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Copyright © Plano Editora Leda E proibida a teprodugio total ou parcial desta publicagio, por uaisquer meios, sem autorizacio prévia, por escrito, da Ealitora Conselho Editorial: Bermardete Angelina Gatti Iria Breezinski, Maria Celia de Abren, Osmar Favero, Pedra Demo, Rogério de Andrade Cidova, Sofia Lerche Vieira Coordenagio da stir Berardete Angelina Gatti Revisio e editoracio eleténica: ‘Maria da Concegao Ferreira Capa: ‘Marcus Polo Rocha Duarte Impressiio e acabamento: Repset India Grin Lila Dados Internacionais de Catalogasio na Publicagio/CP1/Brasil Vianna, Heraldo Matelim, V617 Pesquisa em educagio: a observagio / Herald Marclim, Vianna.— Brasilia: Plano Editors, 2003, 108 p. (Série Pesquisa em Educagio, x 5) ISBN 85-85946.59-8 1. Metodologia de pesquisa. 2. Técnicas de observagio. 3. Escola. 4. Observagio. I. Titulo, epusz.n12 Biblioteca - Camborii Pesquisa em educagtio : a observ Ac. 286557 - R. 974033100; V. 5 "= al* Pt“ 399 Compra - LIVRARIA INOVAGAO CULTURAL Nf: 000.002.871 R$ 15,39- 11/10/2012 Sumario Capitulo I METODOLOGIA DA OBSERVACAO Introdugio: problemitica da observacio .. 9 Observagio e atividade cientifica .. 1" Observacio € suas dimensdes 16 Observagio estruturada ¢ semi-estruturada ururnm 21 Observacio € suas diferentes fases Observagio: outros. pontos a considerar... 30 Obscrvacio: vantagens ¢ desvantagens 135 Observador: seu papel e algumas quest6es sun: 40 Observacio ¢ tipos de abordagem - Observacio naturalista e obsetvagio participante.. 47 Observasio: registtos, dados ¢ relatétios .. ‘Observacio: validade © confiabilidade.. Observacio: modalidades de triangulacio .. Capitulo I OBSERVACAO NA ESCOLA Introducio: 0 contexto da escola ‘Métodos quantitativos de observaci Métodos quulitativos de observagii Conceitos basicos sobre observaci Efetivagio da observacio na escola... Observacio e avaliagio do professor . Anilise dos dados da observagio na escola REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS seeennes BB METODOLOGIA DA OBSERVAGAO. Antes deflsofar sobre um objeto, éncesinio exanind- do com exatidia, Qualquer explcacio om interpretagio deve serprecedida de uma obseruai ede uma desrigio cexatas do objeto. [-] Devemoi, pois, aprender cons um clbar penetrante e deserever com exatido esse fentimeno peculiar de consiéncia que chamanas de conbecimento (HESSEN, 2000, p.19). Introdugao: problematica da observagao ‘A maior parte do que sabemos sobre as pessoas que convivem conosco resulta de observacdes casuais que empreendemos, com muita freqiiéncia, a0 longo de nossa jornada didria, As informacdes cientificas que obtemos sio inteiramente diferentes das que conseguimos quando fazemos uma observagio casual. A difetenca centra-se, sobretudo, no fato de que as observacdes cientificas procuram coletar dados que sejam vilidos e confidveis. As técnicas de observacio em pesquisa sio, praticamente, as tinicas abordagens disponiveis para 0 estudo de comportamentos complexos, como acentua Borg (1967), em sua obra hoje clissica. Grande parte dos fatos que realmente interessam aos educadores, como, por exemplo, a interacio professor /aluno, fandamental no proceso de aptendizagem, é extremamente complexa. 9 Os estudos de observacio, dessa forma, apresentam problemas de grande complexidade e, talvez, por essa tazio, nfo sio numerosos no campo educacional. Ao planejar ¢ implem pesquisador se deftonta com varios problemas, todos de grande importincia. Contudo, para obter informagoes de valor cientifico, na medida do possivel, € preciso usar metodologias adequadas, a fim de evitar a identificagio de fatores que tém pouca ou mesmo nenhuma relagZo com 0 comportamento complexo que se deseja estudar. Outro problema refere-se & determinagao do grau de influéncia que a presenga do observador pode causar, modificando o contexto ¢ mesmo a situacao a set observada. 7 tar uma observacio, © Em observagdes em sala de aula, uma mudanca que se opere no comportamento do professor e no dos alunos, pela presenga do observador, pode comprometer todo 0 trabalho de pesquisa. Um attificio pata minimizar a influéncia do efeito do observador seria a presenga do mesmo em sala varias vezes, mas sem coletar dados, a fim de que professor ¢ alunos, a setem observados, se acostumem com a sua presenca ¢ possam agir com maior naturalidade durante 0 proceso efetivo de tealizacio da observacio. No entanto, nao € possivel eliminar de todo a influéncia da presenca do observador ~ trata-se de uma presenga, ¢ isso deve set considerado nas andlises. Um outro problema refere-se ao fator tempo, considerando que a metodologia da observagio demanda um certo espago temporal para set coneretizada, requerendo permanéncia, as vezes, bem longa no campo, a fim de conseguir dados suficientemente esclarecedores, Outro aspecto a ressaltar, nesta introdugio a problemitica da observacio, refere-se ao fato de que uma 10 pesquisa observacional, para ser considerada como tendo significado cientifico, deve apoiar-se em fundamentos tedricos consistentes relacionados a natureza dos fatos ou comportamentos a serem observados. Sem a teoria e um corpo de conhecimentos bem estruturados, a pesquisa observacional certamente produzira elementos esparsos € no-conclusivos. E importante, dessa forma, iniciar a pesquisa fazendo uma tevisio da literatura, limitada, digamos, aos trés ou quatro tiltimos anos anteriores a0 inicio da observacio e, depois, partir para a formulacio de algumas idéias (hipétéses) sobre a natureza do fenémeno a ser considerado. # impositiva a formagio eo treinamento de todos 08 elementos que vio participar como observadores. ptimeiro passo a ser dado esté na discussio do planejamento da pesquisa com os futuros observadores,, descrevendo todas as fases do trabalho € esclarecendo as diividas que certamente surgitio, para que todos tenham uma idéia bastante clara e concreta do que vai ser realizado e como serio registradas as informacoes. E fundamental que haja diferentes sessdes preliminares de observacGes com todos os envolvidos, ¢ 08 resultados discutidos por todos os integrantes do ‘grupo. Se possivel, os treinamentos devem ser gravados, e as diferengas existentes da parte dos treinados discutidas pelo grupo. Observagio ¢ atividade cientifica A observacio é uma das caracteristicas da atividade cientifica, inclusive na area das ciéncias humanas, ¢ as discussdes metodolégicas sobre 0 papel da observacio como método de pesquisa, conforme ui assinalam Wilkinson (1995) e Flick (1999), tém sido intensas nos tltimos tempos, especialmente a partir da aceitagio, estruturacio ¢ consolidagio de metodologias qualitativas de natureza naturalista, A observagio em pesquisa educacional parte de fatos constatados em eventos e cada ciéncia tem seus fatos particulares, e a maioria desses fatos, nas ciéncias do homem, refere-se a comportamentos (GRAZIANO & RAULIN, 2000). A observacio, como mostram Selltiz et al. (1967), deve estar inserida em um processo de pesquisa, mas isso nao significa que importantes observagdes no possam ser feitas de modo casual, como muitas vezes ocorreu, ¢ ocorre ainda no campo da ciéncia, haja vista © acontecido com Piette’e Marie Curie na descoberta do radium (1898), ou com Alexander Fleming, no caso da penicilina (1928), que sio exemplos hist6ricos AA observacio é uma das mais importantes fontes de informagées em pesquisas qualitativas em educagio. Sem acurada observacio, nao ha ciéncia, Anotagdes cuidadosas e detalhadas vio constituir os dados brutos das observagées, cuja qualidade vai depender, em grande atte, da maior ou menor habilidade do observador ¢ também da sua capacidade de observar, sendo ambas as caracteristicas desenvolvidas, predominantemente, por intermédio de intensa formacio. Ao observador nao basta simplesmente olhar. Deve, certamente, saber ver, identificar e descrever diversos tipos de interagSes e processos humanos. Além disso, como mostra Patton (1997), é importante que, no seu trabalho de campo, o observador possua suficiente capacidade de concentracio, paciéncia, espitito alerta, sensibilidade e, ainda, bastante enerpia fisica para concretizar a sua tarefa. 12 ‘Todas essas caracteristicas exigem intenso € adequado treinamenyd para formar um pesquisador com Suficiente experiéncia ¢ que possua, assim, capacitacgio para coletar elementos de informagio que sejam vilidos «¢, dessa forma, possam ser confiveis para os fins a que se destinam. A pesquisa busca explicar situagdes problematicas que estuda e analisa, apresentando, ao final, inferéncias conclusdes. A identificacio de problemas para fins de pesquisa, inclusive as de natureza observacional, objeto do presente trabalho, sempre parte de tpicos bastante amplos pata depois de sua andlise concentrat-se em um_ problema especifico, conforme discutem McMillan & Schumacher (2001). ‘A identificacio de problemas pode ser feita a partir de observagdes casuais, como mostram virios exemplos histéricos, como os anteriormente mencionados, que podem significar uma rica fonte de reflexdes € interrogagdes, oferecendo diferentes caminhos para novos € mais amplos estudos observacionais. Algumas perguntas getadoras de novos trabalhos podem surgir, a partit de certas relagdes que no oferecem explicacées amplamente satisfatorias para 0 problema enfocado. Além do mais, podemos partir do trabalho de autoridades na area ou da propria tradigio, que costuma aceitar certas afirmagdes sem o suporte de evidéncias empiricas comprovadas, o que ocorre com bastante freqiiéncia no campo educacional ¢ em outras reas ligadas as ciéncias do homem. Outras fontes de identificagio de problemas a pesquisar, além das jf referidas, encontram-se na literatura técnica, em trabalhos teéricos a partir dos quais sio feitas algumas dedugdes que precigam sex comprovadas, ou considerando situagdes dat vida pritica e mesmo “43 experiéncias © insights pessoais que possam ocorrer, ¢ efetivamente ocorrem com relativa freqiiéncia, em diferentes campos cientificos. A observacio é considetada a mais disponivel das técnicas de coleta de dados, mas, provavelmente, segundo Crabtree & Miller (1999), a que demanda, com certeza, mais tempo, além de exigit maior cnvolvimento pessoal do pesquisador. A observacio, [como técnica cientifica, pressupée a realizacio de uma Pesquisa com objetivos criteriosamente formulados, ‘\ planejamento adequado, registro sistematico dos dados, verificagio da validade de todo o desenrolar do seu \Cprocesso e da confiabilidade dos resultados, Ao longo dos anos, a observacio tem contribuido, sem sombra de dtivida e sem contestacio empiricamente fundamentada, para o desenvolvimento do conhecimento cientifico, sendo uma técnica metodolégica valiosa, especialmente para coletar dados de natureza nio-verbal, segundo Bailey (1994), que se referem de forma direta a situacdes comportamentais tipicas, como atestam e destacam Selltiz et al. (1967). Ainda que a observacio envolva, obviamente, 0 Orgiio da visio, certos dados podem ser obtidos por intermédio de outros sentidos, como a audic¢ao, o tato 0u 0 olfato, pois, em sintese, conforme Graziano & Raulin (2000), a observagio é um processo empiric por intermédio do qual usamos a totalidade dos nossos. sentidos para reconhecer ¢ registrar eventos fatuais, O uso da metodologia da observacio, ressaltam Bailey (1994) e Selltiz etal. (1967), no exchui, entretanto, como nao poderia deixar de ser, o emprego de outros métodos de coleta de dados, igualmente vélidos nos tabalhos de pesquisa em educacio, sendo também Possivel, no caso da observacio direta, a utilizagio de 14 e anilise questionitios ¢ entrevista, téenicas projetivas e and de registros anteriores envolvendo a mesma temética objeto da pesquisa. A observacio, especialmente a observagio direta, como metodologia de levantamento de dados, é mais valiosa do que outros meios de captacao de dados, como, por exemplo, 0 surng (técnica de levantamento de dados que apresenta perguntas ou questdes a uma amostra de sujeitos, em determinado momento), a entrevista & © questionério, quando usados isoladamente. ‘As obsetvagdes sio muitas vezes feitas prelimi- narmente a outras atividades, como. suriey, € podem ser realizadas juntamente com outras técnicas, como a expetimentagio ou estudos de documentacio. A observacio também é empregada quando os sujeitos a observar no admitem sua participacio explicita em um, survey, nota Bailey (1994), ou quando se deseja estudar fatos ou comportamentos que ocorrem em determinado contexto ou instituicio (GRAZIANO & RAULIN, 2000; WILKINSON, 1995; WRAGG, 1999). Estudos observacionais podem ser realizados, lembra Bailey (1994), em diferentes lugares, como escolas, universidades, hospitais, shappings, ruas, pracas piiblicas, etc., e em situagdes as mais variadas, como no caso do processo de formacio de professores. Em tnuitas oportunidades, 0 pesquisador vé-se diante de uum quadro insélito, mas no-raro, em que os individuos estudados ni tém condigdes, por razbes varias, de fazer descticdes verbais dos seus comportamentos; as vezes, por nio falarem (criangas pequenas, elementos de outros grupos Hingiisticos e culeurais, pessoas com comprometimento da fila ete). Nesse caso, impoe-se 20 cientista o emprego da observacio na sua pesquisa, acentuam Selltiz et al. (1967). 