auséncia dessas informagoes. Se, p entanto, os dois lobos 6pticos forem separados do restante do cérebro, o ciclo canto cessa completamente, fazendo com que toda hora seja hora para o grilo ‘santar. Esses resultados so consistentes com a hipétese de que um mecanismo de “slogio-mestre (Figura 5.9) reside no lobo Sptico, enviando mensagens para outras do sistema nervoso™"™* e, quase certamente, recebendo e integrando sinais is gerados pelo sistema endécrino do animal como um todo. Ritmos obsewados ajuste Mecanismo Ge relégio de relégio JRA 5.9_Um relagio mestre pode, em algumas espécies, agir como one: ca-passo que regula os muitos outros mecanismos controladores de oe © crcadiaro em um indviduo. Adaptada de Johnson e Hasting. tee 158 John Alcock FIGURA 5.10 A genética dos relégios biolégicos em mamife- ros e na mosca-das-rutas. Em ‘ambos os grupos, um conjunto de 3 genes essenciais produzem pproteinas que interagem umas Com as outras para regular @ atividade de outros genes. em tum ciclo que dura aproximada: mente 24 horas. Um dos genes (pen codifica uma proteina (PER) gradualmente acumulada dentro @ fora do niicleo celular ao longo do tempo, Um outro gene-chave, chamado tau em mamiferos dot em moscas, codifica uma ‘enzima, CKLe, que ajuds a ina tivar PER, reduzindo sua taxa produgéo da PER, mais PER fica ‘isponivel para ligar-se a outra proteina (TIM), decodificada por lum terceiro gene (tim). Quando ‘a proteina PER estiver ligada a ‘complexos com TIM (e outra pro- teina, CRY, no caso de mamife- ros), ela nao pode ser quebrada tao rapidamente pela CKLe. Por isso, mais PER intacta é carrega- da para dentro do nicleo, onde ‘ela bloqueia a atividade do pré- prio gene que a produz, embora ‘apenas temporariamente. Er ‘tem inicio um novo ciclo de at dade do gene per e da produgéo dda proteina PER. Adaptada de Young." che QD (au) PER) =a BiGlogos interessacios no controle do ritmo circadiano de mamiferos ¢ outros vor tebrados tom destinado atengio a uma importante estrutura do cérebro, o hipotéla- no, com especial énfase n0 ntileo supraquiasmatico (NSQ), um par de feixes neurais {que recebe estimulos de nervos originados ne retina. O NSQé portanto, um provavel agmento do mecanismo que assegura informagdes sobre o comprimento do dia e da noite, as quais podem ser usadas para ajustar 0 rel6gio biolbgico mestre Se o NSO contém uum relégio-mestre ou marca-passo, crucial para manter 0 Fit imo citeadiano, entio a lesio do NSQ causaria a perda desse ritmo nos individuos. oses experimentos tem sido feitos pela destruigdo seletiva de neurdnios do NSQ no Cerebro de hamsters e ratos brancos que, posteriormente, exibem padres arritmi- cos de secre¢io hormonal, locomogao e alimentacio. 187 Se o hamster arritmico recebe transplante de tecido do NSQ de hamsters fetais, algumas vezes recupera seus Fitmos Greadianos, mas nunca se o tecido transplantado for proveniente de outra parte do cérebro do hamster fetal.” Além disso, se o hamster arritmico recebe o transplante do NSO de um hamster mutante, com periodo circadiano muito mais curto que o padrao de aproximadamente 24h, o sujito experimental adotao ritmo circadiano do hams: ter doado, evidéncia adicional que da suporte & hipétese de que o NSQ controla esse aspecto do comportamento do hamster. S Talvez o rel6gio NSQ de hamsters, ratos e outros mamiferos, opere via mudancas ritmicas na atividade genética. Um gene-chave candidato a isso parece ser 0 gene Per, (gue codifica uma proteina (PER) cuja produgdo varia em um cronograma de 24 horas, a iinbinado com o produto de um outro gene de maméfero, chamado tau (Figura 5.10). © produto do tau é uma enzima cuja produgdo inicia quando PER esté no pico de abundancia na célula. Essa enzima degrada PER, contribuindo para um ciclo de 24 horas no qual PER primeiro aumenta em abundancia e depois ¢ reduzida.'* ‘Una earacteristica impressionante desse sistema de complexidade assustadora 6 que os genes-rel6gio-chaves que regulam o ritmo circadiano celular em mamiferos também edo encontrados em insetos. A mosca-das-frutas Drosophila ¢ as abelhas me Iiferas também possuiem o gene per, uma cadeia de DNA composta de pouco mais de 3.500 pares de bases, que fornecem as informagoes necessérias para produzir 2 tadeia proteica PER com cerca de 1.200 aminodcidos. Alteracdes na sequiéncia ce ba- ses, envolvendo néo mais que a substituicao de uma simples base, podem resultar, we imosen-das-frutas, em um ritmo circadiano drasticamente diferente (Figura 5.11), bem como em humanos (portadores de mutacdo per tipicamente dormem as 7h30 Comportamerto Animal 159 J mt horas —| Tipo selvagem ESS == == _— Murat de periode lorgo = o__Mutante arritmico \nnuarte deverodo co a da noite e acordam as 4h30 da manha”“*). Esses resultados sugerem fortemente que 2 informacao do gene exerce um papel fundamental na habilitagao de ritmos circa- dianos. Se a expressio de per realmente tem esse efeito, entio animais nos quais o gene per for relativamente inativo devem comportar-se de modo arritmico. Pouca pro- teina PER 6 produzida em abelhas meliferas jovens, as quais geralmente perma- ecem na colmeia para cuidar de ovos de larvas, sendo, de fato, capazes de reali- zar essa tarefa em qualquer perfodo do dia ou da noite, durante um periodo de 24 hhoras. Jé as abelhas meliferas mais velhas, que forrageiam apenas durante o dia, ‘exibem ritmos circadianos bem definidos. deixando a colmeia para coletar polen & ‘néctar apenas durante a parte do dia em que as flores ricas em recursos tém maior probabilidade de serem encontradas. Forrageadoras tém quase 3 vezes mais pro- teina PER nas células do cérebro do que as jovens operas, gragas a atividade au- -mentada do seu gene per re Relate Lo) 5.2. ocd pode lembrar que a transi¢ao para forragearnento em abelhas meliferas depen- de da composicde da colénia, de modo que se houver escassez de operétias nutridoras dentio de colme'a, abelhas mais velhas atrasam sua mudanca pars a funcac de forra adora. Que predicao seque-se sobre a expressio do gene per no cérebro cesses operé- figs socialmente atrasadas em relacéo a outras da mesma idade de cutras colénias com ‘numerosas abelhas operéries jovens? Elabore hipSteses proximais e distais para 0 fat de ‘que a interacio social pode alteraro ritmo circadiano em abelhas meliferas— e também na ‘mosca-das-frutas ~"” as quais ndo vivem em saciedades altamente organizades. Uma vez que a mosca-das-frutas, o hamster, a abelha melifera, vocé e eu temos ‘e= mesmos genes servindo quase que com a mesma fungio de reldgio, bidlogos evo- stas acrecitam que herdamos esse gene, bem como outros genes envolvidos segulacio do padrao de atividade, de um animal muito antigo que vives talvez milhdes de anos.’ Em mamiferos e alguns outros vertebrados, o gene per e ‘outros sao expressos nos neurdnios do NSQ, usualmente considerado o lar do i ou marca-passo circadiano que regula muitos outros tecidos, manten- -uitos comportamentos diferentes num cronograma diario. No entanto, outras do cérebro também podem ter seus préprios relégios biolgicos. Por exem- ‘© bulbo olfatorio de camundongos exibe mudangas cicicas na atividade genética FIGURA 5.11 Mutacdes no gene per afeta o ritmo circadiano da mosca-das-frutas. A esquerda ha um diagrama da sequéncia cde DNA que constitui um gene per. Os locais de substtuigio das bases presentes em trés alelos mutantes na mosca-das-frutas 580 indicados no diagrama. Os padrdes de atividade de moscas do tipo selvagem, bem como os associados a cada mutagéo, sio mos- trados & dirsta, Adaptada de Baylies e colaboradores." Comportamento Animal 159 Mutante afrtmico gon Mutante de periodo curto EES] EE). FIGURASS.11_Mutages no gene per afeta o ritmo circadiano _ BS da mosce-das-frutas. A esquerda ha um diagrama da sequéneia =a de DNA que constitui um gene per. Os locais de substituicéo das bases presentes em trés alelos mutantes na mosca-das-frutas s0 ingicados no diagrama. Os padrdes de atividade de moscas do tipo selvagem, bem como os associados a cada mutacao, s80 mos tredos a dreita. Adaptada de Baylies e colaboradores.”