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SEMINÁRIO PRESBITERIANO DO SUL

FLÁVIO CARDOSO DE PÁDUA

O SAGRADO – RUDOLF OTTO

Campinas
2021
REFERÊNCIA DO LIVRO
OTTO, Rudolf. O sagrado: aspectos irracionais na noção do divino e sua relação
com o racional. São Leopoldo: Sinodal/EST; Petrópolis: Vozes,2007.

O sagrado é um livro (224 páginas) escrito pelo renomado teólogo alemão,


Rudolf Otto (1869-1937), e publicado pela primeira vez em 1917. Este livro tem
o objetivo de expressar da melhor maneira o que é o sagrado ou o numinoso (de
acordo com Otto), dentro das diversas religiões de acordo com suas experiências
e, também, expor alguns dos aspectos do nume, dentre os quais estão:
tremendum, majestas, mysterium, fascinum, augustum, etc. Além disso, o autor
trabalha sobre as formas de manifestação do sagrado ao longo da história e, em
especial, nos períodos do Antigo Testamento e Novo Testamento, e como essa
divinação foi crescendo ao longo da história do cristianismo até os dias de hoje.
No primeiro capítulo, o autor trata sobre as ideias de religiões racionais e
os problemas que surgiram no ambiente religioso devido ao abafamento do
aspecto irracional. No início, ele afirma que adquirir conceitos racionais sobre a
divindade, não faz com que o “objeto divino” se esgote por completo, mas, antes,
que é necessário, para qualquer religião, entender esses atributos divinos como
sintéticos, apenas, com a finalidade de compreende-los de uma maneira mais
honesta. O autor ainda discorre sobre a diferença entre o racionalismo e as
religiões em si. A diferença de ambos se encontra na qualidade do estado de
espírito, pois, um tem uma devoção e sentimento religioso maior que o outro. O
autor ainda salienta que, a ortodoxia é, até certo ponto, a mãe do racionalismo,
devido, essa, dar mais ênfase ao aspecto racional, ignorando o irracional como
se, esse, não fizesse parte do aspecto religioso. Essa tendência prevalece na
atualidade, quando se trata da ciência da religião (e áreas afins), servindo como
arma para atacar a religião em seu aspecto racional.
Já no capítulo dois, o autor identifica um grande problema na área da
religião: qual o melhor termo para expressar a ideia da manifestação que o ser
humano tem na presença do “sagrado”? Um dos problemas se encontram na
própria palavra “sagrado”, pois essa, não pode ser desvinculada de seu termo
moral (devido associações dessa palavra ao longo da história com aquilo que é
o bem absoluto) e, um outro, no termo heilig (derivados das religiões semíticas:
no hebraico qadôsh; no latim sanctus, no grego hágios), conhecido com maior
precisão como sacer, que sofre do mesmo problema da palavra “sagrado”. Por
isso, o autor vê a necessidade de designar outro termo para se referir a essas
manifestações, termo esse que desconta os aspectos morais e racionais: o
numinoso. Contudo, o autor deixa bem claro que esse termo não pode ser
definido de maneira rigorosa, tornando possível a discussão do mesmo. O autor
ainda informa que o termo, o numinoso, não é algo que pode ser simplesmente
definido como aquilo que ele é, mas, pelo contrário, é melhor definido
comparando-se com aquilo que ele não é. No final desse capítulo, ele explica
também que essa manifestação do numinoso não é algo que pode ser ensinada,
mas, estimulável como tudo aquilo que provém do espírito.

