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o-cnePdscuco po Deven do que de modelo de responsabilidade. Af reside © novo dado POs-moralista: longe de ser a norma ideal, a reactivago do de~ ver absoluto provoca a reprovagao, a indignagao colectiva, ‘moralismo tomou-se uma figura sinénima, socialmente, de t rorismo ¢ de desumanidade, Na era pés-moralista predomina ‘uma procura social de limites justos, de responsabilidade calcu- Jada, de leis firmes capazes de proteger os direitos de cada um, no 0 espirito do fundamentalismo moral. Queremos o respeito da ética sem a matilagao de nds proprios e sem obrigagbes difi- ‘eis: 0 espirito de responsabilidade, nilo © dever incondicional Depois das liturgias do dever demitirgico, eis-nos na hora do ‘minimalismo ético. ‘A mutagdo ps-moralista atravessa indistintamente todas as csferas relacionadas com o permitido e o interdito, com o bem ‘© com 0 mal. Mas nao é, em situagio nenhuma, tio manifesta ‘como nos dominios que dizem respeito as representages e pri- ticas do prazer. Em algumas décadas, passimos da civilizagio do dever para uma cultura da felicidade subjectiva, do dcio e ‘a cultura do sefflove que nos rege, em vez do antigo tema de repressdo ¢ de controlo dirigista dos costumes, as ‘exigncias de reniincia e de austeridade foram massivamente substitufdas por normas de satisfagao do desejo e de realizagio fntima, tal & a ruptura mais espectacular do ciclo ps-moralista. ‘Sem dévida, com as Luzes, a felicidade conseguiu impor-se como um ideal social, mas, na hierarquia dos valores, bem ‘como nas normas sociais efectivas, foi relegada para um plano secundério, sujeita como estava 4 ordem superior dos deveres de esquecimento de si pr6prio, Esta regulagao do primeiro mo- ‘mento demoeritico teve 0 seu tempo: a nossa época inverteu hhierarquia moralista das finalidades, © prazer autonomizou-se, fem parte, em relagdo as regras morais, 6a felicidade subjectiva que irriga abundantemente a cultura quotidiana. Cultura pés-moralista nlio quer dizer p6s-moral. Precisa- ‘mente quando o sacerdécio do dever ¢ os tabus vitorianos estio caducos, novas disposigbes véem a luz do dia, retomam-se 58 ‘08, EDEN ibigdes,reinserevem-se valores, dando a imagem de uma Je sem relagao com a que foi descrta pelos que despre- ‘a epermisividade generaizada>. iurgia do dever dilt- nfo tem rosto socal, mas os costumes ndo sogabram Anarquia: o benvestar e os prazeres Slo exallados, mas 4 30- Je civil estd vida de ordem ¢ de moderaglo; os direitos ectivos governam a nossa cultura, mas «nem tudo € perm > Erestabclecida uma ordem que jéndo passa pla repres- © pela idealizacao dos valores convengamo-non, a dissols- do sistema moralista nfo arrasta consigo a devassidio arvel eos «fluxos descodificados» da libido, 0 neo-indv smo ¢ simultaneamente hedonista e ordenado, nflamado Auionomia e pouco propenso aos excessos, aiérgico aos entossublimes © hostil ao eaose transpresses liberi A representacio catatofista da cultura individualist ps- 1a ¢ caricatural: a dindmica coleciva da autonomin, jectva € desorganizadorae auto-organizadora, ¢ capa de 4 partir de i propria, uma ordem social, cujo mo- ji nio € a obsigagio moral, nem mesmo 0 conformismo. wvante, aregulagio dos prazeres¢estabelecida sem obriga- nem seembes, através do caos aparents dos tomos Sociais ¢ diversos: o nco-individualismo é uma adesordem orga- bem-estar como mundo e como representagao Bem ao bem-estar AA civilizagao do bem-estar consumista constituiu o grande io histérico da ideologia gloriosa do dever. Ao longo da ‘metade do século, a lgica do consumo de massas dis- ‘0 universo das homilias moralizadoras, erradicou os im- vos rigoristas e engendrou uma cultura onde a felicidade ‘impée 20 mandamento moral, os prazeres ao proibido, a se~ 59 ocnePscuco vo beven dugio a obrigagio. sidades renunciow a santificacao dos ideias em beneficio dos prazeres renovados e dos sonhos de felicidade privada. Uma nove cillzago fol edit, «qual