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A geografia cultural europeia de quatrocentos e quinhentos Principais centros culturais de producao e difusde de sinteses e inovacoes Explicar a ampliacao do conhecimento do Mundo empreendida pelos Europeus nos séculos XV e XVI A partir de 1450 inicia-se uma nova época, de acordo com a periodizagao tradicional da His- t6ria em “Idades’: trata-se da Idade Moderna, cujo final se faz coincidir com a Revolugao Fran- cesa de 1789, ‘A Idade Moderna caracteriza-se por um desanuviamento da “trilogia negra" ~ fomes, pestes e guerras - criando condig6es propicias as descobertas maritimas. Nos séculos XV e XVI, 0 clima de paz, o apoio da burguesia em ascensao as expedigdes e 0 auxilio dos inventos técnicas (nomeadamente o mapa com ros@-dos-venios, a buissola portatil, © astrolébio, a balestiha e a caravela portuguesa) permitiram aos Europeus 0 conhecimento de regides do Mundo até entao inexploradas. Entre estes Europeus, ocuparam lugar de destaque os Portugueses ¢ os Espanhéis, pois as suas Viagens alteraram para sempre o conhecimento do mundo e as relagées entre os varios continentes: ~ viagem de Bartolomeu Dias (1487-88); permitiu ultrapassar 0 temivel Cabo das Tormentas; —viagem de Vasco da Gama (1497-99): empreendeu o caminho maritimo para a india, possi- bilitando a competigao vantajosa com as rotas terrestres de comércio das especiarias; —viagem de Pedro Alvares Cabral (1500): possibilitou a descoberta do Brasil, que viria a tor- nar-se uma das colnias portuguesas mais promissoras; —viagem de Cristovao Colombo (1492-93): atingiu as Antilhas, ponto de partida da enorme influéncia espanhola no continente americano; —viagem de Fernéo de Magalhaes (1519-1522): realizou, pela primeira vez, a circurn-navega- co, contripuindo para alterar os conhecimentos geogréficos e astronémicos vigentes. Sublinhar manifestacdes de progresso econémico, demografico, social e poli- tico europeu nos séculos XV e XVI Para além do encontro de povos, a Idade Moderna caracterizou-se por um dinamismo geral que se manifestou ao nivel demografico (crescimento populacional), econdmico (desenvolvi- mento do comércio ao nivel mundial), social (criagao de elites burguesas e aristocraticas) e politico (reforgo do poder de principes e monarcas). Salientar a importancia de alguns inventos técnicos entao ocorrides, por exemplo, o da imprensa A proliferagao de inventos técnicos nos séculos XV e XVI permite-nos agrupé-los em trés gru- pos de sentido: por um lado, todos os inventos que auxiliaram a navegagao transocedinica (por ‘exemplo, 0 astrolébio e a caravela); por outro lado, os que impuseram a dominagao europeia (a pélvora ¢ as armas de fogo); por ultimo, os inventos titeis no quotidiano (como os culos ou o reldgio portatil - embora este apenas tivesse 0 ponteiro das horas). A parte desta categorizagao, ocupando uma posigao histérica unica pela sua importancia, salienta-se a invengdo da imprensa: a passagem da copia manual a impressdo em tipos (caracteres méveis), inventada pelo alemao Gutenberg, permitiu difundir rapidamente os escri- tos gregos e latinos, bem como as obras que na Idade Moderna revolucionaram a percepcao do mundo. 0 livro impresso (de que 0 primeiro exemplar foi a Biblia), apesar de menos bonito que o livro de iluminuras, actuou como meio privilegiado de difusao cultural. Chamamos, agora, a todos os livros escritos nos primérdios desta nova era da informagao incundbulos, palavra que significa “bergo”. integrar, no contexto atras referido, a renovacao cultural renascentista O termo “Renascimento” ou “Renascenga’ (criado por Vasari no século XVI) parte da ideia de que, nos séculos XV e XVI, a Europa fez renascer toda a cultura greco-latina, a qual suposta- mente havia sido esquecida durante a Idade Média. Porém, o Renascimento comporta uma mudanga mais abrangente (e mais lenta do que se pensava) em termos civilizacionais. E certo que a Antiguidade Classica (Grécia e Roma) foi o grande modelo dos humanistas (intelectuais) do Renascimento: 6 um facto