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TÉCNICAS

RETROSPECTIVAS
E RESTAURO
Aula 02

2020_2
Professor Luiz Felipe César
Graduação em Arquitetura e Urbanismo
Centro Universitário UNA
Campus Aimorés
ATIVIDADE
PARA A AULA

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CONCEITOS
INICIAIS
PRESERVAÇÃO
Ideia de preservação ligada ao senso comum de
conservação do bem na sua capacidade plena ou com
mínima deterioração possível.

A preservação busca a transmissão do bem às diversas


gerações através do tempo. Tal preservação não busca a
eternização do bem, mas sua presença utilizável através dos
tempos.

Vários níveis de ações preventivas.

(CARSALADE, 2014)
CONSERVAÇÃO
Atividade cuja função essencial é evitar (ou prevenir) a
deterioração do bem. A maioria dos técnicos da área
considera que a conservação é preferível em relação a outros
modos de preservação.

Pode ser de duas formas:


01_ Conservação preventiva: realizada sobre o ambiente ao
qual está exposto o bem;
02_ Conservação sobre o próprio bem.

(CARSALADE, 2014)

A palavra conservação é empregada para referir-se à parte


do trabalho de Restauração que não aspira a introduzir
mudanças perceptíveis no objeto restaurado.

(VIÑAS, 2003)
RESTAURAÇÃO
Ação que se aplica quando há um objetivo essencial de
superar a destruição causada na transmissão de um bem
que, sem a ação do restauro, perderia totalmente o seu
potencial de significação.

(CARSALADE, 2014)

Fala-se em restauração para referir-se à parte do trabalho de


Restauração que tem por objeto modificar os traços
perceptíveis do bem.

A conservação pode resultar perceptível, mas somente se ela


é tecnicamente inevitável ou aconselhável (Ex.: reforços
exteriores do Coliseu de Roma).

(VIÑAS, 2003)
RESUMINDO...
CONSERVAÇÃO RESTAURAÇÃO

Busca evitar a deterioração do bem Busca ressignificar o bem a partir de


ao longo do tempo. um ponto de deterioração específico.

Introduz mudanças imperceptíveis Introduz mudanças perceptíveis que


ou perceptíveis por razão técnica. modificam os traços do bem.

*MANUTENÇÃO_ Conjunto de intervenções


rotineiras visando manter a integridade do bem.

(BRAGA, 2014)
HISTÓRIA DA
CONSERVAÇÃO-
-RESTAURAÇÃO
INTRODUÇÃO
Século XV __Humanistas __Restauro Pictórico

Século XVIII __Iluministas __Antiquários / Monumento histórico

Século XIX __Viollet-le-Duc __Restauro estilístico

Século XIX __John Ruskin __Anti-restauro

Século XIX/XX __Camillo Boito __Restauro moderno

Século XX __Gustavo Giovannonni __Restauro científico

Século XX __Cesare Brandi __Restauro crítico

Século XX/XXI __Teóricos contemporâneos __Linhas contemporâneas


HUMANISMO
Contexto histórico

_ Transição do feudalismo para o capitalismo;


_ Revolução em relação às estruturas sociais, políticas e
econômicas do período medieval;
_ Movimento de revalorização da Antiguidade Clássica
greco-romana nas artes, ciências e filosofia
(classicismo);
_ Progressivo abandono do dogmatismo religioso e do
misticismo concomitantemente à valorização das
ciências, da racionalidade e da natureza (racionalismo);
_ O homem é colocado como centro do universo
(humanismo e antropocentrismo);
_ Arte como imitação da natureza (mímesis);
_ Desenvolvimento das leis da perspectiva no desenho
e na pintura. Imagem 01_ Escola de Atenas por Rafael
Sanzio, 1509-11
HUMANISMO
Efeito Petrarca_ o olhar distanciado e esteta,
despojado das paixões medievais, que se faz sobre os
edifícios antigos em sinal de reflexão e contemplação.

Efeito Brunelleschi_ o olhar de escultores e arquitetos


que viajam a Roma e o universo formal da arte clássica.

Institui-se uma distância histórica que valoriza os


edifícios da Antiguidade Clássica e desconsidera as
edificações do período medieval. Há maior valorização
dos documentos que dos edifícios em si.

Niccolo Niccoli_ erudito florentino que coleciona


manuscritos clássicos. A partir dele, multiplicam-se os
colecionadores de arte do Quattrocento italiano.

(CHOAY, 2006) Imagem 02_ Francesco Petrarca


Imagem 03_ Cúpula de Santa Maria del Fiori por Filippo Brunelleschi. Florença, Itália, 1296-1436.
HUMANISMO
Alberti_ realiza viagens a Roma. Escreve o De re
aedificatoria, livro de referência sobre a construção na
Renascença que procurava ser uma atualização do De
architectura de Vitrúvio.

