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evita 2000 19, Hragovo Matos #execusiio, o devedor/executado somente teria de apresentar a sua deexa no prazo dle dez dias contados da intimagio da penhora, ato de constrigdo cuja realizago si demorar — ressalvada a possibilidade de oferecimento da exceglio de nilo-exe- Ctividade. A execugao, enquanto nao realizada a penhora, ficava parada, Agora, uma ver citado, e, portanto, tendo tomado conhecimento do contetido da demanda executiva, o demandado/exccutado tem 0 Onus de apresentar a sua defesa logo no inicio do processo (quinze dias), antecipando uma discussio surgiria com a oposigao dos embargos tempos depois, como acontecia no regime antigo. Enquanto isso, exatamente porque sem a penhora os embargos no tém efeito suspensivo, a execugiia prossegue; ao mesmo tempo, praticam-se atos processuais {4Ue, por niio serem incompativeis, tudo recomenda possam ser praticados simul- taneamente, em homenagem a economia e a celeridade processuais: 0 executado apresenta a sua defesa ¢ o exeqiente continua a sua busca por bens penhordveis O sistema criado, é preciso reconhecer, é muito inteligente. Sobrevindo a penhora, sera possivel aditar os embargos a execusdo ja opostos para discutir 0 ato juridico penhora ou outros fatos supervenientes. Para o caso de esses embargos jé terem sido julgados, sera possfvel discutir a penhora no bojo do Procedimento executivo, instaurando-se um incidente cognitivo atipico. Partindo da premissa de que a alteragio é boa para 0 exeqlente, formulo a Seguinte pergunta: € possivel o oferecimento da impugnacdo sem a prévia pe- nhora? © CPC permanece exigindo a prévia garantia do juizo para o oferecimento dda impugnagio. 44 tive noticia de um caso em que a impugnagao foi oferecida sem prévia penhora, o-magistrado a processou e a rejeitou, somente depois tendo sabrevindo 0 ato constritivo, Houve algum prejuizo a defesa ou ao exegitente? Parece-me que nao. Ao contrario: atos jé foram praticados, reduzindo a complexi- dade do procedimento executivo, que prosseguiré apenas com a possibilidade de © executado discutira penhora superveniente, nie podendo mais discutira divida executada ou afegar outras matérias que, se no deduzidas no priticiro momento, ficam sujeitas & preclusio, Imagino-me na condigto de advogado do exeqiiente: em que aspecto seria favorivel ao meu cliente o nao recebimento de uma impugnagio, oferecida sem prévia penhora, se, realizada posteriormente a constrigo, essa mesma defesa poderia ser novamente apresentada? S6 atrasaria 0 processi Assim, entendo possivel, ¢ recomendavel, o oferecimento da impugnagao sem a necessidade de prévia penhora, que permanece, porém, importante para a concessio de efeito suspensivo a defesa do executado. — CONTRATO: DO CLASSICO AO CONTEMPORANEO. ~ A Reconstrucao po Concerto Roxana Cardoso Brasileiro Borges Profexsora Adjunta de Direito Civil da Faculdade de Dire {da UFBA e da UNEB, professor na U ‘Doutora em Die to das Retagdes Sociais pela PUCISP, Mestre em Insituigds Juridico-Politias pela UPSC. Wesunor Neste tabatho raliza-se uma anise omparid entre o conceit elissieo de conirato {4 o.6oncelto contemporinee de cobra, com © ‘hjetivede fazer uma erica squeleecontribuit [las construgdo deste. Para isso, considera-se ‘lsico 0 modelo liberal de contrat consol Ado no Csdigo Civil francés de 1804, a cod Mhenyo napoletnica pés-revotugto francesa, € ‘enomporineo 0 conceito de contato que surge th ideal do Estado do Bem-Estar Social e da (ondem civilconstitucional-social-ccondmica ‘Wuminad petos objetivos fundamentals expres- 04 no art. 3° da Consttugao Federal de 1988. ‘Patavnascaaves contrat; funglo social; auto- noi priv; boast Ausranct: In this work the classic concept Cf contract is confronted 10 the eantemporary concept. The objective isto make a eritieal review on the fist and contribute on the cone suction of the later. The classic and liberal contract mode is consolidated by the Freneh Civil Code (1804), the Napoleonic codification, ‘The contemporary concept of contact i pat ‘of the ideals fom Welfare State and from the civilian-constiutional-socal-economic order ithuninated by the basic olgjectives in Frail Federal Constitution of 1988 Keyworns: contract; social funetion; private ‘autonomy: good-faith rode 2. Conceit lssicn de ontrato,2.1. Odesinatrio «do conse thera de contrat, 22. einen de segura jriicn da urges. 23.Dcorato co acondo distress ope. 4, Osslogans shire oluiofancesae ses proto juidicsno dirs obvigzactonal. 241 [bere junldae no Diets Civil napoenca 242. Quam dicot, igjnto. 24, Ainunpbiiade dos comrton 244, Pacts mun serve 2445.0 principio da rettvidade 2.4.6 O papel do Estado, 28 7, Asie «strut. 3. Coneettocontemporines deconit,3.0 detnairi varivel Ainconcstcontemperinende centat.1-. Conseyiaca da yancdade de ‘context sijelo conratuss: hi um emir? 3.2 Aexigecia de usp ‘ona. 3.3.0 coro como vinclo de coaharago. 34. As verties ‘tani dos amigos slogans 3.41. Igual substan 34.2 Autonom iva, 15. A revise judi dos conratos: a tanbibdade da itangb- Tad, 35.1. Impevisdo. 35.2, Oneridae excssiva. 36, Du eta fang: ornament do contrat, 3.1. fglo socal do conto 0 se spect intero. 3.62 A fungo socal do centato wo seu aspect extern: 9 relive da reltividade 3.7. A a6 ubjetv: preg da confine 318.0 papel do Esta. Conchad. 5 Babiopa Meta 2000-15 — George hagose Modesto 1 INTRODUCAO No inicio do séeulo XIX, época em que se construiram as teorias tradicionais «das principais cateyorins do Direito Civil, havia uma crenga de que o Cédigo Civil as normas disciplinadoras das relagdes privadas, como um todo, nio softiam influéncia das alteragdes politicas da sociedade. Nio foi necessirio muito tempo para se percebcr a falsidade desta crenca. Ao escolhermos dois marcos histérieos, ainda que complexos, para testar essa falsidade, percebe-se nitidamente a trans. formasao do Direito Civile seus paradigmas na passagem do Estado Liberal para 0 Estado Social, Pretende. neste trabalho, realizar uma andlise comparada entre o conceito clissieo de contrato e 0 conceito contemporineo de contrato, com o objetive de fazer uma critica aquele © contribuir para a construgdo deste. Chama-se de clissico « modelo liberal de contrato consolidado no Cédigo Civil francés de 