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— Introducao ao pensamento ~ Tilosofico Karl Jaspers i cultrix Digitalizado com CamScanner Titulo do original: KLEINE SCHULE DES PHILOSOPHISCHEN DENKENS © R. Piper & Co. Verlag, Miinchen 1965 Bdigao © primeiro mimero a esquerda indica a edigdo, ou redigio, ey ——_ennobra:& primera deren a direitaindiea 0 ano con ue is a1SN6 sth edigo, ou resdigio, fi publicada 03-04-05-06 Direitos de tradugao para a lingua portuguesa adquiridos com exclusividade pela EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA, Rua Dr, Mario Vicente, 368 — 04270-000 — Sao Paulo, SP Fone: 272-1399 ~ Fax 272-4770 E-mail: pensamento@cultrix.com.br hitp://www.pensamento-cultrix.com. br que se reserva a propriedade literaria desta tradugio. Impresso em nossas oficinas graficas. Digitalizado com CamScanner XIII. A FILOSOFIA NO MUNDO 1. Seja a filosofia 0 que for, est& presente em nosso mundo ¢ a ele’ necessariamente se refere. Certo é que ela rompe os quadros do mundo para langar-se a0 infinito. Mas retorna ao finito para af encontrar seu fundamento histérico -sempre original. Certo & que tende aos horizontes mais remotos, a hori- zontes situados para além do mundo, a fim de ali. conseguir, no eterno, a experiéncia do presente. Contudo, nem mesmo a mais profunda meditacao terd sentido se nao se relacionar 3 existéncia do homem, aqui ¢ agora. A filosofia entrevé os critérios tltimos, a abdbada ce- leste das possibilidades ¢ procura, & luz do aparentemente impossivel, a via pela qual o homem poder enobrecer-se em sua existéncia empirica. A filosofia se dirige ao individuo. D4 lugar & livre comunidade dos que, movidos pelo desejo de verdade, con- fiam uns nos outros. Quem se dedica a filosofar gostaria de ser admitido nessa comunidade. Ela est sempre neste mundo, mas nao poderia fazer-se instituicio sob pena de sacrifiear a liberdade de sua verdade. 0 fildsofo nio pode saber se integra a comunidade. Nao ha instdncia que decida admiti-lo ou recusé-lo, E 0 fildsofo deseja, pelo pensamento, viver de forma tal que a aceitacio. seja, em principio, possivel. A 8. Mas como se pe o mundo em relagio com @ filo- sofia? Ha eétedras de filosofia nas universidades. Atual- mente, representam uma posicéo embaragosa. Por forca da 188 | tradigfo, a filosofia é polidamente respeitada, mas, no fundo, objeto de desprezo. A opiniéo corrente é a de que a filo- sofia nada tem a dizer e carece de qualquer utilidade pré- tica. £ nomeada em piblico, mas — existird realmente? Sua existéncia se prova, quando menos, pelas medidas de defesa a que dé lugar. ‘A oposi¢ao se traduz em f{6rmulas como: a filosofia demasiado complexa; no a compreendo; esté além de meu aleance; nfo tenho vocagéo para ela; e, portanto, ndo me diz respeito. Ora, isso equivale a dizer: € iniitil o interesse pelas questées fundamentais da vida; cabe abster-se de pensar no plano geral para mergulhar, através de trabalho Consciencioso, num capitulo qualquer de atividade pritica ou intelectual; quanto ao resto, bastard ter “opinides” © con- tentar-se. com elas. ‘A polémica torna-se encarnicada.. Um instinto vital, ignorado de si mesmo, odeia a filosofia. Ela é perigosa. Se eu a compreendesse, teria de alterar minha vida. Adquiriria outro estado de espirito, veria as coisas a uma claridade insdlita, teria de rever meus juizos. Melhor é nao pensar filosoficamente. E surge os detratores, que desejam substituir a obsoleta filosofia por algo de novo e totalmente diverso. Ela é desprezada como produto final e mendaz de uma teologia falida. A insensatez das proposicées dos fildsofos é ironi. zada. E’a filosofia vé-se denunciada como instrumento servil de poderes politicos e outros. Muitos politicos véem facilitado seu nefasto trabalho pela auséncia da filosofia, Masses e funcionérios séo mais faceis de manipular quando nao pensam, mas téo-somente usam de uma inteligéncia de rebanho. preciso impedir que os homens se tomem sensatos. Mais vale, portanto, que a filosofia seja vista como algo entediante. Oxalé desa~ parecessem as cétedras de filosofia. Quanto mais