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0 DA HISTORIA DA LINGUA PORTUGUEsa, UMA penIODIZAG a delimitagéo de perfodos na evolugao da lingua go complexa © pouco consensual hist q a sua propria natureza, artificial qualquer divisdg podemos, mesmo, questionar a Compatibij. onceitos periodizagao angua ~ MAS @8 vantagens iyiso apresenta, enquanto instrumento de trabalho que uma tal divis80 ivas dos historiadores da If i ‘ustificam as repetidas tentativas dos ae i As periodizagoes propostas apoiam-se, em grande medida, em fundamentos extralinguisticos mas divergem quanto a escolha dos factos externos a ter em conta. A evolugao de uma lingua é de- terminada nao sé por factores estritamente lingu/sticos mas tam- bém por mudangas historicas, econémicas, sociais, culturais, que se materializam em profundas transformacées na mentalidade dos falantes. Que factores e que momentos deveremos considerar fundamentais na historia da lingua que falamos? As propostas de periodizac¢ao respondem a esta questao de modos diversos: umas partem das divisdes tradicionais da historia, outras baseiam-se na Producao literéria, outras, ainda, pretendem ater-se, exclusivamen te, aos factos linguisticos. Certo 6 que ao lermos um texto antigo Ihe estranhamos a estrutur: i i rente di , 0 Iéxico, a grafia. Reconhecemo-lo como arcaico, dife : lo Portugués Moderno. ‘odemos, Portanto 0 problema d ortugues@ é quest uma lingua tora, Pe! cronolégica precisa — dade entre 0s C Nan , ica , distinguir claramente uma époce area? U antiga de 4 Portugués aie vets moderna. A primeira corresponde”? 0 Viragem al, desde a sua formacdo até ao moment? que 0 Re . do século XVI pose Subdivisées, fs és arial Mento representa. A segunda, 0 Porta ‘ante. Mas cada um destes periodos 4 ne Scanned with CamScanner Pe ie ca eee en OESSENCIAL SOBRE A HISTORIA DO PORTUGUES * (pi Deus, se sab’ora meu amigo eee gorm’eu senheira estou em Vigo! E vou namorada! Tinha um cravo no meu balcéo; velo um rapaz e pediu-mo aiDeus, se sab’ora meu amado —mée, dou-lho ou nao? eu em Vigo senheira manho! ‘ come vou namoradal Sentada, bordava um lengo de mao; velo um rapaz e pediu-mo | Com’eu senheira estou em Vigo, —mée, dou-lho ou nao? | enulhas gardas num ei comigo! E vou namorada! | | Dei um cravo e dei um lengo, 86 nao dei 0 coracdo; Mas Se 0 rapaz mo pedir, —mée, dou-lho ou nao? Com'eu em Vigo senheira manho, Enulhas gardas migo nom trago! E vou namorada! Ld Eugénio de Andrade | Martin Codax Antologia Breve, 1972 Séoulo XII! Se nos basearmos no marco fundamental para a historia da Nossa lingua que representa a sua atestacao (ou seja, a sua exis- téncia em documentos escritos), isolaremos um perfodo pré-lite- rario, em que a lingua falada se distinguiria ja da escrita: falava-se romance, escrevia-se Latim. Mas nos documentos latinos afloram, Por vezes, formas em que podemos ver testemunhos do floresci- mento de uma modalidade falada j4 muito diferente da latina (em- bora o Latim se mantenha como modelo da vertente escrita da lingua). Com um pequeno esforco de imaginacao podemos assis- tir 4 seguinte cena: debrucado sobre o pergaminho, o escriba re- gista - penosamente - o que Ihe ditam. E 0 que ouve é um fomance Galego-portugués que ja se afasta bastante do Latim que €screve. Nao se trata, propriamente, de uma ‘tradugao’ mas de uma situagao de diglossia, talvez inconsciente: quem escreve nem Se apercebe claramente de que usa duas linguas diferentes para duas finalidades diferentes, a fala e a escrita. Eno século xil que comecam a surgir os primeiros textos es- Critos em Portugués, iniciando-se, entao, o period do Portugués Antigo. a A par de documentos ndo literdrios, que revelam as dificulda- des sentidas por quem tenta