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Copyright 2020 © Aline Pádua

1° edição – novembro 2020

Todo o enredo é de total domínio da autora, sendo todos os direitos


reservados. Proibida qualquer forma de reprodução total ou parcial da obra,
sem autorização prévia e expressa da autora.

Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

Diagramação: Aline Pádua

Ilustração: L. A. Designer

Revisão: Gabi Ferraz


Sumário
Sumário

Sinopse

Dedicatória

Playlist

Prefácio

Prólogo

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12
Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15

Capítulo 16

Capítulo 17

Capítulo 18

Capítulo 19

Capítulo 20

Capítulo 21

Capítulo 22

Capítulo 23

Capítulo 24

Capítulo 25

Epílogo

Contatos da autora
Sinopse

Felipe Paiva Soares teve uma segunda chance, e pode começar,

praticamente do zero, a ter uma vida de fato. O homem de olhos castanhos


escuros era silencioso e introvertido, ao menos, aos olhos alheios. Contudo,
aos olhos verdes de Laura, ele era o mais belo mistério que já conheceu.

Laura Lourenzinni Gutterman o apelidou secretamente de Senhor


Mistério. Exatamente por não conseguir desviar de seu olhar, e pela forma
como parece lê-la por completo. Isso a mantém ao máximo de distância,
porém, não evita que seu coração acelere a simples lembrança dele.

Para ele, ela era intocável.

Para ela, ele era inatingível.

Entretanto, quando o destino age junto ao desejo inevitável, existe


chance de escapatória?
Nota

Os protagonistas deste livro são derivados de duas Séries


diferentes: Trilogia Soares e a Série O que sobrou. Contudo, não se faz

necessário a leitura dos livros anteriores para o entendimento deste. Fica a


seu critério. Abaixo, temos a visão de uma breve árvore genealógica, para
os leitores que já leram as séries, e estejam um pouco confusos a respeito.
A Patrícia por vibrar, acompanhar, aconselhar e chorar junto a

mim, essa história nunca seria a mesma sem você;

A Kamila por responder meus áudios a qualquer hora e sempre


estar lá quando preciso;

A Manuele por me ouvir, seja quando for, desde o começo de tudo

isso;

Aos meus leitores, por acreditarem em cada palavra, desde a


primeira;

Vocês são a base disso tudo,

Obrigada!
Dedicatória

Colocar um ponto final neste livro foi a parte mais difícil. Não os
queria deixar ir. Não queria permitir que acabasse. Contudo, em um

momento, no meio de uma conversa, o final veio. Tão claro quanto deveria
ser. Tão certo quanto imaginei que poderia fazer. A nostalgia que Felipe e
Laura me trouxeram, foi a de quando comecei a escrever. Esses
personagens surgiram nos dois primeiros livros que escrevi O que sobrou
do meu amor (sobre os pais de Laura) e O homem que não amei (sobre os
pais de Felipe). Precisei escrever isso aqui aos prantos, e de verdade, não
teria como ser diferente. Deixei meu coração todo e cada parte minha já
escrita nele. De alguma forma, construir esses personagens, me
descontruiu inteira. E eu só queria os agradecer. Esses personagens

nasceram exatamente onde minha carreira começou, e escrever uma


história que fizesse jus a eles, foi como fazer jus a tudo o que aprendi
nesses cinco anos.

Obrigada Laura e Felipe por me ensinarem tanto. Por me ensinarem


tudo durante a escrita desse livro.

Jamais serei a mesma.


Com (todo meu) amor,

Aline
Playlist

A Carne – Elza Soares

All To Well – Taylor Swift

Apaga a Luz – Glória Groove

august – the 1

BB’s Theme – Ludwig Fonsell


Boys Like You – Anna Clendening

Cornelia Street – Taylor Swift

Cruel Summer – Taylor Swift


Dancing With Our Hands Tied – Taylor Swift

Daylight – Taylor Swift

Delicate – Taylor Swift

Don’t Blame Me – Taylor Swift

Dress – Taylor Swift

É isso aí... – Ana Carolina part. Seu Jorge

Easier – 5 Seconds Of Summer


Everything Has Changed – Taylor Swift feat. Ed Sheeran

Holiday – Little Mix

I Think He Knows – Taylor Swift

I’ll Keep Coming – Low Roar

Invisible String – Taylor Swift

King Of My Heart – Taylor Swift

New Year’s Day – Taylor Swift

One – Ed Sheeran

Paper Rings – Taylor Swift

Ready For It? – Taylor Swift

Secret Love Song – Little Mix

State Of Grace – Taylor Swift

Sweet Melody – Little Mix


Prefácio

“Eu não queria ir embora e esperar o dia seguinte. porque cansei dessa gente que
manda ter mais calma. E me diz que sempre tem outro dia. E me diz que eu não posso
esperar nada de ninguém. E me diz que eu preciso de uma camisa de força. Se você

puder sofrer comigo a loucura que é estar vivo. se você puder passar a noite em claro
comigo de tanta vontade de viver esse dia sem esperar o outro, se você puder esquecer a
camisa de força e me enroscar no seu corpo para que duas forças loucas tragam algum
equilíbrio. Se você puder ser alguém de quem se espera algo, afinal, é uma grande
mentira viver sozinho, permita-se. Eu só queria alguém pra vencer comigo esses dias
(...)”

Tati Bernardi
Prólogo

“Lost and never found

Waiting for my words

Seen but never heard

Buried underground

But I'll keep coming.”[1]

Felipe

Olhei para os lados e tentei me certificar de que estava tudo bem,


na verdade, não estava. Andei pelas ruas e corri por algumas, o medo se
aflorando por minha pele. Algo em meu peito parecia que ia explodir e
tinha plena noção. Eu não estava procurando por algo, contudo, algo me
achou.

Senti meu corpo ser levemente acertado, ouvi um grito e barulho


alto do pneu no asfalto. Não consegui pensar em nada que não fosse me
desculpar. Assim que encarei o carro a minha frente e o homem poderoso

que descera do mesmo, senti meu corpo todo estremecer.

Homens como aquele não eram comuns em minha vida. Na


realidade, eu era invisível para aquele tipo de pessoal. Contudo, a
familiaridade que senti fez-me ficar imóvel. Os olhos azuis preocupados
do homem desconhecido foram um completo baque. Sua mão estava

estendida em minha direção e me levantei rapidamente, tentando me


desculpar.

— Me desculpe senhor, eu não olhei pra atravessar e... — ele


cortou minha fala rapidamente.

— Está tudo bem com você rapaz? Qual o seu nome? —


perguntou, e mesmo com sua voz sendo grossa, ele não pareceu rude. Ele
parecia apenas preocupado, o que me assustava. Não me lembrava da
última vez que alguém falou comigo de tal maneira.

— Estou bem sim e... Meu nome é Felipe. — respondi, temendo o


que aquela conversa poderia desencadear. Eu temia as pessoas, ainda mais,
pessoas que claramente não pertencia a minha realidade.

— Onde é sua casa? Posso te levar lá e.... — perguntou e fiquei


completamente sem jeito, não tinha uma resposta clara.

A realidade era simples: eu morava nas ruas. Onde pudesse e


conseguisse passar a noite sem ser perseguido por algumas turmas

perigosas. O medo era meu acompanhante diário, por aquilo estava ali,

naquela exata rua. Mais uma vez, mudando de uma rua para outra.

— Eu... — tentei dizer, mas nada saiu. Era difícil e por mais que
quisesse parecer forte, eu não o era.

— Você mora aqui? Nas ruas? — foi então que notei a mulher do

outro lado do carro, que se aproximava. Ela tinha um tom ameno e


claramente, estava me analisando. Não a julgava por fazê-lo.

— Na verdade... — tentei mentir ou inventar algo, mas não


consegui. Simplesmente travei e no fim, acabei assentindo.

Não conseguia explicar porque estava sendo honesto com aquelas


pessoas. Geralmente apenas daria as costas e sairia dali, contudo,
permaneci.

O dois se entreolharam e notei a forma como pareciam presos em

si.

Resolvi que era hora de ir, enquanto ela falava algo baixo na orelha
do homem. Eu não devia estar ali, apenas para começo de conversa.
Assim, afastai-me aos poucos e tentei dizer algo, ao menos, agradecer pela
atenção, mas me contive.

— Ei, onde está indo? — assustei-me com a pergunta e parei,


virando-me levemente.

— Eu estou indo embora, senhor. — respondi, e retomei meu

caminho.

Contudo, antes que conseguisse dar muitos passos, ele já estava ao


meu lado.

— Há quanto tempo está nas ruas? — perguntou e parei de repente,

abaixando a cabeça. Pensar naquele tempo, levava-me a pensar na dor da


perda, da saudade.

— Dez anos, senhor. — respondi, engolindo em seco e sem tentar


retomar meu passado na memória. Não era um lugar bonito de se lembrar,
muito menos, de estar.

— Por favor, pare de me chamar assim. — pediu e notei sua voz


calma. Como se ele tentasse me passar aquilo. — Meu nome é Caleb
Soares e essa é minha esposa, Victória. — assim que a fala saiu de sua

boca, paralisei.

Eu conhecia aquele sobrenome, na verdade, seria impossível


alguém da cidade não o fazer. Eles eram importantes.

— Soares, igual os das propagandas? — perguntei, sem conseguir


acreditar, e o senhor assentiu, deixando-me ainda mais sem jeito.

— Você já pensou em sair das ruas? — perguntou de repente,


deixando-me perplexo.

— Sim. — confessei, sem vacilar. Tudo o que se passava por

minha mente, todos os dias, era que queria sair daquela situação. A questão
maior era que não conhecia nada além daquilo. Não mais.

— Então venha conosco! — fiquei espantado e tentei contornar o


que disse.

— Não precisa fazer isso senhor, eu...

— Não precisamos, mas queremos... Venha conosco, Felipe! —


Victória falou, aproximando-se, e fiquei sem saber como lhe responder de
fato.

— Mas para onde? — optei por perguntar o simples.

— Para casa.

Fiquei paralisado, ainda encarando meus pés, e de repente, minhas


mãos. Não conseguia acreditar que aquelas pessoas estavam ali, me

oferecendo algo que nunca imaginei que acontecesse. Nem em meus


melhores sonhos.

— Eu não posso aceitar senhor, não precisa... — falei, tentando


sorrir, o que fora em vão.

— Nós queremos que vá conosco, Felipe. Sei que não é comum o


que estamos fazendo, mas aprendi com o homem da minha vida que em
nossa família sempre caberá mais um. — Victória falou e fiquei

paralisado, ainda incrédulo. Foi quando notei a forma como me olhava, e

era diferente. Existia uma ternura nela, que não encontrei em mais
ninguém.

— Eu... — parei, pois não sabia o que responder.

— Façamos assim, passe uma semana em nossa casa. Depois disso

deixaremos com que decida onde quer ficar. — Caleb insistiu e não soube
como negar. Eu não tinha porque negar, por mais que tivesse medo. —
Qual o seu nome completo?

— Felipe Paiva. — respondi receoso e ele assentiu, como se


pensando a respeito.

Ele foi até o carro e abriu a porta de trás, convidando-me a entrar.


O fiz, sem conseguir ainda acreditar que aquilo era real. Era tudo tão lindo
dentro, que parecia acabar de embarcar em um outro universo. Lembrava-

me das propagandas que vira sobre carros e como aquilo me fascinava.

— Gosta de carros? — a voz de Caleb Soares soou e assenti,


contando-lhe que sempre reparei nos carros que passavam nas ruas. Não
quis me aprofundar, pois ainda era tudo tão recente que não sabia dizer o
que acontecia.

Enquanto o carro se movia, notei a forma como o casal a minha


frente conversava e era nítida a cumplicidade entre eles. Encarei as ruas, e

a cada vez que passavam, tudo ficava ainda mais bonito. Eu conhecia

aquele sobrenome, não apenas por ser famoso, mas com certeza, por serem
um dos mais ricos da cidade. Aquilo me aterrorizava, pois eu não tinha
absolutamente nada. Nada para lhes oferecer. O por que me levariam
junto? Eu não sabia, mas me vi buscando a resposta.

Eu ainda não tinha noção do quanto tudo mudaria a partir dali.

O que os Soares seriam para mim, e o que eu, seria para eles.
Capítulo 1

“É isso aí

Os passos vão pelas ruas

Ninguém reparou na lua

A vida sempre continua

Eu não sei parar de te olhar

Eu não sei parar de te olhar

Não vou parar de te olhar.”[2]

Cinco anos depois...

Felipe

— Pode cuidar disso para mim, certo? — Herrera perguntou e


fiquei estático. — Não me olhe assim, Soares. Serão anotações simples, e
Gabriela estará com você. Todo estagiário daqui passa por tal momento.

— Mas eu... — tentei argumentar, mas não tinha o que dizer. — Eu


consigo. — complementei, e ele piscou um olho, jogando uma pasta sobre

minha mesa.

Eu era estagiário na Advocacia Soares, e estava no segundo ano da


faculdade. Pensar naquela retrospectiva, me assustava. Parecia que fora
ontem que conhecera Caleb e Victória Soares, meus pais, e que minha vida
ganhara uma perspectiva. A qual viera acompanhada de amor,

ensinamento, carinho e proteção. Caleb e Victória me deram muito mais


do que um dia imaginei que uma família seria. Eles me deram vontade de
viver.

— Gabriela chega em que horário? — perguntei, e Herrera subiu


uma sobrancelha, encarando-me de forma diferente. — O que foi?

— Sabe que ela é... Como as pessoas da sua idade dizem? —


pareceu pensar sobre e fiquei ainda mais confuso. — Ela tem um crush em
você! — falou animado e acabei sorrindo da forma como parecia ter

adorado acertar a palavra.

Porém, sobre sua constatação, não era a primeira pessoa ao fazê-la.


Meu pai já me alertara sobre, e fiquei alguns dias imaginando se me
portava de alguma forma que pudesse demonstrar que também estava
interessado. Infelizmente, eu não estava. Ainda mais, porque Gabriela era
uma colega de trabalho. Ainda mais, porque minha mente sempre me
lembrava de olhos verdes inconfundíveis e atormentadores.
— Ela é apenas uma colega e amiga. — comentei e Herrera revirou
os olhos.

— Você é tão burro para algumas coisas, rapaz. — provocou e


acabei sorrindo, negando com a cabeça. — Mas enfim, não se esqueça de
estar pronto e a par do caso até daqui duas semanas. — assenti, já ansioso
para começar. — Qualquer dúvida, pode me ligar. Ou então, falar com seu

pai.

— Sabe que vou te ligar, certo? — indaguei e ele assentiu.

— Você e sua mania de achar que está pedindo muito do seu


próprio pai. — debochou e me deu as costas, indo em direção a sua sala.

Contudo, ele dissera exatamente o que sentia. Caleb Soares já me


provera e dera tanto, que tudo o que buscava, era poder retribuir, como
fosse. Até mesmo, simples dúvidas, eu preferia que fossem tiradas com
Herrera, seu sócio. Não conseguia me ver colocando meu pai em mais uma

posição de cobrança.

Olhei para meu relógio de pulso e confirmei que já era hora do


almoço. Como quase sempre, iria para casa e passaria um tempo com
minha mãe. Quando ela não tinha alguma reunião importante ou se
atolasse de trabalho. Sorri, apenas por me lembrar dela. Peguei minhas
coisas, e coloquei tudo dentro de minha bolsa. Neste momento, senti que
era observado, e levantei o olhar, no momento em que Gabriela parou a
frente da mesa, e tocou o tampo.

— Almoço? — indagou, retirando seu paletó e sorrindo.

Não poderia negar que ela era uma mulher linda. Contudo, não
sabia dizer o que realmente me impedia. Gostava dela, das suas conversas
e da forma como era uma boa amiga. Na realidade, eu sabia exatamente o

que impedia. Aquele amor secreto e incubado ainda me cobraria por alto.
Talvez, por eu aceitar vivê-lo completamente sozinho, como minha irmã,
Babi, acusara certa vez.

Os olhos castanhos de Gabriela acompanhavam meus movimentos


e senti-me mal por não conseguir simplesmente lhe alertar que estava
tentando em vão.

— Sim, estou indo almoçar com minha mãe. — comentei, e notei


seu olhar mudar, como se decepcionada. — O que foi? — indaguei, e ela

deu de ombros.

— Nada, só lembrei de algo... — sorriu novamente e tirou a mão da


mesa, dando um passo atrás. — Que tal a gente jantar junto hoje? —
indagou de repente, deixando-me completamente surpreso.

Não que já não tivéssemos feito. A questão era que geralmente


todos do escritório também iam, e eu não tinha ideia de algum encontro
para aquela noite.

— Quando Herrera surgiu com esse jantar? — indaguei, colocando

a bolsa no ombro e ela sorriu ainda mais.

— Só nós dois, Felipe. — comentou casualmente e fiquei


paralisado.

— Olha, eu...

Ela deu um passo à frente, no momento em que saí de trás da mesa,


e notei que seu olhar mudara. Sorriu lindamente, e me entregou o celular
que deixara sobre a mesa.

— Pode pensar sobre. Tem até as seis para me responder, ok? —


falou e assenti, sem saber como ser educado ao negar. Apenas em minha
mente, aquilo parecia como um encontro?

— Ok.

Saí dali, dando-lhe um sorriso sem dentes. Assim que adentrei o

elevador, soltei o ar que mal sabia que segurava. Não sabia sequer como a
encararia depois daquilo. Talvez, o melhor, fosse perguntar a minha mãe
como negar o pedido de um encontro.

Puta merda!

Aos vinte e seis anos, e aquela era uma das “primeiras vezes de
coisas” que não gostaria de ter. Alguns minutos depois, e eu já estacionava
à frente do lugar que chamava de lar. Lembrava-me perfeitamente de como

fora atravessar as portas de uma casa e podê-la vê-la como um lar, depois

de tanto tempo sem aquela sensação. Sorri, saindo do carro, e olhando as


rosas brancas que desabrochavam pelo jardim. Contaria quantos dias
levariam para Miguel destruí-las por completo.

Abri a porta e como sempre fazia, anunciara que cheguei:

— Cheguei!

Contudo, tive uma resposta diferente do que imaginava. Ouvi a voz


de minha mãe na cozinha, e a de uma outra mulher. Não a reconheci de
imediato, e andei diretamente para lá. A cada passo que dava, era como se
a voz de tonasse mais familiar. De repente, senti meu coração acelerar, e
não consegui entender o porquê. Aquilo não era comum. Não para mim.

Assim que adentrei a cozinha, todas minhas dúvidas caíram por


terra. Laura Gutterman estava de costas para mim, escorada no balcão e

conversando animosamente com minha mãe, enquanto ela mexia algo no


fogão. Tentei abrir a boca e reencontrar minha voz, mas não consegui.
Tentei simplesmente voltar os passos e sair dali, porém, minha mãe me
notara no último segundo.

— Ei, filho. Não te ouvi chegando. — anunciou, e forcei um


sorriso, lembrando-me da boa educação que me deu.
— Acho que estava entretida. — comentei, ainda parado perto da
entrada da cozinha, e ela deu de ombros, sorrindo. Notei que ela ficou no

mesmo lugar, esperando, e eu sabia o que queria. Fui até ela, e assim que
me aproximei, senti os olhos de Laura em mim. Como se minha mente
ilusória não brincasse mais uma vez. Eu sabia que não era o seu tipo de
cara. Nem de longe.

Beijei o rosto de minha mãe e tentei focar no que tinha controle,


minha família.

— Agora sim. — piscou um olho e notei que voltara seu olhar para
Laura.

— Como vai, Laura? — indaguei, finalmente encarando-a. Olhos


verdes que me prendiam por completo, levando-me para ela, fizeram seu
efeito de sempre – me consumiram.

— Agora, surtando com o fato de que faremos uma surpresa para

minha mãe. — comentou e a encarei sem entender.

— Vamos te deixar a par durante o almoço. — minha mãe se


pronunciou e eu assenti. Contudo, meu olhar ainda estava preso em Laura,
que sorria como se não tivesse ideia do poder que exercia sobre mim.

Mas eu sabia.

Lembrava-me dela de muito antes de ter um lar.


Lembrava-me dela como o sonho de gratidão que tivera em anos.

Lembrava-me dela quando nossos olhares se reencontraram e como

tudo mudara de figura.

Tudo por conta de um simples olhar.


Capítulo 2

“So cut the headlights, summer's a knife

I'm always waiting for you just to cut to the bone

Devils roll the dice, angels roll their eyes

And if I bleed, you'll be the last to know”[3]

Laura

Ele era definitivamente diferente de todos os caras que conhecia. E

ainda mais, completamente diferente dos quais já me envolvera. Em meus


vinte e quatro anos, nenhuma pessoa me deixara completamente sem chão.
Ele o fizera. Algo em Felipe Soares me levava diretamente para ele. Para o
castanho de seus olhos. Contudo, aquele sentimento me assustava de forma
absurda. Nunca admitira a ninguém, mas era a realidade, tinha um medo
extremo do amor romântico.

Suspirei fundo, sorrindo para o que Victória dissera, e tentei focar


no que fazia na casa dos Soares naquele dia. Victória e minha mãe se
tornaram muito próximas nos últimos anos, além de que, frequentava a

casa deles há um bom tempo. Nossa ideia era fazer algo surpresa e
diferente para o aniversário dela, usando o que ela mais amava como plano

de fundo em festas – fantasias.

— Eu acho que seria melhor reunir todo mundo... o que acha? —

indagou e tentei fingir que não sentia os olhos de Felipe em mim, assim
como, queria encará-lo.

— Todo mundo quer dizer...

— Lili, Marta, Dani, Paula, Lola, Carla, Sophie... — parou para


pensar um pouco, como se tentando puxar alguém na memória. — Enfim,
quem mais você achar que é próxima de sua mãe.

— Lili já até comprou os balões na cor lilás, que é a favorita de


minha mãe nos últimos tempos. — comentei e ela riu, tampando a panela

que antes mexia, e desligando o fogo. — Mas acredito que elas nos
ajudarão e muito nisso.

— Sim, vou tentar falar com todas hoje e bom... temos duas
semanas até o aniversário. Acho que é um bom tempo. — assenti e ela deu
de ombros. — Pode já pegar seu lugar a mesa, porque vai almoçar com a
gente. — praticamente ordenou e segurei a risada.
— Mas tia Vic... — tentei argumentar e ela negou com a cabeça no
mesmo instante. — Ok, sem discussão por hoje! — levantei os braços em

sinal de rendição.

— Tenho que aproveitar que está no país. — argumentou, enquanto


eu me levantava da banqueta, e sabia que que Felipe estava sentado à
mesa, observando-nos. Ao menos, eu imaginava que sim.

— Não pretendo voltar a morar fora tão cedo. — comentei e sorri


para ela, indo em direção à mesa, e paralisando por um segundo, ao não
saber exatamente em que lugar me sentar.

Felipe estava em uma das pontas, e como era uma mesa de oito
lugares, e mesmo assim, temi a proximidade com ele. De repente, perto
dele, minha mente se desfazia. Não imaginara que ele almoçaria em casa
justamente naquele dia. Ou melhor, que eu ficaria até o horário do almoço.
Contudo, estar ali era bom. Conversar com Victória, que era como uma tia

para mim, tornava tudo fácil. Além de que, Babi, sua filha, era minha
melhor amiga. Mesmo ela estando preso no trânsito, pelo que me contara
por mensagem.

Porém, a presença de Felipe sempre parecia dificultar tudo. Por


mais que nossas famílias fossem próximas, nunca me senti perto o bastante
dele. De forma que me assustava o poder que parecia ter sobre mim.
Principalmente, sobre meu coração que batia freneticamente, no momento
em que puxei a cadeira ao seu lado esquerdo, tentando usar a educação que

me foi dada.

— Está tudo bem? — perguntei, notando que ele digitava algo em


seu celular.

Notei a forma como assentiu levemente com a cabeça e fez uma


careta, que ainda assim o deixava completamente atraente. Quando ele

finalmente me olhou, foi como em todas as outras vezes. Olhos castanhos


que pareciam refletir minha alma. Os cabelos e barba estavam maiores do
que me lembrava, dando-lhe um ar de perigo. Diferente de apenas “senhor
mistério” como eu internamente o intitulava. Felipe era tão bonito e
parecia não ter a mínima noção daquilo. Talvez sua ingenuidade sobre sua
beleza, o deixasse ainda mais atraente.

Estando a menos de um braço de distância, o seu cheiro também


me envolvia. Daria qualquer coisa para poder senti-lo mais de perto, para

apenas quebrar a barreira invisível que parecia ter se estabelecido entre


nós. Nunca entendera de fato porque não éramos amigos ou até mesmo,
mais do que simples conhecidos. Talvez eu mesma sabotasse aquela
aproximação. Já que como minha mãe diria, eu não era boa em disfarçar o
que sentia. E poderia jurar que o olhava com todo meu desejo dali.

— Desembucha, Lipe.
A voz de Victória chegou até nós, enquanto ela colocava a travessa
com macarrão à bolonhesa sobre a mesa. Olhei a interação entre eles, e

tive que sorrir. Era claro que ela o conhecia como ninguém.

— Gabi pediu para jantar comigo hoje. — ele comentou, encarando


a mãe, que parecia completamente atenta, e se sentou à mesa conosco.

— E qual é o problema nisso? — perguntou e notei a confusão em

seu semblante. — Vocês são amigos, não?

— Somos, e colegas de trabalho, mas...

— Sempre tem um “mas”...

A voz de Danielle chegou até nós e sorri para ela, que primeiro
veio até mim, dando-me um beijo no rosto.

— Que surpresa linda para o almoço. — comentou, e se encostou


na mesa, enquanto Victória apenas sorria.

— Nem me disse que almoçaria aqui hoje. — argumentou e a loira

deu de ombros. — Senta logo aí, Dani!

Ri das duas, e notei que Danielle encarava Felipe com curiosidade.

— Conheço esse olhar perdido... — comentou e Felipe soltou o ar


com força, como se não tivesse para onde correr. — Quem está dando em
cima de você dessa vez?

Engoli em seco no mesmo instante.


— Gabriela. — ele respondeu, e senti meu estômago revirar. Não
esperava que a conversa chegaria àquele patamar. — A vejo como uma

colega, tia Dani. Acho que isso seria um encontro e...

— Você já respondeu que sim para o jantar? — Victória se


pronunciou e ele negou com a cabeça, o que fez o nó em minha garganta se
desfazer um pouco.

— Felipe é um doce, sabemos disso. — Danielle comentou e deu


de ombros. — Aposto que quer saber como dar o fora nela sem ser rude.

— Exatamente. — ele falou e notei que não parecia nem um pouco


incomodado com a intimidade que tinha com a mãe ou a tia. Muito menos,
estando a minha frente.

Masculinidade frágil não se via ali, e fiquei ainda mais feliz com
aquilo.

— Pode dizer que tem um jantar na minha casa hoje. — soltei de

uma vez, e só percebi que falei demais no segundo que as palavras saíram
de minha boca. Dei de ombros, tentando disfarçar, e senti o olhar de todos
sobre mim. Porcaria de boca grande. — E realmente, tenho um jantar com
amigos no meu apartamento hoje, então...

— Eu...

Ele me encarou e fiz o mesmo, em expectativa de sua resposta. O


que diabos eu estava fazendo? Não tinha a mínima ideia!

— Pode dizer que tinha se esquecido disso, e não pode desmarcar.

— complementei e ele pareceu me encarar sem saber o que dizer. — Ou


pode levar ela junto ao jantar. Já que o problema seria estarem apenas os
dois e parecer um encontro. Meus amigos estarão lá, arrasto Babi também
e... — de repente, sob o olhar dele, senti-me sem saber mais o que dizer.

— Puta merda! — Danielle falou, salvando-me do silêncio, e a


encarei, notando que sorria abertamente. — Parece uma péssima boa ideia.
— olhei-a sem entender e notei o olhar que trocara com Victória.

— Acho que o melhor é ser sincero com a Gabriela, filho. —


Victória comentou e notei como o encarara com carinho. — Pode estar
apenas ajudando a se iludir em algo que pelo jeito, você não quer.

— Obrigado, mãe. — comentou e me encarou no segundo seguinte.


— Mas obrigado pela ideia e pelo convite, Laura.

A voz rouca me tinha por completo, e ele estava tão perto que quis
gritar para que apenas ele aparecesse no meu apartamento. Apenas ele e
eu. Aquela seria uma ótima noite. Ao menos, o era, nos meus sonhos mais
profundos.

— Voto para Felipe ser sincero e ir ao jantar da Laura! — Dani


falou de repente levantando a mão e a encarei espantada.
— Voto também!

A voz de Babi reverberou pelo ambiente, e notei o olhar sacana de

minha amiga, enquanto ela ia até a mãe e a beijava no rosto, e fazia o


mesmo com a tia. Olhei-a incrédula e ela deu de ombros.

— Lipe tá precisando se divertir um pouco. — ela argumentou,


contudo, ela sabia que não existia jantar.

Puta merda!

Eu o tinha inventando de última hora e se Felipe concordasse, teria


que tirar gente do chão para ir. Eu não sabia o que diabos tinha tomado
conta de minha mente.

Ciúmes! – minha mente gritou.

Abri a boca para dizer algo, mas me calei no segundo seguinte,


com medo de piorar ainda mais a situação.

— Eu vou deixar para próxima, já que tenho um caso para estudar.