™ “2 noite e acordam as 4h30 da manha"*"). Esses resultados sugerem fortemente que ‘= mformagdo do gene exerce um papel fundamental na habilitagao de ritmos circa ‘Sea expressdo de per realmente tem esse efeito, entdo animais nos quais o gene = for relativamente inativo devem comportar-se de modo arritmico. Pouca pro- ema PER € produzida em abelhas meliferas jovens, as quais geralmente perma- cem na colmeia para cuidar de ovos de larvas, sendo, de fato, capazes de reali- ‘22r essa tarefa em qualquer periodo do dia ou da noite, durante um periodo de 24 Jas abelhas meliferas mais velhas, que forrageiam apenas durante o dia, m ritmos circadianos bem definidos, deixando a colmeia para coletar palen ¢ apenas durante a parte do dia em que as flores ricas em recursos tém maior lidade de serem encontradas. Forrageadoras tém quase 3 vezes mais pro PER nas células do cérebro do que as jovens operdrias, gracas a atividade au- tada do seu gene per ot pode lembrar que a transigao pare ferrageamento em abelhas melferas depen- -d2 composigao da coléia, de modo que se houver escassez de operarias nutridoras to da colmeia, abethas mais velhas atrasam sua mudanga para a funcSo de forage. (Que predigéo seque-se sobre a expressio do gene perno cérebro dessas operé- ssocialmente atrasadas em relagdo 2 cutras ca mesma idade de outras colbnias com osas abelhas opersrias ovens? Elabore hipSteses prosimais edistais para. fato de 2 interagio social pode alterar o ritmo citcadiano em abelhas meliferas —e tember ns esca-das-rutas as quaisndo vwvem em socedades altamente organizadas, Uma vez que a mosca-das-frutas, o hamster, a abelha melifera, vocé e eu temos ‘mesmos genes servindo quase que com a mesma funcio de rel6gio, bi6logos evo- Stonistas acreditam que herdamos esse gene, bem como outros genes envolvidos segulacdo do padrio de atividade, de um animal muito antigo que viveu talvez 550 milhdes de anos.” Em mamiferos e alguns outros vertebrados, 0 gene per e ins outros s4o expressos nos neurdnios do NSQ, usualmente considerado o lar do gio-mestre ou marca-passo circadiano que regula muitos outros tecidos, manten- muitos comportamentos diferentes num cronograma diario. No entanto, outras stes do cérebro também podem ter scus préprios relégios biologicos. Por exem- © bulbo olfatério de camundongos exibe mudancas ciclicas na atividade genética 160 John Alcock Unidades de PKamRNA, 1 47 019 6 19922 «1 «4 7 Hores do dia FIGURA 5.12. Expressio do gene que codifica a PK2 no NSQ. Os camundangos foram expostos a um ciclo padrao de 12 horas de luz e 12horas de escuridac (LE) antes do inicio do experimento. O grafico mostra mudangas na pro: dducdo de RNA mensageiro codificado pelo gene PK2a cada hora. O gene fi expresso em um ritmo circadiano cuando 05 animais foram mantidos sob o ciclo claro-escuro padréo, ‘mantidos em completa escuridic por 2 dias (2EE) ou por 8 independente de ambiente, de modo que o camundongo é mais sensivel a odores & noite do que durante o dia, efeito adaptativo de um mecanismo temporizador para um ani- ‘mal notumno. ONSQ claramente contém um relégio biol6gico prin- cipal, que deve enviar sinais quimicos para o sistema alvo que ele controla, Se assim for, podemos predizer que (1) a molécula que transmite a informacao do relégio deve ser secretada pelo NSQ de maneira regulada pelos genes do relogio, (2) deve haver proteinas receptoras para tal men- sageiro quimico nas células do tecido alvo e (3) a admi- nistragao experimental do mensageiro quimico deve per- turbar a temporizacdo normal do comportamento de um animal. 0 classico candidato quimico desse tipo é a melato- nina, a qual tem sido objeto de muitas pesquisas que de- monstram o seu envolvimento com a regulacao do ritmo circadiano dos animais.""” Mas a melatonina nao € 0 tni- co produto quimico, ja que, recentemente, pesquisadores demonstraram que uma proteina, a procineticina 2 (PK2), dias (BEE). Adaptada de Cheng ¢ colaboradores."* Ti Pesiodonotume Bi evade duno Saline PQ (controle) FIGURA 5.130 controle circadia- no do comportamento de correr na roda em ratos brancos muda quan- do 0 eérebro dos animais ¢ injetado ‘com PK2, Esses ratos $80 ativos prin- cipalmente durarte o dia, enquanto ratos-controle injetados com salina exibem a preferéncia pelo padrao de atividade notumna. Adaptada de ‘Cheng e colaboradores ** tem a propriedade chave esperada para um rel6gio men- sageiro.”* Em camundongos normais que vivem sob regi me ciclico de 12 horas de luz e 12 horas de escuridao, a proteina PK2 é produzida pelo NSQ sob um rigido padrao circadiano (Figura 5.12). Além disso, camundon- gos com certas mutagdes nos genes-reldgio essenciais nio possuem ritmo circadia- no para a produgio de PK2, pois apenas certas estruturas dentro do cérebro do ca- mundongo produzem uma protefna receptora que se liga com a PK2. Essas regides so conectadas ao NSQ por vias neurais e acredita-se que contenham centros de comandos que controlam varias atividades comportamentais de modo circadia- no. Finalmente, se a PK2 for injetada no cérebro de ratos brancos durante a noite, quando 0s animais sao normalmente ativos, 0 Seu comportamento muda de forma drastica. Em vez de correr em suas rodas, eles dormem, mudando a atividade para o dia (Figura 5.13).* ‘Todas essas linhas de evidéncias apontam para a PK2 como a mensageira qui- mica que o NSQ de mamiferos usa para se comunicar com alvos centrais no cére- bro, além de regulé-los. O NSQ, por sua vez, recebe informagao da retina sobre © ciclo claro-escuro do ambiente do animal de modo que ele pode sintonizar fi- namente seu padrao autorregulado da expresso génica. Qual o valor adaptativo desse componente independente de ambiente do sistema temporal? Pode ser que um reldgio desse tipo habilite os individuos a alterarem a temporizacao de seu ciclo comportamental e fisiologico sem ter que verificar o ambiente constantemen- te para ver que horas sdo. A presenca de um elemento dependente de ambiente, entretanto, permite aos individuos ajustar seus ciclos e manté-los de acordo com as condicdes locais. Como resultado, um mamifero tipicamente noturno automati- camente se torna ativo mais ou menos na hora certa a cada noite, enquanto retém a capacidade para mudar seu perfodo de atividade gradualmente, acomodando as mudangas no comprimento do dia que ocorre quando a primavera se torna verso ‘ou quando © vero se torna outono. ‘Uma forma de testar essa hipétese sobre o valor adaptativo do ritmo circadiano seria a partir da existéncia de um mamifero para 0 qual 0 ciclo claro-escuro fosse biologicamente irrelevante, entao 0 padrao de atividade circediana seria ausente nessa espécie. Como exemplo, usamos 0 rato-toupeira-pelado, Heterocephalus glaber (Figura 5.14), que vive em grupos que ocupam uma extensa rede de tuineis subter~ rineos. Como as toupeiras quase nunca sobem a superficie, vivem em escuridao total ese alimentam de raizes e tubérculos coletados em seus tineis, 0 que acontece Comportamento Animal 161 Periodo Indviduos 28000301230 apna Dia 1 ‘asaeieeraneee i Ka B32 incre ren Rainha) B23 Me diay eee KA7 Bia? Seemerrreere Dia 3 amen Dia KF Dia acre er Dad | ITE ta watiaiLaiiiltin! —Rato-toupeira-pelat Te De) Ter eee anh) 222 HERRITRIRTETE © FIGURAS.14 Ratos-toupeira-pelados ilo apresentam ritmo circadiano, Séo, ee pat err ara mostrados padres de atividade de 6 2 Baz STREET —indiviuos orginarios de colonies catvas mantidas sob constante luz fraca. Barras ior Sree? escuras indicam periodos em que o indivi TH? Dia2 GERTTAI EIT THE duo estava acordado e ative, Adaptada de Bid Davis Walton e Sherman.” ‘ecima do solo nao é importante para elas. O ritmo circadiano € ausente no rato-tou- peira-pelado. Em vez disso, os individuos distribuem breves episédios de atividade ‘etre longos periodos de inatividade, com 0 padrio mudando irregularmente de ‘em dia para o outro (ver Figura 5.14). ‘Ciclos de comportamento de longo prazo ‘Devido ao estilo de vida incomum, os ratos-toupeira pelados nao tém que lidar com ambientes que mudam ciclicamente e, por consequéncia, parecem ter perdido seu ‘sto circadiano. Mas quase todas as outras criaturas enfrentam nao apenas mudan- qs difrias na disponibilidade de alimentos ou risco de predac3o, como também mu- “dancas que ocorrem por periodos maiores que 24 horas, como mudaneas sazonais _gee acontecem em muitas partes do mundo. Se ritmos circadianos habilitam os ani- ‘mais a se preparar fisiolégica e comportamentalmente para certas mudan¢as didrias ‘peevisiveis no ambiente, nio poderiam alguns animais possuir um ritmo circanual, com ciclos de aproximadamente 365 dias?” Um mecanismo de relégio circanual ‘pexe ser similar ao rel6gio circadiano mestre, com um temporizador independente ‘de ambiente capaz de gerar um ritmo circanual em conjungéo com um mecanismo "gue mantém o relgio ajustado as condicées locais. ‘estar a hipétese de que um animal tem um ritmo circanval é tecnicamente dificil “Porque os indiviciuos devem ser mantidos sob condligdes constantes por pelo menos ‘Zanos apés terem sido removidos de seus ambientes naturais. Um estudo desse tipo ‘bem-sucedido envolveu o esquilo Spermophilus lataralis"™ da América do Norte que, ‘== natureza, passa o fim do ontono e o inverno gelado hibernando em uma camara subterrdnea. Cinco membros dessa espécie nascidos em cativeiro foram cegados e _pesteriormente mantidos em constante escuridao e sob constante temperatura, en- “geanto eram supridos com alimento em abundancia. Ano apés ano, esses esquilos “estraram em hibernago quase ao mesmo tempo que seus coespecificos na natureza Figura 5.15). Em outro estudo, varios filhotes de cartaxos (passaro africano do género Sa- “skola) foram coletados do Quénia e levados 4 Alemanha para serem criados em ‘Smaras