You are on page 1of 16
TITULOI ORDEM SOCIAL §1. Ohomem ea sociedade 1.1. Anatureza social do homem ‘Ninguém ignora que o homem é um ser cuja natureza é essen- cialmente social: 6, na célebre definicdo de ArisTOretes, um animal politico porque nasceu para viver em comunidade (polis). Com efeito, sendo dotado de sentimentos e de razio, precisa de comunicar, de tro- car experiéncias, de produzir bens para sie para os outros, de utilizar o produto do trabalho alheio, porque é absolutamente imposstvel criar sozinho tudo o que necesita para viver. A expresso latina unus homo, nullus homo caracteriza bem a sua natureza social porque o homem. que viva absolutamente isolado, sem uma comunidade social mais ou menos extensa (a familia, a tribo, a cidade, o Estado), néo é homem: é um nada. Ser gregério por natureza, o homem pertence a dois mundos: a) a0 mundo natural, constitufdo por seres animais, vegetais e minerais. 0 homem é, téo-s6, uma parte constituinte do todo, mas é indubitavelmente a mais importante em resultado das suas qualidades biops{quicas que o impdem aos restantes seres; b) ao mundo cultural, construfdo pela sua inteligéncia e trabalho. E constituido pelos seres humanos e bens que produzem para viverem e obterem melhores condigdes de vida. Caracteriza a vitéria do homem na sua luta tenaz para se destacar no mun- do natural, criando uma dualidade que o separa dos restantes seres. £no mundo cultural que o homem afirma a sua racionalidade que se manifesta nas realizagdes duma vida que decorre em convivéncia. 4 dei Geral de Direito Dir-se-4 que viver com os outros (conviver) é 0 seu destino, a que no pode fugir sob pena de deixar de ser homem’. Porém, a convivéncia postula regras que disciplinem os comporta- mentos de cada homem e transmitam a seguranca necesséria a vida de relagdo com os outros. Tais regras corporizam a ordem social que importa estudar. 1.2. Aordem social. Instituigées sociais 12.1. Nogio e fungiio A palavra instituigio comporta varios significados. Etimologicamente, deriva de institutio, instituere e pode definir-se como o que esté ou permanece numa sociedade em evolucao", Na linguagem corrente, fala-se de instituigdo em varios sentidos: um complexo de leis, de costumes, de normas; uma obra constitufda por elementos pessoais e materiais organizados segundo leis e regula- mentos (estatutos) préprios com vista & realizago dum fim determi nado; etc."!. Juridicamente, instituicao designa ora um conjunto mais ou menos extenso de normas que, subordinadas a princfpios comuns, disciplinam um determinado tipo de relagées sociais', ora.atealidade social que lhe estd na base®, 8 Nao passam de mera ficcio as doutrinas correntes nos séculos XVII a XIX de que o homem comesou por viver isolado num estado de natureza que teria precedido o estado social. Referimo-nos a Hosars para quem o homem é um ser profundamente egoista que a sociedade educa; e a ROUSSEAU que vé no homem ‘um ser originariamente bom que a civilizagio corrompeu. A sociabilidade inata do homem e as modernas investigacdes antropol6gicas desmentem aquelas doutvinas. Vide Inocéncio Gatvko Texuss, Introdusdo ao Estudo de Direito I (Coimbra, 1999), 33-39; José de Ourvetma AscENsAo, O DireitoIntrodugdo.e Teoria Geral? (Coimbra, 2005), 23-24; Miguel Texxesea De Sousa, Introdugdo ao Direito (Almedina / Coimbra, 2012) 53-55; e David MacaLsties, Nogdes Fundamentais de Direito. Casos Prticos Resolvidos (Coimbra Editora / Coimbra, 2010). 0 autor apresenta casos préticos que percorrem diversas matérias, ®) Vide Outverea Ascensio, 0c, 33-36. © Vide Joao Barrista Macttano, Introduio ao Direto e ao Discurso Legitimador? (Coimbra, 1989), 14. ' Vig, odireito das obrigagdes,odireito de propriedade,odireito da familia, etc. (© Assim, a obrigagao, a propriedade, a familia, etc. | il ordem Social 5 As suas fungGes sio muito importantes, porque ajudam a resolver os problemas da sociedade e dos homens quea integram. As principais so a estabilidade normativa que permite orientar os seus membros na prossecuco de objectivos comuns e transmite a seguranca indis- pensdvel a planificago do futuro; e a integragéo numa organizacao que unifica e identifica os seus elementos. HA instituigdes fundamentais e secundarias. As primeiras per- tencem: a familia, instituigo bdsica que constitui o ponto de partida das demais; a propriedade, que é o sustentéculo do sistema social e politico dum povo; e o Estado, em que um povo se organiza politica e juridicamente numa unidade de poder. As segundas complementam as instituides fundamentais e nem sempre se encontram em todas as sociedades: destacamos, v. g,, 0 Parlamento, um tribunal, uma igreja, uma escola, um sindicato, uma academia, ete.”), Importaré referir que também se fala de instituto (nao de institui- fo) quando se trata dum complexo normativo menor. 12.2. Necessidade Uma perspectiva antropolégica moderna sustenta que o homem um ser naturalmente inacabado, uma criatura de gestagio incompleta que nasce prematuramente; carece dum equipamento instintivo que 0 oriente e permita encontrar um rumo de acco no meio em que se integra, Por isso, tem necessidade de criar instituigdes que o guiem e oferecam, nas relagdes com os outros, a seguranca indispensével & previsibilidade em que assenta a planificagao da vida e o progresso”). © Vide Barrista Macsano, 0, 19-22; e Miguel TEIxEIRA DE SOUSA, 0. Sl © Vide Orlando de Atmetpa Secco, Introducio ao Estudo do Direito' (Rio de Janeiro, 1995), 26-% Vide, no nosso Cédigo Civil, v.g.,a prescricio (arts. 300.°ess.),a responsabi- lidade civil arts. 483.*e ss), a usucapio (arts. 187° e ss.) as responsabilidades parentais (arts. 187. e s.,na redaccdo que Ihes foi dada pela Lei n.* 61/2008, de 31 de Outubro), a sucessdo legitima (arts. 2131.° 88), etc. © Vide Barrista MacHano, o<., 7-9; e Paulo Ferreira da CUNHA, Principios de Direito (Porto, 8/4.) 30. 6 dia Geral de Direito §2. Ordens normativas 2.1. Preliminares Porque o homem vive necessariamente na companhia de outros homens com os quais estabelece varias relagées (de coordenacao, de subordinacao, de integracao), é absolutamente necessério que o seu comportamento seja disciplinado por normas ou regras de organiza- iio e de conduta'®), Tais normas pertencem ao mundo cultural e, por isso, nfo se con- fundem com as leis fisico-mateméticas que explicam um fenémeno natural segundo o princfpio da causalidade. Pelo contrério, as leis cul- turais caracterizam-se pela sua referénciaa valores ou por adequarem meios a fins: tém, portanto, uma natureza axiolégica ou teleol6gica. Entre as leis fisicas eas normas observam-se as seguintes diferencas: 1. allel fisica explica as relagbes necessérias entre os fenémenos naturais: refere-se ao que é e tem um fim teérico. A norma dis- ciplina um comportamento: determina o que deve-ser e 0 seu fim é de ordem pratica; 2. ali fisica é valida quando as relagées ocorrem exactamente na forma enunciada: os factos devem confirmé-la. As normas dirigem-se a seres livres que a podem violar ou obedecer. Nao deixa de ser valida se 0 comportamento dum destinatério dela se afastar: nfo depende da experiéncia e as suas excepgdes Tepercutem-se na sua eficdcia e nao na sua validade™). Nem todas as leis culturais nos interessam: de fora ficam as leis sociolégicas, histéricas e econémicas porque, embora as suas conclu- s6es possam influenciar a ordenagéio dos comportamentos, nao disci- plinamas nossas condutas. Ocupar-nos-emos, sim, das leis ou normas éticas, ou seja, das proposig&es ou enunciados lingufsticos que expres- sam um dever-ser que orienta o inter-relacionamento humano!”, 69 Vide Micurs. Rete, Ligdes Preliminares de Direito® (Coimbra, 1982), 23; ¢ ‘AtmetDA SEcco, o-., 20-26, ( Vide Eduardo Gancta Mayez, Introduccién al Estudiodel Derecho (Mexico D.F, 1944), 5-8; e Gato TELE, 0¢,, 1,28-29. © Vide Miguel REALE, o., 27-29; Javier De Lucas e Outros, Curso de ntroduccién «al Derecho (Valencia, 1994), 18. ae ‘ordem Soctal z No entanto, as normas sociais nao visam 0 mesmo fim e t4o-pouco reagem da mesma maneira as condutas que as nfo observem. Por isso, interessa distinguir as principais ordens éticas ou normativas: a religiosa, a moral, a de trato social e a jurfdica. 