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EDUCACAD commen THTER mere EQCES ane EN CIS PARA ALEM DA SIGNIFICACAO “FORMAL, ‘NAO FORMAL’ ‘INFORMAL NA EDUCACAO BRASILEIRA BEYOND THE FORMAL, NONFORMAL AND INFORMAL’ MEANNG N acl Berartine Sine? Patricia Flavia ot? RESUMO Este artigo, fruto de discussdes realizadas no bojo do Grupo de Estudos, Pesquisas e Extensio Fora da Sala de Aula (FFP/UERJ), desde 2046, tem como ob- jetivo problematizar a divisao entre educagao for- mal, nao formal e informal na educacéo brasileira ~ ainda defendida por tedricos da Pedagogia e do ‘campo, em construgio, da Pedagogia Social. Com uma abordagem reflexiva, esta pesquisa de cunho bibliogréfico apresenta as especificidades destas trés formas de significagao da educagao © argu- menta em defesa do uso dos termos escolar e nao escolar, de maneira articulada, a fim de minimizar 6s processos de escalonamento entre conhecimen- tos, saberes e experiéncias e, ainda, questionar a centralidade de determinados espacos sociais em detrimento de outros - na certeza de que todos os espagos sociais se configuram num territério (so- cio}educativo produtor de miltiplas pedagogias. PALAVRAS-CHAVE Educagao Formal. Educagao Nao Formal. Educagao Informal. RESUMEN Este articulo, resultado de las discusiones mantenidas dentro del Grupo de Estudio, Investigaci- ‘Snvy Extensién Fuera del Aula (FFP/UERJ), desde 2046, tiene como objetivo problematizar la di- visién entre educacién formal, no formal e informal en la educacién brasilefia, tadavia defendido por tebricos de la pedagogia y el campo, en construccién, de la Pedagogta Social. Con un enfoque reflexivo, esta investigacién bibliogréfica presenta las especificidades de estas tres formas de significado de la educacién y argumenta en defensa del uso de los términos escolar y no esco- lar, de manera articulada, para minimizar los procesos de escalada entre conocimiento, saber y experiencias y, todavia, cuestionan la centralidad de ciertos espacios sociales en detrimento de otros, con la certeza de que todos los espacios sociales estan configurados en un territorio socioeducativo que produce maltiples pedagogias. PALABRAS CLAVE Educacién formal. Educacién no formal. Educacién informal. ABSTRACT This article, the result of discussions held within the Study Group, Research and Extension Outside the Classroom (FFP/UERL), since 2016, aims to problematize the division between formal, non-formal and informal education in Brazilian education - still defended by theorists of Pedagogy and the field, under construction, of Social Pedagogy. With a reflective approach, this bibliographic research pre. sents the specificities of these three forms of meaning of education and argues in defense of the use of the terms school and non-school, in an articulated manner, in order to minimize the processes of escalation knowledge, know and experience and question the centrality of certain social spaces to the detriment of others - In the certainty that all social spaces are configured in a socio-educational territory that produces multiple pedagogies. KEYWORDS Formal Education. Non-Formal Education. Informal Education. ° 585° + 586+ T EDUCAGGES: UMA INTRODUGAO EM CONSTRUGAO ‘Aeducagao ~ como jé vimos ~ & um fendmeno complexo, multiforme, disperso, heterogéneo, permanente e quase onipresente. Hé edueagio & claro, na escola ena familia, mas ela também se verifica nas bibliotecas, Na rua, no cinema, nos jogos e brinquedos (mesmo que eles nao sejam dos chamados educativos ou didéticos) ete. ocorrem, igualmente, processos de educagao. (TRILLA, 2008, p. 5) Nao incomum encontrarmos, em diferentes espagos sociais, discursos construfdos em defesa dos processos educacionais que neles habitam, no entanto, associados a estes discursos, também, 1ndo 6 incomum percebermos - direta ou indiretamente hierarquizagdes entre as diferentes formas, tempos e espagos de se produzir educacao. Nesta seara, autores classicos da pedagogia - como por exemplo, Libaneo (2010) ~ ja traziam esta divisdo entre educagao formal, nao formal e informal que foi, sendo potencializada por autores do campo, em construgao, da Pedagogia Social (GOHN, 2010; TRILLA, 2008) que faziam esta divisdo “didatica”, mas que, com uma lente mais apurada, tende a revelar, a nosso ver, certo escalonamento de saberes, conhecimentos e experiéncias - evidenciando, portanto, onde se faz “educagao” e onde se realizam “outras atividades socioeducativas” Aspecto este pontual que nos motivou a produzir esta reflexdo - tedrica por sua esséncia, Uma discussao que se divide em trés partes (formal, nao formal e informal) e, no desfecho, des. constréi esta perspectiva fragmentada em prol da defesa de uma educagao escolar e nao escolar ~ que sejam diferentes, porém complementares. Educagées estas que nos formam ao longo de toda a nossa trajetéria e que tém muito a contribuir para a construgdo de uma sociedade mais plural e menos desigual. Neste contexto, onde se encontra a educacao formal? 2 EDUCACAO FORMAL No cerme desta questo, pensamos estar inserida a proposta de centralidade da escola e de seus saberes construidos socioistoricamente, tendo em vista as concepgdes que alguns autores trazem acerca desta terminologia. Seus estudos nos levam a realizar algumas inferéncias que podem colocar os saberes produzidos pela escola numa escala superior a todos os outros produzidos em varios con: textos da sociedade. Sao necessérias muitas lentes para se discutir tematica téo relevante. Trazemos, portanto, algumas visdes para o debate: Interfaces Cienfieas «Arca - V8 N13 +584 586 Publica Continua 2020 Quadro 4 - Olhares sobre a Educagao “Formal” TEORICOS ‘cONSTRUGAO Maria da Gloria Gohn Aquela que é desenvolvida especificamente nas escolas, com conted- (2003) dos elencados antecioadamente Cada pats define o que é formal, segundo suas leis, que também variam Trille-Bernet segundo o contexto e a dindmica politica do momento; o nao formal, 6 (2003) ‘que est 8 margem do sistema formal € perfeitamente posstvel que 0 que era ndo formal em um momento, torne-se formal. O autor prope uma relagdo de complementaridade entre os tipos de educacao. ‘Aeducagao formal apresenta objetivos e meios definidos num planeja- Moacir Gadott mento e corre no ambiente escolar. (2005) “A educacao formal tem objetivos claros e especificos e é representada principalmente pelas escolas e universidades” (p.2). “Formal rfere-se a tudo que implica uma forma, isto 6, algo intetigivel, estruturado, 0 modo como algo se configura. Educagéo formal seria, pois, aquela estruturada, organizada, planejada intencionalmente, José Carlos Libaneo | sistemstica. Neste sentido a educagao escolar convenciona seria tip (2018) camente formal. Mas isso nao significa dizer que nao ocorra educagao formal em outros tipos de educacaiintencional (vamos chamé-las de ‘no corvencionais). Entende-se, assim, que onde haja ensino (escolar ou no) ha educagdo formal” (p. 81). Fonte: Elaborado pelos autores (2019). Ao entender que a educagao nao é 0 preparo para a vida, mas, sim, a prépria vida (DEWEY, 1959, p. 83), 6 possivel perceber, nas definigdes elencadas, que, embora haja uma tentativa conceitual de se desvincularos conceitos estudados neste artigo, é possivel visualizar o entrelace entre os mesmos no que tange aos processos formativos dos sujeitos. Uma vez que, nesta contemporaneidade, estudos se ‘encarregam de trazer a discussao as possibilidades de formacao para a vida, como a Pedagogia Social (CALIMAN, 2010) e a Pedagogia da Convivéncia (JARES, 2008), por exemple. Entretanto, ainda hd uma disputa por espago, hegemonia e sentidos no que tange a formagaio dos sujeitos. Ao estudarmos as pesquisas sobre Educacao Integral e(m) Tempo Integral, nos de- paramos com posicionamentos que podem exemplificar as disputas nesta contemporaneidade, que discorrem, basicamente, sobre a centralidade da escola nos processos formativos. Neste sentido, duas visdes emergem destas discussdes: uma visdo socioistérica e uma visao contempo- ranea do que seria educagao integral + 587° + 588+ A visio socioistérica se subjaz compreensao de que os elementos socioistoricamente construt: dos pela escola so extremamente importantes para uma formacdo mais completa possivel (COELHO, 2009), uma vez que a escola sintetiza e reproduz os saberes construldos por uma