Aqui, no capítulo três, o autor faz uma divisão em duas partes. Na primeira
parte, ele faz um apelo para que os seus leitores reflitam se já experimentaram
alguma manifestação do numinoso (sem isso, seria difícil prosseguir na leitura),
pois, o conhecimento experiencial supera em muito o conhecimento teórico.
Essa experiência não seria uma simples contemplação de um êxtase moral, mas,
sim, do sentimento que o antecede - o próprio cristianismo reconhece que
sentimentos morais estão contidos em outras áreas, não sendo necessário uma
manifestação do solene. Na segunda parte, o autor traz uma referência de
Schleiermacher, onde esse, afirma que o sentimento de dependência é o que
tem feito as pessoas procurarem a manifestação do nume. Porém, Otto faz dois
reparos na afirmação de Schleiermacher. O primeiro reparo é que esse
sentimento é uma mera analogia e ele faz uma diferença apenas de grau e não
qualitativamente intrínseca (absoluto x relativo). Abraão, por exemplo, quando
encontra com Deus, tem esse sentimento de dependência (ou, melhor dizendo,
sentimento de criatura), onde ele se afunda em nulidade perante aquilo que se
exalta sobre a criação. Ainda assim fica impossível a conceituação dessa
experiência, pois o caráter dessa manifestação avassaladora é maior que a
nulidade da criatura. Isso leva o autor para o segundo reparo, onde,
Schleiermacher afirma que é possível achegar-se ao divino por uma dedução
desse sentimento, mas, esse sentimento de criatura (autopercepção do homem
perante o nume), é somente uma sombra desse outro elemento (receio) que não
provém do homem. Portanto, Otto afirma que esse objeto que causa o receio
seria a presença do nume e somente por aplicação desse “objeto” a psique
recebe o receio (então esse não pode ser o causador da busca do nume).

No capítulo quatro, o autor levanta o maior questionamento até então: o


que é o numinoso? É impossível limita-lo a conceitos, mas de maneira análoga,
pode ser melhor expresso como um sentimento desencadeado na psique
humana - a partir do contato desse com o objeto numinoso - que o autor
denomina de mysterium tremendum (estado de espírito em devoção profunda -
êxtase). Esse sentimento começa de uma maneira grosseira (demoníaca,
selvagem) até ser totalmente refinado (sentimento religioso - contato com o
sagrado). Esse sentimento é subdividido pelo autor em: aspecto tremendum -
sentimento maior que temor; aspecto avassalador - humilhação da criatura
perante a majestade do numinoso; aspecto enérgico - a energia do numinoso,
sentida na ira (vivacidade, emoção); e, por fim, aspecto mysterium - o totalmente
outro, o desconhecido e indecifrável (irracional).

Já no quinto capítulo, o autor cita algumas obras literárias que tendem


elevar a glorificação do Deus Irracional, por meio de conceitos que tangem ao
racional. Esses poemas afirmam vários atributos do numinoso, como por
exemplo: Santo, Excelso, Justo, Criador, Grande, Glorioso, Eterno, Insondável,
Onipotente, Onisciente e Onipresente.

No capítulo seis, o autor retrata sobre outro aspecto do numinoso, o


aspecto fascinante. O numinoso ao mesmo tempo que é amedrontador é
também atrativo em si. Se por um lado, a ira divina causa o tremor e o temor, por
outro, o amor, a compaixão e a misericórdia são alguns dos conceitos que trazem
à tona o aspecto fascinante do numinoso (exaltação dos bens de salvação). Esse
sentimento começou a fazer com que os seus adeptos quisessem se encher do
numinoso por meio de consagração e conjuração - entre os xamãs, o termo foi
designado como possessão. Essa presença do numinoso faz com que aquele
que tem contato com o nume sinta uma paz que excede o racional. Além disso,
a presença do numinoso preenche o vazio do existencialismo, chamado de fundo
d’alma, pelos místicos. Esse aspecto fascinante é exuberante (correspondente
ao além), em outras palavras, uma experiência que não atrela o pecado e a culpa
(mesmo não os ignorando) ao que se aproxima do desconhecido. No budismo,
poderia ser entendido como o nirvana e no cristianismo como graça (essa última,
melhor desenvolvida).

No sétimo capítulo, o autor revela um termo diferente do que foi visto até
aqui, o termo deinós (em alemão, ungeheuer). Esse conceito racionalista chega
mais próximo do sentimento assombroso (ou aquilo que é extremo, excelso). O
autor ainda cita Goethe, que trata desse termo como aquilo que é monstruoso
(aterrador). Esse aspecto, além de inconcebível à psique, é também estupendo
(estranho para o racional).