2.2, Ordem religiosa Asnormas religiosas so criadas por um Ser transcendente e orde- amas condutas dos crentes nas suas relagdes com Deus. Apresentam caracteristicas préprias que as distinguem das demais normas sociais), Sao: 1. instrumentais: preparam ou tornam possivel o que nao perten- ce.ao mundo terreno; 2, intra-individuais: destinam-se directa e fundamentalmente ao {ntimo do homem crente, embora nao deixem também de impor um certo comportamento exterior; 3, as sangées, que estabelecem, pertencem ao foro exclusive das igrejas e, portanto, sdo insusceptiveis de imposigo pelo Estado. Dizem respeito a crenga e a fé numa vida ultraterrena na qual cada homem receber4 a retribuicdo (a paga ética) da sua condu- ta. O remorso é, também, uma forma de sangio imediata™, Subjacente e como suporte da ordem religiosa esté “a ideia fun- damental da religido de que vivemos uma vida transit6ria que néo tem em sia medida do seu valor, mas que se mede, segundo valores. eternos, a luz da ideia de uma vida ultraterrena, na qual os homens serdo julgados segundo o valor ético da sua prépria existéncia", ‘Nao se diga que as normas religiosas (v. g., 0 mandamento que proibe matar ou o preceito que impde que amemos o préximo como a nés mesmos) esto ausentes das relagdes entre os homens. Tao-s6 constituem, do ponto de vista puramente religioso, deveres dohomem, para com Deus e nao direitos dos homens uns para com os outros"). 9 Vide Pedro Em6, Nosdes Elementares de Direito (Lisboa, 1997), 19-20. 8” Vide Miguel REALE, 0<.,74 9 Go palavras de Miguel Rate, a.., 74. © Vide]. Dias Marqurs, Introdugdo ao Estudo do Direito® (Lisboa, 1994), 38-39. 8 deia Gera de Diveito Nos alvores da civilizagio, as normas religiosas confundiram-se, durante muito tempo, com as normas juridicas. O Direito Romano constitui um campo fecundo: no vocdbulo ius, que tem na deusa lustitia a sua geradora; no simbolo do direito, composto pela mesma deusa que, de olhos vendados, segura uma balanga de dois pratos com o fiel perfeitamente aprumado (derectum) ); em alguns negécios juri- dicos, em cuja celebragio se invocava a deusa Fides!’ etc, Também na Idade Média, a ordem juridica nao foi estranha a influéncia da ordem religiosa: bastard exemplificar com os ordélios ou jufzos de Deus") € 0 casamento de juras™, figuras juridicas que se caracterizam pelo directo apelo a intervencdo de Deus e da Igreja. E nfo deixamos, tam- bém, de referir 0 direito muculmano que vai buscar & religio 0 con- tetido dos seus critérios normativos". Todavia, nos paises ocidentais 2 ordem juridica foi-se secularizando e hoje no se confunde com a ordem religiosa, cujas caracteristicas assinalémos” (Vide Sebastiao Cxvz, lus. Derectum (Directum) (Coimbra, 1974), 28, 39 e 44-46. ( Vide Sebastizo Cruz, Direito Romano (“Ius Romanum’) I. Introdugdo, Fontes* (Coimbra, 1984), 241 € 305. © Divergindo os juramentos acerca da prética dum determinado delito, recorria-se ao juizo de Deus na crenga de que revelaria a autoria ea inocéncia, Referimosa pratica do ferro em brasa: depois de lavare enxugara mao, suspeito pegava num ferro em brasa, caminhava nove pés e depositava-o no chio. A mio ra abencoada por um sacerdote e coberta com um pano com cera e linho. Trés dias depois, era examinada e, sea queimadura no manifestasse sinais de cura, 0 individuo era condenado; de contratio, seria absolvido. Vide Marcello Caztano, Hist6ria do Direito Portugués! (1140-1495) (Lisboa, 1981), 262-263. (9) No casamento legitimo do direito germanico (rechte Eke) a desponsatio solene envolvia o consentimento dos pais da noiva, a sua entrega (traditio) a0 noivo, a béngdo da Igreja e a boda. No caso de os pais nfo consentirem e perante uma situasio de rapto em que a mulher passava a viver com o noivo, a Igreja, que tinha consagrado o principio consensus facit nuptias, reconhecia o casamento prestado in manu cleric: com a declaracio de miituo consentimento dos esposos, za presenca de testemunhas e do sacerdote. Vide Manuel Pauto Meni, Sobre 0 "Casamento de Juras", em Novos Estudos de Histéria do Direito (Barcelos, 1937), 131-138, Vide Mario Jélio de ALMEIDA Cosma, Histéria do Direito Portugués, revista e actualizada com a colaboracio Rui Manuel de Figueiredo Marcos (Almedina, Coimbra, 2011), 171-174, (= Entre nés, a Constituigao da Repiblica determina que “a liberdade de cons- ciéncia, de religiéoe de culto é inviolével” (art. 4.*,n.°1); profbe a perseguigioea privacdo de direitos “por causa das suas conviccdes ou pratica religiosa” (art. 41 Yr Conde Social _ ° ‘Das normas religiosas de origem divina distinguem-se as normas que regulam a organizagio e a pritica religiosa das comunidades de crentes, dirigidas por autoridades hierarquicamente escalonadas. Tais normas tém um carécter positivo e so criadas pela hierarquia eclesidstica com vista & aplicago e ao desenvolvimento das primei- ras), A sua violagao pode determinar a aplicacao de sancées rel sas (v. g., a excomunhiio) que se repercutem no meio social com uma intensidade que varia segundo as épocas hist6ricas da civilizagao™. 2.3. Ordem moral A moral é, nas palavras de Casrat pz Moncapa, constituida pelo “conjunto de preceitos, concepces e regras, altamente obrigatérios para com a consciéncia, pelos quais se rege, antes e para além do direito, algumas vezes até em conflito com ele, a conduta dos homens numa sociedade”*), Caracteriza-se pela interioridade, absolutidade e espontaneidade do dever moral. A sua esfera de aplicacdo é imensa, porque vai até onde podem chegar as projeccdes da consciéncia humana: “o homem, se tiver consciéncia, sente-se permanentemente como que solicitado ow atrafdo pelo dever moral, independentemente de toda e qualquer sangdo externa’; e “a tinica sangdo a que estaré sujeito seré, ainda e sempre, a interior do remorso ou, pelo menos, a do desgosto de si mesmo, no caso de nao cumprir 0 dever moral”, Consideramos aqui, tao-s6, a moral geral (comum a todos os membros duma sociedade) sem, todavia, ignorarmos que hé morais particulares (préprias de certas profissdes). Esta distingio justifica a recusa de relativismo na moral sub specie conscientiae e a relatividade moral sub specie societatis™. 1 2); e afirma que “as igrejas e outras comunidades religiosas estio separadas do Estado e sao livres na sua organizacio e no exercicio das suas fungées e do calto" (art. 412, n.°4). © Vide Dias Marques, 0, 39-40. (0 Vide Dias MaRQues, o.., 39-40. ‘9 Referimo-nos & moral positiva e nfo a uma ética de valores absolutos. Vide Lafs CaBRAL DE Moncapa, Filosofia do Direto edo Estado, II (Coimbra, 1966), 134. ®0 Sao palavras de CABRAL-DE MONCADA, 0, 135-136. Vide Casrat. vz Moncapa, 0<., 136-137). Fd ela Gerald Direito A relagio entre a moral e 0 direito nfo foi desconhecida na Antiguidade Classica que, embora no tenha elaborado um critério que permitisse a sua distingfo, nfo deixou de ter a intuigo de que no se confundem. Constituem exemplos significativos a afirmagao de Pautus “non omne, quod licet, honestum est” e a regula atribuida a ULPIANUs “cogitationis poenam nemo patitur”™). Porém, foi na Idade Moderna que este problema adquiriu um sen- tido mais vital ou pragmético na sequéncia dos conflitos entre a Igreja Gatélica e os varios cultos protestantes e das dissensdes que dividiram os protestantes em diversas correntes. Os Chefes de Estado passaram aintervir na vida particular dos cidadiios para indagarem as suas con- viegdes religiosas: uns queriam que os seus sibditos fossem catélicos; outros, protestantes. Surgiu, ento, a necessidade de delimitar clara- mente zona de interferéncia do poder puiblico, s6 possivel através da distingdo entre os campos juridico, moral e religioso, Merece destaque ‘THomastus, o primeiro jurisconsulto que, para tutelar aliberdade de pensamento e de consciéncia, procurou distinguir a moral e o direito separando as acces humanas em internas (foro {ntimo) e externas (foro externo). Ao direito sé interessam os actos da vida de relagio, ou seja, a acco humana depois de exteriorizada; a moral ocupa-se do que se processa no plano do pensamento e da consciéncia, que so actos internos. Em consequéncia, s6 0 que se projecta no mundo exte- rior fica sujeito A possivel intervengao do poder publico e, portanto, nenhum cidadao pode ser processado pelo simples facto de pensar; e tiio-pouco pode ser obrigado a ter esta ou aquela crenca™. Porém, este critério logo se revelou insuficiente porque, se hé actos puramente interiores, nao ha acces humanas exclusivamente exter nas; e 0 direito, porque disciplina fundamentalmente actos humanos livres, nao dispensa a apreciago de factores internos (v..,a culpa, 0 dolo, o animus, etc.) que determinaram comportamentos externos®, Por outro lado, a relagdo entre a moral eo direito nao é tio linear que dispense o interesse de a aprofundar. 950, 17,144: “Nem tudo 0 que é licito (juridico) é honesto (moral)”. 9 48, 19,18: “Ninguém 6 punido por pensar". © Vide Miguel REALE, 0, 53-54. 