Entendimento conforme periodização triparte de


Petrarca: bela antiguidade, idade obscura e
renascimento moderno. O monumento histórico só
pode ser antigo, a arte só pode ser antiga ou
contemporânea.

(CHOAY, 2006)

Imagem 04_ Leon Battista Alberti


HUMANISMO
Atitude contraditória dos papado humanista_ bulas
pontificais ao longo do século XV (a exemplo da Cum
alman mostram urbem do Papa Pio II Piccolomini, de
1462) preconizam a conservação moderna dos edifícios
da Antiguidade, atitude distanciada e objetiva com
medidas à restauração e proteção destes edifícios.

Ao mesmo tempo, contudo, os mesmos não se


contentam com medidas preventivas e, a fim de
embelezar e modernizar a cidade de Roma, devastam
os monumentos, a fim de obterem matéria-prima
rapidamente para as novas obras que irão rivalizar com
as da Antiguidade.

(CHOAY, 2006)

Imagem 05_ Papa Pio II Piccolomini


ILUMINISMO
Contexto histórico

_ Processo de colonização e economia mercantilista;


_ Era dos Estados Nacionais (Absolutismo);
_ Desenvolvimento de estudos e teorias nos diversos
campos das ciências, a exemplo dos trabalhos de
Galileu Galilei e Isaac Newton;
_ Grande desenvolvimento de estilos arquitetônicos que
remetem aos períodos clássicos (Antiguidade Clássica
e Renascença) após a passagem do Barroco;
_ Era das Revoluções: Revolução Industrial, Revolução
Francesa, Revolução Inglesa;
_ Mudanças ideológicas voltadas para os conceitos de
liberdade e progresso para o homem;
_ Filósofos iluministas recebem o apoio da burguesia Imagem 06_ Filósofos Iluministas
ao defenderem o conhecimento racional e a liberdade reunidos no salão de madame Geoffrin
política e econômica. por Anicet-Charles Lemonnier, 1812
ILUMINISMO
Antiquários_ eruditos europeus que passam a viajar
explorando novos lugares (Grécia, Egito, Ásia Menor) e
fazem levantamento de ruínas clássicas em seus
próprios territórios

Diferentemente dos humanistas, consideravam que o


passado se revela mais nas edificações e seus
testemunhos involuntários que nas documentações.

Acumulavam portfólios e dossiês com descrições e


representações figuradas das antiguidades.

Descoberta dos sítios de Herculano em 1713, de Pesto


em 1746 e Pompeia em 1748, estimula uma nova
pesquisa sobre a Antiguidade Clássica.
Imagem 07_ Gravuras de
(CHOAY, 2006) Giovanni Battista Piranesi.
ILUMINISMO
Antiguidades nacionais_ surge um interesse maior por
antigos monumentos erigidos ou produzidos nos
diferentes países europeus antes e, principalmente,
depois do colonato romano (expansão do período
histórico de interesse).

Jean-François Félibien distingue o gótico antigo (velho


e grosseiro) do gótico moderno (bom o novo). O
primeiro refere-se a um conjunto de estilos que vão da
nossa atual Antiguidade tardia ao Estilo Românico. O
segundo, ao atual Estilo Gótico de fato.

(CHOAY, 2006)

Imagem 08_ Catedral gótica de Orviedo.


ILUMINISMO
Na França, o gótico não é bem aceito pelos teóricos,
considerado um estilo menor dos bárbaros, e as
edificações deste estilo são vandalizadas ao longo do
período da Reforma Religiosa até a Revolução
Industrial.

Na Inglaterra, pelo contrário, há uma resistência ao


classicismo, sendo que o gótico é preservado em razão
do seu valor histórico e seu valor artístico par a arte
nacional.

(CHOAY, 2006)

Imagem 09_ Catedral gótica de Lichfield.


ILUMINISMO
Problemática dos antiquários_ trabalham apenas com o valor histórico dos elementos
preservados e esquecem-se do valor artístico, ou seja, faltaram apreciações sensíveis e
juízos de gosto aos antiquários.

A criação dos primeiros museus de imagens e da coleção de arte buscava “democratizar” o


saber, conforme o ideal iluminista, e torná-lo acessível a todos. Porém, esta preservação não
se fez em relação às antiguidades arquitetônicas. No início, os museus tiveram um papel
perverso que favoreceu a fragmentação predatória dos grandes monumentos, cujos
despojos enriqueciam coleções privadas e públicas.

(CHOAY, 2006)
REVOLUÇÃO FRANCESA
Necessidade da criação de políticas de preservação do patrimônio nacional francês no
período revolucionário do final do século XVIII, em razão das atitudes de vandalismo que
tomaram conta do país.