15, Os estudos observacionais, como pode ser intuido das colocagdes anteriores, levam a observagio de campo, técnica fundamental u s qualitativas, qu ana maioria das, juz descrigdes detalhadas de acontecimentos, pessoas, agdes e objetos em um determinado contexto, de acordo com McMillan & Schumacher (2001). A técnica pode ser usada em diferentes tipos de observagio, sob diferentes formas, A observacio faz patte do nosso cotidiano, mas essa situagio no nos deve levat a pensar que possamos fazer observagdes sem uma formacio ¢ treinamento prévios que nos qualifiquem para 0 exercicio dessa atividade, Existem estudos de natureza empirica, relatados pot Selltiz et al. (1967, p. 231/232), que demonstram as dificuldades encontradas por observadores sem um adequado e intensivo treino. Os resultados, na auséncia desse treinamento, quase sempre sio de natureza caética € no merecem credibilidade, por no se revestirem da seriedade e validade que seria de se esperar em um trabalho cientifico. Observagiio e suas dimensées A literatura sobre observagio — ampla nos paises de lingua inglesa em algumas nagées do continente curopeu — apresenta diferentes concepgoes de observasio ¢ do papel do observador. A observacio pode servir a diferentes objetivos da pesquisa ¢, inicialmente, pode ter um sentido apenas explotatétio. Os procedimentos de observagio, na perspéctiva de Flick (1999), sio geralmente classificados ao longo de cinco dimensdes: 16 + Observacio oculta versus observacio aberta — até que ponto é a observacio tevelada aqueles que serio observados? + Observacio nio-participante versus observacao participante — até onde 0 observador se torna parte ativa do campo observado? + Observagio sistematica nersus observacio nio- ‘ sistemética, ou seja — a observagio deve ser padronizada ou permanecer mais ou menos flexivel ¢ responsiva aos proprios processos? * Observacao én natura (natutalista) versus situagbes artificiais (laboratério) — sio as observagdes feitas no proprio campo objeto de interesse, ‘ou sao as interagdes “conduzidas” a um local ‘que oferece melhores condigdes de observacio? + Auto-observagio venus observagio de outros, Ainda que a observacio, ocasionalmente, venha a verificar-se no contexto de um laboratério, como, ocorre com mais freqiiéncia nas experimentacdes, na maioria das vezes, entretanto, como destaca Bailey (1994), ela se processa em um ambiente natural. Contrariamente a0 survey, em que se utiliza um questionirio estruturado, consteuido anteriormente & pesquisa, ¢ usado como referencial para fins de interpretar a realidade ¢ levantar dados empiricos de natureza quantitativa, a observacio em geral, seguindo outra litha, tende a usar um referencial minimo para estruturar 0 fendmeno a estudar, assim como as questoes que serio levantadas no momento da sua efetiva pritica. Se for levado em conta o tipo de estrutura, podemos classificar a observagio identificando, primeiramente, © meio em que a mesma tem lugar, que pode ser natural ou artificial (laboratério, sala especial, etc.). 7 © grau de estruturacio imposto pelo observadot determina outros tipos de observagio. Assim, podemos ter uma observacio estruturada que procura determinar a freqiiéncia com que um comportamento ocotre ou certas coisas sio ditas, e observacio ndo-estruturada, ‘na qual 0 observador nio procura um comportamento especifico, mas apenas observa ¢, simplesmente, registra as diferentes ocorréncias. Categorizar observagdes no é simples. Seria Possivel, como propde Bailey (1994), 0 cruzamento desses tipos de observacao por intermédio de uma tabela de dupla entrada. Contudo, se considerarmos que 4 categorizacio, levando em conta o meio — natural ou antificial— é razoavelmente clara, o mesmo jé nao ocorre com a distingio entre observagio esttuturada ¢ nio- estruturada, dificultando, dessa forma, a ctiagio de uma tipologia. Vemos que esas categorias devem ser consideradas como sendo relativas, nio podendo atribuir-lhes um carter de categorias absolutas, Alguns estudos podem ser mais organizados que Outros, ¢ é perfeitamente duvidoso que qualquer situacio observacional seja inteitamente nio-estruturada, Se considerarmos do ponto de vista meramente teérico, cada tum dos dois tipos de observacio, antes mencionados, pode ser concretizado, seja como observacio participante ou nio-participante, pois diferentes fatores podem determinar um ou outto tipo de ‘observacio. No caso da observacao participante, o observador é parte da atividade objeto da pesquisa, procurando ser membro do grupo, ena observagio nio-participante o observador no se envolve nas ‘atividades do grupo sob observacio € nfo procura set membro desse grupo. Uma observagio pode ser “aberta”, quando 0 observador é visivel aos observados que sabem que 18, esto sendo objeto de uma pesquisa, ou “oculta”, os observados nfo sabem que estio sob observacio. O maior problema com este iiltimo tipo de observagiio € que ela pode ser reativa, ow seja, os observados podem comportar-se diferentemente do que se comportariam habitualmente, ocorrendo o chamado feito de Hanthorne, em que os comportamentos passam a ser diferentes do que se poderia esperar em uma situacio habitual, havendo, em muitos casos, 0 que se poderia dizer como sendo uma melhoria da imagem, um make-ap ow uma maguillage, que desfigura a situagio, ou os observados se sentirem constrangidos por se acharem numa situago que foge a0 normal do seu dia- a-dia, o que cria igualmente um quadro pouco propicio 8 observagio, como seria desejavel. Selltiz et al. (1967) mostram que as pessoas observadas, a0 saberem dessa situagio, podem tentar de uma forma deliberada criar uma impressio especifica, mas essa tentativa de mudanca no escapa 4 observacio de um pesquisador bem treinado e arguto. Quando a pesquisa de observagio ocorre em um meio nao-natural, as pessoas sendo observadas niio sto realmente patticipantes. Desse modo, é mais ficil a acetagio de um observador nio-partiipante. O mesmo sucede quando a observagio tem lugar em um laboratério, situaglo em que 0 trabalho de um observador nio-patticipante fica mais facilitado, face & sua no- identificagio, lembra Bailey (1994). Esclarecendo: um observador nio-participante de uma classe de alunos teri sua missfio mais facilitada se a obsetvasio for feita através de um espelho de uma ‘inica face (one way), que possibilita olhar sem ser visto a partir de uma sala vizinha, ~ 19 O emprego de videotapes & também possivel no exemplo mencionado, sem que haja conhecimento dos alunos observados quanto 20 momento exato em que ocorte a observacio. Uma observacao, qualquer que seja 0 seu objetivo © as suas finalidades, deve propor, inicialmente, como sugerem Selltiz et al. (1967), quatro importantes questdes a serem objeto de consideragio ao longovde todo 0 trabalho: . * O que deve ser efetivamente observado? * Como proceder para efetuar o registro dessas observagdes? * Quais os procedimentos a utilizar para garantit a validade das observagdes? * Que tipo de relagio estabelecer entre o observador o observado, qual a sua natureza € como implementar essa relagio? Muitos podem pensar, erroneamente, com base na idéia bastante generalizada de que a observacdo faz Parte da vida diétia, que é possivel realizar observacées sem um cuidadoso treinamento. Ainda que isso _ efetivamente ocorra, e mais freqiientemente do que se imagina, é preciso lembrar que a observacio na vida didria, por sua propria natuteza, é inteitamente caética, de acordo com Selltiz et al. (1967). Actescente-se, ainda, que nesse tipo de observacio existe, muitas vezes, um mimero relativamente grande de inexatidées e omissdes que comprometem a validade de todo o processo e a consisténcia dos dados levantads, Por se basearem em opinides nem sempte necessatiamente verdadeiras 20 Observacao estruturada e semi-estruturada As observagSes totalmente estruturadas ocorrem em laboratétio e, em geral, partem da pré-construcio de hipéteses. As observacées de campo séo em geral semicestruturadas, tém lugar em um contexto natural e, na maioria das vezes, nio procuram dados quantificiveis, que apenas eventualmente sio coletados. As observagies estruturadas possuem uma metodologia, que Ihes é inteiramente caracterfstica por suas especificidades. Procuram testar hipéteses, exigindo, desse modo, instrumentos préprios € padronizados, segundo normas docimolégicas, isto é, referentes a medidas claramente definidas. E necessitrio, no caso de observacdes estruturadas, que 0 trabalho de observagio dos sujeitos no venha a criar problemas, gerando situagdes conflituosas dentro da instituigio e que o préprio observador nio possa controlar ou mesmo atuar como agente mediador (SELLTIZ, 1967). ‘A observacio estruturada emprega o cbeck-list, que sera considerado mais tardé, com maior amplitude, no usando 0 questionério, que é utilizado em outras metodologias. O observador, na observacio estruturada, sabe perfeitamente o que observar no grupo, os aspectos mais significativos para os objetivos do seu trabalho de pesquisa e, desse modo, traca um planejamento para coleta e registro das observacdes que ira proceder, conforme a bem delineada discussio de Selltiz et al. (1967). Na observagio estruturada, a fim de que diferentes grupos possam ser observados em diversos momentos, € haja possibilidade de estabelecer comparagées, @ partir de uma série de categorias observacionais, destaca 21 Bailey (1994), € imprescindivel que esses grupos sejam identicos em todos os sens atributos, na medida do Possivel. As comparagées devem se realizar segundo condigdes padronizadas, de modo que fique assegurada, em diferentes momentos, a identidade dos diversos ‘gtupos. Trata-se de uma questo fundamental que nio pode ser ignorada pelo pesquisador, Quando sio realizadas observacdes em condigdes laboratoriais, existem possibilidades de que alguns casos escapem a essa situacio pela incluso de conjuntos de sujeitos aleatoriamente selecionados. Note-se, entretanto, que isso nfo costuma acontecer com elevada freqiiéncia, A questio da inclusio de sujeitos, de uma forma aleat6tia no estudo observacional estruturado, talvez ossa ser melhor compreendida atentando-se para uma sitzagao no campo das ciéncias fisicas, tendo em vista que a experimentagio € predominantemente usada como metodologia de coleta de dados informativos. Por outro lado, constitui consenso que a experimentacio € a menos utilizada das metodologias nas ciéncias humanas, Nas ciéncias fisicas, a causalidade é estabelecida pela especificagio bastante clara das variiveis causa ¢ gfeite, que podem set controladas de uma forma "permanente ¢, assim, supor que outras vatiiveis nao terdio qualquer tipo de influéncia sobre a situagio experimental. Vé-se, desse modo, que foi estabelecida uma situacdo em que hé 0 devido controle da vatiavel causa, da vatiawel efeito e das demais variiveis que precisam set controladas, promovendo-se uma espécie de isolamento dessas outras variéveis ¢ restando apenas as variaveis que explicatiam o fendmeno objeto de experimentagio, como mostra Bailey (1994), 22 Esse controle, com 0 isolamento de variiveis, deve acontecer, a fim de que se tenha plena certeza de que a ocorréncia de mudangas na varivel dependente somente podera set atribuida A varivel independente € ‘a nenhuma outra que se encontra isolada, Ao realizar experiéncias no campo das ciéncias fisicas, 0 cientista pode manipular diferentes vatiéveis, ‘mas 0 mesmo no ocorre na area das ciéncias humanas, por razdes Sbvias, considerando aspectos restritivos de natureza ética, moral e até mesmo impedimentos legais. Assim, 0 observador tem os seus graus de liberdade bastante limitados quanto escolha daquilo que vai efetivamente observar e que ser objeto do seu trabalho (SELLTIZ et al., 1967). Acreditamos, segundo as colocagdes de Bailey (1994), set impossivel promover, por motivos ficeis de perceber e de acordo com as restrigdes j4 apontadas, alteragdes em valores humanos, muitas vezes refletidos em varidveis diversas, como as existentes no desenvol- vimento de pesquisas