verter a lingua que ouve no modelo Scanned with CamScanner 84 © ESPERANCA CARDEIRA usar quando escreve, desenvolve-se uma poesia que conhecemos como ‘trovadoresca’, " que: nos autoriza «se nos colocarmos numa perspectiva ee orize 8 produséo literdria - a considerarmos uM perfodo trovat greece as cerca de 1350. Mas é também em meados do século XIV que Portugués A Galego tomam caminhos divergentes e que o Portugués inicia um processo de elaboragao que ird permitir a sua normalizagao ¢ i éculo XIV, Portugué: ixacdo enquanto lingua nacional. Até ao st , gues heeds e Galego constituem uma TSS PeRe OL Ea unidade que se foi definindo Amigos, nom pos: através de um processo de agram coita que d'amor ei, iS , 30 ane vejo SHA andar, distanciamento em relacao as latino que se habituou a e com sandece o direi: outras Iinguas romanicas; do Os olhos verdes que eu vi século XV em diante, o Por- me fazem ora andar assi. tugués inicia um movimento Pero quem quer x’entenderé de elaboragao e estandardiza- aquestes olhos quaes som, ¢4o da lingua e de expansdo e d'est'alguem se queixaré, territorial e linguistica. mais eu ja quer moira, quer not Os olhos verdes que eu vi Me fazem ora andar assi. Podemos, portanto, con- siderar que 0 periodo trova- doresco constitui uma fase comum Galego-portuguesa que termina com a separacao entre Portugués e Galego, no momento em que a vitoria da burguesia sobre a aristocracia tural nortenha, simbolizada pela Batalha de Aljubarrota, determina a deslocagao do centro vital do pais para 0 Sul. Magies socio-histéricas e lin- igués Médio (ou pré-classico). Pero nom devia a perder ome que ja 0 sém nom & de com sandece rem dizer, com sandece digu’eu ja: Os olhos verdes que eu vi Me fazem ora andar assi. Joham Garcia de Guilhade Século XIll Galepoportuoues A esta fase de profundas transfor guisticas poderemos chamar Portu ho arouants ° Portugués Sofre mudangas que o encaminham entido da elaboracdo de um padréo que tera como modelo a lingua literaria, na Gali ( za Castelhani: vive apenas no uso oral. izada 0 Galego sobre’ As evolucées que Ocorrem no. Galego 0 pro- cesso de ensurdecimento das sibil gO (nomeadamente 0 P! antes, que resulta na articula- Scanned with CamScanner =—_ aaa O ESSENCIAL SOBRE A HISTORIA DO PORTUGUES * 85 Ao [Jose] de José, frente ao f 7 ai (guzel) contribuem | sore mau, as mites vorbas: para afastar, cada vez mais, como as verbas ferides Galego e Portugués. Co coitelo dos beizos, cada dia. O limite final do Portugués médio pode ser fixado com | Youche dct tan 86 que tefo Grammatica da lingoagem 7 portuguesa de Ferndo de Que tefio, irmau, maduro 0 coraz6n Oliveira (1536), que inaugu- | Pr gardar nel as verbas tas, rauma nova fase na histéria hl da lingua, marcada por uma Manuel Maria, Verbas a un irmau reflexdo metalinguistica Antoloxia Poética, 1993 sistemdtica e uma inteng¢do Galego modern claramente normativizadora A actuagaio de gramaticos, lexicégrafos e ortégrafos, 0 de- senvolvimento da imprensa e da literatura, traduzem-se, a partir de meados do século xvi, na progressiva estabilizagao da lingua. 0 Portugués Classico é 0 reflexo de uma profunda mudanga de mentalidade, enformada pelo Renascimento e pelos Descobrimen- tos, mas também pela Inquisic¢ao. Prolongando-se até ao final do século XVII, 0 perfodo classico corresponde a fixagdo de um mo- delo linguistico, a norma, e de uma instituicdo social, 0 idioma nacio- nal. A lingua torna-se objecto de estudo, manifestagao estética, expressao do sentimento de nacio- nalidade e instrumento de coesao. A Corte, a Capital e a Igreja con- centram a cultura. O ensino, a disciplina gramatical, o desenvol- vimento da literatura e a imprensa Consolidam o padrao linguistico. GAZETA, EMQVESE