— Felipe comentou e fora como um balde de água fria.

Com a tal Gabriela, ele parecia completamente preocupado da


forma como agir e como dispensar o convite. Comigo, fora simples assim.
Ele apenas disse que não, da forma mais educada possível. O que não
diminuía o fato de aquilo ter me atingido. Apenas me dava a certeza de que
não significava nada para ele. Nem mesmo, alguém com quem se importar,
o mínimo possível.

Ali, tive novamente a certeza, que não deveria sentir nada por ele.

Mesmo que meu corpo, mente e coração discordassem por completo.


Capítulo 3

“I love you so much that I hate you

Right now, it's so hard to blame you

'Cause you're so damn beautiful

You're so damn beautiful.”[4]

Felipe

Ainda tinha algum tempo antes de voltar para o escritório e joguei-

me contra a cama. Encarei o teto por alguns segundos e tudo me remetia à


simples conversa que tive com Laura durante o almoço. Tudo o que eu
queria dizer era “sim”. Dizer que eu queria ir ao apartamento dela, que
eu... Peguei um travesseiro e bati em meu rosto, pensando e repensando
como agia. Era claro que Laura apenas tentou ser solícita, e eu sabia o que
me aguardava, caso fosse aquele jantar no apartamento dela.

Vê-la com outro sempre me deixava sem chão. Não queria passar
pela mesma experiência novamente. Não depois de ter que fingir e sorrir
por toda uma noite, até dar tempo suficiente para fugir daquele lugar. Não

sabia ao certo se ela ainda namorava ou se estava com alguém, porém,


sabia que não estava preparado para o risco de vê-la nos braços de outro,

mais uma vez.

Senti o travesseiro ser tirado de meu rosto, e a cama abaixar ao meu

lado. Babi sorriu em minha direção e colocou o travesseiro em seu colo.


Via nela, um reflexo de mim em vários momentos. Éramos adotados e
vínhamos de um lugar completamente diferente do que todos ao nosso
redor tiveram. Além de tudo, quando a vi pela primeira vez, senti uma
conexão como ninguém. O que nos unia ia além do sangue, e nos olhos
puxados dela, encontrava o amor de uma irmã que sempre sonhei ter.

— Por que fugiu do convite de Lau? — indagou e queria poder


fingir, mas nunca fora bom com aquilo. Não com Babi. Ela me

compreendia tão bem, da mesma forma, que eu soube que ela era
apaixonada por Christopher antes de todos.

— Chris não está para chegar? — perguntei, tentando fugir do


assunto, e ela revirou os olhos. — Não quero falar sobre isso, Babi. De
verdade.

— A realidade é que nunca quer, mas eu sempre falo sozinha sobre.


— rebateu e me encarou profundamente. Sabia que ela tinha razão. — Eu
te prometi que não contaria a ninguém sobre seus sentimentos por ela,

ainda mais, pelo fato de ela ser minha melhor amiga. Mas, Lipe... Não tem

como conquistar alguém sem ao menos tentar.

— Não é tão simples assim. — falei e ela me encarou com pesar.


— Você sabe, melhor do que ninguém que Laura curte pessoas diferentes
de mim. Homens mais velhos e com certeza, mais experientes... Não posso

querer forçar ela a gostar de mim, sendo que...

— Você mal a conhece, Lipe. — rebateu novamente e jogou o


travesseiro em meu peito. — Por que, ao menos, não tentou ser legal e
aceitar o convite dela? — perguntou e respirei fundo, sentindo-me mal
com aquilo.

— Porquê da última vez que fui lá, eu fiquei a noite toda dançando
com alguém que não queria, e a vendo nos braços de outro. Tudo o que
ganhei ao tentar foi um boa noite, e nem sequer a chance de espaço.

— Já pensou em lutar por esse espaço? — perguntou e a encarei


com atenção. — Eu sei que não tem experiência com relacionamentos e o
medo que sente. Por mais que esconda de todo mundo, não precisa
esconder de mim. Mas se você a ama, precisa tentar além da superfície,
irmão.

— E se ela...
— Não vem com seu pessimismo ou realidade distorcida. —
cortou-me rapidamente. — Você pode não ter notado, mas você deu um

“não” na cara dela, na frente de todo mundo no almoço, tão fácil que... Eu
tenho certeza, que mesmo que não sejam próximos, aquilo deixou Laura
completamente sem graça.

— Mas eu... Eu apenas tentei ser educado diante do convite dela.

Ela, com certeza, estava apenas fazendo um favor. — comentei e Babi


revirou os olhos mais uma vez, olhando-me incrédula.

— Esqueceu que não tem como ter certeza de algo sem saber a
versão da outra pessoa? — perguntou e me deixou completamente sem
palavras. — Sabe que estou aqui, sempre. Para desabafar, para beber, para
conversar, para brincar... Mas você precisa lutar pelo amor que sente.

— Você acha que eu realmente a deixei sem jeito? — perguntei,


sentindo um gosto amargo na boca e Babi deu de ombros, praticamente

pulando da cama.

— Isso, você vai saber se for até o apê dela. — falou, quase
cantando, e acabei me sentando, olhando-a incrédula. — E nem me olhe
assim!

Batidas na porta a dispersaram e eu continuei parado, olhando na


direção de minha irmã, sem entender nada. Assim que ela abriu a porta,
Christopher apareceu e sorriu em sua direção. Notei que por um momento,
enquanto ele a puxava para si, levemente, eles pareceram entrar em seu

próprio mundo. Sorri, vendo o sorriso de minha irmã se tornar enorme e


seus olhos brilharem. Era, com certeza, o poder de um amor verdadeiro.

Eu queria poder dizer que sabia muito sobre. Mas na realidade, eu


não sabia absolutamente nada. Era um mero espectador.

— Por que essa cara de enterro? — ele indagou de repente,


encarando-me e me joguei novamente na cama. — O que diabos fez a ele,
Ella?

— Eu? — ela indagou e notei de canto de olho, que vinha até mim.
Babi parou ao meu lado e se abaixou, dando-me um beijo no rosto. — Ela
está solteira. — praticamente sussurrou, e quando voltei a mim, ela já saía
do quarto, praticamente arrastando Christopher com ela.

O que eu poderia fazer?

O que eu deveria fazer?

Peguei meu celular na mesa de cabeceira e digitei o nome de Laura


nos contatos. Parei por alguns segundos, apenas observando sua foto e os
olhos verdes que me cativavam, junto a pele negra e os cabelos cacheados.
Ela era tão linda, que me deixava completamente desconcertado.

Suspirei fundo e pensei em lhe mandar uma mensagem, porém,


desisti no segundo seguinte. Por um segundo, cogitei a possibilidade de
simplesmente aparecer em seu apartamento a noite. Talvez levar uma

garrafa de vinho. Babi já comentara que era uma das bebidas favoritas de
Laura. Bati em minha testa e neguei com a cabeça. Ela poderia
simplesmente bater à porta na minha cara e me achar maluco – uma parte
minha considerou.

Ela poderia simplesmente te deixar entrar e jantar com você – outra


parte gritou.

E eu realmente, não sabia qual delas deveria ouvir.


Capítulo 4

“He got my heartbeat

Skipping down 16th Avenue

Got that, oh, I mean

Wanna see what's under that attitude like

I want you, bless my soul

And I ain't gotta tell him, I think he knows

I think he knows”[5]

Laura

— Eu sei que devia ser mais simples, Rafa. — comentei com meu
primo, e pude ouvi-lo bufar do outro lado da linha. — Sei que não é o
assunto top 1 da lista que queria me ouvir falar, mas...

— Mas não tem coragem de se abrir com Babi e sequer escuta


meus conselhos. — praticamente bradou e tive que rir, mesmo sabendo
que ele estava puto. — Isso, ri da minha cara! Eu até perguntei a Zalon
como te ajudar com isso!

— Desculpe... — ri ainda mais, e deixei o celular no viva-voz sobre

a penteadeira, enquanto passava um creme ativador em meus cachos. Não


que estivesse animada para me arrumar àquela hora, muito menos tinha
cozinhado. A questão era que fazer algo com as mãos ocupava parte de
minha mente que apenas gritava o nome Felipe Soares. — Eu te amo, sabe

disso né?

— Sorte a sua que te amo também — rebateu e poderia visualizar


perfeitamente em minha mente o seu bico.

Rafael e eu crescemos juntos e passamos por muita coisa, e sempre


o vi facilmente como um irmão. Por aquilo e muito mais, era fácil ser
sincera com ele. Não que ele fosse o melhor em dar conselhos, mas falar
com Babi estava fora de cogitação.

Primeiro, porque ela era a irmã de Felipe, e com toda certeza, a

deixaria pressionada em meio aos meus sentimentos e a falta dos mesmos,


no caso dele. Seria um drama desnecessário. Até mesmo considerei falar
com minha mãe, por mais que já acredite que ela desconfie. Dona Melissa
sempre pareceu me conhecer melhor do que mim mesma. Contudo, nunca
consegui falar em voz alta. Admitir o sentimento. Talvez por que todo
mundo se conhecesse? Talvez por ela ser uma amiga próxima da mãe dele?
E vamos de Laura e seu momento rainha da do drama – como ela
mesma diria. Suspirei fundo e encarei meu reflexo no espelho. De fato,

parecia que um caminhão passara por cima de mim. Aquele era o que mais
me assustava sobre Felipe. Uma simples fala dele tinha o poder de me
desestruturar por completo. Sem eu permitir e muito menos, sem querer.

— Então, me escuta, pelo menos uma vez! — Rafael praticamente

gritou do outro lado da linha, fazendo-me rir e tentar focar em nossa


conversa. Por mais que ela não fugisse da pauta: como conquistar Felipe
Soares e seus mistérios. — Você disse que tem uma outra pessoa
interessada nele, e ela parece ter deixado bem claro o que quer. Tá na
hora de tu fazer o mesmo, Lau!

— Mas eu...

— Convidou para uma festinha que tecnicamente teriam outras


pessoas! — ali, entendi perfeitamente o que Rafael queria dizer. — Tem

que ser mais clara. Não precisa desse drama todo, por mais que te
conheço e sei que 99% de você é assim.

— Ok! — sorri de sua fala e encarei meu celular por alguns


segundos. — Vou convidar ele para vir aqui, agora! — soltei de uma vez, e
Rafael soltou um grito de “Aê, porra” do outro lado da linha. — Mas ele
pode estar no encontro que foi convidado e...
— Liga logo, porra! — Rafael revidou e no segundo seguinte, notei
que desligara na minha cara.

Rafael sendo Rafael.

— Ok, vamos lá Laura! — falei para mim mesma, e peguei o


celular.

Engoli em seco algumas vezes e digitei o nome de Felipe no

celular. Por um segundo me esqueci que ele estava como “Senhor


Mistério” na minha lista de contatos. Cliquei em sua foto, antes de apertar
em ligar, e paralisei por alguns segundos, apenas analisando-o. Ele era tão
bonito que deveria ser proibido.

— Ok Laura, para de enrolar!

Falar sozinha era um hábito que nunca perdi. Desde criança e até
hoje era o que mais fazia. Ajudava-me a colocar os pensamentos em
ordem, ao dizê-los em voz alta. Suspirei fundo e toquei no número,

engolindo sem seco. Era só ligar! Por que diabos eu estava tão hesitante?

O toque do interfone fez-me dar um pulo para trás e cair da cadeira


que estava sentada. Não sabia como, mas o susto em meio a toda aquela
tensão pré ligação, fez com que eu fosse para um lado, o celular para o
outro e a cadeira para outro.

— Nota 0, Laura!
Praguejei e fui até o interfone, vendo que era uma bela covarde.
Onde ia parar toda minha iniciativa quando se tratava de Felipe? Talvez

no mesmo lugar que as respostas educadas, mas certeiras dele em minha


cara.

— Boa noite. — falei, odiando-me naquele momento.

— Boa noite, dona Laura. Tem um rapaz aqui embaixo, Felipe

Soares. — meu coração falhou uma batida e senti todo meu corpo tremer.

Eu estava sonhando?

— Tem certeza, Fabi? — indaguei, após perceber que era ela do


outro lado da linha.

Senti-me patética ao ouvi-la perguntar o nome da pessoa que estava


lá, porém, conseguira ouvir a reposta dele, em alto e bom som. Eu
reconheceria aquela voz em qualquer lugar. Era ele mesmo! Puta que
pariu!

— Sim sim. Felipe Soares! Disse que é o irmão de sua amiga, Babi
Soares.

— Pode deixar subir. — soltei de uma vez, e me despedi de Fabi.


Tão perplexa que sequer conseguia colocar o telefone no gancho.

Levei as mãos aos cabelos e corri para o meu quarto. Pelo caminho,
olhei para a situação do apartamento, que aparentemente parecia
organizado. Assim que cheguei ao espelho que emoldurava toda a parede
do lado da cama, olhei para meu pijama cumprido e me indaguei se ficar

com ele parecia casual?

Acabei deixando a roupa de lado e apenas tentei dar um jeito no


cabelo que ainda tinha um pouco de creme. Passei correndo um hidratante
nos lábios e peguei a bagunça sobre minha cama, e joguei dentro do closet,

fechando a porta dele. Sequer sabia porque estava deixando a cama livre.
Na verdade, lá no fundo, eu sabia. Não custava nada sonhar, não é?

Levantei a cadeira que tinha caído há alguns minutos e peguei meu


celular também jogado pelo tapete. Quando cheguei próxima a porta de
entrada, comecei a me indagar se ele viera para a festa que nunca sequer
existiu. O que eu poderia dizer? O que diabos inventaria? Assim que tentei
raciocinar mais, a campainha soou e dei um pulo no lugar. Quantos mais
sustos eu tomaria naquela noite?

Suspirei fundo umas quatro vezes antes de colocar a mão na chave


e a virar. Assim que abri a porta, senti meu corpo corresponder a simples
presença de Felipe a minha porta. Que de simples não tinha absolutamente
nada.

O queixo quadrado emoldurado pela barba por fazer. Cabelos


castanhos escuros ligeiramente selvagens. Olhos castanhos que me faziam
querer simplesmente esquecer a lógica e pular sobre ele. Vestia uma roupa
simples, que há muito não o via – moletom, camiseta e tênis. Nas mãos, ele

trazia uma garrafa, que se não estivesse tão intoxicada por sua presença, já

teria falado sobre.

Eu não sabia o que dizer.

Eu sequer sabia o que ele fazia ali.

Porém, a forma como vi seus olhos discretamente me avaliaram de

cima abaixo, fez com que meu coração errasse outra batida e meu corpo
implorasse pelo seu toque. A gente se encarou e eu poderia jurar que ele
sentia a mesma antecipação cortante. Era naquele momento em romances
em que se ligava o foda-se e pulava sobre o colo dele, sem querer mais
pensar? Pois era exatamente o que queria fazer.
Capítulo 5

“I hate accidents

Except when we went from friends to this

Uh huh, that's right

Darling, you're the one I want.”[6]

Felipe

Nunca me sentira tão nervoso à frente de uma mulher. A questão


era que não sabia o que exatamente fazia ali. Desde o momento em que
peguei o carro e vim para cá, até quando pedi para subir e ela liberou, não

estava preparado para de fato vê-la. A cada andar que subia, apenas
pensava que precisava ficar calmo e tranquilo, que teriam outras pessoas
lá, e que tudo bem, eu apenas tentar me enturmar com ela. Mesmo que a
frente de outros. Apenas torcia para que Babi estivesse certa e Laura não
tivesse um namorado. Vê-la com outro, tão feliz, me acertara por completo
quando aconteceu. Não precisava repetir tal experiência.
A porta se abriu e tentei abrir um sorriso, mas ainda assim, parecia
congelado. Quando ela entrou em meu campo de visão, parecendo

completamente despojada, fiquei ali, preso nela e em seu olhar. Os olhos


verdes pareciam tão surpresos, e ao mesmo tempo, desconcertados.
Segurei com força a garrafa de vinho em minhas mãos, e não pude evitar
olhá-la de cima abaixo. Ela era tão linda... Que a sua frente, nunca soube

como agir. Contudo, sabia que não era apenas o físico que me atraía.
Existia muito mais.

— Ei! — falei, finalmente encontrando minha voz e ela sorriu de


lado, olhando-me profundamente. — Desculpe aparecer sem avisar, eu...

— Está tudo bem. — cortou-me rapidamente, e me deu espaço para


entrar. Fiquei parado, sem saber como agir. Era como se estivesse preso ao
momento e tão perdido como sempre ficava perto dela. — Entra, por
favor!

Passei por ela, e seu cheiro me impregnou. Tudo nela era um


mistério para mim, como se minha única opção fosse desvendá-la. Tais
sentimentos sempre me pareceram tão complexos. Antes dos Soares,
perdera quase todos eles. Contudo, após eles, estive presente em muitos
momentos onde amor, paixão, perdão, coragem... e muito mais, estavam
envolvidos.

Quando ouvi o barulho da porta sendo fechada, olhei rapidamente


ao redor e não encontrara mais ninguém. Senti um frio na espinha e o

medo de que minha irmã estivesse errada, e de repente, o namorado de

Laura aparecesse. Porém, assim que me virei, e seus olhos verdes me


consumiram, tais pensamentos voaram para longe.

Ela sorriu levemente, e notei a clara forma como parecia


envergonhada. Nunca a vira de tal forma, e não sabia como agir ou o que

dizer. Na realidade, nunca soubera.

— Sei que acetei seu convite em cima da hora e...

— Está tudo bem. — suas palavras me cortaram rapidamente, e sua


mão parou em meu braço, perto da garrafa que segurava. Sempre tivera a
certeza de que ela teria algum poder sobre mim, porém, nunca vira meu
corpo reagir tão facilmente a alguém. — Posso? — perguntou, indicando a
garrafa e ainda com alguns dedos contra minha pele.

Assenti, entregando-lhe a garrafa e sorri. Não conseguia evitar.

— Vem comigo. — pediu, e se afastou, o que me fez sentir falta de


seu toque no mesmo instante. Era como se tivesse me marcado onde
tocara. Queria conseguir dizer aquilo, de forma que não a assustasse.

Como se percebesse que demorei um segundo para responder, ela


me encarou por cima do ombro e sorriu, fazendo uma indicação com a
cabeça. Segui-a, e pela primeira vez, reparando em cada detalhe de sua
casa. Notei que sua cozinha era integrada com a sala de estar, e notei-a

pegando duas taças em um armário. Então, ela as colocou sobre o balcão,

que naquele exato momento, nos dividia.

— Como pode ver, não tem mais ninguém. — comentou, com um


sorriso fraco, enquanto tentava abrir a garrafa de vinho. — Mas estou feliz
por ter vindo. — suas palavras me surpreenderam de tal maneira, que

ficara embasbacado. Assim, notei seu falhar na segunda tentativa de abrir a


garrafa. — Que merda! — reclamou, fazendo-me rir.

— Posso tentar? — indaguei, e ela assentiu, passando-me a garrafa.


Peguei o saca-rolha, e poderia sentir seu olhar me queimando, enquanto
me empenhava em abrir. Em poucos segundos estava tudo certo, e a deixei
aberta sobre o balcão. — Prontinho.

— Obrigada. — comentou e serviu as duas taças. Entregou-me uma


e assenti, em um agradecimento silencioso. Temia que ela odiasse aquele

lado meu. Nunca fora bom em falar abertamente e usar palavras. — Você
já conhece todo o apartamento? — perguntou de repente, degustando um
pouco do vinho.

— Na verdade, nunca passei da sala. — respondi, e ela pareceu


pensar um pouco sobre algo.

— Acho que não fui uma boa anfitriã das outras vezes. — falou,
encarando-me e passando à frente do balcão.

— Não é isso, eu...

— Ei! — cortou-me, tocando levemente minha mão livre. — Vou


te mostrar o apê. Não que seja muito grande, mas...

— Ok.

De repente, era tudo tão íntimo que, pela primeira vez, via-me
desejando que ela me desejasse no mesmo momento. Nunca pensei que
Laura Gutterman me daria alguma chance. Porém, ali, poderia jurar que ela
me olhava como um homem – não apenas como o irmão de sua melhor
amiga. Segui-a pelos cômodos, e a cada luz acesa, surpreendia-me com as
cores ornando e como tudo parecia com ela. Quando paramos a frente da
última porta, o vinho em minha taça já acabara e o dela também.

— Bom, último cômodo. — piscou um olho e abriu a porta, com


um sorriso discreto. — Esse é o meu quarto.

Olhei ao redor e se parecia perfeitamente com ela. Cores entre lilás


e branco. Não conseguia explicar, mas combinavam com ela. Ou talvez,
fosse minha mente, tão longe e tão perto, que não sabia mais o que
raciocinar.

— É a sua cara. — soltei, sem ousar adentrar o cômodo.

— Acha mesmo? — perguntou, e me virei para ela, que


permanecia ao lado da porta, próxima o bastante para que se eu diminuísse
dois passos e não fosse nossa diferença de altura, estaríamos face a face.

— Sim. — respondi e sorri brevemente. — Eu não sou bom


falando. — admiti, finalmente encontrando minha voz. — Desculpe por vir
aqui e...

— Não precisa falar muito. — piscou um olho e sorriu. — Para

isso, temos eu. Pode ter certeza que drama e falação são minhas
especialidades. — deu de ombros, e seguiu pelo corredor, em direção a
sala que viemos. Fui em seu encalço, e notei que fora até a garrafa e
colocara mais vinho para ela. — Suponho que tenha usado sua vinda aqui
como uma desculpa para não sair com...

— Gabriela? — perguntei e Laura assentiu, e notei a forma como


pareceu voar para longe dali por alguns segundos. Talvez, eu já a tivesse
incomodado o suficiente.

— Resolvi ser sincero com ela e dizer que não queria... não como
ela queria. — confessei, e a surpresa no olhar de Laura fora óbvia. —
Parece tão surpresa. — arrisquei dizer e ela assentiu.

— Estou acostumada com caras que preferem mentir do que ser


sinceros.

— Um mau costume, tenho que dizer. — comentei e nem mesmo


me reconheci, notando o sorriso em seus lábios.

— É bom te ter aqui. — sua admissão me pegou desprevenido, e eu

permanecia em pé, próximo ao seu sofá, enquanto Laura estava encostada


contra o balcão da cozinha. — Nos conhecemos há anos, e sinto que é a
primeira vez que realmente nos falamos.

— O mesmo aqui. — complementei e fui até ela, a passos incertos.

Assim que me aproximei, depositei a taça sobre o balcão, e notei sua


proximidade. — O que foi? — perguntei, sem ter ideia do porquê o fazia.
Só que o olhar indecifrável de Laura, me pareceu tão claro ali, que me
assustara. Ela parecia realmente gostar de minha presença.

— Você é tão bonito. — falou, pegando-me completamente


desprevenido. Fiquei sem reação, enquanto ela deixou a taça sobre o
balcão e me serviu mais vinho. — Está corado. — comentou, encarando-
me e acabei abaixando a cabeça, sem saber como reagir.

Minha família sempre dissera que as mulheres se sentiam


envergonhadas sob meu olhar. Contudo, nunca enxerguei tal coisa. Porém,
ali estava eu, queimando de vergonha pela mulher que eu queria. Não pude
evitar levar uma das mãos ao rosto e balançar a cabeça, como se fosse
possível esconder.

— Felipe! — meu nome saindo de sua boca era tão diferente, que
me fizera olhá-la de imediato. — Não precisa se esconder diante de um
elogio. Aposto que já ouviu isso de muitas pessoas.

— Elas não eram você.

As palavras simplesmente pularam de minha boca e não sabia o


impacto que teriam.
Capítulo 6

“And when I felt like I was an old cardigan

Under someone's bed

You put me on and said I was your favorite”[7]

Laura

— Elas não eram você.

Seu olhar castanho me invadiu de forma que duvidava que tinha

noção da força que suas palavras tinham sobre mim. Suspirei fundo, e por
um segundo, tentei entender se aquilo era bom ou extremamente ruim.

— É que... Nós mal nos falamos, mesmo estando perto um do


outro, em vários momentos. — complementou e tentei fingir que era
exatamente aquilo que pensava também. — Da última vez que estive aqui,
tinham várias pessoas. — comentou por cima, como se mudando de
assunto, e apenas aceitei.
Era claro que Felipe não estava confortável ali, a sós. Talvez pela
minha mentira de que teríamos um jantar com outras pessoas. Talvez

porque ele simplesmente não se sentisse à vontade comigo.

— E eu ainda estava namorando. — pontuei sem muita vontade e


notei a forma como me encarou diferente. Ele parecia curioso.

— Gostava muito dele? — indagou, surpreendendo-me por

prosseguir com aquele tema, e dei de ombros.

— Acho que nunca gostei tão profundamente de alguém. —


confessei, e sabia que era parte de minha omissão. Nunca gostei
profundamente de alguém que não fosse você, meu coração gritou em meu
interior.

Olhando-o dali, queria saber se seus lábios me marcariam o tanto


quanto seus olhos faziam. Se suas mãos contornariam cada pedaço de mim
e me fariam sua, ou se simplesmente, não seríamos compatíveis. Parecia

loucura, todo aquele desejo e vontade, não ser correspondido. Mas a forma
calma e serena de Felipe, demonstrava que ele apenas me via como a
melhor amiga de sua irmã.

Sentia-me patética.

— E você? — arrisquei perguntar, e tomei um longo gole de vinho


antes de continuar: — Nunca te vi namorando ou com alguém de forma
mais séria.

— Se eu gosto de alguém? — sua resposta com uma pergunta

deixou-me em alerta, e não saberia explicar porque. Assenti, sem


conseguir temer o que ele responderia. — Mais do que gostar, tenho
certeza.

Fiquei estática e poderia jurar que minha cara entregava a decepção

que sentia. Agora, era como se visse tudo mais claro. Felipe amava outra
mulher. Por aquilo e talvez, por muito mais, ele nunca me olhara. Tal
informação fora como levar um golpe no estômago, ou até mesmo, como
se dissipasse minhas secretas esperanças. Não sabia ao certo o que
poderíamos ser, ou como nos queria. Porém, saber que ele amava outra,
apenas mostrava que seria impossível.

— E por que não estão juntos? — eu devia frear minha boca, mas
não conseguia.

Era como se precisasse saber tudo dele, assim como, tudo sobre ela.
Quem poderia ser? Era minha grande indagação. Naquele momento,
apenas queria ligar para Babi e a obrigar a me contar sobre quem ele era
apaixonado. Contudo, ela sequer sabia do que eu sentia por ele. Nunca
consegui colocá-la em tal situação. Poderia ser ainda mais complicado.

— Ela é... — olhou-me profundamente e poderia jurar que seu


olhar era tão meu, quanto seus sentimentos. Por um segundo, apeguei-me a
ilusão de que o que ele dizia sentir por outra, era todo meu. Por que eu não

poderia ter me apaixonado por algum dos meus ex? Seria tudo tão
simples. — Ela é intocável, digamos assim.

Surpreendi-me com sua fala e tentei pensar em alguém, que


conhecia de seu ciclo pessoal. Contudo, não sabia de ninguém, além da

própria família, que Felipe era próximo. Talvez se tratasse de alguém da


faculdade ou do escritório.

— Por que não tenta? — arrisquei a indagação, mesmo que por


dentro, torcesse para que ele não o fizesse. Ele poderia muito bem
esquecer dela estando comigo, não é? Talvez, estivesse mais do que na
hora de acordar para a vida e tentar. Realmente tentar.

— Como assim? — perguntou, apoiando-se contra a bancada e me


prendendo ainda mais em seu olhar. Não saberia dizer se era o vinho ou a

sua confissão. Porém, vi-me indo até ele, e parando bem próxima, como se
fossemos velhos amigos. Ali, há um fio de cabelo de distância dele, sabia
que não queria ser apenas sua amiga.

Queria saber se aqueles lábios tão misteriosos eram tão bons como
em meus sonhos.

— Se a gente gosta de alguém, a gente tenta estar com ela, né? —


perguntei, e deixei a taça de vinho sobre a bancada, virando-me para ele.
Felipe ainda permanecia sentado na banqueta, por aquilo, estávamos quase

na mesma altura. — Por que não tenta?

— Tenho medo de a assustar. — confessou e notei seu olhar preso


em minha boca, assim como, sua voz mudara completamente de tom. —
Tenho medo de...

Levei meus dedos até seus lábios, apegando-me aquelas palavras


como se fossem minhas. Eu daria valor a elas, se o fossem. Assim, tratei de
pôr em mente, que precisava fazer justamente o que dizia a ele – tentar.

— Acho que eu posso cuidar dos seus medos por alguns segundos.
— falei, e afastei meus dedos de seus lábios.

Passei as mãos por seu rosto, e poderia jurar que morreria apenas
por sua pele em contato com a minha. Era como meu sonho mais secreto e
impossível se realizando, ali, na minha cozinha.

— Laura...

A forma como disse meu nome, e se levantou, fez com que


soubesse, que por mais que outra ocupasse seu coração, aquilo não era tão
importante naquele momento. O meu toque nele o era.

— Esquece tudo e apenas...

Não saberia dizer quem deu o primeiro passo, mas senti suas mãos
em minhas costas, e de repente, seus lábios nos meus. Felipe tinha gosto de
pecado. O mais belo e delicioso. Agarrei-me a seu pescoço, como se fosse

minha fonte de vida. Enquanto minha boca implorava pela dele, e seu
corpo, puxava-me para si. Aquela pegada naquele homem era
simplesmente transcendental.