1804, « eodificagdo napolednica pés-revolugao francesa. O-conceito comtemporinco de contrato surge do ideal do Estado do Bem-Estar Sociale da ordem civil-constitucional-social-econémica iluminada pelos objetivos fundamentais expressos no art, 3° da Constituigao Federal de 1988, 2. CONCEITO CLASSICO DE CONTRATO. Inicialmente, cumpre definir como ctissico 0 modelo liberal de contrato con- Solidado na codificagdo mapolednica (1804) pos-revolugdo francesa, 2.1. O destinatirio do conceite liberal de contrato O tratamento que o legislador burgués conferiu ao contrato de entdo, que foi reproduzido no Codigo Civil brasileiro de 1916, era marcado por fortes tragos individualistas. Ao elaborar 0 Cédiga de Napoledo, 0 conhecido Cédigo Civil francés, 0 legislador projetou, mentalmente, um destinatéio ideal para aquelas normas obrigacionais: um individuo isolado: do restante da coletividade e abs- tratamente considerido, sem ligagdo com 0 contexto social, formalmente igual 20 outro contratante e livre para contratar e para estabelecer, com base em sta ‘vontade, 0 contetido do contrato, 2.2.4 exigémcia de seguranca juridica da burguesia O modelo contratual liberal era um modeto que se justificava historicamente «ve jd era a elite econdmica, passou, com a revolugtio francesa, & ‘lite politica, Para yarantr sua permanéneia nesta nova condigto, para ‘Wseyuranga juridica desta nova ordem, ¢, ao mesmo tempo, para afastar a |Juridicw absolutista, era necessirin um Codigo ~ uma tei completa, perfeita msolidasse este novo quadro sdcio-ccondmico-juridien, Este foi iyo Civil francés de 1804, o Cédigo de Napoledo. 1 eontrato como acordo de interesses opostos: odelo clissico de contrato tinh, em seu conceito, uma idéia de oposigllo Dirt pois 0 contrato era definido como acordo juridico enire sujeltos de interesses opostos, ou, na expressio voluntarista, 0 contrat era umn de Vorstades entre interesses opostos. As partes aluavam em antagonisina, ‘uns tradicionais categorias opostas: credor x devedor, sujeito ative x sujeito vO, As situagDes juridicas eram observadas isoladamente, sem alcangar a - 1A. Os slogans dn revolugio francesa ¢ seus produtos juridicos no direito ‘obiigacionat Dois conhecidos slogans da revolugao liberal needs as ateoria bee os da época: liberté, égalite, fraternitéc laissez faire, laissez paisxer. pene 2 sgnitcoo ets serene iaves de orden tera ™ ‘#hoca da codificago napolednica é essencial para a compreensio da estrutura e Fnglo do contrato de entdo, asim como para perceber que, atualmente, distante dus mazes hist6ricas daqueles discursos, estes no podem mais pautar a teorla {goral dos contratos sob a ordem constitucional brasileira apés 1988, 241, Liberdade e igualdade no Direito Civil napotednico No que se refere ao contrato, este é construido a partir de dois pressupostos fetirados de um dos slogans da revolugto francesa: liberté ¢ égalité. Aplicando- ‘os.0 Direito Civil napolesnico, traduzem-se em igualdade formal eliberdade de ‘contratar; foram os pressupostos sobre os quais se construiu a teoria liberal do ‘contrato € do negécio juridico, stificativa para essa nog formal de igualdade esti no processo que levou a bres seca eouaesca opti sans retes de olog Ungiaa presente no texto do Code Napoléon. Para que 4 burguesia pudesse ascender politicamente e para que tivesse amplo acesso iis riquezas em geral, era preciso éliminar os privilégios da aristocracia da época. A formula encontrada para a ” evita 2008-19 = George Fagor Modesto climinagto desse tratamento juridico diverso que era dirigido a aristocracia © que impedia a plena expansio dos poderes da burguesia era « reivindicagiio da igualdade de todos os cidadios. Uma vez que, juridicamente, formalmente, todos fossem considerados iguais, nenhuma barreira juridica haveria para o crescimento 0 fortalecimento da classe burguesa, Com isso, a codifieagio francesa consolidou o ideal de igualdade como pressuposto da teoria geral do negécio juridico, cancebido como instrumento de ‘auto-regulamentacio de interesses entre individuos formalmente iguais, Portanto, codificagao niio levou em conta uma nogdo de igualdade substancial, econdmica ou social, Esse aspecto nifo estava inserto no discurso da époea, ou era menos relevante que a afirmagiio de que todos eram iguais que, por isso, poderia haver lum mesmo Cédigo que se aplicasse a todos, da mesma mancira, sem excegao, Dessa forma, ninguém estaria excluido da incidéncia do Code Napoléon, no haveria mais privilégios a serem invocados € as normas deveriam ser aplicadas, igualmente, a todos, nfo. havendo mais a possibilidade de que a mesma pessoa invocasse ordenamentos cliversos para regulamentar setores diferentes de sua ida, conforme seu interesse mudasse, como relata Carbonnier', Por isso a igualdade nos Cédigos de inspiragio liberal & uma idéia de igualdade Juridica (nao econdmica ou social) e formal (nao substancial). 24.2. Quem diz contrato, dis justo Ao pleitear igualdade, inicialmente, a classe eeondmica burguesa pretendia Por firn aos privilégios da sociedade organizada pelo Estado Absolutista: todas as classes deveriam ser tratadas do mesmo modo, assim como os individuos, sem justficativa, no nove Estado Liberal, para tratamento diferenciado a pessoas declaradas juridicamente iguais perante a lei. No mesmo sentido, afastado 0 govemno dos principes absolutistas, as pessoas, sendo iguais, seriam, também, livres para contratar conforme determinasse sua vontade. O voluntarismo —a vontade como poder jurigeno ~ era quase pleno ¢ ra visto como garantia de justiga dos contratos. A.justiga contratual era conse~ gléncia l6gica da soma da igualdade (formal) eom a liberdade de contratar, pois Se as partes eram iguais e livres para contratar ou ndo contratar, sendo a vontade lum poder jurigeno, o que as partes contratassem seria, necessariamente, justo: “quem diz contrato diz. justo”, em expressio da época, | CARBONNIER, Jean. Dri ci Paris: Presse Universities de France, 1955p. 60, Ey onana Canto Waste AAA A dntangibilidade dos contratos ~Ouitra devorréncia, para a teorin geral dos eontratos, da adogllo destes presst- igualdade formal ¢ liberdade de contratar ~ eram os prineipios di intar= dade © da obrigatoriedade do contrato, O contrato era considerado intangivel j worado pelo acordo de vontades entre as partes, apenas por nove acordo ‘We\iuonteiido poderia ser alterado, nlo cabendo alterago unilateral, ainda. que por ‘Via judicial, salvo por caso fortuito ou forga maior, excepcionalmente. A intungibilidade ou inalterabilidade do contrato é uma exigéncia para & tia da seguranga juridica, objetivo carissimo a nova ordem burguesa poi-re> ‘Yolugilo. Para a nova classe politica, jé classe econdmica estabelecida, era preciso Watantir estabitidade as relagdes juridicas, tendo em que visa serem os burgueses 08 musiores atores nas relagdes contratuais, detentores da riqueza e do interesse Pil circulagio segura de bens e servigos. 