vaidades se ensine, menos estaréo os homens arriscados a se deixar tocar pela luz da filosofia. Assim, a filosofia se vé rodeada de inimigos, a maioria dos quais nao tem consciéncia dessa condicao, A auto- 139 Digitalizado com CamScanner sncia burguesa, 08 convencionalismos, © hébjt ee © bemestar material como razi0 suficiente « vida, 0 habito de s6 apreciar a ciéncia em fungio de - vides ade téenica, 0 ilimitado desejo de poder, a bonomia satMoltins, 0 fanatismo das ideologlas, a aspiracko tm frome literdrio — tudo isso proclama a antifilosofia, Bos omens nao 0 pereebem porque néo se dio conta do que homer endo, E permanecem inconscientes de que a atts flosofia € uma filosofia, embora pervertida, que, se aprofun. dada, engendraria sua prépria aniquilacio, 8. 0 problema crucial & 0 seguinte: a filosofia aspira 4 verdade total, que o mundo no quer. A filosofia é pox tanto, perturbadora da paz. , Ea verdade o que seré? A filosofia busca a verdade nas miltiplas significagées do ser-verdadeito segundo og modos do abrangente. Busca, mas no possui o significado e substincia da verdade ‘nica, Para nés, a verdade nao € estitia e definitive, mas movimento incessante, que penetra no infinito. No mundo, a verdade esta em conflito perpétuo. A fi- losofia leva esse conflito ao extremo, porém o despe de violéncia. Em suas relagdes com tudo quanto existe, o filésofo v8 a verdade revelarse a seus olhos, gracas a0 interembio com outros pensadores e a0 proceso que o tora transparente a si mesmo. Quem se dedica & filosofia pée-se & procura do homem, escuta 0 que ele diz, observa o que ele faz e se interessa por sua palavra e aco, desejoso de partilhar, com seus concidadios, do destino comum da humanidade. agit, Pot ue a filosofia no se transforma em credo, ‘st em continua pugna consigo mesma. a ‘A dignidade do homem reside em perceber a ver- S6 a verdade o liberta © 36 ba s6 a liberdade o prepara, sem restrigGes, para a verdade. a ea prrdade © significado wltimo para o homem no eae econ imperativo ultimo? Acreditamos m, pois a veracidade sem reserva: a om opinides, coincide com o amon. ae x0 Nossa forga est em agarrarmos os fios de Ariadne que a verdade nos langa, Mas a verdade sé é a verdade tora fs preciso que a verdade multipla seja levada a convergir para a unicidade. Jamais chegamos a possuir essa verdade integral, Fiu a nego quando vou ao extremo da afirmagio, quando erjo ‘0 que sei em absoluto. Eu a nego também quando tento sistematizd-la em um todo, porque a verdade total nio existe para o homem e porque essa iluséo o paralisa ‘Todo aquele que se dedica & filosofia quer viver para a yerdade. VA para onde for, acontegalhe 0 que acontecer, sejam quais forem os homens que ele encontre e, principal: Sonte, diante do que ele proprio pensa, sente e faz esta sempre interrogando. As coisas, as pessoas e ele préprio devem tornar-se claros a seus olhos. Ele nao se afasta de seu contato. Ao contrério, a ele se expée. E prefere ser desgragado em sua busca da verdade a ser feliz na ilusio. Faz-se preciso que o que é se ponha manifesto. £ possivel certa confianga, mas nao a certeza. A ver- dade, mesmo quando nos abate, revela — se for realmente ‘a verdade — aquilo que nos salva. E produz-se 0 milagre da filosofia: se recusarmos todos os enganos, afastarmos todos os véus, expusermos 2 luz todas as insinceridades, se nos obstinarmos a avangar de olhos abertos, sujeitando nossas criticas a outras criticas, essa critica terminard por nfo ser destruidora. Muito ao contrério, veremos, por assim dizer, revelar-se 0 préprio fundamento das coisas onde vemos luz, como um restaurador vai-se apercebendo de um Rembrandt por sob a pintura posterior que 0 escondia. E se a luz nio se revelar? Se, ao fim, 0 homem desco- brir a mascara de Gérgona e vir-se transformado em pedra? No temos o direito de olvidar que isso € suscetivel de acontecer. A filosofia se expe a abismos diante dos quais nao deve fechar os ollios, assim como no pode esperar que desaparecam por encanto. Torna-se mais clara do que nunca a questo que, desde © inicio, se pos para o homem. O “sim” para a vida é grandee bela aventura, porque permite a realizagio da razio, da verdade e do amor. Q “nao” & existéncia, tra- WI Digitalizado com CamScanner duzido pelo suicfdio, & a realidade para homens diante de eujo segredo permanecemos calados. Poe-se fronteira “que nifo temos 0 direito de esquecer. 