que envolvem género, idade, cor, nacionalidade/naturalidade, status socioecondmico, nivel educaéional, ocupacio profissional erenda. Ainda que algumas delas possam sofrer modificagdes, a atuacio do pesquisador sofre limitagdes impossiveis de se superar no campo das ciéncias do homem. O controle exercido por um cientista da area social sobre as variiveis pesquisadas é de natureza inteiramente simbélica, sendo mantidos constantes, como afitma Bailey (1994), os valores dos grupos. Voltando problemitica da observagio estruturada, que pressupde a tealizacio de estudos que partam de situagdes selativamente especificas, segundo Selltiz et al. (1967), podemos exemplificar a questio, com a metodologia de Bales (1952) para estudo e andlise 23 da interagio de grupos, ¢ que ser apresentada nos seus aspectos mais relevantes de uma forma bastante Bales parte do pressuposto, com base simplifica ‘em diversos estudos observacionais anteriores, de que, quando em situagdes de tomada de decisdes ou de solugio de problemas, os grupos teriam elementos comuns em suas interagdes que seriam bastante constantes para permitir previs seria possivel explicar 0 comportamento de um sujeito por intermédio de supostas reagdes de outros membros do grupo (SELLTIZ et al., 1967). ‘A partir desses pressupostos, Bales definiu um conjunto de 12 categorias-padrio ¢ formulou certas hipéteses que preditiam a ocorréncia de determinados comportamentos, aptesentados por intermédio de problemas que o grupo poderia encontrar. s € qu Os elementos comuns arrolados por Selltiz et al. (1967) for: + problemas de orientacao; + problemas de avaliagio; * problemas de controle; * problemas de decisio; + problemas de tensio; ¢ problemas de integracio. ¥ Para um conhecimento mais detalhado do método de Bales, vero artigo: BALES, R. F. Some uniformities of behavior in small social systems. In: SWANSON, G. E. etal, (Ed). Reding in social _pyblog. New York: Holt, 1952. Ver, ainda, wma boa discussio sobre o sistema de categoias em Bailey (1994, p. 258/262). 2 Ver também em lingua portuguesa: SELLTIZ; JAHODA; DEUTSCH; COOK. Miiodas de pesquisa nas rele sce. Sto Paulo Editora Herder ~Editora da USP, 1967, p. 223/261, 24 Esses problemas englobam doze (12) categorias de observagio. A titulo de exemplificagao, no caso de problemas de avaliagio, as duas categorias de observacio sio as de n° 5 ¢ 8, no conjunto das 12 estabelecidas por Bales, a saber: (5) dé opiniio, avalia, analisa, exprime senti- mentos, desejos; (8) pede opiniao, avalia, analisa e expressa sentimentos. ‘Ao usat a metodologia de Balés, em uma situagio de grupo de discussio de no maximo cinco pessoas, segundo Bailey (1994), 0 observador faz as suas observagdes através de um espelho one-way, que possibilita ver e observar sem que seja visto pelo grupo observado. Ele registra os comportamentos observados ‘nas categotias do sistema apresentadas em um check-fst @, depois, faz a codificacio dos registros, tansformando- as em porcentagens em telacio ao total de registros feitos, possibilitando, dessa forma, tracar um perfil do grupo de discussio que foi observado, ‘A metodologia de Bales é pouco ou nada reativa, como mostra Bailey. (1994), porquanto os sujeitos observados desconhecem que esto sendo observados. ( instrumento de Bales faz com que a observacio seja inteiramente estruturada, com categorias predefinidas, ‘As categorias no sio exaustivas; assim, o observador, muitas vezes, vé-se na contingéncia de forar para que todos os comportamentos sejam incluidos em uma das suas 12 categorias que resultaram de 50 categorias anteriormente definidas, apés longos anos de pesquisa € pritica. ° 25 problema numa observaciio estruturada, assim como no suriey, centra-se na grande dificuldade de encontrar pessoas dispostas a serem sujeitos de um estudo observacional, demandando grande esforco de urgumentagio do observador. Quando o tesponsivel pela observacio pertence a uma instituigio de reconhecida idoneida universidade, centros de pesquisa, etc. —ou é conhecido por seu trabalho profissional, a pos: colaboracio‘em um trabalho bem definido, nos seus de — lidade de obter a objetivos ¢ com propésitos de releviincia cientifica, é~ grande, resolvendo-se, assim, um problen ocorre com grande freqtiéncia. crucial que A observagio nfo-estruturada consiste na possibilidade de o observador integrar a cultura dos sujeitos observados € ver o “mundo” por intermédio da perspectiva dos sujeitos da observacio c eliminando 4 sua propria visio, na medida em que isso é possivel, segundo ressalta Bailey (1994). A questio inicial que se coloca é: © que observar? E'nem sempre € fic dar uma resposta plenamente satisfatéria nos momentos iniciais do trabalho. © contetido da observagio deve ser necessatia- mente delimitado, porquanto € impossivel observar a todos ea tudo, registrando todos os pormenores (SELLTIZ. et al., 1967). Ao usar categorias observacionais, que sio proptias da observagio estruturada, por outro lado, © obscrvador corre o risco de eliminar ou diminuir as vantagens da observacio em um contexto natural. A observacio nfo-estruturada é com bastante freqiiéncia usada como técnica exploratéria, em que 0 observador tenta restringir 0 campo de suas observagdes para, mais tarde, delimitar suas atividades, modificando, as vezes, os seus objetivos iniciais, ou determinando 26 ‘com mais seguranga e precisio o contetido das suas observacdes e proceder as mudancas que se fizerem necessirias no planejamento inicial. Essas mudangas sao, muitas vezes, desejaveis, ¢ a possivel alteragio do foco da observacio pode determinar uma limitagao no trabalho a ser empreendido (SELLTIZ, 1967). ‘Hi quem alegue que o emprego de uma observagio semi-estruturada pode ter como conseqtiéncia diferentes tipos de reagio, considerando que a possibilidade da ptesenca de um observador em um contexto natural pode causar insatisfagdes ou venha a ocasionar tipos diversos de distoredes nos dados, pela impossibilidade de 0 observador ser completamente’ neutro.. E preciso pensar também que a observagio em situagio natural exige o registro imediato das informacées coletadas ¢ a sua codificaglo, sendo esse um procedimento dificil de se levar a efeito quando 0 observador se acha atuando em um grupo de elementos integrantes da observagio. Além do mais, em um contexto natural, totna-se problematico para 0 observador controlar possiveis vatiaveis estranhas 4 observacio. Por outro, lado, também se reveste de dificuldades a comparacio entre contextos naturais diversos que sio geralmente bastante diferentes entre si. Todos esses aspectos apresentam, sem sombra de diivida, questionamentos miiltiplos que, no entanto, podem ser de alguma forma minimizados, desde que tomadas as devidas cautelas. E possivel ter um contexto “natural” que no possua o attificialismo das condigdes de observacio em “laboratétio”, mas possibilite 0 controle de fatores estranhos a0 problema e que possa garantir, até certo onto, que 0s individuos sofram influéncias semelhantes durante a observagio (BAILEY, 1994), 27 A observacio, num contexto interno (escolas, salas de aula, salas de reunides, locais de trabalho, esctit6rios, etc.), possibilita resultados mais bem estruturados do que quando efetivada em um ambiente natural externo. Além de propiciar resultados mais precisos, ainda favorece 0 aprimoramento das observacées semi estruturadas, como demonstra a literatura, Uma fonte de viés passivel de gerar um erro sistemitico, € que ocorre em observagées de compor- tamento de individuos, esti no efeito de bal’ O pesquisador ou 0 observador pode muitas vezes apresentar um vies pessoal excessivamente forte nas observacées e julgamentos, introduzindo, dessa forma, erros sisteméticos nos seus dados, com efeitos problemiticos para a pesquisa. Um desses efeitos que, alis, ocorre com bastante freqiiéncia, é 0 efeito de halo, que envolve transferéncia de impressdes generalizadas sobre a caracteristica oui situacao de uma pessoa para outras, gerando interpretagdes pouco confiiveis. O feito de halo compromete’a validade do julgamento das tendéncias ¢ dos tracos observados ¢ introduz elementos de natureza esptitia nas observacoes, Observagio e suas diferentes fases Ressaltemos, inicialmente, as diferentes fases do processo de observacio que foram destacadas por vitios -autores ¢ resumidas por Creswell (1998), Flick (1999) € outros, em alguns pontos: 5 Vigs no julgamento de tragos especificos em virtude da tendéncia do julgador ser influenciado pela impressio geral (postiva ou nnegativa) que forma da pessoa julgada. Ver: VIANNA, H. M. Glos de eros cies en mada edacaconit So Paso: Fendagiow (Catios Chagas, 1980. 28 selegio de um “cendrio”, ou seja, estabelecer 0 Tocal onde e quando as pessoas envolvidas ‘no processo podem ser observadas; definigio do que vai ser documentado na observagao e em que casos, ou seja, identificar quem ou o que dbservar, quando e por quanto tempo; treinamento de observadores para fins de padronizacio dos procedimentos ¢ determinar, inicialmente, as fungdes do observador, observacdes descritivas ¢ reflexivas que oferecam uma apresentacao geral do campo observado; planejamento da metodologia do registro das anotagdes de campo; destaque das observagées que contenham aspectos relevantes para as indagacoes da pesquisa; registrar aspectos, como descricio dos informantes, contexto fisico, eventos e atividades particulates, as proprias reacdes do observador; observagdes seletivas que pretendam, inten- cionalmente, compreender aspectos centrais; durante a observacio, se for observador externo, apresentar-se, estabelecer relagdes amistosas, iniciar com objetivos restritos nas ptimeiras sessdes de observacio; tétmino da observacio quando a mesma atingiu ‘um ponto de saturacio tedrica, ou seja, outras observagdes nio proporcionariam mais nenhum conhecimento; apés a observacio, informar aos interessados sobre 0 uso dos dados ¢ a disponibilidade do estudo, 29 Podemos, em forma resumida, estabelecer, de Aceito pelo grupo, o observador passa a registrar acordo com Bailey (1994), que as diferentes e sucessivas suas observagies, que devem se revestir de elementos fases do proceso de obsetvacio sio as seguintes: caracteristicos a serem combinados em um diirio de campo: i) 0 que é importante para os obsertudos ¢ ii) 0 * definir os objetivos do estudo; que parece importante para 0 proprio obsernador. Essas * decidie sobre o grupo de sujcitos a observar; observagdes devem, assim, refletir os elementos observados ¢ aquilo que o observador compreende dos eventos estudados. Por outro lado, o individuo estudado no pode ser visto isoladamente, mas em interagio com * observar € registrar notas de campo durante ogmupo a qual pertence —— semanas (ou um periodo mais longo, conforme a a natureza do estudo); |» legitimar sua presenga junto ao grupo a observar; * obter confianga dos sujeitos a observar; Sem a ocorréncia de interagdes nada se consegue saber efetivamente sobte os observados. As notas de * gerenciar possiveis crises que possam ocorrer campo, desse modo, deve preservar a seqiiéncia em | entre os sujeitos ¢ 0 observador; que essas interagdes ocorrem. Isso exige, portanto, + saber retirar-se do campo de observagio; que as anotagdes sejam feitas imediatamente, na atatisnrioe dladoe medida do possivel. Evita-se, assim, escrever com base \ exclusivamente na memoria dos fatos, face & ocorréncia \ + elaborar um telatétio sobre os elementos obtidos. i de provaveis lapsos que prejudicariam de forma bastante efetiva o trabalho que esti sendo realizado. E. bom lembrar que muitos observadores, durante 0 ptocesso de observacio, fazem apenas simples anotagdes para mais tarde desenvolvé-las, detalhando os diferentes aspectos que foram observados'. Observacio: yutros pontos a considerar O estabelecimento das relacdes em estudos observacionais ¢ uma das mais complexas e dificeis tarefas de se concretizar, podendo, em alguns casos, - aptesentar um cardter traumatico, dependendo da abordagem e do relacionamento estabelecido com os sujeitos observados. E extremamente problemitico para 0 observador, especialmente na fase inicial do processo, compreender, de forma completa, a linguagem, os costumes € até mesmo os habitos das pessoas sob observacio, especialmente em funcio da especificidade do grupo. Hi possibilidade de observar normas de ‘As notas de campo devem relatar 0 maximo de observagdes possiveis no dia-a-dia, ou seja, aguilo que ocorreu, quando ocorren, em relagio a que ou a quem esté ocotrendo, quem disse, « que foi dito e que mudangas ocorreram no contexto, segundo nota Bailey (1994). * Seria interessante que os iniciantes na metodologia da observacio lessem dois livros fundamentais para a dominio da pritica da conduta prevalecentes no grupo, que nem sempre sio observagio: o Dri de Bronislav Malinowski eos Dizrias Indias de as do observador, ctiando-se, assim, uma certa situacio Datei Ribeiro, fim de observa técnica de registro de dados entre de conflito entre 0 grupo observado e 0 observador. ‘outros aspectos. 