444 Pacta sunt servanda Prdximo ao principio da imtangibitidade encontra-se o principio da obrigato- ‘edade ou da forca obrigat6ria dos contratos ou o conhecido pacta sunt servanda, Por este principio, o acordo de vontades tinha forga vinculante juridica entre us faries ¢ deste vinculo, em regra, 6 era possivel liberar-se pelo pagamento ou {elo distrato. © contrato tinha que ser cumprido, come se fosse lei entre as partes 4, dlante de inadimplemento, o credor poderia exigir do Estado intervengdo para jisrantir 6 cumprimento do que foi contratado. IAS. 0 principio da relatividade ‘Ao lado do pressuposto da igualdade formal e dos principios da liberdade ‘vontratual ¢ da autonomia da vontade, € importante, para este trabalho, a anilise, tinda, de outro prinefpio central do direito obrigacional ctissico: o principio da tlatividade. Segundo este principio, o contrato produz efeitos entre as partes, ndo partes as pessoas que o formaram, que manifestaram vontade no sentido dda formagiio do pacto. Dai a classificagae dos direitos obrigacionais ou pessoais como direitos relativos: io direitos oponiveis exclusivamente entre credor € dlevedor, dentro da telago obrigacional. Assim, os efeitos do contrato, juridica- ‘mente, ficavam adstritos & fechada relago contratual (com a ressalva, claro, das lransmissdes inter vives e mortis causa das obrigagdes). © contrato era visto abstratamente como relagdo de contedido patrimonial dois individuos formalmente considerados, sem ligagio com 0 contexto social de base, motive pelo qual ndo se podia fazer nenhuma vinculagdo entre YS 0 contratantes ¢ o restante da coletividade. Esta, na verdade, tinha aquele dever eral de abstencao, ou seja, tudo o que podia e devia fazer em relagilo no contratg. cera abster-se de fazer qualquer coisa, 2.4.6. 0 papel do Estado Similar era © papel reservado ao Estado, em matéria de contratos: devia assegurar seu cumprimento. Ora, se 0 contrato era necessariamente justo, pois decorrente de um avordo de vontades entre duas partes iguais e livres, ndo havia ‘motivo para se defender uma atuagdo estatal sobre esses vinculos que ndo fosse para garantir que o contratado seria cumprido, Impensavel seria uma interven para corres de algum desvio, pois este era praticamente impossivel e teoricamente desnecessitrio dentro de quadro de pressupostos construido pelo legistador civil, Tal entendimento era compativel com o fortalecimento dos direitos civis ¢ das liberdades pablicas do Estado Liberal, que, em part, justficava-se na meméria do Estado Absolutista, invasivo ¢ ofensor dos direitos individuais. O liberalismo ‘econdmico tinha sua vertente juridica: laissez faire, laissez paisser, esta era a melhor forma de atuagio estatal no discurso oitocentista, 2.4.7. A andlise estrutural ‘Ao lado de tudo isso, até aproximadamente a metade do século XX, o estudo do contrato ¢ dos negdcios juridicas em geral se dew apenas do ponto de vi ssirutural, deixando-se de lado uma pesquisa funcional sobre o contrato, Foi um estudo estitico de seus elementos estruturais, tendo sido esquecido, por muitos anos, no Direito Civil, 0 estudo da fungdo do contrato. Como a fungdo era indivi- ‘dualista, voltada para a realizagdo dos interesses das partes, sem a percepeaio de outros sujeitos afetados por aquela relago, © proprio conceito classico, liberal de contrato, impedia sua critica. 3. CONCEITO CONTEMPORANEO DE CONTRATO Situa-se 0 conceito contemporiineo de contrato em dois mbitos: a) na esfera geral, é aquele surgido com o Estado do Bem-Estar Social, o Welfare State, con- solidado em alguns paises europeus e ensaiado no Brasil; b) no dmbito nacional, €o contrato presente na ordem civil ap6s a publicago da Constituigio Federal de 1988, numa ordem juridico-social-econdmica voltada pelos objetivos fundamentais expressos no art, 3° desta (construir uma sociedade livre, justa e solidiria; garantir © desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza ca marginalizagio e reduzir as desigualdades sociais; promover o bem de todos...) além de outros condicionantes encontrados ao longo do-seu texto, ey P orana Cando Benes Boge Hestinatirio varlivel do conceito contempordneo de contrato /sujello de direito idealizado como destinatirio do conceito contemporineo i um mode lexivel, que pode ser composto por diferentes: modo NW0s de atuagho contratual, come as representagdes do consumidor, do i, dor empregado, do empregador, da empresa, da microempresa, do slo particular, do aderente, do predisponente. Nao ha s6 um sujeito, mas Wiveridade deles, atuando em papéis muito distintos entre si, em contextos in, tul-ve 0 contratatante-proprictrio-pai de familia-burgués por uma pli de sujeitos com pertis variados. J. Conseqiténcia da variedade de contextos e sujeitos contratuais: hd um e isu variedade de personagens contratantes, assim como a variedade de mi “Msslitemas juridicos obrigacionais que tais personagens demandam, levantam ‘Wiss perguntas principais quanto a validade de uma teoria geral dos contralos, Aldi do questionamento da validade de uma teoria geral do negécio juridica: ‘A existe um Gnico contrato. (modelo contratual, conceito de contrato) na ordem. Juriticn brasileira? b) se nao existir um iinico eonceito ou modelo ow padtito ‘eonitratual, qual é a utilidade ¢ validade de uma tinica teoria geral? Diante dessas ies, chegou-se a anunciar a crise do negécio juridico e o fim da teoria geral ontratos DDe fiat, tais teorias e suas versdes legis sto compostas, ainda hoje, de eate= 0rias centrais de inspiragdo pés-revolucionaria francesa, inadequadas para tratar {i Fealidade contemporiiea pés-ensaio