observavel, nomeadamente, na arte e na inspiragao em filésofos ‘gregos. No entanto, em diversos campos os renascentistas foram absolutamente inovadores, fazendo dessa época, como afirma 0 historiador e critico de arte René Huyghe, “uma dessas fases supremas de equilibrio e plenitude que parecem, de momento, to sdlidas que se acredi- ta serem definitivas”. Distinguir os principais centros culturais da Europa do Renascimento A Italia, ou, melhor dizendo, as cidades italianas (uma vez que a Italia nao era ent&o - e s6 0 foi a partir do século XIX - um reino unificado), podem ser consideradas o primeiro centro cultu- ral do Renascimento. Nos Paises Baixos, sob o impulso dos duques da Borgonha, foi estimulada a criatividade de numerosos pintores, enire os quais Jan Van Eyck, inventor da técnica de pintura a dleo. Jé no século XV existia um movimento europeu de circulagao de pintores flamengos entre a Itélia (onde quase todos iam aprender a arte da pintura), os Pafses Baixos e os mais diversos paises da Euro- pa. Também originario dos Paises Baixos, Erasmo de Roterdao ficaria conhecido como um exem- plo modelar do humanista do Renascimento, devido aos seus escritos plenos de espirito critico. Em Franga, destacaram-se Paris e Liéo como lugares centrais do dinamismo renascentista, apoiado por Francisco |. O Império Germénico, berco da invengao da imprensa, desenvolveu centros de Humanismo em varias cidades e universidades (por exemplo, a universidade de Nuremberga ou a cidade de Colonia). Os pintores renascentistas Diirer e Holbein so originarios da Alemanha A Inglaterra notabilizou-se pelas universidades de Oxford e Cambridge, salientando-se, entre os seus humanistas, Thomas More, autor de Utopia ‘A Peninsula lbérica nao foi allheia ao movimento humanista, destacando-se, nomeadamente, © Colégio das Artes e Humanidades, criado por D. Joao Ill em Coimbra (1547). Na Hungria, a Biblioteca Corviniana deveu-se & acgao impulsionadora do monarca Matias Corvino. Na Polonia, 0 rei Casimiro IV estimulou a difusao cultural, cabendo & Universidade de Cracé- via um importante papel. Polaco era, também, Nicolau Copérnico, autor da teoria heliocéntrica. Reconhecer o papel inspirador de Italia A Itélia tinha a seu favor, no papel precursor que ocupou no Renascimento, trés factores de peso: por um lado, a heranga, em solo préprio, dos vestigios da cultura greco-latina que serviu de modelo ao novo movimento cultural; por outro lado, um passado histérico de sucesso eco- némico, ja que as cidades italianas dominaram, ao longo da Idade Média, os principais circui- tos mercantis de ligagdo entre a Europa e 0 espago extra-europeu conhecido; finalmente, e em ligagéo com o anterior aspecto, a presenga de familias ricas (por exemplo, os Médicis), muitas vezes ligadas ao poder religioso (caso do Papa Ledo X, ele proprio um Médicis) que apoiaram financeiramente os artistas, praticando o mecenato. Desta forma, varias cidades italianas tornaram-se importantissimos pélos culturais, destacan- do-se: Florenga - cidade natal de figuras como o sabio Pico della Mirandola, 0 arquitecto Brunelles- chi, 0 escultor Donatello, o pintor Boticelli ou o génio multifacetado Leonardo da Vinci, Napoles ~ reino onde se destacou Lorenzo Valla. Roma ~ indissociavel da obra de Rafael e de Miguel Angelo. Veneza - além da sua famosa escola de pintura, a que se ligam nomes como Tintoretto & Ticiano, distinguiu-se pelas suas oficinas tipograficas. Identificar inovac6es e sinteses culturais E necessario ter bem presente que, apesar de fortemente inspirados pela cultura dos antigos gregos e romanos (Antiguidade Classica), os homens do Renascimento nao se limitaram a copiar © seu modelo: intervieram na arte e na cultura movidos pelas preocupagées do seu tempo. Desta fusao entre a influéncia greco-latina e as diversidades regionais nasceram sinteses cultu- rais de grande interesse. Destacam-se, nomeadamente: —as construgées manuelinas em Portugal (por exemplo, a Torre de Belém): associam uma decoragao arcaizante a elementos maritimos evocadores das viagens