de laborat6rio, nas quais a temperatura ¢ o fotoperfodo (nuimero de horas de luz num periodo de 24 horas) foram sempre os mesmos. Esses passaros ¢ sua ‘prole nunca tiveram a chance de conhecer a estacdo das chuvas de primavera no ‘Quénia, a qual sinaliza um perfodo de abundancia de insetos e € 0 momento no 162 _John Alcock Animal Anos FIGURA 5.15 Ritmo circanual do esquilo Spermophilus laterais. Animais mantidos er onstante escuridao e constante temperatura ainda assim entram em hibernagao (barras ver- des) em certos periodos do ano. Adaptada de Pengelley e Asmundson.. qual o cartaxo queniano deve reproduvzir se quiser encontrar alimento suficiente para seus filhotes famintos. Portanto, 0s cartaxos selvagens exibem um ciclo anual fe fisiologia e comportamento reprodutivos. Os passaros transplantados, apesar do ambiente constante, também exibiram um ciclo reprodutivo anual, mas desloca- do da fase de seus compatriotas quenianos (Figura 5.16). Um macho, por exemplo, ppassou por 9 ciclos de desenvolvimento e regressdo testicular durante 08 7,5 anos Ge expezimento. Evidentemente, 0 ciclo anual do cartaxo é gerado em parte por um mecanismo interno, independente de ambiente, assim como no esquilos Spermophi- lus lateralis.” O ambiente fisico influencia os ciclos de longo prazo Na natureza, sinais ambientais arrastam o reldgio circadiano ¢ circanual de modo a produzir ritmos comportamentais que combinam as caracteristicas especificas do ‘ambiente de um animal, como amanhecer e anoitecer, inicio da estacdo chuvasa em determinado ano ou aumento do fotoperiodo associado ao inicio da primavera. Essa sincronia de ciclos comportamentais envolve mecanismos de grande diversidade que respondem a um amplo espectro de influéneias ambientais, as quais podem variar de espécie para espécie, de acordo com as circunstancias ecologicas. Por exemplo, animais noturnos que correm o risco de sofrer ataques de preda~ dores, visualmente alertas, podem variar sua atividade de acordo com o ciclo lunar. Essa afirmacdo recebe embasamento do comportamento das esperancas (insetos da familia Tettigoniidae), que tem que lidar com morcegos que podem localizé-las & noi- te (alguns morcegos cagam usando vias visuais em vez de depender totalmente da ‘ecolocagao). Quando o luar é minimo, é mais provavel que as esperangas da Ilha de Barro Colorado no Panamé sejam mais ativas, a julgar pelo niimero desses insetos coletados em redes em noites escuras versus noites de lua cheia."* ‘Do mesmo modo, é mais provavel que ratos-canguru (Dipodomys spectabilis) per- _manecam em suas tocas subterraneas quando ha iluminacdo pelo luar, que ajuda os predadores notumnos, tais como © corujao orelhudo (Bubo virginianus).”""* Robert Lockard e Donald Owings chegaram a essa conclusao por meio do monitoramento da atividade de ratos-canguru de vida livre mum vale no sudeste do Arizona. Para medir a atividade do rato, Lockard inventou um engenhoso alimentador que liberava —— Ligurs testia SS Mada nas asas e corpo| p ‘ Pr eed i = ; oenoonaeec ° < —= oe ; Largure testicular (mim) 4 Y 95 ae . a) —— 2 / L 4 Ly a / ea a if 1988 19889, > = 3S 2 0 JTR'MTA'M STSA'S"O'N'O JFMAMJJASOND Moses “geantidades muito pequenas de sementes de sorgo de hora em hora, Para buscar as “s=nentes, 0 animal tinha que caminhar pelo alimentador, apertando um pedal no eee cererinenie, fazia uma caneta marcar um disco de papel que girava ente durante a noite, controlado pelo mecanismo de um relégio. Quando o ‘de papel era coletado de manha, ele continha um registro temporal de todas as “sitas noturnas ao alimentador. Acoleta de dados foi algumas vezes frustrada por formigas que beberam toda ‘Snta ou pelo gado do Arizona que pisoteou os registradores. Mesmo assim, os sobreviventes de Lockard mostraram que, quando os ratos-canguru acu- ram uma grande provisdo de sementes no outono, eles foram seletivos no for- nto, em geral saindo de suas tocas subterraneas apenas nas noites em que nao brilhava (Figura 5.17). Como os predadores de ratos-canguru (coiotes e ) podem ver sua presa com mais facilidade em noites claras, os ratos-can- ficam mais seguros quando forrageiam em completa escuridao e, por essa » Parecem posstiir um mecanismo que os habilita a mudar seu cronograma de “Serrageamento de acordo com as condigoes da lua. Comportamento Animal 163 Caraxo FIGURA 5.16 Ritmo circanual do ‘artaxo africano. Quando transfe- ride do Quénia para a Alemanha e ‘mantido sob condig6es constantes, este cartaxo macho ainda experi- ‘mentou um ciclo de longo prazo regular para o desenvolvimento & regressdo testicular (linhas roxas), ‘bem como para troca de penas (as duas barras referemse a muda cor- poral e das asas).O ciclo, contudo, 1nBo teve duracdo exata de 12 meses, cde modo que o momento da muda © de desenvolvimento testicular foi alterado ao longo dos anos (ve linhas tracejadas que fazem um dgulo descendente da direita para a esquerda). Adaptada de Gwinner & Dittami 164 John Alcock dia Melodia FIGURA 5.17 Ciclo lunar de ratos-canguru. Cada marca preta fina representa uma visita feita pelo ra- to-cangurs 20 dispositivo alimentador temporizado. De novembro a marco, (08 ratos foram ativos 8 noite apenas quando a lua nao escava brilhando. Devido & escassez de sementes no fi- ral do ano, os animais se alimentaram durante toda a noite, mesmo quando a lua estava presente e, posteriormen- +e, forragearam durante todas as ho- ras do dia. Adaptada de Lockard."”” a iam ASS Bsns te © luar, quando: al oe sa2 op eae ee eimaniee ns fone sane] Enquanto 0 rato-canguru do deserto combina seu comportamento de forragear com 0 ciclo lunar, e passaros cartaxos empregam um ritmo circanual para se reprodu- zir no momento adequado em seu ambiente tropical, passaros de zonas temperadas ‘como as pequenas escrevedeiras-de-testa-branca (Zonotrichia leucophrys) tém seu pro- prio sistema de controle comportamental adequado as drasticas alteracSes sazonais que ocorrem em seu ambiente, Na primavera, os machos voam de sua rea de inver- no, no México ou sudeste dos Estados Unidos, para suas distantes sedes de vero, no nordeste dos Estados Unidos, Canadé ou Alasca, estabelecendo seus territorios repro- dutivos, lutando com rivais e cortejando fémeas receptivas. Em combinacao com essa impressionante mudanca comportamental, as gonadas dos péssaros se desenvolvem com rapidez.incrivel, readquirindo todo o peso perdido durante o inverno, quando elas retrocedem para 1% do peso observado na estacdo repredutiva. Para ter tempo adequado de recuperar o crescimento de suas gOnadas e 0 inicio de sua atividade re~ produstiva, os passaros precisam muitas vezes antecipar a estacio reprodutiva, Como eles administram esse fato? Gide claro-escuro Ser; a — a 622nvclvimento BL28E Desenvahimento testicular Seo de Eecssensibiidade 0 12 24 36 48 60 72 84 9% 108 120 Horas Anabilidade da escrevedeira para mudar sua fisiologia e seu comportamento depende de sua capacidade para detectar mudangas no fotoperiodo, o qual au- ‘menta 4 medida que a primavera avanca na temperada América do Norte." Uma ‘Bipstese sobre como esse sistema funciona propée que o mecanismo de rel6gio da sscrevedeira exibe uma mudanga didria na sensibilidade & luz, com o ciclo sendo sestabelecido a cada amanhecer. Durante as cerca de 12 horas iniciais apés 0 rel6gio ser restabelecido, esse mecanismo é altamente insensivel a luz; entretanto, ocorre =m aumento da sensibilidade, que atinge o épice 16 a 20 horas apés o ponto inicial o ciclo. A fotossensibilidade enfraquece muito rapidamente para um ponto baixo 24 horas apés o ponto inicial, no comego de um novo dia e de um novo ciclo. Por sensequencia, se os dias tiverem menos que 12 horas de luz, 0 sistema nunca serd -#ivado porque nao haverd luz durante a fase fotossensivel do ciclo. Porém, se 0 fo- Seperiodo for maior que 14 ou 15 horas, a luz atingiré o cérebro do passaro durante 2 fase fotossensivel, iniciando uma série de mudangas hormonais que levam ao ‘desenvolvimento de seu aparato reprodutivo e estimulam a reproducao. Se esse modelo de sistema mensurador de fotoperiodo estiver correto, deve ‘== possivel enganar o sistema. William Hamner, trabalhando com os tentilhdes ‘smexicanos Carpodacus mexicans," e Donald Farner, em estudo semelhante com = escrevedeiras-de-testa-branca,“® estimularam o crescimento testicular pela ex- posicdo de passaros cativos a luz durante a hipotética fase fotossensivel do ritmo cadiano. No experimento de Farmer, os passaros que estavam num regime re- ular de 8 horas de luz e 16 horas de escuro (8L:16E) foram mudados para um s=gime de 8L:28E. Como os perfodos claros estavam agora fora da fase do ciclo de 2 horas, esses passaros ocasionalmente experimentavam a luz durante 0 periodo ‘=o qual seus cérebros estavam altamente fotossensiveis. Os testiculos dos passaros ‘Seachos cresceram nessas condigées, mesmo quando havia uma razao menor de ‘elero-escuro do que o ciclo 