O capítulo oito é dividido em três partes: harmonia de contrastes; lei de


associação de sentimentos; e esquematização. Na primeira parte, o autor volta
a falar sobre o aspecto fascinante, porém agora como o arrepiante e prodigioso.
Esse conceito é expresso como o excelso (supramundano), onde, esse, ao
mesmo tempo que espanta, atrai. Na segunda parte, o autor informa sobre o
equívoco de “transformação” de um sentimento para outro, pois, os sentimentos
(ou ideias) x e y são diferentes qualitativamente, portanto, eles não são
transformados de um para o outro (como se acredita na teoria evolucionista),
mas, antes, um sentimento pode fazer com que outro seja acionado, e, assim,
aquele que experimenta o contato com o numinoso, passa de um sentimento
para outro (enquanto um diminui e outro aumenta). Aí então, existe uma
substituição e não transformação. O autor afirma que de todos os aspectos, o
excelso é o que mais suscita o sentimento do numinoso. E, por fim, o autor
explica como alguns sentimentos podem ser tão intimamente ligados, que são
quase fundidos (sentidos ao mesmo tempo), por tempo indeterminado (até
mesmo permanente). Por exemplo, se o excelso suscita o sentimento do
sagrado, o primeiro, pode ser sentido juntamente do segundo, sem necessidade
de abrir mão do primeiro sentimento. O autor também tenta distinguir os
sentimentos semelhantes do racional e irracional, dando ao leitor o exemplo do
sexo. No sexo, o sentimento vem do comportamento animal (inferior) para uma
classe mais aprimorada e amorosa (superior), enquanto o sentimento numinoso
vem de cima para baixo (do superior para o inferior - do irracional ao racional).
Um outro exemplo dado é o da música, onde essa, tem o seu lado irracional
aguçado e somente aquele que é tocado por ela, consegue entender a sensação
da experiência, inefável para os demais (porém fica claro que o irracional da
música é inferior ao do numinoso).

No nono capítulo, o autor informa que toda a criatura, em contato com o


numinoso, sente sua natureza profana. E isso, não por meras transgressões
morais, mas simplesmente por conta da manifestação numinosa que transcende
o entendimento humano. O valor numinoso é totalmente outro, elevado no mais
alto grau que o ser humano poderia imaginar, daí surge um novo aspecto:
augustum. O aspecto fascinum é beatífico para quem o busca, já o aspecto
augustum é beatífico para si mesmo, sendo, portanto, merecedor de adoração e
devoção. Além disso, o autor relata que a manifestação numinosa faz com que
o experimentador sinta a necessidade de uma remissão, visto que se sente
totalmente profano na presença do sagrado. Essa remissão (perdão dos
pecados, termo mais preciso) é quando o experimentador se sente livre do peso
de sua consciência (devido ser totalmente oposto ao numinoso e por suas más
obras), visto que ele, por si mesmo, não consegue compreender o pecado de
forma plena. Sendo assim, o cristianismo é a religião mais bem desenvolvida,
visto que apresenta a proporção plena de remissão dos pecados – na pessoa de
Jesus Cristo – de maneira mais plausível do que qualquer outra religião (se
tratando dos parâmetros religiosos).

Agora, no capítulo dez, o autor volta a falar do irracional. O irracional, aqui,


não é tido como algo vago (obscuro por apenas um período), mas, sim, um
evento singular e profundo, que foge de toda interpretação inteligente (é a
verdade pura, acessível apenas pelo sentimento). Na manifestação do nume, o
ser humano tenta extrair do ambiente sentimental tudo o que for possível para o
lado da razão, criando assim, o máximo de ideogramas possíveis (formando
doutrinas sadias). Porém, a obscuridade que ainda fica ao redor de toda a razão
(verdade nua e crua), isso é o que o autor chama de irracional.