Sua língua encostou na minha e de repente, apenas senti meu corpo

sendo levantado e depositado sobre a bancada. Era como se fosse explodir


com cada toque, em cada parte de meu corpo. Assim que nos faltou ar, tive
a certeza de que necessitava mais dele, de seu beijo, dele todo. Encarei os
olhos castanhos escuros e notei a forma como ele parecia a ponto de me
devorar.

Não estava preparada para o lado selvagem e pecaminoso do


homem misterioso e quieto que conhecia. Porém, só precisei de um
milésimo para ter certeza que queria cada lado dele comigo – em uma

cama ou em qualquer parte de meu apartamento.


Capítulo 7

“I’m walking fast through the traffic lights

Busy streets and busy lives

And all we know is touch and go

We are alone with our changing minds

We fall in love 'till it hurts or bleeds

Or fades in time[8]

Felipe

Nem em meus melhores sonhos, Laura estaria em meus braços


daquela forma. Era como se ela quisesse tirar tudo de mim. Como se ela
necessitasse de meu toque. Por um segundo, vi-nos na mesma página. Eu
poderia simplesmente ficar ali, sentindo-a, pelo tempo que fosse. Contudo,
assim que nos separamos pela falta de ar, e notei a forma como seus
cabelos estavam revoltos e sua boca inchada, meus sentimentos gritaram.
Só queria dizer que era ela. Sempre foi ela. De certa forma, desde
quando seus olhos recaíram no meus, fora como se pudesse estar ligado a

ela para sempre. Talvez, estivera desde sempre. Temia a assustar com toda
aquela intensidade. Aprendera com minhas irmãs, que eu era de tal forma.
Não sabia fingir que não sentia nada. Não sabia medir os sentimentos
quando os expunha. Eu simplesmente, deixava-os, me tomar.

Laura me tomara para si, sem ter a mínima noção daquilo.

E eu, a tomava para mim, naquele exato momento.

— Laura, eu só quero te dizer algo, antes que...

— Algo que pode estragar esse momento? — indagou e notei a


fragilidade em seu olhar. Pela primeira vez, era como se pudesse lê-la.
Será que eu não conseguia antes por temer tanto o que sentia por ela? Pelo
medo da rejeição?

Suas mãos estavam em meu rosto, e a cada toque de sua pele na

minha, era como se pudesse esquecer tudo e permanecer ali, com apenas o
seu nome em minha mente.

— Eu só... — parei um segundo e engoli em seco – eu só te amo,


era o que minha mente, coração e alma queriam gritar, porém, calei-me.

Puxei forças, para colocara para fora. Não queria simplesmente ir


para uma cama com ela. Eu queria que ela soubesse que significava mais
para mim, mesmo que não fosse recíproco. Era uma necessidade. Talvez
fosse intenso demais.

— Então? — insistiu, com os olhos verdes de um brilho diferente


de tudo que já vi. Era naquele olhar que queria permanecer, mesmo que
soubesse tão pouco sobre relacionamentos. Sabia que era com ela, que
gostaria de saber.

Abri a boca para dizer, e de repente, como se fosse o destino


interferindo – a campainha soou. Laura bateu com uma mão na testa e
notei que não queria sair dali, de cima do balcão.

— Só pode ser alguém da minha família. — comentou, e segurei


sua cintura, no momento em que pulou da bancada. Ela veio para ainda
mais perto e seus lábios tão próximos aos meus, faziam-me querer prová-la
de novo. — Sabe que pode me beijar, não é? — indagou, como se lesse
meus questionamentos. — Sempre que quiser, Felipe.

Sem mais questionar a mim, ou a ela, apenas aproximei nossos


lábios e de repente, sabia que não queria parar em apenas algo terno.
Nossas línguas queriam estar juntas, e minhas mãos sentiam queimar a
cada vez que apertava com ainda mais força sua cintura. Assim que nos
afastamos, eu, a todo contragosto, Laura sorriu lindamente, tocando minha
barba.
— Eu só espero que não sejam os gêmeos. — comentou, antes de
sair de meus braços e ir em direção a porta.

Fiquei ali, na cozinha, por alguns segundos, pensando em tudo,


menos em seu corpo, e em como, queria beijá-la novamente. Suspirei
fundo, no momento em que ouvi a voz de seu primo Rafael. Nos
conhecíamos esporadicamente, mas sabia que os dois eram como irmãos.

Ele não morava por ali, pelo pouco que sabia. Se mudara para o interior,
junto com a esposa.

Permaneci na cozinha, sem saber o que fazer, ou se deveria


aparecer. Não sabia porquê, mas de repente, era como se adentrasse um
novo universo. E o estava fazendo. Sabia que ainda era tudo muito novo
para mim. Mesmo que já tivesse me envolvido com outras pessoas, não
fora como ela. Nada se comparava a ela.

— Eu sei que está escondendo algo. — a voz de Rafael soou no

ambiente, e senti-me mal por parecer um criminoso na casa de alguém.


Contudo, não apareceria caso Laura não quisesse. Não sabia como de
repente, passávamos de mero conhecidos para beijos quentes como o
inferno. — Isso tem cara de homem, Lau!

— E você só veio trazer o queijo que Zalon mandou! — a voz de


Laura soou rude e acabei sorrindo sozinho na cozinha. Por mais que não
entendesse o que acontecia. — Não vem me encher a paciência, Rafael!
— Eu tenho uma aposta e ela começa com a letra...

De repente, ele parou de falar, e fiquei curioso para saber o que de

fato acontecia, porém, me contive. Não era alguém do círculo pessoal de


Laura, para simplesmente me intrometer ou exigir algo. Apenas estava
começando, como em um sonho, que poderia simplesmente acordar a
qualquer instante, a conhecê-la. Não queria estragar o pouco que

acontecera entre nós. Mesmo que aquele pouco significasse tudo para mim.

Ouvi a porta sendo fechada e segurei uma respiração, ainda parado


ali. Não sabia como agir, era a realidade. Quando estávamos apenas nós,
pareceu tão simples. E quando Laura entrara em meu campo de visão, mais
uma vez, soube que me perdia por ela.

— Queijo minas! — levantou a sacola em suas mãos, com um


sorriso. — Rafael adora me encher o saco... Deve saber como é, já que tem
duas irmãs e um irmão.

— Babi é a que mais me enche, admito. — comentei simplesmente,


sem entender como era tão fácil me abrir com ela, e Laura riu abertamente.
— Não conte isso a ela, ela...

— Somos melhores amigas, sabe disso, não é? — indagou


provocativa e veio para perto de mim, deixando a sacola na bancada que
antes, seu corpo estava. — Acho que vou ter que cobrar de alguma forma,
essa minha omissão.

— O que quer dizer? — indaguei, minha voz saindo mais rouca

que o normal, e os olhos dilatados de Laura diretamente nos meus. Meu


corpo já estava pronto para ela.

— Bom... — seus lábios rasparam os meus e de repente, sua boca


chegou até minha orelha. A forma como ela se movia sobre mim, deixava-

me extasiado. Laura era a personificação da sensualidade. — Acho que


posso cobrar beijos e toques... — sua voz soou baixa e de repente, senti
seus dentes puxarem o lóbulo de minha orelha.

Segurei-a firmemente pela cintura no mesmo instante, e sequer


saberia dizer o que houve comigo, porém, eu sabia que Laura despertara
um lado meu, que ninguém tinha – apenas ela.

Puxei-a pela nuca e de repente, notei sua respiração entrecortada,


assim como, sua pele toda arrepiada.

— Cobre tudo de mim!

Sem querer pensar em mais nada, meus lábios foram para os seus,
devorando-a. Suas mãos sob minha camiseta, fazendo meu corpo todo
implorar por mais. Minhas mãos em sua nuca e cintura, trazendo-a para
mais perto, como se fosse possível sermos apenas um. Eu sabia que era. E
sabia, que era o queria para aquela noite... e todas as demais.
Capítulo 8

“Say my name and everything just stops

I don't want you like a best friend

Only bought this dress so

you could take it off

Take it oh, ha, ha, ha-ah

Carve your name into my bedpost

'Cause I don't want you like a best friend

Only bought this dress so

you could take it off

Take it oh, ha, ha, ha-ah[9]

Laura

Minhas mãos já tiravam sua camiseta, e notei a forma como seu


olhar castanho se tornou completamente negro. Queria mergulhar naquela
imensidão com ele. Apenas com ele.
Engoli em seco, enquanto raspava minhas unhas levemente por seu
torso nu e sabia que nenhum outro amante seria como ele. A forma como o

simples toque me fazia ferver. A forma como o mistério sobre ele me


embargava. Eu queria tudo dele.

Algo me alertava que era além do mistério, e além da timidez.


Felipe se soltava, mas até certo ponto, como se contivesse o que realmente

queria. Trouxe suas mãos para minha cintura, onde ele me apertou de
forma que fez todo meu corpo tremer, e intercalava entre minhas costas e
pescoço. Eu não queria apenas ali. Eu queria seu toque por todo meu
corpo.

— Aqui. — falei, e desci suas mãos para minha bunda, apertando-


as contra mim. Gemi com o toque e notei a forma como ele parecia
torturado, ao mesmo tempo, que satisfeito por fazer aquilo.

Sabia um pouco de seu passado. Sabia que ele não tinha uma

história de vida nem um pouco parecida com a minha. Nem de longe, com
da maioria das pessoas. Não saberia dizer se ele realmente transara com
alguém algum dia. De certa forma, a ideia de aquele homem me pertencer,
tornava-me voraz. Ele poderia me chamar de sua também, se o desejasse.
Gostava de como aquilo soaria entre nós, ainda mais, se queimássemos
juntos.

Sua boca estava na minha, fazendo-me perder qualquer raciocínio,


e suas mãos me exploraram mais, partindo para a parte anterior de meu

corpo. Sorri, quando se afastou pela falta de ar e puxei seu lábio inferior

com os dentes.

— Disse que eu posso cobrar tudo... — comentei, enquanto me


perdia com as mãos no cós de sua calça. — Eu quero tudo, Felipe.

Uma de suas mãos veio para meu rosto, e mesmo no mar de

sensualidade que estávamos mergulhados, encontrava o carinho em seu


olhar como uma onda me acertando em cheio.

— Eu não posso prometer que vai ser perfeito, eu... — notei sua
fragilidade, e poderia jurar que sua mente girou sobre “n” questões, menos
em nós, pela primeira vez, naquele exato lugar. — Eu sou virgem. — sua
admissão não me pegou de surpresa. Suspirei fundo, tentando entender a
dimensão de que ele desejar estar comigo, tomava. — Não sou como a
maioria dos caras que conheceu, ou...

Levei um dedo a sua boca e o calei, negando com a cabeça. Se ele


soubesse a quantidade de homens que estive, com apenas ele em minha
mente, com toda certeza, não estaria daquela maneira. Felipe parecia, pela
primeira vez a minha frente, inseguro. Não combinava nada com ele. Na
realidade, sabia que eu combinava.

— Não quero que seja como ninguém. — admiti, tocando seu rosto
e tentando deixar para ele, todo o sentimento que me invadia. — Apenas
quero que seja você. Nada mais.

— Vai ter que me guiar. — comentou e sorriu de lado, com um


lado cafajeste que poderia me acostumar facilmente. Mordi meu lábio
inferior e o puxei pela mão, andando com ele em direção ao quarto.

Surpreendendo-me, antes que eu atravessasse a porta, ele me puxou

para si, e me virou, beijando-me profundamente. De repente, senti minhas


mãos presas contra a parede, enquanto ele me encarava, como se fosse a
sua coisa favorita do mundo. Eu poderia ser. Ele só precisava me dar uma
chance. Ou melhor, eu a tomava bem ali.

— Eu não sei o que fazer, mas... Sei o que quero com você. —
confessou, a voz mais rouca e sedutora, fazendo todo meu corpo se
arrepiar. — Quero te sentir na minha boca.

— Porra! — falei, no momento em que soltou minhas mãos, com

um pedido claro no olhar de que as deixasse ali, contra a parede.

A calça de meu pijama se tornou uma bagunça nos meus pés, e a


forma como Felipe se ajoelhou, tirando minha calcinha, olhando-me, como
se pedisse permissão, ou se para confirmar, que estava me enlouquecendo
aos poucos, com cada mínimo toque que encontrava meu corpo, deixou-me
da mesma maneira. Suspirei fundo quando sua boca beijou minha coxa, e
minha mão foi diretamente para seu cabelo.

— Pode não saber o que faz, mas saiba que é uma tortura. —

comentei, e gemi baixo, quando sua boca encontrou o lugar que mais o
necessitava. Gemi alto, sem conseguir me conter, e por um segundo fechei
os olhos, sentindo que poderia morrer feliz ali.

— Olhos em mim! — sua voz exigiu, e os abri, encantada e

extasiada com aquele lado dele.

Quando pensei que continuaria me torturando, ele simplesmente se


apossou. Tirando meu fôlego, e fazendo com que meu corpo cedesse e
quase desabasse sobre o dele, enquanto gritava coisas inteligíveis. Assim
que ele ficou de pé, firmando-me, apossei-me de sua boca, puxando-o
diretamente para o quarto, e jogando-o na cama, antes que ele pensasse em
tirar minha mente novamente.

— Dois podem jogar esse jogo. — comentei, sobre seu corpo, e

descendo entre beijos, mordidas e lambidas por seu torso. Sabia que ele
estava mais do que pronto para mim, e a forma como estava sendo
torturado em seu olhar, como me deixara antes, fizera-me regozijar por
dentro. Talvez, aquele desejo pudesse ser mais. Muito mais.

Sapatos e calça fora. Meu olhar no dele, torturando-o enquanto


tocava nos lugares exatos, para que esperasse por mais.
— Laura...

— O que? — indaguei, instigando-o a se soltar.

O olhar castanho no meu, fazendo-me sentir a porra de uma deusa.


Era aquilo. A forma como o seu corpo reagia ao meu. A forma como era
perfeito aquele momento.

Sorri indecentemente para ele, sabendo que ele não ultrapassaria

todas as linhas naquela noite. Eu adoraria passar muitos mais, ensinando


tudo o que pudesse a ele. Ainda mais, aprendendo com ele. Aprendendo
como nossos corpos gritavam pelo do outro.

Minha boca desceu sobre ele, e ele arfou alto. Meus olhos nos dele.
Suas mãos em meus cabelos, apenas ali, como se me incentivando a
continuar. Não pararia por nada no mundo. Apenas queria me perder em
seu corpo, enquanto o meu fervia, e desejava, que ele me tomasse.

— Laura... — sua voz saiu entrecortada, e contrariando o que eu

queria, suas mãos me forçaram para cima, fazendo-me subir sobre ele. —
Eu não quero que seja assim.

— Quer eu sobre você? — indaguei, e ele assentiu de imediato,


sem precisar pensar. — Tem certeza? — perguntei, enquanto ainda existia
razão em minha mente. Estiquei-me apenas o suficiente para pegar uma
camisinha na mesa de cabeceira, e a coloquei a nossa frente. Se ele me
pedisse para parar, eu pararia.

— Tenho. — falou, puxando-me para um beijo, que me tirou toda a

sanidade. Senti suas mãos em minha blusa, que sequer lembrava que ainda
usava, e de repente, estava nua sobre ele. Completamente.

Ele tomou a camisinha e a colocou, enquanto eu o analisava em


cada detalhe. Queria pode cravar aquela imagem em minha cama, para

sempre. Era muito melhor que meus sonhos molhados sobre ele.

Beijei-o, no instante em que uni nossos corpos. Porém, fora


impossível não o encarar, enquanto nos tornávamos um só. Aos poucos,
tomava-o para mim, assim como, ele me tomava para si. Prazer algum
chegava perto daquilo. Momento algum poderia ser comparado.

Esqueci o nome de todos os outros naquele momento.

Era nele que queria estar.

Era nele que queria permanecer.

Mãos na minha bunda. Mãos em seu peito. Minhas unhas o


arranhando. Seus dedos me marcando. Suor entre nossos corpos. Nada
mais importava. Gemidos e palavras perdidas... Olhares e beijos
encontrados... Corpos em sintonia...

E assim foi...
Capítulo 9

“Salt air, and the rust on your door

I never needed anything more

Whispers of "Are you sure? "

"Never have I ever before"[10]

Felipe

Eu não sabia quanto tempo estava apenas ali, olhando para ela.

Sobre meu peito, Laura dormia tranquilamente, e podia sentir seu sorriso
contra minha pele em alguns momentos. Ela parecia em outra dimensão
enquanto sonhava algo que parecia tão bom, quanto a realidade, de eu estar
imerso dela. Apenas dela.

Passei as mãos levemente por seus cabelos, sem querer sair dali e
muito menos, ir para longe. Porém, o tempo tinha passado, e já era
praticamente de manhã. Apenas tinha na memória que apaguei com o som
de sua voz me desejando boa noite e um beijo em meus lábios. Se um dia
sonhasse como seria minha primeira vez na cama com alguém, nunca

chegaria perto do que realmente fora.

Eu sabia de sexo tudo o que poderia saber em pesquisas feitas na


internet, apenas aquilo. Já tinha beijado outras pessoas, porém, nunca me
senti livre da forma como Laura me fazia sentir. Na realidade, era como se

ela me prendesse a si, e finalmente, pudesse ser eu mesmo. Ali entendi que
mesmo que minha vida fosse diferente no passado, eu nunca encontraria
em outra mulher o que ela me fez sentir.

O barulho de um celular invadiu o local, e Laura praticamente deu


um pulo de meu peito, claramente assustada. Ela piscou algumas vezes e
olhou ao redor, tateando a cama do lado oposto até a mesa de cabeceira e
pegando seu celular. Vi-a se espreguiçar, e assim que colocou o aparelho
na orelha, seu olhar chegou ao meu.

— Não foi um sonho. — falou de repente, e um sorriso emoldurou


seu rosto. Uma de suas mãos ficou em meu peito, enquanto ela parecia
ouvir algo do outro lado da linha. — Desculpe, mãe! Eu... Eu não me
toquei que era meu dia de levar os gêmeos para tomar café e... Ok, estou
apenas alguns minutos atrasada, dona Melissa! Eu vou chegar em... —
seus olhos pararam nos meus, e apenas assenti, como se a incentivasse a
seguir como teria. — Me dá vinte minutos. — ela ficou em silêncio e
revirou os olhos no segundo seguinte. — Ok, quinze! Também te amo!

Ela então desfez a ligação e encarou o celular por alguns segundos,

sorrindo.

— Dona Melissa pode ser osso duro quando quer. — comentou


tranquilamente, e eu apenas conseguia olhar para ela. Preso em como
estava linda ali, vestida com a camiseta que era minha. — Bom dia. —

falou, e escalou meu corpo, dando-me um leve beijo.

Minhas mãos foram para seu corpo, instantaneamente. Era como se


fosse natural toda aquela intimidade. Como se fosse uma vida sendo dela, e
ela minha.

— Queria poder tomar café com você e... Mas hoje é o dia semanal
em que passo um tempo a mais com meus irmãos mais novos. Se não, eles
me acham uma desnaturada e me acusam de abandono fraterno. —
argumentou, fazendo-me rir largamente, e lembrar-me de Miguel.

— Acredito que Miguel faria o mesmo caso eu saísse de casa. —


comentei e ela suspirou profundamente, passando uma mão por meu rosto.
— Tudo bem? — indaguei, sem saber ao certo como agir naquele
momento. Nunca tivera um dia seguinte com alguém. Nunca tivera aquilo
com alguém. O que eu deveria fazer?

— Como você consegue ficar ainda mais lindo? — indagou,


pegando-me completamente de surpresa, e senti meu rosto pegar fogo. —

Então agora você é tímido! — provocou, fazendo-me rir e ao mesmo

tempo, dando-me vontade de me esconder.

— Eu só... — calei-me, sem saber me explicar. Apenas entendi que


queria poder fazer daquele sonho algo real. Não queria afastá-la ou
assustá-la.

— Antes de correr para a família, eu quero te dizer que... — ela se


ajeitou na cama, ficando ajoelhada e com o olhar ainda no meu. — Não foi
só uma noite para mim. Nem vai ser, caso..

— Eu quero! — respondi, a pergunta que ela sequer fizera,


fazendo-a abrir um sorriso, que jurava, poderia iluminar a cidade inteira.

— Ótimo! — levantou as mãos em sinal de rendição, como se


aliviada. — Estava pensando em como ia conseguir te deixar sozinho
comigo várias e várias vezes... — comentou, beijando-me levemente nos

lábios. — A gente pode se ver hoje à noite? — perguntou, e meu interior


deu um pulo.

— Claro. — respondi de imediato, sem crer que ela realmente


gostaria de me ver novamente. — Quer sair para comer algo? — indaguei,
tentando parecer menos maluco, e um cara normal para com ela. Mesmo
que ela despertasse tudo de mim.
— Que tal dançar depois? — complementou.

— Posso não ser muito bom nisso. — comentei com sinceridade e

ela deu de ombros.

— Tenho certeza que não tem um grama nesse corpo que não seja
bom em algo. — seu tom se modificou por completo, prendendo-me a teia
de sedução que ela instantaneamente construía.

Não pude resistir e levantei meu torso, chegando perto dela. Toquei
seu rosto e notei a forma como reagira a mim. Ela sentia a mesma atração
– parecia simples e nítido ali.

— Eu quero te beijar de novo. — falei, e ela aproximou ainda mais


nossos rostos.

— Sabe que pode fazer o que desejar comigo, não é? — indagou, e


meu coração falhou uma batida, enquanto todo meu corpo acordou. — O
que desejar.

Joguei minha sanidade para longe e apenas puxei-a pela nuca, seus
lábios novamente nos meus. De repente, aquele sonho parecia uma
realidade contínua. Queria que perdurasse e faria de tudo para que sim.
Assim que adentrei a grande porta da sala, não pude evitar fechar
os olhos e soltar um suspiro alto.

— Então o senhor dorme fora pela primeira sem avisar ninguém e


chega suspirando alto....

Arregalei os olhos no mesmo instante, e notei minha mãe, Victória,


com seu robe na cor preta, e uma caneca em mãos. Tentei abrir a boca para

me explicar, e só então percebi que era a primeira vez que não dera
nenhuma satisfação a meus pais.

— Mãe, eu...

— Você perdeu a virgindade! — praticamente gritou, com um


sorriso enorme no rosto, deixando a xícara sobre a mesa de centro e
correndo até mim. Fiquei parado, sem conseguir expressar nada, enquanto
ela me olhava de cima abaixo, como se procurasse tudo no lugar. — Ai,
me diz! Foi bom? Ela ou ele foram bons com você? É...

— Minha rainha.

A voz de meu pai invadiu o ambiente, e pelo seu tom, sabia que ele
segurava a risada. Assim que seu olhar chegou ao meu, eu praticamente
implorei por socorro. A versão mãe de Victória Soares poderia ser
embaraçosa e maluca, como minha irmã mais velha, Luna, sempre dissera.
Aquela era a primeira vez que me via sem saber para onde correr na minha
própria casa.

— Podemos falar com Lipe depois sobre isso, não é, filho? —

indagou, chegando próximo a ela, e contornando sua cintura, enquanto ela


parecia querer soltar um rojão por ter a certeza de que realmente
acontecera algo comigo – eu era realmente transparente para com ela.

Meu pai então deu um leve beijo nos lábios dela, como se a

distraindo, e abriu os olhos antes que ela o fizesse, fazendo sinal com a
cabeça para que eu subisse as escadas. Assenti, seguindo meu caminho,
porém, ainda pude ouvir ela gritando as minhas costas.

— Estou feliz por você, filho!

Eu sabia que ela estava, assim como, meu pai estava. Eles me
deram um mundo novo e me fizeram acreditar novamente que a vida
poderia ser bonita.

Assim que cheguei ao quarto, e fechei a porta atrás de mim, sentei-

me no chão mesmo, sem conseguir acreditar no salto que minha vida dava
em menos de vinte e quatro horas.

Fechei os olhos por alguns instantes, sorrindo enquanto lembrava


de Laura cantando pelo seu quarto, enquanto se dividia em se vestir e fazer
dar tempo para sair e encontrar seus irmãos. Gargalhei sozinho, ao me
lembrar de ela cantando com a escova de dentes de microfone, encarando-
me, como se fosse para mim. E de repente, vi-me apenas cantando

baixinho parte do que lembrava do que ela cantara. Aquela seria uma nova

música de minha playlist. Com toda certeza.

“Eu e você, sem direção

Me dê a mão e eu me perco mais

Eu e você, sem direção

Não solte a minha mão jamais

Eu já nem durmo mais, não

Não sei se eu devo fugir de você

Se agora é certo ou errado dizer

Que eu te quero aqui.”[11]


Capítulo 10

“In my defense, I have none

For never leaving well enough alone

But it would've been fun

If you would've been the one.”[12]

Laura

— Cheguei!

Meu grito poderia ser ouvido na casa vizinha, tinha certeza. Abri

um sorriso, esperando meus irmãos surgirem, mas o silêncio e minha mãe


caminhando em minha direção foram a resposta. Era estranho os gêmeos
não responderem meu chamado. Geralmente, pulavam em cima de mim.
Sorri apenas com o pensamento. Meus irmãos eram meu mundo todinho.

— Seu pai os levou. — minha mãe falou calmamente, enquanto seu


olhar me varria por inteira. Melissa Lourenzinni Gutterman sabia tudo a
respeito de mim, como se pudesse me ler quando me olhava daquela
maneira. Apenas ela parecia capaz. — E mesmo assim o sorriso não sai da
sua cara, filha.

— Oi, mamãe. — falei, aceitando seus braços ao meu redor. Queria


poder explicar, mas, não sabia como dizer que era apaixonada pelo filho de
uma de suas amigas mais próximas. E para piorar, irmão da minha melhor
amiga. — Desculpe o atraso. — comentei, assim que se afastou e tocou

com carinho meu rosto. — Eles estão muito bravos?

— Na verdade, adoraram que seu o pai os levou, porque, segundo


eles, Levi não os leva há um mês para tomar café fora e a escola. — ri de
sua fala, sabendo que só poderia ser o drama de Tuan. Ele era exatamente
como eu e nosso pai. Já Lorena não tinha muita escapatória e caía na
ladainha do gêmeo.

— Apenas eles são os adolescentes que amam os pais na escola,


nunca vi igual. — falei, sabendo que minha mente estava longe dali,

enquanto minha mãe me encarava. — Que foi?

— Tem algo diferente em você. — falou, dando de ombros. — Eu


acabei de assar pães de queijo. Já que não vai comer com os gêmeos...

Minha barriga roncou no mesmo instante e acabei sorrindo para


ela, seguindo-a.

— Eu estou normal, dona Melissa. — refutei, assim que me sentei


na mesa. — Não vem com o instinto apurado de mãe, em! — brinquei.

— Posso ser honesta? — indagou de repente, e seu tom era sério,

deixando-me apreensiva. Ela raramente usava tal tom. Ao menos, comigo.


Os olhos castanhos dela bateram no verde dos meus, e assenti. — Lembra
a última vez que Babi veio aqui junto a Victória e... Passamos o domingo
todo juntas, e falando sobre tudo, sobre nada.

— Lembro. — comentei, sem saber onde queria chegar.

— Felipe veio buscá-las, já que o carro de Babi estragou e bom...


— engoli em seco no mesmo instante. — Eu vi a forma como sua postura
mudou e seu olhar, Lau. Nunca te vi olhar assim para nenhum namorado.

— Mamãe...

— Sei que odeia quando te leio assim, ao mesmo tempo, que ama,
porque é a prova de que nos conhecemos muito bem. Só quero pedir para
que tenha cuidado e calma com Felipe, ele...

— Não é como os outros, eu sei. — complementei e notei que ela


parecia genuinamente preocupada. — Eu o amo. — confessei, e
finalmente, as palavras correram por minha boca.

Minha mãe sorriu, colocando a assadeira com os pães de queijo


sobre a toalha a minha frente.

Ela então se encostou na mesa e tocou meus cabelos cacheados,


assim como os dela. A diferença era que ela agora os mantinha mais
curtos.

— Apenas Rafa sabe, porque... Porque eu não sei. Felipe sempre


foi um mistério para mim. Sei que ele teve um passado completamente
fora da minha zona de conforto e... Por Deus! Não faço ideia do que
passou morando nas ruas. Mas ontem... Ontem, éramos só nós e... Eu

poderia jurar que posso ser amada por ele.

— Por isso está tão sonhadora? — indagou e assenti. — Por que


sinto, que mesmo que tenha passado a noite com ele, ainda está insegura?

— Porque ele ama alguém. — confessei, sabendo que aquilo se


passava em minha mente desde o segundo em que saíra de sua boca. Nos
braços dele, esqueci por completo. Longe deles, tudo me atingia.

— Ele te disse isso? — perguntou e assenti, sem querer encarar a


realidade. — Então, vai lutar para ser o novo amor?

— Acho que já estou. — dei de ombros e sorri. — Eu só não


entendo tanta coisa, mesmo depois de namorados, eu... Nunca me senti tão
confiante com alguém, mesmo que as vezes, o meu drama grite.

— Uma rainha do drama nunca perde a majestade. — falou,


fazendo-me rir, e beijou levemente minha cabeça.

— Foi como tirar duas toneladas das costas. — confessei, enquanto


minha mãe sentava na cadeira ao lado. — Obrigada por isso, mamãe.