sociedade ao longo dos anos. Assim, a escola estaria numa posigo hierarquicamente superior as demais instituigdes, nas quais ocorre o que preferimos chamar de educagao nao escolar. Esta é uma perspectiva que nos remete ao estudo do termo educagao formal. Numa visdo mais contemporénea, ha a percepcao de que outros saberes dinamizados em contextos nao escolares, possuem uma intencionalidade e uma forma. Estabelecendo parcerias com as escolas em busca de educacao integral, Percebe-se, entao, um movimento que tende a fomentar “articulagées entre a educagao formal e os espacos nao formais de ensino” (GONCALEZ; SANTOS, 2018, p. 119) Frente a esse panorama, els que se nos apresenta a perspectiva de “sociedade da aprendl zagem” que, em si,cartega uma compreenséo do processo de aprendizagem como um ato reflexivo no qual informace e conhecimente interagem, na busca por instaurar uma nova lagica para esse pracesso, Esta diregdo caminha na contramao da sociedade moderna _ como produtora de grandes sélidas verdades, uma vez que as narratives que produziam explicagdes sobre o préprio conceito de informagao, conhecimento, e aprendizagem séo questionadas e um novo entendimento & construldo que, diretamente, inlina 9 conceito de educacio _ nesta producdo adjetivada de ‘integral'_para uma abordagem mais con- temporanea. (COELHO; SIRINO, 2048, p. 147). Gadotti (2005, p. 4) discorre em seu texto que “o conceito de educagao sustentado pela Convengo dos Direitos da Infancia ultrapassa os limites do ensino escolar formal”. Neste sentido, precisamos superar a discussao sobre os tipos de educagao e avancarmos para uma reflexao sobre as contribuigdes de cada setor da sociedade para que se aprenda por toda a vida, pensando no territério como uma cidade educadora em que escola e outros contextos se articular para materializaro direito a educagao. Gadotti (2005) infere, ainda, que, possivelmente, toda educago pode ser formal, mas que se efeti vva em espagos e tempos diferenciados, promovendo o desenvolvimento de varios saberes necessérios, 8 formacao humana. Por conseguinte, é desnecessédrio estabelecer uma hierarquizacao do “tipo” de educagao, uma vez que nao hd saber melhor ou pior. Gadotti também traz a discussao a possibilidade de a educagao nao-formal ser encenada num espago escolar, isto é, no contexto formal 0 que dizer sobre as tecnologias em contextos educativos? Onde enquadrar este saber tao dis serninado em diversos contextos? € possivel colocar em uma caixinha, mesmo sob um viés didatico? Nao podemos estabelecer fronteras muitas rgidas hoje entre o formal e 0 nfo-formal. Na escola e na sociedade, interagem diversos modelos culturals. 0 currieulo consagra a in tencionalidade necesséria na relagéo intercultural pre-exstente nas préticas socials e in- terpessoais. Uma escola é um conjunto de relagSes interpessoais, socials e humanas onde ‘se interage com a natureza eo melo ambiente. Os eurrfeulos monoculturais do passado, voltados para si mesmos, etnocéntricos, desprezavam o “nao formal” como "extra-escolar Interfaces Cienfieas «Arca - V8 N13 +584 586 Publica Continua 2020 ‘0 passo que os currfculesIntereulturals de hoje reconhecem a informalidade como uma caracteristica fundamental da educaggo do futuro, O curricuo intercultural engloba todas as agbes e relagdes da escola; engloba o conhecimento cientifico, os saberes da humanida- de, os saberes das comunidades, a experiénela imediata das pessoas, insttuintes da escola; ‘inclu a formagao permanente de todos os segmentos que compdem a escola, a conscienti- 2a¢80, 0 conhecimento humano e a sensibitidade humana, considera a educag3o como um processo sempre dindmico, interativ, complexo e criatvo. (GADOTTI, 2005, p. 4). E inegavel a “forma” presente neste contexto mais fluido e dinamico, preocupado com os saberes, mas, principalmente, com o ser. Que traz propostas que permitem aos profissionais conhecer os sujeitos dos con- textos nos quais atuam e colaborar positivamente com os processos formativos. Nesta contemporaneidade, na qual ainda vivenciamos movimentos de uma madernidade liguida, mos emergir projetos que abordam a preocupago com o outro, com a convivéncia, com o social, para além dos saberes construfdos pela escola, Qual projeto de sociedade estamos bancando? Aquele que atribui a escola a responsabilidade de formar cidadaos de sucesso? Ou aquele que quer formar cidadaos, pessoas felizes que consigam me- diar 0s seus conflitos e que construam uma sociedade mais justa, democratica e igualitéria? Finalizamos, portanto, esta se¢ao, trazendo uma inquietagao: 0 que é formal? Qual a forma que apresenta a educagao para o atual projeto de sociedade que se descortina aos nossos olhos? Sigamos no debate e na discussao sobre educacao nao formal na segao a seguir. 