9 Vide Luis Lecaz v Lacamana, Filosofia del Derecho* (Barcelona, 1979), 434-43: e Gado Textes, 0«,, I, 16. rr rdem Social 4 Surgiram outros critérios que é necessdrio analisar. Destacamos 0: 1, critério teleolégico: a moral interessa-se pela realizagao plena do homem (fim pessoal), enquanto o direito tao-s6 tem em vista a2 realizacdo da justica para assegurar a paz social necesséria & convivéncia em liberdade (fim social). Este critério sofre a censura de que a moral tem também um fim social eo direito satisfaz igualmente um fim pessoal™, além de os seus campos variarem consoante as diferentes escalas de valores das diver- sas épocas hist6ricas: hé normas jurfdicas que se convertem em ‘morais; e normas morais que se tornam juridicas™. critério da perspectiva: a moral incide sobre a interioridade (a motivagao) dos actos (lado interno) e o direito atende ao que externamente se manifesta (lado externo). J& vimos, porém, que este critério (utilizado por Tuomastus) nao satisfaz: desvalori- za a importncia que o direito atribui ao elemento interno das acces humanas e nao atende ao relevo que a moral confere 20 elemento externo. Ora, a moral também exige que actuemos rectamente, manifestando e executando os nossos propésitos™; e odireito penetra com frequéncia na consciéncia para analisar 0s motivos da actuagdo humana", No entanto, este critério nao deixa de conter um elemento vitil: assinala os diferentes pontos de partida da moral e do direito. Aquela parte da atitude inte- rior; este assenta nos aspectos exteriores da conduta™, 3. critério da imperatividade: a moral, porque visa a perfeigaio pessoal, é simplesmente imperativa, ou seja, limita-se a impor 2, ©) V,g.,a norma moral que dispde que devemos ajudar um mendigo contribui também para o fim social de diminuir a delinquéncia; e a norma juridica que {mpde o pagamento de impostos nao deixa de orientar os individuos no sentido do seu aperfeicoamento ético. Vide Norberto Atvanez.e J. L. Muiioz DE BAENA, Introduccién Filosofica al Derecho (Madrid, 1989), 53-54. 5) ¥.g.,a moral contém norms que jé foram juridicas: quando a sua infraccio era punida como constitutiva de escandalo; e ha normas morais num sistema democrético (vg. apoiar um partido politico) que se tornam juridicas em dita- dura, Vide Norberto AtvaREz ¢ MUROZ DF BAENA, 0, 65-66. 9 Vg, ndo basta ter a intengdo de visitar um doente; é também moralmente necessério por em pritica este propésito. Vide O1.VEIRA ASCENSRO, 0¢., 98-100. 5° Bastard pensar, v. g.,no que as diferentes formas de culpa e a boa fé desem- penham nos direitos penal e civil. Vide Gustav Rapsruc, Filosofia do Direito, (Coimbra, 1961), 115-116. 00 Vide Baprista MACHADO. 0.C.. 60-61: € OLIVEIRA ASCENSAO. 0.¢.. 102-103. B eta Geral de Direito deveres; pelo contrério, regulando as relacdes sociais segundo a justiga, o direito é imperativo-atributivo: impde deveres ¢ reconhece direitos correlativos". Por isso, também se fala de unilateralidade na moral e de bilateralidade no diveito: perante o sujeito moralmente obrigado nao ha uma pessoa autorizada a exigir-Ihe o cumprimento dos seus deveres; j4 quem se encon- tra juridicamente obrigado esta perante outra pessoa que tem a faculdade de exigir 0 cumprimento da sua obrigagiio™. Nem sempre, porém , assim é: basta pensar nas obrigagdes naturais, cujo cumprimento nao é judicialmente exigfvel™; em normas cuja violagao nem sempre é susceptivel de sancdo; e em alguns direitos que carecem de coercibilidade™”, 4. critério do motivo da acco: os preceitos morais tém a sua fonte na consciéncia de quem os deve cumprir que constitui, também, a instancia que decide sobre o seu cumprimento ou incumprimento“"; o direito é fruto da vontade dum sujeito diferente. Por isso, a moral é auténoma (0 autor da norma moral 6 a pessoa que lhe deve obedecer) e o direito é heterénomo (implica a sujeigo a um querer alheio). Isto é, o cumprimento da norma moral requer o assentimento do obrigado, enquanto ‘norma jurfdica se cumpre independentemente da opiniao dos seus destinatérios. Também este critério, que foi utilizado por Kant, sofre de deficiéncias: 0 autolegislador de Kant nao é 0 homem real, mas uma vontade pura cujas maximas tém valor universal; por isso, nao sendo criadas pela pessoa obrigada, as normas morais nao so auténomas. A sua obrigatoriedade no pode fundar-se num querer empirico, mas em exigéncias ideais. Ademais, se as normas morais fossem auténomas, sempre have- ria que reconhecer ao obrigado nao sé a faculdade de as criar, mas também de derrogar ou modificar segundo os seus capri- chos, faculdade que nenhum moralista lhe atribui. £ também impossivel elevar a vontade universal & dimensio de norma © Vide Métio Bicorre CHoRAO, Introducdo aoDireito I (Coimbra, 1989),200-201. 89 Vide Garcia Maynez, oc. 16-18; € GALvAo TELLES, ac, I, 17. © Vide art. 402.° do Cédigo Civil. ©) Videinfra, as notas 48 € 49. (8 Vide Javier De Lucas e Outros, ac, 22; €José Hermano Saraiva, Moral eDireito, em Filosofia Juridica Portuguesa Contemportinea (Porto, s/d.), 302-303. Y onde Social 13 sem sabermos previamente o que é bom ou mau: o imperative moral 6a expressdo de algo intrinsecamente valioso e nfo duma vontade. Por outro lado, o direito tem também uma dimensao de autonomia porque, sendo a vigéncia a base factica da validade, esta desvanece-se quando aquela desce a um certo grau. Além de que uma “obrigacao” heterénoma (isto , imposta por uma vontade alheia) envolve uma contradiiio: a obrigac&o pressu- pée o reconhecimento dum dever e uma vontade alheia s6 pode produzir, quando muito, um ter-de-ser, nunca um dever-ser?. No entanto, ndo deixa de poder afirmar-se que a dimensio de autonomia domina na moral; por isso, enquanto a ignorantia iuris no excusa do seu cumprimento™, j4 releva a ignorantia moralis: quem no conhece um preceito moral nao lhe esté obrigado. A moral é um imperativo categérico e, portanto, per- mite ao individuo que aprecie as circunstancias fora das quais a norma moral nao tem validade; a norma juridica ¢ hipotética, porque estabelece os pressupostos da sua aplicacao™’, 5. critério da forma ou dos meios: as normas morais so incoerc{- veis, isto é, o seu cumprimento s6 poderé efectuar-se esponta- neamente’, As normas juridicas gozam de coercibilidade: hé a possibilidade de se recorrer A forca para que sejam observa- das), Também este critério nao satisfaz plenamente. Haja em vista que ordinariamente o direito é observado sem pensarmos na possibilidade de imposicao pela forca”); também, a coer- cibilidade nao constitui uma dimensdo essencial das normas jurfdicas porque nem todas tém sangdo"); e hé normas cuja sango no pode ser coactivamente impostal”?. (©) Vide RappRuct, 0, 126. (© Videart. 6 do Cédigo Civil. (Vide Lucaz v LACAMBRA, 0, 439-441, (9 Dir-se-4, a propésite, que ninguém se toma bom a forca. Vide Bicorne GHoRio, oc, 201. Vide Lecaz v LAcAMBRA, 0<., 437-438; Garcta MAYNEZ, 0, I-22; € GaLVAO ‘Tess, 06, 1, U8. ‘© Vide Norberto ALVAREZ. e Mufioz DE BAENA, ac, 61; e Gatvio TeLtes, ac, I, 26-27. ‘8 Pensemos, v.g., nas obrigagBes naturais (arts. 402.°e 404.) e na norma que fixa os deveres conjugais art. 1672.). Vide OL1vEIRA ASCENSiO, 0¢., 80-92. ‘1 Sucede, v. g, com 0 Direito Canénico, absolutamente destitufdo de 4 ela Geral de Direlto 6. critério do minimo ético: o diveito é aquela parte da moral arma- da de garantias especificas indispensdveis & existéncia da paz, da liberdade e da justica na sociedade'™. Identifica-se, portanto, com as normas basicas ou fundamentais da convivéncia e cons- titui um circulo menos amplo da moral. A relagio entre o direito e amoral pode ser representada por dois circulos concéntricos: o mais pequeno representa o direito; o maior, as normas morais, que o direito no protege. Por isso, poder-se-A afirmar que tudo © que é juridico é moral, mas nem tudo o que e moral é juri- dico, Também este critério nao satisfaz. Desde logo, porque hd normas juridicas moralmente indiferentes; depois, porque também as hé contrarias & moral!” Referidos os principais critérios, nenhum fixa, de maneira certa ou acabada, os limites que separam a moral e o direito, o que, alids, se compreende se tivermos em atenciio que o seu relacionamento é pautado por atinéncias muito profundas a par de algumas situades de indiferenga e de colisio. Quando o direito determina a nulidade das doagdes e das disposi- ges testamentdrias de pessoa casada ao ctimplice com quem cometeu adultério™ ou atribui ao doador a faculdade de revogar a doagdo por ingratidao do donatario™’, estamos perante solugdes juridicas forte- mente marcadas por uma valoragao moral. E no raro concordam os valores morais e juridicos: v,g., ndo matar, nfo difamar, nfo furtat, etc. sfio deveres igualmente morais e juridicos. Persistem, no entanto, alguns pontos de vista valorativos que sugerem uma fronteira: a moral caracteriza-se pela autovinculacao e pela importancia primordial que atribui as motivagdes das condutas; coercibilidade; e com o Direito Internacional Pitblico. Vide Ouiveiea Ascensio, ac, 84-85. (©) Vide BAPTISTA MACHADO, a.., 59-60. (! Vig, asnormas que ordenam a circulagdo automével pela direita. Vide Miguel REALE, ac, 42; € OLIVEIRA ASCENSKO, 0¢., 100-101. © ¥.g.,a norma que declara nulas as disposigdes testamentérias a favor do médico ou do enfermeiro que tratar 0 testador, se otestamento for feito durante adoencae oseu autor viera falecer dela (art. 2194.