A depredação tinha um caráter político, especialmente sob o regime do Terror e o governo


do Comitê de Salvação Pública, a partir de 1792. Há uma postura de contrarreação na busca
da conservação primária ou preventiva dos edifícios.

(CHOAY, 2006)
REVOLUÇÃO FRANCESA
É criado o Comitê de Instrução Pública, que se utiliza do valor nacional do monumento para
justificar as medidas de conservação.

É considerado também o valor econômico dos monumentos, em razão dos interesses da alta
sociedade em conhecerem o patrimônio constituído por estes monumentos.

O valor artístico, por sua vez, é relegado ao último lugar, em razão da ausência de juízo estético.

(CHOAY, 2006)
VIOLLET-LE-DUC
Viollet-le-Duc nasceu no seio de uma família burguesa
de posição estável no ano de 1814 em Paris.

Seu pai, Emmanuel Viollet-le-Duc era um funcionário


público e bibliófilo. Sua mãe, Eugénie Delécluze, era
irmã do pintor e crítico de arte Étienne Jean Delécluze.

Panorama cultural francês do início do século XIX


dominado pela figura de Antoine Quatrèmere de
Quincy, pelos ideias clássicas e pela arquitetura
academicista.

Neste ambiente, a arquitetura gótica passava a se


revestir de um caráter nacionalista.

(VIOLLET-LE-DUC, 2006)
Imagem 10_ Viollet-le-Duc.
VIOLLET-LE-DUC
Realiza viagens pela França ao longo dos anos 1830,
consolidando a noção de que existem princípios de
adequação da forma à função, da estrutura à forma, e
da ornamentação ao conjunto tanto na arquitetura
clássica quanto na arquitetura medieval.

Participa de debates sobre o futuro das edificações do


período medieval, tão devastadas na França nas
décadas anteriores.

Entre 1854 e 1868, escreve, em dez volumes, o


Dictionnaire raisonné de l’architecture française du
XIe au XVIe siècle (Dicionário razoado da arquitetura
francesa do século XI ao XVI).

(VIOLLET-LE-DUC, 2006) Imagem 11_ Capa do Dictionnaire


de le-Duc.
VIOLLET-LE-DUC
Neste Dictionnaire, expõe seu conhecimento sobre a
arquitetura medieval, versando sobre o sistema técnico
e funcional de suas edificações.

No verbete “Restauração”, le-Duc afirma:

“A palavra e o assunto são modernos. Restaurar um


edifício não é mantê-lo, repará-lo ou refazê-lo, é
restabelecê-lo em um estado completo que pode não
ter existido nunca em um dado momento”.

Em seus escritos, le-Duc louva a capacidade dos


filólogos, etnólogos e arqueólogos contemporâneos de
se desdobrarem sobre o passado a fim de fazerem
análises, comparações e classificações de estilos.
Imagem 11_ Capa do Dictionnaire
(VIOLLET-LE-DUC, 2006) de le-Duc.
VIOLLET-LE-DUC
Restauro estilístico_ para le-Duc, não existe o
problema entre o preexistente e a intervenção, pois ele
entende o restauro como um refazer, uma
recomposição de unidade estilística.

Ideia de que seria possível recompor uma edificação


degradada dentro de normas estilísticas gerais
aplicáveis a ele (ecos da categorização, sistematização
e classificação de estilos do período).

Princípios pessoais de restauração_ “restituição” do


bem a um estado completo que poderia nunca ter
existido; restaurações agressivas, fantasiosas e
“corretivas”.

(CARSALADE, 2014) Imagem 12_ Ilustração do


Dictionnaire de le-Duc.
VIOLLET-LE-DUC
Le-Duc, ao encarar um edifício a ser restaurado,
possivelmente se perguntaria:

O que teria sido se, quando da construção deste


edifício, os construtores detivessem todos os
conhecimentos e experiências da época atual?
Como posso reformular este edifício de modo ideal,
dentro do que lhe é cabível em seu estilo?

(VIOLLET-LE-DUC, 2006)

As intervenções de le-Duc, atualmente, levantam uma


discussão sobre o falso histórico, ou seja a
recomposição da obra a partir de um elemento novo
com a aparência do original.

(CARSALADE, 2014) Imagem 13_ Ilustração de gárgula


para a Catedral de Amiens.
Imagem 14_ Telhado de Notre-Dame fotografado por Charles-François Bossu dit Marville, c. 1860.
Imagem 15_ Fotografia de intervenções realizadas por le-Duc.
Imagem 16_ Intervenções de Viollet le-Duc em uma das flechas da Catedral de Notre Dame de Paris.
RESUMINDO...
PROBLEMÁTICAS QUESTÕES (AINDA) ATUAIS

Alteração de partes da edificação Restauro não apenas na aparência,


consideradas defeituosas. mas também na função portante da
estrutura.
Desrespeito a modificações Levantamentos pormenorizados da
posteriores em razão da busca da edificação para compreender a
pureza de estilo do edifício. situação existente.