nko s¢ prope xn ‘Ao estimular permanentemente os valores do bem-estar in- dividual, a era do consumo desqualificou massivamente as for- ‘mas rigoristas ¢ disciplinares da obrigago moral, a liturgia do dever tonou-se inadequada a uma cultura materialista e hedo- hista, baseada na exaltago do eu e na excitagio da voldpia. «A felicidade, se eu quiser»: o culto da felicidade em massa veio ‘gzeneralizar a legitimidade dos prazeres e contribuir para a pro~ ‘mogao da febre da autonomia individual; simultaneamente, veio retirar a legitimidade as formas de pressio autoritéria, aS nor- ‘mas vitorianas, as injungdes inflexiveis ¢ solenes, caracteris- ticas do ciclo anterior, em prol da sedugio, da solicitagio publi- citéria, das mensagens euféricas e sensualistas. Torémo-nos alérgicos as prescrig6es artificiais, o espirito directivo das mo- ‘ais doutrindrias; na era p6s-moralista, a expressio do dever & bemolizada, os supermercados, o marketing, o eldorado do lazer foram o timulo da religiao do dever. A affluent society nio € a tinica ater trabalhado neste senti- do: factores intelectuais, filoséficos, sécio-culturais desempe- rnharam um papel essencial no processo histérico de desvalori- zacio do referente moralista. A difusio, ao longo dos anos 1960-1970, das ideias marxistas, freudianas, nietzschianas e es- truturalistas, ndo apenas nos eitculos intelectuais ¢ estudiosos ‘mas também, de uma forma mais generalizada, nos media, con- feriu uma legitimidade excepcional a relegaglo da ideologia do dever. As probleméticas da revoluglo, do desejo, da vida em li- berdade vieram substituir aretérica da obrigacio; a tematica da cexpressio individual e da emancipago sexual veio tomar o lu- C7 EDEN, EDEN ar da temética da virtude; o referente psicolégico substituiu a eologia culpabilizante. Por toda a parte as grandes figuras is da critica filos6fica da modemnidade foram br citadas e comentadas para desvalorizar os princfpios auto- fos e promover os valores liberais na vida privada, Foi toda Epoca que se empenhou em mandar as urtigas o discurso lienante, mistficado-mistificador da moral, associado a0 dio pequeno-burguesa, 2 anti-liberdade. Em do imperativo intelectual da «divida» e do anti-humanis- ‘te6rico, 0 discurso moral foi ecusado; em nome da liberta- individual e colectiva, a utopia politica-contestatéria varreu Jonge a wopia das cas alma. Enguantoo «boom» do a eee 05 valores anti-capitalistas tiveram © mesmo ccontra-moralista do que os mecanismos e estimulagdes apitalistas; © mundo dos objectos, o discurso anti-huma- ist, os movimentos contestatérios contribuiram, cada um de neira especifica, para precipitar a faléncia da era moralista, ‘democracias. ‘Ninguém 0 negaré: a hist6ria anunciou o fim do prazer dos len sixties. Hoje em dia, o referente ético vai de vento em. sito de damas protectoras e benfazejas ganhou uma legiti- social. Estaremos a assistir ao restabelecimento do sta- ‘uo ante? Nio_nos idamos:cuslaver ae sen a. eerves- o-cnertiscuto Do DevER ceabe as injungSes do dever numa sociedade obsidiada de satide de juventude, que difunde massivamente conselhos dietéticos cestéticas, desportivos e tuisticos, erdticos e psicol6gicos? «O Club Méditerranée: a melhor ideia desde a invenao da felici- dade»: o imperativo moral deixou de ocupar o centro das repre sentagées sociais, no lugar dos mandamentos severos da moral temos o psicologismo e a euforia do bem-estar. Os valores cari- tativos ¢ humanitirios podem beneficiar de um forte impulso de simpatia, ficam muito aquém em relaggo a superficie ocupa~ dda pelo hino ao ego e pelos estimulos consumistas. A felicida- de : para Ié da renovacio ética actual, a pesada ideolo- ‘de ou nada: para ld da renovacio ética actual, a pesada ideolo ia que orienta o nosso tempo € pds-moralista, dominada que é Pl Grcebees,dsciso cos snadas da felicidade e do eu, da sedugio e do rela ‘A cultura moralista pregava infinitamente a entrega indivi dual ¢ 0 dever. O que resta deles