do Bem-Estar Social (no Brasil) e para ‘ednciliar a diversidade de pressupostos antagdnicos que as diversas personagens Fisse quadro levou a critica do negécio juridico como instrumento a servigo Alay classes dominantes e a critica do contrato como categoria abstrata ultrapassa- da, Essas criticas se acirram ainda mais quando se tem em vista os contratos por adesilo: alguns autores chegaram a considerar 0 contrato como categoria extinta ano auto-regulamentagao dos préprios interesses, pois, se apenas uma parte i-regula os proprios interesses, enquanto a outra apenas adere a essa regula: ‘mentagae unilateralmente formulada, nenhum sentido mais haveria em manter 0 cntrato inserido no género dos negocios juridicos. Nesse sentido, Franceseo Galgano denuncia que 0 negécio juridieo nlio & ‘mais um instrumento de real mediagao de interesses, constituindo, atualmente, evista 2006 19 - Gaorge agave Modesto “uma categoria enganosa, que impede a compreensio do significado efetivo do ‘mecanismo contratual, retira a relagdo contratual da conotagiio social das partes, ‘mascara a contradigao interna a disciplina dos contratos e oculta a real naturezaa dos interesses em jogo” ¢ considera que 0 negocio juridico, por isso, é uma categoria em declinio, destinada ao ocaso?, Para 0 autor, nfo se pode mais ter um conceito unitéirio de negécio juridico, ‘uma vez que as diversas espécies de contratos tém conteido heterogéneo. Con- tudo, entendemos que o rompimento da concepgo unitiria de negocio juridico iio leva conclusio de que todo proceso produtivo seja de massa, nem que toda Contratagdo seja de massa, pois 0 contrato paritirio, nos termos concebidos na teoria do negocio juridico, ainda existe, apesar do enorme espago ocupado pelos ontratos por adesdo. Segundo Galgano, para evitar o tratamento inadequado dos contratos em que nitidamente ha uma parte fraca, deve-se afastar a teoria geral dos contratos ¢ construir uma teoria propria para cada contrato isoladamente. E, ‘quanto aos contratos de massa, Francesco Galgano entende que eles *. deve se transfridos de um émbito concetul pensado em terms de fats, aos, negdciosjuriicos para um dmbito conceit! consrui em terms enc, devend sr reintrpreada como iniciativa eeandeica 4 autonomia eontratual™ Embora nao estejamos convencidos da necessidade de abandono da teoria geral dos contratos, nem do abandone da categoria do negécio juridico', reconhecemos, todos aqueles problemas apontados por Galgano quanto as varias ficgBes presentes na teoria geral do negécio juridico e todos eles devem ser levados em consideragio quando do estudo da autonomia privada ¢ da liberdade contratual, Contudo, nao é neste trabalho que cabe a desconstrugdo destas teorias. Para chegar ao principio da fungao social do contrato, neste trabalho, vamos continuar tratando de contrato no singular, ressalvando-se a critica acima, 3.2. A exigéncia de justia contratual Embora a seguranga juridica continue sendo um valor indispensiivel para 0 ambiente juridico-social-econdmico, outro valor sobressai na ordem civil cons- titucional obrigacional contemporinea: 0 valor da justiga contratual ou equidade contratual GALGANO.| idem p. 82 BORGES, Roxana Cardoso Brasco, Disponible hs dra personalidad atari priv Sto Paulo: Sarva, 200 ances, I it privat facade ¢ Continciome 9. Bologna: Zanicheli, 1983, 81 36 ena Cait Bry eres Justificada, linhas acima, a exigénola de seguranga juridica na ordem liberal jds-revolucionsria, percebe-se qué tal exigéncia no ocupa posigio to elevada ha nova ordem, tendo em vista a mudanga do contexto ¢ a desnecessidade de prineipios que tenham come principal objetivo a estabilidade dos vinculos e a ‘onservagio das conquistas burguesas. ‘A ordem civil constitucional brasileira contempordnea nto & conservadora, mas dirigente, propositiva, progressiva, promocional e solidaria. Portanto, no que se refete A teoria contratual, no é mais o valor da seguranga juridiea que ocupa o ugar privilegiado, mas o valor da eqdidade, do equilibrio, da. justiga nas relagdies negociais?. Para atingir os objetives fundamentais assumidos pelo constituinte de 1988 no art. 3° (construir uma sociedade livre, justa e solidéria; garantir © desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalizagio e reduzie as desigualdades sociais; promover o bem de todos ~ permitam a repetigao), mio serve um ordenamento conservador, & necessdrio um conjunto de norms Com ‘mandamento de mudanga, de transformagfo, de evolugao, de progresso* em varios limbitos: progresso social, progresso ecandmico, progresso cultural, progress ambiental, progresso juridico. A justiga contratual é uma exigéncia dos objetivos fundamentais (art. 3°, CF) dos fundamentos do Estado brasileiro (art. 1°). Ela substitu, no atual comtexto juridico, 0 conservador principio da seguranga juridica. Esta ainda subsiste, por ‘obvio, mas nao esté mais no topo da pirdmide de valores que orientam o direito obrigacional, 3.3. 0 cantrato como vinculo de colaboragio ‘A definigdo inicial de contrato passa, naturalmente, por uma revisia, tendo ‘cm vista as alteragdes percebidas no contexto histérico. Da explicagao de contrato como acordo de vontades representantes de interesses opostos, passa-se & nolo de contrato come vinculo de cooperagao. este novo conceito algumas conseqQiéncias juridicas decorrem de imediator 1 proteso da confianga no ambiente contratual, a exigéncia de boa-fé e a obser vincia da fungdo social do contrato, Deixando no passado a idéia de oposigo, antagonismo ¢ contrariedade entre as partes, chega-se d percepgiio da necessidade de atuagdo cooperativa entre os polos 5) NALIN, Pal, cua: cance ptm. Curitiba: ard, 2002, 9,213, (Aina que a ps-moderidade questione os dos itimos conceit, vamos manos, or or ” evita 2006 11 Gea Fragoso Modesto da relagdo contratual, pois ambas tem interes saetheh L, pois interesses em jogo dependentes da atuagdo ‘ciproca’. A satisfagio dos interesses de uma das partes depende de atuagio da ats ‘omo antes, Mas se alguém se propde a, em contrapartida ao atendimento Meese rater ado dresinada satisfy ds interesss de ute, ‘aquele alguém deve atuar colaborando, cooperando para que o contrato atin se fins, que so de interesses de ambos. vay een Ni € possivel, na ordem juridica atual, admitir-se él