30 31 EB necessario que as observagdes sejam concretas, devendo 0 observador evitar 0 emprego de palavras abstratas ou sujeitas a miltiplas interpretacdes, Ele deve manter-se no nivel mais baixo de interferéncia junto a0 grupo observado, evitando julgamentos finais, conclusivos sobre o que esté sendo objeto de observacio. Lofland (1971) relaciona os cinco elementos fundamentais que devem constar de notas de campo: i) breves descricdes de ocorréncias; ii) elementos esquecidos e que depois voltam 4 lembranca; iii) idéias analiticas e inferéncias; iv) impresses e sentimentos; ¢ ¥) notas para futuras informagées, Alguns detalhes podem ser esquecidos no afi de escrever observagdes que foram julgadas importantes no momento, mas observacées esquecidas costumam_ voltar 4 lembranga , muitas vezes, se revelam de importéncia & luz de novos eventos. As idéias analiticas, € inferéncias sao do observador a respeito de certos detalhes, como, por exemplo, as coisas mais importantes que foram observadas, a orgaitizagio e classificagio dos dados, ou seja, qualquer idéia sobre a andlise dos dados, assim como possiveis especulagdes sobre a importincia de determinados fatores. Tudo deve ser registrado, mesmo que séjam idéias sobre possiveis fururas observagdes. As idéias, diz Bailey (1994), mesmo que fo momento parecam sem maior importincia, devem ser anotadas, pois podem, mais tarde, facilitar a interpretagio de parte ou da totalidade dos dados. A observacio demanda um periodo mais longo de contato entre 0 observador 0 observado, gerando, em conseqiiéncia, um relacionamento emocional (amizade, simpatia, etc. e mesmo emogées negativas) que pode facilitar, ou dificultar, uma melhor compreensio do observado. 32 Contudo, é necessitio que o observador tenha em mente que, por outro lado, as emogdes, se descontroladas, podem ter um efeito que compromete a anilise dos dados levantados durante a observacio, concluindo-se, dessa forma, que os sentimentos e as emogdes devem ser registrados ¢ analisados. © observador, como participante no evento, nto € apenas um pesquisador. Ele proprio € sujeito da pesquisa; assim, seus sentimentos e emoces constituem, também dados. Além disso, o pesquisador pode estudar suas emogdes ¢ reagdes, como fonte de viés, ¢ analisar em que medida suas agdes foram influenciadas por seus sentimentos, importante que o observador anote o que resta por set feito: outras coisas ou pessoas a observar. As anotagdes em geral devem ser bastante completas € petmitir que mais tarde possam ser analisadas ou voltar a ser consideradas. As observacdes, quando adequada- mente tealizadas, sio um retrato vivo" da realidade estudada. Uma adverténcia deve, entretanto, ser feita: quase sempre ocotrem crises e confrontos entre-o ‘observador e 0(s) observado(s). B freqiiente ocorrer © fato de muitas pessoas considerarem algumas observa- Bes como uma critica, fato esse que costuma gerar uma atitude hostil em telacio ao observador, nos vatios niveis da hicrarquia do grupo ou da instituicio observada. A anilise dos dados ¢ a elaboragio dos relatérios slo fases importantes do processo de observagao. Se houve medidas realizadas — é bom que seja destacado, seguindo a licdo de Bailey (1994) — elas so de natureza nominal. A escala nominal em alguns casos pode ser tepresentada por mimeros (sala 12, sala 14, etc.), mas, essencialmente, esses mimeros sio uma escala de classificagao e nao uma quantificacio estrita. Biaecado Campus Cans ACCA nsw Feel Camiseese = 33, ‘Uma varidvel nominal apresenta, no minimo, duas, categorias ¢ nao é, na realidade, uma varidvel. As categorias antes teferidas devem ser distintas, ‘mutuamente exclusivas e exaustivas. Ou seja, hé uma categoria aproptiada para cada caso que esti sendo observado/medido (VIANNA, 1989). © fato de ser mutuamente exclusiva significa que cada caso estudado se agrega a uma e a somente uma categoria. Assim, cada caso deve ter uma categoria (exaustividade), mas somente uma categoria (miitua exclusividade) em que claramente se ajusta. Sexo ou género, masculino ou feminino, constituem uma dicotomia e possuem todas as catacteristicas anterior- mente apontadas, sendo, pois, um exemplo esclarecedot. As melhores variéveis qualitativas ou nominais, no dizer de Bailey (1994), sio as que possuem categorias distintas ¢ no admitem situagoes marginais; no entanto, na pritica ocorrem situagdes em que isto nem sempre possivel. ‘As medidas nominais habitualmente sio descritas usando-se rétulos, nomes ou termos descritivos, ao invés de mimetos, como anteriormente acentuado, A maior parte dos pesquisadores analisa seus dados construindo conjuntos de categorias nominais aplicadas as pessoas, de modo que possam delinear aspectos significativos dos observados, ‘As categotias podem ser crindas a partir dos nomes usados pelo préprio observador para identificar as, pessoas, ou podem resultar de alguns conceitos cientificos relacionados com o trabalho ou com as variiveis pesquisadas, Alguns conjuntos de categorias, por sua vvez, ¢ com base em mais de uma variével ou dithensio, podem, em alguns casos, constituir tipologias, conforme Bailey (1994), 34 Observacao: vantagens ¢ desvantagens ‘A observacio, como qualquer tipo de metodo- logia cientifica, possui vantagens e desvantagens, como mostraram Bailey (1994) e Patton (1997), sendo necessitio que 0 observador, como cientista social, conheca algumas das suas principais vantagens e possa evitar 0 seu uso quando a situaglo niio for adequada ao emprtego da metodologia. A grande vantagem da observacio, ressaltam Selltiz et al. (1967), consiste no registro do comportamento no ato € no momento da sua ocorréncia, Comecaremos a apomtar, assim, algumas de suas vantagens: 1) A observacio é indiscutivelmente superior pesquisa de survey, experimentagio ou estudos de documentagao para fins de coletar dados sobre um comportamento nao-verbal. O survey mostea-se supetior a observacio a fim de descobrit a opiniio de uma pessoa sobre certa controvérsia, Se o pesquisador fizer perguntas sobre 0 comportamento de uma pessoa, encontrar intimeras dificuldades, inclusive a negacio sobre 0 comportamento ou o esquecimento a respeito do mesmo, observador pode identificar comportamentos ‘i medida que eles ocottem; pode registrar em seu didtio de campo aspectos relevantes dos comportamentos, ou registri-los na sua totalidade, usando, para esse fim, videotapes. Na pesquisa de survey, os dados sobre comportamentos so secundatios ou obtidos em segunda mio, salvo quando os comportamentos ocorrem no momento da aplicacio. O método da observagao possibilita a realizagio de estudos com maior profundidade do conjunto dos individuos, a0 contritio, por exemplo, dos questionstios ‘no survey que € um instrumento limitado pelo seu attificialismo ¢ seu aspecto restritive em relacio a um nimero de questdes previamente selecionadas. As técnicas de observagio fornecem dados que se teferem diretamente a situagdes sociais/comporta: ‘mentais tipicas, segundo Selltiz et al. (1967), e sempre que se acreditar que diferentes fatores possam interferir nos dados, a observagio do fendmeno em estudo deve ser a metodologia ¢ a técnica indicadas. Além do mais, © método observacional é, mnitas vezes, usado como um estudo preliminar, com o objetivo de descobrit as caracteristicas a serem pesquisadas, inclusive de comportamentos que os proptios sujeitos desconhecem. A observagio, particularmente a nio-estruturada, € uma técnica bastante flexivel que possibilita ao pesquisador fixat-se em fatores que julgue importantes ata o objetivo do seu trabalho. O método da observacio nao apresenta a formalidade do survey, em que o aplicador tem um contato répido ¢ superficial com 0 sujeito durante a entrevista. No entanto, no caso da observacio, as relagdes com 0s sujeitos sto mais longas, mais informais e possibilitam maior interacio. As telagdes na observacio séo primétias, enquanto que no survey so secundétias. A observacio, no caso considerado, pode, entre tanto, perder a sua objetividade, quando influenciada pela intimidade entre 0 observador e 08 sujeitos estu- dados, ficando a observacio de certos tragos prejudi- cada pela emocionalidade envolvida entre as partes. 2) O fato de 0 comportamento ocorrer em um ‘meio natural constitui,indiscutivelmente, uma vantagem, sendo a observacio menos teativa que outras técnicas usadas na coleta de dados, conforme ja destacado. 36 O experimento depende grandemente de um meio controlado, O survg, a partir de sua dependéncia de respostas verbais a um certo mtimero de questées, pode determinar 0 viés dos dados que o pesquisador pretende estudar. Dessa forma, como conseqtiéncia, os dados podem ser 0 produto do método emptegado, e nio a medida de uma realidade empirica existente. Assim, a observacio nfio é to restritiva nem to artificial como © survey € 0 experimento, Contudo, a presenca de um estranho (0 ebservador) € os vieses envolvidos na observagio humana e no registro dos dados constituem uma teal possibilidade de falseamento desses dados. A observacao passa a constituir uma destreza do observador, que conseguiré registrar a ocorréncia de certos elementos, que nem, sempre so percebidos pelos préprios integrantes do grupo observado, como acontece, por exemplo, nos estudos de cientistas que se dedicaram & anilise de outras, culturas, como Bronislaw Malinovski, Radcliff:Brown, Franz Boas, Margareth Mead, Ruth Benedict outros mais, inclusive antropélogos e socidlogos brasileiros, empenhados em observar diferentes tragos culturais em diversos contextos. 3) Ao contratio do que ocorre na entrevista e 20 experimento, o observador pode fazer o seu estudo no meio natural dos sujeitos observados € desenvolver 0 seu trabalho 20 longo do periodo de tempo necessario, As vantagens da observagio sao de certa forma ébvias. Por exemplo, o respondente de um survey pode ter esquecido um fato distante no passado, enquanto que o observador estuda eventos 4 medida que eles ocorrem ¢ pode observar mais longamente os acontecimentos e determinar com maior facilidade as suas tendéncias.” 37 E preciso salientar também, como fazem Selltiz et al. (1967), que muitas vezes 0 observador trata com. sujeitos que nao sio capazes de verbalizar os seus comportamentos ou os prdprios sentimentos, como foi destacado anteriormente, pelo simples fato de que ainda ‘ao tém 0 completo dominio da linguagem, como no aso especifico das criangas, nas suas primeiras fases de desenvolvimento, Acteditamos que a sintese apresentada tenha deixado perfeitamente bem claro quais sio as vantagens de um estudo baseado na metodologia da observagio. Entretanto, ainda seguindo a linha anterior de Bailey (1994), necessitio se faz que dessa mesma metodologia sejam conhecidas algumas desvantagens: 1) Ainda que se tenha ressaltado as vantagens do meio natural sobre 0 contexto artificial do laboratério, somos forcados a admitir que estudos em ambiente natural, apesar de apresentarem aspectos Positivos, nem sempre permitem que o observador controle certas variiveis irtelevantes para a situagio ¢ que podem afetar os dados. 2) A medida em estudos de observagio refere- se as percepgdes do observador e nada tém a ver com medidas quantitativas obtidas em uma pesquisa de survwy © em experimentacio. Ao invés de construir escalas numéticas, 0 observador esti mais interessado em ; observar um evento e registrar o que realmente ocotte. Ao término do estudo, tera registros de comportamentos ¢ fatos € nao escores a respeito dos sujeitos. Isso nio significa que os dados nio possam set quantificados ‘em observagdes, mas ficam limitados a freqiiéncias ¢ Percentuais. (Isso, realmente, é um problema nos estudos qualitativos? Nao é exatamente isso que se busca com a observagio2) 38 Uma visio histética do problema mostra que, inicialmente, ndo havia grande preocupacio com a quantificagio dos dados das observacdes, especialmente pot parte dos primeios antropdlogos, comportamento esse que, aos poucos, se foi modificando, sem que isso signifique, entretanto, que todos os dados de observa- Ges devam ser imperativamente quantficados, como acentuam Seltz et al. (1967). Ao coatrisio, a quantifi cacio deve ser utilizada por uma necessidade estrita em telagio ao problema e & forma de colocagio do mesmo. As observagées oferecem uma grande quantidade de dados, e quando se quer codificar ou classificar de uma forma sistemética, dificuldades aparecem. O observador vé-se com centenas e mesmo milhares de piginas de registro descrevendo 0 que aconteceu no dia-a-dia, mas que no sio passiveis de sistematizar ¢ categorizar de forma a petmitirem conclusdes relacionadas 4s hipéteses do seu estudo. Comparando-se com 0 survey, 0 observador costuma set dos que privilegiam dados nio-quantitaivos, concentrando-se no emocional e no humanistico, tendo uma relagio desse tipo com os sujcitos observados. Realiza andlises subjetivas, segundo algum ponto de vista, e anota seus dados por esctito. Ao final, 0s dados sio registros de lembrangas e nao de nimeros. 