RELATAM. AS NOVAS| TODAS, QVE OVVE NESTA CORTE, EQVE VIERAM DE ‘yas pater no mesde Noverne ‘bro de 14. Com tedas at Ticenges necefarias. E priuilegio Real. EM LISBOA. NcOffinade Lourengo de efaueres Primeira gazeta publicada em Portugal Scanned with CamScanner der a dimens&o europeia, o Portugués torn ae a VOS € OUtras Ao SE comunicagao para siete por sic inetnene em Africa, na América fala-se ‘0 wg : s, sg ne De pect que resultou da transplantagao a ling Pabeeae Ute unidade que permite a compreens4o entr i prebsess hee, americanos. Falado por cerca de duzentos milhées, gual: mais diversos pontos do mundo, o Portugués dej- sem oe Scar a Portugal e tornou-se um elo essencial entre xou de perten 0 povos, culturas e nacées. OU-se Cultu. Mas a Ua, so. @ euro. ae Ry rove! PRINCE avcous i 0 Do século xvii até a actualidade, o Portugués aie tem sofrido mudangas linguisticas radicais. A norma, centra an i dos Lisboa, difunde-se agora, com facilidade, através do ensino e meios de comunicacao, Embora diversificada, a lin i: la gua portuguesa caracteriza-se pel Sua unidade: um falante do S ul No tem dificuldade em entender um falante do Norte ou das ilhas. Mas, sé ° longo dos se culnei s comunidades de fe Portuguesa se espa! a tam pelo mundo, as: if timos, agora, a oT de correntes mig'@ Periodos na historia do Portugués até ao século xi! Portugués Pré-literario século XII-xy ‘ortugués antigo. século Xv xy} Portugués médio século XVI-xviI| Portugués classico s6culo XVII| - xx) Portugués Moderno Scanned with CamScanner ee eae se O ESSENCIAL SOBRE A HISTORIA DO PORTUGUES * 87 rias em Portugal: sero estes novos contactos linguisticos capa- zes de transformar a lingua? O Portucués NAO EUROPEU: AS NOVAS NORMAS No processo de expansdo da lingua portuguesa, deveremos distinguir duas situagGes; a afirmacao do Portugués, sobrepon- do-se as linguas autéctones, e a constitui¢ao de crioulos de base portuguesa. A navegacao na costa africana e 0 comércio com o Oriente, com a consequente fundacao de portos de mar fortificados, pro- piciam a formacao de crioulos: as necessidades de comunicacao, que visam facilitar as relagées comerciais, séo pontuais e reduzi- das. Comerciantes e colonos estabelecem-se, por vezes, nestas possess6es portuguesas, casando com mulheres indigenas. E assim que nas regides costeiras do Oriente e de Africa se de- senvolvem variedades lingufsticas de intercdmbio, de base portu- guesa e com influéncias das linguas indigenas, com uma estrutura gramatical muito simplificada que se ira complexificando 4 medi- da das necessidades comunicativas dos seus falantes. Estas va- tiedades linguisticas de emergéncia nao representam, numa primeira fase, a competéncia lingufstica nativa dos seus falantes. Em algumas das possessdes portuguesas, contudo, a intensifica- $40 dos contactos linguisticos, favorecida pelos casamentos mis- tos, permitiu que essas variedades se expandissem, tornando-se @ primeira lingua da comunidade. E quando uma lingua de emer- 9éncia se torna, assim, lingua materna — crioulo -, o seu destino Sera evoluir de acordo com as necessidades expressivas, cada vez ™aiores, dos seus falantes. Os crioulos de base portuguesa do Oriente jA quase desapa- feceram. Contudo, se ja hé poucos vestigios do crioulo indo-por- tugués nas costas da india, ainda hé falantes do Portugués em Goa onde, no inicio do século xx, 0 crioulo foi substituido por um Portugués muito préximo da norma europela. Em 1961 Goa foi integrada na India, passando a lingua oficial a ser o Inglés. 0 Por- lugués ficou, ento, relegado para o ambiente familiar de uma tr i " seek ®strita comunidade crista. Scanned with CamScanner

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