Já no capítulo onze, o autor busca explicar alguns meios de expressões


que se fazem perceber a presença do numinoso. Em primeiro lugar, ele retrata
sobre os meios diretos de expressão, isto é, quando se têm acesso à presença
do numinoso. É impossível explicar a alguém, com meras palavras, aquilo que
só se pode sentir experimentando, ainda mais para alguém que não compreende
a presença numinosa do capítulo seis de Isaias (é como querer que um surdo
desfrute de uma sinfonia de Beethoven, por exemplo). Porém, quando palavras
são ditas por intermédio de uma pessoa cheio do Espírito (junto de suas
expressões, entonações e emoções), a eficácia chega a ser muito semelhante
da experimentação da presença do nume, dando indícios da existência do
mesmo (porém, ainda não revela o objeto por completo). Em segundo lugar, o
autor retrata sobre os meios indiretos de expressão do numinoso, onde podem
ser encontrados por meio das artes. Essas artes se expressam de diversas
formas: missas de Beethoven; arquiteturas orientais (pátios vazios expressando
o aspecto excelso) e ocidentais (igrejas com modelos góticos da idade média);
imagens de Buda; pinturas no período de T’ang e Sung, etc. Por meio delas é
possível entender alguns aspectos do numinoso (principalmente o excelso),
mesmo que uma pessoa ainda nunca tenha tido uma experiência religiosa por si
mesma.
No capítulo doze, o autor destaca como o numinoso é apresentado na
religião do Antigo Testamento. Pode-se observar, primeiramente, o
amadurecimento da fé israelita contrastando com o medo de Êxodo 4 (quando
Moisés quase perde sua vida pelo próprio Deus) com as reverentes devoções
nos Salmos, por exemplo. Em segundo lugar, o autor mostra o contraste entre
Javé e Elohim, onde o primeiro prepondera sobre o familiar racional e o segundo
sobre o lado racional do aspecto numinoso. À medida que avança em
amadurecimento, a religião mosaica passa por um processo de moralização e
racionalização do numinoso (até onde seria possível). Em Isaias, por exemplo,
podemos observar claros conceitos de Deus como bom, santo, etc. Porém,
filósofos da época lutaram contra os racionalistas unilaterais, defendendo o
irracional (o que foi bom), mas, por outro lado, pecaram quando trataram do
antropomorfismo de forma literal. Por fim, o autor relata sobre a maravilhosa
expressão do numinoso em Jó (em especial, no capítulo 38), onde pode ser
percebido seu aspecto fascinante, myrum e augustum.
Já no capítulo treze, o autor fala sobre o numinoso no Novo Testamento.
Primeiro, informa como Cristo e seu evangelho tornou a racionalização e a
humanização da ideia de Deus como algo mais esclarecedor para a religião
(religião cada vez mais rica em detalhes do numinoso, sem desprezar o
irracional). O reino vindouro é numinoso em cada um de seus aspectos (seus
futuros moradores são santos, separados daquilo que é profano). O dono desse
reino é o próprio Deus, o Pai do Senhor Jesus Cristo, e, também, dos seguidores
de Cristo (Deus atrativo e temível). O próprio sentimento de temor de Jesus
Cristo retrata como é terrível cair nas mãos do Deus Vivo (ao mesmo tempo
sendo maravilhoso estar debaixo de Seus cuidados). Na perspectiva do apóstolo
Paulo, o autor consegue notar a ira de Javé contra o pecado (essa ira já se inicia
no momento em que Deus entrega o pecador para pecar deliberadamente). Em
Paulo é possível notar também a eleição (graça experimentada) e predestinação
(direcionamento do arbítrio humano). O próprio islamismo compreende esse
aspecto da predestinação (o cristianismo, o supera fortemente no aspecto
moral). A predestinação é altamente atacada devido ao fato de não conseguir se
exprimir de forma plena como ela verdadeiramente é. Paulo também fala sobre
a depreciação total da carne, possível origem do sentimento criatural em relação
ao sagrado. Por fim, o autor afirma que em João, é possível observar a ira de
Deus, o aspecto fascinante (luz e vida) e também um divisor de águas de
qualquer religião, de que Deus é Espírito e está acima de qualquer aspecto
racional.
No capítulo catorze, Otto informa os aspectos do numinoso contidos em
Lutero. Lutero foi um dos fortes defensores do aspecto irracional, batendo de
frente com o escolasticismo de sua época (fortemente influenciados pelo
aristotelismo ou racionalização). Para Lutero, ter um Deus é confiar nEle de todo
o coração (aspecto fascinante). Mas ao mesmo tempo, muitas vezes se escondia
atrás das muralhas das Escrituras para se refugiar da ira (aspectos tremendum).
Chega até mesmo dizer, de maneira equivocada, que o aspecto arrepiante é
Deus em Si. Em seus escritos, trata de Deus como um fogo voraz e consumidor