5. A filosofia se destina ao homem enquanto homem ow apenas a uma elite fechada em si mesma? Para Platio, poucos homens sio aptos para a filosofia e sé adquirem tai aptidio apés longa propedéutica. Hé dois tipos de vida na Terra, disse Plotino, um prdprio dos sdbios eo outro da massa dos homens. ‘Também Espinosa sé espera filosofia do homem excepcional. Kant, porém, acredita que a rota por ele tragada pode tomar-se um caminho real: a filosofia af esté para todos. E seria mau se fosse diferente. Os fildsofos ndo passam de elaboradores e guardiies de atas, onde tudo deve estar justificado com precisio maxima. Contra Plato, Plotino, e quase toda a tradicao, acom- panhamos Kant. Trata-se de uma decisio filoséfica de gran. de alcance para a atitude iriterior do fildsofo. Corresponde a uma recusa de se prosternar diante da realidade; foi assim até agora e assim é hoje; mas no deve permanecer assim e assim nio continuaré. Dar-se-Zo ouvidos a exigéncias do homem como homem, exigéncias freqiientemente ocultadas e reduzidas de importancia, afastadas e negligenciadas. A de- cisio cabe a cada individuo. Estaremos, talvez, transformando em virtude a tragica auséncia de uma filosofia genial em nosso tempo? Nao, a experiéncia de nossa prépria mediocridade, do homem que, embora simples homem, pode compreender os grandes ho- mens do passado, apropriar-se do que realizaram, aproximar- se deles, cheio de respeito, mas sem divinizé-los — essa experiéneia & encorajadora. O que esta a nosso alcance esté ao aleance de todos ou de quase todos, bastando que verdadeiramente 0 queiram. Ha, na Histéria, uma grande excegio. Os padres da Igreja crista considerando que lhes tocava o dever de enun- ciar a salvacdo e de praticar obras de amor, dirigiam-se a todos os homens. E encontravam um argumento contra os fildsofos gregos no fato de estes sé se dirigirem aos eleitos. Tema da Tgreja foi: ninguém que deseje crer est exeluida. Mg. uilo que se revela, a plena claidad i ‘Advis tos eleltos esth contido na fé mats Pe ea Contudo, tal solitude pelas massas é ambivalonte: de- seja domind-las e, ao mesmo tempo e no interesse de domi. Silas, tolera a mentira e a supersticao e se envelve no litico. Em razio disso, esse grande exemplo histérioo erg nos pode servir de modelo. Outro inimigo da filosofia independente e, portanto, da liberdade do homem é 0 pensamento pretensamente demo. crdtico. Hé razio em proclamar: 0 que nio convém a todos deve, um dia, desaparecer. O que nfo desperta qual. quer eco é, « priori, desprovido de realidade. Mas é erténeo afirmar: sabemos qual seja essa realidade; 0 que hoje é sempre ser; 0 que nfo atua agora, jamais atuard; o homem nao se modifica, Antes, caberia dizer: o que ainda esté jsolado poderd expandir-se; 0 que hoje no encontra eco poderé encontré-lo amanhi; e, principalmente, 0 que € real para reduzido nimero de pessoas poder’ tomar-se a rea- Tidade suprema de uma época e, sob tal forma, perpetuar-se; ingiu as massas poderd penetré-las no © que ainda no futuro. Para libertar-se é inevitdvel que a verdade desca as massas, ao burburinho sonoro e confuso dos homens. ‘A altemativa seria o dominio sobre as massas, a censura, @ edueacéo padronizada. E os seres humanos se tornariam matéria-prima para os déspotas. Na incerteza, uma s6 coisa permanece: crer na possi- bilidade de liberdade humana e, alimentando essa crenca, conservar-se ligado & Transcendéncia, sem a qual aquela conviego sogobraria. 