al, admitit-se que alguém se proponha compor ma relagdo contratull e atue contrariamente a consecugao dv fing ssl vinculo, assim como nao se admite que um contrato. bilateral e oneraso roduza vantagens para apenas uma das partes, deixando a outra em situa frustragdo ¢ prejuizo, " von ee 34. As verses atuais dos antigos slogans _Ieualdade ¢ liberdade continuam pautando a teoria geral do contrato contem- Pordineo. Mas sto igualdade e liberdade com outros significados, adequados a0 Contexto sdcio-econémico-cultural ¢ ordem civil-constitucional, 34.1. Igualdade substanciat Pouco apos a solidificagdo do discurso de i a icagdo le que todos so iguais perante a | surge, no séeulo XX, a necessidae dereivindear, pura o camp jtidice a ma 'mog2io de outro tipo de igualdade: a igualdade substancial, Mesmo no tempo da coditicagdo francesa era nitda a desigualdade material ¢alte as partes, assim camo a conseyincia de que, send as partes desiguais evo. mica ou socialmente, a auto-regulamentagdo dos seus interesses nem sempre Seria completamente motivada por uma vontade live. Essa desigualdade fos ainda mais nitida apés a revolugao industrial ea expansfio da economia de mace edo consumo de massa. Passou-se a questionar, frtemente, por exemple, areal autonomia do trabalbador ¢ a real autonomia do consuumidor para, num contrato com 0 empresirio, auto-regulamentar seus interesses. ‘Aumentou assim, arevindicag3o por um tratamento juriico dif a8 partes de um mesmo contrato afastando o pressuposto burgués da isualdade formal entre as partes e buscando garantr a liberdade dos contratantes por meio daexplicitago da sua desigualdade juridia. Ou sea, diame de uma desigualdade material entre as partes, novesséria & uma desigual ti enciado para lade juridica de tratamento ‘ressupndo-s wn contrat bilateral ozo, our Cai te Borges {quo revonhega e equilibre as forgas de poder ~ sobretudo de natureza econdmica ~ jwosertes na relag. Porcebeu-se rapidamente a armaditha do discurso da igualdade formal que Welxava ox individuos a propria sorte, considerados livres para assumirem qual- {quer vinculo contratual, ainda que, em alguns momentos, esses individuos nllo se ‘ovessem preponderantemente por liberdade verdadeira, mas por necessidade, ‘Giuiados pela necessidade, levados ao contrato, nio tinham nenhum poder nem ‘eondigho material de exercera liberdade contratual, a que se refere & determinago Wo contedido do contrato, O que a parte mais poderosa naquele contexto impusesse ‘como conteddo do contrato era aceito pela parte necessitada ou desinformadn, Jevando 0s contratos, em certas situagdes, a serem vistos como vinculos de abuso ‘explorago. O problema residia na iberdade apenas pressuposta, mas ndo real, € lis partes cram, pela lei, consideradas como iguais, mas no o eram. Da soma das duns premissas falsas, o resultado era o vinculo desequilibrado que a ideologia Juridica liberal e individualista produzia. A conhecida frase atribuida a Lacordaire, religioso, politico ¢ académico ‘nascido dois anos antes da elaboragdo do Cédigo Civil francés, “entre 0 forte ‘6 fraco, a lei liberta e a liberdade escraviza”, tem validade se a lei de que se trata thuscar a igualdade substancial e a protegdo da liberdade contratual de todas as partes do contrato, mo apenas de uma, © antigo pressuposto de igualdade formal deu lugar @ igualdade substancial, © principio da igualdade, na sua versio contemporiinea, ndlo apenas pressupde & ipualdade das partes diante da tei, mas tem a lei como instrumento para promover ‘igualdade substancial -na verdade, para diminuir a desigualdade extrema ~ de partes materialmente desiguais © que, por isso, tendem a realizar um contrato desequilibrado. Autonomia privada ‘A antiga fiberdade de contratar, assim como o voluntarismo juridico, deram ‘espago a nogo de autonomia privada. Autonomia privada ¢ o poder de realizar negécios juridicos, conhecida, também, por liberdade negocial, que abrange a Jiberdade contratual. E 0 poder atribuido pelo ordenamento juridico a pessoa para que esta possa reger, com efeitos juridicos, suas priprias relagdes. Esse poder cconfere as pessoas a possibilidade de regular, por si mesmas, as prOprias agdes ‘© suas conseqiéncias juridieas, ou de determinar 0 eonteiido ¢ 0s efeitos de suas relagies juridicas, tendo o reconhecimento e podendo contar com a protegdo do ‘ordenamento juridico. ni Gorge rogovo Modemmo ‘A autonomia privada é um dos principios fundamentais do direito privado, Esse principio se materializa por meio da realizaglo de meydcios juridicos. Con. forme Cariota Ferrara, os negécios juridicos so as instrumentos ou os meios de ‘alizago da autonomia privada*. Os negécios juridicos sto instrumentos “que 0 Proprio direito poe & disposieio dos particulares, para servirem de hase aos seus interesses na vida de relagdo, por conseguinte, para dar vida e permitit o desen. volvimento das relacdes entre eles™, Segundo Emilio Betti, a autonomia das pessoas quanto & auto-regulamenta- ‘Go de seus proprios imeresses ¢ uma pritica social que, ao ser reconhecida pelo dire, transforma-se em autonomia privada juridica"”, O autor explica que a ordem juridica, antes de sancionar um negécio realizado pelas partes, avalia sua {ungao pritica, podendo dar-Ihe trés repostas possiveis, altemativas: pode jgnorar ‘© negécio, reconhecer 0 negécio ou combater 0 negécio, Por isso, possiveis corregdes na autonomia privada ou na liberdade contratual nao negam tais conceitos, adaptam-nos aos novos contextos que servem de base ‘Arealizaio do coniraio. O intervencionismo piblico, através da lei ou da revisto judicial, nao fere a autonomia, apenas a corrige ¢ a mantém dentro dos limites do ordenamento juridico, E necessirio, ainda, ressaltar que ndo falamos da autonomia da vontade no seu sentido voluntarista elissico, mas de autonomia privada'', que decorre do ‘ordenamento ¢, por isso, earrega sua axiologia, O poder de gerar regras juridicas para as préprias situagdes ou relagdes nao esta na simples vontade da pessoa, mas na declaragao de vontade que estiver autorizada pelo ordenamento juridico, quanto 4 forma, quanto ao contetido e quanto a capacidade ¢ legitimidade do sujeito, 35. A revisio judicial dos contratos: a tangibilidade da intangibilidade Apesat de 0 Cédigo Civil brasileiro de 1916 nao ter previsto a revisio con- ‘ratual, os tribunais cuidaram de construi-la e aplicé-la em inameros casos de necessidade de correedo do contrato, A revisto judicial do eontrato nio tem o objetivo de ultrapassar as vontades das partes ¢ gerar inseguranga ao vinculo contratual, mas reequilibrar o contrato 8. CARIOTA-FERRARA, Luiz. mez grid nl drt private ialkan, Napoli Mera 55. '% BETTI, Enito, Teoria gral da neyo fri, Tea, erate de Miranda, Coimbra: Combes Eton 196. 