3 EDUCACAO NAO FORMAL A partir das contribuicdes de Trilla (2008), é possivel identificarmos algumas especificidades que margelam a compreensao de educago “nao formal”. Em meados do século XIX, evidenciava-se a necessidade de outros ambientes educacionais - para além da centralidade da escola que estava posta, por, justamente, haver o reconhecimento de seus limites e, neste bojo, identificar-se grupos exclufdos do processo educativo e que careciam de formacao e capacitagéo profissional. Este contexto se atrela a necessidade de preenchimento do tempo livre - num cendrio de mu- dancas na instituigo familiar em que os pais precisam trabalhar ¢ os filhos precisam de um espaco seguro e, ao mesmo tempo, produtor de cuidado, amparo e orientacao. Para potencializar ainda mais esta demanda, eis que se avolumam os meios de comunicagao de massa, 0 uso de novas tecnologias nos processos educativos - inclusive como uma forma de resgate de setores da sociedade que se encontravam em conflito e/ou marginalizados. Dado este que se re- laciona com a reforma da educagao ocorrida na década de 60/70 (DELORS, 1998) e com as criticas crescentes & instituigo escolar por sua perspectiva, supostamente, mais reprodutivista Uma visdo que descortina novos conceitos sobre educagao relacionados as cidades educadoras, uma vez que, como nos sinaliza Caliman (2010, p. 342), “Fora e além da escola existem diversas formas de educagao igualmente significativas e influentes". Neste caminhar, Souza Neto (2010, p. 37) complementa esta discussao ao nos afirmar que “O projeto de educagao que defendemos tende a transformar as organizacées sociais, a cidade, a sociedade em espacos ¢ territérios educadores'” + 589° 590+ Neste sentido, convém destacar que 0 movimento “Cidades Educadoras” - criado em 1990 em Barcelona, na Espanha ~ dialoga com 0 campo da Pedagogia Social uma vez que, segundo Paiva (2015, p. 64), “A Pedagogia Social discute esses novos espagos educativos, como midia, radio, TV, vi deo, igrejas, sindicatos, empresas, ONGs, espaco familiar, internet, espacos no campo que nao podem mais ser ignorados” - ou seja, um territ6rio, para além dos muros escolares - que produz educagdo, mas que, socialmente, se convencionou a chamar de educagao nao formal. Podemos, resgatando, ainda, as contribuigdes de Trilla (2008) encontrar processos de adjetiva ¢80 da educagao ao longo dos tempos. Processos estes que se relacionam com: 1) especificidade do sujeito (educacao infantil, educagao juvenil, educacao de pessoas adultas); 2) aspecto ou dimensao da personalidade (educacao intelectual, fisica, moral); 3) tipos de educacao (sanitaria, literéria,cien- tifica); 4) procedimento/metodologia (ensino a distancia, metodologias ativas); 5) insttuigdes (edu cago familiar, educagao escolar, educagao institucional). Adjetivacdes que, também, ocorrem quando fazemos a divisdo ‘formal, ‘nao formal’ e/ou ‘infor mal’. No entanto, como, nesta segdo, focamos, especificamente, na segunda adjetivagao, convém salientar que a primeira vez que a mesma foi citada, data-se de 1960 na obra de PH, Coombs - refe rindo-se a uma educagao intencional, formativa, com carter metédico, sistematico e/ou estrutural que acontece em diferentes espagos sociats, para além dos escolares. Sobre este tépico, cabe trazermos os mbites da educagio nao formal - uma vez que ela pode se dar 1) com a promogao de uma formagao ligada ao trabalho; 2) em espagos de lazer e de cultura; 8) por meio da Educagao Sociale 4) dentro da propria escola - 0 que nos faz resgataro artigo 1 da Let de Diretrizes