de descobrimento (cordames, algas, corais...); —08 castelos do vale do Loire (por exemplo, 0 castelo de Chambord): associam a decoracéio de gosto italiano as estruturas do gético francés. Relacionar o dinamismo civilizacional dos séculos XV e XVI com a “promocao do Ocidente” Hoje em dia tende a pdr-se de lado a nogao de que 0 Renascimento cortou com toda a tradi- 940 (nomeadamente religiosa) medieval, recuperando apenas o legado greco-latino. Os sécu- los XV e XVI ficaréo para sempre ligados @ um conjunto de transformagées que colocaram a Europa a um nivel equipardvel ao das avangadas civilizagées chinesa e muculmana daquele tempo. Destacam-se, sobretudo, como factores de dinamismo: —a produgao de grandes obras literérias escritas nao s6 em grego e latim, mas também nas linguas nacionais dos territérios onde eram produzidas; —onascimento do sentimento nacionalista; —0 desenvolvimento do individualismo;, —as reformas religiosas (protestante e catdlica); ~ a difusdo da instrugdo entre as classes privilegiadas; — 0 progresso econémico; a descoberta (e exploragao econémica) do Extremo Oriente e da América; —a enorme quantidade de inventos ou aperfeigoamentos técnicos; —areviséo de conhecimentos cientificds sobre o Homem e 0 universo. Em suma, 0 Renascimento consistiu, nas palavras do historiador Jean Delurneau, no “grande momento da promogao do Ocidenie". Destacar a especificidade do contribute cultural ibérico para a sintese renas~ centista O principal contributo da Peninsula Ibérica para o Renascimento consistiu, por um lado, na descoberta do Mundo, através das viagens de navegagao e, por outra lado, no dominio do tra- fico comercial & escala mundial, transferindo o centro da economia do mar Mediterraneo para 0 oceano Atlantico, 0 cosmopolitismo das cidades hispanicas - importancia de Lis- boa e Sevilha Interpretar 0 cosmopolitismo de Lisboa e Sevitha Lisboa - No século XVI, a cidade de Lisboa viveu o seu periodo aureo. Herdeira de uma tradi- cao comercial, a cidade beneficiou da expansao ultramarina portuguesa. O seu espago urbano expandiu-se, enquanto o contingente populacional aumentou: no final do século XVI, Lisboa, com os seus 150 milhares de habitantes, registava uma populagao superior 4 de Roma e a de Amsterdao. A explicagao? Um intenso cosmopalitisme, isto é, uma capacidade de atrair gentes das origens mais diversas e por variadas razdes: mercadores, missionérios, soldados, escra- vos, bancatios, etc. Neste proceso, a cidade do Porto, que havia desempenhado um impor- tante papel na aventura dos Descobrimentos, evoluiu a uma escala menor, passando para segundo plano no desenvolvimento do Reino. Salientam-se os seguintes marcos de prosperidade na Lisboa quinhentista: 1. 0 inienso trafego, no porto de Lisboa, de navios de diferentes origens e envergaduras. 2. Os estaleiros da Ribeira das Naus, onde se construiam e reparavam as embarcagoes. 3. O afluxo de produtos ¢ de metais preciosos as Casas da Mina e da india. 4. A.vinda de mercadores e de banqueiros europeus a Lisboa. 5.A riqueza em conhecimentos geograficos, astronémicos e cartograticos proporcionada pelas viagens de descoberta 6. A expanséio urbana, nomeadamente através da abertura de novas ruas ligadas ao comércio da valorizagaio da zona ribeirinha e do Terreiro do Pago como entrada da cidade. A cidade ganha imponéncia pela construgao de edificios novos, de que sao exemplos a Casa da india (armazéns da Coroa), a Atfandega Nova, 0 estaleiro da Ribeira das Naus, o Armazém_ do Trigo, a colunata desde o Pago Real até ao rio e a Torre de Belém. E ao monarca D. Manuel | que devemos atribuir a reconfiguragao da cidade de Lisboa que, de cidade com cariz medieval, passa a metrépole cosmopolita na Idade Moderna, assumindo-se como verdadeira cabeca de um império (com prejuizo para o desenvolvimento do resto do pats). 