*). Tas disposigées podem ter sido motivadas pelo cumprimento de deveres de gratidao. (9) Vide arts. 953. e 2196. do Cédigo Civil © Vide arts. 970.*€ 974.° do Cédigo Civil. Yr ‘ondem Social 15 odireito acentua a imposicao heter6noma das suas normas os aspec- tos externos ou sociais da conduta humana constituem o seu ponto de partida. Mas convém assinalar uma ideia: o direito ordena o que 6 necessério ao fim temporal do homem, enquanto a moral afecta o que de mais intimo h4 na pessoa. Sendo o fim, que é proprio da moral, superior ao fim que o direito realiza‘), a moral goza duma superio- ridade que lhe permite intervir na criagio, na interpretago e na aplicagéo do direito (influéncia material) e impor exigéncias formais, como ocardcter geral, a publicidade, a nao retroactividade e a clareza das normas jurfdicas™. 2.4, Ordem de trato social ‘As normas de trato social (também denominadas usos sociais, regras de etiqueta ou de boa educagao, normas convencionais, cos- tumes, etc.)(* so usos ou convencionalismos sociais destinados a tornar a convivéncia mais agradavel™. Dirigem a maioria dos nossos actos, como a forma de vestir, sau- dar e responder a uma saudagao, oferecer presentes a certas pessoas em determinadas épocas, retribuir uma visita, dar os pésames aos familiares duma pessoa falecida, etc." Tais normas revestem duas caracteristicas. Sio: 1. impessoais: t@m origem nao numa vontade concreta, mas em 1usos ou praticas sociais regularmente observadas'"; 69 Vide Lecaz v LACAMBRA, 0<., 443; Javier De Lucas e Outros, ac, 27; e Miguel ‘Teneeiea pe Sousa, ac., 49. 9 Vide Javier De Lucas e Outros, 0<., 27-28; e TetxeieA Dr SOUSA, 0<., 74-80. © Vide Norberto ALvaRez e MuSoz Dr BAENA, 0<., 87-88; GaRciA MAYNEZ, 0 25-26; e LeGAz TLACAMBRA, 0c, 448. & Diferentes, por nao disporem de cardcter normativo, sio alguns usos (tam- ‘bém denominados simples habitos) que nao se impdem:v.., passear ou comer a ‘uma hora determinada, ete. Vide Javier De Lucas e Outros, 0<., 19-20; Norberto ‘ALwanez e MUNOZ DE BAENA, 0<., 92-93; € LEGAZ Y LACAMBRA, 0, 451. (© Vide javier De Lucas e Outros, o., 19. © Geralmente, estes usos sao exigencias técitas da vida colectiva: carecem de formulagio expressa, mas nada impede que sejam escritos e até codificados, como observamos,v.., nos manuais de urbanidade. Vide Garcia Manz, a, 27. 6 ela Gera de Direito 2. coactivas: impem-se através da pressio exercida pelo grupo social a que se pertence e a sua inobservncia é punida com diversas sangdes, como a perda de prestigio e de dignidade, a marginalizagio e o afastamento do grupo, etc. Estas caracteristicas mostram que as normas de trato social tém semelhangas com as normas juridicas: séo vinculativas e gozam de sangio e de coacgio. No entanto, hé diferencas que as separam. Desde logo, o direito prevé e quantifica as sangdes que se aplicam a condutas determinadas; e ha érgdos especificamente criados pelo ordenamento jurfdico para as aplicar e impor segundo procedimentos adequados. Fala-se, a propésito, da “institucionalizagao da sancdo” que distingue o direito dos usos sociais dotados de sangSes e de meios de coaccao indeterminados, informais e inorganizados. Depois, enquanto as normas jurfdicas possuem uma estrutura bilateral ou imperativo-atributivo® as normas do trato social séo unilaterais obrigam, mas nfo facultam'?, Nao se trata, porém, de normas morais: além do carécter coactivo, as normas de trato social no exigem a rec- tidao da intengao que motiva a conduta externa, Dir-se-4, portanto, que as normas de trato social ndo so morais nem jurfdicas. So usos sociais, costumes, convencionalismos ou decoro social que exercem, por vezes, uma pressdo a que o direito (©) Esta semelhanga levou Det. Veccio a sustentar que a actividade humana 36 pode ser objecto duma regulamentagdo que umas vezes € moral e, outras, juri- dica, E RADBRUCH vé nos Us0s sociais a forma primitiva comum dentro da qual se encontram, no principio, o direito e a moral, num estado ainda embrionrio de indiferenciagao. Deste estado indiferenciado partem, em direcgSes distintas, as formas do direito e da moral. Vide giorgio Det. Veccxto, Filosofia del Derecho? (Barcelona, 1991), 321-323; RaDBRUGH, o., 137; ¢ LEGAZ ¥ LACAMBRA, 0.., 452-462, (©) Vide Javier De Lucas e Outros, (©) J4 vimos que perante uma pessoa juridicamente obrigada esté outra que tem a faculdade de Ihe exigir o cumprimento da obrigago. Vide supra, §2.3. ‘69 um dever de cortesia ceder o assento a uma Senhora que viaje de pé num autocarro, mas nao uma obrigacio jurfdica. ©) H& quem entenda que as normas de trato social também reclamam uma boa intengio. Porém, se a uma saudagio amavel nfo corresponde a verdadeira inten- ‘glo de saudar, nao se violenta a norma de cortesia: quem satida nlo é descortés, ‘mas hipScrita. Vide Gancia MAYNT2, a, 34. rf Ordem Social ” nao pode ser insensivel, transformando-os em normas juridicas'; de contrério, arrisca-se ao fracasso. Mas ao direito cabe, também, a missio de libertar o homem da tirania de certos usos, impondo novas formas de vida social que o progresso e a liberdade humana reclamam(, 2.5. Ordem juridica Depois de procurarmos caracterizar as ordens religiosa, moral e de trato social, é tempo de nos ocuparmos da ordem jurfdica. Deparamos, no entanto, com varias dificuldades. Desde logo, porque nao é facil definir direito. Como observou. Max E. Maver, “até agora nfo houve um jurista nem um filésofo do Direito que tenha acertado a formular uma definicdo unanimemen- te aceite”, sobretudo porque “é impossivel compreender e explicar satisfatoriamente as diversas formas manifestativas do direito numa nica fSrmula”®), £ certo que nao tém faltado definigdes desde as mais modernas (que o reduzem a um conjunto de normas dotadas de coercibilidade™ ou referem uma “ordenagao heterénoma, coer- civel e bilateral atributiva das relagdes de convivéncia, segundo uma integracao normativa de factos e valores”™!) As mais antigas de Dane que fala de “realis ac personalis hominis ad hominem proportio, @ Manuel Maxrin Fornoza (Curso de Iniciacin juridica® (Madrid, 1979), 217) oferece-nos um exemplo dum uso social que adquiriu uma dimensdo juridica: durante algum tempo, foi uso social dar uma gorjeta aos serventes nos restau- rantes, cafés, bares, etc. que nfo tinham salério. Se o cliente no cumprisse esse uso social, sujetar-se-ia apenas a ser mal servido no futuro ou tratado com alguma hostilidade. Mais tarde foi criada uma norma juridica que concedeu a0s serventes odireito a uma percentagem (15%) sobre o valor do consumo. Assim se converteu um uso social em norma juridica. (© Vide Lecaz ¥ LACAMBRA, 0, 465. (9 Vide Sebastio Cruz, Direito Romano, cit., 20; Herbert L. A. Han, O Conceito de Direito, trad. de A. Ribeiro Mendes (Lisboa, 1996), 18-22; MaRTIN FoRNOzA, ‘ac, 2; Femando José Bronze, Ligdes de Introdugao ao Direto® (Coimbra Editora, Coimbra, 2006), 146-233; e Paulo Ferreira da CUNHA, 0.<., 45-46. "©? Vide Gancéa Mavwez, 0.., 36. 