9.92, 10. Tides, p01 H. BORGES,R.C.B.Op, cit Hana Cantona hase Borges ‘WH # finalidade de preserv-lo, com a possibilidade de satistagio dos interesses Heitiinon em jogo. Op contratos devem ser cumpridos, esta ¢ a regra geral, ¢ a revisto judicial deve buscar a possibilidade do seu cumprimento equilibrado. AS Imprevisdo i a construgio pretoriana brasileira, de inspiragio estrangeira, iniciou-se leet aceite joc or contrusncom raisroqaion que orexglod Wa final do séeulo XX. Inicialmente, para que o juiz se considerasse autorizado a intervit no contetido do contrato, eram necessérios os seguintes requisitos: alteragdo radical da base ‘bjetiva do contrato, causada por circunstincias imprevisiveis (extraordinérias), A levee no deseo ote a presage, gerando, par uma pri ‘iquccimento inesperado ¢, para a outra, empobrecimento, tornando insuportiv Wexecugio do contrato. A possibiidade da revisio decorria da eliusula rebus sic stantbus, considera Iinplicita a todos 0s contratos, segundo o entendimento, de origem na antiguidade", ‘de que os contratos de execucao diferida devem ser cumpridos no mesmo ie de coisas existente quando as obrigagdes foram assumidas. A revisto omnes iunte deste quadro alterado, tem por objetive restaurar, no vineulo, © ‘rginal da relagio entre as prestagdes assumidas na sua formagdo, Posteriormente, os tribunais passaram a dispensar a presenga. do enriqueci- ‘mento sem causa, considerando suficiente a desproporgio ou excessiva onerosi- dade decorrente do fato imprevisivel que altera radicalmente a base objetiva do eontrato. Assim, © pacta stunt servanda continua valendo, mas se rebus sie stantibus. 4.5.2. Onerosidade excessiva li léncia brasileira, os tribue Com a teoria da imprevisio consolidada na jurisprudéncia t huis pereeberam outro contexto justificador da revisio contratual: a onerosidade cexcessiva pura, que nilo é conseqliéncia da alea extraordinaria. ” cA conratoss: autenomia da -vontade ¢ tori da [2 RODRIOUES ul Oo Lae Ain ett do A Ie, S89 Pau: ny 9 9 “ $F Goorye Frogoso Mode Inicialmente aplicada its relagdes de consumo, a revisito contratual, neste: caso, prescinde do evento imprevisivel como causa da desproporgio ou onerosidade excessiva, Trata-se de revisiio do contrato por lesio objetiva, que quebra a comu- tatividade dos contratos, desequilibrando a relagao, tambxém de origem antiga No sistema consumerist, & pritica abusiva impor ao consumidor desvanta- gem exagerada ou exigir dele vantagem manifestamente excessiva. Mesmo que ‘aonerosidade excessiva seja originéria, ainda que haja, na formagio do contrato, sua presenea, 0 contrato pode ser corrigido judicialmenie, tendo em vista a vul- nerabilidade do consumidor, Recentemente, percebe-se, na jurisprudéncia, o entendimento de que a revi- Slo por onerosidade excessiva pode ser feita em relagio a qualquer contrato,seja consumerista ou formalmente paritirio, por uma exigéncia de justiga eontratual, Apesar de 0 Cédigo Civil, no art. 478, na segio que trata “Da resolugio por ‘onerosidade excessiva’, exigir os requisitos tradicionais da teoria da imprevisio mesmo quando a jurisprudéncia no mais os exigia todos -, a interpretagao é de que, como expressa o titulo dado a segio, basta a onerosidade excessiva para ‘a corregio contratual, tendo em vista a principiologia axiol6gica do Codigo Civil de 2002, assim como da Constituigdo Federal de 1988, Vale 0 pacta sunt servanda, desde que a balanga esteja equilibrada, 3.6. Da estrutura a fung0": o renascimento do contrato Dentre as criticas feitas a teoria do negocio juridico e a teoria geral do contrato, esto 0 fato de este ser tido como instrumento de realizagao da liberdade pessoal, © que, diante das desigualdades entre as partes, soa falso, além do fato de seu cestudo, tradicionalmente, resumir-se a seus elementos estruturais Com o questionamento do discurso individualista, deixou-se de falar do nnegécio juridico apenas como meio de afirmagio da liberdade para falar de um “instrumento de realizago de interesses privados”, no sentido de que, segundo Ana Prata, “a sua caracteristica diferenciadora deixa de sera liberdade do sujeito, passa ‘sera fungio que desempenha, a sua aptidio a produzir dados efeitos”. Houve, assim, uma alteragdo no sentido de uma “funcionalizagao do negécio”, uma socializago do contrato, como reag2o ao voluntarismo estruturalista oitocentista 45, Acbea“Datlastttar il fnzione de Norberto Bobbio cottons de empstimo para ee ipn, ‘rope uma reflexdo ybre a fang pramoonal do dio par lem da aniline de ums eetnas [4 PRATA, Ana ta contucionl da amon priv, Coit. Almesina, 23, 15, Tider, ot Aan Candann Bano Borge Como obyervou Miguel Reale! o principio da fungdo social do conteato, re Velado pelo art. 421 do Codigo Civil de 2002, decorre do preceito constitucional 4 fungio social da propriedade, presente, dentre outros, no art. 5°, Xt © XXI, ols, muitas vezes, o contrato serve & propricdade ¢ vice-versa, Ele & um dos novos principios da contemporiinea teoria geral dos contratos € pole trazer grande contribuigdo a protego a0 equilibrio contratual N6.1. A,fungio social do contrato no seu aspecto interno 0 conirato é relagdo juridica entre duas partes que decidiram (embora nem sompre esta decisio seja plenamente voluntiria na sociedade de massas) vincular= se juridicamente para atendimento de seus interesses. Assim, ambos os polos da felagilo obrigacional tém interesses em jogo. Seo contrato é bom ou funciona apenas para uma das partes (tratando-se de contratos bilaterais, oncrosos), expressa abusividade endo atendimento de sua funglo interna. Se aquele vineulo serve apenas a uma das partes quando, de inicity, doveria servie is duas, nio ha justificativa juridica nem social para sua manutengio, Se 0 contrato ndo serve a ambas as partes, mas apenas a uma