7. Afirmagaio de Lisboa enquanto metrépoie politica. A corte itinerante de origen medieval dé lugar a fixagao, em Lisboa, de D. Manuel, cuja nova morada (9 Pago da Ribeira) alberga, no rés-do-chéo, os armazéns das Casas de Mina e da india. O sistema de monopdlio regio concentrava nas mos do rei a administragao dos tréficos ultramarinos. Sevitha ~ a sua importancia funda-se no controle da Carreira das Indias, isto 6, da rota dos metais preciosos que ligava a Espanha a América, continente descoberto por Cristévao Colom- bo em 1492. Sevilha adquire, no século XVI, 0 seu caracter cosmopolita, evidenciado nos seguintes aspectos: 1. 0 movimento portuario — 0 porto de Sevilha tinha um importante papel mercantil no s6 na comercializagéo dos produtos americanos (ouro, prata, aguicar, plantas tintureiras, cou- ros), mas também na ligagao entre as cidades italianas e a Flandres, a Inglaterra, a Breta- nha e 0 Norte da Europa. Era, além disso, base naval da armada castelhana, dada a sua localizagao privilegiada, invulneravel aos ataques de piratas. 2. A riqueza da cidade em homens (era a mais povoada das cidades de Castela, contando 150 milhares de habitantes em 1600, 0 equivalente & populagdo de Lisboa na mesma data). 3. A riqueza em bens alimentares — no vale do rio Guadalquivir obtinha-se 0 azeite, o vinho @ 0 trigo que forneciam as expedigses a América. 4. A tradigao comercial - a cidade de Sevitha (tal como Lisboa) estava virada para as trocas desde a época medieval; era ponto de passagem obrigatéria entre o Norte de Africa e 0 reino de Granada, por um lado, e entre as repiiblicas italianas e 0 Norte europeu, por outro lado. 5. Os conhecimentos de astronomia e de cartografia legados pelos Muguimanos (cuja pre- senga foi longa e marcante, apesar da sua expulstio em 1492) e Judeus. Um exempio: 0 astrolabio, essencial 4 navegacao, foi difundide pelos Mugulmanos. A Casa da Contratagao (1803), além de controlar 0 tratico com as Américas, albergava um centro de pesquisa néu- tica, preparando pilotas ¢ guardando ciosamente as informagées valiosas nos dominios car- togréfico e néutico. 6. A riqueza em ouro e prata proveniente da América — duas vezes por ano, a Carreira das Indias partia para os portos de Vera Cruz (México) e Cartagena das indias (Colombia), locais de chegada das riquezas da América Central e do Sul e das Filipinas. Cerca de 150, chegavam a Espanha mais de 40 toneladas de ouro, enquanto nos finais do século XVI a prata era a principal importacdo, atingindo cerca de 2500 toneladas no Ultimo decé- nio do século XVI! Esta “injecg&o" de metais preciosos, 4 qual esta associada a inflagéo dos precos, mas também dos lucros, impulsionou o desenvolvimento da Espanha e 0 capi- talismo comercial europeu. 7.0 controlo, a partir da América, da rota do Extremo Oriente (rota do Galedo de Manila) que unia a Espanha a Asia, através das Filipinas. As pérolas e especiarias das Filipinas seguiam de Manila (Filipinas) para Acapuleo (México) até & cidade de Vera Cruz (México), 8. A renovacao urbanistica - para acompanhar o estatuto de cabega de um Império, funda- ram-se instituigdes novas, tais como a Casa da Contratagéo de Sevilha (através da qual 0 monarca geria 0 monopélio régio sobre a exploragao dos metais desembarcados) e o Con- sulado do Comércio (1534), representante dos interesses dos financiadores privados da politica real. 9. © poder, a nivel internacional, dos Reis Catélicos, monarquia centralizada que se tornou simbolo da pujanga econémica de Castela, A Espanha, unificada desde 1492, através da alianga dds coroas de Aragao (D. Fernando) e de Castela (D. Isabel), assumiu 0 comando das viagens de descoberta, atingindo 0 auge com os reis Carlos V ¢ Isabel de Portugal. O seu filho, Filipe Ii, viria a tomnar-se Filipe | de Portugal, em virtude da politica de unides matrimoniais ibéricas, Esquema SECULOS XV-XVI EPOCA MODERNA RENASCIMENTO: ~ Cidades italianas - Europa VIAGENS _ DE NAVEGACAO: ~ Portugueses - Espanhdis da certografia ~ Descoberta do mundo ~ Mecenato - Hurnanismo ~Racionalidade ~ Antropocentrismo| ~ Tecnicas nauticas |, | Imprensa - difusao cutturat - Progresso ~ Classicismo tt . Cosmopolitismo: ~ = Lisboa Promogao do Ocidente” - Sevitha ee an

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