9 Vide Miguel ReAtE, a., 67 18 ela Gera de Direito quae servata servat societatem; corrupta, corrumpit"®” e de Cicero para quem “natura iuris ab homine repetenda est natura”, De todo o modo, a ideia de direito postula uma ordem justa e, por isso, nao é possivel defini-lo sem uma referéncia & justica que lhe transmite validade™. Poder-se-4, portanto, dizer, com Sebastiio Cruz, que o direito “é tudo aquilo que tem especiais atinéncias com o iustum’”), Depois, porque falta também uma nogio de ordem juridica que se tenha imposto sem discussdo. Fala-se de “um complexo de regras, ins- tituigies e érgdios"”9; de “conjunto de normas imperativo-atributivas que numa certa época e num determinado pafs a autoridade politica considera obrigatérias””®); de “sistema de normas juridicas in acto, compreendendoas fontes de direito e todos os seus contetidos e projec- ‘gBes”; duma “nogao englobante em que se inscrevemas instituigSes, 0 érgios, as fontes do Direito, a vida juridica ou actividade juridica e as situagées juridicas”; de “um conjunto de normas, princfpios, instituigdes e institutos juridicos (direito positive) trabalhados pela especulagao cientifica (ciéncia juridica)”™); de “institucionalizagao histérica do direito”®; etc. Ressalta, no entanto, a ideia nuclear de um direito relativamente estavel num certo tempo™, constituido por ‘um conjunto de normas correlacionadas e harm6nicas entre si que se denomina direito positivo (ius in civitate positum) ou objectivo™. © “0 direito & uma proporgao real e pessoal do homem para o homem que, conservada, conserva a sociedade; corrumpida, corrompe". Vide Miguel Rrate, 2c, 60. (2p natureza do direito deve ser retirada da natureza humana”. Vide Miguel REALE, 0c, 61 () Vide BaPrista Macao, 0, 32-33; LeGaz yLACAMBRA, 0¢,, 288-289; e DIAS MARQUES, 0., 47-48. (9 Vide Sebastiao Cruz, Direito Romano, cit., 20. (©) Assima entende Barro, apud OLIVEIRA ASCENSiO, 0¢., 43. (9 Vide Gancta MaYNz, 0. 37. © Vide Miguel Reate, 0<., 190. © Vide Oxsverea AscENSiO, 0, 48-50. © Vide Canpat. DE Moncapa, Ligées de Direito Civil? (Coimbra, 1959), 55. (1 Vide Anténio Castawtie1ta Neves, Introdugdo ao Estudo do Direito (Coimbra, 1968-1968), 350. (80 Vide Castanntema Neves, o-, 350. {2 Vide Jodo Castro Mennes, Introdugao ao Estudo do Direito (Lisboa, 1984), 42. (9 Vide Garwio Texcrs, 0¢, 1, 52-55; OLIVEIRA ASCENSiO, 0<., 46-48;¢ Fernando José Bronze, ibidem, 581-606. rr onder Social 19 Aeste direito, visto na perspectiva da ordem juridica econsiderado globalmente como um sistema de normas, apontam-se algumas carac- terfsticas que urge expor criticamente: 1. Necessidade: resulta da natureza social do homem. Dotado de sentimentos e de razio, o ser humano precisa de comunicar, de produzir e consumir bens, isto é, o homem realiza-se pela con- vivéncia com os outros e pelo dominio e uso das coisas. A socie- dade, onde necessariamente convive, postula um conjunto de normas juridicas que disciplinem o seu comportamento: ubi societas, ibi ius. De contrério, a sociedade dissolver-se-a, mas, nema anarquia é sustentvel duradouramente (ohomem aspira Aordem) nem o despotismo é toleravel por muito tempo™, 2. Alteridade: o direito nao disciplina a conduta do homem isolado, mas enquanto vive em sociedade, comunicando, produzindo e consumindo bens, numa palavra, convivendo®™. 3, Imperatividade: tradicionalmente tem-se entendido que as normas juridicas, porque constituem normas éticas, so impe- rativas. A sua esséncia é um dever-ser a que devemos obedecer incondicionalmente sem a possibilidade de escolhermos livre- mente entre o seu cumprimento ea sua inobservancia. Dir-se-4 que o direito orienta as nossas condutas independentemente da nossa vontade porque s6 assim cumpriré a sua fungo ordena- dora indispensdvel & subsisténcia da sociedade®’. Tratar-se-ia de imperativos categéricos"”, porque o direito “fixa os fins e exige a sua realizagdo de uma forma to incondicional, dum modo exactamente tio “categérico” como a moral”, observa © Vide Ouivema Ascensio, ac., 56-59; Sebastido Cnvz, Dieito Romano, cit., 1 Gawwio Tetes, oc, I, 32-39; e TEIEIRA DE SOUSA, ac. 54. ©) Vide Pedro Ein6, 0¢., 25. 9 Vide Gatvio Tees, oc, I, 124-125; TencemA DE SOUSA, ac, 91;¢ Pedro Em6, 0c, 26. ” Valeré a pena distinguir os imperativos hipotético e categérico. Aquele & condicional: subordina o imperativo a um fim e s6 tem valor se procurarmos atingir esse fim. Nao passa, portanto, dum simples conselho de prudéncia ou de habilidade: v.g., se quiseres ter satide, no cometas exageros. 0 imperativo categérico é incondicional: nao esté subordinado a nenhum fim, tem valor em sie ordena absolutamente sempre e em toda a parte, quaisquer que sejam as consequéncias: x. g.,a proposi¢do “no deves matar”. ein Geral de Direlto Karl ENciscn?. No entanto, além de igualmente se poder falar de imperative hipotético no sentido de imperativo condicional (anorma jurfdica representa uma hipétese e s6 se aplica quando se verificarem os factos af descritos)*, importaré também refe- rir que hé normas que ndo ordenam ou profbem uma conduta, antes atribuem um poder ou faculdade™); e que a norma éa res~ posta a um problema juridico e a opco valorativa que traduz, porque condicionada pelos termos do problema, pelas opgées possiveis e pelo critério valorativo que lhe imprime coeréncia e significado, “nunca poderé ser um puro acto de vontade, puro imperativo”®, Por isso, hd quem observe graus de imperativi- dade e recomende que “é preciso entender a imperatividade do direito cum grano salis”: sendo expresso axiolégica dum com- plexo processo de opgdes valorativas, a sua natureza social eos individuos gozam de larga margem de acgio livre”. E afirma-se também que “a imperatividade, que aqui nos ocupa, ésomentea imperatividade propria da ordem normativa no seu conjunto” e “do cabe (a) cada regra em particular”®®) 4, Coercibilidade: é a susceptibilidade de aplicacao pela forga das sanges prescritas pelo direito™, Distingue-se da coaccao que, definindo-se comoa forga (fisica ou psicolégica) queacompanha odireito, se revela inadequada para o caracterizar: falha, quando as normas juridicas so violadas e, portanto, o direito nao teve forca para se impor"); e é desnecesséria na esmagadora maioria dos casos em que as normas juridicas se observam espontanea- mente), Pelo contrario, a coercibilidade é a possibilidade de aplicar uma determinada sangao a quem violar uma norma jurfdica e, por isso mesmo, é também uma forga espiritual que 9 Vide Karl Ewoiscu, Introdugdo ao PensamentoJuridico (Coimbra, 1977), 27 © Vide infra, §25; e ENtscH, o.., 41-42. © Videinfra, §26. 89 Vide Batista MACHADO, a, 91-92; ¢ Miguel REALE, o., 33. » Vide Miguel Reate, o<., 33 ¢ 129-136, » Vide OuiveiRa ASCENSAO, ac, 62-63. Vide Otiverra AscENsio, 0¢., 80-82; Tztxeixa DE SOUSA, 04, 105-107; € BiGOTTE CHORAO, ac, 118. (9 Vide Lecaz v LACAMBRA, 0, 386-387, (9 Vide Ourverea ASCENSAO, 0, 81-82; € BIGOTTE CHOR;O, 0, 120. all onde Social 21 cumpre uma fungio pedagégica”. Esta atitude, tfo cara 4 dou- trina positivista que vé na coercibilidade um elemento essencial do direito™, oferece grandes motivos de critica que justificam asua recusa. Sustenta-se que “o direito depende da forga na sua vigéncia (o direito tem uma existéncia no tempo e no espaco), mas nao no seu ser, na sua esséncia ou no seu contetido que & determinado em fungao da ideia de Direito"®. O principio da justiga informa-o, dé-Ihe validade, mas é necessario que vigore efectivamente; por isso, nao pertencendo a esséncia do direito, a coaccao ea coercibilidade constituem uma importante condigéo de eficdcia: contribuem paraa sua vigéncia. Daqui se extrai uma conclusio nao menos importante: se ajuridicidade duma norma nio resulta da coercibilidade, mas esta é que deriva daquela, a coercibilidade sé ser’ legitima sea norma juridica tambémo for (isto é, conforme a ideia de direito). Numa palavra, ao “Direito cabe legitimar e impor limites & forga” da qual pode depender na sua vigéncia: para existir™®), Importa também referir que a coercibilidade nem sempre est presente: nfo é necesséria nas sangdes que operam automaticamente™; no é possfvel em normas reguladoras dos poderes dos érgios supremos do Estado em relac&o aos quais se pde a eterna questo quis cus- todiam custodit?™); néo funciona em alguns direitos por falta dum aparelho capaz de impor as suas normas (y. g., o Direito Internacional Péblico)"®) ou absolutamente destituidos de coercibilidade (». g., 0 Direito Canénico)"; nem pode existir em normas juridicas desprovidas de sanco"), Todavia, embo- raa coercibilidade no pertenca a esséncia das normas juridi- cas, ha quem entenda que “pode predicar-se da ordem juridica Vide Lrexz v LACAMBRA, 0¢., 382. 0° Vide Lecaz v Lacamana, ac, 386; Miguel REALE, 0<., 47; BAPTISTA MACHADO, :» 32; BIGOTTE CHtORAO, ac, 121-122; e Gato TELLS, Introdusdo ao Estudo do Direito, 1° (Coimbra, 2000), 125-129, © ‘Transcrevemos BaPrista MACHADO, 0¢., 31-39. {091 Vide Barrista MACHADO, 0c, 41-42; e Paulo Ferreira da CUNHA, 0¢., 27-28. 9 Sucede, v.g., coma ineficécia. Vide infra, § 37.2. (91 Vide Ouiveiea Ascensio, 0<., 87-88. (9) Vide BrcorTe CHORAO, 0.121; € OLIVEIRA ASCENSAO, 0¢., 84-85. (| Vide supra, §2.3". 9 Vide supra, §2.3%, 2 ia eral de Direito globalmente considerada’’ e justifique com a funga0, que a0 Poder pertence, de “necessariamente garantir a ordem juridica da sociedade, defendendo-a de elementos anti-sociais"!"”