3) Os estudos observacionais tendem a usar amostras menores que no surwy e, As vezes, amostras mais amplas que nos expetimentos. Sob um ponto de vista meramente teérico, na observagio poderiam set feitas milhares ¢ até mesmo milhdes de observacées, se houver observadores em niimero suficiente. Entretanto, considerando a natureza dos estudos de obscrvacio, com dados na maioria das vezes subjetivos e dificeis de quantificar, duas ou mais observagdes por 39 diferentes observadores setiam de dificil comparacio ¢ nao seria facil verificar a sua fidedignidade em observagées nao-estruturadas, Além disso, os estudos de observagio devem ser realizados em tempo mais longo que 0 survey e os expetimentos, que se limitam a um par de horas de duracio. Sob uma certa ética, um estudo observacional longo, pot sua vez, pode perder em confiabilidade, o mesmo ocorrendo quando muitos observadores sio utilizados na tarefa. 4) Muitos estudos de observacio sio feitos no meio natural e freqiientemente 0 observador encontra dificuldade para realizé-los, especialmente quando envolvem érgios governamentais, e mesmo no caso de algumas instituigdes privadas que estabelecem testtigdes, como fotografar, tomar notas, gravar ¢ outras formas de registro. O observador, em algumas citcunstincias, é visto como suspeito, e limitagdes sio impostas aos seus procedimentos, ainda que tenha obtido autorizagio para sua aco cientifica, a partir de niveis hierirquicos superiores, A metodologia da observacao, com as suas vantagens € desvantagens, possui, no entanto, uma limitagdo centrada na reatividade do observador, muitas vezes dificil de controlar, especialmente na observacio Patticipativa em que uma reacio suti, como um simples balangar de cabeca ou um leve murmirio, pode determinar mudangas no comportamento objeto da~ Pesquisa (GRAZIANO & RAULIN, 2000), Observador: seu papel e algumas questes ‘Queremos chamar a atencao para a problematica do obiereador€ sew papel, assim como enfocar a questio do que observar. 40 Uma das principais questdes da metodologia da observacio est em definir, de uma forma bastante clara, 0 papel do observador € 0 que o possibilita permanecer numa certa area e fazer observagées. Ou. seja, como mostra Flick (1999), 0 observador deve encontrar um campo especifico de interesse, observar © fluxo de eventos sem influenciar demasiadamente nos mesmos, ¢ sem se tornar ctimplice dos fatos observados ‘ou promover distorcdes nos eventos. A discussio sobre observagio nio-participante ¢ observagio participante examinari essa questiio segundo as duas colocagées, ambas igualmente possfveis em pesquisas. E fundamental a integragio do observador com © conhecimento do campo a ser observado, porquanto 2 ocorréncia de algum descuido pode comprometer 0 processo de observacio. Na observacio, nem sempre € possivel a substituigo dos elementos integrantes do grupo, ¢ uma abordagem equivocada pode determinar conseqiiéncias dificeis de serem superadas. A observacio ocorte no Ambito de um contexto que expressa realidades entre pessoas que agem, se comunicam e interagem com os demais membros do grupo, observando uns aos outros € ao préptio observador. Assim, se um observa um grupo e dele participa, estaré sendo simultaneamente observado comentado pelos integrantes do grupo, objeto de estudo, E importante, desse modo, que o observador se apresente aos elementos do grupo ¢ declare os objetivos do seu trabalho sem maiores disfarces, evitando que seja considerado um “estranho no ninho”. A identificagio do pesquisador é uma das muitas questées éticas ligadas as atividades de pesquisa. Entretanto, em ocasides éspecialissimas, 0 anonimato do pesquisador pode ser uma imposicio, tendo em vista, a natureza do problema e da observacio a set realizada. a1 A fim de aumentar a expressividade dos dados levantados, é recomendével que 0 observador faga uma triangulacao da observacio com dados de outras fontes € com os dados coletados por outros pesquisadores. As diferengas de género, note-se, muitas vezes tepresentam lum aspecto crucial. As mulheres tendem a set mais sensitivas em relagio a certos aspectos observados; ‘assim, em grupos de observacao, de acordo com Flick (1999), & recomendavel a inclusio de ambos os sexos. Outra sugestio da mesma pesquisadora refere-se 4 auto- avaliagio do pesquisador ao participar de um trabalho de campo. © fato de que alguém perceba que est sendo observado por outra pessoa ou por instrumentos (camara ou gravadores, por exemplo) afeta a maneira como habitualmente se comporta em detetminada situacio, registra Wilkinson (1995). Ocorre, assim, 0 chamado efeito do observador (ou reatividade). Esse efcito traduz-se por um comprometimento na validade dos dados. E necessitio, portanto, tomar cautclas quando se pretende usar uma metodologia observacional em Pesquisa, existindo, para essa finalidade, meios que possibilitam minimizar os efeitos da reatividade. A presenga do observador ou de equipamentos pode ser atenuada, ocultando-se o instrumental 0 Proprio observadot. Se essa solucio nio for vidvel, Procura-se fazer com que 0 acompanhamento do observador desperte um minimo de atracio dos observados e que a sua presenca passe a set parte do dia-a-dia do meio observado. Os sujeitos observados, em principio, quando sabem que estio sendo observados e com que finalidade, costumam se portar diferentemente, com ‘menos naturalidade. Diga-se, entretanto, que os sujeitos 42 devem saber que esto sendo observados, mas podem nao ter conhecimento dos momentos em que a observacio ocorre, em alguns casos. ‘A reatividade niio modifica apenas 0 comporta~ mento dos observados, afeta, igualmente, 0 préprio observador que desenvolve um novo tipo de vis, 0 viés do observador. O fato de o observador estar comprometido intelectual e emocionalmente com o seu projeto, a ponto de influenciar demais suas percepodes, acentua Wilkinson (1995), pode fazer com que via certas ocorréncias que comprovam suas hipéteses, deixando, igualmente, de ver eventos que as contrariam. © observador nem sempre Se apercebe dessa situagio, especialmente no caso de classificagio de aspectos qualitativos que devem ser interpretados por ele proprio. O vids do obsersador compromete a validade do estudo e prejudica a confiabilidade dos dados, impondo-se, dessa forma, a minimizagio desses efeitos. Uma forma de atenuar a influéncia do viés do obsertador consistiria em obter 2 colaboracio de alguém ‘que nao tivesse um conhecimento do projeto em todos os seus detalhes, que desconhecesse, por exemplo, as hipéteses formuladas e nao tivesse amplas informagdes sobre os objetivos do mesmo, para que essa pessoa participasse de alguns momentos do projeto como, observador cego. A partit dos registros em videos também se pode controlar niér do observadorcom maior grau de confianga. Em casos de uso de instrumentos de observacio, estruturados, a concordancia entre varios observadores pode ser calculada usando coeficientes de cortelagio, adequados para dados em uma escala nominal. E necessario considerar que, quando os observa- dores sabem que esse tipo de procedimento vai ser 43 utilizado para célculo da confiabilidade dos dados, eles tendem, geralmente, a aptesentar niveis altos de concordincia, em oposigio ao que ocorre quando Jgnoram esses procedimentos. No caso de classificagées, é preferivel usar observadores independentes ou fazer ‘um painel de trés pessoas, procedimentos esses que podem atenuar a influéncia dos vieses culturais ou ligados ao género, entre outros. Para isso, € preciso que material tenha sido geavado. Outro tipo de comprometimento da confiabilidade dos dados observacionais decorte de compreensiveis limitagdes dos proprios pesquisadores: cansaco, preocupacées, tédio ¢ outras mais. Isso pode ser atenuado, como no caso anteriormente apresentado, «quando existem dados gravados que podem set revistos em diferentes momentos. E necessiirio, pois, 2 adogao de cautelas ligadas a0 cansago, & atengio, & capacidade de concentragio ¢ ao grau de experiéncia da pessoa em realizar observacdes. Wilkinson (1995) ressalta a necessidade do interesse do proprio observador no ptojeto para obter dados de boa qualidade. ‘A observacio, em que pese 0 fato de ser uma das caracteristicas fundamentais de qualquer atividade cientifica, possui suas limitagdes. E impossivel observar a tudo, Assim, 0 que observar — situacdes, ocorréncias, comportamentos ou ages — depende, naturalmente, como observa Wilkinson (1995), do problema a ser investigado ou do objeto em estudo. Os dados coletados devem ser obtigatoriamente reduzidos de forma que possam ser analisados, podendo-se, para esse fim, reduzir os dados a categotias analiticas, ou a uma classificacio, a posicionamentos, a medidas de duracio (tempo de ocotréncia) ou a freqiéncia de comporta- mentos ou eventos. 44 [As estruturagdes do material coletado podem set feitas no momento da observacio original ¢ os dados registrados de forma pré-codificada (abordagem comportamental padrio), ou durante o proprio trabalho de campo, sendo mais tarde desenvolvidas e refinadas (abordagem ecologica e etnografica). Os dados também podem ser coletados a partir de telatos natrativos escritos de natureza nao-avaliativa (abordagem etol6gica). Os -vasios registros podem ser feitos utilizando-se audio, tapes, e videotapes, com transcricdes para anilises posteriores. Pata maiores esclarecimentos, a etologia é uma abordagem bastante diferente da observacio, sendo uma atividade interdisciplinar, envolverido antropologia, ctnografia, psicologia biologia, entre outras teas cientificas, no estudo do comportamento humano em ambiente natural. A abordagem etolégica caracteriza- se por uma metodologia particular de observacio direta com o objetivo de registrar comportamentos de uma forma completa ¢ imparcial em todos os seus detalhes, correlacionando-os com estimulos que os determinam. Nenhuma avaliagio é feita nem sao feitas interferéncias sobre motivagées, intencdes ou emogdes dos sujeitos observados. A finalidade é realizar um etograma que, completo, sera usado pata a formulagio de hipéteses que servitio de base para um expetimento ou anilise de procedimentos a adotar em relagio aos sujeitos. Graziano & Raulin (2000) destacam o problema do emprego de miltiplos observadores em que surge a questio da objetividade, ou seja, da consisténcia dos varios registros, havendo necessidade de controle dos mesmos ¢ de se determinar um coeficiente de fidedignidade entre juizes ou um indice do percentual de concordincia, Esses autores apresentam detalhes sobre estatisticas, inclusive sobre o indice Kapa. 45 Observagio e tipos de abordagem importante considerar, numa primeira visio mais geral, diferentes tipos de abordagem direta na coleta de informagées por intermédio da observasio, destacando-se, inicialmente, a abordagem sistemitica ea observagio ecolégica, ¢ fazendo mencio Aabordagem etnogrifica ¢ a etolégica, segundo Wilkinson (1995), Na observagio sistemdtica adotam-se procedimentos padronizados para obter os dados, que podem ser ‘considerados como sendo uma extensio da teoria e dos métodos de medidas. O pesquisador deve definir categorias € unidades de comportamentos a serem observados e estabelecer meios de mensuri-los (tempo, tabulacio/contagem ou pontuacio) Isso exige, como bem acentua Wilkinson (1995), um periodo de observacio informal, no seu quadro natural, mas niio demanda um registro detalhado das informagdes. Essa obsetvacio informal fornece elementos para a montagem de um instrumento estruturado de observacio. Diferentes tipos de observagio sistematica podem set analisados no trabalho de Croll (1986), por exemplo. Tal observagio € possivel também na area chamada de ecologia educacional, que se propde a descrever analisar o sistema de vida dos sujeitos no meio natural, apresentando comentarios detalhados das virias atividades e estimulos com que os sujeitos entram em. contato. O relatério, nesse caso, no é meramente descritivo, Deve revelar a preocupacio do pesquisador em fazer inferéncia sobre atitudes, motivos ¢ intengdes dos sujeitos objetos da observacio. Os extudos einogrifts ox estados de campo cons- tituem os menos estruturados dos tipos de observacio, ow simplesmente apresentam uma estruturagio bem reduzida em relagio a0 meio usado pelo observador. 