na hora das normas consumis- tas, recreativas e sensacionalistas? Hino as férias, entertainment lv, tle-msscen, lice epee -evasio e a violencia em zoom; onde se santificava a pureza das ‘das coisas: onde se_beatificava @ arandeza de se superar a si psn. tems. epntsma live. as.enmodiades do contort. ade cut [Nas nossas sociedades, 0s objectos cas marcas exibem-se mais do que as injungdes morais, a soli- idades & ar ao Bem. A era moralistati- ‘nha por ambigdo a disciplina do desejo, nds exacerbamo-1o; ela ‘exortava aos deveres de cada um para consigo mesmo e para com 08 outros, nés convidamos a0 conforto. A obrigacio foi ‘ubstituida pela seducio, o bem-estar torou-se Deus.e a publi- Cidade o seu profeta. O reino do consumo e da publicidade dio tum imagem feroz da cultura p6s-moralista as relagbes entre 10s homens sto menos sistematicamente representadase valor ‘adas do que as relagbes dos homens com as cosas: 0 primado 2 DEN, AEN ‘elagio homem/objecto sobre a relago homem/homem, ca- ristica da ideologia econmica modema’, anexou os sig- da vida quotidiana. Assim vai o futuro do dever, anuncian- fem tecnicolor o direito individualista a indiferenca em jo aos outros: «HA uma vergonha de se ser feliz face a ‘misérias» — escrevia La Bruyére; a publicidade, essa, quegam tudo.» especticulo pos moralsta da formaga) ‘com a grande imprensa moderna, desenvolveu-se uma ura espectfica que, em principio, exclui o juizo moral em sivo beneficio da objectividade dos factos, da imparciali- jectividade. Sem dvida, a imprensa de opinio nou, durante muito tempo, em muitos pafses, a imprensa informagao; sem divida, a interpretagao e a defesa de uma in levaram a melhor sobre a exposigdo dos factos; sem vida, ainda nos nossos dias, 0s comentérios exprimem jutzos valor. Surgiu uma cultura inédita, que foi depois massiva- te difundida, e que se pode qualificar como pos-moralista, orquanto se trata, antes de mais, de testemunhar, de estar a0 igo dos factos, nio de enaltecer ideas. A filosofia da infor- no & nem moralista —o ideal que a anima € exortar que é, € nio dizer 0 que dever ser —, nem amoral — 0 ‘excrcicio € comandado por um dever de verdade e de im- jalidade —, mas sim pés-moralista: 0 principio de neutrali- dade ¢ de objectividade destronou as ligdes de moral. A infor- ‘macio tclevisiva veio acentuar_ainda mais esta dimensio ‘pés-moralista: um noticirio televisivo € idealmente construido Tavis Dumont, Homo aequals, op ct pp 3-H 8 ‘OcREPUSCULO Do DEVER para lé do bem e do mab», requer uma rigorosa neutralidade de tom, «flashes» concisos, emissdo em directo, em tltima ané- lise, um desfile de informagoes sem comentérios nem interpre~ tages. Nao culpabilizar, nZo julgar, mas dizer tudo, mostrar tudo, expor todos os pontos de visa, emcee bpaemaionecbaaa seme (© primado dos factos sobre os valores no é mais do que uma das faces do pés-moralismo medistico. Na sua realidade 1 informacdo é igualment ‘mereadoria que se vende, procurando.um_piblico alargado: nestas condicdes..€ tum misto de neuralidade e de sensacionalismo, de obiectivida dee de espectacularidade o que apresentam os media, envolvi- ‘numa concorréncia comercial eH muito que hoje em dia, € a ‘vez da televis4o, com a exploragio das imagens chocantes, as frases bonitase pretensiosas, 0s debates «, febre do directo; antes da teatralizagao,distribuir emoglo, cativar 0 p- blico através do desfileacelerado de imagens mais ou menos inauditas. O consumo nfo é anenas de objetos c de filmes, mas ‘informs vduzida e funciona como animacdo hiper-reaista e emocional da vida quotidiana, como espectéculo meio angustiante, meio recreativo, capaz. de ritmar as sovieda~ individual 4 liturgia austera do dever perdeu-se na corrida ofegante da informago, no especticulo e ho suspense pds-moralistas das noticias. A felicidade ‘Accra da felicidade das massas celebra a individualidade li- vre, privilegia a comunicagio e multiplica as escolhas e as op- 0s. Isto no significa que tenham