6. Continua-se a afinmar que, no mundo, a filosofia esta consciente de sua impoténcia. Desperta poucas res- postas e nfo dispde de nenhum poder de modelar 0 mundo; nfo é, de maneira alguma, um fator da Histéria, Assim pareceu até agora. Mas a filosofia esté Jonge de ser impotente no que diz respeito ao individuo. Ai, ela constitui, muito ao contrério, M3. Digitalizado com CamScanner a grande forga quo leva 0 homem a encontrar 0 caminho para a liberdade, 6 ela possibilita a independéncia interior, Ganho essa independéncia exatamente quando e onde parego completamente dependente, ou seja, quando reconkiego jue — em minha liberdade, em meu amor, em minha raziio — fui dado a mim mesmo. Nenhuma dessas coisas esta sob meu poder, eu nao as faco surgir. Mas tudo quanto eu fizer surgit delas derivard. Se atinjo o ponto em que sou dado a mim mesmo, distancio-me de todas as coisas e, inclusive, de mim. Como que de um plano de observacao externo a mim — em ver- dade, inatingivel — contemplo 0 que acontece e 0 que faco. & como se me fosse preciso ‘atingir aquele plano para mergulhar na realidade histérica. De ld jorra a luz que faz crescer minha liberdade interior. ‘Torno-me indepen- dente na medida em que vejo as coisas a essa luz. Essa independéncia é uma quietude, sem violéncia & sem orgulho. Tanto menos soberba quanto mais segura de si mesma, Evidencia-se permanecendo em obscuridade. Na independéneia, a liberdade no permanece vazia. Limitar-se a si mesmo nao seria independéncia. A indepen- déncia quer participar do mundo. Age. Ouve e responde aos apelos da sorte. Nao foge As exigéncias do dia. Quando © destino parece deter as rédeas, ousa envolver-se em situa- ges de risco, na esperanca de vir a dominé-las. Nao obstante, aceita sempre critérios que nio pode trair porque provém de sua mesma origem. Traf-los seria aniquilar-se. 7. A independéncia do fildsofo torna-se falsa quando se mescla de orgulho. No homem auténtico, o sentimento de independéncia sempre se acompanha do sentimento de impoténcia, 0 entusiasmo de poder sempre se acompanha Ee desespero de ae Poder, a esperanca sempre se acompanha uumtol ee fim. Filosofar dénos lucidez total erca das s de nossa dependéncia, mas de ma- neira tal que, em vez de permanecermos esmagados por nossa impoténcia, encontramos, a partir de nossa indepen- déncia, meio de recuperacio. arr Eis dois exemplos de como isso ocarre no pensamento: a) © quantitativo tem predomindneia sobre 0 qualita- tivo, © universo, no seio do qual, a Terra, com todos os seus habitantes, nao passa de um grio de poeira, tem pre- dominfincia sobre nosso planeta. Na hierarquia em que fi- guram matéria, vida, alma e espirito, cada um dos estégios tem predomindncia sobre o seguinte. Ao fim, é a massa que tem preeminéncia. Diante dela, o individuo nio conta. $6 conta o universo, a matéria, a massa, 0 que tem peso. Invertamos, porém, a escala de valores: 0 que ha de mais precioso no universo é 0 homem; na hierarquia das realidades, é 0 espfrito; entre as massas, 0 individuo como éle préprio; entre as obras da natureza, as criadas pela arte humana. Se julgamos as‘coisas de maneira diversa, € por sucumbirmos & tentacZo do quantitative © rentmeiarmos a0 senso do humano. b) © conjunto da Histéria — que ninguém pode co- nhecer, que nao precisamos imaginar necessariamente como uma totalidade — avassala-nos. O individuo sente-se inde- feso. Tudo o que éle é, é determinado por aquele conjunto. E ele deve curvar-se. Entretanto, o que se passa com a Iumanidade passa-se como resultado das forgas infimas de bilhées de individuos. Cada um € responsivel pelo que faz, pela maneira como vive. Parece-nos que a Histéria néo tenha sentido, mas ela estd penetrada de razio. E essa razdo depende de nés. Permanece, porém, 0 fato.de que diretamente real para nés € 0 meio que, de imediato, nos cerca. Nosso primeiro dever é para com ele. Quando desesperamos do futuro, porque nfo podemos orientar 0 curso dos acontecimentos, ou quando nos exaurimos em clamores vos, como se disso dependesse o movimento do universo, estamos esquecendo 0 que nos toca mais de perto. Afirmamo-nos na realidade desse_pequeno mundo que nos cerca. E, através dele, participamos do conjunto. 