46 Eles ocorrem em um contexto natural e, na maioria das vezes, emprega-se uma observacio participante. © estudo etnogrifico tem por principal objetivo descrever uma determinada cultura, entendida no seu sentido sociolégico. Apesar de se interessar, na sua ofigem, apenas por culturas primitivas, atualmente vem sendo usado em estudos complexos para 0 conhecimento de subgrupos especificos, como, por exemplo, a escola, grupos de adolescentes, segmentos ctérios em geral, como os idosos, entre outros. Sendo objetivo do etnélogo observar para descrever ¢ estudar determinadas culturas, geralmente, como pesquisador, tem algumas hipéteses predefinidas endo usa um questionério estruturado. A preocupagio maior em um estudo etnologico consiste em descrever a cultura ou sub-cultura de uma forma bem detalhada, incluindo o maior niimero possivel de tracos observados ‘A observacdo é quase sempre do tipo participante, quando possivel no estudo de campo, o que implica processo de re-socializacio do observador, segundo Bailey (1994), a fim de se tornar parte do contexto e descrever com maior fidelidade a cultura observada. A e-socializacio nunca €absoluta. O observador é sempre alguém de fora, um outsider; que no pode ignorar os seus préprios valores, entre outros tracos culturais, € nem consegue se identificar inteiramente com 0 grupo, que muitas vezes nio o aceitari como membro da cultura, salvo em casos excepcionais. Observacio naturalista € observagio participante Queremos, neste ponto do trabalho, apresentar breves consideragdes sobre quatro tipos de observacio: 47 ‘a causal, a formal, a naturalista e a participante, sendo {que 0s dois tltimos tipos sero considerados com maior aprofundamento, tendo em vista sua grande utilizagio em pesquisa em educagio. “A observacio de uma situagio, em que os sentidos (visio e audigio) e 0 espirito estio em alerta, pode oferecer valiosos insights e informagdes indispensiveis para a coleta de dados significativos em momentos subseqiientes do trabalho (WILKINSON, 1995). ‘A observacio casual é bastante titil na tomada de decisées sobre a melhor situacio para fazer uma observacio ¢ de desenvolver diferentes tipos de categorias necessarias a uma observacao sistemitica. Bi recomendiavel fazer anotagdes sobre observagdes casuais, pois as impressGes iniciais sio geralmente as ‘mais vivas e mais titeis quando imediatamente registradas. ‘A observagio formal é a aplicagio estruturada e sistemética de um conjunto de procedimentos para tealizé-la ou coletar dados geralmente de uma tinica abordagem ou de uma combinagio de abordagens (sistematica, etoldgica, ecolégica, etnogrifica). Geralmente envolve um observador w-intrusive que faz, observacdes de campo ¢/ou registra tempo, conta ou classifica comportamentos ou eventos, Algumas vezes, ‘uma cimara de video pode substituir 0 observador ¢ 0 video seri mais tarde analisado por intermédio de um instrumento-padrio. ‘A observagio naturalista é feita no ambiente natural, como diz 0 seu proprio nome, nio procura manipular, modificar ou mesmo limita 0 meio ou os comportamentos dos patticipantes. Ha observagio registro do que efetivamente ocorre. Fraenkel & Wallen (1996) chamam a atengio pata 0s trabalhos realizados pelo grande epistemdlogo 48 genético, Jean Piaget, que resultaram, em grande parte, da observagio naturalista, As vezes envolvendo seus proprios filhos. A partir da observagio naturalista so estruturados, muitas vezes, expetimentos mais formais, ‘As tinicas limitagdes sio aquelas que 0 préprio observador procura estabelecer para fins de levar a cabo a sua tarefa, envolvendo procedimentos bastante detalhados e precisos. Exemplos clissicos de observacio naruralista sio 08 estudos tealizados por Jane Goodwall sobre os comportamentos de chimpanzés; os de Dian Fossey sobre 0s gorilas das montanhas do Tanganica (Africa) 08 histéticos estudos observacionais de Chatles Darwin sobre crianga (seu neto). Graziano & Raulin (2000) destacam que um cestudo dessa natureza é itil, sempre que se inicia uma investigagio em uma rea sobre a qual pouco ou nada se sabe € se deseja familiarizar com as caracteristicas do contexto ambiental ou dos elementos participantes. Um estudo naturalista também se impde quando temos um tinico individuo, grupo ou um conjunto de acontecimentos € as indagacées sio inteiramente direcionadas e especificas para a pessoa, ambientes ¢ eventos. Além disso, um estudo naturalista também nos permite, entre outros aspectos, descobrir certas contingéncias (algo que tem possibilidade de acontecer ‘no futuro) que poderiam servir de base para estudo de ‘questées ou pesquisas mais complexas. A coleta de dados, na observagio em campo, pode set também feita por um observador participante, que, tendo em vista a sua condicio, passa a ser parte integrante da situagio € até mesmo contribui para que essa situagio ocorra, mas, ao ser participante, a observagio, conseqiientemente, deixa de ser naturalista. 49 ‘Uma das vantagens da observacio participante é a de que, com seu proprio comportamento, é possivel, ao pesquisador testar hipéteses por intermédio da cringio de situagdes que normalmente aio ocorreriam. Os estudos de caso usam com bastante freqiiéncia a observacdo participante. ‘A observaciio participante, como o proprio nome indica, difere da observacao casual e da formal, pois nesse tipo de observagio o observador € parte dos eventos que estio sendo pesquisados. Esse tipo de observagio apresenta algumas vantagens, como mostra Wilkinson (1995): i) possibilita a entrada a determinados acontecimentos que setiam privativos € aos quais um observador estranho nio teria acesso aos mesmos; petmite a observagio nao apenas de comportamentos, mas também de atitudes, opinies, sentimentos, além de superar a problemitica do efeito do observador. ‘A principal critica, geralmente feita, reside na impossibilidade de 0 observador patticipante ser inteiramente objetivo, face a flutuagdes de sua atencio ‘em diferentes momentos. Além disso, problemas éticos podem ser suscitados pelo duplo papel do observador- pesquisador, gerando, assim, conflitos de fungdes. Houve quem dissesse que a expresso “observagio participante” seria um paradoxismo, por reunir palavras com significados opostos e conflitivos. Assim, como 6 possivel alguém “observar” e, a0 mesmo tempo, “participar”? ‘Alguns chegam a duvidar de que a observagio participante seja efetivamente uma metodologia cientifica (BOGDEWIC, 1999). Entretanto, se ponderarmos adequadamente, veremos que ao alub da observagao participante pettence uma ampla gama de exptessivos cientistas sociais. 50 As taizes da observagao participante estio em uma das obras fundamentais de Bronislav Malinowski — Argonautas do Pacfco Ocidental, 1961, em que analisa aspectos da cultura dos habitantes das ilhas ‘Trobiand. Entretanto, é possivel recuar no tempo e encontrar a observacio participante no livro de E. C. Lindemann Social Discovery, 1924, em que procura analisar a diferenca entre os que procuram estudar uma cultura a partir de “fora”, via entrevista e outras técnicas, os que estudam essa mesma cultura usando a observacio participante, que possibilita o conhecimento da cultura 2 partir de “dentro”. © objetivo final de uma observagio participante é, dessa forma, como acentua Bogdewic (1999), gerar verdades priticas ¢ teéricas sobre a cultura humana com apoio nas realidades da vida didria. A observagio participante, na visio de Flick (1999), éfreqtientemente usada em pesquisas qualitativas, E uma atividade que simultaneamente combina anilise documental, entrevistas com respondentes ¢ informantes, participacao diteta, observacio e introspecgio. O principal aspecto do método, acrescentando ao anteriormente ja assinalado, € que o pesquisador mergulha no campo, observa segundo a perspectiva de um membro integrante da acio e também influencia o que observa gracas 4 sua patticipacio. As diferencas em relagio a uma obsetvacio nio-participante € que os objetivos ficam mais densos, como os adiante relacionados por Jorgensen (1989): * interesse no significado do humano e na interagao com pessoas em situacdes e contextos particulares; 51 + integracio ao aqui ¢ agora das situages da vida didria como fundamento da pesquisa ¢ do método; + forma de teoria com énfase na interpretagio ¢ comprcensio da existéncia humana; + légica € proceso de pesquisa aberto, flexivel, ‘oportunistico e que requer constante redefini¢io do que é problemitico, com base em fatos coletados em situagdes da existéncia humana; + abordagem de estudo de caso ¢ planejamento, anilise profunda e qualitativa; + desempenho do papel (ou papéis) de um participante que envolve o estabelecimento de relacdes com as pessoas da dtea a observar; € * uso da observacao direta juntamente com outros métodos de obtencio de informagGes. A observacao participante deve set entendida como um proceso: 0 pesquisador deve set cada vez mais um patticipante e obter acesso ao campo de atuagio € As pessoas. A observagio deve, aos poucos, se tornar cada vez mais concreta ¢ centrada em aspectos que sio essenciais para responder as questdes da pesquisa. Assim, conforme a perspectiva de Spradley (1980), a observacio participante distingue tés fase * observacao descritiva — 0 observador adapta- se ao campo de estudo e faz descrigées niio- especificas, que se destinam a dat uma idéia geral da complexidade do campo de estudo ¢ a desenvolver, simultaneamente, perguntas concretas para a pesquisa, abrindo novas perspectivas para 0 trabalho; 52 * observacio centrada — a perspectiva se estreita em relacio ao processo e aos problemas mais essenciais para as questdes da pesquisa; e + observaciio seletiva ~ a0 se aproximar o fim da pesquisa, a coleta de dados centra-se em novas questdes ¢ exemplos para os tipos de priticas € processos encontridos na segunda fase da observagio. A maior dificuldade, ainda, segundo Spradley (1980), esté em como delimitar agdes observacionais pata que o problema a estudar se torne visivel. Algumas dimensdes precisam ser consideradas: * espaco fisico (ou espacos); + pessoas envolvidas no proceso; conjunto de ages que apresentam relagio; + acdes isoladas feitas pelas pessoas; conjunto de atividades relacionadas que as pessoas executam; *+ seqiiéncias a0 longo do tempo; * coisas que as pessoas tentaram fazer; € + emogdes sentidas e expressas. O pesquisador, para fins de desenvolver politicas de concretizagio de observagdes participantes, e depois verificara relacao entre os seus diferentes dados, precisa planejar vatias estratégias: + registros de arquivos; + observagio; + notas de campo; 53 + outras observacdes; + sumitios de observages; + desenhos associados as anotagdes de campo, se for 0 caso; * conversas e entrevistas informais; + entrevistas gravadas; € * outras conversas. E bom lembrar que, definidos 0 objeto ¢ o local de realizagao da observagio, o planejador da pesquisa deve verificar a factibilidade dessas estratégias, considerando que muitas vezes uma informagio, que seria obtida pela observacii, poderia ser conseguida com maior possibilidade de sucesso por meio de entrevistas, por exemplo. Assim, a escolha de virias estratégias implica a criagio de todo um processo de decisio que possa determinar a melhor mancira de obter dados tepresentar a realidade do objeto de consideracio. ‘A observacio a ser realizada em campo representa um trabalho bastante intenso e, por vezes, prolongado, podendo levar a novas opgbes de coleta de informagdes, fora da area de atuacao do pesquisador, como, por exemplo, no caso da observacio de um professor (observagao em sala de aula), que se altera quando 0 ‘mesmo passa a substituir, temporatiamente, 0 diretor da escola (observagio da acio administrativa). As vezes, a observacio deve ser feita a0 longo de todo um semestre ou de um ano letivo, durante um dia completo da semana, exigindo cautelas quanto coeréncia dessas informacées em todo o periodo de tempo. Outras vezes, ainda, € necessiirio considerar a freqiéncia (aimero de vezes) da atuacio € o total de horas exigidas para a realizagio da observacao. 