. Exterioridade: as normas jurfdicas disciplinam comportamen- tos que se manifestam exteriormente. £ certo, o direito também penetra no recinto da consciéncia para determinar os motivos que explicam as condutas sociais™. Todavia, o ponto de par- tida so os actos exteriores: mera intengao, sem manifestaco externa, no provoca direito™, 6. Estatalidade: esta pretensa caracteristica do direito esté na base duma questo que opde o monismo juridico estatalista ao plu- ralismo juridico. Aquele, sobretudo representado por KELSEN que considera o direito e o Estado dois aspectos distintos, mas inseparaveis, da mesma realidade (0 Estado é 0 direito como actividade normativa; o direito é 0 Estado como situagio fixada pelas suas normas)"""), reduz a criago e a aplicacao das normas juridicas ao Estado. O pluralismo jurfdico sustenta, pelo con- trario, que nem todo o direito é criado e aplicado pelos Srgaos estatais™), Importa saber, portanto, se todo o direito é estatal. ‘Nao ha diividas de que a produgo normativa dimana sobretudo dos érgaos do Estado (Parlamento e governo) que desempenham a fungao legislativa; e tio-pouco se contesta que a aplicacao das normas juridicas aos casos concretos é feita principalmente pelo poder executivo e, nas situagdes litigiosas, pelos tribunais do Estado. Porém, o Estado no tem 0 monopélio da criagio do direito nema exclusividade da sua aplicagao. Hé, efectivamente, normas juridicas de outras proveniéncias: destacamos o Direito Internacional Piblico, cujas normas tém vigéncia efectiva na sociedade internacional; os direitos das comunidades p mitivas, que no tinham uma autoridade central nem tribunais (6 Vide Bicorre CuoRKo, ac, 12 (© Vide Oliveira Ascenso, oc., 85-88 008 Vide supra, §2.3. (0 Vide Pedro E1n6, 0, 26-23. {0 Vide Hans KeLsen, Teoria Pura do Direito, 1° (Coimbra, 1962), 163-182; Rapaructt, ac, 126-127; infra, § 19. (0) Vide BiGorre CHoRio, 0. 211-212. (Vide BAPTISTA MACHADO, ax., 51-52; infra, § 44.2 | al ‘ordem Social a 23 permanentes™; 0 direito consuetudindrio; os direitos editados pelas autarquias e regides auténomas e pelas diversas insti- tuigdes religiosas, culturais, profissionais, desportivas, etc. E, paralelamente, so v4rios os tribunais internacionais e inter- nos que nfo pertencem ao Estado, mas aplicam igualmente as, normas juridicas em matérias de que tm competéncia. Tanto nos basta para recusar que a estatalidade seja uma dimensdo essencial do direito™). Em conclusio, poder-se-4 caracterizar 0 direito positivo, parte nuclear da ordem juridica, como um conjunto de normas necessérias a convivéncia humana que se inspiram e fundamentam na ideia de justiga e tém na coercibilidade uma importante condigio de eficécia. 89) Vide BaPristA MACHADO, 0¢, 52-53; € GALVAO TELLES, 0¢, 1, 56-57". 04 Vide Miguel ReaLe, o«.,7;e Gauwio Tees, ibidem, 57-58 8 Vide também Paulo Ferreira da CUNHA,a¢., 28-30. a _____ eta era de irito Especificamente em relagdo & seguranca, o Prof. de Coimbra ensina que “uma ‘ordem’ s6 poderé dizer-se ‘juridica’ se nela puder ver-se realizada a Ideia de Direito” e esta “nao sera realizada mediante, por ex., uma seguranca resultante da estabilizagao de um poder arbitré- rio, alheio ou negador de qualquer intengdo ética, e imposto apenas pelo terror”. A seguranga “terd de ser justa ou a expresso de uma ordem de direito, pois nao é em fungo da seguranga que se afere 0 direito e sim em fungi do direito o valor da seguranga’®™, ‘Também aqui, nao hé, portanto, uma contradigao entre ajusticaea seguranca: esta “deve estar ao servico da justiga e legitimar-se perante ela’, concluimos com Baprista Macuapo"™", CAPITULO IV NAGAO, ESTADO E DIREITO §17. Nagao Tem-se definido Nag&o como “uma comunidade (que) assenta numa convivéncia mais ou menos longa de homens ligados pela mes- ma etnia, pela mesma lingua e pelas tradicdes sedimentadas naquela convivéncia’9, Trata-se duma realidade com uma dimensdo simul- taneamente natural e cultural: aquela corresponde a exigéncias naturais da vida humana, disponibilizando um conjunto de bens econémicos ¢ fisiolégicos; esta constitui a cristalizagao de valores intelectuais e morais que um povo encarna e aspira realizar™). ‘A Nagio permite que os homens se ajudem mutuamente ao longo do tempo, fornecendo-thes valores que acrescentam e transmitem de (96 Vide CastaNHiea Neves, Ligdes,cit., 212-218 (097 Vide Baprista MACHADO, a, 56. (8) Vide Soanes Martinez, 0¢.,76-77.0 Autor entende, todavia, que araridade de agregados humanos com unidade récica e lingufstica permite duvidar deste conceito de Nacio e chama a atengio para a existéncia de nagSes onde o aspecto religioso tem particular importancia, destacando 0 povo judaico que, “disperso pela difspora, conservou o seu culto, a sua etnia e a sua lingua’, sobrevivendo, até hé pouco tempo (até & criagao do Estado judaico) “como unidade desligada de qualquer poder politica’. (0 Vide Lecaz ¥ LACAMBRA, 0<.,772-775; € Marcello CAETANO, 0<., 123. xd aca 8 geracoem geracaie, por isso, constituem umaheranca que enriquece serve de apoio firme e orienta a vida fisica e moralmente. Ao mesmo tempo, a Nag&o imprime um cardcter particular que individualiza e distingue os seus membros com especificos modos de ver, de pensar e de actuar. Transmite-lhes uma certa civilizagio a que é inerente um determinado grau de desenvolvimento. Por isso, podemos ver numa comunidade nacional algumas notas queapermitem caracterizar: 1. € uma forma de vida, que pertence & esséncia ontolégica do homem. Assim, dir-se-& que todo o homem possui uma “dimen- so nacional” que é um dos factores decisivos na formacao da sua personalidade; 2, é uma comunidade total cimentada pelos seus valores e pode compreender pequenas comunidades de cardcter econémico, cultural, idiomstico, et 0s valores af realizados e cristalizados constituem a sua cultura que se manifesta na literatura, na arte, na religido, na misica, za moral, no direito, etc. Hé sempre uma especificidade que, no entanto, néo deve prejudicar as suas dimensdes universais; 4. os vinculos nacionais nfo se fundamentam num “contrato social”, estendem-se do passado ao presente e prolongam-se no futuro: hé uma continuidade, uma tradigao. 3, ‘Trata-se, em suma, duma “unidade de destino” na histéria que constitui a patria para os seus nacionais. Nao é, porém, um valor supremo: os valores nacionais nunca devem prejudicar o valor uni- versal mais elevado que se chama Humanidade. Por isso, condena-se ‘onacionalismo que, desconsiderando-a, torna-se imoral; e o indivi- dualismo, em que o individuo isolado cai. A Nagao tem uma conexo muito estreita com o Estado, embora a sua natureza de comunidade inorganizada logo nos diga que h4 nagies nio organizadas em Estados) e Estados cujos limites ndo coincidem com os duma Nagao, Servem de paradigma a Nagfo judaica ea Nacio palestiniana enquanto nfo se etiou o Estado judaico e nfo for criado o Estado palestiniano. 0 V.g, os grandes Estados (como a América do Norte e a Rissia) comportam nagdes diversas. E 0 mesmo se diré da Espanha onde os esforcos para criar uma unidade nacional ainda no extinguiram os ansefos autonomistas dos velhos n _____ Mea Geral de Diveto Impée-se, portanto, o estudo do Estado. §18. Estado 18.1, Nocio, origem e estrutura 0 vocabulo Estado, que provém de status, ndo tem um sentido un{voco, antes apresenta uma polivaléncia de significagao riquis- sima, como condigao, conjunto de direitos e deveres, estrato social, dignidade, propriedade, boa ordenacao, etc.“*), Mais restritamente tem-se usado para referir quer uma comunidade territorial poli- ticamente independente integrada por governantes e governados (Estado-comunidade ou Estado-sociedade) quer o poder do governo dessa comunidade (Estado-poder ou Estado-governo), Referir- -nos-emos a primeira acep¢ao e, por isso, na esteira do entendimento tradicional podemos definir o Estado como uma sociedade que se fixou num determinado territério e se organizou politicamente em termos auténomos e soberanos™), Assim entendido, o Estado é relativamente recente: a prépria ter- minologia s6 comegow a ser utilizada no Renascimento; ¢ a formacao e generalizacao do conceito moderno sao fruto duma longa evolucao que arranca no século XVI e sé ficou concluida no século XVII com o jusnaturalismo racionalista™"), Nem sempre, portanto, a sociedade reinos de Aragio e de Navarra nem dos Vascos ¢ dos Catalies. Fenémeno con- trrio se operou com a unificagio da Itlia: a Nagfo italiana, entio dispersa por vvirios Estados, imps a sua unidade politica. Vide Soares MARTINEZ, 0, 77-1 Marcello CaetANo, 0.123. ©) Vide Martim de ArsuquERque, Politica, Moral e Direito na Construgéo do Conceito de Estado em Portugal, em Estudos de Cultura Portuguesa, I (Lisboa, 1983), 132. 