8L:16E, 0 qual nao estimulou o crescimento testicular Figura 5.18). $3 Em outro experimento com escrevedeira-de-testa-branca, grupos de machos manti- ‘dos num regime de BL:16E foram alojados em completa escuridao por periodos varidveis, 2 100 horas) antes de serem expostos a um intervalo de B horas de luz. Poucas horas “depois, 05 pesquisadores mediram a concentrago sanguinea de horménio luteinizante “ormonio liberado pela pituitéria anterior e carregado para 0s testiculos, onde estimula ‘= desenvolvimento cos tecidos). Os dados mostrados na Figura 5.19 fornecem um teste ‘e872 2 hipdtese da fotossensibilidade recém-descrita? Mudangas no fotoperiodo sao sinais titeis para a atividade reprodutiva de pas- s2r0s que vive em ambientes onde os recursos alimentares seguem as estagdes de Sema previsivel. Mas ha alguns péssaros para os quais a chegada da primavera no ‘srante recurso alimentar suficiente para criar a prole. Para essas espécies, poderia Comportamento Animal 165 Escrevedeira-de-testa-branca FIGURA 5.18 O ciclo de fotossensibilidade. Um experi- ‘mento com escrevedeiras-de-tes- ta-branca testou a hipétese de que esses passaros possuiam um mecanismo de relégio especial- mente sensivel 3 luz entre as 17 @ 19 horas de cada dia. A linha inferior representa esse hipoteti co periodo de fotossensibilidade, As secdes amarelas e pretas das duas barras horizontais supe. riores mostram os periodos de Claro e escuro de dois diferentes regimes de claro-escure. Ape- aS 0s passaros sob o regime ‘experimental de 8L:16E foram expostos 4 luz durante a suposta fase fotossensivel do ciclo, e apenas eles responderam com ‘crescimento testicular. Adaptada de Farner. 166 John Alcock Diferentes grupos de pardais Vatiagio na concentragio 0 a 4872 Tempo (horas) apés 0 tltime amanhecer real FIGURA 5.19. Resposta hormonal & luz. Diferentes grupos do passaro escrevede'ra- “de-testa-branca mantidos em diferentes periodos de completa escuridgo antes de serem texpostos @ um dnico periodo de 8 horas de luz. O diagrama superior ilustra quando a ex- posigdo as & horas de uz ocorreu. O grafico inferior exibe as mudangas na concentracéo Sanguinea de horménio luteinizane (LH) desde o inicio do experimento em cada grupo de péssaros, O LH é um horménio eonhecida por estimular 0 desenvolvimento das génadas, ‘Adaptada de Follett, Mattocks e Farner.” se esperar a evolucao de mecanismos proximais que respondessem a pistas mais es- treitamente relacionadas & prépria disponibilidade de alimento. Esse fato pode ser verificado estudando-se um pardal do Deserto de Sonora, Aimophila carpalis. No su- deste do Arizona, plantas de deserto e insetos que as comem teriam um suprimento restrito nas primaveras que seguem invernos secos. Assim, oalimento para a prole de ‘A. carpalis pode estar disponivel apenas ap6s as chuvas de verao e, de fato, os pardais frequentemente esperam para reproduzir ap6s 0 inicio das monges, que se estendem do inicio de julho a metade de agosto.” Pardais que abdicam da primavera a favor da reprodugio de verao podem fazé- -lo esperando as proprias chuvas para disparar o desenvolvimento de suas gonadas, em vez de usar pistas menos confiaveis do fotoperfodo. Mas, quando os machos de A, cnrpalis so expostos a um aumento do fotoperfodo em maryo, seus testiculos se de- senvolvem, seguindo o padrio de passaros canoros de zonas temperadas. Entretanto, sob condigdes de seca, esses machos nao tentam reproduzir, a despeito de seus testi- culos aumentados. Ao contrério, uma tempestade chuvosa de verao é necessaria para iniciar 0 proceso, pois as chuvas parecem estimular a produgao do horménio lutei- nizante, 0 qual estimula os testiculos a produzir testosterona, preparando 0 macho para reproduzir. Em conjunto com essas mudangas, o sistema que controla 0 canto (cer Capitulo 2) no cérebro do pardal pode se desenvolver mesmo em julho, quando 6 fotoperiodo esta reduzido, algo que nao acontece no cérebro de outros pardais que ‘vivem em regides com estages mais previsiveis. O volume aumentado do sistema de controle de canto esta associado a um substancial aumento na producéo de som quando comparado com o periodo pré-moncio (Figura 5.20), atividade associada com a territorialidade reprodutiva.' (O pardal A. carpalis apresenta mecanismos proximais que respondem as chuvas de vero porque no seu ambiente de deserto as chuvas so indicadores mais confiaveis de que havera alimento para sua prole em comparagio as mudancas de fotoperiodo. Para duas espécies de fringilideos granivoros, cruza-bico franjado (Loxia leucoptera) cruza-bico escocés (Loria curvirostra) é a ingestao de alimento que atua como determi- =F Comportamento Animal 167 Namero de pissaros camtanda por transecto 0! Antes da Apés Antes da Apos ‘Antes da pos Pardal Ammophila carpalis chuva 2 chuva chuva a chuva chuva achwa FIGURA 5.20 Alteragées na regio de controle do canto no cérebro do pardal Aimophila ‘==palis ocorrem apés as chuvas de verao e levam ao aumento do comportamento de cantar, ‘Os tamanhos de (A) o centro vocal superior (CVS) e (B) 0 nicleo robusto do arco-estriado 12) do pardal aumente apos as tempestades das moncdes no sudeste do Arizona, (C) As ‘sheracdes neurais sio ligadas a um aumento no canto apés o inicio das mongSes. Barras ver- Ss: representam dados coletados antes das primeiras tempestades. Barras laranjas represen- sam dados coletados apés o inicio das mongoes. Fotografia de A. carpalis de Pierre Deviche; A.B C—adaptadas de Strand, Small e Deviche.'* ‘Sante primario da reproducao." Craig Benkman descobriut que existem anos nos quais ‘= producao de sementes de coniferas é tao alia que os passaros encontram alimento _@undante para si proprio e para sua prole em quase todos os meses e, como consequén- ‘<&, aproveitam os bons tempos para se reproduzir. Essa caracteristica pode estar ligada “= outra distintiva da fisiologia hormonal do cruza-bico escocés: passaros submetidos a as de longo fotoperiodo (20L:4F) nao inativam completamente seus neursnios libera- ‘Gores de gonadotrofinas, como fazem outros péssaros aparentados, como os pintarroxos “Corduelisflammea e os pintassilgos C. pinus."™ Eles parecem preservar a capacidade para ‘Sstimular a liberacio de horménios reguladores da reproducdo quando as condigSes ‘para reproduzir se tomnam especialmente favoraveis, Essa flexibilidade nao significa que o cruza-bico ignore todas as pistas ambientais, ‘@xceto a abundancia de sementes.*” Em um estudo com cruza-bicos na natureza, Tho- ‘@as Hahn notou uma interrupgio na reprodugio dessa ave em dezembro e janeiro |Pigura 5.21), mesmo em ambientes com alimento abundante. Embora esses passaros ‘sam mais flexiveis e oportunistas do que a média dos passaros canoros, Hahn ques- ‘Sonou se os cruza-bicos ainda tinham um ciclo reprodutivo subjacente dependente Se fotoperiodo. Quando ele manteve o cruza-bico escocés em temperatura constante ‘=2cess0 ilimitado ao alimento, enquanto deixava os passaros experimentar mudangas -ssturais de fotoperiodo, ele descobriu que o comprimento dos testiculos dos machos ‘seriava de modo ciclico (Figura 5.22), tornando-se menor durante outubro a dezem- ‘Bro de cada ano, ainda que os passaros tivessem todas as sementes que desejassem emer” Além disso, 0 cruza-bico escocés de vida livre sofre declinio na concentragio. “sanguinea de horménios sexuais nesse periodo do ano, mesmo em areas onde o ali- -pento é abundante.“* Dessa forma, o oportunismo reprodutivo desses péssaros nio -=2bsoluto, mas sim sobreposto a um mecanismo temporal guiado pelo fetoperiodo, -ssracteristica de passaros canoros de zonas temperadas. Appersisténcia de um sistema temporizador padrao na flexibilidade reprodutiva +o cruza-bico pode ser explicada ao nivel evolutive por ao menos dois caminhos: ‘@)omecanismo guiado por fotoperiodo pode ser uma caracteristica nao adaptativa +o passado ou (2) cruza-bicos podem obter beneficios reprodutivos pela retencao de ‘em sistema fisiolégico que reduz a probabilidade de tentar reproduzir em periodos -guando outros fatores, além do suprimento alimentar, tornam o sucesso reprodutivo ‘S=xprovavel (como a necessidade de trocar e tepor penas no outono, proceso que __-mequer grande investimento calorico).™* on a 168 John Alcock 0 alimentar(ng/eegunda) ol FMAMJJASONDJFMAMJ Moses FIGURA 5.22 0 fotoperiodo afeta 0 tamanho dos testiculos em cruza-bico escocés. Seis péssaros ca tivos foram mantidos sob fotoperiodo natural, o qual mudou ao longo das estagdes, mas a temperatura e 0 suprimento alimentar foram mantidos constants. (Os dados representam a média do comorimento dos testiculos desses péssaros em diferentes periodos 30 longo do ano, Adaptada de Hahn. * PopulagBes reprodutvas + Populagées no reprodutivas CCruza bieo franjado FIGURA 5.21 Ingestdo alimentar e periodo reprodutive em curva-bico franjado. Popula aes reprodutivas em geral ocorrem em areas Eom disponibilidade relativamente elevada de alimento. Populagées nao reprodutivas oF ralmente ocorrem em areas onde os passaros ingerem pouco alimento. Observe, entretanto, 2 auséncia de populagdes reprodutivas em de- ‘zembro e janeiro, em todos 0s casos. Adaptada Meses de Benkman.