— Estou aqui para isso. — piscou um olho, pegando um pão de

queijo. — Agora, me fala! Quando vai vê-lo de novo?

— Hoje. — respondi, sorrindo no mesmo instante. — Vamos sair


para dançar.

— Vic sempre diz que Felipe não é de sair. — comentou e assenti,

sabendo daquilo. — Está tentando colocá-lo um pouco em seu mundo?

— Acho que sim. Ao mesmo tempo que, sinto que qualquer lugar
pode ser bom com ele.

— Isso é amor, Lau. — comentou calmamente.

— Acho que estou começando a entender.

Era a realidade.

Não sabia praticamente nada sobre. Porém, sabia que seria incrível

se ele fosse o cara certo. No fundo, sabia que era ele. Talvez, sempre
soubera. Desde o primeiro olhar, até seu corpo ser meu. Não conseguia
parar de sorrir, mesmo que estivesse em uma luta contra o amor intocável
dele. Eu era o oposto. Ele poderia me ter, me querer, me tocar... quando
quisesse. Esperava que minha intensidade não o assustasse. Porque no fim,
eu era daquela maneira.

E pela primeira vez, caía de cabeça por alguém.


Meu celular vibrou no bolso da calça e o peguei no mesmo
instante, sob o olhar atento de minha mãe. Quando notei seu “Senhor

Mistério” no visor, senti que poderia gritar ou cantar. Queria poder rodar
pela cozinha, e quando percebi, estava fazendo aquilo. Sem sequer olhar o
conteúdo, e eu me sentia no céu por conta de uma mensagem.

Quando parei, encostando-me contra a ilha da cozinha, minha mãe

sorria.

— Todo começo de amor é assim? — perguntei e ela deu de


ombros.

— É o começo do seu, isso que importa. — sorri, abrindo a


mensagem e sentindo meu coração falhar uma batida.

Remetente: Senhor Mistério

É normal já querer te ver de novo?

obs: sou novo nisso.

Levei o celular ao peito, como se em meu coração e senti o alívio


me percorrer. Talvez, as coisas apenas se encaminhassem. Da melhor
maneira possível. Porém, pensando no que ele perguntara, eu não tinha a
resposta correta. Contudo, sabia como ele se sentia.

Eu estava igual.

Destinatário: Senhor Mistério

Se é normal, eu não sei. Mas, de uma coisa tenha certeza – nunca me senti

assim antes.

obs: também sou nova nisso.

obs2: também quero te ver de novo, hoje.

Cliquei em enviar e dei uma última rodada pela cozinha. Minha


mãe comia serenamente, com o olhar que dizia tudo – ela estava feliz por
mim. E eu? Eu apenas queria que o dia passasse. Tudo o que desejava era
cortar o tempo e poder estar nos braços dele de novo. Naquele momento,

tive a certeza de que Felipe não era um amor para se esquecer. Não era
apenas o primeiro amor para ter saudade. Eu não queria esquecer. Eu não
queria sentir falta.

E o começo de nós, não poderia ser mais confuso e dramático em


minha mente. Contudo, no fim da noite, tinha certeza de que ele estaria na
minha cama, outra vez.
Capítulo 11

“I've been breakin' hearts a long time, and

Toyin' with them older guys

Just to play things for me to use

Something happened for the first time, in

The darkest little paradise, shakin'

Pacin', I just need you.”[13]

Laura

O coração na boca.

Parada na frente de meu celular, com corridinhas esporádicas até o


espelho mais próximo para conferir se estava de fato pronta. Acreditava
que nunca de fato estaria pronta para uma noitada com Felipe Soares.

Por Deus!

Aquele era uma parte dos meus sonhos impossíveis que poderiam
todos ser realizados exclusivamente por ele. Pois, apenas o incluíam. Se
ele soubesse...

O celular tocou no segundo em que peguei o batom vermelho em

mãos e de repente, ele estava no chão. A adrenalina que percorria todo


meu corpo parecia a mesma de realizações da vida, que adorava sentir.
Como me formar na faculdade. Como o emprego que amava. Como
comprar meu apartamento. Como poder comprar meu vinho favorito e

passar o fim de semana nua na cama, e não fazendo absolutamente nada.


Com toda certeza, Felipe em uma local escuro, com música, era uma das
quais queria para a lista.

— Ei! — falei, tentando fechar meu batom com apenas uma mão e
não tentando parecer completamente desesperada.

Eu tinha esperado dar dois toques para atendê-lo? Sequer me


lembrava. De repente, apenas me importava em ouvi-lo. Diferente do
modus operandi que tinha para com homens. Com ele, acabava de

esquecer meu nome, e nem estávamos na cama.

— Boa noite, Laura!

Deveria ser pecado a voz de alguém ser tão sexy ao telefone.


Contrariando todas as expectativas da realidade e confirmando a de livros,
meu corpo todo se arrepiou, e resolvi apenas deixar o batom de lado e sair
de meu apartamento. Precisava entrar no elevador e ir até ele, antes que
perdesse a cabeça. Menos de vinte e quatro horas e eu já sentia vontade de
simplesmente pular em seu colo e ali estar.

Aquilo era normal?

Nunca o sentira antes. Nem mesmo com a primeira paixonite. Era


diferente do desejo iminente que já tive. Era um estado de combustão.
Precisava queimar com ele, o mais rápido possível. O silêncio do outro

lado da linha, fez-me encarar meu reflexo no elevador, enquanto


imaginava-nos apenas subindo naquela caixa de metal, juntos. Suspirei
fundo e resolvi tentar me ordenar. Estava perto de surtar.

— Preciso confessar... — comecei a dizer, ouvindo sua leve


respiração do outro lado da linha. — Eu preciso da sua boca na minha, se
não, vou surtar. E talvez, seu corpo no meu à noite toda. Em qualquer
lugar.

— Laura...

Sua voz soou como tempestiva, como se me implorasse para parar,


ao mesmo tempo, para continuar. O silêncio veio de novo e não desfiz a
ligação. Assim que o elevador parou, respirei fundo e resolvi ser ainda
mais sincera. Porém, surpreendendo-me, ele desfez o silencio.

— Eu... Me sinto da mesma forma. — confessou e mordi o lábio,


com a antecipação me matando um pouco a cada passo que dava para
perto dele.

— Me espera dentro do carro, com as janelas fechadas. — pedi e

desfiz a ligação, passando as mãos nos cabelos e jogando-os para trás.

Sabia qual era seu carro, pois ele me mandara a mensagem com a
placa no segundo em que pisei na rua. Felipe Soares estava na mesma
página que eu, com toda certeza, mesmo que não soubesse o que

aconteceria no carro. Nós não podíamos evitar querer. Assim que me


aproximei do veículo, respirei profundamente antes de entrar e ter minha
visão tomada por todo ele.

Sentei-me, e parei por um momento, apenas o observando. Olhos


castanhos devastadores. Uma expressão que parecia o reflexo da minha –
desejo e saudade. Sem conseguir evitar, minhas mãos foram para seu rosto
e ele veio de bom grado a mim.

— Senti sua falta. — foi tudo o que pude dizer, antes de seus lábios

estarem nos meus.

Uma de suas mãos adentrou meus cabelos, trazendo-o para mais


perto, e segurei-me para não me jogar contra seu colo e ali ficar. Meu
corpo todo aprovando o toque que queimara por ele e pela distância. Ali,
estava recompensando todo o tempo apenas me imaginando com seu toque
sobre o meu.
— Isso é tão diferente de tudo. — falou, assim que nos afastamos
pela falta de ar. Nossas testas encostadas e o controle por um fio. — Nunca

me senti assim, Laura.

Meu coração falhou uma batida, e afastei-me, apenas para olhá-lo


profundamente. Buscando a verdade naquelas palavras, mesmo que a
forma como foram ditas, me confirmassem tal coisa. Em seus olhos,

encontrei-as. Era como se ali, estive estampada a chance de que eu poderia


ter seu coração para mim. Apenas eu.

Esqueça ela, pedi em pensamento, dando-lhe um leve beijo. Não


queria lembrar que ele admitira gostar de alguém antes de nós dois
acontecermos. Precisava focar em ser um novo alguém para ele. Da forma
que ele era único para mim. Sempre fora.

— Está com fome? — indagou, fazendo-me assentir e sorri para


ele. De repente, era tão fácil. Nós dois acontecia da maneira mais natural

possível. — Podemos jantar e depois ir para a boate que disse.

— E depois... — olhei-o em expectativa e notei a forma como seu


olhar devorou meus lábios e o topo de meus seios. A forma única que o
vira me encarar, como se fosse a mulher que ele mais desejava no mundo.
A sensação daquilo, tornava-me uma maldita deusa. — Pode passar a noite
comigo.
— Sempre que quiser.

Sua resposta me pegou de surpresa, fazendo-me rir de lado e não

conseguir me afastar de seu rosto, beijando-o novamente. Felipe tinha


gosto de menta com pecado e paixão. Uma mistura tão nova para mim, e
que de repente, deixava-me embriagada. Afastei-me a contragosto e sorri
para ele, enquanto colocava o cinto de segurança e ele dava partida com o

carro.

— Posso? — perguntei, indicando o sistema de som. Ele sorriu,


assentindo, e logo senti sua mão direita pairando sobre a parte exposta de
minha coxa, devido ao vestido que subira um pouco.

— Posso?

Ele com toda certeza não sabia o quanto a sua inocência e polidez o
deixavam ainda mais sexy. Me deixava ainda mais maluca por ele. Sabia
exatamente o que queria, e assenti, soltando um suspiro de desespero no

segundo em que sua mão apertou levemente minha pele exposta.

Eu morreria com a cena de ele, concentrado no trânsito, mas com


uma mão em minha coxa. Aquela parecia, de repente, de definição de
“couple goals” para mim. Felipe Soares, realmente, mudava todos os
padrões. Sem conseguir evitar, e sabendo que dois poderiam jogar aquele
jogo, conectei meu celular através do bluetooth, e coloquei a música que
me fizera pensar nele o dia todo. Na realidade, desde que seu toque me
atormentou por mais.

Sempre mais, com ele.

Sem conseguir evitar, cantei junto a música, e no segundo exato, o


sinal vermelho apareceu, e seu olhar castanho me consumiu.

“Não me culpe, seu amor me deixou louco

Se não, você não está fazendo isso direito

Senhor, salve-me, minha droga é meu amor

Eu estaria usando pelo resto da minha vida

Eu venho quebrando corações há muito tempo, e

Brincando com eles, caras mais velhos

Apenas para jogar coisas para eu usar

Algo aconteceu pela primeira vez, no

Paraíso pequeno mais sombrio

Ritmo, eu só preciso de você”[14]

O aperto em minha coxa aumentou e eu sabia que ele entendia. De


repente, eu encontrava alguém que me entendia como as músicas
diferentes que escutava. E era ele... Como pude demorar tanto para fazer

aquilo acontecer?

Entretanto, parecia o momento certo. Talvez sempre o fosse,


porque era com ele. Felipe era a minha perdição pessoal, e soube pela
forma como seus dedos queimavam minha pele, que eu desejava suas

marcas em mim, por mais que uma noite. Por todas as noites, pelo resto da
vida. Seria maluquice? Eu adoraria ser considerada maluca, se fosse para
senti-lo. Apenas para senti-lo.
Capítulo 12

“In the middle of the night, in my dreams

You should see the things we do, baby

In the middle of the night in my dreams

I know I'm gonna be with you

So I take my time

(Are you ready for it?).”[15]

Felipe

O suspiro preso na garganta.

Assim que saímos do carro, eu não sabia ao certo o que fazer. De


repente, ali, expostos, tudo parecia complicar. Não por eu não querer que
ela fosse minha, porém, por não saber como agir. Não tinha a mínima ideia
de como se agia em um primeiro encontro. Aquele era um primeiro
encontro, certo?

— Estou vendo sua cabeça pegar fogo de tanto que pensa. — sua
voz chamou minha atenção, como se fosse a gravidade me puxando. Senti

seu braço envolver o meu e ela sorriu. Não consegui fazer outra coisa do

que me afastar levemente, e passar o braço sobre sua cintura, trazendo-a


para perto. Ela sorriu, como se aprovasse minha mudança de situação e
como se me incentivasse. — Não há nada mais sexy em você do que

quando age espontaneamente, como se me lesse.

— Como assim? — indaguei, sentindo meu rosto queimar,


enquanto adentrávamos o ambiente.

— Retiro o que disse. — falou, mordendo o lábio inferior, fazendo


minha mente voar para nós dois, em um lugar sozinhos. — Quando cora
ou me olha dessa forma, como se estivesse nos imaginando nus... — sua
voz saiu como um sussurro e engoli em seco. — Não sei mais quando
consegue ser mais sexy! Acho que vou morrer até o fim da noite. —
admitiu, levando uma mão ao peito e agindo dramaticamente, fazendo-me

rir de lado. — Sem sorriso cafajeste, Soares. Ou, eu morro agora.

— Não por mim, Laura. — comentei, e toquei levemente seu


queixo, segurando-me para não a beijar bem ali.

Afastei-me e fui até a cadeira, puxando-a para ela. Laura sorriu,


como se não esperasse aquilo e eu dei de ombros. Sabia que não era
comum puxar a cadeira em uma lanchonete, contudo, era algo que me
acostumara em qualquer lugar. Sempre via meu pai fazendo aquilo com
minha mãe, e de certa forma, trouxe para mim. Na realidade, eles eram

meu espelho para praticamente tudo. No amor, não seria diferente.

— Você é tão diferente. — Laura comentou e não soube fazer nada


que não fosse sorrir para ela.

Eu era apaixonado por ela há tanto tempo, que não conseguia me


ver fazendo algo diferente desde que o dia anterior. Ela tinha me beijado.

Ela tinha sido minha primeira. E em minha mente e âmago, desejava que
fosse a única. Suspirei fundo, e quando coloquei a mão sobre a mesa, senti
a sua sobre a minha. Para ela, parecia simples, como respirar. Simples
como fora gostar dela... Apaixonar-me por ela. Temia que perdê-la fosse
da mesma maneira. Não queria vê-la escorregar entre meus dedos.

— Diferente bom? — tomei a coragem de viver o momento e


deixar acontecer. Não queria perder o que tinha no presente, simplesmente
por medo de perder no futuro.

— Tudo sobre você sempre me surpreendeu de forma boa, lindo.


— fiquei por um segundo parado, sem saber como reagir ao apelido e notei
que Laura quase se escondeu na cadeira. — Eu jurei que ia morder a
língua. Jurei a mim mesma, no caso. Mas... não sou conhecida por fingir.

— Não tenho problema por me chamar assim. — comentei,


apertando sua mão, e de repente, nossos dedos estavam entrelaçados. Não
sentia fome de mais nada, a não ser, passar o tempo com ela. — Eu só não
sei fazer o mesmo.

— Apelidos? — indagou e assenti, dando de ombros.

Por dentro, eu tentava me controlar, contudo, sabia que minha


felicidade estava explícita. Ela me achava lindo... Ela me chamou de
lindo... Bom Deus! Mal sabia o quanto mexia comigo ela me chamar de tal

forma.

— Miguel sempre faz pirraça sobre isso. — comentei, lembrando-


me de meu caçula. — Aliás, hoje ele me interrogou. Logo depois de meu
pai e minha mãe fazerem o mesmo. — notei como tudo saía para ela,
mesmo que não perguntasse absolutamente nada.

— Amo sua família. — falou e seus olhos pareciam ler os meus. E


eu amo você, era o que queria dizer. — Consigo imaginar Victória
querendo saber se usou proteção ou... — parou de falar e gargalhou

baixinho. Assenti, sabendo que a conversa fora exatamente por aquele


caminho.

— Mas ela ficou mais feliz por me ver fazendo algo que
tecnicamente, faz-se antes da minha idade. — dei de ombros. — E Miguel
foi tentar dormir comigo, quase como sempre, e não me encontrou. De
manhã, foi birra atrás de birra.
— Talvez Miguel seja a veia dramática da família, por isso, me dou
bem com ele. — comentou e não pude negar, pois notava a forma como

Laura era, mesmo de longe. Nunca pude não o notar. — Mas e Babi? —
perguntou e notei que sua voz mudara repentinamente.

Naquele instante notei que ela poderia temer que as pessoas


soubessem que era ela. Mesmo não indagando se falei a respeito, era clara

a preocupação em seu rosto.

— Ela dormiu no apartamento de tio Chris. — respondi, e notei seu


semblante mudar. — Eu não contei a ninguém que estava com você. —
complementei e ela pareceu vacilar um olhar. — Não vou contar caso
queira que isso seja um segredo e...

— Ei! — cortou-me, levando seus dedos até minha boca, como se


para me calar. Notara que era um gesto típico seu para comigo. — Não é
nesse sentido. Eu só... Só não quero que Babi me odeie por não contar a

ela. Quero poder fazer isso antes.

— Quer contar da gente para ela? — a pergunta voou de minha


boca e não pude fingir que não o tinha feito.

— Eu te disse que não queria apenas uma noite, lindo. — olhou-me


profundamente, e por um instante, acreditei que era um reflexo meu. — Eu
só queria saber se estamos na mesma página. Não precisamos falar nada
agora, mas... Sou sonhadora demais para fingir que não nos vejo aqui,
daqui algumas semanas, ainda juntos.

Eu estaria ali todos os dias se fosse para poder encontrá-la.

“Sinceridade pode assustar a maioria das pessoas, filho.


Principalmente, no começo. Às vezes, precisamos deixar acontecer.
Porém, não de vinte anos. Seu pai não foi sincero comigo por achar que

eu tinha medo dela. Na realidade, sempre foi ele. No final, a culpa de


estarmos separados por tantos anos foi nossa. Porém, sempre me pergunto
como teria sido se eu tivesse dito que o queria no nosso casamento ou ele
tivesse me contado a verdade sobre como se sentia antes.”

As palavras de minha mãe me atingiram em cheio e pensei em


apenas deixar as palavras correrem para fora. Contudo, sabia que o caso
deles era completamente diferente. Eu e Laura éramos apenas o começo de
algo. Algo bonito que não precisava de pressa, precisava de sinceridade em

cada passo – e eu lhe daria aquilo. Mesmo com zero de experiência e


muito a querer mostrar.

— Eu vou estar aqui, quando me quiser aqui ou...

— No meu quarto no fim da noite? — perguntou e assenti, sem


conseguir evitar. Trouxe sua mão até meus lábios e a beijei levemente.

— Ou qualquer horário.
Nos olhamos por um segundo que pareceu durar uma vida inteira.
Por um segundo, eu consegui ver novamente tudo de nós interligado. Além

de corpos. Como se nossas almas finalmente se encontrassem. Talvez


intercalar entre romance, fantasia e direito não era uma boa. Contudo, eu
amava ler. E olhando ali, para ela. Apenas pude desejar que Laura fosse a
protagonista da minha história de amor. Da nossa.
Capítulo 13

“Come back and tell me why

I'm feeling like I've missed you all this time

And meet me there tonight

And let me know that it's not all in my mind.”[16]

Laura

— Quantas vezes foi arrastado para um lugar como esse? —


perguntei, no momento em que entramos no escuro da pista de dança e

segurei ainda mais firme a mão de Felipe na minha. Puxei-o comigo até o
balcão do bar, e que felizmente, continha menos pessoas. A pouca luz não
me permitia vê-lo por inteiro ali, contudo, os olhos castanhos ainda me
consumiam com seu brilho.

— Babi tentou algumas vezes, mas desistiu na última em que viu


que não combinava em nada comigo. — comentou e o encarei surpresa,
vendo-o se sentar rapidamente em uma banqueta que ficou vazia. Sorri e
não pude evitar ficar bem próxima a ele, na realidade, quase entre suas

pernas.

— E o que combina com você? — indaguei, sem conseguir evitar


tocá-lo.

Minha mão já estava em seu peito e notei a forma como sua


respiração mudara levemente. Existia algo entre nós que não podia ser

evitado. Como se quando estávamos presos um no outro, fosse possível ler


absolutamente tudo. E eu queria tudo, apenas dele.

— Você. — respondeu de relance, e notei que sequer pensara para


aquilo sair. A sinceridade de Felipe para comigo era seu maior charme.
Deixava-me ainda mais ambiciosa por tempo com ele. Sob ou sobre seu
corpo. Ou que fosse apenas para conversarmos e dividir o dia como fora
durante o jantar.

Ele sorriu de lado, do jeito sexy que apenas enxerguei nele, com a

covinha esquerda dando ainda mais destaque ao rosto perfeito. Não tinha
algo nele que me fazia desgostar. Não tinha algo dele que me fazia querer
correr.

— Então... — analisei-o, pensando em como seria puxá-lo para o


vip daquele lugar e tê-lo por um momento a sós comigo. — O que gosta de
beber? — ele deu de ombros e pareceu pensar um pouco.
— Não sou de beber nada além de vinho. — confessou e não fiquei
surpresa. Sempre o notava com uma taça de vinho durante os jantares e

festas em comum, mas nunca, outra bebida. — Na verdade, experimentei


de tudo um pouco e não gostei muito de nada.

— Bom, amo vinho, mas quando saio, para dançar prefiro cerveja.
— comentei, dando de ombros e me virei para pedir uma ao barman.

Assim que me voltei para Felipe, notei que seu olhar não saía do meu
corpo. — O que foi? — perguntei e ele sorriu abertamente, passando uma
mão levemente pelos cabelos.

— Você é linda. — falou e senti meu coração falhar uma batida,


quando pensei em ir até ele e o puxar para mim, senti algo gelado tocar
minha mão parada sobre o balcão. Suspirei fundo e me virei para o
barman, aceitando a garrafa, e agradecendo com um sorriso no momento
em que a abriu.

— Acho que preciso te roubar mais um pouquinho do mundo. —


falei, chegando bem próxima a ele, e o puxando novamente pela mão.

Puxei-o em direção as escadas, que conhecia muito bem. Adorava


aquela balada em particular. Porque o pop e funk que tocavam, geralmente,
eram os quais eu mais gostava, e sempre podia ir ali e esquecer um pouco
do trabalho ou simplesmente, extravasar cantando e dançando no meio da
pista. Assim que chegamos à cabine privada da área vip, soltei sua mão e
fui diretamente para a poltrona central. Conseguíamos ter a visão perfeita

da pista de dança e de todos ao nosso redor. Assim como, de outras

cabines. Era um lugar para simplesmente ficar mais à vontade com amigos,
ou então, com aquela pessoa que você quer que seja apenas sua por alguns
segundos, mesmo com os olhos do mundo ao redor.

Aquele era Felipe Soares para mim.

Notei a forma como ele analisou o local, claramente inspecionando.


Bati levemente no braço da poltrona e bebi um pouco da cerveja. Felipe
levou uma mão aos cabelos e com certeza não sabia o quanto seu
semblante perdido era sexy. O que de fato eu não achava sexy nele, afinal?

— Nunca veio a uma boate com isso? — indaguei e ele assentiu de


imediato, e notei que deu alguns passos para perto do sofá ao lado da
poltrona que estava. — Sim ou não? — perguntei, sem entender sua
resposta e ele piscou algumas vezes, me olhando, antes de se sentar.

— Tio Castiel me trouxe aqui uma vez, há um tempo. Noite dos


homens, disse ele. — comentou e riu abertamente, como se fossem boas
lembranças. — Ele ficou bêbado e praticamente implorou para o levar para
casa cerca de três horas depois. — não pude evitar rir só de imaginar a
cena.

— Dani deve ter ficado furiosa com ele aparecendo dessa forma. —
apontei o óbvio e Felipe assentiu. — Aliás, eu tenho uma pergunta, que
acho que nunca, nem quando tentei sem querer tirar de Babi, consegui a

resposta. — comentei, lembrando-me do fato de que Felipe passara um


breve tempo fora em Londres, com Danielle e Castiel Soares, seus tios.

Levantei-me e fui para perto dele. Notei de primeira a forma como


engoliu em seco e não pude evitar morder o lábio inferior, enquanto seus

braços se abriram completamente, como se preparado para me receber em


seu colo. E eu fui.

Sentei-me de lado sobre ele e notei a forma como seu corpo se


moldava perfeitamente ao meu. Como se seu colo fosse meu lugar certo
desde sempre. O quanto aquelas informações sobre a primeira noite na
balada com o homem pelo qual era apaixonada, seriam úteis à minha mãe
em sua escrita de livros de romance? Demasiadamente. Ela me diria o
quanto paguei a língua por duvidar que um dia, encontraria alguém que

tiraria meu fôlego, ao mesmo tempo que, me fazia respirar livremente.

Uma de suas mãos veio para minha coxa, e assenti para ele, ao
notar que claramente pedia permissão para permanecer ali. Toquei seu
rosto e fiquei por alguns apenas o encarando – admirando-o. Olhar para
ele, tão de perto, me fazia esquecer por completo do que fazia. Do que
fazíamos ali. Só queria parar e memorizar cada detalhe. Tocar cada
detalhe.
— Babi comentou por cima sobre Castiel sentir ciúme de você. —
falei e ele assentiu, como se pensando a respeito. — Não preciso dizer que

achei isso sem sentido, mas... Sabendo do histórico dos Soares no amor, e
de como Dani e Castiel passaram maus bocados...

— Ele estava muito mal na época, na verdade. Acho que


considerou que qualquer pessoa merecia o amor da tia Dani, menos ele. —

comentou e notei um sorriso se abrir ao fim. — Não sabe o quanto foi


incrível quando eles se acertaram. Estive com eles tempo suficiente para
saber que se amavam apenas pela forma que ficavam no mesmo ambiente.
Pode ser maluquice, mas... Era como se os olhos deles fossem a resposta
para tudo.

— De um dos romances favoritos de minha mãe para você... “Os


teus olhos sempre me disseram mais que a tua boca. Neles sempre
encontrei a tristeza que você duramente se esforçava pra esconder atrás

de um sorriso. Alguns dizem que os olhos são a janela da alma. Os seus

são a casa inteira.”[17]

Assim que as palavras pularam de minha boca, notei que não falava
a respeito de ninguém mais, mas sim, de nós. Os olhos castanhos de Felipe
sempre me disseram muito mais do que a boca dele. Na realidade, a boca
dele nunca me entregara absolutamente nada até um dia atrás. A não ser, a
negativa de que jamais teria alguma correspondência.
Pensei sobre a mulher que ele dissera “mais que gostar” momentos
antes de estarmos perdidos demais em nós, que duvidava que ela pudesse

tê-lo assombrado em sentimentos. Olhando-o ali, poderia jurar que seus


olhos me diziam que também que me queria com o afinco que tinha em
meu âmago – com amor.

Encostei nossas testas, e deixei a garrafa encostada sobre a curva

do estofado. Toquei seu peito com a outra mão, e notei seu coração
acelerado como o meu. Eu tinha tanto a falar, mas quando nossos olhares
se encontraram novamente, sua boca finalmente se tornara parte da
resposta.

Seus lábios nos meus.

Suas mãos em meu corpo.

Seu coração sob minha palma, batendo freneticamente.

Seria egoísta demais desejar que todas as batidas fossem para mim?
Capítulo 14

“So, I'mma let go

No one else in the world

could ever come close to you, baby

Close to you, baby

We're taking it slow

Whenever, wherever

we're lasting forever my baby.”[18]

Felipe

Já fora arrastado para pistas de dança antes. Lembrava-me


claramente de como Babi tentara me fazer soltar um pouco mais, e até
mesmo, tia Dani. Não era bom naquilo, definitivamente. Fiquei apenas
dando passos para lá e para cá, bem próximo, enquanto Laura segurava-se
em meu pescoço. Tocava uma música alta, e teria certeza que era alguns
dos funks que minha mãe gritava pela casa. Não tinha certeza do nome,
mas com certeza, já ficara em minha cabeça por um par de dias, porque

Victória Soares quando viciava em algo, fazia a casa toda fazer o mesmo.

Olhei ao redor e notei as pessoas dançando felizes, com sorrisos,


animadas. Pessoas rebolavam ao som da batida, e me sentia um pouco
deslocado por ser completamente duro para aquilo. Demorei um tempo
para entender que ser diferente das outras pessoas não era necessariamente

ruim, e sabia o quanto a terapia me ajudara naquilo. Se fosse, há alguns


anos, com toda certeza não conseguiria ficar ali, sentindo-me tão
deslocado. Contudo, naquele momento, eu entendia que era normal se
sentir assim. Para todas as pessoas.

— Por que não dança como eles? — indaguei, na orelha de Laura e


voltei meu olhar para o dela. Ela me encarou surpresa e dei de ombros. —
Eu sei que ama dançar. Babi já pontuou isso algumas dezenas de vezes em
casa, enquanto ela e mamãe tentavam aprender a dançar sensualmente.

— E elas conseguiram? — perguntou e dei de ombros, e notei que


ela falava alto como eu, devido a música. — Babi até hoje reclama que a
bunda dela não se mexe o suficiente.

Tive que rir, pois era alguma das reclamações que ouvira dela
também.

— Minha mãe começou o pole dance há alguns meses, disse que


ajudou e muito. — comentei e notei algo no olhar de Laura brilhar. — O
que foi?

— Eu amo pole dance.

Paralisei com sua fala, e não pude evitar imaginá-la dançando


sensualmente para mim. Com certeza meu rosto entregava meus
pensamentos, ou se não, ela sabia facilmente o quanto mexia comigo.

Laura afastou as mãos de meu pescoço e as desceu para meu peito.