54 ‘A observacio participante se complementa, ainda, com entrevistas formais, por exemplo, na escola, gravadas com professores isoladamente ou com todo 0 corpo docente, envolvendo também os pais ¢ elementos da diretoria, ou entrevistas informais com o diretor, 0 corpo docente ¢ os pais, além de outras observagdes fora da escola e a revisio da documentagio porventura existente ¢ relacionada ao objeto da pesquisa. ‘A observagao participante, como acentuam MeMillan & Schumacher (2001), possibilita ao pesquisador obter as percepgdes das pessoas e expresses por intermédio de sentimentos, pensamentos € crencas. E importante, desse modo, que o pesquisador tenha o dominio dos padrdes lingiifsticos ¢ das variacdes da linguagem dos individuos observados, a fim de poder registrar com fidedignidade os elementos levantados € poder interagit com os individuos. Além das percepges apresentarem-se sob a forma verbal, temos também constragdes niio-verbais, como expressdes faciais, gestos, tom de voz, linguagem corporal e outros tipos de interacdo social que sugerem significados sutis da linguagem. Acrescente-se a esses elementos, 0 conhecimento ticito, que é pessoal ¢ intuitivo, dificilmente articulado pelos individuos, mas que pode ser demonstrado pelas ages dos mesmos. Além dos problemas referidos, o pesquisador precisa saber ouvir para, por intermédio das crencas expressas, dos pensamentos apresentados, dos sentimentos demonstrados ¢ dos valores revelados, compreender a ldgica subjacente aos contetidos das percepcdes. O observador, numa pesquisa participante, trabalha com milltiplas fontes de dados, decorrentes do uuso que faz de miiltiplos métodos (observacio, conversas casuais, entrevistas, documentos), miltiplos tipos de 35 participantes (secretatias de educacao, superinten- déncias ou delegacias de ensino, orientadores educacionais, especialistas em curriculo, diretores, professotes, entre outros) e virias situagdes (reunides de diversos tipos, oficinas de trabalho, vida em instituigdes, etc.). Desse modo, o observador participante, no desenvolvimento de um trabalho dessa, natureza, deve procurar identificar, conforme a énfase apresentada por McMillan & Schumacher (2001), entre outros elementos, os seguintes: + quem integra 0 grupo ~ quantas pessoas participam do grupo, caracteristicas que as identificam e razio de sua integracio 20 grupo; * oque acontece no grupo — o que fazem e dizem as pessoas; as atividades promovidas e como sao organizadas e justificadas; como as pessoas ‘no grupo se relacionam umas com as outras; como se otganizam (ou nfo); quais os diferentes papéis que ficam evidentes n0 grupo; quem toma as decisdes; qual o contetido das conversas; os assuntos mais freqiientes; a linguagem verbal empregada; as diferentes formas de comunicacio nao-verbal; as idéias emergentes nas conversas; quem fala ¢ quem ouve; o conhecimento ticito; ~ * onde se localiza o grupo — caracteristicas fisicass recursos utilizados, inclusive tecnolégicos; uso do espaco, ete; + quando © grupo se encontra € interage freqiiéncia e duragio dos grupos; como otganiza 0 seu tempo; como os patticipantes se posicionam em relagio a fatos passados e outros possiveis de acontecer no futuro; 56 + comoos clementos do grupo se inter-relacionam — estabilidade do grupo; modificacdes ocorridas; regras e normas de organizacio do grupo; relagdes com outros grupos, organizagbes e/ou instituicdes; + qual o significado atribuido pelos participantes as suas atividades e os seus valores e visdes de mundo possiveis de identificar no grupo. Ainda que a metodologia da observacio participativa tenha sido usada com freqiiéncia, sendo ‘empregada em estudos etnogrificos, estudos de caso € estudos fenomenolégicos, entre outros, 0 método possui, entretanto, as suas limitagdes. Assim, nem todos, os fendmenos podem ser observados. Por exemplo: alguns processos biogrificos sfo dificeis de observar; processos de conhecimentos compreensivos nao sio acessiveis & observagio; certos eventos ou priticas que raramente ocorrem, ainda que importantes para a pesquisa, salvo a possibilidade de sorte do observador, também apresentam dificuldades de observacio. Flick (1999) diz que, muitas vezes, para contornar os problemas, sio acrescentadas entrevistas ao programa de pesquisa, a fim de possibilitar a reconstrugio de processos biogrificos ou conjunto de conhecimentos resultantes de priticas que podem ser observadas. A observasio patticipante é uma técnica que exige bastante do pesquisador e nem sempre oferece os resultados que seriam desejados, lembra Bogdewic (1999). B uma metodologia que consome muito tempo ¢ energia ¢, ao final, os dados levantados nem sempre conduzem a uma interpretacio inteiramente satisfat6ria e titil, E bom lembrar que, para garantia de que os resultados sejam ricos e reflitam a esséncia do que foi 87 pesquisado, 0 observador deve possuir qualificacdes, como set uma pessoa aberta a diferentes possibilidades nem sempre imaginadas ¢ possuir capacidade de compreender a multiplicidade dos elementos que Ihe sho oferecidos no trabalho de campo. A observacio participante, resumindo, pode ser aberta— quando 0 observador € identificado os sujeitos sabem que estio sendo observados — ou cults, em que hi sigilo sobre a identidade do observador, que age como os demais sujeitos. A observagio aberta é um aspecto fundamental na pesquisa etnogréfica, A observacio oaulia, ainda que produza resultados vlidos, costuma set criticada sob 0 ponto de vista ético, tendo em vista que a observacio sem conhecimento das pessoas observadas é bastante questionivel, Observagio: registros, dados ¢ relatérios As observagées podem ser registradas em forma narrativa ou em gravadores (video ou audiotapes) e, subseqiientemente, transformadas em quadros interpretativos, classificagdes ou medidas dos vitios, elementos de um comportamento, no existindo um tipo ideal para registro dos dados observados (SELLTIZ, et al., 1967). O certo é que se escolha sempre 0 mais simples € 0 mais viével em termos econdmicos, “que geralmente acabam sendo 0 melhor. O observador, ao realizar uma observacio, precisa, inicialmente, indagar a si mesmo quando deve registrar os seus dados e como proceder para efetivar cesses registros, Selltiz et al. (1967) mostram que o melhor momento para o registro € no decorrer do acontecimento, pata evitar possfveis vieses seletivos deformagdes decorrentes de lapsos de meméria. 58 Hi situagdes que impedem o registro imediato, por quebrar a naturalidade da ocorséncia ou perturbar as pessoas envolvidas no ato da observacio. Além disso, € preciso considerar que o constante registro pode, em. muitos casos, contribuir para comprometer a qualidade da observacao, pois o observador, sem diivida, dividira as suas atengdes entre 0 ato de observar e o de registrar as suas percepcdes, perdendo, dessa forma, elementos que poderiam ser significativos para os objetivos do seu trabalho. © observador precisa desenvolver um método pessoal para fazer suas anotacdes, para nfo ser traido por sua meméria ¢, além disso, deve'fazer um registro de natureza narrativa de tudo que foi constatado no periodo de observacio. Os dados natrativos sio uma espécie de dado bruto que somente adquire sentido depois de transfor- mado em categorias, relacdes ou formas numéricas. O dado narrativo procura preservar, sob a forma escrita, as informagdes na seqiiéncia em que ocorreram e da mesma maneira em que, otiginalmente, aconteceram, objetivando, muitas vezes, pouco ou nenhuma interpretagio do seu contetido. Os observadores, na realidade, sempre promovem uma certa seletividade nas suas narragbes, pois nem sempre o que ocorre pode ser ov foi registrado (WILKINSON, 1995). Na opiniio de muitos pesquisadotes, algum tipo de interferéncia é necesséria para a interpretacio dos dados nartativos. A nacrativa é quase sempre usada para ofrecer a descricio de episédios que tém um principio, meio € fim. A questio é bastante complexa porque demanda uma definigio do nivel de inferéncia permitido na apresentagio escrita. Nao existe uma maneira tinica € correta de apresentar os relatérios, que, no entanto, 59 devem ser tio completos quanto possivel. Numa primeira etapa, € melhor apresentar 0 “mais” e nl o “menos”, pois, na fase posterior, quando se empreende a anilise dos dados, muitos elementos podetio ser descartados, por falta de utilidade para os objetivos do trabalho, mas, se forem rejeitados antes, podem causar lacunas de interpretacio. Patton (1997) destaca com bastante acuidade que 08 dados de uma pesquisa observacional devem desctever, inteita e cuidadosamente, o fendmeno observado, incluindo atividades ocorridas, pessoas participantes das atividades e o significado para essas pessoas daquilo que foi observado. As descrices devem set factuais, precisas e evitar minticias irrelevantes fatos triviais. E preciso oferecer ao leitor uma expetiéneia viedria da situagio que foi observada. Os relatérios dos dados obtidos devem ser objetivos e precisos. As vezes, ha interpretagdes sobre © que foi observado, devendo as mesmas, contudo, ‘metecer alguma forma de destaque, afirmando que se trata de uma ago pessoal do observador. Assinalar com aspas (“), indicando que é a visio de uma pessoa sobre © que ocorreu, a fim de nao distorcer anilises ¢ interptetagdes posteriores do pesquisador, quando de posse do conjunto das observagies e até de outros dados, tendo sobre eles trabalhado € refletido a luz de téoria. E igualmente importante que o relatério de observagio seja escrito logo apés o periodo de obsetvacio, diz Wilkinson (1995), quando notas podem ser acrescentadas sobre aspectos essenciais que possam tet ocottido, Escrever ¢ observar ao mesmo tempo, lembra esse autor, é uma habilidade que nem todos possuem suficientemente desenvolvida, exigindo, nesse caso, 0 suplemento do registro das gtavagées para completar 60 as observagdes documentadas. A transformacio das observacdes em dados comega no decorret da atividade de campo ¢ € um proceso continuo que influencia outras observacdes subseqiientes. Os dados em gravador ou video também podem set considerados como narratives, mas, nesse caso, somente serio dados “reais” depois de convertidos a uma for- matagio que permita sua anélise. O desenvolvimento tecnolégico possibilitou o aparecimento de diferentes tipos de cémaras de nideotapes que permitem um nivel de detalhe e confiabilidade que antes nio se possufa, quando observacdes eram feitas em sala ou no campo. Ha um certo mimero de fatores a considerar quando se usa o videotape para fins de observagio. O que vai ser registrado e como serio as agdes sio elementos que precisam ser contemplados na fase de planejamento antes do emprego do video. Problemas relacionados 4 presenga de outras pessoas no local da observacto ou a necessidade de dsenp sio elementos a ponderar, assim como 0 uso do zoom nas filmagens. ‘Tudo precisa ser pensado e planejado com antecedéncia para nio comprometer a validade das observagdes, mas é claro que sempre poder haver também ajustes criados ‘no momento mesmo da filmagem. © uso de cimara em instituigdes, inclusive em escolas, ou mesmo em piiblico, costuma causar certa inquietagao, fato esse que interfere no processo de coleta de dados, assim como no prdprio comportamento dos sujeitos. As filmagens em piiblico podem ter implicagdes legais e éticas, especialmente quando os sujeitos filmados niio sabem que estio sendo objeto de uma pesquisa. Isso nem sempre sucede quando as filmagens ocorrem no contexto de uma instituicio, uma vez que as virias agdes resultam de negociagdes entre as diversas partes integrantes do processo. 61 ‘A filmagem em sala de aula é considerada mais ficil, tendo em vista a maior possibilidade de controle ambiental e 0 fato de que os sujeitos sio informados € orientados sobre a natureza do trabalho. Pode oferecer imagens de virios Angulos e registrar a interacio dos sujeitos ou dos grupos formados. E preciso atentar que, ainda que se disponha de complexo e sofisticado aparato tecnolégico para registro dos dados, muitas vezes esses elementos somente proporcionam uma visio geral, a vol d’aiseau. O emprego desse material por si nao vai resolver a complexidade do problema, que é a coleta de dados de uma forma sistemitica e objetiva. E evidente que esse equipamento tecnolégico vai contribuir para se ter cenas precisas, mas na realidade, além dessa caracteristica, € preciso que os dados registrados sejam validos, segundo Selltiz et al. (1967), © que s6 sera possivel se os observadores tiverem um. treinamento especifico e experiéncia nesse tipo de coleta e registro dos dados, mas isso nem sempte ocorre. -Além do mais, ha sempre o petigo de viés no campo da observacao, nfo havendo observadores totalmente isentos, donde a necessidades de cautelas, a comecar pelo préprio processo de selegio dos observadores. Observagao: validade e confiabilidade Os conceitos de validade e de confiabilidade, ainda que aplicados com mais freqiiéncia em relacio aos instrumentos de medida usados em pesquisas quantitativas, sio também importantes em relaglo pesquisa qualitativa, especialmente no caso de observacées e de respostas obtidas durante entrevistas. 