* Mudanga de prioridades em ambientes socialmente variaveis Como acabamos de ver, diferentes caracteristicas do ambiente fisico, como o uar, comprimento do dia, chuvas ou suprimento alimentar s40 uusadas por diferentes espécies para estabelecer prioridades comporta- mentais. Além disso, 0s animais podem usar mudancas no ambiente social para fazer ajustes adaptativos na fisiologia e no comportamen- to, Por exemplo, quando Hahn e varios colaboradores realizaram um experimento com cruza-bico no qual alguns machos cativos foram en- gaiolados com seus pares enquanto outros foram forcados ao celiba- to, mas mantidos sob visio e audic3o de pares de cruza-bico em um avidrio vizinho, os machos solteiros experimentaram um retorno mais, Iento A condicgo reprodutiva ap6s o final do inverno do que os machos pareados.“* Do mesmo modo, apenas uma exposi¢ao de 60 minutos & fémea resultou em elevada concentragio de testosterona em estorni- hos machos cativos,""® o que pode ter contribuido para as mudangas subsequentes no comportamento do macho, como aumento do canto de corte. ( ambiente social também afeta as prioridades comportamentais de camundongos domésticos (Mus musculus) fémeas e machos. Quan- do é dada as fémeas a chance para escolher potenciais parceiros, elas fazem gastando um tempo cheirando 0 macho escolhido quando so colocadas no centro de uma gaiola que contém machos em comparti- ‘mentos nas duas extremidades, Fémeas que tiveram experiéncia prévia apenas com um macho submisso nao apresentaram preferéncia quando hes foi dada escolha entre cheirar um macho dominante e um macho subordinado. Mas aquelas que tiveram experiéncia com 0 odor de um macho dominante favoreceram muito mais esse individuo na gaiola de trés compartimentos na qual a escolha da fémea foi medida (Figura 5,23). Aexposicao ao odor do macho dominante promove o aumento de neurdnios em duas regides do cérebro do camundongo, remodelando Comportamento Animal_169 efetivamente a maquinaria neural de forma que a {mea consiga identificar um macho dominante, assim que o ambiente social fornega esse tipo de parceiro.”” ‘Camundongos machos dominantes também s4o programados para permitir que 2 experiencia social altere suas decisdes comportamentais. Por exemplo, ap6s um ca- mundongo doméstico macho montar uma fémea e ejacular, ele torna-se imediatamente muito agressivo com os filhotes, matando todos que encontrar: Por cerca de 3 semanas -2p6s acasalamento, ele fica suscetivel a cometer infanticidio, mas apés esse periodo se soma mais e mais suscetivel a proteger todo e qualquer filhote que encontrar. Cerca de semanas apés a sua ejaculacao, ele volta a cometer infanticidio.”” Esse natével ciclo tem um claro valor adaptativo. Apés 0 macho transferir esper- ‘ma para sua parceira, trés semanas se passam antes dela parir. Os ataques aos filhoies ‘nessas trés semanas invariavelmente serao desferidos contra a prole de um macho ri- ‘eal, com todos os beneficios concomitantes & sua eliminagdo (ver pagina 23). Apos trés semanas, um macho que muda para comportamento paternal quase sempre cuidaré e sua prépria prole recém-nascida. Apés sete semanas, seus filhotes desmamados ‘eo se dispersar, e uma vez mais ele pode praticar infanticidio de modo vantajoso. ‘Ao nivel proximal, que tipo de mecanismo pode habilitar um macho a mudar de Mc Hyde, o monstro infanticida, para o paternal médico Dr. Jekyll trés semanas apés © scasalamento? Uma possivel explicacdo envolve um sistema temporizador intemo que registra 0 niimero de dias desde a ultima c6pula do macho. Se esse mecanismo semporizador sexualmente ativado existe, entéo uma manipulacao experimental que sumente ou diminua 0 comprimento do “dia”, como percebido pelo camundongo, te- 2 um efeito sobre a quantidade absoluta do tempo que passou antes do macho fazer ‘= transicao de assassino para cuidador. Glenn Perrigo e seus colaboradores manipularam 0 comprimento do dia ao co- Secor grupos de camundongos sob duas diferentes condicdes de laboratério, uma com “dias rapids”, no qual 11 horas de luz foram seguidas por 11 horas de escuro ‘G3L-:11E) para produzir um “dia” de22 horas, ¢ outra com “dias lentos” (13,51:13,5E) de 27 horas. Como esperado, o ntimero total de ciclos claro-escuro, nao 0 ntimero <> periodos de 24 horas, controlou a tendéncia infanticida dos machos (Figura 5.24). ‘Quando camundongos machos do grupo de dias répidos foram expostos aos filhotes D dias reais apés 0 acasalamento, apenas uma minoria cometeu infanticfdio, pois ‘esses machos tiveram experiencia com 22 ciclos de claro-escuro durante esse periodo. Em contraste, mais de 50% dos machos do grupo de dia lento atacaram filhotes recém- ssascidos 20 dias reais apés 0 acasalamento, pois esses machos tiveram experiéncia ‘com apenas 18 ciclos de claro-escuro durante esse periodo. Esses resultados demons- s=aram que um dispositive temporizador registra o ntimero de ciclos claro-escuro que jecorreu desde 0 acasalamento e que essa informagio fornece bases proximais para 0 ‘sentrole da resposta infanticida."* Talvez o dispositivo temporizador que controla o tratamento que o camundongo acho da aos filhotes influencie o seu estado hormonal. Se assim for, ent4o vocé es- ‘eraria que durante a fase infanticida, os camundongos machos teriam altas concen- szagtes de testosterona no sangue, dada a relacdo bem estabelecida entre testosterona ‘© agressividade em machos. Uma hipétese alternativa 6 que a agressividade extrema Ti Macho submisso I Macho dominante do chelar begundl Duras do compertament Faas lan FIGURA 5.23 0 odor do ‘macho dominante muda preferéncia por parceiros em fémeas de camundongo de- méstico. (A) Uma gaiola de trés ccompartimentos em que a fémea (cémara central) pode se apro- ximar e cheirar 05 machos num os dois compartimentos nas extremidades. 8) Fémeas que ‘iveram experiéncia apenas com 6 feromanio do macho submisso nao exibicam preferéncia entre machos dominantes e submissos; fameas expostas ao odor do ‘macho dominante gastaram bem ‘mais tempo cheirando 0 mais dominante dos machos na gaiola ‘experimental. A, fotografia cor- tesia de Gloria Mak, adaptada de Mak e colaboradores.”® 170 _John Alcock FIGURA 5.24 Regulagio do infanticidio em camundongos domésticos machos. (A) Camun- ddongos machos forarm mantidos sob condigées experimentais de “dias lentos" e "cies répidos” (8) Amaioria des camundongos mantidos na condiglo de dia ra- pido deixou de ser infanticida 20 digs reais (22 dias répidos) apés ‘o acasalamento; machos que tiveram experiéncia com dias lentos ndo apresentaram o mes me dedlinio no comportamento infanticida mesmo que passedos cerca de 25 dias reais. Adaptada, de Perrigo, Bryant e vom Saal.” EB Primera ninhads a Sequnds ninhada CS7BLS PRKO FIGURA 5.25 Efeito hormonal sobre 0 comportamento infanticida sm eamundongos de laboraté- rio. Machos da linhagem C57BL/6 tém alta probabilidade de atacar os préprios filhotes (primeira ou segun- da ninhada) ao invés de cuidar dos jovens. Se, entretanto, o gene do eptor de progesterona for remo- vido do genama, os camundongos progesterona-nocaute (PRKO) nao podem detectar a progesterona em seus corpos nao exibem 0 com- portamento infanticida em relagao 3 sua prole. Adaptada de Schneider e colaboradores.'” 6 Dias “lentos” horas) Dias“ theres) Dias “répidos* (22 horas) ‘Acstalamento ult 163 2 BY we Dias “reais” desde o acasalamento Ciclos clarorescuro desde 0 aczsalamento contra 0s filhotes ocorra quando 0s machos estdo sob a influéncia da progesterona, pois sabe-se que esse horménio suprime o cuidado parental em roedores fémeas. Para testar essa hipdtese alternativa, Jon Levine e seus colaboradores usaram técnicas ge- niéticas de nocaute para criar uma populagio de camundongos de laboratério com auséncia de receptores de progesterona, o que significa que machos dessa linhagem rndo conseguem detectar a progesterona em seus corpos. Quando machos nocautes foram expostos a um filhote, eles nunca 0 atacaram, ao passo que mais da metade dos ‘machos de uma linhagem geneticamente nao modificada de camundongos de labora- {6rio atacaram um filhote-teste (Figura 5.25) (essa linhagem é uma linnagem anormal- mente agressiva na qual machos nio tratados podem matar seus proprios filhotes) Nao houve diferencas significativas nos niveis de testosterona ou progesterona entre 0s dois grupos de camundongos, apenas uma diferenca na habilidade das células cerebrais em detectar a progesterona."” Certamente, essa diferenga estava presente também durante o desenvolvimento do macho e, portanto, pode ter afetado 0 desen- volvimento do cérebro, produzindo anormalidades que causaram o comportamento observado nesse experimento. Mesmo assim, esse