desaparecido todos os mode- ls directivos, De facto, a cultura da felicidade no se concebe ot pew, éDEN todo um arsenal de normas, de informagées técnicas e ntfficas capazes de estimular um trabalho permanente de sontrolo e de vigildncia de si préprio: depois do i ‘apenas consumista, ela é de esséncia activista, construti- JA nfo se trata, como antes, de governar idealmente as individuais, mas sim de optimizar os nossos potenciais; no se trata da aceitacio resignada do tempo, mas da eterna do corpo; ja nfo se trata da sabedoria, mas do traba- que cada um € capaz de executar; no da unidade do eu, da diversidade high tech das exigéneias de proteegio, de ervagio, de valorizacao do capital-corpo. Por um lado, a poca além-dever liquid a cultura autortériae puritana tradi- te, A cultura a felcidade desculpabiliza a auto-absorgao subjectiva, mas, mesmo tempo, desencadeia uma dindimica de ansiedade, evocada pelas préprias normas do bem-estar e do melhor-pa- er que a constituem, [Das endncas aninGnicas mola ax nos sociedad fas, sexusis ou distractivos: sobrevaloriza porosrafia, droza, ‘sexo selvazem, bulimia de objectose de prosramas medisticos, jos do exétito e endividamento doméstico, Aqui, o hedo- eects cath oe a es pisces desquaitica 0 valor do trabalho, contibui para dessocializar, desestruturar € marginalizar as minorias étnicas das grandes 65 OcREPOSCULO Do DEVER ietrépoles © 0s rejeitados dos subsirbios. Yrapartida, a Outra privilegia a gestio «racional» do tempo c do corn «profissionalsmo> em todas as coisas, a obsssfo pola exce- iencia e pela qualidade, pela sade e pela higiene. O hedonis- mo associa-se, aqui, &informagéo mult-servigos, &auto-produ- ¢0 narcisicahigiénica e desportiva,&organizasa0 racional © liofizada dos prazeres. Vemosinsaia-se um hedonismo dual Dizer das nossas sociedades que elas sio hedonistas no significa que elas sejam entregues sem reservas & espiral de- Senfreada dos prazere, nem mesmo que o prazercapta todas as cnergiase intengbes: de facto, o trabalho, a procura da qualida- ddede vida e da sadde mobilizam mais os individuos do que os consumos voluptuosos. Sociedade hedonista significa que (0 prazer deixou de ser banido, passou a ser massivamente va lorizado e normalizado, promovido e reprimido, diversificado € s >, ne diferido pelas obriga- i tntatny pla teed ces noes acto ds spe esr de sale Const com mdcragiw moa dex lars sdquiriao roto de uma gestto dos prazeres imediatos, Homeoptticos e desmaltplicados. Q Redonisme iaonks 6, petuameasive, mem dita, € eaeetea aeceeneea ‘Acar da felcdade lever induz wma ansiedadecréaica de massa, mas faz desparecer a culpabiidade mora. Nas socie tades democrticas, a3 sombriasprofeias de Freud e Niets che noe realzaram, sentido do ero maral no tende, de forma nenfuma, a intensificar-se; nfo én pecessidade de cast- ie faz mover a nossa 6pocs, a superficlalizago da culpe bildade aue reiterao universoefémero dos objects e dos me- (Bier Prmpsjioren!de(2 caslite praiomtes ou cade tee peace aE ia el aia eter ana 66 AEN, EDEN ‘as normas da felicidade se reforgam, a consciéncia culpada sse mais temporiria, a figura do Zapper’ substitui a do a depressio, 0 vazio ou o stress é que nos caracteri- nfo oabismo da mé conscincia morificador. A emocio ci téculo das eris dade, usar um «badge» anticracista, enviar um che- para combater a miopatia, nada disso tem grande relagio M as angdstias da culpabilidade e a tirania do super-ego. A idos media sobreexpde a infelicidade dos homens, mas des- © sentido da falta, a velocidade da informagiio cria @ Ogio e dilui-a ao mesmo tempo. No século xvi, La Mettie! por repudiar o valor moral do remorso, «to intl de- ‘como durante © antes do crime». A nossa época nfo tem atitude, jd ndo bane filosoficamente a «vo Regressiio do super-eg0, desvalorizacio social do discurso obrigagdo moral: a cultura pés-moralista envereda, de uma, ‘maneira, pelo processo modemo, nao acabado, da secula- i da moral. Deslegitimando a