(aspecto demoníaco). E também podemos observar o aspecto augustum,
quando ele entende que perante Ele, tudo se cale e se dobre. Lutero entendia
também o lado paradoxal (majestas) do Senhor. Otto, inspirado por Lutero,
entendeu pela primeira vez o que era o numinoso, em relação ao racional.
No capítulo quinze, o autor fala sobre a evolução da religião. O
aprofundamento no numinoso necessita ser racional e de boa moral. O santo
passou a ser associado a moral (santo = bom), por isso, sempre que se fala do
sagrado, está também sendo falado daquilo que é bom. O aspecto evolutivo da
religião se dá pela seguinte forma: primeiramente, tem-se o sentimento primitivo
(demoníaco), receio. Depois, ele é enobrecido passando do receio para o
assombro, e do assombro para a adoração (de deuses e depois do Deus
verdadeiro), tendo as falsas correspondências afastadas. Assim, o numinoso
atraí para si os ideais morais da sociedade e do indivíduo, tornando-se ético e
moral ao povo que o venera.
No capítulo dezesseis, Otto traz a primeira parte da categoria do numinoso
a priori. O sagrado é composto por aspectos irracionais e racionais, ambos, com
conhecimentos a priori. O conhecimento é manifesto por meio das experiências
de um indivíduo, porém não é possível afirmar que todo o conhecimento tenha a
sua origem na experiência. O conhecimento empírico é diferente do
conhecimento que ocorre por meio de um estímulo exterior que estimula a
disposição do indivíduo buscar a conhecimento. Para o autor, o conhecimento
existe na psique e depende dos elementos exteriores e interiores oriundos da
existência.
No capítulo dezessete, o autor trata sobre o surgimento histórico da
religião, onde pode ser observado em primeiro lugar, a pré-religião (que ainda
não tinha nada de religioso em si) como uma antessala para a religião, dentre os
quais estão: feitiçaria (atos irrefletidos); culto aos mortos (medo e nojo);
imaginário de almas (assombrações e receios numinosos confusos); poder
(ciência, conhecimento); natureza e astros (atribuídos ao nume); folclore
(narrativas e mitos); etc. O autor também informa que para se criar uma religião
faz-se necessário um “vidente” (sacerdote) para trazer à luz o numinoso. Aquilo
que é considerado como puro e impuro pelo ser humano (mecanismos de
proteção), foram sendo refinados, ao passar dos anos, até passar para o
ambiente do nume. Portanto, os primórdios de uma religião se dá quando se
experimenta de maneira prática a presença do “totalmente outro”, do irracional,
e sobrenatural.
Já no capítulo dezoito, o autor retrata sobre os aspectos brutos. Quando
o numinoso aparece de forma paulatina e/ou em ocasiões rompantes, pode-se
gerar confusões a respeito de seus aspectos, levando o experimentador ao
sentimento de receio (medo demoníaco). Isso gerou confusão entre os
estudiosos, que pensavam que as religiões mais primordiais adoravam
demônios a princípio. Somente através da revelação plena do nume, torna-se
possível a compreensão dos seus aspectos à psique. Para apreender sobre, faz-
se necessário ideogramas, que tentam trazer à luz um pouco daquilo que habita
no irracional.
No capítulo 19, o autor trata da segunda parte dos pressupostos do
sagrado (irracionais e racionais). A moralização do sagrado é um pressuposto,
pois, é impossível comprová-la empiricamente. De onde surge a ideia de uma
tribo, de que um ser divino se comprometeria com ela, se não do pressuposto da
moralização? O autor cita o diálogo de Sócrates e Adêimantos como um exemplo
de que Deus não necessita ser provado, mas, sim, reconhecido. Isso é um
conhecimento a posteriori. Como pressuposto (a priori) ninguém alcançou o
conhecimento pleno do sagrado. O autor também informa, por meio de citações,
que toda consciência foi gravada com o discernimento de que Deus existe. Até
mesmo quem diga que Ele não exista, precisou usá-Lo para, então, negá-Lo.
Porém, ninguém pode expulsar o sagrado de sua psique. Por fim, seguindo os
pressupostos, o cristianismo construiu sua base em cima do irracional, com
estruturas (conceitos) mais puras e adequadas do que qualquer outra religião,
tornando-se uma religião superior às demais.
No vigésimo capítulo, o autor traz o assunto sobre as manifestações do
sagrado. Uma coisa é saber da existência do sagrado (a priori), outra, é
experimenta-lo (possibilidade em que a religião acredita). Uma das formas de se
entender a presença do sagrado é por meio de sinais, em outras palavras, por
meio do sobrenatural (aquilo que foge ao natural). Esses sinais despertam o
sentimento do sagrado no ser humano (cognições, não intuições). O Espírito