trabalho sugere que quando a pro- gesterona esta presente em certas concentragées num macho intacto, o camundongo torna-se propenso a ser um assassino infanticida. Como o nivel de testosterona cai lentamente (ou a sensibilidade ao horménio declina nas células cerebrais) apés 0 aca- salamento, a capacidade paternal do macho pode aumentar lentamente com o tempo, protegendo a propria prole. Para discussao 5.4 No roedor-da-cali‘omia, (Peromyscus californicus, os machos séo altamente pater- nals. Uma explcacdo para esse comportamento inclu a hipétese da progesterona redu- 2ada que acabamos de explorar para os camundongos de laboratério, Alternativemente, possivel que o aumento dos nivel de estrSgeno seja responssvel pelo comportamento pparental do macho. Face algumas predigbes derivadas dessas duas hipSteses, incluindo 30 menos uma relacionada B testosterona (se necessério, lia a intraducso deste capitulo pata relrescer sua memaria sobre as relagées entre estrégeno e testosteranal. Entéo exa- nine a Figura 5.26 avale suas hipoteses a parti desses dados. C—O a Comportamento Animal_171 (Ay 6) = z 2 2 e Car Machos Com Pais Machos Com Pals sem fihotes som fihotes O acasalamento altera as prioridades comportamentais de muitos animais, nao apenas do camundongo doméstico e do arganaz-do-campo (Microtus ochrogaster) (eer Capitulo 1). A codorna japonesa (Coturnix japonica) é um exemplo. Quando um macho copula com uma fémea, mesmo que apenas uma vez, seu comportamento suda drasticamente. Antes de acasalar, um macho colocado préximo a uma fémea ‘em uma gaiola de dois compartimentos passaré relativamente pouco tempo espian- do pela janela entre os compartimentos para olhé-la. Mas, ap6s acasalar, um macho parece positivamente fascinado pela sua parceira, e no final fixa 0 olhar nela duran- ‘te horas (Figura 5.27A)"’. Esse comportamento, que presumivelmente tem a fungio de aproximar o macho de uma fémea receptiva para mais uma cépula, é bastante “sefiuenciado pela presenca da testosterona em uma regido particular do cérebro do macho. Bssa conclusdo baseia-se em parte nos achados que a remogao dos testiculos ‘Gos machos elimina todo o comportamento sexual — a menos que 0 macho receba ‘=m implante contendo testosterona; nesse caso, ele recupera a motivacao de procu- FIGURA 5.26 Concentracoes de testosterona e progesterona em ‘és categorias de roedores-da-ca- liférnia machos: machos inexpe- rientes, sem parceira nem filhotes: ‘machos com parceiras e sem filhotes; e roedores pais, com parceiras e f- lhotes, (A) A diferenga de testostero- na entre machos inexperientes e pais no 6 estatisticamente sigificativa (8) Em contraste, a progesterona ‘corre em quantidades muito mais elevadas no sangue de machos inex- petientes do que de machos com prole. Fotografia de roedores-da-ca- liférnia machos parentais de Brian Trainor; A eB, adaptadas de Trainor e colaboradores."*" =r parceiras. = GH Célule-alvo on — oe” Es = Testosterona (1) T7Restradia! 123456 7 89 10111213 1415 16 17 18 Série de testes mplantado com testosterona + implantado com testosterona + inibidor de aromatase (no teste 9) = Controle (sem implante de testosterona) FIGURA 5.27 Tostosterona e controle da motivaglo sexual ‘em machos de codorna japonesa. (A) Mudancas hormonais contribuem para mudancas no mode como machos sexual- mente experientes respondem 3 oportunidade de ver uma codorna fémea madura. A testosterona éliberada do testiculo| « levada para certas partes do cérebro. Quando a testosterona entra nas células-alvo, reagées quimicas catalisadas pela enzi- ‘ma aromatase a convertem em 17B-estradiol. Essa substancia se liga a um receptor de estrégeno para formar um complexo estrégeno-receptor, o qual &transferido para o nicleo das lulas-alvo, onde promove mudangas quimicas que, em ultima ‘anélise, levam o macho a olhar ixamente para uma fémea por ‘uma janela nas gaiolas de dois compartimentos. (B) Ao contré- rio dos machos-controle que no receberam implantes de tes- tosterona, 0s machos castrados que receberam esses implan- tes exibem a resposta de olhar fixamente para a fémea. Mas, ‘quando machos implantados so injetados com um inibidor de ‘sromatase, eles perdem a resposta, presumivelmente porque 8 testosterona nio pode mais ser convertida em 17f-estradicl, © horménio essencial para a modulagio da motivacso sexual do macho. Adaptada de Balthazart e colaboradores.” 172_John Alcock Farmese qu acealaram 5 Mechos Macho» vingene deflcentes.cortole ens FIGURA 5.28 Moscas-das-frutas fémeas acasaladas com machos ceapazes de suprir PS tém amesma pprobabilidade de copular novamiente ‘aps 48 horas que fémeas virgens ino mesmo periodo. A, fotografia do ‘acasalamento de Drosophila de Brian Valentine, wus flickr com/photos/ lordv; B, daptada de Chapman e co- leboradores. O interessante é que a testosterona por si s6 nao € o sinal que transforma uma co- dora japonesa macho em um individuo aparentemente “perdido de amor” quando se- parado de sua parceira, Em vez disso, a testosterona ¢transformada em 17P;estradiol, {im estrégeno, em células-alvo no interior da area pré-Gptica do cérebro. A conversio requer uma enzima, aromatase, codifcada por um gene que se torna muito mais ative apds 0 macho de codorna amadurecer. O estrégeno produzido na presenca de aroma- tase se une a uma proteina receptora de estrogeno, ¢ 0 complexo receptor de estrégeno resultante transmite um sinal para o nticleo da célula, desencadeando futuros eventos bioquimicos, que se traduzem, em itima analise, em sinais neurais que induzem omar cho a observar atentamente uma parceira sexual inacessivel no momento. ‘A importincia da enzima aromatase para esse processo tem sido estabelecida ex- perimentalmente pela criagio de trés grupos castrados de codornas machos, Os con froles ndo receberam reposicao de testosterona, enquanto machos em dois outros gru- pos receberam implantes de testosterona. Os machos implantados passaram muito nals tempo olhando pela janela do que os controles. Apés oito ensaios, um dos dois grupos de machos implantados recebeu injeyves difrias de um inibidor de aromalasts Br nteresse desses passaros pela fémea no compartimento vizinho caiu constantemen- te como visto pela redugao do tempo que eles passaram olhando pela janela durante 08 dez ensaios seguintes (Figura 5.27B). Horménios e a organizagao do comportamento reprodutivo Muitos dos ajustes mediados por hormdnios feitos pelos animais afetam diretamente seu comportamento reprodutivo. Na codora japonesa, 0 17B-estradiol exerce tlm pa pel importantissimo no ajuste do grau de atragio do macho pela parceira, enquante fo arganaz-do-campo a vasopressina é mais importante na regulagto da unio sexual (ver pagina 4), ee mmoscas-das-frutas nao formam unides sexuais duradouras. Ao contrario, logo apés acasalar, a fémea se torna completamente no receptiva, rejeitando nao apenas © parcero anterior, mas todos os outros machos, caso eles tentem cortej-la. Em vez de gastar seu tempo acasalando, ela passa alguns dias colocando ovos, mudanca adapta- fiva no comportamento, & que ela pode fertlizar todos os seus ovules maduros com esperma estocado recebido de um inico parceiro. Conforme verificowse, & significa tiva mudanga de fémeas sexualmente receptivas para a recusa sexual ¢ regulada por tum horménio, nao produzido por ela mesma, mas recebido do fluido seminal que o macho transfere para ela durante 2 c6pula. ‘O horménio doado pelo macho € chamado PS (Peptideo Sexual). Usando uma técnica chamada interferéncia de RNA, é possivel bloquear 0 gene especifico nas mos- as macho que codificam o PS. Os machos bloqueados sio normais,exceto pele fato de nio produzirem PS e, por consequéncia, ao copularem com as fémeas, serem in- capazes de transferir PS para suas parceiras. Se o PS é de fatoo sinal proteico crucial ute impede as fémeas de responderem a machos que as cortejem, entio fémeas que copularam com machos deficientes de PS devem permanecer receptivas para cépula, pesar de terem recebido esperma e fluido seminal; essa predigdo demonstrou ser correta (Figura 5.28). ‘Como mencionado anteriormente, um mensageiro quimico atua por meio da li- gacio com moléculas receptoras na superficie de uma célula-alvo. O horménio PS da a eercw-das-frutas deve, portanto, se unir com uma proteina receptora especifica; confor tne esperado, a molécula apropriada, chamada Receptor de Peptideo Sexual (RPS), fo cncontrada, Nesse caso também é possivel bloquear o gene responsavel pela codificacdo do RPS, criando fémeas “mutantes” cujas células slo incapazes de se unirem ao hormo- thio doado pelo macho. Quando isso é feito experimentalmente, femeas com deficiéncia dde RPS que tenham copulado ao menos uma vez copulam novamente se tiverem 2 0P0r- tunidade, como se fossem fémeas virgens."" ‘Pesquisas adicionais foram necessérias para identifcaro(8) 6rga0(s) alvo do PS dos machos: Esses alvos foram encontrados primeiramente suprindo o tecido das fémeas Comportamento Animal 173 = Becton Acssalamena Serpent Thomnophis ‘sored Diecedo Atividacle hormonal gonadal tivar as Teme ‘género Thamnophis. Adaptada de Crews. das moscas-das-frutas com um composto que se liga especificamente ao RPS e, entao, corando o tecido com uma tinta especifica para 0 composto ligado. A cor foi concen- ‘trada nos 6rgao armazenadores de esperma das fémeas e em uma porcao especifica do ‘cérebro, na qual 0s neurénios expressam um gene chamado fruitless. A atividade desse ‘gene em um determinado conjunto de células nervosas no cérebro do macho ¢ fun- damental para a sua capacidade de cortejar fémeas com sucesso.” Na mosca fémea, ‘es neur6nios que expressam a informagao contida no fruitiess so aqueles capazes de detectar 0 PS. Quando esses neurénios sao expostos ao PS apés um acasalamento, sua -atividade ¢ aparentemente alterada ap6s 0 horménio doado pelo macho se ligar aos seceptores especiais nas células nervosas. 