liturgia do dever, a cultura {nea liberta a moral de um «resto» religioso: temos vibigdes, mas jé no temos prescrigdes sacrificiais, valores, ‘no imperativos herdicos, sentimentos morais, mas ndo ntimentos de divida. No momento presente, a dinimica da izago» da moral afirma-se menos na polémica com Tgreja do que no eclipse das homilias do dever do homem ¢ Do inglés, referate a alguém que muda constntemente de canal de tele Wisho, som se fxar em nenhum dees. (V. 7) Médico © filssofo francés (1709-1751), banio de Franga e da Holanda elas suas opines, refugiouse janto de Frederico IL Escreveu vérias “bbras de medicina, Materialist, aplicva aos homens a teoracatesiana + os aimai-miquinas(Homme-machine, 178). (N. 1) 07 ‘OcREPUSCULO DO DEVER do cidadio. Os contetidos dos valores continvam, é certo, a ser insepardveis de uma longa tradicdo religiosa, mas a forma da moralidade social, essa, distanciou-se do espirito de religiao, mesmo laico. da no absoluto que obrigue ou Seater exorale os bonne a devetarse 8 quelaeer Weal por ‘mais superior aue seia, 0 dever nfo é mais do que uma opca0 livre. A cultura da auto-determinagao individualista chegou 2 esfera moral: a época da felicidade narcisica nao é a do «tudo ppermitido», mas sim a época de uma «moral sem obrigagio nem sangio'». sual A promogio dos valores hedonistas, reforgada, um pouco mais tarde, pelos movimentos de libertagio sexual, transfor- ‘mou por completo a moral sexual tradicional. A partir de mea- 40s do século, 0 sexo deixou de ser associado ao mal e 80 pe- ‘eado, a cultura repressiva dos sentidos perdeu o seu crédito, Eros tomou-se uma das expresses mais significativas do mun- do pés-dever. Em algumas décadas, os principios rigoristas da ‘moral sexual esilhagaram-se por completo, aquilo que era si nal de infimia adquiriu, em maior ou menor escala, uma legiti- tmidade, os imperativos rigorosos metamorfosearam-se em op g6es livres, 0 sexo-pecado foi substituido Quem censat ent cia meee «Ges morais? Quem se indiana perante-a sexualidade livre das mulheres € dos jovens? Quem poe no index a masturbacio? Mesmo os «desvios» sexuais deixaram de ser anatemizados: "Para uma primeira abordagom esrittmente ilosfiea da questo podemos reportar-nos& ob classica de Jean-Marie Guyau, Fsquise dune morale {ans obligation né sanction, Psi, IBS. 68 AEN, EDEN jo mesmo exibidos na imprensa e em pequenos antincios, os ddo-masoquistas exprimem-se nos palcos televisivos, na Di- a 0s casais homossexuais so reconhecidos pela lei, em 3 em cada 4 jovens entre os 15 e os 34 anos nilo consi- ‘a homossexualidade condendvel. ‘Ao mesmo tempo, 0 sexo tornou-se um objecto de consu- de massas: o Minitel anuncia as suas promessas cor-de-rosa, m paingis publictérios, os filmes hard podem ser livremente os not vieoctubes. Qua asada abjesto mor {a emancipou Eros da ideia de pecado, legitimou voyeuris- po de massas, substitu o «lnfeme» da Biblioteca Nacional pe- ‘ensinamentos luminosos das «sex-shops» e pelas revistas X, toda a parte o dieito ao prazer suplanta as normas repressi- tende a legitimar os comportamentos outrora ignominio- O movimento de iberagto afeta todas as eferas da vida , mas em nenkma é tio profundo como na da heterosse- ‘adulta. Aqui, cada um, homem ou mulher, é live de er 0 que muito bem Ihe apetece, sem ser posto A margem da vidade, ja no hi deveres obrigatrios a comandar os portamentos sexuais, na cama tudo esté certo a partir do to em que € aceite pelos amantes. Na sua forma radical, rocesso pds-moralistadesigna est trabalho por autonomiza: 0 da sexualidade em relagio 2 moral, Eros jé nfo encontra a ‘ua legitimidade no respeito pelas regras ideais,afectivas ou ‘eonvencionais, mas em si préprio, enguanto instrument da fe- licidade © do equilibrio individual, O'sexo p6s-moralista tem, fantes de mais. uma.definicio funcional, erstica.e psicol6sica, jf do se trata de vigiar-reprimir-sublimar, 0 sexo deve expri- oo

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