— O show é todo seu. — falou a minha orelha, e me deu um leve


empurrão, enquanto se colocava a alguns passos distantes de mim.

No mesmo instante, vi-a encaminhar até a dj, e a forma como


conversaram, ficou claro que Laura conhecia muito bem aquele lugar. Não
consegui fazer outra coisa, a não ser, ficar parado ali, no meio de tanta
gente, apenas a observando.

Quando a música mudou, a batida sensual, fez com que eu desse

passos atrás e felizmente, existia uma coluna perto dali. Não sabia ao certo
o que fazer durante as músicas, era um fato. Encostei-me e paralisei ao
notar Laura se encaminhar para um pequeno palco ao lado da dj. Tinha um
poste ali, e não pude evitar os pensamentos que me vieram em mente.

Sequer tinha notado aquele local antes. Talvez por estar preso
demais ao corpo e olhos de Laura. Talvez porque estava me esforçando
para não me sentir um peixe fora d’água. Ali, entendi que ela me fazia

sentir parte. Parte de uma noite com ela. Parte de um local que não me

veria sozinho. Mas com ela, sempre.

Ela se pendurou e desceu, rebolando ao som sensual da música.


Mesmo quando ficou de cabeça para baixo, seus lindos olhos verdes
pararam nos meus e não pude fazer algo diferente de suspirar por ela. Ela

então se afastou um pouco, ainda com uma mão no poste, e pulou do


palco, vindo até mim. Era como se o mundo todo parasse apenas para vê-la
andar. Sabia que o meu mundo parou.

Pisquei algumas vezes, enquanto ela se aproximava mais de mim, e


não pude evitar a forma como meu corpo reagia ao dela. Ela se aproximou
o suficiente para que nossos rostos ficassem próximos, devido aos saltos
que usava.

Seu corpo fez um movimento ficando de costas para o meu, e ela

rebolou, em mim, sobre mim. Fechei os olhos por um segundo, sem saber
o que fazer. Sem saber como agir, e a única coisa que me vinha em mente
era fugir com ela para seu apartamento. Ela então segurou em meu pescoço
e senti seus lábios em meu pescoço, e de repente, sua voz em minha
orelha.

— Sabe que essa marra sempre acaba quando tô pelada,


chamando seu nome... — ela cantou ao som da música que desconhecia até
aquele momento, e não pude evitar minhas mãos em seu quadril, trazendo-

a para mais perto. Abri os olhos, para me deparar com os dela,

praticamente me devorando. Aquela sensação de necessidade emanando


dela. — Com tesão, diaba virou o meu codinome. Pronta pra atentar, essa

leoa sente fome. Vai, me usa, me nomeia sua musa...[19]

— Laura! — cortei-a, com uma mão em sua cintura e a outra em

seu queixo. — Eu não sei o que fazer com você. — falei, sendo totalmente
honesto e o sorriso em seu rosto aumentou ainda mais.

— Você sabe sim. — falou e seus lábios vieram para os meus. O


beijo não tinha nada de inocente ou calmo, como tivemos mais cedo. Era
selvagem, desejoso e necessitado. Sabia que não pararíamos apenas nele se
estivéssemos a sós. — Passa essa noite comigo? — sua pergunta veio
como um apelo, como se ela precisasse daquilo assim como eu. Apenas
quis segurar seu rosto com as duas mãos e dizer que iria, todas as noites

que ela desejasse. Mas temia que os meus sentimentos por ela fossem
demais para o que estávamos vivendo.

Desejo era diferente de amor. Contudo, aceitaria o que ela quisesse


me dar, mesmo que aqueles dois sentimentos meus fossem exclusivamente
dela.

— Vem. — falou e apenas me levou com ela, em direção a parte


que deveria ser a saída. — Coloca na minha conta, Bet?

A mulher a nossa frente assentiu e fiquei um pouco perplexo,

enquanto Laura me arrastava para fora.

— Mas eu poderia pagar e... — comecei a falar e ela parou assim


que saímos da boate. — Laura!

— Lindo! — comentou e tocou meu rosto com carinho, como se

me analisasse. — Eu sei que pode pagar, mas... Você já pagou a comida,


então, nada mais justo, que eu pagar pelo nosso resto de noite.

— Mas... — fiquei calado, no segundo que ela tocou com os dedos


meus lábios, e sorriu maliciosamente. — Não vou discutir por isso, não
hoje.

— Sim, senhor.

Mordeu o lábio ao falar e me puxou consigo novamente, como se


desesperada para achar o carro. Não pude julgá-la porque sabia que queria

estar em um lugar com ela o mais rápido possível. Só nós dois.

Assim que encontramos o carro, meu corpo foi puxado para o dela,
e seus lábios vieram para os meus. Não pude evitar um rosnado baixo, no
segundo em que ela gemeu em minha boca. Suas mãos em meu corpo,
desejando mais. As minhas em seus cabelos, querendo-a por completo. De
algum jeito, consegui abrir a porta do carro para ela, e no momento em que
me sentei no banco do motorista, seu corpo veio para o meu. Como se eu
já tivesse feito aquilo milhões de vezes, de automático, desci o banco em

que estava sentado, e ela ficou perfeitamente sobre meu colo.

— Eu disse que você sabia. — comentou, e puxei sua boca para a


minha novamente.

Pela primeira vez, em anos, sentia-me jovem como deveria ser. Ou

talvez não devesse, porém, sentia-me vivendo algo que tanto lutava para
ser – apenas eu. Sem precisar mudar ou ser diferente. Ali, soube que o
desejo que sentia por Laura era único, simplesmente, pela forma que ela
me fazia sentir.

Laura não pedia nada além do que eu era, ou poderia dar. Ela
parecia me conhecer melhor que eu naquele curto intervalo de tempo. Ao
menos, ela conhecera perfeitamente meu corpo em apenas dois dias.
Queria que de alguma forma, ela desejasse conhecer meu coração e alma.
Capítulo 15

“Take my hand and my heart and soul

I will only have these eyes for you.”[20]

Laura

Queria dizer que eu caíra no sono e tive a melhor noite de sono da


minha vida. Contudo, acordei minutos depois que Felipe adormeceu ao
meu lado na cama. Eu não conseguia tirar o sorriso do rosto, muito menos,
parar de olhá-lo. Não sabia ao certo se já se passara uma hora que estava

ali, mas não conseguia desviar dele. Felipe dormia na minha cama como se
fosse seu lugar certo de estar. E eu, não podia evitar que meus
pensamentos voassem para nós no futuro. Não conseguia parar de pensar
de como desejei aquilo por tanto tempo, e temi tanto quanto, que achei que
seria impossível.

Entretanto aconteceu, no segundo em que ele apareceu a minha


porta com uma garrafa de vinho. No segundo em que a gente se enxergou,
longe de todos. Não era mais apenas a filha dos amigos de seus pais, nem
ele, o filho dos amigos dos meus pais. Ou até mesmo, o irmão mais velho

da minha melhor amiga. Suspirei fundo e toquei seu rosto levemente, sem

conseguir evitar suspirar por ele mais uma vez naquele dia.

Virei-me para encarar o teto, o sorriso fazendo meu rosto doer.


Felipe Soares sempre fora uma incógnita para mim. Em certas partes, ele

ainda o era. Sabia que o que senti ao vê-lo pela primeira vez no jardim da
sua casa, não poderia ser disperso com o vento. Apenas o evitei o quanto
pude. Talvez por medo do que sabia que poderia sentir. Talvez por ter
outras prioridades no momento, além do amor. Talvez por saber que a
história dele, não se assemelhava nem um pouco a minha. E eu sabia
apenas o mínimo sobre como fora sua jornada até nossos olhos se
cruzarem.

Sentei-me na cama, e virei meu olhar para ele. Não pude evitar

pensar em tudo que ele passara na vida. Por um segundo, eu só queria


abraçá-lo e fazer com que seu passado mudasse. Contudo, sabia que não
tinha tal poder. O que estava ao meu alcance era amá-lo por tudo o que era.
Pelo que fora, pelo que era e pelo que seria.

Levantei-me da cama a contragosto e caminhei até a cozinha.


Infelizmente, não podia ignorar a sede que me atormentava há alguns
minutos. Assim que abri a geladeira, dei uma voltinha e dancei de
felicidade. Peguei a garrafa e a usei como meu microfone. Enquanto

cantava em minha mente, mas mexia a boca perfeitamente, para o público

de: eu mesma, feliz porque era a segunda noite que passava com o homem
que era apaixonada. A Laura de anos atrás, jamais acreditaria na Laura do
hoje, se ela contasse. Talvez minha mãe estivesse certa quando disse que o
amor acontece, quando tem de ser. Quando os dois permitem ser. A

realidade era: quando dona Melissa não estava certa sobre algo?

Enquanto fechava a geladeira, girei novamente até a sala, com a


garrafa de microfone. Cantando em pensamento a música que tocara em
seu carro e que dizia perfeitamente como me sentia por ele.

“Eu fico tão chapada, oh

Toda vez, sim, toda vez que você está me amando

Você está me amando

Viagem da minha vida, oh

Toda vez, sim, toda vez que você está me tocando

Você está me tocando

Toda vez, sim, toda vez que você está me amando

Oh, senhor, salve-me

Minha droga é meu amor


Eu estaria usando pelo resto da minha vida

Usando pelo resto da minha vida, oh!”[21]

Joguei-me de joelhos no tapete, e Felipe com toda certeza


agradeceria por eu não estar cantando alto e girando pela casa. Minha voz

não era das melhores, não mesmo. Assim que terminei a música, ainda
encenando meu show privado de felicidade, saí de meu momento no
segundo que ouvi a voz alta de Felipe ao final do corredor.

Paralisei no segundo que terminei de beber um gole de água, e


fiquei tentando entender se ele me chamara. Levantei-me e caminhei pelo
corredor até chegar ao quarto e encontrar a cena que fez meu coração
paralisar uma batida.

Felipe gemia de dor, e de repente, um grito irrompeu sua garganta.

— Não! Não! Por favor! Não... Eu vou no lugar dele! Eu!

Soltei a garrafa no chão e fui até ele, aproximando-me devagar,


sabendo o mínimo que podia sobre como ajudá-lo naquele momento. Ele
parecia viver o inferno em seu sono. Se aquilo pudesse ser considerado
apenas um pesadelo. Toquei seus braços e balancei levemente, temendo a
todo custo estar machucando-o. Ele gritou mais uma vez, e notei como
estava suando.
— Felipe! — chamei-o baixo, mas o suficiente para que pudesse
ouvir, enquanto não gritava novamente. — É apenas um sonho ruim. Por

favor, acorda! — pedi, e senti uma de suas mãos segurar com força meu
braço, como se apegando ao que tinha mais próximo. Notei a outra fazer o
mesmo com o lençol da cama, e no segundo em que pensei em ligar para
Babi, e gritar por socorro, já não sabendo o que fazer para tirá-lo daquele

tormento, temendo que pudesse estar piorando o pesadelo, seus olhos se


abriram.

Ele piscou algumas vezes e soltou meu braço imediatamente.


Olhou ao redor e notei a forma como tocou os lençóis com força, como se
procurando certeza naquilo.

— Ei! — falei, ajoelhada na cama, e tentando me aproximar. —


Foi um pesadelo! Sou eu, Laura! Você está em casa, comigo!

Sabia que poderia ser sem nexo dizer aquilo, no entanto, sabia que

poderia ser o mínimo que ele também buscava. Só queria que a dor que
enxerguei em seus olhos, fosse embora.

Ele então levantou as pernas, a ponto de abraçá-las, e vi que


escondeu o rosto com elas. Como se envergonhado do que presenciara.
Como se ele mesmo tivesse tentando entender como aconteceu.

— Lindo, por favor... — falei, depois de cinco minutos em silêncio


que pareceram uma eternidade.

Eu só queria abraçá-lo e mostrar que estávamos juntos no que

fosse. Contudo, não sabia do se tratava o seu pesadelo, muito menos, se era
recorrente. Naquele segundo, entendi mais uma faceta do amor que minha
mãe contava em seus livros, a qual, pensei que nunca compreenderia por
completo. “Às vezes se ama tão instantaneamente, que demora a entender

que existe um outro ser humano inteiro do outro lado para querer, para
amar, para cuidar. O amar à primeira vista, é apenas o primeiro passo de
conhecer o seu amor como um todo por outro ser.”

— Eu sinto muito. — falou e levantou levemente a cabeça, e notei


os olhos castanhos marejados. — Fazia alguns meses em que não tinha
isso, eu não imaginei que aconteceria agora e...

— Ei! — falei, no momento que notei que ele se engasgou com as


próprias palavras. — Não precisa se desculpar por isso. — comentei séria,

com toda minha sinceridade, olhando-o intensamente. — Todos nós temos


problemas, lindo. E eu sei, mesmo que muito pouco, que os que tive na
vida, não foram nem um pouco parecidos com os seus.

— Sabe que fui morador de rua, não é? — indagou e assenti. No


momento em que ele esticou a mão para a minha, fui de bom grado.
Aquele simples toque fez meu coração aquietar um pouco, ao mesmo
tempo que queria passar segurança a ele com o meu. — Obrigado por me
acordar, eu... Eu sempre prefiro acordar do que reviver esse pesadelo.

— Quer falar sobre isso? — perguntei, com todo meu carinho,

tocando levemente seu rosto e sentindo uma lágrima descer por seu rosto.

— Não é uma história bonita. — falou, como se me alertando que


poderia ser além do que eu imaginava. Ali notei que ele não dizia aquilo
para fugir do assunto, mas sim, para me alertar que estava ultrapassando

uma linha com ele. De saber mais sobre ele.

— Não quero apenas as partes bonitas da sua história. Tenha


certeza disso. Quero cada parte que queira repartir comigo... cada uma.

Notei como seu olhar vacilou e como pareci surpreendê-lo. Se ele


soubesse como eu me sentia, jamais ficaria tão surpreso assim. Porém,
ainda éramos frágeis, como se a qualquer momento algo pudesse levá-lo.
Talvez, a dona de seu “mais que querer”. Não queria que meu amor o
assustasse, muito menos o afastasse. Queria que aquele sentimento fosse

nosso, e assim, ser livre com ele.


Capítulo 16

“I will hold you

And protect you

So let love warm you

Till the morning

I'll stay with you

By your side

Close your tired eyes

I'll wait and soon

I'll see your smile in a dream.”[22]

Felipe

— Eu não me lembro bem dos meus pais biológicos. Tenho alguns


vislumbres sobre eles, apenas isso. Eles morreram em um acidente de carro
quando tinha quatro anos. Nisso, eu fiquei na responsabilidade de uma tia,
que depois de um tempo, simplesmente deixou eu e meu irmão sozinhos.
Não por escolha dela, mas porque ela estava muito doente e, meu irmão
tinha completado dezesseis, então, de alguma forma, poderíamos nos virar.

— fechei os olhos por um instante, e lembrei-me de Guto, com o sorriso do


tamanho do mundo, pedindo para que eu, aos 10 anos, me trancasse em
casa, e lembrasse de pegar a comida que a amiga dele sempre trazia as 12 e
18 horas. Nunca consegui esquecer o quanto ele lutou para ser um bom
irmão, e praticamente, me criou. — Um dia, Guto, esse era o nome dele.

— os olhos de Laura me analisavam, e notei que estavam marejados. Era


como se ela sentisse a minha dor, mesmo que fosse impossível. Como ela
sabia, e eu também, nossas histórias eram diferentes em vários aspectos. —
Desde antes de minha tia nos deixar, ele trabalhou e muito. Ele até tentou
me colocar na escola, mas, a gente não tinha dinheiro para aquilo. Para
comprar os cadernos ou o transporte. Então, ele tentou, conseguir ajuda do
estado, mas teve medo, de que assim, nos afastassem. Nesse meio tempo,

ele tentava me ensinar o básico que sabia. E bom, ele era o melhor. — falar
de Guto sempre me doía demais. Doía pelo fato de que nunca conseguiria
esquecer o que ele fez por nós. E principalmente, o que fez por mim. —
Quando ele completou dezoito, ele conseguiu um emprego “melhor”... —
fiz aspas com as mãos e odiei-me por aos onze, nunca ter desconfiado de
nada. — A gente era pobre e eu sabia, mas a gente tinha comida na mesa,
tudo por ele. E aí... Um dia, ele disse que tinha que ficar mais que uma
semana longe, que era o tempo que ele levava as vezes... trabalhando. —
suspirei fundo e fechei os olhos. — Mas daí, se passou um mês. Eu só

sabia dele através da Bruna, amiga dele, que sempre me trazia as refeições
nos horários certos que ele combinava. Um dia ela apareceu e me mandou
sumir com ela. Sumir pela cidade... Eu não entendi na hora, mas fiz o que
ela mandou. Ela foi comigo, e eu descobri no dia seguinte o que ela queria
dizer. Quando a gente se aproximou da casa que era minha e do meu irmão

até então, ela estava cinza e preta. Pelo fogo que atearam nela.

— Lipe...

— Bruna tentou cuidar de mim, mas... Ela também teve o mesmo


fim que o meu irmão. Eu não entendia direito na época, mas, depois de um
tempo nas ruas, e pelas conversas que se passavam, soube que Guto Paiva
foi morto queimado por dever dinheiro a pessoas erradas, assim como, a
Bruna. — soltei o ar e tentei tirar da minha mente, a cena que sempre se

repetia. A nossa casa em chamas, Guto ao meu lado, com gasolina em seu
corpo. E eu gritando para que me levassem no lugar dele. O fim sempre era
eu, assistindo meu irmão sendo queimado vivo. — O meu pesadelo sempre
é com... — tentei dizer em voz alta, mas como sempre, travei. Era aquela
parte que doía demais. Nunca consegui parar de me culpar pelo que meu
irmão fizera. Seja lá qual fosse seu acordo com tais pessoas. Sabia que ele
fizera o necessário para que eu tivesse o que comer e um teto. Sabia que no
fim, ele morrera por minha causa.

— Não precisa dizer algo que ainda dói demais. — Laura

comentou, como se me lesse, e tocou meu rosto com as duas mãos. — Só


quero que saiba, que não importa o que passa por sua mente. A crueldade
dos outros não é sua culpa. Não é!

Era como se ela pudesse me ler, pela forma como falava

abertamente sobre aquilo tudo. Como se ela entendesse a dor e desespero


em meu rosto. Por um segundo, apenas fiquei ali, com suas mãos em meu
rosto, apegando-me ao sentimento que ela me trazia – confiança.

— Eu até tentei encontrar minha tia, mas... descobri que ela faleceu
meses antes. Foi aí que aceitei que as ruas eram meu novo lar, e tentei ao
máximo, sobreviver a cada dia. Tive ajuda de pessoas no caminho... —
naquele segundo, lembrei-me perfeitamente de quando o olhar de Laura
chegou ao meu pela primeira vez. — Pessoas que me permitiram ter bons

momentos mesmo nos piores momentos deles. E assim foi, até que
conheci, completamente sem querer, ou num quase acidente – Caleb e
Victória.

— Babi diz que sua história com eles foi como família à primeira
vista. — comentou, e tive que sorrir, em meio as lágrimas.

— Eles quase me atropelaram e de repente, me convidaram para


sua casa... Eu conhecia os Soares, ainda mais, porque, quem não os
conhece no Rio de Janeiro? Mas nunca entendi ao certo como eles me

escolheram como seu filho, naquele exato momento. Eu até tentei fugir
uma vez, com medo de que a minha presença tivesse levado Caleb ao
hospital... Mas Victória, minha mãe, me fez ver, pela primeira vez, que eu
tinha novamente uma família. A família que Guto tentou me dar, a todo

custo. E que lhe custou tudo. Eu pus na minha cabeça que não podia abrir
mão do que amava, assim como meu irmão, nunca abriu.

— Meu Deus... — ela suspirou fundo e tocou meu rosto, no qual,


mais lágrimas desciam. — Eu só gostaria de poder ter a chance de
agradecer seu irmão, porque ele fez de você, exatamente o que é hoje.

— A terapia tem me ajudado muito a lidar com tudo, mesmo que


ainda não consiga falar sobre os pesadelos com meu irmão... — suspirei
fundo, sentindo-me mais leve por deixar aquela parte de mim, exposta para

ela. Como fora com meus pais e irmãos, eu não me sentia invadido por ser
verdadeiro. Senti-me ainda mais parte dela. — A ligação que criei com
Luna, Babi e Miguel, é tão forte, que as vezes, nem eu sei como tive tanta
sorte.

— Destino, talvez? — indagou e dei de ombros, sem saber


considerar aquilo de fato. Nunca saberia dizer como consegui tanto, em
meio a tão pouco que tinha. — O amor de todos vocês é mais que nítido. E
eu tenho certeza, que Miguel é o mais maluco por você ali.

— Ele é. — tive que rir e lembrei-me de meu caçula. — Às vezes,

tenho a sensação de que ele é tão parecido com Guto, em pequenas coisas.
Em como ele fala algumas palavras ou como amarra o cadarço do tênis
todo errado. Sei que pode parecer maluquice para algumas pessoas, mas
até conversei com meus pais sobre, e claro, na terapia. Pode ser uma parte

minha, que queria ter uma segunda chance com Guto, e talvez, por isso o
enxergue em Miguel.

— Rafael teve uma experiência muito parecida com essa, e digo


isso, porque ele nunca foi uma pessoa religiosa. Mas, sério... Um dia, vou
te levar para conhecer Zalon, a esposa dele, e vai conseguir entender o que
não consigo expressar. Acho que só eles conseguem fazer isso.

Olhei-a dali, e senti meu coração se aquietar. Como se depois da


tempestade, a calmaria me acertasse. Laura Gutterman era minha calmaria

naquele momento.

— Acho que por isso, eu sou quieto, introvertido e muitas vezes,


não sei como agir como as outras pessoas. Existem partes de mim que,
acreditei que foram pelo trauma, ou por quando morei nas ruas e não
enxergava um dia além do outro, ou pelo medo da perda. Já completavam
praticamente cinco anos que minha vida mudou completamente, e entendi
que vai demorar para que me sinta parte, ou até mesmo, nunca o faça.
— Talvez, mesmo que nada de ruim tivesse te acontecido, esse seja
você. — tocou meu rosto com carinho e sorriu lindamente. — Porque, esse

é você! Felipe Paiva Soares. Um completo de você, e é isso que importa.


Espero que um dia, os pesadelos se vão... Mas mesmo que não aconteça,
tem pessoas que te amam tanto que vão estar aí para te acordar, sempre.

Naquele instante, eu só consegui puxá-la para mim, e a abraçar.

Nunca me imaginei abrindo tudo para alguém que tivesse meu coração.
Entendia que trabalhava para ser meu melhor há anos com a terapia, e
ainda mais, tentando ser o meu melhor para minha família. Entendia que
também, Guto sempre seria parte de mim, mesmo que não mais presente.
Mesmo com a culpa ao meu redor. Ali, nos braços de Laura, entendi que
estava me abrindo, justamente, porque senti que era certo. Assim como,
senti que era certo aceitar o convite de Caleb e Victória há cerca de cinco
anos.

Ela se afastou e me deu um leve beijo, olhando-me com adoração.

— Temia que seu olhar mudasse sobre mim. Sei que algumas
pessoas se comovem e sente pena mesmo que não queiram passar isso, e...

— E nada. — cortou-me, com um lindo sorriso. — Não vai


encontrar pena em mim, não porque não me comovo pela sua história, mas
sim, porque sei que não é feito apenas da parte não bonita da sua vida.
Mesmo que me doa saber que essa dor está em você. O que queria fazer
era tirá-la, de alguma forma.

— Mas não pode. — complementei, e ela assentiu. Puxei-a para

mim, beijando levemente sua testa. — Obrigado por ouvir a parte nada
bonita, espero poder compartilhar coisas boas em algum momento.

— Bom, por mais que a gente se pegue em qualquer canto por aí...
— comentou, provocativa, fazendo-me rir. — Não posso deixar de

esquecer da forma como contou sobre a reação dos seus pais por saberem
que dormiu fora. Ainda mais, os ciúmes de Miguel. E agora, eu sei do seu
amor pelo seu outro irmão. E lindo, mesmo em meio as coisas não bonitas,
esse amor é algo que muda tudo.

Não pude evitar sorrir para ela, notando que sempre que me
faltavam palavras, ela estava ali, para usar as melhores que existiam por
nós. Laura parecia um complemento perfeito, em todos os sentidos.

— E um dia, vai ouvir sobre as partes não bonitas minhas... e bom,

algumas são até recentes, ou até mesmo do dia. — comentou, praticamente


pulando da cama e a encarei sem entender absolutamente nada. — Nem me
olha assim! Essa madrugada é toda sua e agora, vou fazer o meu melhor
para cuidar de você.

— Laura... — falei, e ela me puxou para si, e sem conseguir evitar,


fui de bom grado.
— Não sei se sabe, mas...eu tenho uma banheira perfeita para nós.
— comentou, e fiquei perplexo pela forma como ela agia naturalmente.

Estar com ela me inspirava. Era exatamente aquilo. Fazia-me


querer e desejar ser alguém tão leve quanto. Mesmo que soubesse que não
poderíamos ser iguais, mas ainda assim, desejava encontrar aquela
espontaneidade que ela tinha apenas por respirar. Contudo, como ela

dissera, assim como, eu percebera naqueles anos, talvez eu fosse calado e


introspectivo por simplesmente ser. Pela soma do que passei, pela soma do
que era e do que ainda viria. E trabalhava todos os dias para que em algum,
conseguisse a paz de ser o eu que tanto buscava.
Capítulo 17

“Don't read the last page

But I stay when you're lost and I'm scared and you're turning away

I want your midnights

But I'll be cleaning up bottles

with you on new year's day.”[23]

Laura

— Às vezes esse é o meu refúgio. — comentei, assim que testei a

temperatura da água e me virei levemente para Felipe, que me encarava


com o olhar baixo e atento. — Acho que posso te dar um pedacinho dele, o
que acha? — perguntei e ele sorriu de lado, com a covinha do lado
esquerdo sendo sua marca registrada.

Por um segundo, vi-me questionando mentalmente o quanto ele


parecia levar as coisas da melhor maneira possível. Felipe passara o
inferno na terra desde tão novo, e ali, olhando-o tão aberto, mesmo com as
feridas entreabertas, já que algumas poderiam jamais cicatrizar, notara que
ele tirava o melhor de onde o pior se instaurou.

— Você me olha como se... — parou, como se escolhendo as


palavras, e fora como enxergar o que ele queria dizer no profundo castanho
de seus olhos.

— Te admirasse? — perguntei e ele assentiu, fazendo-me sorrir

internamente, porquê de alguma forma, era como se nos entendêssemos


apenas pelo olhar. — Bom, não tenho como evitar isso.

— Não acredito que eu tenha algo tão admirável assim. —


comentou levemente, como se realmente crendo naquilo. Ele não parecia
se menosprezar ou talvez, não enxergasse que o fizesse. — Sou um homem
comum, como vários. — falou e fui até ele, trazendo-o para perto, e
ajudando-o a tirar a única peça de roupa em seu corpo. Notara que ele dizia
aquilo não por querer que eu dissesse ao contrário, mas sim, porque era o

que acreditava. Naquele momento, vi-me em Felipe de diversas formas.

— Bom, eu também sou apenas uma mulher comum. — dei de


ombros, puxando-o para mim, enquanto entrava com cuidado na banheira.
— Mas hoje, quero poder ser especial, e quem sabe, possa fazer o mesmo
com você.

— O que está tramando Laura Gutterman? — perguntou, e o


momento solto e leve dele, como sempre, me acertava em cheio.

Assim que me sentei com cuidado na água, e o trouxe, indicando

para que sentasse a minha frente, de costas, ele seguiu o comando sem
hesitar.

— Vou te refugiar comigo um pouquinho. — falei, e assim que ele


ficou de costas para mim, notei que não se soltara de fato. — Relaxa, e

apenas me deixa guiar por agora. — pedi baixo, praticamente em sua


orelha, e ele o fez.

Felipe soltou levemente o corpo, e logo, eu o prendi com o meu. A


banheira era grande o suficiente para nos comportar perfeitamente. E ali,
com ele deitado sobre mim, com as costas sobre meus seios, e a cabeça em
meu ombro, percebi, mais uma vez, que éramos um encaixe perfeito.

Meus braços ao seu redor, traziam a água quente para ele, junto aos
sais de banho perfumados que colocara um tempinho antes de água ficar na

temperatura certa. Não pude evitar e beijei levemente seus cabelos,


sorrindo por aquele momento tão próximo e tão... íntimo.

— Está confortável? — perguntei, sabendo que eu estava ótima no


lugar que escolhi. Porém, temia que não pudesse estar da mesma forma
para ele. Nunca estivera daquela forma com alguém. Nem imaginei que
um dia estaria.
— Sinto meus músculos finalmente relaxando. — comentou e
sorri, sentindo o quanto aquele momento me trazia a um patamar mais

diferente com ele.

Felipe Soares a surpresa mais bela que tivera na vida. O que me


deixava completamente insegura, mas naquele momento, e outros mais,
senti-me a certeza em pessoa.

— Qual sua cor favorita? — perguntei, e ele sorriu, virando


levemente o rosto para o meu, de forma que conseguia me ver
parcialmente. Dali de cima, conseguia vê-lo por completo sobre mim. —
Não estou brincando, é realmente uma curiosidade.