8." Na época atual, fazemo-nos conscientes de nossa impoténeia divisando-lhe um Angulo novo. Todos sabemos M5 Digitalizado com CamScanner que a democracia é corrupta no seu operar, embora continue sendo a tinica via possivel para a liberdade. Mais duvidoso € seu aleance entre povos em que ela nio tem origem istérica _prépria, Satisfazer-se com o milagre econdmico & 0 dpio do mundo livre. © resto do mundo inveja esse milagre, mas io tem as condic&es capazes de propicid-lo e lanca ao mundo livre a culpa de suas desventuras, No mundo ocidental, 0 econdmico predomina sobre © politico. E_ isso equivale a dizer que o Ocidente esti cavando a préptia cova. Nele, a liberdade politica se teduz constantemente. £, com freqiiéncia, incompreendida. Assiste-se 4 desaparicio do sentimento de liberdade e do espirito de sacrificio. Em todo o mundo, manifestam-se tendéncias & ditadura militar e ao totalitarismo, pois a liberdade se degrada. Os povos se fazem presa dos poderosos. Se continuar, a explosio demogréfica levard necessaria- mente a uma conflagracio que exterminard imimeras vidas humanas. Os povos de cor (mais de dois tergos da humanidade) voltam-se contra os brancos, cheios de ressentimento e com determinagao crescente. A bomba atémica pesa sobre todos nés. Por algum tempo, ela continuard a impedir a grande conflagracio que (nfo sabemos quando) provocard o aniquilamento total, se os homens continuarem a ser 0 que sio hoje. Até agora, quando Estados, povos ou civilizagées pere- ‘am, outros Ihes tomavam o posto. Um elemento. permane- cia — a humanidade, Atualmente, caberia. perguntar sea humanidade naé esté a ponto de cometer suicfdio gene- ralizado. No interim, podemos gozar a vida, permanecendo, porém, a0 .pé do cadafalso. Ou afastamos o perigo mortal ou deveremos estar preparados para a catéstrofe. E escandalosa a trangiiilidade do mundo ocidental, trangiiilidade baseada na presuncao de que essa agradavel M6 maneira de viver teri duragio indefinida, As conseqiiéncias das ilusées voluntarias de antes e apds 1914 nao nos terdo ensinado ao que leva essa irresponsabilidade politica e moral? Nossa época vive entre dois abismos. Compete-nos esco- Iher: deixar-nos tombar no abismo da ruina do homem e do universo, com a conseqiiente extingéo de toda vida ter- rena, ou cobrar animo para nos transformarmos, dando surgimento ao homem auténtico, ante o qual se’ abrirao possibilidades infinitas. 9. Em tal contexto, qual o papel da filosofia? Ensina, pelo menos, a ndo nos deixarmos iludir. Nao permite que se descarte fato algum e nenhuma possil Ensina a encarar de frente a catdstrofe ‘possivel. Em meio & serenidade do mundo, ela faz surgir a inquietude. Mas proibe a atitude tola de considerar inevitavel a catdstrofe. Com feito, apesar de tudo, o futuro depende tam- bém de nd: Se fosse vigorosa em sua elaboragéo, convincente por seus argumentos e digna de {6 pela integridade de seus expositores, a filosofia poderia ‘tornar-se instrumento de sal- vacio. Sé ela tem o poder de alterar nossa forma de p samento. Mesmo diante do desastre possivel e total, a filosofia continuaria a preservar a dignidade do homem em declinio. Numa comunidade de destinos, que se apdie na verdade, o homem encara face a face seja o que for. Nao se confunde o declinio com o nada. Em meio ao desastre, a iiltima palavra cabe ao homem, que ama e conserva confianga incompreensivel no fundamento das coisas. Para falar sob forma de enigma: a origem de que bro- taram.o universo, a terra, a vida, o homem e a Histéria encerra possibilidades que nos sfo inacesstveis. Enfrentando de frente o desastre, asseguramo-nos dessas possibilidades. Fazemos uma tentativa, & qual outras ho de seguir-se, continuadamente. Mas, presentes, por um instante, nessa lr Digitalizado com CamScanner a tentativa, que uma ten! minciada. Nenhum pensamento suscetivel de ser concretizado, 1 , e- num conhecimento, nada de fisicamente tangfvel, nenhu dos enigmas por nds mencionados pode adentrar a teri. i- dade. Mas, para além de todos os enigmas, 0 pensamento netra no siléncio pleno de insondavel_ raziio. De a vordade atestam tratar-se dey » mais o amor € U 1 ] ima palavra de eter dade fo; de foi Pro. tativa. 118 Digitalizado com CamScanner

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