e Bases da Educago Nacional (LOBEN) o qual nos afirma que a educagao abrange “processos formativos que se deserwolver na vida familar, na convivéncia hurnana, no trabalho, nas insttuigBes de ensino e pesquisa, nos movimentos socias e organizagSes da sociedade civil e nas manifestacBes culturais (BRASIL, 1996.4), nte ao exposto, podemos resgatar espacos ~ para além dos escolares ~ que promovam proces 0s educativos e que 530, profundamente, importantes para que novas oportunidades formativas sejam ofertadas. Esta perspectiva pode ser percebida facilmente, por exemplo, ao se questionar, em qualquer grupo social, sobre um espaco nao escolar que veio a contribuir na formagao desses sujeitos. Certamente, muitos deles ir trazer, baila, igrejas, instituigdes religiosas, organizagbes nao governamentais, pracas, parques, museus, centros culturals, hospitais, linicas, abrigos, centros de acolhimento, espacos militares, teatros, cinemas — dentre infintas outras possibilidades de espacos que, direta ou indiretamente, possuem processos formativos quer Seja pela agdes neles desenvolvi das ou, mesmo, pelas interagées oportunizadas entre os diferentes sujeitos. Neste contexto interativo, cabe resgatar, ainda, as contribuigdes de Hans-Uwe Otto (20141) quan: do, a partir de sua discussio sobre As origens da Pedagogia Social, podemos inferir que Tada relagao social é uma relagao pedagégica. Mfirmacao esta que nos permite maior alinhamento na compreen: so de que - em espacos ditos nao formais de ensino - a interagao, que eles possibilitam entre os. diferentes sujeitos, por si s6, j& traz uma aprendizagem significativa. Uma aprendizagem que se d4 no campo da convivéncia e que, possivelmente, muitos dirdo ser ‘informal’, mas esta é uma outra discus: S80 - que fica para a préxima seco, Interfaces Cienfieas «Arca - V8 N13 +584 586 Publica Continua 2020 A EDUCAGAO INFORMAL Ap6s as explicagdes dadas a respeito da educacao formal e nao formal, supomos que muito pouco restou para a definicdo da organizacao da educagao que podemos intitular sobre informal. Contudo, essa manifestagao da educacao que acontece no cotidiano das pessoas é uma das mais importantes, ‘a0 mesmo tempo em que, muitas vezes, desconsiderada, nos processos de ensino-aprendizagem, ‘Aeducagao informal se articula por meio de saberes originados dos grupos sociais em sua estreita relacdo com a vida cotidiana. Esse conjunto de conhecimentos sobre o real se transforma na base concreta na qual se movimenta tanto a educagao formal quanto a considerada nao formal. De fato, vale recorrermos a filosofia da educagao para entendermos uma das que podemos con siderar como sendo uma das principais caracteristicas da educagao informal e que se faz presente na vida dos sujeitos e de seus respectivos grupos sociais, embora os mesmos nao sejam capazes de identificd-tos de forma explicita: a constituigao do conhecimento da realidade, a partir do exercicio do juizo da razao sobre o mundo que se manifesta e a constituigao do campo semantico do senso ‘comum e suas representagses cognitivas do mundo. Os sujeitos, ao se depararem com o mundo concreto, s8o convidados de forma consciente ou in- consciente a organizar seu racioctnio de forma légica sobre o mundo, utilizando dois principios bési- cos de juizos: ode realidade e o de valor. Segundo Savianni (1996, p. 57), essa é uma das diferencas cexistentes na constituigao da reflexéo do ser humano sobre si mesmo ea realidade, pois, dessa forma, “oconhecimento do mundo passa a ser constituldo por essa égide: um conheclmento sobre a realida- 4e, organizado pela ciéncia, e outro no qual se debruca afilosofia, coma capacidade de emitir valores entre outros conceitos sobre a mesma realidade”. Esta construgao pode nos levar ao comeco de uma reflexao sobre a importancia de a educagao levar em consideragao um conhecimento chamado de “informal”. 