— Verde. — falou, e a intensidade de suas palavras me fez perder


o foco por alguns segundos. Como ele conseguia fazer aquilo tão
facilmente? — E a sua?

— Esqueci de avisar que sou péssima com perguntas limitantes...

então, lilás e verde água. — pisquei um olho e ele sorriu lindamente, como
se fosse possível iluminar o banheiro todo. Estávamos nós ali, com a luz
amarela mais baixa de alguns pontos que deixei estrategicamente acesos.
Não era uma novidade para eu fazer aquilo. Sempre o fazia sozinha. Era
diferente, dividir aquele momento com alguém, e simplesmente
acontecera.
— Minha vez. — falou calmo e baixo, fechando os olhos castanhos
e sorri por notar que ele parecia estar realmente relaxando. Como se

finalmente, fugindo de seu pesadelo. — Um livro? — perguntou,


surpreendendo-me e não pude evitar sorrir, ao encarar o teto, enquanto
tocava seus cabelos castanho-escuros.

— Não esquece a parte de que minha mãe é escritora... — comentei

e pude ouvir seu sorriso baixo.

— Pode ignorar os livros de dona Melissa se for mais fácil. —


sugeriu, e aquilo facilitou e muito minha empreitada.

— Bom, tirando os de mamãe... Ainda assim é tão difícil. — falei e


respirei profundamente, tentando pensar no livro que sempre me pegava
relendo e relendo sem cansar. — Posso arriscar Apaixonada por um
Highlander, mas... tem tantos...

— De romances, eu gosto de O homem que não amei. — comentou

por alto, fazendo-me rir da mesma forma.

— Dona Melissa fazendo escola, não é mesmo? — perguntei e ele


assentiu, puxando uma de minhas mãos para seus lábios e as beijando
levemente. — A parte mais engraçada da escrita desse livro foi quando ela
me contou que era sobre o tio Caleb. Eu fiquei paralisada, porque o
sobrenome estava diferente, o país, mas mesmo assim... Vinte anos e
cartas... Quando Babi me confirmou a história, fiquei alguns dias
processando. A pergunta de: Por que ele não disse a ela que a amava? Foi

uma constante.

Calei-me um segundo depois, vendo que meus devaneios sobre o


livro que mamãe escrevera baseado na história de amor dos pais de Felipe,
levaram-me a mim. Naquele momento, pela primeira vez, entendi por

completo Caleb Soares. Antes, não compreendia ao certo como conseguira


resguardar aquele amor por Victória por tantos anos, contudo, vi-me no
lugar dele.

Não foram vinte anos, mesmo assim, ainda guardava o sentimento,


que gritava, incendiava e acalmava meu peito, tudo ao mesmo tempo.
Tudo pelo homem deitado sobre meu corpo, que agora tinha sua respiração
mais calma, e com toda certeza, estava quase pegando no sono.

— Ei! — falei, e ele abriu os lindos olhos, como se voltando a

realidade.

— Acho que cochilei, desculpe. — comentou rapidamente e


comecei a entender que era algo que ele sempre fazia.

Felipe nunca deixava de se desculpar sobre algo, por mais simples


que fosse a “falha”, que no fim, nem era uma. Talvez o fato de ver tudo se
tornar em nada tantas vezes, o deixasse daquela forma. Como se tivesse
medo de que a qualquer momento, o chão desaparecesse de seus pés.
Aquilo era tão humano quanto o medo do futuro, porém, sabia que para

com ele, vinha com uma carga pessoal maior.

— Acho que te perdoo se formos para a cama, e lá, dormir nos


meus braços, dessa forma. — pedi e abaixei meu rosto até poder encontrar
sua testa, beijando-a.

— Não tenho nada contra. — comentou e sorri, vendo-o se afastar


aos poucos e levantar com cuidado da banheira.

Fiquei alguns segundos, apenas o observando se afastar e pegar a


toalha que deixei estrategicamente posicionada sobre a pia ao nosso lado.
Sorri, enquanto me escorava dos lados da banheira, e assim que pisei um
pé fora, Felipe segurou minha cintura e me firmou consigo, colocando-me
sobre o tapete macio. Aqueles sutis gestos me tinham por inteira.

Naquele momento entendi o porquê de alguém esperar vinte anos

pelo amor, mesmo ele estando do outro lado de um corredor. Se era


verdadeiro, em qualquer tempo, valia a pena.
Capítulo 18

“And I can still see it all (in my mind)

All of you, all of me (intertwined)

I once believed love would be (black and white)

But it's golden (golden).”[24]

Dias depois...

Felipe

— Terra chamando Felipe!

A voz alta e feminina a minha frente, fez com que piscasse algumas
vezes e voltasse a realidade. Sequer percebera, mas por alguns segundos
apenas me deixei levar com as lembranças da minha última noite com
Laura. De repente, era como se vivesse um relacionamento, mesmo que
não tivéssemos nomeado aquilo. De repente, via-me suspirando por cada
canto ao lembrar-me dela.
— Nunca te vi tão longe do trabalho. — Gabi comentou, deixando
a pilha de documentos que carregava sobre minha mesa.

Dei de ombros, sem saber ao certo o que responder. Na realidade,


entendia a visão que Gabriela tinha sobre mim. Dediquei-me aos estudos e
trabalho, ao máximo. Da forma de aproveitar tudo o que poderia do que os
Soares me proporcionavam. Demorara a entender e aceitar que eu era um

deles, mesmo que já me sentisse parte. Ganhara uma nova família, que me
apresentou muito além do dinheiro e fama que tinham, eles me entregaram
seu amor. E lembrava-me, todos os dias, do pedido de minha mãe,
Victória, quando me colocara para dormir pela primeira vez, sendo que eu
tinha vinte e um anos na época. Lembrava-me da forma que sorriu e pediu
baixo, antes de beijar minha testa: não esqueça de sonhar os melhores
sonhos, menino lindo.

Eu tentava, todos os dias, fazer aquilo. E mesmo em meio aos

pesadelos que tinha, e que ela descobrira logo após começarmos a ser uma
família de fato, quando voltava a realidade, notava que eu estava seguro.
Mesmo que minha saudade e dor pela perda de meu irmão nunca
passassem. Elas eram partes de mim, assim como, os Soares se tornaram
uma.

— Ei! — pisquei os olhos novamente, notando que me perdi em


mim mesmo por alguns segundos. — Já saiu para o café hoje? — Gabi
indagou de repente, e neguei com a cabeça, notando que já eram cerca de

15 horas. — Então, que tal a gente tomar um açaí na esquina?

— Claro. — falei e olhei rapidamente para o documento word


aberto em minha tela. Eu tinha adiantado boa parte do trabalho, e então,
pela hora, poderia sair e finalizá-lo a tempo do fim do expediente. Olhei ao
redor de minha mesa e busquei meu celular, e por um segundo, apenas

percebi que não estava comigo. Não era tão apegado aos eletrônicos de
fato. — Só me deixa ver se deixei o celular na sala do meu pai, ok?

— Sem problemas. — piscou um olho e pegou suas papeladas,


indo para sua mesa.

Segui meu caminho até o final do corredor e bati levemente na


grande porta de madeira escura. Ouvi um “entra” e a abri, sorrindo
levemente ao encarar a bagunça que estava na mesa de meu pai. Caleb
Soares parecia apenas um ponto no meio de papéis e mais papéis. Ele

levantou o olhar azul e encontrou o meu, sorrindo no segundo seguinte, e


esticando o pescoço, como se cansado.

— Oi pai. — falei e fui para perto dele, já procurando com o olhar


sobre os papéis. — Acho que esqueci meu celular por aqui.

— E fez isso mesmo. — respondeu de imediato, indicando a


cadeira a sua frente, e ali, estava o aparelho intocado. — Não te levei
porque sei o quanto não liga para essas coisas, então...

— Parece ocupado. — comentei por cima, pegando o aparelho e

colocando em meu bolso.

— Queria que meu cansaço fosse pelo trabalho. — falou e o


encarei confuso, enquanto ele retirava os óculos de grau, e apertava
levemente o espaço entre os olhos.

— Algum problema? — indaguei, sentando-me na cadeira à frente


da sua mesa, e ele me encarou negando a princípio com um gesto de
cabeça, seguido de uma confirmação.

— Às vezes acho que vou enlouquecer com Miguel. — comentou e


o encarei sem entender. — Eu já fui pai muitas vezes, filho. Mas tenho
uma confissão a fazer, a gente nunca sabe se está fazendo o certo.

— Você é incrível. — falei, e ele sorriu, olhando-me com o carinho


que encontrei em seu olhar desde a primeira vez que nos vimos. — Miguel

aprontou algo?

— Ele tem tentado, na verdade, chamar atenção de todo mundo. No


caso, principalmente a sua. — confessou e não fiquei de fato surpresa.
Notara a brusca mudança que Miguel teve desde a primeira vez que dormi
fora de casa. — Desde a segunda noite que ele foi tentar dormir com você
e não te encontrou... Sabe exatamente como ele é.
— Mimado ao extremo, como Luna grita aos quatro cantos? —
perguntei e meu pai assentiu. Por um segundo, pensei que estivesse

negligenciando meu irmão.

— Não queria te contar porque sabia que ia ficar preocupado, ou


até mesmo, se culpando por isso. Fora que as suas aulas voltaram, e fora o
seu tempo estagiando aqui, sei que passou as últimas noites preso ao caso

que Herrera te pediu uma análise completa há alguns dias. — apontou o


óbvio, como se me lesse, e negou com a cabeça no instante que abri a boca
para falar algo. — Miguel tem que aprender que o mundo não gira em
torno dele, ainda mais, agora. Acho que por ele ser caçula, todos o
mimamos demais e aí... Ele nos deixa malucos.

— Eu posso conversar com ele hoje, e... Ele geralmente me escuta.

— Eu agradeço, filho. — falou e suspirou profundamente. — Mas


preciso dizer também que estou feliz, assim como sua mãe, que não se

aguenta de fazer teorias, de que você tem alguém.

Engoli em seco e me lembrei dos breves interrogatórios que tive de


minha mãe, e algumas conversas que tive com ele.

— Eu não quero que se preocupem ou...

— Não é isso, filho. — cortou-me, e se encostou mais à vontade na


grande cadeira. — É que, Victória e eu somos emocionados, ao extremo.
Ainda mais, com os nossos filhos. A gente surtou com o casamento da

Luna, o de Babi... preciso nem dizer, né? E agora, eu tento controlar sua

mãe que já está pensando no smoking perfeito para o seu casamento,


enquanto eu finjo que não imagino o mesmo.

— Meu Deus! — soltei, completamente surpreso, e rindo baixo


daquela situação. Conseguia vê-los falando sobre aquilo, perfeitamente. —

É tudo muito novo, e eu não sei muito sobre relacionamentos e... — me


calei, e não soube como explicar.

Como eu diria a ele que estava envolvido, na verdade, mais que


envolvido, com a filha de um de seus melhores amigos, e que o chama de
tio? Não sabia como contar aquilo, por mais que quisesse. Temia estar
sendo como ele e mamãe, emocionado demais.

— Apenas viva a sua vida do jeito que quer, filho. Isso que
queremos para você, mesmo sendo malucos e emocionados demais. —

comentou, rindo de si, e acabei fazendo o mesmo.

— Obrigado por isso, pai. — falei, e como sempre, quando dizia


aquilo, queria dizer sobre tudo. Sobre o quanto mudara minha vida e por
ser quem era. — Vou tomar um açaí com Gabi, quer que te traga algo? —
perguntei, levantando-me, e ele pareceu pensar sobre.

— Se tiver aquele sorvete colorido e meio esquisito, aceito. —


comentou e tive que sorrir de sua definição.

— Tá bem.

Saí de sua sala e fui em direção à mesa de Gabriela, que me


aguardava com um leve sorriso, e como se me analisasse minuciosamente.
Via que ela parecia desconfiada, mas não conseguia entender sobre o quê.
Gostava dela, e éramos bons colegas e praticamente amigos há algum

tempo, porém, ainda existiam ressalvas sobre mim, que não conseguia
mudar. Não era bom falando com as pessoas, era um fato inevitável.

— Pronta? — indaguei, e ela assentindo, levantando-se.

Fomos até o elevador, e Gabi não parava de falar de uma música


nova que descobrira em playlists aleatórias, e que com toda certeza, eu
gostaria. Assenti e sorri para ela, dando-lhe minha atenção. Gabi era uma
boa companhia, e animada o suficiente por nós dois.

Assim que chegamos a açaiteria, fizemos nossos pedidos e nos

sentamos próximos a porta, onde geralmente ficávamos em nosso


intervalo.

— Ok, tem um brilho diferente em você. — falou, olhando-me


profundamente, como se tentando me sondar. Fiquei ali, estático, sem
saber o que fazer. — Eu sei que a gente não conversou direito sobre, mas...
Entendi o fora que me deu, Lipe. E tá tudo bem a respeito disso.
— Gabi, eu... Eu só não queria ser rude com você ou algo assim. —
fui sincero e ela deu de ombros, ainda sorrindo.

— Nunca achei que pudesse dar certo de fato. — comentou e notei


que não parecia magoada. Ao menos, eu não conseguia identificar. Torcia
para que ela realmente não estivesse mal com aquilo. — Mas me conta, o
que tem te deixado assim? Como se viajando em outro universo?

Pensei em contar para ela sobre estar apaixonado e de como me


sentia, porém, por mais leve que Gabi parecesse, não queria abrir para ela,
o que de alguma forma pudesse transformar nossa amizade em algo que a
feria.

— Os pedidos de vocês. — pisquei em direção ao homem que


trouxera os açaís e sorri, agradecendo, assim como Gabi fez. Escolhi o
silêncio e o gosto do açaí para fugir da conversa e Gabi pareceu entender.

— Por ora, te deixo em paz, mas... Me deixa te falar do filme que

assisti esse final de semana. — falou, animada como sempre.

Era fácil gostar de Gabriela, desde o princípio. Contudo, nunca fora


além daquele sentimento para com ela, ou qualquer outra pessoa. Era como
se quando o meu olhar encontrou o de Laura, novamente, no jardim de
minha casa durante a renovação de votos de meus pais, ela me pegasse
para si. Sem precisar pedir ou exigir. Ela simplesmente me teve. Eu soube
naquele momento, e no hoje, tinha ainda mais certeza..
Capítulo 19

“Late in the night, the city's asleep

Your love is a secret I'm hoping

Dreaming, dying to keep

Change my priorities

The taste of your lips is my idea of luxury.”[25]

Laura

— Puta que pariu! — soltei, pulando da cadeira, no segundo em

que a porta do meu escritório se abriu e Babi entrou como um furacão,


dançando ao redor da sala. — Você quase me mata do coração! — acusei,
e ela riu alto, indo fechar a porta, e logo seu olhar me acusava de coisas
que até os céus duvidavam.

Babi tinha a mania de me azucrinar de repente, em alguns dias da


semana. Se existia um lado de minha melhor amiga, que sempre me
deixava assustada, era aquele. Eu odiava levar sustos, e Babi era
especialista em o fazer.

— Eu te amo também. — falou e veio para perto, olhando ao redor,

como se sentindo algo no ar.

— Que foi? — indaguei, e ela deu de ombros, ainda concentrada.


Deu a volta na mesa, e se escorou na mesma, parando ao meu lado direito.
— Babi, eu te conheço.

— Eu que te conheço e de repente, minha melhor amiga meio que


some durante as noites... Não diz nada sobre um novo amor ou
contatinho... Laura Laura, o que anda me escondendo? — perguntou, e eu
engoli em seco, sem conseguir reagir.

— Eu só... — não consegui complementar a frase, ainda mais,


porque não tinha conversado tão a fundo com Felipe sobre. Não me sentia
pronta para contar a sua irmã e minha melhor amiga, justamente porque ele
agora era uma realidade na minha vida. Queria dar a Felipe a certeza que

eu tinha sobre nós, antes de qualquer coisa. Jamais aceitaria que ele me
quisesse pela pressão de ter que querer. — É diferente, eu não sei explicar.
Ainda é tudo muito recente. — Babi me encarou com interesse e notei o
brilho em seu olhar.

— Te conheço bem o bastante para saber que esse cara deve ser
mesmo diferente. — apontou e sorriu dando de ombros. — Não vou te
pressionar sobre, ainda mais, porque não me pressionou sobre Christopher.

— Obrigada por isso. — falei, e ela piscou um olho. — Mas me

fala, fugiu da empresa e...?

— Christopher estando na cidade me tira do eixo, então...


aproveitei que Castiel o roubou hoje, e vim te roubar. — comentou, dando
duas palmas e sorrindo em minha direção. — Não tenho sido uma boa

amiga ultimamente, então, vamos sair e comer algo, tomar chocolate ou


algo assim... Você escolhe!

— E esqueceu de me perguntar se tenho trabalho ou não...

— Sei que conversei com sua mãe, vulgo, chefe, e ela liberou para
essa tarde comigo! — piscou um olho, e afastei a cadeira, incrédula.

— Você é tão calculista sobre tudo, Babi. — debochei e ela deu de


ombros, fazendo pouco caso.

— Gosto de coisas organizadas, porquê de bagunçada já basta eu.

— comentou e corri até minha bolsa, enquanto me sentava novamente à


frente da caixa de e-mails e notava se faltava algo ali a ser negociado. Ser
o braço direito de minha mãe e sua assessora pessoal era um sonho
tornando-se realidade. Formei para ser a melhor em meu trabalho, e poder
fazê-lo para com ela, assim como, pretendia expandir futuramente.
Construir uma carreira sólida como assessora no meio literário era o meu
objetivo, e felizmente, tudo ia mais do que bem.

— Agora me diz! — falei, assim que desliguei o computador e me

virei para Babi. — Como está o noivado/casamento com seu boy? — ela
suspirou alto, e finalmente, entendi por completo o quanto era estar como
ela – perdidamente maluca por alguém, e não de maneira ruim.

— Tem sido um sonho. Depois que as coisas deram certo, tem

alguns dias que apenas quero me trancar com ele em sua casa, que ele diz
ser nossa. Como se estivéssemos no começo da relação, de novo. —
comentou sonhadora, e tive que sorrir, notando que eu passava por aquele
exato momento com Felipe.

Era novo. Era nosso.

— E essa carinha viajando por aí, só pode dizer o mesmo. —


alfinetou enquanto entravámos no elevador, e apenas a encarei, sem saber
o que dizer. — Mas como disse, por hoje, está a salvo. Aliás, preciso falar

contigo sobre a festa surpresa de sua mãe... A minha tá pirando, e tenho


certeza que tá pirando todas as amigas de sua mãe também.

— Lili e Marta praticamente me mandaram sossegar que elas dão


conta, mas fechei os detalhes finais com a decoradora na semana passada,
e bom... Meu pai que lute para mantê-la ocupada nesse sábado. — dei de
ombros e sorri para minha amiga. — Acho que ela vai amar o fato de que
será a fantasia. — comentei e Babi sorriu ainda mais.

— Ela vai de Tiana[26], certo? — indagou e assenti.

— Ela ainda só não sabe disso. — pisquei um olho. — E você? Já


pensou do que vai se vestir para a festa a fantasia surpresa de dona
Melissa?

— Bom, talvez Mulan[27]? — pareceu pensar alto, e ainda não


muito certa. — E você?

— Ainda sem qualquer pensamento sobre. Já olhei mil referências,


mas nada que me prendesse. E preciso para ontem, porque a festa é nesse
fim de semana. — comentei, lembrando de que não tinha ideia do que ir,
de fato. — Talvez embarque na onda de princesas, mas... Ainda sem
certeza.

— Lembro da vez que foi de mulher gato naquele pub perto de


onde a gente morava no Canadá. — falou, e as lembranças daquela noite

me atingiram. Fora uma diversão e tanto.

— Queria algo diferente, mas não sei dizer o que. Talvez vá apenas
de filha mais velha e protetora, mamãe vai amar.

Babi riu alto, e indicou com a cabeça a cafeteira que geralmente


íamos.

— Eu acho que logo terá aquele momento Laura em drama... — fez


aspas com os dedos, e bati com a bolsa em seu braço. — É sério! E daí,
junta mil referências e fica incrível.

— Ou eu desisto drasticamente. — provoquei e me sentei na mesa


que Babi, controladora como sempre, já se sentara.

— Ok, preciso falar disso com alguém! — exasperou de repente, e


a encarei sem entender. — Sei que não costumo falar muito sobre meus

irmãos, mas... Sério, preciso tirar isso de mim, se não vou enlouquecer
junto a Christopher.

— O que houve? — indaguei, preocupada, sem entender o que se


passava por sua mente. — Algo com Miguel?

— Também, mas nesse caso, ele só está ciumento como sempre. —


deu de ombros, e fiquei em alerta. Só faltavam dois irmãos...

— Luna então? Ela e Lucas...

— Não não! — cortou-me rapidamente, e puxou o cardápio para si.

Sabia que ela olharia todo ele, e escolheria o de sempre, como fazíamos.
Eu já nem me concentrava em fazer aquilo. — Felipe.

A hora que o nome dele saiu de seus lábios, fiquei alguns segundos
parada, tentando disfarçar o impacto daquela simples palavra sobre mim.
Sempre me mantive a esquiva de qualquer fato a respeito de Felipe,
principalmente, com Babi. Mas ali, de repente, após tudo o que acontecera,
parecia ainda mais difícil disfarçar.

— O que tem? — perguntei, fingindo ser um assunto qualquer e ela

sorriu amplamente, mesmo parecendo preocupada.

— Acho que ele tá namorando. — segurei uma respiração e Babi


baixou o cardápio, arregalando os olhos puxados. — Mas ele não me conta
nada, absolutamente nada! Não quero ser a irmã chata sendo insistente,

porque na verdade, tô no céu vendo a felicidade dele, mas mesmo assim...


Eu queria tanto saber sobre ela ou ele. Já tentei fazer apostas sobre Gabi, a
amiga dele no trabalho, mas... — aquele nome novamente, e de repente,
comecei a considerar se de fato aquela poderia ser a mulher que ele
gostava. Esqueça isso, Laura! — Lipe deu o fora nela naquele mesmo dia
que você foi lá em casa. Aí, fiquei sem opção alguma.

— Talvez ele só esteja esperando o momento certo para contar. —


falei, tentando fingir que não me impactava em nada aquele assunto. Que

Babi me perdoasse no futuro! Na realidade, esperava ansiosa pelo


momento em que pediria perdão por não contar para ela de primeira sobre
nós. Queria chegar aquele momento sobre mim e Felipe, era um fato. —
Você fez isso com Chris, por exemplo.

— Não posso me usar como exemplo, eu fui péssima nisso. — fez


cara de desdém e acabei rindo, vendo que a conversa estava mudando de
foco. — Mas enfim, só queria colocar para fora. Tô tão feliz que ele,
finalmente tá vivendo um pouco longe da família, sabe? Lógico que a

gente o quer conosco, mas, me vejo muito no Lipe. Do medo de interagir

com os outros, de aceitar que faz parte... Ele é tão incrível que eu só quero
poder ser amiga de quem o está deixando assim, sonhando acordado, como
mamãe disse.

— Boa tarde, senhoritas. Gostariam de pedir?

Time perfeito.

— O de sempre, Babi. — falei e ela se adiantou a fazer os pedidos


por nós.

A frase de minha melhor amiga me bateu em cheio, e fiquei ali, por


alguns segundos perdida em pensamentos, enquanto ela falava com a
simpática mulher que nos atendia. Por um lado era bom saber que ele
estava parecendo mais feliz, que estava sonhando acordado após aqueles
dias comigo. Ao mesmo tempo que, não sabia o que fazer com a

informação. Não queria parecer apressada, ansiosa, ou até mesmo,


pressioná-lo. Contudo, a cada segundo, a proximidade que tínhamos por
todos os lados, nos cercavam.

Respira, Laura!

— O que foi? — a pergunta de Babi me trouxe para a realidade e


neguei com a cabeça, como se fosse nada demais.
Peguei meu celular dentro da bolsa e encarei rapidamente a
mensagem que chegara, que era justamente, do homem que me deixava tão

perdida e confusa, assim como, encontrada e orientada.

Remetente: Senhor Mistério

Não costumo ficar muito ao celular, como já notou nos últimos dias rs

Mas assim que chegar em casa, vou ouvir essa música

obs: também queria poder passar essa noite com você, como na semana
passada.

Ignorei sua mensagem naquele momento a contragosto, bloqueando


a tela, e focando em Babi, que parecia me dissecar apenas com o olhar.

— Agora, eu que pergunto... O que foi? — ela deu de ombros e

sorriu de lado. — Você parece desconfiada demais.

— Só tentando não surtar que meu irmão e minha melhor amiga


estão se envolvendo com pessoas que eu não conheço. — acusou e mais
uma vez, fora do céu ao inferno em segundos. — Mas como sou uma
ótima amiga e irmã, posso aguentar a curiosidade mais pouco. Quando eu
estourar, vou fazer um interrogatório!
— Tomara que comece por Felipe. — já sugeri e Babi riu baixo,
assentindo. — Aposto que consegue o ler muito bem.

— Você que pensa, Lipe as vezes é tão fechado como uma caixinha
de surpresas boas.

Mantive-me apenas sem reação, enquanto mudava de assunto para


o novo álbum de uma das cantoras favoritas de Babi. Era mais fácil fugir.

Babi poderia me ver escorregar nas palavras em um segundo, e não


poderia fazer naquele momento. Precisava de algum tempo, o suficiente
para que Lipe e eu nos sentíssemos a vontade de compartilhar o que
tínhamos com o mundo.

Aquilo chegaria a acontecer? Era a pergunta que deixei trancada


em minha mente, lá no fundo, como sempre.
Capítulo 20

“I, I loved you in secret

First sight, yeah

We love without reason.”[28]

Felipe

Joguei-me contra a cama, e meu corpo agradeceu pela maciez.


Suspirei fundo e levei um braço aos olhos, cobrindo-os. O retorno das
aulas e o estudo de caso que Herrera me dera, estavam consumindo todo

meu tempo. Contudo, a semana fora cansativa, mas muito produtiva. E no


fim, tudo tinha dado extremamente certo. Respirei fundo algumas vezes e
busquei meu celular pelo colchão. Assim que o desbloqueei fui
presenteado com uma ligação de vídeo. Não pude evitar o sorriso, no
momento em que notei que era Laura.

Nos dias que se passaram, foi a forma com a qual conseguimos nos
comunicar melhor. Eu estava atolado até a cabeça do estágio e estudo, e
ela, finalizando os últimos detalhes para o aniversário surpresa de sua mãe.
Não nos vimos novamente, mas mesmo assim, não fora como se

tivéssemos nos afastado. Pelo contrário, ela me ligara todos os dias assim

que chegava em seu apartamento, ou até mesmo, antes de dormir.

Entendi que aquele era o jeito de Laura demonstrar que queria


muito me ver, mas entendia completamente o fato de que estava

concentrado com a faculdade e estágio, e ela, com a correria do dia a dia.


Não sabia quase nada sobre relacionamentos, mas entendi que de certa
forma encaminhávamos para aquilo. Um pouquinho a cada dia. Minhas
esperanças eram altas demais, e tinha ciência. Contudo, não conseguia
evitar. Não mais.

— Ei! — falei, assim que conectei o fone de ouvido ao celular, e


fui presenteado com seu sorriso do outro lado da tela. Notei que seu cabelo
estava para o alto, em uma bagunça perfeita de cachos em um coque. Os

olhos verdes brilhavam, e mesmo parecendo cansada, ela estava


claramente empolgada com algo.

— Se sentindo mais livre após finalizar o estudo de caso? —


perguntou de imediato, e me deitei mais próximo a cabeceira da cama,
encostando-me.

— Sim, e muito feliz. — comentei e ela assentiu, sorrindo


abertamente, como se feliz por mim. — Mas me preparando porque as
aulas estão com toda força e então... Minha rotina vai voltar a ser muito

caótica com provas e tudo mais.

— Não sinto falta alguma da faculdade, tenho que admitir. —


confessou, e sorri de sua fala.

— Eu gosto muito. — ela fez uma careta diante de minha fala, e


acabei sorrindo. — Claro, que tenho dias e dias, mas no geral...

— Você tem um jeito tão dedicado e parece tão animado, que com
certeza, no direito, encontrou sua profissão dos sonhos. — argumentou e
não pude fazer outra coisa que não fosse sorrir e assentir com a cabeça.

— Lembro de quando pesquisei mais a fundo sobre meu pai, e


descobri o que ele fazia, no caso, ainda faz. Eu me vi querendo fazer o
mesmo, usar o direito para ajudar pessoas.

— Isso é tão bonito e raro de se ouvir. — falou, e afastou um pouco


mais o celular, dando-me uma leve visão do seu entorno. — Tenho certeza

que vai seguir a carreira acadêmica por um tempo, não sei dizer porquê.

— É uma das minhas metas. — admiti, surpreso diante de sua


análise correta sobre mim. — Mas estou tentando pensar que preciso me
formar antes. Ainda falta muito para isso.

— Então, vou ter algumas provas e trabalhos te roubando de mim


por um longo período, imagino. — provocou, e era naqueles detalhes que
entendia que Laura não me enxergava como algo passageiro.

Aos poucos, vi-me notando que em suas falas, ela sempre nos

colocava em algo futuro. Talvez inconscientemente. Talvez


propositalmente. Aceitaria qualquer um dos dois.