0 PS afeta a expressio génica do fruitless nas ‘flulasalvo, uma vez que elas possuem a forma tipica do receptor necessério para se gar ace. 5 sinais hormonais s4o importantes ndo apenas na interacdo entre machos & meas, mas também em encontros entre machos. Quando um peixe ciclideo macho Edestituido do territ6rio de atragao de parceiras, uma mudanca na produgo de hor- ‘monio liberador de gonadotropina contribui para a reducdo de sua agressividade, do ‘emanho de seus testiculos e do seu esforgo para reproduzir (ver paginas 94-96). Em vérias outras espécies, os horménios também atuam na integrada alternancia en- sxe 0 comportamento sexual e agressivo que facilita a reproducao nos periodos em “que as condigdes ambientais externas e fisiol6gicas internas so mais favoraveis. A organizagio hormonal da reprodugio com frequéncia envolve mudancas coorde- ‘nadas na produgao de gametas e na atividade sexual, o to conhecido padrao reprodu- "Seo associado (Figura 5.29). Esse padrao é evidente, por exemplo, no comportamento ‘s=produtivo sazonal de cervos vermelhos (Cervus elaphus) que vivem na Gra-Bretanha. _ Qs cervos que viveram pacificamente uns com os outros durante todo 0 verio se tor- ‘mam agressivos a medida que setembro se aproxima, precedendo o periodo de aca- ‘sslamento; nesse periodo, seus testiculos produzem esperma e testosterona. Machos adultos castrados antes do periodo de cio mostram pouca agressividade e ndo tentam _scasalar com fémeas sexualmente receptivas. Se as diferencas comportamentais entre -machos castrados ¢ machos intactos forem provenientes da auséncia de testosterona _Sroulante nos veados castrados, entdo o implante de testosterona deve restaurar sua -@eressividade e 0 seu comportamento sexual durante 0 cio, @ é isso que acontece."” Do mesmo modo, quando lagartos anolis verdes (Anolis carolinensis) machos s¢ ‘sernam ativos pela primeira vez apés um periodo latente de inverno, suas concen- _=acies de testosterona na circulacao s4o muito baixas. Entretanto, & medida que a _produgdo desse horménio aumenta, os testiculos dos machos crescem em tamanho ‘Sesperma maduro é produzido. Nesse periodo, os machos comecam a proteger seus ‘exritbrios a cortejar as fémeas.”” Esses individuos tendem a ser maiores e mordedo- _ == mais poderosos, com muito mais testosterona no sangue do que os machos meno- ‘=>, e com sacos gulares maiores, com os quais cortejam femeas e ameacam rivais. FIGURA 5.29 Um padréo de reproducio associa do € aquele em que 0s sinais ambientais disparam ‘mudangas hormonais internas, 95 qué respostas comportamenteis dentro de um periodo: relativamente curto (como ilustrado pelo anolis verde). Em um padrdo de reproduce dissociado, c acasa- lamento pode ser dissociado no tempo da atividade gonadal (e hormonal) como na serpente colubridea do 174 John Alcock Esses aparentes efeitos da testosterona s4o, em parte, dependentes da época do ano, conclusio obtida por Jennifer Neal e Juli Wade, que implantaram cépsulas de tes- tosterona em dois grupos de anolis verdes cativos. Um grupo foi exposto a uma tempe- ratura mais elevada e a dias longos, mimetizando as condigdes ambientais que os lagar- tos encontrariam durante o periodo de reprodugio de verdo normal. outro grupo foi mantido em temperaturas mais baixas ¢ em dias mais curtos, situagio que se aplicaria & 6poca do ano em que os lagartos normalmente nao se reproduziriam. Machos implan- tados com testosterona no grupo “periodo reprodutivo" (PR) se mostraram muito mais dispostos a procurar por fémeas ¢ copular com elas do que os machos do grupo “pe- riodo nao reprodutivo” (PNR). O cérebro dos machos PR também se mostrou diferente do dos machos PNR, pois os neurdnios de suas amfgdalas eram maiores, sugerindo também que regides especificas do cérebro estavam submetidas a regulacao hormonal. O fato deo efeito nio ser independiente da época do ano sugere um mecanismo para 0 padrao de reproducao associada dos anolis verdes." [eter 5.5. Em mulheres, o ciclo menstrual envolve mudangas mediadas por hormdnios que regulam a produgao de 6vulos maduros. Podetia aligagSo entre horménios e fsologia ovalator's se extender para 0 comportamento reprodutivofeminino, produzindo um padrao de reprodugdo astociado? O que os bidlagos evolucionistas poderiam predizer Sobre a relag3o entre o ciclo menstrual e.0 desejo sexual? Por que eles iam predizer uma diferenga entre mulheres casades e es que no tem um parceiro sexual fixo? Por que eles ppoderiam também predizer que, no periode de ovulagao, as mulheres procurariam ma- Chos com caractersticas facials mascullnizacas especialmente atrativas? (ver Figura 149, pagina £21, para um exemplo de variagao de coracteristicas faciais masculinas). Confira $uas respostas com Gangestad e colaboradores,* Macrae e colaboradores”*e Pillswor th, Haselton e Buss." Embora muitas espécies estudadas até 0 momento demonstraram possuir pa~ ides reprodutivos associados, a teoria de que o comportamento sexual esta sob esse tipo de controle hormonal continua a ser testada."" Se a testosterona for necesséria para o comportamento sexual em aves, entéo a castracéo deve eliminar esse com- portamento do macho, porque a remogao dos testiculos reduz drasticamente a fonte de testosterona. Esse fato foi confirmado em algumas espécies, incluindo a codorna japonesa.a qual, se castrada, para de reproduzir, mas volta a atividade se for feito um implante de testosterona,” assim como ocorre com 0 veado vermelho. Mas isso nao se confirmou com os pardais escrevedeira-de-testa-branca que, mesmo sem testicu- Jos, o macho ira montar fémeas que solicitem c6pula, desde que tenha sido exposto a longos fotoperiodos.'*” Além disso, algumas populagées de escrevedeira-de-tes- ta-branca tiveram mais de uma prole por estacao reprodutiva. Os machos de escreve- deira-de-testa-branca que copularam com uma fémea para produzir uma segunda ou terceira ninhada de ovos fertilizados no verdo tinham relativamente pouca concentra- «ao de testosterona no sangue naquele periodo (Figura 5.30), mais uma evidéncia de que altos niveis de testosterona ndo sao essenciais para o comportamento sexual dos -machos nessa especie. reat 5.6 Em estudos sobre o controle hormenal do comportamento, é comum retirarse os ovérios ou testiculos de um animal e depois injetd-los com horménios variados para ver quis s20 seus efeitos comportamentais. Que vantagem essa técnica tem sobre outra abordagem, a de simplesmente medi a concentragao de horménios especifices no san- ‘gue de sujeltos animais de tempos em tempos? A abordagem muito menos invasiva da medida direta mostraria, por exemplo, se a concentracao de testosterans ou estrogeno estariam elevadas enquanto acasalamento estivesse ocotrendo, Escrevedeire- de-testabranca (Washington) Cte) Comportamento Animal 175 FIGURA 5.30. Cicios hormonal e comportamen- tal em populagdes com uma Gricaninhad e miil- ‘iplas ninhadas de escrevedeira-de-testa-branca. Concentragses de testosterona no sangue de escrevedeira-de-testa-branca machos apresentam tum pico pouco antes do momento de acasalamento ‘com as fémeas (A) no seu primeiro ciclo de reprodu= G20 da temporada. Em populagSes que reproduzem diuas vezes em uma estacéo, contudo, a copula tam- bbém ocorre durante um segundo cielo reprodutivo, ‘no momento em que a concentragéo de testoste- rona est diminuindo. Adaptada de Wingfield e Moore.'"” No porquinho-da-india (Cavia porcelus), individues maches variam em seu impulso |.como medido, por exemplo, pelo numero de vezes que 6 macho ejacula quando Jacesso a fErieas receptivas por um periodo de tempo padrao. Uma hipétese para Nvatiagio ¢ de que o impulso sexual do macho se correlaciona com a concentracéo terona circu-ante. Que predicdo se obtém dessa hipotese? A Figura 5.31 apre- dads de um experimento feito com trés porquinhos-da-india, os quais tiveram Jmpulsos medidas. Todos os trés machos foram castrados e, depois disso, seus xuais continuaram sendo monitorados. Finalmente, aps algumes semanes, do aos trés machos a mesma quanticade de testosterona suplementar, ¢ seus im- es sexuais foram novamente medidos om intervalos. Qual a relevancia desses dados 1s hipotese em questo? Qual conclusso cientifica pade ser obtida com base nesses rados? Antes da Apo Teapiade carat eatesio tesorterona i = WMachoa = Macho = tmatoe 1B 21 24 Tempo (semanas) 7M BM Mt FIGURA 5.31 Os efeitos da castragéo seguide de terapia com testosterona em trés ma- chos de perquinhos-da-india. O "escore de libido ou impulso se- sual" é uma medida da atividade copulatéria Adaptede de Grunt e Young,” 176 John Alcock 05 025 Log da testosterona (ng/a) 7 Fémeas Femeasem monogémicas grupos poliginicos FIGURA 5.32 Testosterona e agro: dade de fémeas de ferreirinha. As concen: tragdes de testosterona foram maiores em fémeas competindo por machos em grupos ppoliginicos (barras vermelhas) do que em fémeas em relacionamentos monogamicos. Adaptada de Langmore, Cockrem e Candy.