62 Esses conceitos estio diretamente ligados ao grau de confianga que os pesquisadores podem ter, face aiquilo que véem e ouvem. ‘A validade refere-se, no caso especifico do assunto, ora discutido, a propriedade, ao significado e & utilidade das inferéncias feitas pelos pesquisadores a partir dos elementos que colétaram. A confiabilidade est ligada & consisténcia dessas inferéncias ao longo do tempo. Na pesquisa qualitativa, a coleta de dados depende muito da perspectiva assumida pelo pesquisador, dos seus conceitos sobre as coisas. Certos pesquisadores véem mais claramente diferentes aspectos, enquanto outros, no mesmo. contexto, observam outros fatores. Nesse caso, hé que se empregar varias técnicas para verificar as suas percepgdes, identificar possiveis informagées falsas € assegurar que © pesquisador estaria vendo ou ouvindo aquilo que efetivamente diz ver ou ouvir. Fraenkel & Wallen (1996), entre outros procedimentos a serem seguidos para garantir a validade © a fidedignidade das informacé ss, sugerem: + usar varios instrumentos de coleta de dados, a chamada triangulagio, para checar validade das informagdes; + gravar os pronunciamentos dos pesquisados durante as observacdes e as entrevistas para, mais tarde, analisar as respostas, comparando- as com as anotagdes € registros gravados; + -vetificar possiveis divergéncias nas informagdes relacionadas As mesmas coisas, ou seja, cotejar informagdes oriundas de virios observadores para os mesmos sujeitos; 63 + aprender a usar a mesma linguagem (inclusive gitias ¢ expressdes regionais) do grupo estudado, para que nio haja diferencas de entendimento lingiifstico entre os pesquisadores € os sujeitos observados; + anotar no apenas as respostas dadas, mas também fazer 0 registro das proprias perguntas, para fins de reduzir os efeitos da meméria seletiva, quando, mais tarde, 0 pesquisador se propuser a analisar o material; + documentar as fontes de observagdes € comentétios casuais, sempre que possivel € apropriado, para evitar falsas interpretagdes posteriores pelo proprio pesquisador; + registrar, na medida do possivel, os fandamentos cem que se basearam as inferéncias realizadas pelo pesquisador; + descrever os vitios contextos em que as perguntas foram propostas aos entrevistados e as situagSes que foram observadas; * usar, sempre que houver condigdes posstveis adequadas, elementos tecnolégicos, como, por exemplo, gravadores, videos, etc; «+ tiraras suas conclusdes a partir de uma compre- ensio ampliada da situacdo observada e orientar suas acdes a partir dessas conclusdes; a ages, em muitos casos, podem mostrar que as conclusdes iio so realmente valida + entrevistar os individuos mais de uma vez, para detectar possiveis inconsisténcias/mudangas 20 longo do tempo. ‘Uma observagio direta apresenta mais validade aparente do que a coleta de informagdes por intermédio 64 de questionérios ou de entrevistas, especialmente quando o estudo envolve certos elementos que podem resultar de diferentes posicionamentos ¢ englobam aspectos subjetivos, como valores, opinides ou crengas. No caso de um questiondrio ou mesmo no estudo de um documento, o respondente e 0 autor apresentam a sua versio de algo que presenciaram e/ou observaram, sendo os dados fornecidos, por ambos, de natureza secundaria. As estérias mudam no processo de contar ¢ recontar — lembremos a brincadeira de crianga, em que uma diz uma coisa no ouvido de outra, que passa para outa colega e assim sucessivamente'até que, no final, depois de muito contar e recontar, a tiltima informagio € inteiramente diferente da que foi inicialmente apresentada, como resultado da intermediagio. De acordo com Bailey (1994), pode-se dizer que a observagio oferece maior validade aparente (face ualdify) do que informagdes intermediadas por diferentes pessoas, sem que, entretanto, a observacio, ressalte- se, seja totalmente perfeita, oferecendo elementos infaliveis, pois ao longo do seu processo diferentes fatores afetam a validade de uma observacio direta. E importante lembtar que 0 observador € parte de uma realidade social e suas percepgdes so, em grande parte, afetadas, condicionadas pelo contexto em que se cencontra, nio havendo, foro facto, observagdes inteiramente isentas, com uma validade irrestrita, uma validade que se possa dizer total. Uma observacio, por mais bem feita que seja, nunca apresenta total neutralidade, face 4 intermediago do proprio observador. ‘As pessoas tendem a ver aquilo que efetivamente desejam ver, criando, portanto, um certo vi sistemitico e gerando uma percepcio. 65 Assim, uma observacio € de certa forma seletiva. Bi possivel ocorrer 0 contritio, havendo da parte do observador uma completa auséncia de expectativa sobre © que ver, determinando, por conseguinte, uma certa “invalidade” no processo de obsetvacio. ‘Tudo isso mostra a necessidade de formagio para 0 uso da observagio, como meio de pesquisa, e a importéncia de uma definiclo de estratégias para que as observagées possam ser consideradas relativamente vilidas. Lembtemos que 0 campo da observacio possui miiliplas ¢ complexas dimensdes € 0 observador, sem. uma definigio prévia de sua estratégia sobre 0 que observat, sentir-se-d inteiramente perdido diante da numerosidade de possiveis elementos de informagio, na totalidade do campo obsetvacional. Faz-se necessétio desenvolver condigdes para uma certa otganizacio e orientagio, a fim de proceder ao trabalho de observagio com fins de pesquisa ‘A observagio, entre as varias possibilidades de mensuragio de comportamento nio-verbal, é sem diavida, como anteriormente foi dito, a metodologia que revela maior potencialidade. Contudo, preciso que se destaque nio ser possivel generalizar esse atributo para todos os tipos de observacio. : ‘A observacio como metodologia cientifica foi questionada, mas virios autores procuraram mostrar sua validade por intermédio de comparagdes através de surveys, realizados em amostras de pessoas submetidas A investigacao das mesmas varidveis que foram observadas. As concordancias entre resultados de observagées € de sus, como mostra Bailey (1994), tendem a demonstrar a validade da observasio como metodologia ‘de pesquisa. 66 Ao pensarmos na metodologia, ora em discussio, precisamos considerar que os dados da observacio sio afetados por uma grande diversidade de fatores, ja apontados, que afetam em diferentes graus a confiabilidade dos resultados. As vezes, essa questio no esta nas preocupacdes do pesquisador, em funcio de seu posicionamento tedtico. Entretanto, em muitos casos, precisamos nos pteocupar com o problema. A detecco da confiabilidade vai depender, em grande parte, do método de observacio empregado. Assim, se um tinico grupo for observado por um tinico pesquisador, torna-se dificil realmente estabelecer a precisio dos resultados, que se revestem de um certo grau de comprometimento, tendo em vista a impossibilidade de estabelecer comparacdes. A énfase, no caso de estudos de campo, esta na compreensio subjetiva do pesquisador, que sofre a influéncia de varios elementos, decorrentes da sua equagio pessoal, nfo sendo possivel a quantificacio dos resultados e, ipso facto, no se pode usar as técnicas docimolégicas habitualmente empregadas nas mensuragdes educacionais. ‘Ao registrar suas observacdes, © pesquisador precisa considerar 0 grau de exatido das informagdes que serio objeto do seu registro ¢ anilise. E. necessatio acentuar que o pesquisador nao vai se lembrar de tudo aquilo que lhe foi dado observar, ainda que muitas vezes possa pensar que sim. Dessa forma, é preciso que volte 408 seus registros no gravador ou aos multimeios, ¢aso 0 uso deles tenha ocorrido, Uma solugio possivel para a auséncia desses registros esta na realizacio de observagio por dois ou mais pesquisadores, a fim de propiciar a comparagio dos resultados e a identificacio e eliminacio de vieses, possibilitando que cada observador possa identificar os seus problemas, quanto 20 registro, ediscutindo provaveis conflitos para gatantir uma melhor consisténcia das observacies. Selltiz et al. (1967) chamam a atencio para o problema do observador patticipante, que acaba criando, relagdes de amizade com elementos do grupo observado, podendo concentrar-se apenas nesses elementos ¢ assim comprometet a observacio. E preciso buscar explicaces para o comportamento do grupo, sem procurar justificar ou defender a conduta daqueles aos quais se € mais chegado por razdes de sentimento. Além disso, é importante que 0 observador nio se identifique apenas com alguns elementos € passe a considerar certos comportamentos como sendo perfeitamente aceitaveis, porque identificados apenas com alguns sujeitos. ‘A participagio no geupo pode fazer com que 0 pesquisador se distancie dos objetivos definidos para sua pesquisa. importante que o observador faga constantes revisées da sua redacio, procurando suprir omissdes ¢, sobretudo, encontrar explicagdes para certos fatos ou comportamentos e aprimorar determinadas explicagdes que se mostram incompletas ou nao sto plenamente satisfatérias. B fundamental que, em diferentes momentos de sua nartativa, o pesquisador pergunte a si mesmo se esta faltando alguma coisa, se clementos nao necessariamente importantes io destacados, ¢ esquecidos outros que possuem real valor para 0 contexto da observacio. ‘Uma possivel solucio para a problemitica apontada, desde que o observador compreenda que a mesma possui limitacdes e adote as cautelas necesséirias, seria a discussio da natrativa com um dos membros do grupo observado, que pode suplementar alguns elementos 68 informativos, mas no deve, de forma alguma, discutir os fundamentos teéricos do trabalho, por fugir inteiramente & condicfo € a0 grau de autonomia do proprio elemento observado, Seria interessante que sobre confiabilidade e validade fosse consultada a obra de Miller & Kirk (1989). Observagio: modalidades de triangulagio ‘A metodologia da pesquisa exige capacitagio de seus patticipantes, inclusive daqueles que vio ter uma participacao diferenciada nos trabalho’ de campo, como no caso da observacio. E necessirio, por outro lado, que a equipe de pesquisa discuta seus objetivos ¢ procedimentos para agir em unissono €, no caso. especifico de uma pesquisa qualitativa, decisées devem ser tomadas sobre a coleta de dados ¢ como serio os mesmos posteriormente analisados e divulgados. E fundamental, insistimos, que haja concordincia entre os membros da equipe sobre diferentes aspectos, como, por exemplo, a anilise das transcrigdes, os clementos a considetar no material gravado (videos, tapes, etc), € que os observadores tenham uma atuacao conjunta que reflita um consenso sobre os procedimentos a adotar pelo grupo, assim como também sobre como fazer os devidos registros. Anteriormente, foi feita uma referéncia, ainda que brevemente, 20 processo de iriangulagao, 0 qual vai possibilitar fazer uma verificagio, uma checagem em relagio as percepgées de varias pessoas durante a fase de observagio da pesquisa, determinando, ao final, se as conclusdes possuem fundamento ¢ se apresentam consisténcia em relacio aos elementos coletados. 69 Existem, conforme N. K. Denzin, no seu artigo sobre Triangulagao, publicado na International Encyclopedia of Educational Research, citado por Wragg (1999), quatro, tipos diferentes de triangulagio, que devem ser considerados no desenrolar de um processo de pesquisa: i) a triangulagao de dados, considerando as variaveis, tempo, lugar ou pessoas; ii) a miangulagio do pesguisadar, ‘em que diversos observadores fazem uma verificacio cruzada de cada um dos observadores da equipe; iii) a triangulagio de teoria, em que diferentes teorias usadas durante a observagio so testadas; iv) a sriangulayio etodolégica, em que mais de uma metodologia pode set usada no desenrolar da pesquisa. Bnnecessirio, ainda, que se verifique a concordincia ‘quando dois ou mais observadores esto envolvidos nos trabalhos. Assim, é forcoso considerar a concordancia entre observadores ¢ a concordancia intra-observadores, sendo esta ultima uma constatagio de que os observadores concordam com eles préprios’. 5 A presente colegio sobre Pesquisa em Educagio editari volumes ‘especiais dedicados a instrumentos operacionais, destacando-sc, ‘entre outros, o dedicado a Questionarios e seus diferentes tipos eo sobrea Entrevista e suas varias técnicas. 70 Capitulo IT

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