— Prometo que pode ter meus finais de semana. — falei, e ela


negou rapidamente com a cabeça.

— Acho que sua família me mata se te roubar no almoço de


domingo, e a minha, faz o mesmo com você. — apontou o óbvio, e sabia
que estava certa. — Mas sempre pode fugir para minha cama no meio da
noite, qualquer dia. — sugeriu, e não pude deixar de nos imaginar a sós
novamente.

Não era apenas pelo sexo, por mais estrondoso e extraordinário que
fosse. Não tinha experiência para me basear, mas em meu âmago, tinha a
absoluta certeza do que o que Laura me proporcionara, era impossível de

encontrar em outro lugar. Era também pelos momentos conversando. Era


para poder me refugiar com ela em sua banheira. Era para poder dormir
sobre ou sob seu corpo. Era sobre tanto mais que poderíamos ter.

Eu a amava.

E a cada momento, a certeza daquele sentimento me acertava mais.

— Ou na sua banheira. — comentei, e ela assentiu de imediato. —


E como estão os preparativos? — perguntei, lembrando-me de que
precisava, urgentemente, ver se Babi conseguiria me ajudar a montar a

fantasia que escolhi. Não era nada extravagante, e seria fácil de fazer.
Contudo, não tinha a mínima ideia de como fazer sangue falso.

— Uma loucura... — seu tom mudou um pouco e notei que pareceu


voar em seus pensamentos. — Esperando minha fantasia chegar amanhã

cedo, e curiosa para saber o que você vai usar. — apontou um dedo em
minha direção, como se para dar maior ênfase.

— Você que disse que não gostaria de saber antes. — argumentei e


ela fez a melhor cara de inocente que tinha.

— Só estou imaginando o que Felipe Soares usaria em uma festa a


fantasia... Tenho muitas possibilidades em mente. Mas tenho certeza que
vai me surpreender.

— Laura e sua mania de achar que sou bom em surpresas e tenho

algo excepcional. — provoquei, sabendo o quanto me sentia solto e leve


com ela. De uma forma que parecia que nunca teria com mais ninguém
além da minha própria família. Era simples com Laura, porque não fora
algo ordenado ou pedido. Apenas acontecera. E de repente, por mais ruim
que eu fosse falando, gostava de lhe entregar as minhas poucas palavras.

— Felipe e sua mania de não entender que não acho nada, eu


tenho certeza. — revidou, piscando um olho, fazendo-me sorrir.

Batidas na porta me fizeram olhar em direção a mesma.

— Vai lá! — falou, e me mandou um beijo com as mãos. — Sabe


que pode me ligar, quando quiser, não é?

— Sim. — respondi e fiquei ali, parado apenas a encarando por


alguns segundos. — Até amanhã. — falei, e ela sorriu amplamente.

— Até.

Ela desfez a ligação, e a euforia que tomou conta de mim, dizia


muito da saudade que senti de estar próximo a ela nos últimos dias.
Contudo, no dia seguinte, teria a oportunidade, mesmo que de longe, de tê-
la ao meu redor. Seria a festa de aniversário de sua mãe, e ambos
estaríamos lá. Seria a primeira vez que estaríamos no mesmo lugar que
todos que amávamos ao redor. O que podia esperar daquela noite? Não
tinha a mínima ideia. Acreditava que nem Laura soubesse.

Fui até a porta, e não estranhei no segundo que notei os grandes


olhos azuis de Miguel, que trazia consigo a manta na cor preta do Darth
Vader, que ele era apaixonado.

— Por que não entrou no quarto como um furacão? — perguntei, e


ele deu de ombros, desviando o olhar. — O que foi, Mig?

Ele estava com cinco anos, e ali notei o quanto Miguel tinha
crescido. Por mais que ele fosse o bebê da casa, e da família toda,
praticamente. Aos poucos, notava que o bebê que segurei no colo, não o

era mais.

Abaixei-me, e toquei seus cabelos pretos, o que o fez me encarar.


Notei os olhos azuis marejados e não soube dizer o porquê ele estava
daquela maneira.

— Não quero ser um irmão chato pra você. — falou, e estranhei


completamente sua fala.

Nós tínhamos conversado sobre o fato de eu as vezes não estar em


casa, para que ele dormisse comigo, e tudo mais. Contudo, não fora uma
conversa que o deixara assim. Ao menos, não quando aconteceu, dias
atrás. Porém, notei que ele não viera para meu quarto nenhuma das noites
seguidas daquela conversa.

Miguel ainda era uma criança e tentava ao máximo ter cuidado com

tudo o que lhe falava. Comentei com meus pais que ele não aparecera, e
eles pediram para que não questionasse sobre. Como eles me disseram, em
algum momento, Miguel viria. No tempo dele, claro.

— Você nunca vai ser. — ele veio então para os meus braços e me
abraçou fortemente, do jeito que sempre fizera.

— Eu posso dormir com você hoje? — perguntou, surpreendendo-


me por completo, e me afastei um pouco dele, para notar que o marejar de

seus olhos, agora se tornavam um brilho de animação.

Miguel nunca me pediu para estar no quarto comigo. Contudo, ele


sempre afirmava que vinha no meio da noite porque ia me proteger do
bicho papão em meu sonho. Aqueles eram um dos motivos que me
levavam diretamente para acreditar que existia alguma ligação,

inexplicável, sobre ele e Guto. Miguel não se apavorou na primeira vez


que tive algum pesadelo ao seu lado, na realidade, se autodenominou meu
protetor. E ele tinha apenas dois anos na época.

— Pode. — toquei seus cabelos e os baguncei, sabendo o quanto


ele gostava de tal gesto. — Mas por que a gente não desce para ver se tem
algo pronto para comer? — perguntei, e ele deu um pulo para trás,
levantando os braços e gritando animado.

— Fome! — repetiu o grito, e puxou a manta mais para cima, de

forma que encaixou o pequeno capuz que tinha nela, em sua cabeça. —
Vai perder, Lipe! — falou, e disparou corredor a fora.

— Não corre, Mig! — falei, e fui até ele, e assim que o alcancei,
peguei-o no colo, e fiz o restante do caminho assim, jogando-o para cima,
e o fazendo ficar como um super-herói em meus braços.

Assim que chegamos à sala de estar, notei o olhar que nossos pais
nos lançaram e a forma como pareciam felizes me acertou em cheio. Eles
poderiam ter suas dúvidas sobre nossa criação, contudo, gostaria que

tivessem a certeza, que eu tinha, de que sempre acertavam no melhor para


nós. Foi assim com Luna. Foi assim com Babi. Era assim comigo. E seria
assim com Miguel.

Eu tinha certeza.
Capítulo 21

“A carne mais barata do mercado é a carne negra (...)

Brigar sutilmente por respeito

Brigar bravamente por respeito

Brigar por justiça e por respeito

De algum antepassado da cor”[29]

Laura

— Só por mais alguns minutos, pai! — pedi, olhando para o lado

de fora de minha casa, e finalmente notando um carro com o logo da


empresa que contratamos para o bolo chegando. Finalmente!. — Acho que
são eles! Eu te mando uma mensagem dando “ok”, tá bem?

— Ok, Lau. — falou e era claro o nervosismo em sua voz. — Sua


mãe vai me fazer infartar até terminarmos a sobremesa. — comentou, e
acabei gargalhando alto, enquanto fazia um sinal com a mão direita para
o lugar que deveriam estacionar o caminhão.
— Depois diz que não sabe de quem puxei a veia dramática. —
comentei, e sabia que se ele não estivesse tão nervoso, entraríamos em uma

discussão sem fim. — Ok, te amo. Já te mando mensagem! Segure a dona


Melissa aí!

Desfiz a ligação e fui rapidamente até o homem e a mulher que


desceram do carro e me virei rapidamente para notar tia Lili em meu

encalço.

— Boa noite! Sabem me dizer se está tudo certo com o bolo ou...

— Estou procurando a senhora Laura Gutterman. — fiquei


paralisada por alguns segundos, pela forma como o homem branco de
terno a minha frente pareceu me ignorar por completo.

— Senhor, eu...

— O que? — perguntou e me olhou de cima abaixo, com o olhar de


superioridade, que me causou náuseas. Eu já tinha visto aquele filme antes,

tantas e tantas vezes.

Então olhou para meu lado esquerdo, onde tia Lili acabara de se
aproximar por completo.

— Claro, só pode ser você. — sorriu amplamente em direção a Lili,


uma mulher branca de cabelos loiros, e soube exatamente que era a
situação que deduzi antes.
— Não é. — falei, e me coloquei bem a sua frente. Notei ali,
exatamente para onde aquela situação se encaminhava. Já estivera nela

tantas e tantas vezes, que era como se um alarme gritasse em meu interior.
Eu sabia que pioraria. — Eu sou Laura Gutterman. — Notei o choque em
seu olhar, assim como, incredulidade. Ele me olhou novamente, de cima
abaixo como se procurando alguma explicação. — Algum problema? —

perguntei e ele tossiu um pouco, claramente, sem jeito.

— É que... Me desculpe senhorita, é que pessoas como você


geralmente não encomendam bolos exclusivos na nossa confeitaria...

— Pessoas como eu? — indaguei, e notei que ele não esperava que
cortasse sua fala. — O que tem de tão diferente entre mim e você? Ou
entre mim e a mulher ao meu lado? — indiquei tia Lili, e notei o olhar de
raiva em seu rosto, e como ela se segurava.

Eu sabia a resposta que ele queria dar ou tinha em mente, contudo,

ele não tornaria aquilo alto. Não pela forma desesperada que me encarou.
Existiam diferentes tipos de comentários racistas, e pessoas racistas que
cruzaram meu caminho em toda a vida.

No curto período de silêncio que se passou, apenas o encarei.


Talvez ele estivesse questionando o próprio racismo. Talvez ele estivesse
tentando entender como sair daquela situação. Existiam tantos talvez em
situações como aquela. Contudo, também existia eu, que depois de anos e
anos ficando calada, já não me calava mais. Sabia exatamente que quando

uma mulher negra não se calava, o mundo ao redor se modificava. Desde

que comecei a não me calar para o racismo, seja implícito ou explicito,


seja estrutural ou não, notei que impactava o outro com minha resposta,
porque geralmente, não se esperava qualquer reação.

— Bom, já que não tem resposta, apenas gostaria do bolo e

finalizamos aqui. — comentei e ele apenas assentiu sem dizer


absolutamente nada, dando-me o papel para assinar. Assinei o recibo e fui
até a mulher que segurava a caixa do bolo. Ele se adiantou e pegou o bolo,
entregando-o para mim.

Peguei a caixa e lhe devolvi a sua via. Ele deu um leve aceno de
tchau para Lili, que parecia a ponto de saltar no pescoço dele. Soltei o ar
que segurava no momento que vi o carro saindo da casa dos meus pais.

Gostaria de dizer que situações como aquela não me atingiam mais.

Porém, era impossível. Minha mãe dissera que nunca passa, mesmo que
achemos que passou. Era ainda um caminho longo e de luta para que
pessoas negras não fossem simplesmente desconsideradas, em momentos
como aquele. Assim como, em tantos e tantos outros.

— Sei que queria arrancar os cabelos dele — comentei, tentando


aliviar o momento, e minha tia me encarou com pesar. Ela era a amiga
mais antiga de minha mãe, e consequentemente, me viu crescer.
— Já perdi a conta de quantas vezes vi isso acontecer com você...

— E quantas fez um barraco por nós? — indaguei, e ela riu de lado.

Tia Lili não era calma e serena como minha mãe, nem de longe. — Tem
momentos que não valem falar alto ou discutir. Esse era um deles.

Ela me puxou levemente para si e passou as mãos em meus cabelos


cacheados. Infelizmente, aquela era a parte não bonita da minha história,

que me acompanhava. Assim como, as outras pessoas negras.

— Todos já chegaram? — indaguei, e segurei o bolo com mais


segurança em mãos. Lili me encarou com preocupação e eu sabia que não
teria como ela não estar. — Tia, vamos focar no dia da mamãe, por favor.

— Ok. — concordou, mesmo a contragosto, enquanto


caminhávamos até o jardim. O lugar que se tornara a festa surpresa a
fantasia de minha mãe, que ela sequer sonhava. Ao menos, esperava que
não. — Só falta seu pai, e no caso, a aniversariante também.

— Vamos correr e colocar esse bolo lindo, com todos os livros dela
adornados, e já mandar mensagem para meu pai. Ele deve estar até suando
frio. — comentei, e ela sorriu, fazendo-me parar de focar no episódio
anterior. — Aliás, todo mundo está dentro da casa ainda, não é? —
perguntei e ela assentiu, digitando algo em seu celular.

— Sim, no momento que mandarmos mensagem ao seu pai, vamos


trazer todos para o jardim e bom... Já sabe o resto!

— Surpresa! — complementei e coloquei a caixa do bolo no lugar

que deveria ficar. Ela se adiantou, e notei Marta e Victória se


aproximando. — Vocês podem finalizar isso para mim? Preciso tomar uma
água e...

— Vai logo, menina! — tia Lili praticamente me empurrou dali, e

tive que sorrir, caminhando para dentro da casa.

De repente, percebi que meus pensamentos estavam perdidos por


algum canto. Fui até a cozinha, e peguei uma água na geladeira. Bebi um
longo gole, tentando não destruir o batom que passara há alguns minutos, e
já digitei um “ok” para meu pai. Com certeza, ele gritaria “Aleluia” se
pudesse. Sorri apenas por pensar naquilo.

Encostei-me na bancada e tentei relaxar um pouco. Ouvi as vozes


dos convidados não tão distantes, pessoas que amavam minha mãe, e que

ela também amava. Sorri apenas com pensamento de que ela ficaria
emocionada e feliz. Minha mãe merecia o mundo de amor, assim como,
ela sempre me dera.

— Ei!

Surpreendi-me com a voz, não por estranhá-la em minha casa, mas


sim, ali tão perto. Levantei o olhar, e o castanho de Felipe me atingiu. Não
soube ao certo como reagir, mas por um segundo, apenas quis ir até ele, e o

abraçar. Era o meu corpo, alma e coração gritando pela falta de seu toque.

Já faziam tantos dias... quase duas semanas que não nos víamos. Ele
permaneceu parado próximo à entrada do ambiente, e assim que fiz o
movimento de ir até ele, a voz de Babi invadiu o local, fazendo-me travar.

— Achei você! — gritou para mim, e depois se virou para o irmão.

— E você, Lipe! Papai está todo babão falando sobre a gente na sala,
recomendo fugir um pouco de lá.

Ela então veio até mim e me abraçou. Dei-lhe meu carinho


também, e percebi que meu olhar foi diretamente para Felipe, enquanto
estava nos braços de sua irmã. Por um segundo, vi-me perguntando, se ele
pensava o mesmo que eu... que não queria esconder nós de ninguém.
Absolutamente.
Capítulo 22

“Our secret moments

in a crowded room

They got no idea about me and you

There is an indentation in the shape of you

Made your mark on me

a golden tattoo.”[30]

Felipe

Gritos, aplausos, parabéns... Música para todo o lado e pessoas


sorrindo. Não conseguia evitar o sentimento bom que me atingiu, assim
que a mãe de Laura apareceu e todos gritaram “Surpresa”. Era como se o
amor naquele lugar fosse único. Como se todas as pessoas ali, tivessem
realmente um propósito. Vi-me, enquanto tomava uma taça de vinho,
sentado em um canto mais afastado no jardim, indagando-me qual era o
meu.
— Fui abandonada. — tia Dani reclamou, jogando-se na cadeira ao
meu lado e sorri para ela. — Castiel está dançando com todas as crianças e

adolescentes da festa, e eu, com certeza já estou me sentindo velha por


estar de salto.

— Por que veio de Barbie? — perguntei e ela me encarou como se


estivesse a provocando.

— Annie me obrigou, praticamente. E nem vem com essa cara de

menino bom, porque olha só você de John Wick[31]! — acusou e a encarei

sem entender nada. — Você realmente não sabe o quanto é bonito, né?

Aliás, vi Laura na pista de dança e me lembrei na hora de você.

— Mas...

Paralisei, sem saber como continuar a frase, e notei a forma como


tia Dani me encarou com certeza.

— Pode ser que o apelido de Castiel faça sentindo no fim. Sendo


feiticeira ou não, para mim, sempre foi nítido a forma como Laura te olha,
e ainda melhor, como você a olha.

Fiquei perplexo e engoli em seco, sem saber como falar sobre.

— Eu não sei o que dizer, tia.

— Não precisa. — deu de ombros, piscando um olho. — Nem para


mim. Nem para ninguém. Espero que chegue o momento de vocês se
assumindo, porque assim, quando Vic me falou sobre a tal namorada

misteriosa, relacionei com aquele dia na cozinha e... Bingo!

— Feitiçaria. — acusei, brincando e ela gargalhou alto. — Eu não


sei se somos namorados. — admiti, e tia Dani me encarou interessada.

— Sei que não gosta de se abrir, mas eu posso dizer a minha breve

visão como expectadora. Me permite? — indagou e assenti de imediato.


Era um certo alívio, poder ouvir alguém falar sobre aquilo, que não fosse
minha própria mente. — Vocês têm um círculo íntimo em comum. Os pais
são melhores amigos e a família está sempre reunida em alguma festa. Sei
a pressão que isso pode causar. Senti essa pressão quando comecei a me
envolver com Castiel. Acho que, as coisas acontecem no tempo que tem
que ser. Deixa a pressão para lá, e as vezes, deixa ser espontâneo. Não
precisam pensar tanto sobre os outros, mas sim, sobre vocês. Primeiro,

vocês têm que saber o que o outro sente, e o mundo que aguarde.

— Eu não faço a mínima ideia do que ela sente. — fui honesto e


bebi mais um gole do vinho. — Mas as vezes, é como se visse nos olhos
dela, um reflexo dos meus.

— E o que seus olhos dizem? — perguntou e abri a boca para


responder. — Não tem que dizer para mim, mas sim, para ela.
Guardei suas palavras, assim como, guardei as minhas. Sorri,
deixando a taça sobre a mesa e dei um leve beijo na cabeça de minha tia,

antes de seguir em direção parte que dava uma visão melhor da pista de
dança que fora feita ali, no centro do jardim.

Procurei-a por todos os lados, ainda um pouco distante, e não


demorou muito para encontrá-la. Ouvi a gargalhada alta de Laura, e me

virei em sua direção. Ela estava dançando no meio da pista, com as luzes
penduradas ao redor, dela e de outras tantas pessoas. Rafael, seu primo, a
seguia na coreografia, e foi impossível não sorrir, notando o quanto ela
parecia leve e solta.

Ela girou com sua saia e parecia flutuar no ambiente. Notei que ela
brincava com algumas outras pessoas, como a esposa de Rafael, seu tio,
seus irmãos, seus avós... Todos ali, se divertindo, como se aquele dia fosse
único. E ele realmente parecia. Encostei-me próximo a coluna da casa, que

dava para a saída do jardim, e fiquei a observando.

Laura dançou mais um pouco, girou e girou, até chegar à mesa de


seus pais e abraçou a mãe fortemente. Ela então voltou para dançar com o
irmão e notei o quanto ela era cheia de vida. Laura era como uma
tempestade. Não tinha como não ser atingindo por ela, por mais que você
tentasse. Sequer tive a chance de o fazer.

A música mudou e notei que ela levantou o olhar como se buscasse


algo ao redor. Assim que seu olhar parou no meu, a forma como um leve

sorriso se desenhou em seu rosto, fez meu coração falhar uma batida. Era

como se ela encontrasse o que buscava desde o princípio. Naquele instante,


queria que meu olhar passasse a ela, tudo que minha boca ainda não ousara
dizer – meu amor.

Será que ela conseguia ver?

Será que ela conseguia me ver de fato ali?

A forma como seu olhar me dera a resposta, fora arrebatadora.

Notei ela mudar seus passos em minha direção, e fora como se tudo
parasse para ela se aproximar. Não era uma surpresa para ninguém ali,
Laura tentar enturmar a todos em meio a uma festa. Ela já o fizera várias e
várias vezes, com pessoas diferentes. Aquela, parecia ser apenas minha vez
para as outras pessoas. Mas no fundo, não me importei com o que
pensariam. Me importei com o que eu pensava sobre nós, e com o que ela

o fazia.

— Preciso estar perto do homem que amo essa noite, se não ela não
vai estar completa. — sussurrou e suas palavras me atingiram em cheio.

Puxou-me para o meio de todos, e ouvi o grito de tio Castiel a


esquerda, mas ignorei.

— Mexe o esqueleto, Lipe! — ele insistiu, e fiquei ali, sem saber o


que fazer.

Felizmente, eram muitas pessoas para todos se importarem apenas

comigo ali, perdido na pista de dança. Na realidade, as palavras de Laura


ecoavam em minha mente, e a forma como ela girou e continuou a dançar
uma coreografia ao meu lado, com minha irmã a tiracolo, mostrou que ela
parecia sequer ter percebido o que dissera.

Mas eu percebia, e claro, sentia-me da mesma maneira.


Capítulo 23

“So when you hold my hand

Do you wanna hold my heart?

When you say you want me

Is it all of me or just one part?.”[32]

Laura

— Está tão linda de Tiana! — falei novamente para minha mãe,


que sorria abertamente e a girei com um dedo. — Espero que tenha

aproveitado o máximo do seu dia, mamãe.

— Nunca pensei que ganharia uma festa de aniversário estando tão


velha. — comentou, e abriu um sorriso, que como meu pai dizia poderia
iluminar nossos piores dias. — Eu ia te dizer para passar a noite aqui,
mas... Pelos olhares que notei durante a noite, acredito que vai ter alguém a
sua porta hoje.

— Como assim? — indaguei, enquanto mamãe se sentava no


grande sofá, e ouvia o barulho de meu pai e os gêmeos no andar de cima.
Todos os convidados já haviam ido embora, e ali estávamos nós. Apenas

nossa pequena grande família unida.

— Não preciso dizer o nome dele, para saber que estou falando
dele. — pontuou e soltei os ombros, sentando-me ao seu lado. — Ele te
olha de um jeito, Lau. Não sei como consegue esconder o que sente dele.

— Às vezes acho que estou maluca e projetando nele o sentimento


que tenho. — admiti, e deitei minha cabeça em seu pescoço. Senti seu
braço passar ao meu redor, e seu carinho em meu cabelo. — Não quero o
pressionar abrindo o coração e... Felipe é novo em relacionamentos. E eu
posso ter tido vários, mas em praticamente todos, sempre fui a primeira a
dizer adeus. Porque eu já tinha em mente que ia acabar, antes mesmo de
começar.

— Tão romântica, minha filha. — debochou, sorrindo e não pude

evitar fazer o mesmo. — Eu te disse, que em algum momento, não ia ver o


fim...

— Não consigo ver com ele. Não quero. — confessei, e levei as


mãos ao rosto, sentindo-me um tanto estúpida. — Nem parece que foram
apenas alguns dias juntos e aí...

— O conhece e gosta dele há mais tempo do que realmente tiveram


juntos. Evitou por tanto tempo que agora está dessa maneira.

— Estou a ponto de gritar que sou maluca por ele. — comentei e

mamãe riu abertamente.

— E por que não faz isso? — perguntou, afastando-se o suficiente


para me encarar. — O que realmente te impede é o curto tempo juntos? Ou
o fato de que o amou à primeira vista e tem medo de que o sentimento não

seja recíproco?

Parei para pensar em seus questionamentos por alguns segundos.


Soltei-me contra o sofá e encarei o teto, tentando encontrar algum
discernimento. Não o tinha de fato.

— Talvez uma mistura disso tudo? — indaguei para o nada, mas na


realidade, para minha mãe. — Eu sou tão expansiva as vezes, que...

— Morre antes de levar o tiro. — apontou e assenti, sabendo que


ela sempre me diria aquilo. Eu o era exatamente assim. — Às vezes, é só

deixar acontecer. Não precisa se forçar a não dizer, assim como, temer que
irá dizer. Pode ser, que diga sem querer, no momento mais inesperado que
o ama. Quando a nossa autoprisão nos machuca, nosso corpo age por si.

— Tem razão, como sempre, mamãe.

Entendi ali que estava sofrendo demais por algo que não deveria
ficar perdurando, por mais que fosse estarrecedor em alguns momentos.
Poderia só viver o momento, do jeito que fazíamos sempre que estávamos
juntos. Sorri sozinha ao pensar sobre.

— Eu desisto! — ouvi a voz de meu pai na escada, e já imaginei


que estava dramatizando, assim como eu. — Lorena diz que nunca mais

vai tirar a fantasia de Taylor Swift[33] e Tuan diz que será um caçador de

Bloodborne[34] para sempre.

— Uma hora eles se cansam, e precisam tomar banho. — minha


mãe apontou o óbvio, levantando-se e indo até ele.

Encarei-os e sorri pela forma como ela foi confortavelmente para


seus braços. Como se eles foram feitos para tê-la bem ali.

— Já que as crianças estão querendo deixar vocês malucos, eu já


vou antes que elas me deixem. — pisquei um olho e minha mãe fez
menção de vir até mim, mas neguei rapidamente. — Hora de se curtirem!
— apontei com um dedo, e meu pai riu baixo.

— Boa noite, casal que amo e que odeio por serem tão românticos.
— falei, e fui até eles, recebendo um beijo em minha testa de meu pai, e
um beijo no rosto de minha mãe. — Me avisem se precisarem que roube os
gêmeos.

— Vai logo, filha! — mamãe comentou e se virou para meu pai, e a


forma como trocaram um olhar significativo, era como se ele entendesse
que existia algo mais na fala de minha mãe.

— Nem me olhe assim! — falei para meu pai, que já levantou uma

sobrancelha. — Não vou falar nada.

Dei as costas a eles e fui até a porta, dando um leve tchauzinho e


mandando um beijo para o casal de apaixonados no meio da sala de estar.
Eles nunca mudavam.

— Amo vocês!

Fechei a porta atrás de mim, e fui presenteada com a lua em seu


esplendor – cheia. Suspirei profundamente e peguei meu celular. Não
acreditava na teoria de minha mãe, de que Felipe estaria à frente de meu
apartamento. O conhecia pouco, contudo, o suficiente para saber que
consideraria tão ato como intrometido. A mensagem que apareceu em meu
visor, fez-me girar sozinha em direção ao meu carro.

Remetente: Senhor Mistério

Só queria dizer que foi uma noite incrível

obs: pelo pouco que ficamos próximos, entendi que me basta apenas olhar
para você

obs2: podemos nos ver amanhã?


Resolvi não o responder e disquei seu número. Assim que entrei em

meu carro, apenas fiquei esperando a cada toque, para que pudesse ouvir
sua voz do outro lado da linha.

— Laura.

A forma como meu nome soava em sua voz, fazia-me entender,

que nada no mundo poderia interromper aquele sentimento.

— Posso te roubar hoje? — indaguei, sem pensar em mais nada,


apenas em nós. Era tão mais fácil quando fazia aquilo.

— Eu posso fugir com você, se soar melhor. — respondeu, fazendo-


me rir, e aquele era o lado menino do homem que me tinha por completo.

— Vou estar à frente do seu condomínio daqui alguns minutos...

— Ok. Te encontro lá!

Desfiz a ligação e soltei o celular sobre o colo, vibrando sozinha


dentro do carro. Não sabia se todo começo de amor era daquela maneira,
contudo, não me imaginaria sentindo aquilo em qualquer outro cenário. Eu
não queria um príncipe, nunca o desejara.

Talvez por aquilo escolhera Moana[35] para meu personagem


naquela noite. Sempre gostei de ser livre como o vento, como as águas...
Suspirei fundo, sabendo que Felipe também me proporcionava aquilo,
mesmo sem saber. Uma liberdade dentro do amor. Era o desejo que sequer

sabia que tinha, realizando-se. Pouco a pouco.

“Apaga a luz”[36] fora a última música que mandara para ele. A


mesma, preenchia meu carro, enquanto cantava animada, sonhando feito
uma adolescente pelo crush. Talvez finalmente estivesse vivendo aquilo.

Eu me dividia em cantar, e olhar para a entrada do condomínio.


Suspirei profundamente e pausei a música no segundo que o vi caminhar
em minha direção. O próprio pecado caminhando em minha direção. Não
pude evitar e saí do carro, indo até ele. Sem dizer absolutamente nada, ele
abriu os braços e ali, vi-me no encaixe perfeito de seu corpo.

Naquele abraço, tive tudo que desejei durante a noite tão próximos,

mas ainda assim, tão longe.

Sem dizer nada, ele segurou meu rosto com ambas as mãos e o
olhar castanho inundou todo meu ser. Naquele mundo todo nosso, presos
um ao outro, soube que mesmo que lutasse, era uma batalha perdida. O
sentimento que tinha era tão meu, quanto dele. Mesmo que fosse cedo
demais. Mesmo que fosse tarde demais.
— Eu te amo. — soltei, e seus lábios vieram para os meus, dando-
me tanto dele, que poderia jurar que flutuei naquela calçada.

Assim que nos afastamos, ele me encarou, e o brilho em seu olhar,


dava a resposta de que aquele sentimento não era negado. Ao menos, não
por ele.

— Não diz nada. — pedi, tocando seus lábios com meus dedos, os

quais ele beijou delicadamente. — Podemos ir ver o mar? — perguntei e


ele assentiu de imediato, sorrindo tão largo, que poderia jurar que era um
de seus programas favoritas. — Será muito maluco eu de Moana e você de
John Wick em plena Copacabana?