delas, no cumpre sua fungdo interna © precisa ser corrigido. Exemplificando: se um consumidor contrata uma compra ¢ venda de um liquidificador, pagando o prego em doze ‘eves © com juros de cem por cento ao ano, este contrato no esta funcionando mmo compra e venda, mas como métuo explicitamente abuisivo, mio servindo & clrculagao de mercadoria, mas a pritica de agiotagem. Assim, ndo cumpre com su Fungo interna tipica de contrato de compra e venda, violando o principio do art, 421 do Cédigo Civil, além de outros. Perguntemos: para serve 0 contrato? Para satisfago dos interesses das partes isoladamente, niio poderiam obter certos bens ou servigos, precisando, para 0, da colaboragiio da outra parte. Assim, a fiungao sécio-econdmica do contrato reside na sua utilidade em relagio a obtencao desta satisfagdio. Quando o contrat i permite esta satis fagdo, servindo para outro fim, como o alcance dos interesses dle apenas uma das partes, prejudicando a outra, 6 pacto ndo cumpre sua fungiio social considerada justificativa juridica para sua tutela pelo ordenamento. qu Assim, o contrato que niio cumpre sua fungdo social, no aspecto interno, tem ‘sua finalidade esvaziada ou desviada, carecendo de justa causa para sua tutela, 1. REALE, Miguel. Funpdo Social do Contra Disponive em: Acexso em 2005/2007. eit 2006 - 19 - George Fragono Modesto ‘Se dado pacto no se reveste desta utilidade, hd problema quanto a sua validade e eficécia, 3.6.2. A funcio social do contrato no s : aG3 dhs Neu aspecto externo: a relatividade da Analisando 0 aspecto extemo da fungdo social do contrato, 0 foco vai para além das partes, para 0 restante da cofetividade, numa passagem do individual Para o transindividual, trazendo, para dentro do contrato, pessoas que nilo 0 a8 Sinaram ¢ que, pot isso, o Direito Civil tradicional nao as considera como partes neste vinculo, no as pe nos polos da relago jurdieaobrigaciona, Na andlise aspecto externo da fungio social do contrato encontramos quem ndo assinou © contrato, mas é por ele socialmente interessado, 0 que 0 leva, no caso, a ser juridicamente interessado por aquela relagio obrigacional da qua, trad ‘mente, niio era parte. , male ‘Ao tangenciaro contrato, as pessoas tradicionalmente chamadas de terceiros aparecem no cendrio juridico para, prineipalmente, protegerem-se de contratos que possam violar direitos seus. Veds-se, com o principio da fungio social do contrato, que um ajuste, ainda que surgido do mais puro ¢ perfeito acordo de Vontades entre as partes, venha a causar danos a pessoas que, embora atingidas pelo contrato, ndo tém o stanus de parte maquela relagaio juridica, “O que se exige ‘apenas que o acordo de vontades nio se verifique em detrimento da coletividade, ‘mas represente um dos seus meios primordiais de afirmagio e desenvolvimento”. ‘como esclareceu Miguel Reale", . A socializagio do contrato consiste nesta importdincia que o legislador ¢ 0 Constituinte conferiram aos reflexos sociais do vinculo obrigacional. Nao se trata {de socialismo se sobrepondo ao capitalisma, mas 4 eondiglo de que os contratos, Possam cumprir sua fungaio individual ou interpartes desde que isso nfo ocorra em detrimento dos direitos de tereeiros, representados pela coletividade, O prin- Cipio da fungao social do contrato inclui os que sempre estiveram a margem das ‘contratagdes,triangulando.a relagdo juridica contratual. Por isso justifica-se a redagdo do art. 421 do Cédigo Civil: “a lberdade de contratar sed exercida em razaoe nos limites da fungdo social da contrato” Se as partes (tradicionalmente consideradas) ultrapassarem os limites da fungdo social do contrat, significa que as pessoas por cle afetadas poderdoatuar mesa rclogao 17. Op cit “ 4 Soman Canton Wate Hoge, Juridica para por o acordo dentro das fronteiras desenhadas pelo ordenamento {Juridica em que pode haver o exereicio da liberdade contratual, Se o ordenamento jut idico brasileiro protege a liberdade contratua, é porque a considera socialmente {il Assim, apenas quando o exereicio desta liberdade for feito de forma social- ‘ente Gtil- ou, no minimo, quando nilo contrarie o interesse da sociedade ~ esta up a protegdo do ordenamento, Ultrapassando a fronteira da fungiio social, aquele Jwoto nllo mereceri tutela juridica ¢ sua validade ¢ eficdcia podem ser revistas Judicialmente, inclusive através de iniciativa daqueles terceiros que costumavam, 04 mantidos de fora do contrato. Deve-se perguntar: para que serve o contrato? © contrato tem a finalidade sbeio-ccondmica de satisfazer os interesses das partes, prineipalmente com base ‘Mem mecanismo de troca, Sua finalidade no é prejudicar terceiros. Se 0 meciy fhismo de satisfagio de interesses das partes prejudica tercciros, violando seus direitos, hd ilicitude, desvirtuando-se o pacto de sua fungao sécio-econdmica ‘normal, devendo ser corrigido. Auiltrapassagem dos limites da fungdo social do contrato caracteriza abuso do direito de contratar, conforme a combinagio entre os artigos 421 ¢ 187 do Codigo Civil, equiparando-se a atuagao das partes (tradicionais) a ato ilicito, que pode fgerar dano a pessoas que ndo participaram da formagao do vinculo contratual. ano gerado a terceiros por um vinculo contratual implica, entdo, responsabilidade para as partes (tradicionais) que pactuaram algo Iesivo aos direitos de outrem, jpassando a ser obrigados a reparar o dano, Por exemplo: se as partes de um con- {rato so causadoras de um dano ambiental, ainda que este decorra diretamente dda conduta de apenas tima delas, todas so responsiveis por sua reparago, pois tnvesmo a parte que ndo realiza a conduta material diretamente vinculada ao dano, tua indiretamente motivando-o ¢ esperando proveitos da atividade realizada pelo ‘outro contratante, Se o contrato ¢firmado em fungao de uma atividade poluidora, {todas as partes deste cantrato respondem pelos danos ambientais causados, no ‘apenas a parte que se obrigou a realizar materialmente a atividade poluidora que também é de interesse dos demais contratantes. A revisiio contratual pode se dat, pili ida por seus legitimados, considerados terceiros em relagdo ao contrato, E neste sentido que deve ser entendido o valor da livre iniciativa (art. 1°, 1V dda Constituigo Federal) ¢ sua conseqdeente liberdade contratual: respeitando-se 