Reconstituição de grandes Ação em função do contexto ou


extensões da edificação. circunstância e não de princípios
absolutos.
JOHN RUSKIN
John Ruskin nasceu em Londres no ano de 1819,
vivendo durante o auge e poderio econômico e militar
da Ingleterra na Era Vitoriana.

Oriundo de família escocesa, seu pai era próspero


comerciante e sua mãe era uma puritana calvinista que
educou o filho de maneira rígida.

Seus estudos básicos foram feitos de forma severa,


tendo o teórico uma infância sem diversões e solitária.
Assim, tornou-se observador do mundo ao seu redor.

Ruskin era um excêntrico reacionário de seu período,


um grande inimigo da industrialização – da qual seu
país era um dos principais responsáveis.

(RUSKIN, 2008) Imagem 17_ John Ruskin.


JOHN RUSKIN
Considerado um romântico, criticava a sociedade
capitalista industrial e suas mazelas (miséria, injustiça
social, inchaço urbano, destruição do meio ambiente).

Seus escritos foram fundamentais para as reformas


sociais, urbanísticas e de proteção ao meio ambiente
que vieram posteriormente.

Ruskin escreveu o livro The seven lamps of Architecture


(As sete lâmpadas da arquitetura), publicado em 1849.

No capítulo sete, intitulado “A Lâmpada da Memória”,


realiza um debate sobre o papel da arquitetura para a
sociedade moderna.
Imagem 18_ Capa do livro The
(RUSKIN, 2008) Seven Lamps of Architecture
por John Ruskin.
JOHN RUSKIN
Ruskin considera que o trabalho das gerações
anteriores confere, aos edifícios deixados, um caráter
sagrado.

Para Ruskin, a arquitetura doméstica dá origem a todas


as outras, tendo este caráter de santidade, pois
permeava dentro dela a essência vida e história de
quem nela viveu. Já os prédios públicos deveriam ser
sempre construídos a partir de um propósito histórico.

As marcas deixadas nos edifícios fazem parte de sua


essência. Ruskin considera que estes edifícios não
pertencem apenas à sua geração, de modo que deve
ser proibido, aos homens de seu tempo, tocá-los.

(CHOAY, 2006)
JOHN RUSKIN
Anti-restauro_ qualquer intervenção sobre
edificações históricas é um sacrilégio. O projeto
restaurador seria absurdo, como procurar ressuscitar
um morto.

“[Restauro] significa a mais total destruição que


um edifício possa sofrer: uma destruição no fim
da qual não resta nem ao menos um resto
autêntico a ser recolhido, uma destruição
acompanhada da falsa descrição da coisa que
destruímos.”

Apenas algumas intervenções são permitidas, a fim


de consolidarem a edificação (“muletas”) e
conservarem-na. Quando estas perdem sua
utilidade, deve-se conformar com a sua morte.
(RUSKIN, 2008)
JOHN RUSKIN
“[...] a Arquitetura deve ser considerada por nós
com a maior seriedade. Nós podemos viver sem
ela e orar sem ela, mas não podemos rememorar
sem ela.”

“Pois, de fato, a maior glória de um edifício não


está em suas pedras, ou em seu ouro. Sua glória
está em sua Idade, e naquela profunda sensação
de ressonância, de vigilância severa, de
misteriosa compaixão, até mesmo de aprovação
ou condenação, que sentimos em paredes que há
tempos são banhadas pelas ondas passageiras
da humanidade.”

(RUSKIN, 2008)
COMPARANDO...
VIOLLET-LE-DUC JOHN RUSKIN

França, século XIX. Inglaterra, século XIX.


Restauro estilístico, considerando Antirestauro, considerando o valor
elementos de estilo da edificação sagrado da edificação.
pensados como um modelo ideal.
Alteração de partes da edificação e Condenação de todo e qualquer tipo
inserção de novos elementos de intervenção nas edificações
conforme o estilo históricas, à exceção de pequenas
obras de consolidação.
REFERÊNCIAS
CARSALADE, Flavio. A pedra e o tempo: Arquitetura
como patrimônio cultural. Belo Horizonte: Editora da
UFMG, 2014.

CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São


Paulo: Editora da UNESP, 2001.

RUSKIN, John. A lâmpada da memória. Cotia: Ateliê


Editorial, 2008.

VIOLLET-LE-DUC, Eugène Emmanuel. Restauração.


Cotia: Ateliê Editorial, 2006.

VIÑAS, Salvador Muñoz. Teoría contemporánea de la


restauración. Madrid: Editorial Síntesis, 2003.

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