— Nada deixa de ser maluco com você. — comentou, tocando


levemente meu rosto e não pude evitar um suspiro.

— Praia e depois, banheira. — pontuei e ele assentiu. Afastei-me,


puxando-o até o carro.

Surpreendi-me no momento em que me puxou novamente para si e


me beijou. Um beijo calmo, leve e sereno. Ele não precisava dizer nada,
nem corresponder. O jeito que me olhava me entregava exatamente o que
queria – ele. Nada mais importava, nem convenções de relacionamentos.
Só nós.
Capítulo 24

“Então fica comigo, baby

Sabe, eu posso te amar pra sempre

Sei cada resposta pra cada pergunta

Que você faria em um dia sobre pertencer.”[37]

Laura

— Gostaria de saber o que passa em sua mente. — Felipe falou de


repente, depois do silêncio que nos envolveu, enquanto caminhávamos
pela calçada. O som e cheiro do mar de plano de fundo, as pessoas indo e

vindo ao nosso redor.

— Agora, que não poderia estar em outro lugar. — comentei,


enquanto segurava seu braço, e caminhávamos lado a lado.

Naquele momento, senti a paz me invadir por completo.


Finalmente, meus sentimentos não me sufocavam mais. Os deixei soltos
para que Felipe pudesse ou não os ter. Os deixei livres, para que eu
pudesse me sentir de tal forma.

— Eu também não. — falou, enquanto passava seu braço ao redor

de minha cintura e me trazia para perto.

Era tão natural para a gente, estar exatamente assim, que percebi
que existia muito mais do que palavras poderiam expressar – existia a
intensidade que emanava de um para o outro. A forma como nossos

olhares se encontravam em meio a tantas pessoas. Naquele momento,


lembrei-me claramente, das várias vezes em que o castanho dos olhos de
Felipe Soares encontrara os meus, mesmo sem querer, durante os anos que
nos conhecemos.

— Lembro da primeira vez que te vi, e como todos os convidados


ao redor pareceram sumir. — confessei, soltando o ar que segurava. Eu
não tinha mais porque esconder. — Ei, lindo! — parei, e ele se virou para
mim, e toquei levemente seu rosto. — Não estou dizendo isso porque

quero te pressionar ou algo assim. Eu só senti que ia explodir a qualquer


momento, se não deixasse as coisas em viva-voz.

Surpreendendo-me, ele não disse nada, e levou uma de minhas


mãos até seu peito, exatamente sobre seu coração. Senti-o bater
freneticamente e mais uma vez, vi-me desejando cada batimento.

— Não sou tão bom com palavras. Não entendo de


relacionamentos, a não ser os que fui espectador. Mas eu sei que desde o
momento em que te vi, eu nunca esqueci seu olhar. E quando te

reencontrei, em um desses acasos de destino ou o próprio destino, eu... Me


vi perdido por você.

— Lindo, você não...

Surpreendendo-me, como sempre fazia, Felipe levou seus dedos

aos meus lábios, calando-me, da forma que eu comumente fazia com ele.
Aquele gesto tão íntimo e tão nosso, fez-me ficar ainda mais imersa.

— Lembro que foi na primeira semana em que estava nas ruas, e eu


tinha fome... Ainda não tinha encontrado um lugar em que pudesse ter
comida. Eu estava em um parque, e me lembro exatamente da menina
negra de olhos verdes que passou perto de mim, e de repente, me ofereceu
seu sanduíche. Lembro de sua mãe gritando “Laura” e a forma como você,
como se soubesse que eu precisava, me deu o sanduíche.

Paralisei diante de sua fala e fiquei em choque. Eu me recordava


quase nada daquele momento. Eu devia ter o que? Cinco anos, talvez?

— Eu sei que não se lembra. — comentou e suspirou


profundamente. — Mas quando vi sua mãe novamente, a qual não mudou
quase nada da época, tive a confirmação de que foi você que fez isso por
mim, muitos anos atrás. Por um tempo, eu questionei se você lembrava,
mas percebi que não o fez. Depois, percebi que a forma como me senti,
quando te vi novamente, foi completamente diferente de anos atrás. Eu

perdi o chão, o foco, a fala...

— O coração. — complementei e ele assentiu. Senti as lágrimas em


meus olhos, e não poderia evitar que elas descessem, mesmo que lutasse.
— Por que não me disse que a gente se conheceu ou...

— Porque eu te amei a segunda vista. — falou, e minhas lágrimas


desceram no mesmo instante. Suas mãos vieram para meu rosto e ele
encostou nossas testas. — Porque eu sentia gratidão pela menina que me
ajudou naquela época, mas quando te vi novamente, me senti... — notei
que ele fechou os olhos e suspirou. — Não sou bom em falar, mas... Laura,
eu te amo.

Seu olhar veio para o meu, e de repente, tudo fez sentido em minha
mente. A forma como nos ignoramos ao longo do tempo. Seu olhar

encontrando o meu durante todos aqueles anos. Ele em meu apartamento e


uma garrafa de vinho. Ele contando sobre a mulher que “mais que
gostava” e parecendo tão honesto e perdido. Ele se entregando para mim,
na mesma intensidade, que eu o fazia. A forma como tudo ficou simples no
segundo em que nos encontramos sozinhos e fomos honestos.

— A mulher que você “mais que gosta” sou eu. — falei alto e ele
assentiu, e notei como estava completamente exposto. — Eu pensei que
estava pirando quando via a reciprocidade em seu olhar. Por Deus, lindo!

Eu me apaixonei por você da mesma forma, a segunda vista.

— Hoje eu percebi que não podia mais esconder o que sentia, pela
forma como eu claramente deixava exposto que te amava, apenas te
olhando.

— Caralho! — falei, e o vi rir baixo, enquanto eu tocava seu rosto.

— Eu te amo tanto, que...

— Me disse isso sem perceber hoje à noite, na festa. — fiquei


perplexa diante de sua fala. — “Preciso estar perto do homem que amo
essa noite, se não ela não vai estar completa.”.

— Meu Deus! — falei e ri de mim mesma, sem conseguir entender


como não vi as palavras saindo. — Eu nem acredito que sofri tanto para
me declarar, e no fim, fiz isso sem perceber.

— Talvez tivesse que ser assim. — comentou, do jeito sério e leve

que apenas ele tinha.

Ficamos ali, frente a frente por alguns segundos. Como se


questionando um ao outro, ou confirmando de que era daquela maneira que
aconteceria.

— Talvez tivesse que ser nós. — falei, e ele me puxou para si,
abraçando-me tão forte quanto a emoção que nos encontrou.
Naquele momento percebi que por mais recente que fosse nossa
relação, o nosso sentimento não o era. Estava vivo e vibrando entre nós,

mesmo que tivéssemos tentando não o compreender, correr ou evitar.


Permaneceu ali, ardendo e buscando o afago que apenas o outro poderia
proporcionar.

Ele então se afastou um pouco e me encarou. Notei que aquele

encontro, sincero, verdadeiro e certeiro, não poderia ser nada além do


destino, unindo-nos. E era como uma das minhas músicas favoritas dizia, e
agora, pensava sobre ele. “E não é bem bonito pensar que o tempo todo

havia uma corda invisível amarrando você a mim?”.[38]

Seus lábios então vieram para os meus e eu só conseguia pensar


que minha vida realmente não seria mais a mesma. Nunca depois de seu
olhar. Jamais depois de seu toque.
Capítulo 25

“And baby, I get mystified by how

This city screams your name

And baby, I'm so terrified of

if you ever walk away.”[39]

Felipe

Ela vestia apenas minha camiseta, enquanto estava sentada sobre


meu colo, e uma música tocava de fundo. Laura levou a caneca de

achocolatado mais uma vez a boca e tive que rir da forma como ela parecia
feliz por tomar aquilo.

— É tão doido tudo isso. — comentou, e suspirou profundamente.


— Eu o tempo todo te querendo, você me querendo e a gente... — negou
com a cabeça, como se sem crer naquilo. — Nessas horas, volto a acreditar
fielmente nos romances que leio. E olha que nunca fui nada romântica!

— Não duvido disso! — falei, e passei as mãos por seus cabelos,


enquanto ela se concentrava em beber mais um pouco do líquido. — Acho
que as coisas tem seu tempo de acontecer, ou talvez, a gente goste de

complicar.

— Acredito na mistura das duas coisas, para ser sincera. — deu de


ombros. — Mas, de verdade, agora não tô me importando nem um pouco
com o passado. Só quero isso aqui e... o futuro.

— Eu achei que poderia te assustar por te amar. — confessei e ela


encostou nossas testas, com um sorriso no rosto. — Agora vejo que se
sentiu da mesma forma.

— Não sabe como! — afastou-se e pulou de meu colo, e a vi


caminhar até a cozinha. — E pior, você sempre tão misterioso, na sua,
quieto... e eu, morrendo por dentro porque parecia a última mulher que
daria atenção. — acusou e tive que rir da forma como nos desencontramos.

— E sempre foi a primeira. — argumentei e a vi caminhar de volta

para mim, sem a caneca. — E não sou nem um pouco misterioso.

— Continua como “Senhor Mistério” em meu celular. — confessou


e me estendeu as mãos, fazendo-me levantar e ir até ela. — E não pretendo
mudar tão cedo.

Ela então passou suas mãos em meu pescoço, e as minhas foram


instintivamente para sua cintura.
— O que está fazendo? — perguntei, e ela me fez girar consigo
pela sala. — Sou péssimo nisso.

— Já te disse, não tem como você ser péssimo em nada. — piscou


um olho. — Vai por mim que tenho razão 99% do tempo.

— Esse pode ser o famoso 1%...

Ela riu de lado e revirou os olhos.

— Preciso fazer outra confissão. — comentei, enquanto ela me


guiava, e seus olhos encontraram os meus. — Músicas sempre me
lembram de você. A maioria delas. Sobre amor. Sobre sentir.

Notei seus olhos mudarem o brilho e ela ficou sobre meus pés, e
logo seus lábios vieram para os meus, levemente.

— A gente é tão parecido na forma de amar. — falou e me atentei


em como me olhava com o sentimento vivo. Nunca imaginei que poderia
estar tão certo sobre como a lia. Felizmente, o estava. — Já perdi a conta

de músicas que lembram você, e como te amaldiçoei por não deixar minha
mente em paz. — brincou e tive que rir, beijando sua testa com carinho. —
Me conta qual foi a primeira. — pediu, e notei como sorria em
antecipação.

Podia sentir meu rosto queimar, e não conseguia evitar tal reação.
Respirei fundo e tomei a coragem de me abrir para ela, da forma como
queria. Da forma como fazia sozinho com meu violão.

“Como pode ser gostar de alguém

E esse tal alguém não ser seu

Fico desejando nós gastando o mar

Pôr do Sol, postal, mais ninguém

Peço tanto a Deus

Para esquecer

Mas só de pedir me lembro

Minha linda flor

Meu jasmim será

Meus melhores beijos serão seus”[40]

Parei e levei meus dedos para seu rosto, limpando as lágrimas que
desciam.

— Você é tão... meu amor. — falou e sorriu lindamente, os olhos


verdes expressando mais do que qualquer palavra poderia dizer.

Ela então abriu a boca, e surpreendeu-me cantando o restante da


canção.

“Sinto que você é ligado a mim

Sempre que estou indo, volto atrás

Estou entregue a ponto de estar sempre só

Esperando um sim ou nunca mais

É tanta graça lá fora passa

O tempo sem você

Mas pode sim

Ser sim amado e tudo acontecer” [41]

— Quero dançar com você. — falei e ela sorriu, girando em meus

braços e logo, voltando para mim. Os olhos verdes me seduzindo,


chamando e gritando.

— Quero dançar com você. — complementou e nossos lábios se


encontraram. Suas mãos foram para meu rosto, e senti-me imerso daquele
sentimento, que agora, sabia que era tão nosso, quanto certo.

Diferente de quando tocava aquela música no jardim, para o nada.


Ali, cantara para a mulher que amava, e que de se explicação alguma para

o fazer, correspondia ao sentimento.

Ardentemente.

Aos poucos o beijo se transformou em mais toques, as poucas


roupas que nos cobriam foram tiradas, marcas sendo deixadas um pelo
outro, e o macio do tapete da sala como nosso oásis sagrado.

Seu corpo sob o meu, os olhos fechados devido ao prazer que


tínhamos com o encontro de nossos corpos. Meus olhos arrebatados pela
forma como ela se sentia comigo, pela forma que ela me fazia sentir.
Quando a sensação se tornou demais, e seus gemidos se misturaram com
os meus, o suor de nossos corpos, suas mãos marcaram minhas costas, da
forma como seu olhar o fez quando nos reencontramos.

Ali, nos reencontrávamos novamente.

— Eu te amo.

Nossas vozes saíram descompassadas, devido as respirações


irregulares, e o prazer que chegara ao ápice. Contudo, não poderia ser
diferente o encontro perfeito que tínhamos, assim como, fora desde o
começo. Sorri para ela, quando suas mãos vieram para meu rosto e seus
lábios para os meus.

Poderia ficar ali para sempre. Tinha certeza. Assim como,


observando os olhos verdes que me marcavam como seu, e sabendo que
era tão meu, quanto seu. Era nosso.
Epílogo

“Time, curious time

Gave me no compasses, gave me no signs

Were there clues I didn't see?

And isn't it just so pretty to think

All along there was some

Invisible string

Tying you to me?”[42]

Dias depois...

O amor tem seu próprio jeito, em alguns casos, simples de


acontecer.

Laura imaginou que amara Felipe Paiva Soares à primeira vista, até
descobrir que o amou a segunda. Felipe nunca pensou que conheceria tal
sentimento, mas este o escolheu no segundo em que os olhos verdes de
Laura Lourenzinni Gutterman bateram, novamente, no castanho dos seus.

Eles poderiam ser definidos pelo inesperado e pela espontaneidade.


Talvez eles nunca soubessem daquilo, contudo, seus corações e desejos
mais profundos sim. No momento em que Laura deixou as palavras saírem

naquela mesa de almoço, até Felipe estar do outro lado da porta de seu
apartamento. Eles criaram algo tão deles, completamente sem querer, que

no fim, quando as declarações vieram, fora fácil entender.

O complicado nunca fora compreender o sentimento um do outro,

mas sim, admiti-lo em voz alta. O amor se tornava real de tantas maneiras,
que, a admissão do mesmo, era apenas um bônus.

O amor se encontrava na forma como o beijo lhes tirava o chão. O


amor resplandecia na forma como respeitavam o espaço um do outro, e
entendiam, que por mais malucos que estivessem para estar juntos, existia
uma vida fora do apartamento onde tudo começara. O amor acolhia nos
momentos de indecisão sobre como e quando contar as suas famílias sobre
o que tinham. O amor trazia o sorriso desde os momentos de prazer, até, o

simples dormir lado a lado, ou até mesmo, por uma simples vídeo-
chamada. O amor deles era tão, mas tão maior do que simplesmente dizer
“eu te amo”.

Laura respirou cerca de cinco vezes antes de abrir a porta da casa


dos Soares. Assim que varreu a entrada, notou que praticamente a família
toda estava ali. Ela engoliu em seco e buscou o olhar de Felipe, para lhe
dar força naquele momento. Contudo, logo notara que ele não estava ali.
Percebeu o sorriso aberto de Danielle, e recordou sobre o que Felipe

comentara a respeito do conselho dela. Não pode evitar em sorrir em sua

direção.

No segundo seguinte Laura buscou a melhor amiga em meio a eles,


e também não a encontrou. Queria tanto que a melhor amiga estivesse ali,
e que em um olhar, a entendesse. Sabia que poderia ser um caos, contudo,

confiava no fato de que Babi a entenderia perfeitamente. A ela, e a Felipe.


Abriu a boca para dizer algo, mas assim que Victória se aproximou,
claramente não tão animada quanto antes, ela questionou o que acontecia
de fato ali.

— Está tudo bem? — perguntou e Victória assentiu de imediato,


abraçando-a com carinho.

— Felipe disse que a namorada misteriosa ia aparecer mais ou


menos nesse horário e então... — fez um sinal para todos os Soares ali

atrás, que não tiravam o olhar da porta de entrada. Laura não pode evitar
um sorriso.

Percebeu que estava tão nervosa em contar a família de Felipe


sobre eles, que não pensou se eles considerariam ou não o fato de ela
chegar no horário parecido com a tal namorada. Trocou um breve olhar
com Danielle que parecia segurar a gargalhada e voltou-se para Victória.
— Desculpe essa bagunça... — fez um sinal para os demais, e
Castiel reclamara, enquanto os outros pareciam alheios. — Babi está lá em

cima com Lipe, caso queira que a chame...

— Eles devem estar para descer. — cortou a mulher mais velha,


que a olhou intrigada.

Dito e feito.

Como um passe de mágica, vira a melhor amiga descer as escadas,


e notara que Babi tinha os olhos marejados, como se tivesse chorado.
Logo, Babi chegara até ela, e segurou suas duas mãos, puxando-a para um
abraço. Victória se afastou naquele momento e fora em direção do filho
mais novo, Miguel.

— Antes que diga algo. — Babi sussurrou para a melhor amiga e se


afastou apenas o suficiente para olhar nos olhos verdes de Laura, que já
não sabia como agir. — Eu sempre soube. Sabia o que meu irmão sentia e

então, foi fácil ver que ele estava, finalmente, com a mulher que ama.

— Babi...

— Aquele dia no café, eu só estava te provocando... Eu entendo


perfeitamente o lado de vocês, e jamais vou ficar magoada por isso. Eu
estou vibrando por saber que hoje, todos vão saber.

— Obrigada por entender, não sabe como...


— Eu sei. — piscou um olho e se afastou da amiga, vendo-a ir em
direção a bagunça enorme de Soares pela casa.

Assim que Laura voltou sua visão para o pé da escada, encontrou


Felipe. Os olhos castanhos dando-lhe a certeza que tanto queria, que tanto
precisava naquele momento. Sem dizer nada, ele foi até ela, e mais uma
vez, roubou-lhe a respiração. Tão perdido neles, mal notaram as reações

atrás de si. No segundo em que Felipe puxou Laura para si, e lhe deu um
leve beijo nos lábios, as reações dos Soares foram diversas.

Danielle e Babi vibraram, gritando em uníssono “Finalmente!”.


Castiel pegou os filhos no colo e os girou. Luna, a irmã mais velha,
gargalhou alto e soltou um grito, claramente feliz por eles. Christopher
bateu palmas, enquanto, Caleb e Victória permaneciam em choque, com as
bocas entreabertas.

— Eu imaginei exatamente isso. — a voz da mãe de Laura invadiu

o ambiente, assim como sua risada.

O marido, Levi, vinha a tiracolo, com os gêmeos que correram para


abraçar Felipe que sequer sabia como reagir. A família de Laura soubera
na noite anterior, e a forma como o aceitaram e vibraram com a notícia, o
fez compreender, que ganhara mais uma família como sua.

— Lipe!
A voz de Miguel chegou as orelhas de Felipe, que encarou o irmão
mais novo no mesmo instante. Notou a forma que ele sorriu em direção a

Tuan, que bagunçou seu cabelo, e logo depois, para Lorena. Os gêmeos se
afastaram, e surpreendendo a todos os presentes, que finalmente,
compreendiam a notícia, Miguel foi diretamente para os braços de Laura.

Completamente emocionada, ela pegou aquele pedacinho de gente

de apenas cinco anos, e o levantou do chão. Miguel sorriu para ela, e a


abraçou com força. Laura então olhou para Felipe, e não pode evitar as
lágrimas. Ali, entenderam o tempo que levaram para se assumir a todos, e
que realmente, existia um propósito. Nada mais precisava ser dito, e de
repente, eles se tornaram uma bagunça de abraços, felicitações, puxões de
orelha e gritos.

E em meio a tudo aquilo, o olhar de Laura encontrou o de Felipe,


mais uma vez. Eles souberam. Eles sentiram. Que daquela maneira, em

qualquer multidão, eles se encontrariam, assim como, em qualquer outra


vida.

FIM
Naquela mesma noite...

— Queria que estivesse aqui para te abraçar, irmão. — Felipe falou


em direção ao céu, enquanto andava pelo jardim. — Queria que pudesse
fazer parte de todo esse amor. Que tivesse o amor dessa família também, e

que... Sinto sua falta, todo dia.

Dos segredos e momentos tão íntimos nossos, que ninguém, além


de nós tem noção. Quando a saudade ou a culpa pela perda do irmão mais
velho gritava no coração de Felipe, ele sempre ia ao jardim. Ele lembrava
que o irmão adorava árvores, e de como o ensinou a desenhá-las quando
mais novo. Sem Guto, não existiria o Felipe que ele era. Felipe sentia que
reencontrava, por alguns segundos, a paz que precisava para seguir em
frente. Ao deixar, sua dor sair, e sua saudade, gritar.

— Eu só queria uma outra chance, em uma vida diferente, quem


sabe. — riu de si mesmo, não por duvidar que fosse possível, mas sim, por
desejar fortemente que acontecesse.

— Lipe!

A voz de Miguel chegou até ele, e Felipe se apressou em disfarçar


as lágrimas, e quando menos esperou, Miguel praticamente voou sobre ele.
Não havia explicação para o que sentira naquele momento. A paz que o
encontrou. A forma como as coisas se encaixavam.

Quem sabe, de alguma forma inexplicável, ele e Guto já tivessem


se reencontrado... No inexplicável a vida se perde, e neste mesmo, a vida
se (re)encontra.
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Meus outros livros: aqui


[1]“Perdido e nunca encontrado
Esperando minhas palavras
Visto, mas nunca ouvido
Enterrado no subsolo

Mas eu vou continuar voltando.”

I’ll Keep Coming – Low Roar

[2] É isso aí – Ana Carolina part. Seu Jorge

[3] “Então, apague as luzes, o verão é como uma faca


Sempre espero por você para cortar até o osso
Os demônios jogam os dados, os anjos reviram os olhos

E se eu sangrar, você será o último a saber.”

Cruel Summer – Taylor Swift

[4] “Eu te amo tanto que te odeio

Neste momento, é tão difícil culpar você

Porque você é tão linda

Você é tão linda.”

Easier – 5 Seconds Of Summer

[5] “Ele faz a batida do meu coração


Saltar pela 16ª Avenida
Fez aquele, oh, quero dizer
Quero ver o que há por trás dessa atitude, do tipo
Te quero, abençoe a minha alma

E eu não preciso dizer a ele, eu acho que ele sabe


Eu acho que ele sabe.”

I Think He Knows – Taylor Swift

[6] “Odeio acidentes


Exceto quando nós fomos de ''amigos'' pra isso

Uhum, é isso aí

Querido, você é a pessoa que eu quero.”

Paper Rings – Taylor Swift

[7] “E quando eu senti que era um cardigã velho


Debaixo da cama de alguém

Você me vestiu e disse que eu era o seu favorito.”

Cardigan – Taylor Swift

[8] “Estou andando rápido pelos semáforos

Ruas lotadas e vidas ocupadas

E tudo o que sabemos é viver rapidamente

Estamos a sós com nossas mudanças de ideias

Nos apaixonamos até doer ou sangrar

Ou desaparecer com o tempo”

State Of Grace – Taylor Swift


[9] “Diga meu nome e tudo simplesmente pára
Eu não quero você como um melhor amigo

Comprei apenas este vestido para que


você pudesse retirá-lo
Tire-o (ha, ha, ha)
Esqueça seu nome na minha cama
Porque eu não quero você como um melhor amigo

Comprei apenas este vestido para que


você pudesse retirá-lo

Tire-o (ha, ha, ha, ha)”

Dress – Taylor Swift

[10] “Ar salgado, e ferrugem em sua porta


Eu nunca precisei de mais nada
Sussurros de, "Você tem certeza? "
"Nunca tive antes na vida"”
august – Taylor Swift

[11] Direção – Manu Gavassi.

[12]“Em minha defesa, eu não tenho nenhuma

Por nunca ter deixado tudo em paz

Mas seria divertido

Se você fosse o cara certo.”

The 1 – Taylor Swift

[13]“Eu venho quebrando corações há muito tempo, e


Brincando com eles, caras mais velhos

Apenas para jogar coisas para eu usar

Algo aconteceu pela primeira vez, no

Paraíso pequeno mais sombrio

Ritmo, eu só preciso de você.”

Don’t Blame Me – Taylor Swift

[14] Trecho de Don’t Blame Me – Taylor Swift.

[15]“No meio da noite, nos meus sonhos


Você deveria ver as coisas que fazemos, amor
No meio da noite, nos meus sonhos
Eu sei que vou estar com você
Então estou me dando o tempo necessário
(você está pronto pra isso?)
(ooh, você está pronto pra isso?)”

Ready For It? – Taylor Swift

[16]“Volte e diga-me por que


Me sinto como se tivesse sentido sua falta todo esse tempo
E encontre-me aqui esta noite
E diga-me que isso tudo não é coisa da minha cabeça”

Everything Has Changed – Taylor Swift feat. Ed Sheeran

[17] Trecho de Querido John, livro de Nicholas Sparks.

[18]“Então, eu vou deixar acontecer


Ninguém no mundo
poderia se comparar a você, amor (Uh-uh)

Comparar a você, amor (Uh-uh)


Estamos indo devagar
Em qualquer momento, qualquer lugar
Vamos durar para sempre, meu amor”

Holiday – Little Mix

[19] Trecho de Codinome – Maria

[20] “Pegue a minha mão, meu coração e minha alma


Eu só deixarei que esses olhos vejam você”

One – Ed Sheeran

[21] Trecho de Don’t Blame Me – Taylor Swift

[22]“Vou te abraçar

E te proteger

Então deixe o amor te aquecer

Até amanhã

Eu vou ficar com você

Do seu lado

Feche os olhos cansados

Vou esperar e logo

Vou ver seu sorriso em um sonho”

BB’s Theme – Ludwig Fonsell


[23] “Não leia a última página
Mas, nela, eu fico quando você está perdido e eu estou com medo e você está se

afastando
Eu quero suas madrugadas
Mas eu estarei limpando garrafas
no dia de Ano Novo com você”

New Year’s Day – Taylor Swift

[24]“E eu ainda consigo enxergar tudo (Na minha mente)


Tudo de você, tudo de mim (Interligado)
Uma vez, eu acreditei que o amor seria (Preto e branco)
Mas é dourado (Dourado)”

Daylight – Taylor Swift

[25] “No final da noite, a cidade está dormindo


Seu amor é um segredo que eu estou esperando
Sonhando, morrendo de vontade de manter
Mude minhas prioridades

O gosto de seus lábios é minha ideia de luxo”

King Of My Heart – Taylor Swift

[26] Tiana é a protagonista do filme de animação A Princesa e o Sapo, lançado em


2009 pela Walt Disney Studios. No início do filme, ela é uma garçonete de um
restaurante que vive no bairro francês de Nova Orleans durante a Era do Jazz. Fonte:
Wikipédia.
[27] Mulan é um filme estadunidense de animação de 1998 da Walt Disney
Feature Animation, baseado na lenda chinesa de Hua Mulan. Fonte: Wikipédia.
[28]“I, I loved you in secret

First sight, yeah


We love without reason”

Dancing With Our Hands Tied – Taylor Swift

[29] A Carne – Elza Soares

[30] “Nossos momentos secretos


na sua sala lotada
Eles não têm ideia sobre eu e você
Há um recorte na forma de você
Fez sua marca em mim
uma tatuagem dourada”

Dress – Taylor Swift

[31] John Wick é uma franquia americana de thriller de ação neo-noir criada pelo
roteirista Derek Kolstad e de propriedade da Summit Entertainment. Fonte: Wikipédia .

[32] ”Então, quando você segurar minha mão

Quer segurar meu coração?

Quando você diz que me quer

É tudo de mim ou apenas uma parte?”

Boys Like You - Anna Clendening

[33] Taylor Alison Swift é uma cantora e compositora estadunidense. Fonte:


Wikipédia.
[34] Bloodborne é um RPG eletrônico de ação produzido pela FromSoftware e
publicado pela Sony Computer Entertainment a 24 de Março de 2015 em exclusivo para

a PlayStation 4, sendo o quarto game da serie Souls. Bloodborne foi realizado por
Hidetaka Miyazaki, diretor de Demon's Souls e Dark Souls. Fonte: Wikipédia.
[35] Moana é um filme de animação estadunidense de 2016, dos gêneros comédia
e aventura, dirigido por John Musker e Ron Clements para a Walt Disney Animation
Studios, com roteiro dos próprios diretores e ainda Jared Bush, Chris Williams, Don

Hall, Pamela Ribbon, Aaron Kandell e Jordan Kandell. Fonte: Wikipédia.

[36] Apaga a Luz é uma canção da cantora brasileira Glória Groove, lançada em
2018.

[37] Apaga a Luz – Glória Groove

[38] Invisible String – Taylor Swift

[39]“E amor, eu fico perplexa de como


Esta cidade grita o seu nome
E amor, eu fico apavorada
Se você algum dia for embora”

Cornelia Street – Taylor Swift

[40] Amado – Vanessa da Mata.

[41] Amado – Vanessa da Mata.

[42] “Tempo, tempo curioso


Não me deu bússolas, não me deu sinais
Havia pistas que eu não vi?
E não é bem bonito pensar
Que o tempo todo havia uma

Corda invisível
Amarrando você a mim”

Invisible String – Taylor Swift

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