0 ser humano apresenta em si mes- moa capacidade tanto de descrever a realidade tal qual ela se apresenta para ele, como também emi- tirjutzos de valores do conhecimento e da aco por ele participado e que, na sua convivéncia grupal, vai ganhando significado e sentido para a experiéncia vivida. Independentemente dessa agao ser considerada pela epistemologia do conhecimento como mani- festagdes do que poderfamos chamar de “ciéneia” ou “flosofia’, essa estruturacao de conhecimento de mundo tem a sua raiz no empfrico produzido pelos incividuos em seus grupos de origem. Assim sendo, a educagao dada de forma livre e aut6noma dos cénones das instituigdes formais, embora esteja subjugada as pretensdes dos grupos particulares, sdo conhecimentos validos e fundantes da construgdo de um pensamento que acompanharé o individuo mesmo que ele participe de outros es- pagos educacionais constituidos como formais ou nao. 'Da mesma forma, a educagao informal recebe em sua fundamentagao os resultados oriundos da experiéncia dos seres hurmanos a partirdo senso comum constituido no interior dos seus grupos socias. Conforme conseguimos vislumbrar na leltura de Germano (2041, p. 251), 0 senso comum se ca~ racteriza por “uma visao distorcida, desagregada e incoerente do mundo; uma compreensao difusa de uma realidade marcada pela presenca da ideolagia dos grupos dominantes”, Por isso, o avango para 7591+ 792° tuma consciéncia de ordem filoséfica significaria a passagem de uma concepcao “fragmentada, inco- erente, desarticulada, implicita, desagregada, mecanica e passiva e simplista a uma concepgdo uni- ‘éria, coerente, articulada, expltcita, original, intencional, ativa e cultivada” (SAVIANI, 1996, p. 10), Aos lermos os trechos acima temos a impressdo de que o senso comum deve ser expurgado e, portanto, a educagao informal, que, muitas vezes, encontra, na reprodugao do seu contetido, a sua sobrevivéncia do campo educacional deva, também, ser excluida dos processos educacionais huma- nos. Todavia, o que queremos reforgar é a ideia contréria ‘A preocupagao pelo reconhecimento dos contetidos da educagdo informal se fazer fundamentais nos processos educacionais por dais motivos basilares: primeiro, entender como os grupos sociais € seus individuos constroem os seus conhecimentos sobre 0 mundo e suas relagdes grupais; segundo, quais as ideologias presentes nesses grupos que os fazem movimentar sobre o mundo, assim como as escolhas que sao realizadas pelos seus integrantes. Naverdade, a valorizagao da presenga da educacao informal nos processos de ensino-aprendiza- gem ajuda aos educadores a entenderem as “légicas proprias de mundo” dos grupos socialmente constituidos para que, assim, se possa chamar, o que Germano (2011, p. 258) apregoa, como “uma educagao comprometida com a construcao de uma nova hegemonia, além de uma nova categoria de intelectuais com formagao e os interesses voltados para os interesses das classes populares”. Esse contexto jé é vivido pelos autores que se dedicam a Pedagogia Social em seus diversos cam pos de saber como podemos perceber na Educacao Popular, na Educagao Social, nos t6picos sobre Educagao e Periferias Urbanas, Educagao do Campo, Grupos Etnicorraciais, dentre outros. Em todos estes exemplos, de campos de pesquisa e investigacao da educagao nao escolar, a intitulada “edu- cagao informal” tem a sua primazia e a sua valorizagao como campo legitimo de manifestagao de saberes com jutzo de realidade e de valor préprio - ao mesmo tempo em que, o senso comum passa a ser o campo representacional que manifesta como os individuos constituem as suas relagées socioe- ducacionais na contemporaneidade, como pode ser percebido no quadro a seguir. Quadro 2 - Bases constitutivas da Educagao Informal Base do Conhecimento (Formal e Nao Formal) laboragao dos Autores (2019). Fonte: Enfim, a0 organizarmos a nossa argumentacao sobre Educagao Informal, por meio da ilustragao acima, ndo queremos inferir, mas, apenas, mapear o comeco de uma reflexéo mais detalhada sobre a educagao informal, sua relevancia na construgao da ciéncia e no amalgama de ideologias que cons- ‘ituem as relagdes socioeducacionais. Autores brasileros como Paulo Freire, Celso de Rut Beisegel, Osmar Févero, Vanilda Paiva, Stella Gra ciani ~ entre tantos outros -iniciaram esse trabalho de valorizagao da educa¢ao informal como prinefpio de uma agao libertadora e emancipadora do ser humano em suas relagdes com a sociedade do