™* O papel variével da testosterona Aescrevedeira-de-testa-branca nao ¢ o tinico passaro em que grandes concen- tracdes de testosterona sao desnecessérias para a corte e o acasalamento.”" A testosterona poderia ter outras fungdes em algumas espécies além da es- timulacéo do comportamento sexual? Uma possibilidade seria que a testos- terona regula o comportamento de canto, como visto anteriormente neste capitulo. Outra seria de que o horménio atua como facilitador de agressao. Se essa hipétese estiver correta, podemos predizer que em passaros sazonal- ‘mente tertitotiais, a concentzacao de testosterona deve estar especialmente alta logo antes do periodo reprodutivo, quando os machos defendem territérios agressivamente contra rivais. Esse fendmeno tem sido observado na escreve- deira-de-testa-branca (ver Figura 5.30) e em alguns outros passaros.'** Mesmo. 9s territoriais passaros Hylophylax naevioides, que habitam os tr6pi a exibem altos niveis de testosterona em nenhum padrio sazonal especifico, res- pondem a gravacdes de cantos de suas espécies com uma répida elevacao de testosterona na circulagao.""" A hipétese de que a testosterona desempenha um papel na regulacao da agressao leva a utra predicdo: quando a competicao entre fémeas for uma caracterfstica regular da historia natural de uma ave, entao as fémeas mais agressivas devem possuir niveis de testosterona relativamente elevados. Uma espécie de passaro com fémeas competitivas é ferreirinha (Prunella modularis) (ver Figura 10.30). Ferreirinhas fémeas reproduzem-se em pequenos grupos que partilham um ou dois machos. Nessas situacdes, 0 sucesso reprodutivo de uma fémea depende de quanta assisténcia ela recebe do(s) macho(s) com o(8) qual (ou quais) ela vive. Por isso, as fémeas tentam manter as outras fémeas longe de “seu(s)” parceiro(s), perseguindo-as, emitindo chamados agressivos, até mesmo cantando para anunciar que estdo prontas para a briga. Quando os niveis de testoste- rona de fémeas de grupos com varias fémeas foram comparados com as fémeas sem competicao, pareadas com um tinico parceiro, os resultados corroboraram a hipétese de que a testosterona é um facilitador hormonal de agressao (Figura 5.32), embora seja possivel que as brigas causem um aumento dos niveis de testosterona, mais do que outra coisa. Mesmo em espécies nas quais a testosterona indubitavelmente promove o adaptativo comportamento sexual ou agressivo, é regra que a concentracio de tes- tosterona cai para quase nula quando fora do perfodo reprodutivo ou apos cessar a Supima o sistema Estimulao probabilidade de desafios territoriai Por que isso acontece? Tal- vez. 0 horménio tenha um preco, diminuindo a aptidao em cer- Pinor's pauces ‘tive ocomporaments tos periodos ou em certas situacdes. O horménio realmente tem de sémen senual - / muiltiplos efeitos (Figura 5.33), nem todos eles positivos, incluin- do a interferéncia no sistema imunoldgico;” isso explica por que machos de muitos vertebrados sao mais propicios do que fémeas a serem infectados por virus, bactérias ou parasitas.”” Altas concentracdes de testosterona podem também contribuir para a alta concentracao de glicocorticoides, que pode contribuir para ou ser reflexo de estresse fisiolégico,’ e, assim, aumentar a vulnerabilidade aos organismos causadores de doencas. Além disso, os efeitos comportamentais diretos da testoste- rona podem ser custosos, levando os individuos sob influéncia do horménio a gastar muito mais energia do que em outra si- tuagao.” Por exemplo, quando machos de andorinhas das cha- ‘minés (Hirundo rustica) tiveram suas penas do peito pintadas de um vermelho mais escuro, eles se tornaram mais atraentes para as fémeas e alvos de outros machos agressivos. Como resultado, ‘mune comportamento agressive seus niveis de testosterona aumentaram, e 0 peso de seus corpos diminuiu com o passar do tempo, quase certamente porque o hor- FIGURA 5.33 A estrutura quimica da testosteronae ——_ménio induzitios passaros a se tormarem mais ativos fisicamente seus diversos efeitos na fisiologia eno comportamento. ag custo de usarem suas reservas de energia."™ Adaptada de Wingfield, Jacobs e Hillgarth.°”” ® fe = $3 = ie BE” mario Al —_Laranja Corda garganta ‘Amarelo Aaul Lavan Corda garganta Machos saturados de testosterona podem tornar-se tao focados no acasalamento ‘em brigas com rivais que se tornam alvos faceis para predadores ou parasitas. algumas dessas espécies, machos com altas concentracdes de testosterona tem enor probabilidade de sobreviver do que machos com uma quantidade mais mo- ta de horménio no sangue (Figura 5.34) (ver também a Figura 8.26). Mesmo se um cho saturado de testosterona sobreviver, ele pode negligenciar os filhotes para Seer com outros machos. Assim, embora os emberezideos Juntco hyemalis que rece- som implantes de testosterona nao apresentem maior taxa de mortalidade do que smachos-controle, esses passaros canoros de fato alimentam suas crias com menos éncia. Pode ser por isso que a prole de machos com niveis de testosterona au- entados produz proles menores, que ndo sobrevivem tio bem quanto as proles dos s-controle.*" implantes de testosterona podem manter a concentracao hormonal anormalmente da em um junco macho por um longo periodo, enquanto na natureza os machos dem elevar seus niveis de testosterona quando necessario, em resposta a certos even- em vez de estar constantemente sob influéncia do horménio. Para determinar as {éncias de ondas tempordrias mais naturais de testosterona, uma equipe de eco- estas comportamentais liderada por Ellen Ketterson injetou hormonio liberador de 1a (GnRH) em juncos machos cativos, o que induziu um breve e varidvel ento de concentracao de testosterona nos sujeitos animais, que entdo foram devol- es a seus territérios de reproducdo. Esses machos que tinham niveis de testostero- ‘relativamente aumentados apés a aplicagao de GnRH se comportaram com mais essividade frente a um intruso simulado (um junco macho engaiolado introduzido: centro do territério do residente). Mas os machos que mais tiveram seus niveis de esterona aumentados em resposta ao desafio do GnRH também foram os que ali- saram suas crias com menor frequéncia.””* Mesmo um curto periodo de elevacao, ‘concentragio de testosterona parece ter o custo potencial de tornar 0 macho um pai ‘cooperativo. ert Eis cura questéo sobre o comportamento paternal do roedor-da-califonis cujos ma- io ertremamente protetores de saus fihotes. Se for verdade que a testosterona inter Sere no commportamento paterno, entio a castragao de machos desses camundongos deve “qual efeito? Confira sua prediglo com os dados coletados por Brian Trainot e Catherine f apresentados na Figura 5.38. Qual seria sua conclusso se ahipétese da compensa- (trade-off hypothesis) fosse aplicada 2 essa espécie? Considerando-se as potenciais desvantagens da testosterona, que variam de espé- para espécie, nao é surpreendente que o padrao de controle hormonal da agressao eproducio nao seja 0 mesmo para todo animel (Figura 5.36). Em uma espécie de Comportamento Animal_177 Utastansburiono FIGURA 5.34 Custo da testoste- rona para a sobrevivéncia. (A) As tués diferentes formas do la Uta stansburiana pessuem gargan- tas de diferentes cores diferentes quantidades médias de testosterona Greulante no sangue. (B) A forma ‘com maior concentracéo também apresenta elevada taxa anual de mortalidade. Fotografia do autor, A +B, adaptada de Sinervo e colabo- rads Wi Machos com implantes de sook| _ testostrans [QMachor com implonter parental Bog 8 8 ‘Terspo invetido em O' Reonchegands —Lmpanda fihotee FIGURA 5.35 Tempo gasto no comportamento parental (aconche- gando e limpando filhotes) por um roedor-da-califérnia macho castrado que recebeu reposicao de testos- terona (barras vermelh machos que receberam implantes vazios (barras laranjas). Adeptada de Trainor e Marler"

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