889 Vide Bicorre CHORKO, a., 211; e Pedro Ein6, 0, 137-138, 4) Vide CasTRO MENDES, ac, 31; e Marcello CaETANO, ac, 121-122. © Atribui-se a Maquiavel a invengio da palavra Estado no moderno sentido. ‘Trata-se, no entanto, duma questéo em aberto, mas “nfo parece restar di da (de) que o termo adquiriu perfil actual na sua obra’ e “de qualquer forma, Maquiavel (..) contribuiu nao pouco para difundir e popularizar a significagio ‘moderna da palavra Estado’, escreve Martim de ALsuquERqve, Politica Moral., cit,, 168, Vide também as pags. 169, 205-207 e 211. oxen a civil adoptou 0 Estado como forma de organizagao: bastard recorrer 4 Histéria que nos mostra a sociedade grega organizada na polis; e 0 ‘mundo romano, na civitas, na res publica, no Principado e no Império, precedidas da familia, da tribo e da gens. ‘Ainda na Idade Média, a ideia de Estado esta ausente, substituida por outros conceitos politicos basicos como princeps, dominus, domi- nium, regimen, gubernator, etc. que, sob angulos diversos, designam 9 poder, No entanto, nfo deixaram de esbosar-se linhas de forca que favoreceram a ideia de Estado” que, a partir do Renascimento, 9s tempos modernos iriam paulatinamente aperfeicoar®) até se considerar definitivamente consolidada no racionalismo triunfante do século XVIII™*). Na definic&o de Estado observamos trés elementos essenciais que ateoria tradicional pée em destaque: 1, opovo: 6 0 conjunto de cidadaos ou nacionais, ou seja, de pessoas ligadas ao Estado pelo vinculo juridico de nacionalidade que lhes (46 Vide Martim de Atsuquengur, ibidem, 134-135. O Autor refere (139-144) vvirios factores que ndo favoreceram a emergéncia do conceito de Estado: 0 Direito Romano, o Direito germfnico, a Igreja, a ideia do imperador senhor do ‘mundo, a concepcao patrimonial do reino, a supremacia do costume como fonte de direito ea origem divina do poder. 0) Vide Martim de Ausuquenaur (ibidem, 144-161), que refere alguns conceitos da ordem jurfdica romana (v.g.,civitas, populus, res publica), que designavam formas de organizagio juridico-politica; a palavra coroa, que refere a entidade juridica “representada pela sucessio dos reis” 0 termo reino, que rotula a unio juridica do governante e da comunidade; o esbatimento das relagdes pessoais, tipicas do feudalismo a favor das relacBes piblicas préprias das situagdes esta- ‘ais; o movimento laico, que disputa a Igreja as suas atribuigSes na ordem social; a divisioregnorum com a afirmacio dos prineSpios rex est imperator in regnio suo e princeps superiorem non recognoscens, que suportam a soberania (suprema potes- tas); a concepcio publicistica de que 0 governante nio e proprietério do reino, mas o representante da res publica; e a redescoberta da obra de Ariststeles, que ‘marca o inicio do processo de autonomizagao da politica (9 Vide Martim de ALsuquERauE, ibidem, 163. 1 Segundo Lecaz v LacamBrA (0.., 776-777), aracionalizagao moderna actuou em trés vias: na militar, com a passagem dos exércitos intermitentes e particu- lares para um exército permanente; na econémica, com a criagao duma fazenda prépria do Estado, dum sistema fiscal regular e duma burocracia hierarquizada; na jurfdica, com a afirmagio do Estado como uma unidade de decisio juridica com vigéncia no territ6rio em que actua. a Ideia Geral de Dirito reconhece 0 goz0 de direitos politicos. Trata-se dum conceito juridico-politico que nao se confunde com o de populagao que ‘tem natureza econémico-demogréfico™’; e tio-pouco se iden- tifica com o conceito de Nagao que tem natureza cultural; 2. 0 territério: é 0 espaco onde o povo é “senhor de se reger segundo as suas leis, executadas por autoridade prépria com exclusio da intervengao de outros povos”*". Constitui uma exigéncia iniludivel do Estado, cuja etimologia contém a ideia de estabilidade que o territério proporciona™. Integra o solo e o subsolo (territério terrestre), 0 espago aéreo (territério agreo) e o mar territorial, no caso de o Estado ter costa mariti- ma (territério maritimo). 0 territério do Estado é limitado por fronteiras e define o ambito da competéncia no espaco dos seus 6rgos supremos*™ 3. o poder politico: é “a faculdade exercida por um povo de, por autoridade propria (nfo recebida de outro povo), instituir ‘Srgos que exergam o senhorio de um territério e nele criem e imponham normas jurfdicas, dispondo dos necessérios meios de coacgdo”°*, No se confunde com a soberania que 6 0 poder politico supremo (s6 limitado pelo Direito na ordem interna) 682) A populagdo abrange as pessoas que residem num territério, quer se trate de nacionais ou de estrangeiros. Vide Marcello Carano, a.c, 123-124; Lecaz ¥ LACAMBRA, 0., 779-780; Marcelo REBELO DE SousA / Sofla Gatwao, Introdugdioao Estudo do Direito® (Lisboa, 1994), 24; e Pedro Ein6, ox, 134-135, Falam node povo, mas de populago: Hans Kestn, Teoria Pura do Direito IP, trad. de J. Baptista Machado (Coimbra, 1962), 177-178; Garcfa MavNez, 0. 96-98; e Reinhold ZrepeLius, Teoria Geral do Estado, trad. de Ant6nio CaBRAL DE MONcADA (Lisboa, 1974), 45-54. 80 Vide supra, §17. 6) Transcrevemos Marcello Cartano, o.., 126. Vide também Vital Moneina, ‘Sebenta de direitoconstitucional,ct., 214-215. 55 Por isso, um povo némada no tem Estado, Também a Igreja Cat6lica nao constitu’ um Estado, embora tena algumas caracteristicas estatais: um ordena- ‘mento jurfdico, uma autoridade e um poder de jurisdicao. 0% Vide Reinhold ZippELtus, ac, 41-43; Marcello CAETANO, 2, 125-129; Marcelo ReBeto De Sousa / Sofia GaLvK0, ax, 24-25; Pedro E1n6, ac., 135; KELSEN, 06, 178-180; Lecaz v LACAMBRA, 0,779; € GARCIA MAYNEZ, 01, 94-96. 6:9 Transcrevemos Marcello CAETANO, 2,130. 686) Nao é sustentavel que a soberania seja um poder ilimitado ou ilimitavel porque, se fosse omnipotente, poderia suprimir a ordem juridica e destruir-se ondem jul 8 ¢ independente (na ordem internacional encontra-se numa situagio de igualdade com os poderes supremos dos outros povos). Ao Estado é necessdrio um poder politico, mas j4 nfo a soberania: hé Estados condicionados por um poder diferente e superior, como os Estados federados (v.9., os Estados Unidos da América) que, embora elaborem as suas préprias Constituigdes e criem e apliquem o seu direito no ambito do seu territério, no so soberanos: tém de respeitar a Constituicao federal; as suas leis podem ser anuladas pelos tribunais federais se con- trariarem esta Constituigao; e ndo podem estabelecer relagdes internacionais préprias®™”, 18.2. Fungées Para prosseguir os objectivos que constitucionalmente lhe esto atribuidos, o Estado tem de realizar permanentemente varias acti- vidades que se chamam fungSes°™). Umas sio primérias; outras, secundérias. ‘Sao fungées primérias (principais ou independentes) as que os érgios do poder politico do Estado podem realizar “de uma forma essencialmente livre ou minimamente vinculada’’®), Pertencem a estas fungdes: ‘impoe a sua limitagdo pelo Direito. Jem Boot, que (no século XV1) considerou a soberania elemento essencial do Estado, a soberania nfo é um poder ilimitado, ‘mas sujeita ao Direito Divino, ao Direito Natural eas obrigagdes contraidas pelo seu detentor (0 soberano) especialmente para com outros soberanos. E também ‘Suanzz reafirma a limitagdo imposta pela comunidade internacional e pelo seu Direito, Vide Reinhold ZtePettvs, oc., 57-58; J. Siva CUNHA, Direito Internacional Pablico, Introdugdo ¢ Fontes* (Coimbra, 1991), 81-32; e Garcia MA¥NEz, o.¢, 99. Contra, vide Marcello CaztaNo (a.., 132) que refere a soberania como um poder “que no estdlimitado por nenhum outro na ordem interna’. Sobre alimitacio da soberania vide ainda Lecaz ¥ LacaMBRA, 0<., 779-780; ¢ infra, § 44.2.1", 8 Vide Marcello CazTANO, 0.c, 130-139; e Marcelo REBELO Dz SOUSA / Sofia Gnwio, ax., 35, Diferente é Confederagio de Estados, como a Suica: os Estados conservam a sua soberania em tudo o que nio for abrangido pelo tratado que nstituiu a Confederacio. Vide Pedro Eim6, 0,137. ts Sobre osdiversossignificados de fungdo, vide Marcello CAEZANO,0<., 148-149; Vital Morezna, ibidem, 221-225. © Transcrevemos Marcelo REBELO DE Sousa / Sofia GALVAO, 0.¢.. 30-31. 