capital. Interfaces Cienifieas «Arca -V8 N13 +584 586 Publica Continus 2020 Cabe a cada um de nés, portanto, continuar essa reflexdo sobre a educagao informal, desde o tempo ‘ espaco hist6rico que nos encontramos, tendo-o em conta nas pesquisas relativas as classes populares. ‘5 EDUCACOES: UM DESFECHO EM (DES)CONSTRUCAD Ninguém escapa da educagéo, fm casa, na rue, naigreja ou na escola, de um mo ou de muitos todos nés envoluemas pedages da vida com ea: para aprender, para ensinar, para aprender ~e~ensinar Para saber, are fazer, para ser ou para conve’, todos os dias misturamos a vida cam a educagio. (@RANDAO, 1981,p. 3). Acpigrafe que trazemos no inicio deste desfecho diz muito do que acreditamnos ser educagao: um pro- ccesso complexo, plural eque se deservolve em miiltiplos tempos e espagos por meio de diferentes sujeitos. Dessa forma, queremos trazer & tela que no comungamos com a ideta cléssica da educagao em dividir os campos dos saberes em formal, nao formal e informal. Este tipo de classificagao, por muitas vezes, desvaloriza os processos de ensino-aprendizagem acontecidos fora do ambiente escolar e t30, necessérios para o desenvolvimento do ser humano. Bem verdade que a legislagao educacional, tal qual foi exposta, valoriza esses espacos e promo: ve, na formagao docente, reflexdes pertinentes sobre esses outros espacos nao escolares, porém, sabemos que, nas préticas, a nomeagéo de um campo de saber educactonal como prioritario (formal) movimenta esforgos muito maiores das politicas puiblicas na utopia iluminista de que o conhecimento formatado pelos curriculos escolares irdo resgatar os grupos sociais dos espagos de vulnerabilidade ‘em que se encontram ou, mesmo, apaziguard as desigualdades sociais de forma imediata, deixando nas mos dos educandos a tinica responsabilidade pelo seu sucesso, ou ndo, diante de uma sociedade desigual sécio-econdmica-cultural ‘Ao defendermos os espagos nao escolares (chamados tradicionalmente de nao formais e infor mais) a comecar por uma refiexéo contra a nomenclatura dada pelos livros e manuais de educagao, queremos suscitar @ outros educadores que possam realizar o mesmo manifesto e, a partir da vivéncia educacional prética, buscarmos meios de valorizar esses outros espagos educacionats que falam de uma realidade mais objetiva. Atentem-se que nao pregamos o fim da educagao formal; apenas um olhar mais cuidadoso sobre ( outros campos de educagao a fim de que sejam percebidos tanto pelas politicas piiblicas quanto pelos curriculos ¢ organizagdes dos trabalhios pedagégicos existentes nesse pais. Talvez, desse modo, ao tratarmos com a mesma dignidade essas diversas formas de manifestagao da educagao, possamos terminar com a reprodugo de um conhecimento fragmentado para olharmos ‘ser humano como um ser inteiro e que integre suas diversas formas de educago, oriundas das suas vivencias de ensino-aprendizagem social. + 593+ +594 REFERENCIAS BRANDAO, Carlos Rodrigues. © que ¢ educagio. Séo Paulo: Editora Brasiliense, 1981. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educagao Nacional, LDB. 9394/1996. Sao Paulo: Saraiva, 1996. CALIMAN, Geraldo. Pedagogia social: seu potencial critico e ransformador. Revista de Ciéncias da Edueagio - UNISAL, Americana/SP, Ano Xlil,n. 23, 2° Semestre, 2010. COELHO, L. M, SIRINO, M. B. 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Barcelona: Ariel, 2003 595° 1 Professor Agjunto de Didétca do Departamento de Etducagao da Faculdage de Formagao de Professores da Universidade do Estado do Ria de Janeiro - UER, E-mail arthuruerffp@gmail.com 2 Mestre em Eaucagao (UNIRIO); Doutorando em Eucagso (ProPEAIUERJ}; Professor da Universidade Castelo Branco — UCB, E-mi pedagogomarcio@amsil com $3 Doutoranda no PPGEdu — UNIRIO; Professora na Universidade Castelo Branco, E-mail: patriciamotauerfp@hotmail.com Recebido em: 12de Agosto de 2018 ‘Avallado em: 1 de Marco de 2019 ‘Aceito em: 6 de Abril de 2020 Aautenticidade desse artigo pode ser confers no site https//periolcos, setedu.br Este artigo licenciado na modalidade aesso abertosob a AtribuiSo-Compartithalgual CCBYSA Grupo TIRADENTES

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