4 fungo social da propriedade (arts. 5°. XXIII e 170, IIE) ¢ evitando-se o abuso ‘do poder econdmico (art. 173, 4°, também da CF), para ficar nos termos consti- além do principio da solidariedade (art. 3°, ! da CF), ucionais evita 2008 19 George ragono Mowesto 3.7. A boa-fé objetiva: protegio da confianga, © principio da boa-fé objetiva ou principio da probidade ou eticidade, expres- 80 nos arts. 422, 113 ¢ 187 do Cédigo Civil, atua sobre os contratos com varias, fungdes": & fonte de direitos laterais,é limite a liberdade contratual ea liberdade de contratar, ¢ cdnone de integragao e interpretago dos contratos. ‘Com este principio, explicita-se a opedo pela presenga da ética nas relagdes negociais, devendo-se considerar, na anélise do contrato, os padres de conduta ‘correta, vigentes no meio, para pautar 0 comportamento dos contratantes. O com- Portamento das partes deve estar de acordo com o padro razodvel de conduta -cultivado no meio social em que o contrato se insere, Trata-se de uma exigéncia de respeito & confianga”” da outra parte © aos seus legitimos interesses por aquele eontrato, deeorrente, também, da nogdo de contrato como vinculo de colaboragio, Apesar da insuficiéneia do texto do art. 422, hii um forte entendimento de que ‘0 principio tem aplicagdo também nas fases pré e pos-contratual, pois todas estas fases sdo partes de uma relagdo voltada para a satisfagdo dos interesses legitimos, das partes, PPorisso, o abuso da liberdade de contratar™ (ede ndo contratar, logicamente), na fase pré-contratua, representado pelo rompimento inesperado e injustifica- do das fndadas expectativas da outra parte na formagao do vineulo contratual, _gerando prejuizos para esta, enseja responsabilidade civil da parte que violou padres de comportamento correto naquele contexto, Do mesmo modo, 0 abuso ‘posterior & execuezio da obrigagio”, que leva & obstrugiio do gozo dos efeitos do contrato, revertendo as expectativas da parte, também viola a boa-Fé e leva a responsabilidade do contratante desleal, 3.8.0 papel do Estado Diante da transformagao relatada acima de um paradigms liberal para um Paradigms social, a doutrina e a jurisprudéncia, assim como o legistador, vém 1G MARTINS-COSTA, Judith. hoo:é mo diet privado, Sto Paul: RT, 2000. NEGREIROS, Teresa Funcaments para iterpreaccomstincional do princpl ca Bn fe Ri de Ste: Renn, LO, SILVA, Jorge Ces Ferrin da boxe a vole possi. conrans Ride Janet: Renova, 21 20, PINHEIRO, Rosalice Fal, (aha odio es eager comrans Rio de Janet: Renova 21. PEREIRA, Reps Fichtner 4 reponsobhdale civ présconrtual Rio de Jaen: Renova 2001, POPP (Carlyle Aeypomabiidade cv pré-negocal 6 rompreto das etatvs. Cori: ur, 2001. DDONNINI toto Ferra. Responsable pe-conatua. $40 Paulo Saraiva, 2004, F oar Cantos soo Bor vontinuamente, a necessidade de substituira nogio de igualdade formal Jginidace substancial, A protegdo da parte mais fraca na relagdo contratual € ise recente discusses sobre contratos, nas decisdes judiciais, no Cédigo de do Consumidor, A intervengilo do Estado, mediante a le, nas relagBes con- ‘econvimicas é um fato, Todos alertam para as diferengas entre os contratos Jilouho © os contratos paritarios. Os juizes ja nil se apdiam exclusivamente ‘unt servanda, mas na busca pelo equilibrio contratual. Neste contexto, o Estado, na expressio legal ou judicial, que se apresenta 4 inais nquele modelo liberal pos-revoluciondrio, mas um Estado que tem Jromocionais, frulo dos movimentos sociais e da alteragao que o Estado Hen-Estar Social imprimiu ao capitalismo, devendo atuar de forma positiva sais diversos setores da sociedade, inclusive no setor econdmico € nas re hegociais. ate papel é inegavel diante das diretrizes assumidas pelo constituinte brasi- Joi de 1988: art. 1°, II ~ dignidade da pessoa humana como fundamento; art, 1", LV ~ valores sociais do trabalho ¢ da livre iniciativa como fundamento; art. VL —construgdo de uma sociedade livre, justa e solidria; garantia do desen- ‘yolvimento nacional; erradicago da pobreza e da marginalizagdo e redugdio das osigualdades soc st. 5°, XXIII —a propriedade iulenderd a sua fungao social; art. S*, XXXII —o Estado promoverd, na forma da Joi, a defesa do consumidor; art. 6° ~ sto direitos sociais a educagdo, a saiide, 0 Atubatho, a moradia, o lazer, a seguranga, a prevideneia social, a protesdo & m: omnidade e &infincia, a assisténcia aos desamparados; art. ””~ direitos dos traba- Ihadores urbanos ¢ rurais; ar. 170—a ordem econdmica, fundada na valorizagio do trabalho humano e na livre iniefativa, em por fim assegurar a todos existéncia digna, conforme os ditames da justiga social, observados os seguintes principios: .. fungilo social da propriedade, livre concorréncia, defesa do consumidor, defesa do tncio ambiente, redugdo-das desigualdades regionais e nacionais, busca do pleno einprego...: art. 173, 4° —a lei reprimira o abuso do poder econdmice que vise & tdominagao dos mercados, a eliminagao da concorréncia ¢ ao aumento arbitrario ddos lucros; art. 173, 5° —a lei, sem prejuizo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa juridica, estabelecerd a responsabilidade desta, sujeitando-se 4s punigdes compativeis com sua natureza, nos atos praticados contra a ardem ‘econdmica e financeira e contra a economia popular; art. 179 ~tratamento juridico diferenciado & microempresa e a empresa de pequeno porte; art. 182 —a politica ‘do desenvolvimento urbano... tem por objetivo ordenar 0 pleno desenvolvimento tlas fungdes sociais da cidade e garantir 0 bem-estar de seus habitantes; art 182, 2°. fungdo social da propriedade urbana; art. 186 ~ fungi social da propriedade rutal; at, 192 —o sistema financeito nacional, estruturado de forma a promover « desenvolvimento equilibrado do Pais e a servi aos interesses da coletividade, ” ova 2006-1) George Fragove Modesto ‘em todas as partes que o compiem...; art. 193 ~ a ordem social tem como base o primadl do trabalho, ¢ como objetivo © bem-estar€ a justiga socials ete. Naio convence o discurso démodé de que a intervengo legal ou judicial nos ‘contratos & fator de inseguranga juridiea e de um suposto “custo Brasil", como alardeiam os porta-vozes do empresariado nacional ¢ estrangeiro. Tal discurso esta

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