4 eia Geral de Dirty 1. a fungio politica: consiste “na definicao e prossecucao, pelos 6rgios do poder politico, dos interesses essenciais da colectivid: de, realizando, em cada momento, as opges para o efeito consi deradas mais adequadas”™ Orienta-a0 interesse geral e carac- teriza-aalliberdade de opcao entre varias solucdes possiveis®™, Constitui uma manifestagéo importantissima desta fungdo a elaboragao e promulgagio da Constituigao (pelo poder consti- tuinte) ea sua revisio (pelo poder de revisio constitucional) =), 2. a fungao legislativa: traduz-se na pratica de actos legislativos pelos érgaos constitucionalmente competentes na forma pre- vista na Constituicdo, £ através dela que o Estado cria a maior parte do seu direito positivo constituida por leis “, As funces secundarias (subordinadas ou dependentes) decorrem das fungdes primérias. Sao: 1. a fungao jurisdicional: consiste no julgamento de litigios susci- tados por conflitos entre interesses privados ou piblicos e pri- vados; e na punicao da violacio das normas juridicas. E desem- penhada por érgios independentes e imparciais (os tribunais), cujos titulares (0s juizes) sofrem de certas incompatibilidades; gozam duma instituigfo propria (o Conselho Superior da ‘Magistratura, no caso dos jufzes dos tribunais judiciais, ou 0 Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais) que os nomeia, coloca, transfere, promove e sanciona discipli- narmente; so inamoviveis e ndo podem ser responsabilizados pelos seus julgamentos e decisées, salvo nos casos especialmen. te previstos na lei, ®| Voltamos a transcrever Marcelo Reneto pr Sousa / Sofia Gatvio, 0, 30, 0) Vide Marcello Caz=Ano, 0c, 172, 8) Outras fungdes politicas sto a actividade desenvolvida nas negociagées intemacionais, a orientago governativa em debates parlamentares, ete. Vide Marcello GAETANO, oc, 171, 8) Vide Marcello Castano, 0.c, 158-160 e 166; Marcelo Resto DE Sousa / 1 Sofia Gatvho, ac, 30 © 39-46; e Pedro EiR6, oc., 143-144. Sobre alei (formal e material), vide infra, § 37.1.1. ' Cf.arts.203,,216.,217.e218.°da Constituiglo da Republica arts. 5°,62,7, 13.€136.ess. do Estatuto dos Magistrados judiciais,aprovado pela Lein.*21/85, de 30 de Julho (com sucessivas alteragées, a itima das quais operada pela Lei n.° 37/2009, de 20 de Julho), arts. 2.°, 3.° e 74.° e ss. do Estatuto dos Tribunais s den usin 2, a fungio administrativa: “consiste na satisfago das necessi- * dades colectivas que, por virtude de prévia opgio politica ou legislativa, se entende que incumbe ao Estado prosseguir”™®) £ uma “tarefa cometida a érgaos interdependentes, dotados de iniciativa e de parcialidade na realizac&o do interesse piblico e com titulares amoviveis e responsaveis pelos seus actos”, §19. Estado eDireito 19.1, A relagio Estado-Direito Na definigo de Estado como uma forma de organizagao da socieda- de resalta imediatamente a sua indole juridica que levou KeiseN a0 exagero de o considerar “uma ordem juridica relativamente centrali- zada’®? A sua propria histéria traduz a luta contra a arbitrariedade pela jurisdigo da sua actividade"™. Foi assim no Estado liberal, gue procurou destruir os privilégios da aristocracia e do clero; consa- grou o principio da igualdade dos cidadaos perante a lei; e tutelou os dineitos civis e politicos. A injustica material, que a igualdade formal ccultava, determinou a evolucao para o Estado Social de Direito que se preocupa com a justiga distributiva e com o bem-estar social e cultu- ral" E, de permeio, assistimos a formas totalitérias de organizaclo que interpretaram diferentemente os objectivos econdmicos e sociais dajustiga edo bem-estar™, Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.° 13/2002, de 19 de Fevereiro — rectificada pela Declaragio de Rectificagio n° 14/2002, publicada no Diario da Repilblica,ISérie-A, n.° 67-A, de 20 de Marco (com sucessivas alteragées, a iltima das quais resultou do Decreto-Lein.*166/2009, de de Julho) —, earts.1*,n.°1, €14° do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Publicas, aprovado pela Lei n.° 67/2007, de 31 de Dezembro (com a redacgdo que the foi dada pela Lei n. 31/2008, de 17 de Julho). 1 Transcreverios Marcelo REBELO DE SoUusA / Sofia GatvAo, a. 31. Vide tam- bém Marcello CartANo, 0.., 168-169; e Pedro Ein6, ac, 146-148. 4 Voltamos a transcrever Marcelo REBELO DE SOUSA / Sofia GALVAO, 0¢, 31. 9 Vide Ke1seN, ac. 175-176. (8 Vide Lecaz ¥ LACAMBRA,ac., 639-640. 01 Vide Marcello CartANo, a. 143-148; Marcelo REBEL DE Sousa / Sofia Gawwio, o<., 26-29; e supra, §14.3. 0) cr svn Bevan enntaltore. he en omen Pebeden Pont = sia Geral de Dirty ‘Sempre, embora com um sentido diverso, a ustiga esteve presente, co que, alids, nao supreende: sea qualquer Estado se exige que assegure a paz, esta sé é possivel se for justa (pax opus iustitiae est). Interessa, no entanto, conhecer algumas doutrinas que assinalam pontos de vista diferentes acerca da relagdo entre o Estado e o Direito. Destacamos: 1. a doutrina normativista: o Estado 6, segundo KELSEN, uma ordem juridica relativamente centralizada, limitada no seu domfnio espacial e temporal de vigéncia, soberana ou imediata- mente subordinada ao Direito internacional, globalmente e em rregra eficaz, 0 Estado é, portanto, a personificago da prépria ordem juridica, o somatério das suas préprias leis, e, por isso, identifica-se com o Direito; se ha distingdo, traduz, tio-s6, a acentuagio de aspectos distintos da mesma realidade: o Estado 60 Direito como actividade normativa; o Direito é o Estado como situag%o fixada pelas suas normas. Em consequéncia, o Estado agiria sempre dentro do direito, pelo que nao tem sentido o problema da limitagao do Estado pelo direito'™. Observa-se, no entanto, que o Estado surge, também, como verdadeiro sujeito de direitos (piblicos e privados) e de orbi- gagbes); um ordenamento normativo abstracto nfo constitui uma comunidade juridica’"; 0 Direito é anterior e superior a0 Estado”); etc.; 2. adoutrina marxista: véarealidade econémico-social constituida por uma estrutura (a relac&o de producio capitalista) e por uma supra-estrutura formada pelo Estado, direito, religiao, moral, etc. que funcionam como valores de defesa. Como o direito, 0 Estado ndo passa dum instrumento nas mos da classe domi- nante para sujeigio das outras. E quando a classe capitalista for exterminada, deixaré de haver oposigo de classes e o Estado tornar-se-4 desnecessdrio: desaparece. O mesmo destino terao 0 direito e a religiao (0 dpio do povo) porque, no mundo de feli- cidade, no hé opressio nem conflitos. Porém, observa-se que, segundo as leis da dialéctica que explicam as transformagoes i) Vide Kexsen, o.,, 174-182, (9 Vide RasRUcH, o-, II, 127; e Marcello CAETANO, oc, 284-285. (0) Vide Raparucs, oc, I, 131. 1%) Vide Reinhold Zrppet3us, o¢., 29-31. 5) Vide Marcello CAETANO, 0.¢., 288-289, n (ordem Juridica _ = da sociedade (tese — antitese — sintese — tese...), ndo hd lugar para uma situagio definitiva sem contradigdes: a sociedade de felicidade teré a precaridade das outras™;¢ essa sociedade idi- lica repleta de perfeicao social e de bem-estar é uma sociedade estagnada sem a esperanca de melhores dias, sem ideologia, porque nada mais hé a desejar: consummatum est!®”), A rea- lidade encarregou-se de desfazer esta utopia nos paises que procuraram pér em prdtica o marxismo: a sociedade tornou-se, af, das mais imperfeitas e humanamente insuportaveis. Estado de Kersen e o Estado marxista nao reflectema realidade. Por um lado, o Direito nao se confunde com o Estado: cabe-Ihe limi- té-lo e legitimé-lo, fungdes que seria impossivel desempenhar se se confundissem. Por outro lado, a justiga nao tolera o desrespeito pela dignidade humana e, portanto, a instrumentalizagio do Direito e do Estado a0 servigo da opresso. Ao direito cumpre realizar a justiga™; mas também o Estado, a quem incumbe instituir e garantir a ordem juridica’™ Ihe deve obediéncia™, ‘Numa palavra, o Estado s6 pode ser de Direito, 19.2. O Estado de Direito 0 Estado de Direito tem na jurisdicidade a sua esséncia: ubicivitas, ibiius"Y, 0 Direito fundamenta-o e define as suas competéncias"™) Na sua histéria podemos destacar trés etapas que traduzem a luta contra a arbitrariedade e pela jurisdigio da sua actividade™: 14 a luta contra o arbitrio judicial. O liberalismo foi buscar 8 Idade Média argumentos contra o arbitrio que os juizes © Vide Zipretivs, o¢.,107-108. 0 Vide CaBeat-pe MoNcaDa, Filosofia do Direito edo Estado, ct, I, 185-186. (1 Vide supra, §14 (1 Vide Lecaz v LACAMBRA, 0<.,780. (9 VideKlaus Anonter; Introduccién ala Teoria del Derecho, trad. de E. Bacigalupo (Madrid, 1984), 182-183; e Baprista MacHADo, 0.., 53-54. 89 Vide Bioorre CHoRKo, ac., 212 21. 8 Vide Reinhold Z1pr.tus, o.c; SoaRES MARTINEZ, 0, 356; € TEIXEIRA DE Sousa, ., 86-88. 9) Seguimos Leaz v LACAMBRA, a¢., 639-655.

You might also like