Santo, por exemplo, é aquele que revela ao ser humano que a Escritura é
sagrada e inspirada. Otto, passa a chamar de divinação a faculdade de
reconhecer o sagrado.
No capítulo vinte e um, o autor fala sobre a divinação no protocristianismo,
onde explica que a história da religião bíblica e Cristo são os seus receptáculos
mais dignos (Cristo o maior). Cristo é a revelação da divindade plena, Ele não é
apenas o sujeito da ação divina, mas o objeto em si. Ele não precisava falar de
Si próprio, a Sua própria essência e obras davam testemunho por Ele (o autor
aponta a passagem em que Pedro afirma ser Ele o Cristo). Até os dias de hoje,
muitos “santos” têm se levantado e apenas 2% são verdadeiros quanto sua
“santidade”. Eles podem tentar entender o numinoso por si e fundar outras
religiões. Porém, o que houve no período de Cristo foi infinitamente maior do que
qualquer outro evento religioso (comprovados pelas Escrituras e testemunhos).
Isso, pelo fato de que Cristo é a manifestação plena do nume (sendo mais eficaz
quanto a conceitos de como se achegar a Deus).
No penúltimo capítulo, o autor fala sobre a divinação no cristianismo atual.
Os cristãos de hoje sentem a mesma experiência de Cristo e suas obras como
os primeiros cristãos experimentaram? O autor cita uma história onde um
missionário pregara com certa dificuldade pela língua falada, mas mesmo assim,
as pessoas foram tocadas de forma convincente. Quando o Espírito opera há
uma manifestação do Sagrado (só reconhece as coisas do espírito, quem é do
Espírito). Outra indagação feita pelo autor é se essência do cristianismo
prevaleceu depois de tantas reformulações. Isso pode ser observado
positivamente, sendo que o foco de remissão de pecados, salvação, filiação e
vida eterna não se ausentam da doutrina cristã atual. A religião de Jesus Cristo,
sempre foi redentora (até mesmo no antigo Israel), ou seja, sempre foi uma
doutrina de graça (como o grão de mostarda que se transforma, mas não muda
daquilo que deveria ser, sua essência). O cristianismo, em muito supera todas
as religiões, visto que em todos os aspectos religiosos, fornece ideogramas mais
completos e mais sofisticados e plausíveis (através da revelação escrita). Além
disso, se o pressuposto de que o sagrado exista é verídico, é da maneira cristã
que Deus certamente se revelaria. O próprio Cristo, fornecedor de cobertura e
expiação, é a manifestação do numinoso em si mesmo. A religião que é superior
deve mostrar melhor os aspectos do sagrado, e nisso o cristianismo está a largos
passos das demais religiões. Qualquer um que tente atacar essa fé religiosa,
baseando-se na experiência, não será bem-sucedido, pois suas armas não
podem alcançar aquele que não se pode ser alcançado (ainda mais por esses
que nem estão na presença do numinoso).
No último capítulo, o autor fala sobre o pressuposto (a priori) religioso e a
história. Comenta também sobre o sagrado a priori em oposição ao sagrado
como manifestação (revelação interior x exterior). Como princípios para
evidências internas no ser humano, só podem ser utilizados pressupostos, pois
nada na história ou na psique pode explicar algo que supera o racional. A religião
se torna um estímulo e predisposição na história. Estímulo para que busque o
sagrado e predisposição para reconhecer as manifestações do numinoso na
história (quando estímulo e predisposição têm comunhão com o sagrado, a
psique e a vontade estão juntas). Toda religião é histórica, e nenhuma vem a ser
inata. Todas as cognições são despertadas nas pessoas, mas não nascem de
dentro delas, mas, sim, através da história e por outras pessoas. Ele finaliza o
capítulo com alguns patamares religiosos. O primeiro é aquele que só pode
receber algo do Espírito. O segundo (profeta), e superior ao primeiro, é aquele
que carrega em si o Espírito e consegue propagar a religião, e, o terceiro e mais
importante, é Aquele que consegue ter a plenitude do Espírito e ser o “objeto” de
manifestação do numinoso: O Filho!
O sagrado é um excelente livro para poder esclarecer como o irracional é
fundamental para a religião. Os racionalistas, muitas vezes, têm mais
atrapalhado em seus conceitos fechados do que ajudado. Esse livro nos dá uma
ótima perspectiva das religiões no geral, ajudando até mesmo no aspecto
evangelístico, graças a muitos detalhes revelados pelo autor. Leitura
extremamente complexa, porém, um conteúdo extremamente gratificante.
Recomendo aos futuros leitores que o leiam, e o leiam mais de uma vez, para
poder absorver ao máximo o que essa obra tem a nos oferecer.

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